IVA e Tributação na Federação Ricardo Varsano O Estado e a Federação Brasileira: Crise e Reformas CAE/ Senado Federal, IDP e BID 27 de novembro de 2013 Tópicos da Apresentação 1. O IVA: origem e propagação 2. Os pioneiros que perderam o rumo 3. Os Tributos sem nenhum caráter 4. Um laboratório da tributação indireta 5. Um IVA em construção num BRIC 6. Reforma tributária na federação Esta apresentação baseia-se principalmente em um artigo ora em elaboração para o projeto “Apoio à Reforma Fiscal no Brasil”, cujo título provisório é “A Tributação do Valor Adicionado, a Prática no Brasil e em Outros Países e Reformas para Conformar o ICMS às Melhores Práticas Internacionais”. O IVA: origem e propagação Origem do IVA • 1948 - O imposto francês sobre a produção (seletivo sobre produtos industrializados), passou a permitir crédito de imposto pago sobre os insumos utilizados diretamente na produção. • 1954 - Após nova reforma, o imposto bem mais geral foi rebatizado de IVA. Não incluía serviços e era cobrado somente de grandes contribuintes. Permitido também crédito do imposto pago sobre os bens de capital e sobre as despesas gerais. Motivação: eliminar cumulatividade para reduzir ineficiência e aumentar competitividade Propagação do IVA (I) • Primeira metade da década de 60 – Costa do Marfim (1960), Senegal (1961) e Brasil (IPI, 1964). Todos semelhantes ao imposto francês de 1948 • 1967 – Brasil (ICM) e Dinamarca ICM – Primeiro IVA subnacional, semelhante ao IVA francês de 1954 mas incluindo pequenos e médios contribuintes e com crédito de imposto semelhante ao imposto de 1948 Dinamarca – primeiro IVA cuja base inclui serviços Propagação do IVA (II) • 1968 – Entra em vigor a reforma francesa de 1966 que expandiu a base do IVA e eliminou 13 impostos, inclusive o imposto sobre serviços. • Final da década de 1960 e década de 1970 - O IVA se propaga principalmente para os países da CEE e os latino-americanos. • Ao final do século XX – IVA já era adotado por cerca de 120 países em todas as partes do mundo. Em 2013, 151 países adotam o IVA O único grande ausente: Estados Unidos Os Pioneiros que perderam o rumo Evoluções Divergentes • IVAs em geral – generalização e simplificação: bases amplas, uma ou poucas alíquotas, mesma regra aplicada à grande maioria das operações ICMS: base cada vez mais restrita, grande número de alíquotas, regra geral cada vez menos aplicada • Impostos seletivos –quase todos são atualmente uni-estágio, aplicados essencialmente aos vícios e poluentes. IPI: multi-estágio, sobre todos os produtos industrializados, com muitas alíquotas zero Os IVAs do Mundo e o ICMS (I) • Abrangência da base – ICMS = China, mas China já deu início a experiência visando a incluir serviços na base (Shangai) • Tratamento dos bens de capital – ICMS pré-1996 = Haiti = China pré-2009 – ICMS1996-2000 = Mundo – ICMS pós 2000 = Filipinas pós-2005 • Isenções – Mundo: muitas isenções, para mitigar alegada regressividade ou para tratar casos em que controle é difícil e/ou caro. Há países em que receita poderia dobrar – Exceção importante: Nova Zelândia – ICMS: Quantas isenções? Qual o gasto tributário? Os IVAs do Mundo e o ICMS (II) • Ajustamentos de fronteira – Mundo: princípio de destino (vendas a consumidores e certos serviços tributados com princípio de origem) – Exceções: ICMS interestadual e, até 2001, IVA dos CIS • Período do imposto – Maioria dos países: mensal – Em alguns países: bimensal ou trimestral. – Pequenos contribuintes: desde mensal até anual • Créditos de imposto – Mundo: crédito para todos os insumos, com algumas restrições (“critério de crédito financeiro”) – ICMS = Costa Rica (“critério de crédito físico”) Os IVAs do Mundo e o ICMS (III) • Restituições – O sistema de restituição é considerado o calcanhar de Aquiles do IVA. Se não funciona, a qualidade do IVA é precária. – Ideal: pedido de restituição feito imediatamente – Maioria dos países: pedido de restituição somente após certo número de períodos do imposto mas, em geral, imediato para exportadores – Alguns países: só exportadores têm direito a restituições – ICMS: em geral, nem mesmo exportadores Os IVAs do Mundo e o ICMS (IV) Restituições de IVA em percentagem da arrecadação bruta1 País Eslováquia % 53,9 País Reino Unido % País 40,9 Ucrânia % 24,1 País El Salvador % 9,6 Canadá 50,3 África do Sul 39,5 Argélia 24,3 Camarões 8,8 Países Baixos 50,0 Nova Zelândia 35,5 Bulgária 21,5 Quênia 7,2 Letônia 49,1 México 32,1 França 21,2 Marrocos 5,1 Suécia 48,6 Chile 28,8 Peru 19,8 Colômbia 4,1 Hungria 48,2 Irlanda 24,9 Indonésia 12,4 Camboja 2,8 Rússia 44,6 Romênia 24,7 Bolívia 10,4 Moçambique 2,7 Fonte: Harrison e Krelove (2005), op.cit. 1 Restituição média anual no período 1998 a 2001. Os IVAs do Mundo e o ICMS (V) • Alíquotas – Idealmente, uma única alíquota positiva e alíquota zero somente para exportações – Levantamento feito em 2005 (International Tax Dialogue): Uma alíquota: 51% dos países com IVA Uma ou duas alíquotas: 81% dos países Três ou menos: 94% dos países – IVAs mais recentes: 80% dos países adotaram uma só alíquota – Colômbia (considerada caso extremo) tinha sete alíquotas; a partir de 2013 só duas – ICMS – quantas alíquotas? No Rio de Janeiro são quinze! Os IVAs do Mundo e o ICMS (VI) • Limiares do IVA em países selecionados (em US$) País Alemanha Argentina1 Austrália Barbados Brasil2 Canadá China3 Limiar 132.676 35.020/52.530 69.851 40.000 Não há 28.987 Não há País Colômbia Dinamarca El Salvador França Gana Índia Itália Limiar 51.922 49.808 5.714 132.676 55.364 7.847 46.437 País Polônia Portugal Reino Unido Rússia Singapura Tanzânia Ucrânia Limiar 46.832 46.437 110.137 60.669 788.567 24.776 36.697 Fontes: FMI/FAD e www.TMF-VAT.com 1 Para bens e serviços, respectivamente. Não há limiar para as corporações. 2 Todas as empresas são obrigadas a se registrar. No entanto, empresas com receita bruta abaixo de R$3.600.000 por ano (aproximadamente, US$1.635.000) podem optar por tributação simplificada (Simples Nacional). 3 Todas as empresas são obrigadas a se registrar. No entanto, empresas com faturamento até US$9.800 a 39.200 por ano, dependendo do setor, são isentas. Os IVAs do Mundo e o ICMS (VII) • Substituição Tributária – substituição para trás – uso relativamente comum (ex: Comércio entre membros da UE; primeira saída de produtos agrícolas) – Substituição em operações concomitantes – raramente usada (ex: leilões) – Substituição para a frente – ICMS = Argentina = Peru – Dados de 2009 (PWC e CNI, em Angelo de Angelis (2012)): MG: 337 produtos; SP: 281; RS: 266; RJ: 238 Substituição tributária + isenções + alíquotas + créditos não restituídos: ICMS ≠ IVA Os Tributos sem nenhum caráter O Que São o PIS e a COFINS? (I) • PIS e COFINS – originalmente tributos cumulativos • Reformas do PIS (2002) e da COFINS (2003): criaram tributos sem similares no mundo. • Tributos “meio cumulativos” – Em certos setores → IVA cobrado pelo método de subtração; em outros → tributo cumulativo • IVA pelo método de subtração = imposto sobre a produção → prejudicial ao crescimento • Comércio exterior: nem importações nem exportações eram tributada → viés pró-comércio O Que São o PIS e a COFINS? (II) • Tributação das importações a partir de 2004 → princípio de destino → tributação do consumo • Existem tributos sobre o valor adicionado cobrados pelo método de subtração: IRAP na Itália e imposto local sobre negócios na Hungria. Ambos são cobrados com princípio de origem → tributos sobre a produção. PIS e COFINS são cumulativos ou não-cumulativos? São tributos sobre a produção ou sobre o consumo? É certo, porém, que são extremamente distorcivos e que inibem o investimento estrangeiro. Um laboratório da tributação indireta Canadá • IVA Federal (GST) – em todas as províncias que não participam do IVA harmonizado • Impostos de vendas provinciais (PST) – British Columbia, Manitoba e Saskatchewan • Nenhum imposto provincial – Alberta e os territórios de Yukon, Nunavut e Northwest Territories • IVA de Quebec (QST) – Quebec • IVA harmonizado (HST) - Newfoundland and Labrador, Nova Scotia, New Brunswick, Ontario e, desde abril de 2013, Prince Edward Island Transferências federais de equalização Um IVA em construção num BRIC Índia e Brasil: Semelhanças • Governo Central indiano tinha: – Um imposto seletivo em cascata. A partir de 2000, CENVAT (= IC →IPI) – ST, sobre três serviços. Foi generalizado e incide agora sobre cerca de 100 serviços (= ISS) – CST, sobre exportações interestaduais, cuja receita pertence aos estados (= IE até década de 30). Alíquota seria anualmente reduzida até a eliminação. • Governos estaduais tinham – imposto de vendas em cascata, substituído em 2005 por IVA cuja base não inclui serviços (IVC → ICMS) Índia: Reforma em Gestação (I) • Início em novembro de 1999: estados decidiram acabar a guerra fiscal e criar o IVA • Foi criado o “Empowered Committee of State Finance Ministers” (= CONFAZ, mas ≠ CONFAZ) com o objetivo de definir as características do IVA e preparar sua introdução • Intenção era adotar o IVA a partir de 2003, mas só foi possível introduzi-lo em 2005 • Compromisso do governo central de compensar eventuais perdas de receita nos três primeiros anos (100%, 75% e 50%) (= seguro-receita) Índia: Reforma em Gestação (II) • IVA foi instituído sem a adesão de oito dos 28 estados. Última adesão em janeiro de 2008 • Sistema de tributação indireta ainda insatisfatório devido à fragmentação da base e à tributação interestadual • Próximo passo: criar o GST, um IVA dual (= PEC 175/95). Proposta era criá-lo a partir de 2010 mas ainda não foi possível completar o acordo • Última reunião do comitê acorreu na semana passada. Conforme relato da imprensa, há poucas discórdias ainda a resolver Reforma tributária na federação A Reforma Tributária é Impossível? • Reforma tributária em qualquer democracia é muito difícil; nas federações mais ainda • Propostas não faltam: Executivo (1995, 2003, 2007), Comissão Especial da Câmara dos Deputados (1999), CAERT/CAE (2010). Mas nenhuma esteve próxima de ser implementada • Canadá e Índia parecem mostrar que a reforma não é impossível, desde que haja cooperação Método para a Reforma • Índia: é possível agir mesmo que haja dissensões temporárias. Se os resultados são bons, os dissidentes se reintegram • Canadá: é possível até mesmo a convivência perpétua de diferentes tributos estaduais desde que haja um sistema de equalização • Talvez: – fatiar seja uma solução, mas fatia implica a existência de um todo que não se vê na atual discussão – abordar conjuntamente tributação e sistema de transferências seja uma solução mas, outra vez, é preciso definir o modelo global Obrigado