TEMA DA AULA: TEORIA DO TIPO ERRO DE TIPO Enoni Gilberto Renan Luiz TIPOS DE ERRO ACIDENTAL Ocorre quando o erro do agente recai sobre circunstâncias acessórias da pessoa ou da coisa, estranhas ao tipo, ou outro dado que se agregue à figura típica. Sem ele, o crime não deixa de existir; Não afasta o dolo, ou o dolo e a culpa simultaneamente, uma vez que o agente tem consciência da antijuridicidade dos seus atos, enganando-se apenas quanto a um elemento não essencial do fato, ou erra na sua execução. Erro sobre o objeto (error in objecto) Quando a conduta do agente, por erro, recai sobre “coisa” diversa daquela representada por ele. Ex: Um ladrão age com a consciência da ilicitude dos seus atos (animus furandi=intenção de furtar), ao pegar para si um relógio falsificado, supondo-o verdadeiro. O erro se deu quanto ao valor atribuído ao bem e ele responde pelo crime de furto, normalmente. Erro sobre a pessoa (error in persona) Art. 20, § 3º, CP Quando o agente vem a atingir uma pessoa diversa daquela que tinha intenção de ofender por haver errado sobre a identidade da pessoa, trocado uma pessoa por outra; EX: quis matar o filho e acabou matando o vizinho, o pai responderá como se matara seu descendente, ou seja, para efeito de aplicação de pena não se consideram as condições ou qualidade da vítima real, senão as da pessoa contra quem o agente queria praticar o crime. Aberratio ictus - erro inabilidade erro na execução - Art. 73, CP Quando, por acidente ou erro no uso dos meios de execução, o agente, ao invés de atingir a pessoa que se pretendia ofender, atinge pessoa diversa. Aplica-se a regra do art. 20, §3º, CP, respondendo como se atingira a vítima que se pretendia ofender; Caso ele tenha, além de acertado em um terceiro, também atingido quem ele realmente desejava, responderá como concurso formal de crimes, art. 70, CP, (homicídio+homicídio culposo); OBS: erro in persona surge no momento da formação da vontade e nisso distingue da aberratio ictus, que surge no momento da execução da vontade. Aberratio criminis ou delicti resultado diverso do pretendido - art. 74, CP Excetuando-se os casos do art. 73, ocorrerá aberratio criminis quando, por erro ou acidente na execução do crime, sobrevier resultado diverso do pretendido; O agente responderá por culpa se o fato for previsto como crime culposo; se ocorrer o resultado almejado, aplicar-se-á a regra do concurso formal de crimes. O erro deverá incidir de coisa para a pessoa. Ex.: Uma pessoa que, desejando destruir uma vitrine, arremessa uma pedra que acaba atingindo uma pessoa, puramente por erro. Responderá por crime culposo de lesão corporal, não sendo apenado pela tentativa de dano. Aberratio causae Aqui há um erro acidental com relação ao nexo causal. O agente acaba por alcançar o resultado pretendido, porém, por uma causa distinta daquela que havia planejado; Ex: pretendendo matar B por afogamento, A o atira da terceira ponte, porém este acaba batendo com a cabeça numa das pilastras de sustentação, e morre de traumatismo craniano. Ex: depois de estrangular a vítima, o autor, crendo que ela está morta, enforca-a para simular um suicídio; todavia, fica comprovado que a vítima na verdade morreu em razão do enforcamento. Responde por um só homicídio doloso consumado. ERRO DETERMINADO POR TERCEIRO Art. 20, § 2º, CP É a hipótese de o agente ter atuado por erro em virtude de provocação (ou determinação) de terceiro. Pode ser espontâneo ou provocado. O “provocado” pode ser por determinação dolosa ou culposa; A dolosa se dá quando o agente conscientemente induz outra pessoa a erro; A culposa, por sua vez, se dá quando o agente, por culpa, leva outra pessoa a erro; O “espontâneo” é o erro cometido pelo terceiro inocente. O sujeito incide em erro sem a participação provocadora do terceiro. ERRO DE TIPO SOB A ÓTICA DA TEORIA NORMATIVA PURA DA CULPABILIDADE TEORIA NORMATIVA PURA DA CULPABILIDADE A teoria normativa pura da culpabilidade nasceu com a teoria finalista da ação na década de 30, que teve como precursor o Hans Welzel; A concepção finalista mantém a pretensão punitiva do Estado pelo conceito analítico tripartido do delito como: ação típica, antijurídica e culpável. Contudo, alteram-se os requisitos de cada uma dessas fases de valoração do crime; Nesta teoria, toda conduta humana vem impregnada de finalidade, pelo poder de previsibilidade do homem, de maneira que o dolo veio a ser conduzido para a ação típica; TEORIA NORMATIVA PURA DA CULPABILIDADE (continuação) Na teoria finalista da ação o dolo e a culpa deixam de ser elementos ou requisitos da culpabilidade para integrarem o fato típico; passam a fazer parte do núcleo do tipo e não mais da culpabilidade; Quanto ao dolo deve-se observar que ele passa a ser concebido como “dolo natural” (estado de consciência + vontade), mas sem a consciência da ilicitude; Desta maneira, a teoria normativa da culpabilidade deixa, na culpabilidade, um juízo puro, isto é, puramente valorativo ou normativo com caráter de reprovabilidade, que está na cabeça do juiz e recai sobre o autor do injusto penal, excluída de qualquer dado psicológico; TEORIA NORMATIVA PURA DA CULPABILIDADE (continuação) O dolo, que é psicológico, é afastado do âmbito da culpabilidade e passa a compor o tipo subjetivo dos delitos dolosos; a vontade é o núcleo do injusto pessoal do agir; Para se adequar as exigências normativas puras do finalismo, a consciência da ilicitude não aparece como dado subjetivo (consciência atual da ilicitude), mas sim, como dado normativo (potencial consciência do injusto); A consciência da ilicitude separou-se do dolo e se encontra, agora, na culpabilidade, reduzindo o conceito desta a uma análise valorativa do dolo; Welzel define os requisitos para a culpabilidade: 1) imputabilidade; 2) possibilidade de conhecimento do injusto; 3) exigibilidade de conduta conforme o direito. O ERRO NAS DESCRIMINANTES PUTATIVAS A partir dessa nova concepção de crime, o tratamento do erro nas descriminantes putativas fez surgir duas teorias da culpabilidade: a extremada ou estrita e a limitada; Putativo é o imaginário, hipotético. Nas descriminantes putativas, o agente atua com vontade e consciência do que faz (o dolo do tipo, o natural), mas se achando legitimado a agir por estar amparado por uma excludente de ilicitude que, na realidade, não existe; As excludentes de ilicitudes são: o estado de necessidade; a legitima defesa; o exercício regular do direito; estrito cumprimento do dever legal; O ERRO NAS DESCRIMINANTES PUTATIVAS (continuação) Há três hipóteses de erro nas descriminantes putativas: 1) erro sobre a existência de uma causa de exclusão de ilicitude (não reconhecida pelo ordenamento jurídico); 2) erro sobre os limites de uma causa de exclusão de ilicitude reconhecida pelo ordenamento jurídico; 3) erro sobre situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. As duas primeiras modalidades de erro são denominadas de erro de permissão e integram o erro de proibição indireto. A terceira modalidade é denominada de erro de tipo permissivo. O ERRO NAS DESCRIMINANTES PUTATIVAS (continuação) Nas descriminantes putativas o agente sabe perfeitamente o que faz; o que acontece, de peculiar, é que o agente age convicto ou na crença de que está fazendo algo excepcionalmente permitido pelo Direito. Ele pensa que está agindo de acordo com o direito. Não há nenhum erro do agente sobre os elementos objetivos do tipo incriminador; Tanto na teoria extremada como na teoria limitada da culpabilidade, a consciência da ilicitude não integra o dolo do tipo (teorias do dolo), mas sim como requisito autônomo da culpabilidade. O ERRO NAS DESCRIMINANTES PUTATIVAS (continuação) A teoria estrita ou extremada da culpabilidade vê todo erro sobre uma causa de justificação como erro de proibição; É impossível, de acordo com a teoria extremada da culpabilidade, a condenação do agente por crime culposo, uma vez o agente, mesmo podendo agir de modo diverso, formou sua vontade em desacordo com o ordenamento jurídico; O objeto do juízo de culpabilidade é, portanto, o poder agir de outro modo. Considera-se, aqui, com extremado rigor, o potencial conhecimento da ilicitude e o dever de observar as justificantes; O ERRO NAS DESCRIMINANTES PUTATIVAS (continuação) Ocorre que no erro sobre a situação de fato, o autor seria fiel ao direito, querendo observar a lei, cujas exigências só não cumpre por desconhecer a realidade. Ele acaba agindo sem consciência da ilicitude. Coisa diversa sucederia na hipótese de erro de valoração pelo qual o autor considera seu procedimento como justo, por uma representação viciosa no âmbito do dever jurídico. Neste caso, estaria ele em proximidade muito maior de conhecer a infração do direito, merecendo, portanto, a pena corresponde ao atuar doloso, que só poderia ser atenuada; Se o erro, nas circunstâncias, anula o elemento intelectual do dolo (não há consciência da ilicitude), excluirá certamente o dolo e, então, se classifica como erro de tipo (erro sobre o elemento do tipo); se, entretanto, o erro, em certas circunstâncias, anula apenas a consciência potencial da ilicitude, classificando-se então como erro de proibição (erro sobre a ilicitude do fato), pois o elemento normativo consciência potencial da ilicitude faz parte da culpabilidade; O ERRO NAS DESCRIMINANTES PUTATIVAS (continuação) Desta feita, a teoria limitada faz a distinção entre o erro que recai sobre uma situação de fato (erro de tipo permissivo) e o erro do agente que recai sobre a existência ou limites jurídicos de uma causa de justificação (erro de permissão): o primeiro é equiparado ao erro de tipo, com efeito de excluir o dolo, enquanto os dois últimos são tratados como erro de proibição, só excludente ou atenuante da culpabilidade; As três hipóteses de erro nas descriminantes putativas são tratadas pela teoria extrema da culpabilidade como hipóteses de erro de proibição: se o erro for inevitável, exclui a culpabilidade totalmente e, de outro lado, se evitável, permanece a responsabilidade pelo crime doloso, podendo o juiz reduzir a pena do crime doloso de um sexto a um terço (CP, art. 21, parte final); O ERRO NAS DESCRIMINANTES PUTATIVAS (continuação) A teoria limitada da culpabilidade, diferentemente, faz uma distinção e, em parte, trata de modo diverso o erro: se ele recai sobre a existência ou limites jurídicos da descriminante, configura-se erro de proibição indireto; de outro lado, se recai sobre situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima, ele é equiparado ao verdadeiro erro de tipo, com a conseqüência de excluir o dolo (e assim a punição do agente por crime doloso), só restando a possibilidade eventual de punição por crime culposo (no erro evitável). Porque, novamente, ele acha-se em cumprimento do dever jurídico; No erro de tipo permissivo, o agente equivoca-se sobre a realidade fática ou típica de uma causa justificante e, assim, atuando equivocadamente, supõe estar agindo licitamente, conforme o Direito, quando, na verdade, sua conduta é ilícita; O ERRO NAS DESCRIMINANTES PUTATIVAS (continuação) Já no erro de permissão o agente possui total e inequívoco conhecimento do mundo exterior, mas mesmo assim incide em erro a respeito da ilicitude de sua conduta, isto é, imagina-a lícita ao supor uma causa justificante a ampararlhe, quando na verdade, sua conduta é ilícita; A distinção prática entre o erro de proibição indireto e o erro de tipo permissivo reside na consideração do erro vencível: o primeiro implica a punição do agente pela sanção do crime doloso com a possibilidade de se reduzir a pena, enquanto o segundo implica a punição do agente pela sanção do crime culposo (negligência), se previsto em lei;