J Pediatr. 2012 Sep;161(3):417-421.e1. Anemia, Apnéia da Prematuridade e Transfusão Sanguínea Ciglinda Martins Gomes Lino Helyda Crystina Rodrigues Dias Kate Lívia Alves Lima Coordenação: Dr. Paulo R. Margotto www.paulomargotto.com.br Brasília, 5 de outubro de 2012 - A etiologia da apnéia da prematuridade é multifatorial. No entanto, a diminuição da capacidade de carrear oxigênio pode ter importante1-4. A rede neuronal respiratória em neonatos é imatura, particularmente nos prematuros, como demonstrado pela sua resposta paradoxal à hipoxemia: Recém-nascidos tem um breve aumento na ventilação seguido de respiração intermitente, depressão respiratória, e, ocasionalmente, a cessação do esforço respiratório.5 Resposta paradoxal à hipoxemia: pode ser agravada por anemia em recém-nascidos prematuros. Uma diminuição na capacidade de carreamento de oxigênio pode resultar na redução da distribuição de oxigênio para o sistema nervoso central, diminuição da rede neuronal respiratória eferente e aumento da apnéia.6 - - Estudos realizados ao longo dos últimos 30 anos têm analisado a associação entre anemia e apnéia bradicárdica no recém-nascido: Alguns não mostraram diminuição na frequência de episódios de apnéia após transfusões; 7-9 Outros sugeriram que a expansão do volume desempenha um papel mais importante do que a capacidade de transporte de oxigênio. 1 Bebês que recebem mais transfusões de concentrado de hemácias (CH) tem significativamente apnéias menos frequentes, menos episódios que exigem estimulação tátil, e menos episódios que exigem ventilação com pressão positiva. 10 Bebês do grupo de transfusão restritiva tiveram uma diminuição na freqüência de apneia após a transfusão de CH. 10 ↓ Estudos com estas considerações dão suporte aos achados de que as transfusões diminuem significativamente a taxa de apnea. 2-4 A transfusão de concentrado de hemácias (CH) é uma prática relativamente comum em recémnascidos com anemia associada a apnéia e bradicardia, mas a literatura é limitada e dividida sobre o impacto das transfusões de sangue no número de eventos. Este estudo examinou esta questão em um conjunto significativo de dados dos monitores do leito em gráficos de onda e dos sinais vitais. Propósito do presente estudo: Comparar a freqüência e a gravidade dos eventos de apnéia em RN muito baixo peso (RNMBP) antes e depois de transfusões de sangue, utilizando a análise eletrônica contínua em gráfico de onda. A análise de gráficos de onda dos pacientes e a abstração de dados de prontuários foram aprovadas pelo Conselho de Revisão Institucional da Universidade de Virginia e classificados como isentos de exigir o consentimento. Os indivíduos foram não-identificados após a extração de dados demográficos e de transfusão dos gráficos. Inclusão: Todos os recém-nascidos com peso de nascimento ≤ 1500g admitidos na unidade de terapia intensiva neonatal ou unidade de cuidados intermediários da Universidade da Virgínia após 23 de janeiro de 2009, e que receberam alta até 24 de junho de 2011, e não cumpriram os critérios de exclusão foram candidatos para o estudo. Duas coortes foram examinadas: - Na primeira coorte, as crianças que não receberam uma transfusão durante a admissão foram excluídas. A análise dos dados se limitou a períodos de seis dias, 3 dias antes e depois da transfusão de sangue. Duas coortes foram examinadas: - Para a segunda coorte, valores de hematócrito de todos os RN de muito baixo peso (RNMBP) admitidos durante o período foram recuperados a partir do repositório de dados clínicos hospitalares e a análise de dados se restringiu a 12 horas a contar do momento da coleta de sangue. Para ambos os grupos, a análise de dados do gráfico de onda e laboratorial foi restrita a períodos de tempo durante o qual as crianças respiravam espontaneamente, seja em ar ambiente, com oxigênio suplementar, cânula nasal, ou com pressão positiva contínua nas vias, mas sem ventilação mecânica. O eletrocardiograma em 3 derivações, o pneumograma de impedância torácica e a oximetria de pulso, derivados de dados do leito e dos sinais vitais, foram coletados continuamente usando o BedMaster (Excel Medical, Jupiter, Florida) e armazenados em uma grade computacional personalizada. Usou-se uma interface personalizada para o desenvolvimento, teste e implementação de algoritmos matemáticos para análise dos eventos de apnéia. Para identificar eventos de apnéia central, foi desenvolvido um sistema para a filtragem eletrônica do pneumograma de impedância dos gráficos de onda para eliminar ruídos de baixa freqüência e a atividade cardíaca. 11 ↓ Esta técnica remove o componente cardíaco relacionado à impedância torácica e estima a probabilidade de apnéia com base em registros de dos casos clínicos conferidos. Os algoritmos foram validados clinicamente e têm > de 90% de acordo com o julgamento de clínicos experientes. Apnéias começando dentro de ~50 segundos (ou terminando dentro de ~25 segundos), bradicardia (frequência cardíaca < de 100 batimentos por minuto) e dessaturação de oxigênio (SpO2 <80%) foram definidas como clinicamente significativos e rotuladas como "apnea-bradycardia-dessaturacion-nn“, significando apnéia central com bradicardia e dessaturação, em que a apnéia central tem duração de nn segundos. O processo de validação foi restrito a apnéias de > 10 segundos e o pequeno número de episódios de apnéiabradicardia-dessaturação com duração > 60 segundos foram raros e, muitas vezes, acompanhados de medidas de ressuscitação. Para os fins deste estudo, restringiu-se a análise a estes extremos. Quaisquer apnéias ocorridas dentro de 5 minutos de outra apnéia foram contadas como um evento único para reduzir a possibilidade de contagens excessivas de múltiplos eventos que possam ocorrer durante os períodos de intervenções de enfermagem. A figura 1 mostra um exemplo de uma apneía-bradicardia dessaturação-30 detectada com o sinal do pneumograma de impedância e a probabilidade de apnéia. Sexo, peso ao nascer, idade gestacional, raça ou grupo étnico da mãe, os nascimentos múltiplos, e tempo de várias formas de suporte respiratório foram extraídos do registro médico do paciente. O tempo de administração de cada hemotransfusão foi extraído a partir de folhas de transfusão dentro dos gráficos à beira do leito. Relatórios de enfermagem de eventos de apnéia foram extraídos de uma "ficha de apnéia " separada, que foi mantida na beira do leito de cada paciente. Os gráficos de onda foram analisados por um total de 6 dias: 3 dias antes e 3 dias após a transfusão de concentrado de hemácias para todos os RNMBP. Foram incluídas apenas as transfusões para as quais houve um mínimo de 95% dos dados legíveis durante as 24 horas antes e depois do início da transfusão. As taxas médias por dia de apnéias identificadas pelo computador para as 12 horas anteriores e posteriores de uma transfusão foram calculados a cada 15 minutos e classificados em apnéias de > 10, > 20 e > 30 segundos de duração. Diferenças nas taxas de apnéia por dia antes (8 horas antes do início da transfusão até 4 horas após o início), e após a transfusão (definidos como 4 a 16 horas após o seu início), foram comparadas usando um teste de ranqueamento Para testar a significância da associação da idade pós-concepcional (IGPC), hematócrito, e probabilidade de apnéia seguinte ao tempo de determinação do hematócrito, utilizou-se regressão logística bivariada ajustada para medidas repetidas. 12 Foram obtidos 1463 valores laboratoriais de hematócrito do Clinical Data Repository para RNMBP sem ventilação durante períodos de tempo de monitoramento completo do evento de ABD (apnéia-bradicardia-dessaturação). Para cada valor de hematócrito, foram calculadas estimativas das probabilidades, utilizando todos os casos em que os valores estavam dentro de 5 unidades de hematócrito, e foram calculados grandes amostras de intervalos de confiança de 95% para essas proporções estimadas. Trezentos e vinte e três RNMBP receberam alta durante o período de estudo. 67 crianças receberam 110 transfusões de sangue enquanto não estavam em ventilação mecânica. A tabela I mostram dados demográficos A tabela II os eventos apneicos identificados pelo computador >10,>20 e >30 segundos As transfusões de sangue foram seguidas por uma redução estatisticamente significativa do número de apnéia-bradicardia-dessaturação detectados pelo computador para apnéias de 10, 20, e 30 segundos (figura 2) Os registros de enfermagem relataram menos de metade, mesmo nos eventos de apnéia mais longas documentados pelo computador antes e depois das transfusões de concentrado de hemácias (tabela II) A probabilidade de apnéia nas 12 horas seguintes, com duração > 10 segundos e associados a bradicardia e dessaturação, diminuiu com o aumento do hematócrito, mesmo quando ajustados para a IGPC por estratificação de grupos de > 32 ou <32 semanas (figura 3) A principal limitação do presente trabalho é que todas as transfusões foram consideradas em conjunto, sem distinguir perda de sangue aguda de crônica, considerar a possibilidade de coexistência de doenças ou avaliar a razão para a transfusão. As principais vantagens deste trabalho são o tamanho do conjunto de dados e a detecção automática de apnéia. Utilizando um algoritmo de computador para detectar a apnéia-bradicardia-dessaturação, mostrou-se que a hemotransfusão diminuiu a freqüência de eventos de apnéia em RNMBP respirando espontaneamente e que a probabilidade de apnéia é inversamente proporcional ao hematócrito mesmo após ter em conta a IGPC no momento em que o hematócrito foi obtido. Identificou-se uma relação estatística de transfusões de sangue e uma diminuição na frequência de eventos de apnéia central em RNMBP. O efeito é estatisticamente significativo em apnéias de todas as durações e parece ser mais pronunciado nas apnéias mais comuns, as de curta duração. Nos últimos 30 anos, os estudos tem mostrado uma a associação conflitante entre apnéia e transfusão. Muitos destes estudos se basearam nos relatods de enfermagem (estes relatos subestimam a ocorrência de apnéia) Note-se que mesmo as apnéias > 10 segundos são geralmente consideradas patológicas, quando acompanhada de bradicardia e/ou dessaturação17; A definição deste estudo exigiu que ambos os critérios estivessem presente, assim reforçando ainda mais a validade da relação observada. Não foi possível avaliar a influência das transfusões em apnéias obstrutivas, pois o detector de apnéia foi limitado pela disponibilidade de sinais existentes de monitores do leito, que não têm uma avaliação do fluxo de ar (variável necessária para distinguir apnéia central de eventos resultantes de dessaturação e bradicardia de obstrução das vias aéreas). Há a hipótese de que a diminuição da capacidade de transporte de oxigênio observada na anemia pode resultar na entrega de oxigênio diminuída para o sistema nervoso central, resultando em apnéia como um reflexo paradoxal da curva de resposta hipóxica. Estudo realizado por Bifano et al1 sugere que a frequência reduzida de apnéia observada após uma transfusão de sangue pode ser secundário a expansão de volume, ao invés de aumentar a capacidade de carga do oxigênio. Demonstrou-se ainda que a probabilidade de apnéia futura está inversamente relacionada com hematócrito no RNMBP (que fornece evidência adicional de que a diminuição da capacidade de transportar oxigênio, em vez de volume isoladamente, podem desempenhar um papel significativo em apnéia da prematuridade). O benefício da transfusão deve ser equilibrado com os riscos associados, incluindo infecção, hipercalemia, sobrecarga de volume e supressão de eritropoietina endógena. Além disso, um artigo recente de Paul e cols.18 sugere uma associação entre transfusão de concentrado de hemácias e um risco aumentado de enterocolite necrosante. Não foi possível determinar a indicação para a transfusão de sangue nesta revisão retrospectiva da documentação clínica. Na instituição onde se realizou este estudo, a decisão de pedir uma transfusão de sangue para uma criança não é determinada por um protocolo prescrito. Conclui-se que há uma correlação entre as transfusões e uma diminuição na freqüência de apnéia, e que a probabilidade de apneia futura é inversamente proporcional com o hematócrito. ABSTRACT REFERÊNCIAS Dr. Paulo R. Margotto, Dda. Ciglinda M.G. Lino, Dda. Helyda C.R. Dias, Dda. Kate L.A. Lima