CONSELHO DA JUSTIÇA FEDERAL
JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS
TURMA DE UNIFORMIZAÇÃO DAS DECISÕES DAS
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS
Pedido de Uniformização n° 2002.60.84.000047-5
Requerente:
Instituto Nacional do Seguro Social
Advogado(a):
Augusto Dias Diniz
Requerido(a):
Afonso Ramires Goes
Advogado(a):
Maíra Santos Abrão
Relator(a):
Juíza Federal Vivian Josete Pantaleão Caminha
Origem:
Seção Judiciária do Estado do Mato Grosso do Sul
RELATÓRIO
Trata-se de pedido de uniformização de interpretação de lei federal,
formulado pelo Instituto Nacional do Seguro Social, em face de decisão proferida pela Turma
Recursal dos Juizados Especiais Federais da Seção Judiciária do Estado do Mato Grosso do
Sul, que determinou a averbação do período de 01.01.1945 a 31.12.1965 em que o autor
laborou como rurícola, bem como a expedição de certidão de tempo de serviço,
independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias.
Sustenta, a autarquia previdenciária, que, ao admitir o cômputo do
tempo de serviço rural prestado pelo autor antes da edição da Lei nº 8.213/91, sem o
respectivo aporte financeiro (contribuições), a Turma Recursal inobservou o disposto no
artigo 96, inciso IV, da Lei nº 8.213/91, e no artigo 202, § 2º, da Constituição Federal, dandolhes interpretação divergente da que fora adotada pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça.
Argumenta que a circunstância de o autor ser, atualmente, servidor
público estadual, vinculado a regime próprio de previdência, evidencia a intenção de
aproveitar o tempo de serviço sub judice, para fins de contagem recíproca, sem o ônus da
contrapartida financeira, o que contraria a legislação de regência.
Aponta como paradigma a decisão resultante do julgamento do
Recurso Especial nº 409.563/RS (rel. Min. Fernando Gonçalves, 6ª Turma, j. em 03.06.2002,
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DJU de 24.06.2002), citando ainda os precedentes oriundos do Recurso Ordinário em
Mandado de Segurança nº 11.583/SC (rel. Min. Félix Fischer, 5ª Turma, DJU de 29.05.2000,
p. 168) e do Recurso Especial nº 202.580/RS (rel. Min. Gilson Dipp, 5ª Turma, DJU de
15.05.2000, p. 180).
Entende demonstrada a existência de contrariedade autorizadora da
interposição de incidente de uniformização, nos termos do art. 14, § 2º, da Lei nº 10.259, e
pede seja conhecido e provido o recurso, com a reforma da decisão recorrida. Junta cópia do
primeiro precedente citado.
O INSS interpõe recurso extraordinário, inadmitido pelo Presidente da
Turma Recursal, que limita-se a receber o pedido de uniformização endereçado a este
Colegiado.
Com contra-razões, vêm os autos.
É o sucinto relatório. Peço dia.
Vivian Josete Pantaleão Caminha
Relatora
Pedido de Uniformização n° 2002.60.84.000047-5
Requerente:
Instituto Nacional do Seguro Social
Advogado(a):
Augusto Dias Diniz
Requerido(a):
Afonso Ramires Goes
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Advogado(a):
Relator(a):
Origem:
Maíra Santos Abrão
Juíza Federal Vivian Josete Pantaleão Caminha
Seção Judiciária do Estado do Mato Grosso do Sul
VOTO
I - Insurge-se o Instituto Nacional Seguro Social contra decisão
proferida pela Turma Recursal da Seção Judiciária do Estado do Mato Grosso do Sul que
determinou a averbação do período de 01.01.1945 a 31.12.1965 em que o autor laborou como
rurícola, com a expedição de certidão de tempo de serviço, independentemente do pagamento
das respectivas contribuições previdenciárias, por se tratar de tempo de serviço prestado antes
da edição da Lei nº 8.213, de 1991, e ter se operado em relação aos valores em causa a
prescrição.
Argumenta, a autarquia previdenciária, que o julgado destoa da
jurisprudência dominante do Egrégio Superior Tribunal de Justiça acerca da matéria, a qual
exige para o cômputo de tempo de serviço rural a correspondente contrapartida financeira.
O confronto analítico entre a decisão impugnada e os paradigmas
invocados pelo recorrente permite inferir a configuração de divergência jurisprudencial apta a
gerar incidente de uniformização. A despeito de serem semelhantes as situações fáticas e a
questão jurídica debatida, há dissonância entre as soluções jurídicas adotadas nos julgados. A
Turma Recursal da Seção Judiciária do Mato Grosso do Sul reconheceu que o autor faz jus ao
cômputo do tempo de serviço rural anterior à Lei nº 8.213, para fins de inativação, sem lhe
impor o respectivo ônus financeiro. Nos precedentes citados pelo recorrente, o Superior
Tribunal de Justiça assentou o entendimento de que o tempo de serviço rural anterior à
referida Lei pode ser utilizado para fins de contagem recíproca, desde que o trabalhador efetue
o recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias.
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Comprovada a existência de dissídio pretoriano, no que tange à
interpretação do art. 96, inciso IV, da Lei nº 8.213, é de ser admitido o pedido de
uniformização, na forma do artigo 14, § 2º, da Lei nº 10.259, de 2001.
II - Adentrando na análise os fundamentos do incidente, inicialmente
impede reconhecer que a certificação do tempo de serviço prestado constitui direito
constitucional do trabalhador, cujo exercício não é passível de condicionamentos (art. 5º,
XXXIV, b, da CF), haja vista que a certidão refere-se a fato ocorrido, e não aos efeitos
jurídicos que produz (ou à valoração destes), os quais não são certificáveis, já que previstos
em
lei,
“comportando
demonstração
interpretativa.”
(TRF4ªR,
2ª
Seção,
EIAC
nº
1999.04.01.137993-1/RS, rel. Desembargador Federal Teori Albino Zavascki, DJ 06.12.2000, p. 228).
Na hipótese sub judice, entretanto, a situação fática delineada nos
autos evidencia que a pretensão posta em causa transcende a mera certificação do tempo de
serviço laborado no meio rural. O autor almeja não só o reconhecimento do direito de
computar o tempo de serviço rural prestado no período de 01.01.1945 a 31.12.1965, para fins
de inativação, como também a inexigibilidade das respectivas contribuições previdenciárias
(fls. 5 e 49). Conquanto não especifique na inicial a finalidade da averbação por ele
pretendida, a sua atual condição de servidor público estadual denota a intenção de somar ao
tempo de serviço público o período laborado no meio rural (contagem recíproca), o que, aliás,
não é negado em momento algum. E, ao impugnar a exigência da contrapartida financeira
imposta pela autarquia previdenciária, o autor suscita questão que desborda do tema relativo
ao direito à certidão, inserindo no âmbito da presente lide discussão que envolve a
interpretação da norma constitucional que dispõe sobre a contagem recíproca do tempo de
contribuição na administração pública e privada.
A análise a ser empreendida por esta Turma há que cingir-se à
exigibilidade, ou não, das contribuições previdenciárias correspondentes ao período a ser
averbado pelo autor -, extrapolando os limites deste incidente a questão atinente ao tempo de
serviço em si, seja por envolver matéria fática (art. 14 da Lei nº 10.259), seja não ter sido
devolvida especificamente a este Colegiado através do pedido de uniformização. Não há
dúvida de que o exercício de atividade rural deve ser comprovado perante o Instituto Nacional
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do Seguro Social, por se tratar de atividade de natureza privada vinculada ao Regime Geral da
Previdência Social, ainda que para fins de averbação do tempo de serviço junto a órgão
público. O reconhecimento de vínculo jurídico com a Previdência Social, na condição de
segurado especial, pressupõe início de prova material do labor agrícola (art. 55, § 3º, da Lei nº
8.213), insuprimível pela prova exclusivamente testemunhal (súmula nº 149 do STJ), pois a
relevância da prova documental é realçada pelo próprio legislador, que, sem instituir um
sistema de tarifação de provas, de valoração pré-estabelecida, invasivo, portanto, da seara
reservada à atividade do juiz na formação de sua convicção acerca dos fundamentos de fato e
de direito, elege os meios idôneos à perfeita elucidação do fato, dada sua especificidade.
Contudo, não nos é dado, nesta fase recursal, reexaminar a matéria fática objeto da lide
(incluída a questão da suficiência ou não das provas produzidas), restando-nos enfrentar tema
específico - a exigibilidade das contribuições previdenciárias correspondentes ao período a ser
averbado sob a forma indenizada.
Outro aspecto importante a salientar é o que pertine às disposições
legais que regem o cômputo do tempo de serviço laborado no meio rural. Os artigos 39, 55, §
2º, 96, IV, e 143, todos da Lei nº 8.213, devem ser interpretados sistematicamente. Da leitura
conjugada desses dispositivos ressalta evidente que o segurado especial trabalhador rural faz
jus aos benefícios de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílioreclusão, de pensão ou de salário-maternidade, no valor de um salário mínimo,
independentemente da comprovação do recolhimento de contribuições previdenciárias, desde
que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período,
imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses
correspondentes à carência. A legislação, portanto, confere direito a benefícios de valor
mínimo àqueles que hajam exercido atividade rural, o que pressupõe a realização de trabalho
típico. Entretanto, se o segurado especial pretender a concessão de outros não elencados no
inciso I do art. 39, deverá contribuir facultativamente para a Previdência Social, sem prejuízo
da contribuição a que se refere o art. 195, § 8º, da Constituição Federal (incidente sobre o
resultado da comercialização da produção).
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Oportuno referir que o tempo de serviço rural anterior à data de início
de vigência da Lei nº 8.213 será computado integralmente, independentemente do
recolhimento das contribuições previdenciárias, exceto para efeito de carência. Não obstante,
o cômputo de tempo de serviço anterior ou posterior à obrigatoriedade da filiação à
Previdência Social, para fins de contagem recíproca, torna exigível o pagamento de
indenização das contribuições correspondentes ao período respectivo, com os acréscimos
moratórios especificados no art. 96, IV.
E não foi sem razão que o legislador estabeleceu tais distinções. A
legislação pretérita não impunha ao rurícola a obrigação de efetuar o recolhimento de
contribuições previdenciárias, posto que vinculado ao regime do Funrural, de conotação
assistencial. Daí a necessidade de estatuir uma regra de “transição” destinada a evitar que,
com as exigências implementadas pela novel legislação, ficassem desamparados aqueles que
vinham seguindo as normas até então vigentes. E, para compreender-se a lógica que inspirou
o legislador, basta ter presente que os trabalhadores rurais não eram, até a edição da Lei nº
8.213/91, inseridos em regime previdenciário de caráter contributivo, tendo somente a partir
de então sido disciplinada a regra de igualdade constitucionalmente posta em 1988. Não é por
outro motivo que a mesma lei mantém a exigência de comprovação do cumprimento da
carência stricto sensu para fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição (art.
55, § 2º), enquanto, ao regular a aposentadoria por idade, procede com coerência, tratando
diferentemente essas situações que instrinsecamente não se equivalem.
Em contrapartida, estabelece para a hipótese de vinculação (posterior)
do trabalhador a um regime previdenciário diverso - no caso, estatutário - a exigência de
pagamento de indenização, para o aproveitamento do tempo de serviço privado, em face da
exigência legal e constitucional de compensação financeira na hipótese de contagem recíproca
de tempo de serviço público e privado para fins de aposentadoria. Tal exigência não se impõe
no caso de ser mantida a vinculação com o RGPS pela singela razão de que a Previdência
Social absorveu, por inteiro, o sistema assistencial que anteriormente abrangia os
trabalhadores rurais, o que afasta a obrigação de compensar financeiramente qualquer outro
sistema. A junção do tempo de serviço rural e urbano - ambos decorrentes do exercício de
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atividade privada - não se subordina aos pressupostos estabelecidos pelo art. 202, § 2º, da
Constituição Federal, em sua redação original (compensação financeira e contribuição), e
vincula-se aos princípios da uniformidade e da equivalência entre os benefícios às populações
urbanas e rurais, resultantes do mandamento constante no parágrafo único do artigo 194.
Todo o sistema da Previdência Social está assentado no princípio
atuarial de que deriva a exigência de equilíbrio financeiro entre fontes de custeio e benefícios.
Constitui regra elementar e necessária em matéria de seguridade social que os regimes devem
garantir diretamente a totalidade dos riscos cobertos no plano de benefícios, a que se soma o
imperativo do autofinanciamento do sistema. Isto porque a cada benefício deve corresponder
uma fonte de custeio. Nesse delineamento, nada mais razoável do que a preocupação do
recorrente com os prejuízos financeiros que poderão advir do cômputo do tempo em que o
autor dedicou-se às lides campesinas, para fins de inativação em outro sistema previdenciário,
sem o respectivo lastro financeiro. Conquanto não se possa atribuir à relação custeio-benefício
um caráter individual, pois a Previdência Social atende ao princípio da solidariedade
contributiva (art. 195 da CF), que importa na responsabilidade compartilhada entre o Estado e
a sociedade civil pela manutenção financeira do sistema (todos contribuem para um fundo
comum, com base em cálculos atuariais, e repartem, dessa forma, a responsabilidade pelo
custeio do sistema), restando afastada a modalidade da capitalização (pela qual o indivíduo é
o responsável pessoal pelos aportes de recursos para criação de um fundo próprio de
aposentadoria, que será gerenciado por uma instituição mediante a cobrança de taxa de
administração, e resultará no implemento de uma renda futura substitutiva do salário), não há
dúvida de que o financiamento da Previdência Social tem como sustentáculo a regra da
comutatividade, pela qual garante-se ao trabalhador o direito à aposentadoria, ou pensão aos
seus dependentes, nos casos em que ele contribuiu para diferentes sistemas, impondo-lhes a
compensação financeira segundo critérios estabelecidos em lei (art. 201, § 9º, da CF). Vale
dizer, a contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública e na atividade
privada somente viabiliza-se pelo sistema de compensação financeira, distinguindo-se o
regime previdenciário do de natureza assistencial justamente pelo caráter contributivo
daquele.
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Ao interpretar a norma inserta no parágrafo segundo do artigo 202, da
Constituição Federal (em sua redação original), o Egrégio Supremo Tribunal Federal
reconheceu a impossibilidade de condicionar o direito à contagem recíproca do tempo de
contribuição prestado à iniciativa privada à compensação financeira a cargo da instituição
previdenciária, assinalando a existência de duas regras distintas e independentes no referido
dispositivo constitucional. A norma constitucional garante, especificamente, a contagem
recíproca do tempo de contribuição na administração pública e atividade privada, esta última
urbana ou rural, e não o aproveitamento do simples tempo de serviço (STF, Pleno, ADIMC nº
1.664, rel. Min. Octávio Gallotti, j. 13.11.1997, DJ 19.12.1997, p. 41). “A primeira parte do
dispositivo representa uma norma constitucional completa, bastante em si mesma para
garantir a contagem recíproca. De outro modo, evidenciando a segunda parte do dispositivo,
sobre a compensação financeira entre os diferentes sistemas financeiros, essa sim estaria
pendente de estabelecimento de critérios legais”. “O acerto de contas que deve haver entre os
diversos sistemas de previdência social não interfere na existência do direito
constitucionalmente previsto, que assegura a contagem recíproca, sobretudo para fins de
aposentadoria”. “... a previsão constitucional de um mecanismo legal interprevidenciário de
compensação financeira entre os sistemas elide qualquer razão de ser da exigência de um
mínimo de contribuição do servidor ao sistema que lhe deva pagar a inatividade: o custeio da
aposentadoria há de provir da compensação devida, independentemente do número de
contribuições pagas à entidade que a deva conceder e satisfazer” (STF, Pleno, RE nº
220.821/RS, rel. Min. Maurício Correa, j. 17.2.2000, DJ 19.5.2000, p. 21).
O direito à inativação do trabalhador que, ao longo de sua vida
profissional, vinculou-se a diferentes sistemas de previdência social é assegurado pela
compensação financeira entre tais sistemas - operação que envolve os órgãos públicos
diretamente afetados e tem o efeito de preservar o caráter atuarial e contributivo da
Previdência Social. Na situação especial de reciprocidade, o custeio do benefício provém das
contribuições vertidas à entidade que deve concedê-lo e mantê-lo e da compensação devida.
Esse mecanismo legal interprevidenciário de compensação financeira, entretanto, somente
viabiliza-se pela existência de um lastro financeiro compensável, formado a partir de
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contribuições advindas do segurado. Nesta medida, a exigência de indenização a que se refere
o art. 96, IV, da Lei nº 8.213, a cargo do trabalhador que se beneficiará com a contagem
recíproca, visa a permitir ao INSS cumprir a obrigação de compensar financeiramente o
sistema previdenciário que concederá a aposentadoria, participando do custeio do benefício.
Em se tratando de um sistema contributivo (a que é inerente a expectativa de uma
contrapartida a cargo do órgão previdenciário), nada mais razoável do que atribuir ao
beneficiário da aposentadoria o ônus de prover a autarquia previdenciária, sob a forma
indenizatória, de recursos suficientes para fazer frente à compensação financeira, uma vez que
a reciprocidade garantida pela lei fundamental se dá em relação ao tempo de contribuição, e
não ao tempo de serviço. A previsão constitucional de compensação financeira entre os
sistemas público e privado autoriza a ilação de que, acaso inexistente a indenização, a
Previdência Social sofrerá prejuízo em razão da transferência de recursos para custear parte da
aposentadoria a ser paga ao autor pelo sistema público.
As disposições legais que erigiram restrições ao cômputo do tempo de
serviço do trabalhador rural, anterior à vigência da Lei nº 8.213 (porque só a partir desta se
passou a exigir a contribuição, sendo a fonte de custeio antes imputada ao Funrural) têm sua
razão de ser na regra constitucional da reciprocidade, restrita ao tempo de contribuição na
administração pública e na atividade privada. “... para a contagem recíproca corretamente
dita, isto é, aquela que soma o tempo de serviço público ao de atividade privada, não pode
ser dispensada a prova de contribuição, pouco importando - diante desse explícito requisito
constitucional - que de, contribuir, houvesse sido, no passado, dispensada determinada
categoria profissional, assim limitada, bem ou mal, quanto ao benefício de reciprocidade
pela ressalva estatuída na própria Constituição” (excerto do voto do Min. Octávio Gallotti no
julgamento da ADIn nº 1.664-0).
“PREVIDÊNCIA SOCIAL. Relevância jurídica da impugnação, perante os
artigos 194, parágrafo único, I, 201, caput e § 1º e 202, I, todos da
Constituição, da proibição de acumular a aposentadoria por idade, do
regime geral da previdência, com a de qualquer outro regime (redação
dada, ao art. 48 da Lei nº 8.213-91, pela Medida Provisória mº 1.52313/1997).
Trabalhador rural. Plausibilidade da argüição de inconstitucionalidade da
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exigência de contribuições anteriores ao período em que passou ela a ser
exigível, justificando-se ao primeiro exame essa restrição apenas em
relação à contagem recíproca de tempo de serviço público (artigos 194,
parágrafo único, I e II, e 202, § 2º, da Constituição e redação dada aos
artigos 55, § 2º, 96, IV e 107 da Lei nº 8.213-91, pela Medida Provisória nº
1.523-13-97).
Medida cautelar parcialmente deferida.”
(SYF, Pleno, ADIn nº 1.664-0, rel. Min. Octávio Gallotti, j. 13.11.1997, DJ
19.12.1997)
Diante da exegese atribuída ao artigo 202, § 2º, da Constituição
Federal, pela Suprema Corte, consolidou-se no âmbito do Egrégio Superior Tribunal de
Justiça o entendimento de que o tempo de serviço rural anterior à Lei nº 8.213 pode ser
utilizado, para fins de contagem recíproca, desde que sejam recolhidas as respectivas
contribuições previdenciárias.
“PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. PERÍODO
ANTERIOR À LEI Nº 8.213/91. CONTAGEM RECÍPROCA,
CONTRIBUIÇÕES. RECOLHIMENTO. NECESSIDADE. RECURSO NÃO
CONHECIDO.
1. O Superior Tribunal de Justiça firmou sua jurisprudência no sentido de
que o tempo de serviço rural anterior à Lei nº 8.213/91 pode ser utilizado
para fins de contagem recíproca tão-somente quando recolhidas, à época da
sua realização, as contribuições previdenciárias.
2. Recurso especial não conhecido”
(STJ,5ª Turma, REsp nº 497.143/RS, rel. Min. Laurita Vaz)
“PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. CERTIDÃO DE TEMPO DE
SERVIÇO RURAL. CONTAGEM RECÍPROCA. CONTRIBUIÇÕES.
NECESSIDADE. ART. 96, INCISO IV DA LEI 8.213/91.
Para a emissão de Certidão de Tempo de Serviço, visando a contagem
recíproca de tempo de serviço rural e urbano para fins de aposentadoria,
necessário se torna o recolhimento da contribuição correspondente ao
respectivo período, por expressa imposição legal, nos termos do art. 96,
inciso IV, da Lei 8.213/91.
Recurso conhecido e provido.”
(STJ, 5ª Turma, REsp nº 416.995/RS, rel. Min. Jorge Scartezzini, DJ
03.02.2003)
“RECURSO ESPECIAL. CERTIDÃO DE TEMPO DE SERVIÇO.
CONTAGEM RECÍPROCA. TEMPO RURAL. CONTRIBUIÇÕES.
NECESSIDADE. ART. 96, IV, DA LEI Nº 8.213/91.
1. Em se tratando de certidão de tempo de serviço rural para contagem
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recíproca, deve o interessado colacionar aos autos a prova pré-constituída
das respectivas contribuições. Precedentes.
2. Recurso especial conhecido e provido.”
(STJ, 6ª Turma, REsp nº 409.563/RS, rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ
24.06.2002)
“RECURSO ORDINÁRIO. PREVIDENCIÁRIO. CONTAGEM RECÍPROCA
DE TEMPO DE SERVIÇO. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO
PRESTADO EM ATIVIDADE RURAL PARA FINS DE APOSENTADORIA
NO SERVIÇO PÚBLICO. CONTRIBUIÇÃO. NECESSIDADE.
1.”Para efeito de aposentadoria, é assegurada a contagem recíproca do
tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada,
rural e urbana, hipótese em que os diversos sistemas de previdência social
se compensarão financeiramente, segundo critérios estabelecido em lei”
(artigo 202, parágrafo 2º, da Constituição da República).
2.”(...) para a contagem recíproca corretamente dita, isto é, aquela que
soma o tempo de serviço público ao de atividade privada, não pode ser
dispensada a prova de contribuição, pouco importando - diante desse
explícito requisito constitucional - que de, contribuir, houvesse sido, no
passado, dispensada determinada categoria profissional, assim limitada,
bem ou mal, quanto ao benefício de reciprocidade pela ressalva estatuída na
própria Constituição.” (ADIn nº 1.664/DF, Relator Ministro Octávio
Gallotti, in DJ 19/12/97).
3.A contagem do tempo de serviço prestado na atividade privada, seja ela
urbana ou rural, só pode ser aproveitada para fins de aposentadoria no
serviço público, quando houver prova de contribuição naquele regime
previdenciário, inocorrente, na espécie.
4.Recurso improvido.”
(STJ, 6ª Turma, RMS nº 11.135/SC, rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJ
15/04/2002)
Acresça-se ao até aqui exposto que a lei previdenciária, para admitir o
cômputo do tempo de serviço prestado pelo trabalhador rural, para fins de contagem
recíproca, impõe-lhe uma contraprestação financeira que refoge ao âmbito da relação jurídicotributária que dá origem à obrigação de recolher contribuições previdenciárias (hipótese em
que seria cabível cogitar-se de prescrição tributária), por ostentar natureza ressarcitória. Notese que não se confundem, estando apenas indiretamente relacionadas, as relações tributárias e
previdenciárias. As contribuições são exigidas (dos trabalhadores e seus empregadores) para o
custeio de todo o sistema e não apenas do próprio benefício; a indenização a que se refere o
art. 96, da Lei nº 8.213, para a contagem recíproca de tempo de serviço. Nem se cogite de
efeito retrooperante da lei (que, neste tópico específico, refere-se ao tempo de serviço anterior
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a 1991), pois, antes de sua edição, o autor não tinha direito (adquirido) ao cômputo do período
laborado no meio rural, para fins de aposentadoria no serviço público, sem a correspondente
contribuição previdenciária. A contagem recíproca só é assegurada ao trabalhador mediante
indenização correspondente às contribuições relativas ao período (art. 45, § 3º, da Lei nº
8.212, c/c art. 96, IV, da Lei nº 8.213).
Por tais razões, conheço e dou provimento ao presente incidente para
uniformizar a jurisprudência no sentido de que o tempo de serviço rural anterior à Lei nº
8.213 pode ser utilizado, para fins de contagem recíproca, desde que sejam recolhidas as
respectivas contribuições previdenciárias, de forma indenizada.
É como voto.
Vivian Josete Pantaleão Caminha
Relatora
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CERTIDÃO DE JULGAMENTO
OITAVA SESSÃO ORDINÁRIA DA TURMA DE UNIFORMIZAÇÃO
Presidente da Sessão: Excelentíssimo Senhor Ministro ARI PARGENDLER
Sub-Procurador Geral da República: Dr. Moacir Guimarães Morais Filho
Secretário(a): GLÓRIA LOPES TRINDADE
Relator(a): Excelentíssimo(a) Senhor(a) Juiz(a) Federal VIVIAN CAMINHA
Requerente: INSS
Proc./Adv.: AUGUSTO DIAS DINIZ
Requerido: AFONSO RAMIRES GOES
Proc./Adv.: MAÍRA SANTOS ABRÃO
Remte.: SEÇÃO JUDICIÁRIA DO MATO GROSSO DO SUL
Proc. Nº.: 2002.60.84.000047-5
CERTIDÃO
Certifico que a Egrégia Turma de Uniformização das Decisões das Turmas
Recursais dos Juizados Especiais Federais, ao apreciar o processo em epígrafe, em
sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: “Depois dos votos da
Excelentíssima Juíza Vivian Caminha, admitindo o incidente e lhe dando provimento
para manter a orientação do acórdão paradigma e fazer uma proposta de súmula, no
sentido de que o aproveitamento do tempo de serviço rural para a contagem
recíproca depende de recolhimento de contribuição de forma indenizada, ficando
esta sujeita a uma nova redação, acompanhou os Excelentíssimos Juízes: Vladimir
Carvalho, Janilson Siqueira, Cândido Moraes, Márcia Hoffmann, Guilherme Calmon
e Liliane Roriz, e Ricardo do Valle Pereira. Pediu vistas o Excelentíssimo Juiz
Renato Toniasso. “
Participaram do julgamento, os Srs. Juízes e Sras. Juízas Federais: Dr. Vladimir
Carvalho, Dr. Janilson Siqueira, Dr. Cândido Moraes, Dra. Márcia Hoffmann, Dr.
Guilherme Calmon, Dra. Liliane Roriz, Dr. Ricardo do Valle Pereira e Dr. Renato
Toniasso.
Proferiu sustentação oral pelo Requerente.: MARCELO DE SIQUEIRA FREITAS
Proferiu sustentação oral pelo Requerido.: HOLDEN MACEDO DA SILVA
Brasília, 05 de agosto de 2003.
GLÓRIA LOPES TRINDADE
Secretário(a)
CONSELHO DA JUSTIÇA FEDERAL
JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS
TURMA DE UNIFORMIZAÇÃO DAS DECISÕES DAS
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO
PROCESSO Nº 200260840000475
Requerente : Instituto Nacional do Seguro Social – INSS.
Procurador : Augusto Dias Diniz.
Requerido : Afonso Ramires Goes.
Advogado : Maíra Santos Abrão - DPU.
Relatora
: Juíza Federal Vivian Josete Pantaleão Caminha.
VOTO
Pedi vista dos presentes autos para apurar a questão posta,
mas, diante dos inabaláveis fundamentos expandidos pela eminente Relatora,
sou pelo conhecimento e pelo provimento do incidente da uniformização
interposto pelo requerente.
É como voto.
CONSELHO DA JUSTIÇA FEDERAL
JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS
TURMA DE UNIFORMIZAÇÃO DAS DECISÕES DAS
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
NONA SESSÃO ORDINÁRIA DA TURMA DE UNIFORMIZAÇÃO
Presidente da Sessão: Excelentíssimo Senhor Ministro ARI PARGENDLER
Sub-Procurador Geral da República: Dr. Moacir Guimarães Morais Filho
Secretário(a): GLÓRIA LOPES TRINDADE
Relator(a): Excelentíssimo(a) Senhor(a) Juiz(a) Federal VIVIAN CAMINHA
Requerente: INSS
Proc./Adv.: AUGUSTO DIAS DINIZ
Requerido: AFONSO RAMIRES GOES
Proc./Adv.: MAÍRA SANTOS ABRÃO
Remte.: SEÇÃO JUDICIÁRIA DO MATO GROSSO DO SUL
Proc. Nº.: 2002.60.84.000047-5
CERTIDÃO
Certifico que a Egrégia Turma de Uniformização das Decisões das Turmas Recursais dos
Juizados Especiais Federais, ao apreciar o processo em epígrafe, em sessão realizada
nesta data, proferiu a seguinte decisão: "Prosseguindo do julgamento, a turma por
unanimidade deferiu o pedido de uniformização e lhe deu provimento, nos termos do voto da
Sra. Juíza relatora".
Participaram do julgamento, os Srs. Juízes e Sras. Juízas Federais: Dr. Barros Dias, Dr.
Leomar Amorim, Dra. Liliane Roriz, Dr. Ricardo do Valle Pereira, Dr. Marcelo Mesquita, Dr.
Renato Toniasso, Dra Mônica Sifuentes, Dra. Cláudia Cristófani e Dr. Mauro Luís Rocha
Lopes.
Brasília, 30 de setembro de 2003.
GLÓRIA LOPES TRINDADE
Secretário(a)
CONSELHO DA JUSTIÇA FEDERAL
JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS
TURMA DE UNIFORMIZAÇÃO DAS DECISÕES DAS
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS
Pedido de Uniformização n° 2002.60.84.000047-5
Requerente:
Instituto Nacional do Seguro Social
Advogado(a):
Augusto Dias Diniz
Requerido(a):
Afonso Ramires Goes
Advogado(a):
Maíra Santos Abrão
Relator(a):
Juíza Federal Vivian Josete Pantaleão Caminha
Origem:
Seção Judiciária do Estado do Mato Grosso do Sul
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO COMO
TRABALHADOR
RURAL.
CONTAGEM
RECÍPROCA.
EXIGÊNCIA
DE
RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS.
1. O tempo de serviço rural anterior à Lei nº 8.213 pode ser utilizado,
para fins de contagem recíproca, desde que sejam recolhidas as respectivas contribuições
previdenciárias, de forma indenizada.
2. Pedido conhecido e acolhido.
ACÓRDÃO
Visto e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas,
decide a Turma de Uniformização das Decisões das Turmas Recursais dos Juizados Especiais
Federais, por unanimidade, conhecer e acolher o pedido de uniformização, nos termos do voto
da Relatora. Participaram do julgamento os Juízes Vladimir Souza Carvalho, Cândido Moraes
Pinto Filho, Guilherme Calmon Nogueira da Gama, Liliane do Espírito Santo Roriz de
Almeida, Márcia Hoffmann, Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Renato Toniasso e Janilson
Siqueiro.
Porto Alegre, 5 de agosto de 2003.
Vivian Josete Pantaleão Caminha
Juíza Federal Relatora
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2002.60.84.000047-5