ISSN 2316-624X O Dano estético e os profissionais da saúde. Parte 1 - breves notas sobre a responsabilidade civil The Damage aesthetic and health professionals. Part 1 - brief notes on Civil Liability Prof. Marcio Garcia Lauriano Lemei Docente do CEPROMEC – Curitiba- Paraná – Brasil [email protected] Resumo O presente artigo objetiva o estudo da responsabilidade civil, ramo do direito civil dentro da área de abrangência da ciência jurídica no tocante ao papel dos profissionais de saúde e sua relação com a superveniência de dano estético decorrente dessas atividades. Baseado em pesquisa doutrinária e jurisprudencial Por ser tema de grande importância e repercussão ficou delimitado a caracterização do dano estético pela determinação da responsabilidade civil desde seus aspectos históricos até a sua constituição como teoria. Tratando a seguir dos fundamentos da responsabilidade da determinação de seus pressupostos e de seus excludentes. Em um novo momento buscou-se tratar especificamente das lesões deformantes, estudadas nas áreas do direito que se projetam. Para então derradeiramente tratar do dano estético propriamente dito caracterizando e relacionando-o com a pessoa da vitima. Palavras Chave: Dano Estético, Responsabilidade Civil, Profissionais da Saude. Abstract This article aims to study the liability branch of civil law within the coverage area of legal science regarding the role of health professionals and their relationship with the occurrence of aesthetic damage caused by such activities. Based on research doctrinal and jurisprudential Being a subject of great importance and repercussion was defined to characterize the aesthetic damage by determining the liability from its historical aspects until its incorporation as a theory. Since then the foundations of responsibility of determining their assumptions and their exclusive. In a new moment we sought to specifically address the severe deformation, studied in the areas of law that project. To then ultimately address the aesthetic damage itself characterizing and relating it to the person of the victim. Keywords: Aesthetic Damage, Liability, Healthcare Professionals. 1. INTRODUÇÃO A responsabilidade civil é um dos temas mais importantes da atualidade devido a o fato de envolver uma série de situações encontrados nos mais variáveis tipos de ações, desde família, trânsito, também na esfera trabalhista e eminentemente na seara civil. Na responsabilidade civil sempre haverá uma violação de direito. Essa violação traduz-se na figura do dano. A responsabilidade civil tem uma função eminentemente 2 social, por tratar-se de um direito social, ou seja, um direito de personalidade e a indenização têm uma característica dualista (reparação e compensação)ii. A responsabilidade civil caracteriza-se pela presença de três pressupostos: Dano, Culpa e Nexo de Causalidade. Culpa é diferente de ato ilícito, pois no primeiro há uma nítida contrariedade a um dispositivo legal e na culpa há uma evidente falta de conduta necessária em face aquela situação. A culpabilidade vem amparada em três elementos: Negligência, Imprudência e Imperícia. A negligência é a desídia, o ocaso, a omissão ao dever de conduta ante uma situação; a imprudência se pode entender como uma impetuosidade, uma afoitez e a imperícia pode ser traduzida na falta da habilidade técnica/científica essencial para a realização de determinado ato. A indenização decorrente de danos estéticos vem a cada dia tomando maior espaço nos tribunais. A composição de dano em uma visão bastante simplista pode-se resumir em uma diminuição patrimonial, podendo ser no aspecto moral, como também no campo material, ou em ambos. Mas sempre se deve ter a previsão de que, para serem responsabilizados por atos ilícitos, é necessário a demonstração de culpa. Estudar o Dano Estético a luz da responsabilidade civil vem, em um primeiro momento, a disposição de inicialmente traçar uma linha histórica do surgimento da responsabilidade civil, para então iniciar seu estudo propriamente dito,.conceituar Dano Estético e relacioná-lo com o dano moral e material. Há também a necessidade de abordar os princípios gerais da responsabilidade civil, analisando sua configuração e também seus elementos: culpa nexo de causalidade e o dano; bem como a importante relação da imputabilidade, que decorrerá nas situações em que se exclui a própria responsabilidade. Assim, para o presente projeto será estudado de uma forma geral a responsabilidade civil, buscando analisá-la pela ótica do dano deformante, no sentido da responsabilidade das pessoas das áreas da saúde e das relações de trabalho ante a ocorrência de dano, de ordem estética, para tanto buscando nos diplomas legais e no posicionamento dos tribunais. 2. CONTEXTO HISTÓRICO DA RESPONSABILIDADE CIVIL O dano moral na responsabilidade civil não é assunto novo no mundo jurídico, muito pelo contrário, remonta a épocas passadas, sendo praticamente impossível se fixar um início propriamente dito deste instituto. Desde que começou a viver em sociedade o ser humano estabeleceu certos limites que uma vez ultrapassados tornam necessários ser reparados. Ao iniciar estudo da responsabilidade civil decorrente do dano estético, buscamos estabelecer uma evolução histórica do tema, ante aos relatos históricos compreendidos em quatro grupos, do Código de Hamurabi ao Direito Romano o estabelecimento do Código Civil Francês e a própria evolução histórica do dano no Brasil e no direito brasileiro. Maria Helena Diniz ( 2005, p.10.) afirma que, para a responsabilidade civil, ocorreu uma evolução pluridimensional, pois, nas palavras da própria autora: “sua expansão se deu quanto a sua história e aos seus fundamentos a sua extensão ou área de incidência [...] e a sua densidade” Ainda na linha histórica a autora apresenta que, em um primeiro momento dominava, o que chamou, vingança coletiva onde ante ao dano suportado por um indivíduo, a punição correspondente se dava por toda a coletividade do grupo ao qual ele pertencia. 3 Ainda vemos que o próximo momento, é a evolução para a vingança privada, onde se institucionalizava a auto-justiça, que ao invés de uma reparação ocorria na verdade o surgimento de um novo dano. Maria Helena Diniz (2005, p.10) adota o pensamento, aponta a autora que se trata de “uma reação individual, isto é, vingança privada, em que os homens faziam justiça pelas próprias mãos sob a égide da Lei do Talião” . Ainda, lembra que, "para coibir abusos, o poder público intervinha apenas para declarar quando e como a vítima poderia ter o direito de retaliação, produzindo na pessoa do lesante dano idêntico ao que experimentou" '. Portanto vemos que nesses primórdios para a responsabilidade, não havia ainda uma idéia de culpa, nem de reparação do dano causado, o que se pode notar é a presença do sentimento de vingança, uma satisfação pessoal do sofredor do dano que não deixa de ser uma recompensa moral. 2.1.O CÓDIGO DE HAMURABI Hamurabi foi um célebre rei babilônico, na lendária região da Mesopotâmia, a região delimitada entre os rios Tigre e o Eufrates, tendo seu reinado ocorrido em torno de 1790 a 1750 antes da nossa era. A ele foi atribuído a consolidação de várias leis esparsas, em uma mesma obra, a essa reunião modernamente denominamos como o Código de Hamurabi. Nesta obra vigora o princípio do “olho por olho e dente por dente”, onde a reparação do dano se faz na pessoa do sujeito causador. Diz a tradução do textoiii: 196º - Se alguém arranca o olho a um outro, se lhe deverá arrancar o olho. 197º - Se ele quebra o osso a um outro, se lhe deverá quebrar o osso. 200º - Se alguém parte os dentes de um outro, de igual condição, deverá ter partidos os seus dentes. 218º - Se um médico trata alguém de uma grave ferida com a lanceta de bronze e o mata ou lhe abre uma incisão com a lanceta de bronze e o olho fica perdido, se lhe deverão cortar as mãos. 232º - Se destrói bens, deverá indenizar tudo que destruiu e porque não executou solidamente a casa por ele construída, assim que essa é abatida, ele deverá refazer à sua custa a casa abatida. Nesse sentido, Clayton Reis (2002, p.12), ensina que a idéia da punição pessoal do agente, representava o meio mais seguro a disposição dos povos mais primitivos para coibir a prática dos atos lesivos. E finaliza o pensamento apontando “que a influência desses preceitos normativos, fortemente impregnados de castigos corporais, exerceram influência notável nos ordenamentos jurídicos e nas sociedades que se sucederam no curso da história.” Deste modo é possível notar que o princípio do “olho por olho e dente por dente”, era de um modo geral aplicado somente para os iguais, sendo que quando ocorria em situação de uma desigualdade, entre a posição de lesante e do lesado, havia também a possibilidade de uma compensação de ordem material. 2.2 O DIREITO ROMANO 4 Na Roma Antiga durante o período pré-republicano ou melhor no período da Realeza, as condições não diferiam muito do encontrado na Mesopotâmia. Havia lá a Monarquia (juntamente com os patrícios) e a plebe, e entre eles um oceano de diferenças. Com o advento da República e o fortalecimento político, econômico e social das classes começam a surgir necessidades de mudanças na questão da reparação dos danos causados a outrem. É o momento em que temos um novo salto evolutivo na responsabilidade. Da luta entre plebe e patrícios alguns estudiosos atribuem o surgimento da Lei das XII Tábuas, datada aproximadamente no ano 450 antes da nossa era. A vingança em primeiro plano continuava privada, entretanto surge a figura do Estado ou quem lhe fazia às vezes em um papel regulador. É o período que Maria Helena Diniz denomina como de “Composição”, podendo essa ser voluntária ou obrigatória. A Lei das XII Tábuas surge então mais como um marco do que como um diploma de responsabilidade, representando a substituição do inflingimento de penas corporais a uma representação pecuniária como espécie de compensação. Entretanto até o presente momento histórico ainda não encontramos o surgimento dos caracteres embrionários da responsabilidade civil este apenas se dará com o advento da Lei Áquília . Maria Helena Diniz (2005.p.11) apresenta que a Lex Áquilia de Damno, consolidou a idéia do tratamento do dano como questão a ser resolvida em termos pecuniários; em suas palavras “impondo que o patrimônio do lesante suportasse o ônus da reparação, em razão do valor da res, esboçando-se a noção de culpa como o fundamento da responsabilidade civil” É a pedra fundamental da teoria da responsabilidade civil, a expressão "culpa aquiliana", tem sua gênese nessa lei. Sendo que em princípio a culpa não apresentava ainda um papel fundamental na reparação do dano. Neste sentido Clayton Reis (2002, p.24) destaca que “Por outro lado, restou igualmente incontroverso que os romanos não questionavam a que título o dano havia sido perpetrado. Bastava tão-somente a sua ocorrência, para evidenciar a obrigatoriedade de reparar”. Portanto podemos concluir que no Direito Romano foram lançadas as bases da responsabilidade civil, através da evolução da concepção de indenização passando de um caráter puramente vingativo corporal à possibilidade de uma resolução de reparação pela via pecuniária, equilibrando a balança na relação dano sofrido versus indenização. 2.3 O CÓDIGO CIVIL FRANCÊS Como visto com o Direito Romano inaugura-se uma nova fase na responsabilidade no âmbito civil, atualmente pode-se notar sua influência em vários países que fundamentaram sua ordens jurídicas nos preceitos do Direito Romano. No direito francês, não poderia deixar de ser diferente, aqui a teoria da responsabilidade civil encontrou uma base fértil na qual pode se desenvolver um princípio geral. Embora em seus primórdios, com boa parte de influência romana, a abordagem da idéia de culpa (como elemento subjetivo do dano) ainda era ignorada. A evolução da teoria da responsabilidade civil só progrediu em razão da construção doutrinária decorrente das transformações sociais ocorridas na França medieval. Maria Helena Diniz (2005, p.11) ensina que “na idade média, com a estruturação da idéia de dolo e de culpa stricto sensu, seguida de uma elaboração dogmática da culpa, distinguiu-se a responsabilidade civil da pena” 5 Para Clayton Reis (2002, p.24) temos a mesma linha ao qual o autor conclui “ o fato é a exata noção do dano ou a idéia concreta de sua reparação, somente surgiu, na França, no século XII” Maria Helena Diniz (2005, p.11) também aponta que a teoria foi firmada pela posição doutrinária dos autores franceses, destacando a pessoa do jurista francês Domat, a quem atribui a formulação do princípio geral da responsabilidade civil. Sendo de tal importância sua contribuição, que foi absorvida pelo Código Civil Francês em seu artigo 1382. Nesse sentido aponta Rui Stoco em artigo em comemoração ao bicentenário do Código Civil Francês: Não se pode negar que no fundamental campo da responsabilidade civil o Código Francês de 1804 foi suporte e modelo para o nosso estatuto civil revogado, sendo certo que a regra moral e paradigmal do neminem laedere, segundo a qual a ninguém é permitido causar lesão a outrem, foi consagrada no seu art. 1382 ao dispor: Tout fait quelconque del’homme, qui cause à autrui um dommage, oblige celui par la faute duquel il est arrivé, à Le réparer (“Qualquer fato oriundo daquele que provoca um dano a outrem obriga aquele que foi a causa do que ocorreu a iv reparar este dano”). Do tratamento dado pelo Código Francês, decorre o fato de que este veio a influenciar grande parte das legislações que adotaram a culpa como fundamento de sua responsabilidade. Ante ao apresentado vemos que as bases da responsabilidade, próximas de como a interpretamos hoje estavam lançadas, o código Civil Francês, ao elencar a culpa repagina a teoria da responsabilidade civil e fornece para o mundo uma nova forma de estudá-la. 2.4 O DANO NO BRASIL No Brasil o surgimento de uma teoria da responsabilidade civil, está nitidamente relacionado com a nossa história, desde o descobrimento e mesmo até depois da República, imperava em nossas terras uma adaptação dos diplomas portugueses. Importante ressaltar a lição de Aloísio Surgik v, em artigo sobre a luta pela propriedade da terra na história de Roma e no Brasil. Ensina o autor que: De nossa parte, já tivemos oportunidade de nos referir ao tema, vinculando-o ao problema da escravidão no Brasil, por ocasião do Congresso Internacional em homenagem a Augusto Teixeira de Freitas, realizado na Universidade de Roma, ao ensejo do centenário de sua morte, em 1983, destacando principalmente o fato de que, em razão da recusa de Teixeira de Freitas em incluir o regime da escravidão no projeto do Código Civil, o Brasil manteve a vigência das Ordenações Filipinas, por influência da força conservadora dos escravocratas detentores da grande propriedade rural, por muito mais tempo do que em Portugal. De fato, em 1867, Portugal organizou o seu Código Civil, à base do projeto elaborado pelo Visconde Seabra, enquanto, no Brasil, as Ordenações Filipinas, condensadas fundamentalmente na compilação de 1603, escritas em estilo bizantino e destinadas primitivamente a um reino absoluto, sobreviveram à queda do Império, conservaram-se ainda nos primeiros vinte e cinco anos do regime republicano, e chegaram a completar 314 anos, mantendo-se em vigor até o dia 1° de janeiro de 1917. Portanto, seguindo tal pensamento temos que até a vigência do Código Civil de Clovis Bevilaqua, com início em 1917, a responsabilidade civil era tratada pelas Ordenações Filipinas, sendo que em algumas outras áreas começavam a abordar o tema inicialmente em situações peculiares até a inclusão no Código Civil de 1916 (CC1916). 6 Ensina neste campo, Roberta Schneider Whestphal (2003, p.13), que: No direito brasileiro, a primeira manifestação quanto a existência do instituto ocorreu com a lei na 496 de 01/05/1898, a qual regulava a questão dos direitos autorais defendendo alguns aspectos pessoais e patrimoniais na relação entre autor e obra. Ainda com a autora temos mesmo depois do tratamento dispensado pelo CC1916 de que outras leis abordaram o assunto, como o Código de Telecomunicações e a Lei de Imprensa. Com o advento da Constituição de 1988 e o posterior Código Civil de 2003– O Novo Código Civil Brasileiro (CCB), bem como do amadurecimento da legislação pertinente, como o Código do Consumidor(CDC), estatuto da criança (ECA) e o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) entre outros temos configuração moderna da responsabilidade civil no Direito Brasileiro. Assim pode-se concluir que a evolução do instituto da responsabilidade civil no direito brasileiro, se deu de forma inicialmente lenta, devido à demora da abordagem pelo Código Civil, entretanto nas últimas décadas apresentou um aprimoramento significativo, sendo que a cada dia as questões referentes à indenização por danos morais, materiais e estéticos ocupa cada vez mais espaço nos tribunais e nas relações do cotidiano. 3. FUNDAMENTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL O Direito é dinâmico, tal pensamento soa uníssono, seja nas cortes, seja nas academias. Dentre os vários ramos do direito, o que tange a responsabilidade civil, apresenta grande destaque, diversos autores em seus compêndios manuais dedicam capítulo exclusivo ao tema, mesmo tendo o Código Civil vigente, tratado-o com tão poucos artigos. Neminem Laedere, é a expressão máxima, proveniente do direito romano, a qual atribuímos o significado latu senso de, a ninguém ofender, é o princípio fundamental onde enraíza-se a teoria da responsabilidade civil. Pablo Stolze Gagliano (2004, p.XXI), no volume correspondente de seu curso, ao apresentar o tema já alerta da importância do mesmo, lembrando que: “De fato a responsabilidade civil, é questão que merece destaque da própria disciplina do Direito Civil, sendo matéria afeta à teoria geral do Direito, uma vez que se relaciona com todos os ramos da árvore jurídica” O Código Civil Brasileiro (CCB) também atenta a este fato jurídico com a devida relevância: Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. Silvio de Sálvio Venosa (2007, p.05) ensina, em sua obra que: “no vasto campo da responsabilidade civil, que interessa saber é identificar aquela conduta que reflete na obrigação de indenizar;” (grifamos) Nesse sentido continua o autor demonstrando que o que se leva em conta é a potencialidade de causar danos; o perigo da atividade do causador do dano, sua natureza e meios adotados. 7 João Casilo (1994, p.53) já atentava para o mesmo ponto, diz o autor que: “basta a violação, a ofensa ao direito, para que a proteção jurídica referente a reparação imediatamente nasça, independentemente de outra cogitação” (grifo nosso) Assim vemos que o importante também é a conduta que causará o dano, que por sua vez possibilitará a obrigação de indenizar; nessa esteira vemos que o risco uma vez relacionado à conduta é de mesma importância. Para Pablo Stolze Gagliano temos a “idéia” de responsabilidade como: Responsabilidade para o direito, nada mais é que uma obrigação derivada – um dever jurídico sucessivo – de assumir as conseqüências jurídicas de um fato, conseqüências essas que podem variar (reparação dos danos e/ou punição pessoal do agente lesionante, de acordo com os interesses lesados.( GAGLIANO,. 2004, p. 03) Tal imposição vem refletida em alguns dos conceitos que podemos estabelecer para a responsabilidade civil. Segundo Rui Stocco: O direito civil brasileiro estabelece que o princípio geral da responsabilidade civil, em direito privado, repousa na culpa. Isto não obstante, em alguns setores, e mesmo em algumas passagens deste vestuto instituto, imperiar a teoria do risco. Assim é que a legislação sobre acidentes de trabalho é nitidamente objetiva; a que regula os transportes em geral (aéreo, ferroviário) invoca-a: a responsabilidade por fatos das coisas repousa na responsabilidade objetiva. Há uma tendência para nela atrair questões relativas à responsabilidade civil dos bancos. Com relação aos direitos do consumidor impera a responsabilidade objetiva. (STOCO, 1999. p.79.) Para Maria Helena Diniz a responsabilidade civil pode ser considerada como: “a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesmo praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal” (DINIZ, 2005. p.34) Ilustrativo é o quadro apresentado por Sergio Cavalieri Filho (2001. p.30), que abaixo reproduzimos de forma simplificada: RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL SUBJETIVA CONTRATUAL OBJETIVA COM OBRIGAÇÂO DE RESULTADO COM OBRIGAÇÂO DE MEIO Portanto, vemos que a responsabilidade civil pode ser fruto de natureza contratual ou extracontratual. 8 Entende-se como contratual devido ao fato, de ser resultante da violação, de uma relação jurídica preexistente, essa sim de natureza obrigacional, sendo que o dever de indenizar surge deste descumprimento entendido como o inadimplemento contratual. Maria Helena Diniz analisa a responsabilidade no campo contratual, como sendo aquela. Oriunda da inexecução de negocio jurídico bilateral ou unilateral. Resulta portanto de ilícito contratual, ou seja, de falta de adimplemento de qualquer obrigação. É uma infração a um dever especial estabelecido pela vontade dos contratantes, por isso decorre de relação contratual preexistente e pressupõe a capacidade para contratar. (DINIZ, 1999. p.110) Em síntese temos que responsabilidade contratual é aquela que surge da inexecução de pactuado em contrato, pressupondo acordo preexistente e a conseqüente violação do acordado. Convém lembrar que tal responsabilidade subdivide-se em responsabilidade de meio ou de resultado. Em Tereza Lopez vemos que: A responsabilidade contratual, a culpa pode ser presumida ou não. Não há uma obrigatoriedade de presunção de culpa, sopor estarmos diante de um contrato. O parâmetro vai ser do tipo de obrigação assumida pelo devedor. Se este se propôs a atingir um determinado resultado e não o atingiu, é presumido culpado, devendo demonstrar sua não culpa. O credor só deve demonstrar o inadimplemento. Há portanto uma inversão do ônus da prova, onde o credor ou vítima do prejuízo fica em uma posição mais cômoda. Ao contrario se o devedor somente se comprometeu a uma determinada conduta, cabe ao credor o encargo de provar que por culpa ou por dolo do devedor houve danos a ele.(LOPEZ,. 1999, p.54.) Para Sergio Cavalieri Filho (2001, p.30) .a responsabilidade contratual “é infração a um dever especial estabelecido pela vontade dos contraentes,” deste modo elege o autor que “o dever jurídico violado tem por fonte a própria vontade dos indivíduos. São eles que criam para si certos deveres jurídicos.” E conclui, determinando que “Pois bem, todas as vezes que o dever jurídico tem sua fonte em um contrato, em um negócio jurídico pelo qual o próprio devedor se obrigou, teremos a responsabilidade contratual”. Conforme apresentado as obrigações contratuais dividem-se em obrigações de meio e de resultado, tal divisão tem extrema importância pois irá, por sua vez caracterizar a culpa, e por conseguinte implicará no ônus probatório. Mas uma vez buscamos em Tereza Lopes (1999, p.53.) uma definição a respeito de obrigação de meio, diz a autora, “há obrigações de meios, quando a própria prestação nada mais exige do devedor do que pura e simplesmente o emprego de determinado meio sem olhar o resultado” Assim podemos entender que nesse tipo de obrigação não está vinculada ao resultado final, existindo fundamentalmente a necessidade de se agir com presteza e diligência necessária na sua execução, não se assegurando seu êxito. Para Humberto Teodoro Junior temos que: Já na obrigação de meio , o que o contrato impõe ao devedor é apenas a realização de certa atividade, rumo a um fim, mas sem ter o compromisso de atingi-lo. O Objeto do contrata limita-se a referida atividade, de modo que o devedor tem que se empenhar na procura do fim que justifica o negócio jurídico, agindo com zelo e de acordo com a técnica própria de sua função, a frustração porém do objetivo visado não configura inadimplemento, nem, obviamente enseja o dever de indenizar o dano suportado pelo outro contratante. Somente 9 haverá inadimplemento, com seus consectários jurídicos, quando a atividade for mal desempenhada. (TEODORO JUNIOR., 1999. p. 69.) Tal explanação solidifica a conceituação buscada para o tema, sobre contrato ou melhor obrigação de meio veremos mais adiante ao tratarmos da responsabilidade dos profissionais da saúde. Apoiando-nos nas fontes consultadas, temos para a obrigação de resultado na visão de Tereza Lopez (1999, p.53.) que é aquela obrigação onde: “o devedor se obriga a alcançar um determinado fim, sem o qual não terá cumprido sua obrigação; ou consegue resultado avençado ou deve arcar com as conseqüências” Deste modo, pode-se entender que o que realmente deve ser considerado ao tratar deste tipo de obrigação, ocorre que há um compromisso final, que se traduz no resultado. Esse deve ser entendido como o ápice contratual e seu insucesso, é que por sua vez gerará o inadimplemento da obrigação e, por conseguinte, ensejará na responsabilidade civil, facultado ao lesado a busca pela reparação. Humberto Teodoro Junior (1999, p.69) também partilha deste pensamento ao determinar que “na obrigação de resultado, o contratante obriga-se a alcançar um determinado fim, cuja não-consecução importa em descumprimento de contrato.”. Atribuindo ao tal fim a prestação devida e uma vez fracassado resulta no inadimplemento contratual, surgindo a obrigação de indenizar. Pablo Stolze Gagliano aponta o seguinte tratamento para o tema: (...) com efeito, para caracterizar a responsabilidade civil contratual faz-se mister que a vítima e o autor do dano já tenham se aproximado anteriormente e se vinculado para o cumprimento de uma ou mais prestações, sendo a culpa contratual a violação de um dever de adimplir, que constitui justamente o objeto do negocio jurídico. (GAGLIANO, 2004, p.20) Com tal definição atende-se a caracterização buscada, e em se tratando de obrigação de resultado, conforme anteriormente apresentado, o não alcance do resultado é o que o autor supra mencionado, com propriedade, determinou, ou melhor, nomeou como Culpa Contratual. Deste modo, pode-se determinar em relação ao exposto que será aquela em que, por decorrência de uma obrigação contratual inadimplida, uma das partes co-contratante se compromete a indenizar a outra em perdas e danos (art.389 CC). Neste tipo de responsabilidade, uma vez não alcançado o prometido resultado, resta ao então credor apenas demonstrar que não houve o cumprimento da obrigação ensejando assim a pretensão à indenização, que na maioria das vezes traduzir-se-á na reparação do prejuízo sofrido. No outro pólo da responsabilidade encontramos aquela em que em face de um ato ilícito, decorrente de uma violação de direito, surge o dever de indenizar. Diz-se, portanto, extracontratual, por decorrer de violação de direito, conclamada no art. 186 do Código Civil: Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Ensina Pablo Stolze Gagliano, (2009, p.16) em seu Novo Curso de Direito Civil, que “se o prejuízo decorre diretamente da violação de um mandamento legal, por força da atuação ilícita do agente infrator (...) estamos diante da responsabilidade extracontratual.” Já para Carlos Alberto Gonçalves temos a posição de que, 10 Quando a responsabilidade não deriva de contrato, diz-se que ela é extracontratual. Neste caso aplica-se o disposto no art.186 do Código Civil. Todo aquele que causa dano a outrem, por culpa em sentido estrito ou dolo, fica obrigado a repará-lo. É a responsabilidade que deriva de ilícito extracontratual, também chamada de aquiliana. (GONÇALVES,, 2009. p.26) Mais adiante o próprio autor diferencia de forma bem elementar uma de outra, elegendo “na responsabilidade extracontratual, o agente infringe um dever legal, e, na contratual, descumpre o avençado, tornando-se inadimplente.” Assim, de acordo com o estudado temos nesta modalidade de responsabilidade a presença, não de uma relação obrigacional, mas sim de um ato ilícito como gerador do dever ou da pretensão indenizatória. Não há um compromisso com os resultados finais, entretanto há a inadimplência como fonte, havendo também uma afronta a ordem legal de modo a causar dano a outrem. Estabelecida a responsabilidade civil como instituto basilar do direito, seja no decorrente de obrigações, bem como na incidência de ato ilícito. De forma que o próximo passo é estudar a composição da responsabilidade civil em seus aspectos p´raticos e elementos formadores. Estudo que será apresentado na continuação deste artigo. CONSIDERAÇÔES FINAIS. Pelo presente estudo, pode-se observar que ante a inegável atuação da teoria da responsabilidade civil, foi necessário um longo caminho, desde a construção histórica da própria responsabilidade. Sendo impossível apresentar um início, temos as primeiras manifestações de vingança pessoal dos primórdios da civilização, como as tentativas de uma idéia de responsabilidade. Com o amadurecimento da sociedade surge na Mesopotâmia o Código de Hamurabi, consagrando o princípio do “olho por olho e dente por dente”, como um dos primeiro os textos que abordam o tema de maneira mais objetiva. A teoria encontrou na Roma Antiga, os alicerces que a fundamentaram, com o advento da Lei das XII Tábuas, encontram-se a configuração da culpa como elemento constituinte da responsabilidade, bem como a possibilidade da substituição pecuniária em detrimento da corporal. A influência dos preceitos romanos, ecoou na França Medieval, onde se estruturou a responsabilidade civil como teoria, graça a contribuição de vários doutrinadores. Tal foi a importância do elaborado que influenciou muitos ordenamentos jurídicos mundo afora. No Brasil a teoria da responsabilidade civil teve um desenvolvimento lento, do descobrimento até mesmo após a proclamação da república, tivemos forte influência do direito português, por conta das ordenações, mesmo quando o próprio direito português as abandonou para estabelecer seu código civil. Foi com o Código Civil da República Dos Estados Unidos do Brasil em 1916 que o tema responsabilidade civil foi trabalhado em nosso direito, Algumas legislações esparsas também, abordaram do assunto, sendo que o atual tratamento é decorrente da promulgação da Constituição de 1988 e do atual Código Civil. A responsabilidade civil atende ao pressuposto determinado pelo princípio de a ninguém ofendervi, sendo que ante a ocorrência de evento danoso, causado por ato ilícito tem se o dever de indenizar. Entretanto pode haver mesmo assim o dever de indenizar sem que exista o ato ilícito, mas na presença na quebra de uma obrigação. è em sua a divisão da responsabilidade civil em seus dois grandes grupos, a responsabilidade contratual, que resulta justamente de um contrato, que, uma vez inadimplido resta a parte causadora o dever da reparação em perdas e danos; e a responsabilidade extracontratual esta sim, decorrente de ato ilícito, as vezes representados nas figuras da negligência, imprudência e imperícia. 11 REFERÊNCIAS CASILO, João. Dano a pessoa e sua indenização. 2 edição, São Paulo: editora RT, 1994. CAVALIERI FILHO. Sergio, Programa de responsabilidade civil. 2ª edição, 4 tiragem, revista, aumentada e atualizada. São Paulo: Malheiros, 2001. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. 19ªed. São Paulo: Saraiva, 2005. ________________. Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 1999. GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil. Volume III – Responsabilidade Civil. 2ª Ed ver. Ampliada e atualizada.São Paulo: Saraiva, 2004. _______________________. Novo Curso De Direito Civil. Volume 3: Responsabilidade Civil. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. GONÇALVES. Carlos Alberto, Direito Civil Brasileiro. Volume IV. Responsabilidade civil. 4ª edição. São Paulo: Saraiva, 2009. LOPEZ,. Tereza Ancona. O Dano Estético.: Responsabilidade Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais,1999. REIS. Clayton, Avaliação do Dano Moral. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2002. ___________, Os novos rumos da Indenização do dano moral.. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2002. STOCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua interpretação Jurisprudencial: doutrina e jurisprudência. 4ª Ed. Ver. Atual. E Ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. SURGIK, Aloísio. A luta pela propriedade da terra na história de Roma e no Brasil (considerações críticas). Revista da Faculdade de Direito da UFPR, América do Sul, 32 29 07 2005. TEODORO JUNIOR. Humberto, Dano Moral. 2ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999. VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Responsabilidade Civil. Sétima Edição. São Paulo: Atlas, 2007. WESTPHAL, Roberta Schneider. O dano moral e o direito do trabalho: o novo código civil e a caracterização do dano moral nas relações de trabalho. Florianópolis, SC: Momento Atual, 2003. i Marcio Garcia Lauriano Leme é Advogado e Biólogo, Possui graduação em Direito pela Faculdade de Direito de Curitiba (2009) e graduação em Biologia, Ciências Licenciatura Plena - Faculdades Integradas Espírita (1997). Especialização em Ecoturismo e em Magistério Superior pelo IBPEX, Atualmente é Advogado no Escritório Oliveira Advocacia, Também professor do Centro de Educação Profissional e Empresarial de Curitiba. Tem experiência na área Juridica, bem como na área de Educação e na Área 12 Hospitalar atuando como Biólogo junto ao DIGICOR - Laboratório de Hemodinâmica e Angioplastia da Santa Casa de Curitiba. Currículo lattes = http://lattes.cnpq.br/3491886975596873 ii Ensina Clayton Reis em sua obra: Os Novos rumos da indenização do Dano Moral. Editora Forense 2002, nas conclusões do capitulo relativo a reparação do dano no que tange a responsabilidade civil que “A reparação dos danos morais é um imperativo individual e social”(grifamos) iii Texto obtido eletronicamente através de download arquivo pdf disponível em http://www.culturabrasil.pro.br/zip/hamurabi.pdf. iv STOCO, Rui. Palestra proferida no Seminário em Comemoração ao Bicentenário do Código Civil Francês, realizado pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, no auditório do Superior Tribunal de Justiça (Brasília-DF), no dia 27 de setembro de 2004, painel presidido pelo Ministro Edson Vidigal, Presidente do Superior Tribunal de Justiça. http://conline1.cjf.gov.br/phpdoc/pages/sen/portaldaeducacao/textos_fotos/bicentenario/textos/rui_stoco.doc v SURGIK, Aloísio. A luta pela propriedade da terra na história de Roma e no Brasil (considerações críticas). Revista da Faculdade de Direito da UFPR, América do Sul, 32 29 07 2005. disponível em http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs2/index.php/direito/article/view/1873/1568. vi Referente a máxima Nemim Ladere do Direito Romano