fls. 1 TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo Registro: 2012.0000373299 Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº 929474724.2008.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que é apelante ACADEMIA PAULISTA ANCHIETA S/C LTDA MANTENEDORA DA UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO ( UNIBAN ), são apelados BRUNO PERES ORCAJO (JUSTIÇA GRATUITA), RAFAEL PEREIRA DA SILVA e THIAGO STIVAL LOPES. ACORDAM, em 24ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores SALLES VIEIRA (Presidente) e CESAR MECCHI MORALES. São Paulo, 2 de agosto de 2012 WALTER CESAR EXNER RELATOR Assinatura Eletrônica Este documento foi assinado digitalmente por WALTER CESAR INCONTRI EXNER. Se impresso, para conferência acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/esaj, informe o processo 9294747-24.2008.8.26.0000 e o código RI000000EEK9A. ACÓRDÃO fls. 2 TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo Apelação com Revisão nº: 9294747-24.2008.8.26.0000. Apelante: Academia Paulista Anchieta S/C Ltda. (mantenedora da Universidade Bandeirante de São Paulo Uniban). Apelados: Bruno Peres Orcajo; Rafael Pereira da Silva; Thiago Stival Lopes. Comarca: São Paulo FR de Santana - 3ª Vara Cível. Voto n° 9156 Indenização. Contrato de prestação de serviços educacionais. Interrupção de curso de graduação por parte da instituição de ensino em face do reduzido número de alunos. Ofensa às leis de proteção ao consumidor. Restituição aos autores dos valores pagos pelos períodos não aproveitados. Dano moral. Caracterização. Verba devida. Sentença mantida. Recurso improvido. Vistos. Trata-se de ação de indenização por danos morais e materiais movida por Bruno Peres Orcajo, Rafael Pereira da Silva e Thiago Stival Lopes em face de Academia Paulista Anchieta S/C Ltda., mantenedora Paulo da Universidade Bandeirante de São Uniban, que a respeitável sentença de fls. 249/253, de relatório adotado, julgou parcialmente procedente para condenar a ré ao pagamento de R$ 10.000,00 a cada um dos autores, a título de dano moral, atualizados desde a data da sentença e acrescidos de juros desde a data do ato ilícito (abril de Apelação nº 9294747-24.2008.8.26.0000 - São Paulo - VOTO Nº 2/10 Este documento foi assinado digitalmente por WALTER CESAR INCONTRI EXNER. Se impresso, para conferência acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/esaj, informe o processo 9294747-24.2008.8.26.0000 e o código RI000000EEK9A. Ação: Indenizatória (nº 583.00.2006.244895-0/00). fls. 3 TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo 2004). Condenou-a, ainda, a restituir aos autores o valor da matrícula e das mensalidades do segundo semestre de 2003, mais o valor da matrícula do primeiro semestre de 2004 e as mensalidades desse mesmo desembolso e juros legais desde a data da citação. Por fim, condenou-a ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, arbitrados em 10% do valor da condenação. Irresignada, alega a apelante, em síntese, sempre ter procedido com boa-fé perante seus alunos, prestando de forma adequada todas as informações acerca da possibilidade de interrupção do curso por falta educacional podendo foi ser de quorum. prestado objeto de Aduz que o serviço efetivamente em 2003, aproveitamento em outras instituições, razão pela qual os valores correspondentes a esse período não devem ser restituídos aos alunos. Sustenta, ainda, que no caso em tela não restou configurado o dano moral, por absoluta falta de provas e nexo de causalidade entre qualquer ato da recorrente e o prejuízo recorridos. supostamente Pleiteia, assim, a experimentado pelos total da reforma r. sentença, para que a ação seja julgada improcedente. O recurso foi recebido em seu duplo efeito e a parte contrária, em contrarrazões, bateu-se Apelação nº 9294747-24.2008.8.26.0000 - São Paulo - VOTO Nº 3/10 Este documento foi assinado digitalmente por WALTER CESAR INCONTRI EXNER. Se impresso, para conferência acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/esaj, informe o processo 9294747-24.2008.8.26.0000 e o código RI000000EEK9A. período, com atualização monetária desde a data do fls. 4 TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo pela manutenção da sentença. É o relatório. O recurso não merece acolhida. ser cabível a aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao caso, vez que da simples leitura dos artigos 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor resta evidente a relação de consumo havida entre as instituições de ensino superior, na qualidade de prestadoras de serviços educacionais, e os alunos, que utilizam os serviços na condição de consumidores finais. Dessa forma, a liberdade garantida às universidades pelo artigo 207 da Constituição Federal, e pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, é obviamente limitada pelas restrições de ordem social, especialmente pelas normas de proteção ao consumidor, como, aliás, disciplina o artigo 170, V, da Carta Magna. Nesse contexto, a atitude da ré em interromper o curso de graduação com fundamento no número reduzido de alunos matriculados, em que pese a previsão contratual nesse sentido (Cláusula 3ª, § 1º do Instrumento Particular de Contrato de Prestação de Serviços Educacionais Ano letivo 2003, fls. 22), Apelação nº 9294747-24.2008.8.26.0000 - São Paulo - VOTO Nº 4/10 Este documento foi assinado digitalmente por WALTER CESAR INCONTRI EXNER. Se impresso, para conferência acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/esaj, informe o processo 9294747-24.2008.8.26.0000 e o código RI000000EEK9A. Em primeiro lugar, cumpre observar fls. 5 TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo infringe dispositivos da legislação consumerista, além de transferir para o consumidor risco inerente à atividade empresarial, que deve ser amargado pela empresa. Zelmo Denari, ao discorrer sobre a responsabilidade por vício de qualidade de produto ou serviço, ensina que “o fornecedor tem a obrigação de assegurar a boa execução do contrato, colocando o produto ou serviço no mercado de consumo em perfeitas condições de uso e fruição” (in “Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do Anteprojeto”, Forense, 8ª ed., 2005, p. 201), como, aliás, prevê o artigo 20 da Lei 8078/90, em especial, o parágrafo 2º, ao dispor expressamente que “são impróprios os serviços que se mostrem inadequados para os fins que razoavelmente deles se esperam, bem como aqueles que não atendam as normas regulamentares de prestabilidade” (grifei). Ora, é evidente que o aluno que se submete a investir tempo e dinheiro, muitas vezes em quantia superior ao que suas reais possibilidades lhe permitem, para ingressar em um curso de graduação, tem a expectativa razoável de obter uma capacitação que lhe permita ampliar sua cultura e conhecimento em determinada área e, mais que isso, as Apelação nº 9294747-24.2008.8.26.0000 - São Paulo - VOTO Nº 5/10 suas Este documento foi assinado digitalmente por WALTER CESAR INCONTRI EXNER. Se impresso, para conferência acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/esaj, informe o processo 9294747-24.2008.8.26.0000 e o código RI000000EEK9A. Frise-se que o ilustre doutrinador fls. 6 TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo perspectivas de um melhor futuro profissional, com ampliação do mercado de trabalho e consequente aumento em seus ganhos, dependendo para tanto, no mínimo, da obtenção de um diploma ou certificado de Nessa conformidade, o fato de terem os autores frequentado o curso durante um ano, ou mesmo a afirmação de que tiveram aproveitamento e desfrutaram de todos os serviços colocados a sua disposição durante o período efetivamente frequentado, torna-se irrelevante para que se possa considerar efetivamente cumprido o contrato em questão, na medida em que não foi este o motivo que levou os consumidores a tomarem parte em processo seletivo e iniciar o curso de “Engenharia de Telecomunicações”. Em outras palavras, não era esse o benefício que eles razoavelmente esperavam obter com a celebração do referido contrato. Cabe aqui trazer a baila o brilhante ensinamento de Cláudia Lima Marques: “Enquanto o direito tradicional se concentra na ação do fornecedor do serviço, no seu fazer, exigindo somente diligência e cuidados ordinários, o sistema do CDC, baseado na teoria da função social do contrato, concentra-se no efeito do contrato. O efeito do contrato é a prestação de uma Apelação nº 9294747-24.2008.8.26.0000 - São Paulo - VOTO Nº 6/10 Este documento foi assinado digitalmente por WALTER CESAR INCONTRI EXNER. Se impresso, para conferência acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/esaj, informe o processo 9294747-24.2008.8.26.0000 e o código RI000000EEK9A. conclusão do curso escolhido. fls. 7 TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo obrigação de fazer, de meio ou de resultado. Este efeito, este serviço prestado, é que deve ser adequado para os fins que 'razoavelmente deles se esperam'” (in “Comentários ao Código de Defesa do Consumidor", RT, Diante desse quadro, é imperioso reconhecer que o contrato não foi cumprido pela ré de acordo com o que foi ofertado aos autores - e muito menos dentro daquilo que razoavelmente dele se rigor a esperava. Nesse sentido, de manutenção a r. sentença combatida em relação à devolução do valor da matrícula e das mensalidades do segundo semestre de 2003, mais o valor da matrícula do primeiro semestre de 2004 e as mensalidades desse mesmo período, vez que os autores não tiveram em outra instituição de ensino qualquer aproveitamento das matérias cursadas nos semestres em questão (conforme documentos acostados a fls. 107, 128 e 134). Quanto aos danos morais, vale aqui mais uma vez destacar ensinamento de Zelmo Denari, no sentido de que “em sede de prestação de serviços é que, com mais freqüência, se localizam os danos que afetam a esfera moral dos consumidores”, e mais adiante, “mais importa ao consumidor alcançar, em sua plenitude, o ressarcimento da ordem moral do que a Apelação nº 9294747-24.2008.8.26.0000 - São Paulo - VOTO Nº 7/10 Este documento foi assinado digitalmente por WALTER CESAR INCONTRI EXNER. Se impresso, para conferência acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/esaj, informe o processo 9294747-24.2008.8.26.0000 e o código RI000000EEK9A. 2ª ed., 2006, p. 359). fls. 8 TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo reparação dos danos materiais inculcados ao fornecedor relapso” (ob. cit., p. 212). Segundo Antonio Jeová Santos, “o que caracteriza o dano moral é a conseqüência de espiritual ou qualquer padecimento infligido à vítima em razão de algum evento danoso. É o menoscabo a qualquer direito inerente à pessoa, como a vida, a integridade física, a liberdade, a honra, a vida privada e a vida de relação”. Afirma, ainda, o festejado autor que “a entidade dano moral, porém, não pode ficar circunscrita à vulneração de sentimentos, sob pena de o Direito placitar comportamentos que prejudicam, mas que não são abarcados por indenização. A extensão do dano moral, desde que afastados atos que causem simples abespinhamento e que não cheguem a caracterizar o autêntico dano moral, tem de ocorrer para além do afetivo e da lesão a sentimentos, do pretium doloris” (in “Dano Moral Indenizável”, RT, 4ª ed., 2003, p. 108 e 109). A conduta da ré em cancelar unilateralmente o curso pactuado, após expectativas e compromissos ajustados, dissabor” autores, aos não sendo ocasionou certo que “mero houve verdadeiro descaso, peso de angústia, dor íntima e desestímulo relacionados ao desrespeito na alteração Apelação nº 9294747-24.2008.8.26.0000 - São Paulo - VOTO Nº 8/10 Este documento foi assinado digitalmente por WALTER CESAR INCONTRI EXNER. Se impresso, para conferência acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/esaj, informe o processo 9294747-24.2008.8.26.0000 e o código RI000000EEK9A. algum ato que cause dor, angústia, aflição física ou fls. 9 TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo das bases do negócio ajustado, não podendo ser desprezado o fato de que eles frequentaram inutilmente o curso durante um ano, período em que certamente planejaram e traçaram objetivos para o exercício da conta do descumprimento contratual da ré, dando azo, assim, à indenização por danos morais e, consequentemente, à procedência total da ação. No tocante ao valor indenizatório dos danos morais, importa observar que essa questão recomenda sempre a máxima prudência e cautela por parte do julgador, a fim de se evitar enriquecimento indevido, ou punição insuficiente àquele que provocou a indevida dor moral. Nessa esteira, confira-se: “A quantificação dos danos morais observa o princípio da lógica do razoável. Deve a indenização ser proporcional ao dano e compatível com a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e a duração do sofrimento experimentado pela vítima, a capacidade econômica das causadoras dos danos e as condições sociais do ofendido.” (APELAÇÃO COM REVISÃO Nº 990.141-0/7, Rel. Des. Kioitsi Chicuta). Assim, levando-se em consideração as condições pessoais das partes, bem Apelação nº 9294747-24.2008.8.26.0000 - São Paulo - VOTO Nº 9/10 como os Este documento foi assinado digitalmente por WALTER CESAR INCONTRI EXNER. 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