UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE AÇÃO MONITÓRIA E SEUS ASPECTOS CONTROVERTIDOS Por: Octavio Caio Mora y Araujo de Couto e Silva Orientador Prof. Dr. José Roberto Borges Rio de Janeiro 2004 2 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE AÇÃO MONITÓRIA E SEUS ASPECTOS CONTROVERTIDOS Apresentação de monografia à Universidade Candido Mendes como condição prévia para a conclusão do Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” em Direito Processual Civil Por: . Octavio Caio Mora y Araújo de Couto e Silva 3 AGRADECIMENTOS Aos inúmeros amigos que tive a honra de conquistar ao percorrer esta fantástica jornada que nos desafia a cada dia, e que chamamos de Direito. E, em especial, à Vanessa Marques Paiva, por generosidade, sua e por indescritível manter-me diariamente instigado e motivado diante da ciência jurídica. 4 RESUMO Este trabalho objetivou estudar as controvérsias que envolvem a utilização da ação monitória. A monitória, incluída pelo legislador no ordenamento jurídico em 1996, veio enriquecer o ordenamento jurídico, pois antes desta ação era necessário que o credor de um documento sem eficácia executiva propusesse uma dispendiosa e demorada ação de conhecimento pelo rito ordinário. A Ação Monitória abreviou o caminho para a execução, ou seja, tornou possível que o credor veja satisfeito o seu crédito mais rapidamente. A inovação foi tamanha, que desde o código de processo civil de 1939 não havia nenhum mecanismo parecido para proporcionar rápida constituição de título executivo e a sua conseqüente execução. Para conseguir utilizar a ação monitória, exige a lei que o autor elabore petição inicial, e junte prova escrita de seu crédito. Recebida a inicial, o juiz em cognição sumária sobre os documentos, expede mandado para o devedor, a fim de que este pague sua dívida ou interponha embargos contra os argumentos e documentos acostados na exordial. Alguns autores tentam identificar a natureza jurídica desta “decisão” de deferimento da inicial, para definir o recurso cabível, ou se o meio de impugnação seriam os próprios embargos. Caso haja interposição dos embargos, o rito se converte em ordinário e poderão ser objeto de profundo conhecimento do juiz quaisquer fatos, tal como numa ação de conhecimento. Após este procedimento, caso o autor obtenha sucesso, receberá um título dotado de executividade imediata, de modo que poderá prosseguir imediatamente para a execução de títulos executivos judiciais. Um dos pontos que geraram controvérsias desde o início, foi a de como definir a natureza jurídica desta ação, já que após a fase de conhecimento sobre a lide realizado pelo juiz, o autor obtém título executivo judicial pronto para a execução, tudo dentro do mesmo procedimento. Na fase executiva da monitória, é encontrada expressiva divergência sobre a possibilidade ou não de opor embargos de devedor, e sobre quais matérias, se restritas ao art. 741 ou ao art 745 do CPC, 5 sobretudo quando o réu se manteve inerte na fase de conhecimento e o título se formou sem sua manifestação nos autos. Contudo, a questão mais tormentosa do procedimento monitório, e onde até o presente momento não é possível definir qual o entendimento majoritário dos Tribunais, é a admissibilidade da Fazenda Pública figurar no pólo passivo. Isso porque a fazenda goza de várias prerrogativas, inclusive constitucionais, que não podem deixar de ser observadas e que aparentemente são incompatíveis com o rito peculiar da ação monitória. Outrossim, existe o fato de que o legislador quando incluiu a monitória no CPC silenciou a respeito.Esses fatores contribuíram para que hoje sejam encontradas decisões das mais variadas nos tribunais regionais, e nos superiores. 6 SUMÁRIO INTRODUÇÃO 07 CAPÍTULO 1 LEI. 9079/95: INCLUSÃO DO PROCEDIMENTO MONITÓRIO NO BRASIL 10 CAPÍTULO 2 EMBARGOS NA AÇÃO MONITÓRIA 24 CAPÍTULO 3 FASE EXECUTIVA DA AÇÃO MONITÓRIA 36 CAPÍTULO 4 DO CABIMENTO EM FACE DA FAZENDA PÚBLICA 45 CONCLUSÃO 55 BIBLIOGRAFIA 58 ÍNDICE 60 FOLHA DE AVALIAÇÃO 61 7 INTRODUÇÃO O presente trabalho tem como objetivo estudar as controvérsias que envolvem a utilização da ação monitória. O ordenamento jurídico brasileiro há muito rogava por um procedimento que abreviasse o caminho para a execução aos credores que possuíam um documento desprovido de executividade. Em atendimento ao clamor doutrinário, o legislador incluiu no Código de Processo Civil através da Lei. 9.079/1995 de 14 de Julho de 1995 os artigos 1.102a, 1.102b e 1.102c, que regulamentam a ação monitória. A ação monitória tem por objetivo abreviar o caminho, bem como a constituição de um título executivo judicial, deixando para trás o moroso e caro procedimento comum ordinário. É possível o emprego da ação monitória sempre que o credor dispor de um documento escrito, desprovido de força executiva, representativo de uma obrigação de pagar soma em dinheiro, entrega de coisa fungível ou de determinado bem móvel. Recebida a inicial, o Juiz irá realizar conhecimento sumário e não exauriente sobre os documentos juntados e expedir mandado de pagamento ao devedor para que realize o pagamento imediatamente, sob a benesse de ficar isento das custas e honorários advocatícios, ou interponha embargos monitórios. Tal isenção foi o meio utilizado pelo legislador de incentivar o devedor a realizar prontamente o pagamento ao invés de alegar fundamentações meramente protelatórias que só denigrem a imagem da Justiça. A defesa do devedor, caso efetivamente existam argumentos relevantes que extinguem, alteram ou diminuem o direito do autor, serão arrolados nos embargos monitórios. Com a interposição dos embargos o feito se converte em ordinário, prosseguindo tal como uma ação de conhecimento comum. Constituído o título executivo, o procedimento segue para a fase executória, que, segundo o próprio legislador, terá tratamento similar ao que é 8 dado para os títulos executivos formados judicialmente, inclusive com a possibilidade de embargos de devedor. Diante das considerações iniciais acima traçadas, será iniciada a apresentação dos capítulos e de suas respectivas abordagens. O primeiro capítulo irá descrever a evolução deste tipo de ação, desde sua origem no direito português, até os dias atuais onde em 1995 foi incluída no ordenamento pátrio a ação monitória. Será realizada uma análise detalhada dos requisitos específicos para a propositura da ação monitória expressamente descritos pelo legislador, bem como as controvérsias que envolvem tais condições de admissibilidade. O segundo capítulo tratará dos efeitos do mandado monitório expedido pelo juiz inaudita altera pars, bem como a definição de sua natureza jurídica a fim de esclarecer se é possível a interposição do recurso ou não, e, as possíveis atitudes do réu ante o recebimento do mandado. Abordará ainda questões atinentes aos embargos como sua natureza jurídica, que é fruto de controvérsias, o recurso cabível da decisão dos embargos e um estudo comparativo entre os embargos monitórios e os embargos à execução. O terceiro capítulo tecerá as questões inerentes à fase executória do procedimento monitório, ou seja, explicitando como se dará a formação do título executivo judicial no âmbito da ação monitória, e se existe a possibilidade de antes desta formação que o autor pleiteie a antecipação da tutela, ou, posteriormente à concepção do título, a execução provisória quando pendente o recurso interposto pelo devedor. Por fim abordará a discussão mais saliente quando se trata de embargos monitórios, que é a possibilidade ou não de interpor novos embargos na execução, nesta fase chamado de embargos de devedor, que tenham sido ou não precedidos de embargos monitórios na fase de conhecimento. Será apontada ainda a discussão sobre quais matérias poderiam ser ventiladas nestes embargos de devedor, se as matérias atinentes somente aos títulos executivos judiciais, ou, toda e qualquer matéria como nos títulos executivos extrajudiciais. O quarto e último capítulo tratará especificamente sobre a admissibilidade 9 ou não da fazenda pública como parte adversa, que é objeto de inúmeras controvérsias na doutrina e jurisprudência, a ponto de não ser possível identificar atualmente qual a posição majoritária sobre o tema. Tantas discussões envolvem o tema em razão das particularidades que detém a fazenda quando é executada, que aparentemente confrontam com o rito da ação monitória. Por isso, serão apresentadas as duas teses doutrinárias, e seus argumentos serão confrontados, a fim de que seja possível extrair o melhor entendimento. A pesquisa efetuada foi eminentemente teórica, utilizando-se o método histórico-descritivo. Como fontes de pesquisa, foram utilizadas a doutrina, a jurisprudência e a legislação e, como técnicas prevalentes, as pesquisas bibliográfica e documental. A Internet serviu como instrumento de coleta de informações técnicas e jurídicas. 10 CAPÍTULO I LEI. 9.079/95: INCLUSÃO DO PROCEDIMENTO MONITÓRIO NO PROCESSO CIVIL BRASILEIRO Avaliando historicamente o sistema processual brasileiro é possível encontrar resquícios do sistema monitório em antigos procedimentos, como a ação de assinação de dez dias e as ações cominatórias. A chamada ação decendiária, ou assinação de dez dias, com origem no direito Português, nas Ordenações Manoelinas, surgiu no Brasil com as Ordenações Filipinas, e depois nos diplomas Regulamento 737 de 25/11/1850 e Consolidação Ribas de 28/12/1876 permanecendo sua aplicação até a introdução do Código Unitário de 1939. O objetivo era o cumprimento de uma obrigação de dar, incluindo dinheiro ou bens, desde que houvesse prova escrita, devendo então o autor corroborar suas alegações na petição inicial com um documento escrito. O réu era citado para em 10 dias cumprir a obrigação, demonstrar quitação ou apresentar embargos. Caso os embargos não fossem oferecidos ou fossem irrelevantes os argumentos apresentados, o juiz concedia força executiva ao título comprobatório da obrigação, ou seja, o documento escrito trazido pelo autor ganhava força executiva. Sendo os embargos de argumentações relevantes, eram recebidos, e prosseguiria o processo de conhecimento pelo rito ordinário. O Código de Processo Civil de 1939 em seu art 303, trouxe um novo procedimento monitório, a ação cominatória, deixando para trás a ação decendiária. A ação cominatória também teve origem no Direito Português na “ação de preceito cominatório”, ou “embargos à primeira’. Tratava-se de uma ação para prestação de fato ou abstenção de ato, onde o juiz em cognição sumária apreciava a prestação a que tinha direito o autor, e expedia o mandado para o 11 réu acompanhado da cominação de uma pena (daí o nome preceito cominatório), para cumprir um dever fazer ou não fazer”. O réu poderia se opor ao mandado instaurando um processo de conhecimento, e para isso deveria comparecer à audiência e opor embargos (por isso embargos à primeira – audiência). Caso não apresentasse oposição ao preceito cominatório e tampouco comparecesse à audiência, o juiz proferia sentença, que diferentemente da ação de assinação de dez dias, não possuía força executiva imediata, pois era necessária a propositura de nova relação processual para executar a obrigação. Em razão disso que muitos autores defendiam que o legislador fez mal em excluir o procedimento decendiário no código de 1939, pois acabou por deixar uma lacuna no direito processual, já que a natureza monitória era incompleta, pois a execução não podia ser realizada nos mesmos autos, dependia de nova ação. O Código de 1973 ainda deixou lacuna maior, pois não previu nenhum tipo de procedimento monitório. As obrigações de fazer e não fazer passaram a seguir o rito comum ordinário, onde em caso de inércia do réu não havia a possibilidade da sentença imediata e automática que confirmava a pretensão autoral, a inércia apenas ensejava os efeitos da revelia, ou seja, apenas antecipava o julgamento da lide. Pelo exposto, já se pode resumir o histórico do procedimento monitório no Brasil, onde antes do Código de 1939 havia a ação decendiária (procedimento monitório documental trazido do direito português), porém este foi abolido com a introdução do Código de 39, que só trouxe a ação cominatória, a qual muito deixava a desejar, e o Código de 73 sequer apresentou procedimento monitório. Com o passar do tempo, sentiu-se a necessidade da criação de um instituto que facilitasse a formação de um título executivo, sem se descuidar de garantir a defesa do devedor. Vários autores clamavam pela conveniência de se adotar um procedimento monitório no Direito Brasileiro, foi então que o legislador editou a Lei nº 9.079/95 incluindo os arts. 1.102a, 1.102b, 1.102c no Código de Processo Civil no livro IV, título I, capítulo XV, sob a nomenclatura de Ação 12 Monitória, dentre os procedimentos especiais de jurisdição contenciosa. A origem desta ação, mencionada na exposição de motivos do projeto de lei, vem do Direito Luso-Brasileiro, em evidente referência à assinação de dez dias, por isso é que se afirma que a ação monitória não se trata de uma novidade, mas sim de um reaproveitamento do que foi utilizado no passado, 1 atualizado a necessidade de hoje . No entanto, a inspiração principal foi encontrada no moderno Direito Italiano, no procedimento ingiunzione, por isso que alguns autores utilizam a denominação procedimento de injunção, que foi simplificado às nossas peculiaridades. A introdução desta ação tornou possível, ao portador de documento sem eficácia de título executivo, satisfazer o seu crédito sem precisar propor uma ação de conhecimento, partindo-se diretamente para a execução definitiva, sempre que o devedor não ofereça embargos. Nas palavras de Cristiane Delfino Lins é possível definir a ação monitória como: Ação monitória é um processo de cognição sumária, que possui rito especial, e tem como principal escopo alcançar o título executivo, de forma antecipada, sem a demora natural do processo de conhecimento que necessita de sentença de mérito transitada em julgado para que o processo executivo se inicie.2 Assim, veio essa ação desburocratizar, agilizar e dar efetividade ao processo civil, abreviando de forma hábil o caminho para a formação do título executivo, deixando para trás o moroso e caro procedimento ordinário, que em muito prejudicava a imagem da Justiça. Um dos principais objetivos é de evitar a situação de extrema dificuldade que existia para o credor de ver satisfeito o seu crédito, o que lhe causava 1 ARAÚJO, Francisco Fernandes de. Ação Monitória: Comentários à Lei nº 9.079 de 14 de Julho de 1995. 4.ed. São Paulo: Copola, 1996. p. XVII 2 LINS, Cristiane Delfino Rodrigues. Ação monitória no direito brasileiro (Lei9079/95). Teresina: Jus Navegandi, 2000. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=892>. Acesso em 16 fev. 2004. p.2 13 desânimo, pois mesmo possuindo um documento abalizado, e sabendo da inexistência de defesa por parte do devedor, teria de enfrentar todo o complexo processo de conhecimento, para só depois executar em ação própria o inadimplente. O destaque sobre os benefícios da nóvel ação, não podem ser avaliados somente sob a ótica do autor, pois, se por um lado este teve o caminho para a execução abreviado, quanto ao devedor, não significou uma arbitrariedade, pois ao mesmo caberá o encargo de inaugurar eventual contraditório após o recebimento do mandado monitório através da propositura dos embargos. 1.1 Natureza jurídica do instituto A doutrina não é pacífica quanto a natureza jurídica do procedimento da ação monitória, havendo 3 correntes distintas. Alguns autores se posicionam no sentido de que possui caráter de ação de conhecimento, outros de execução e até mesmo há quem defenda que tratase de uma natureza híbrida, com um misto de conhecimento e execução em um só procedimento. Todas posições possuem autores de alto renome que fundamentam com veemência a sua teoria como constata-se a seguir. O doutrinador Vicente Greco Filho3 dispõe que “a ação monitória é um misto de ação executiva em sentido lato e cognição, predominando, porém, a força executiva”. Para Nelson Nery Júnior4 “a ação monitória é ação de conhecimento, condenatória, com procedimento especial de cognição sumária e de execução sem título”, Rogério Cruz e Tucci5 e Cristiane Delfino6seguem esta linha de 3 GRECO op cit, ARAÚJO, op. cit., p. 10. NERY JÚNIOR, apud COL, Helder Martinez Dal. Ação monitória em face da fazenda pública. Teresina: Jus Navegandi, 2000. Disponível em < http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=893>. Acesso em: 09 mar. 2004. p. 3. 5 TUCCI, apud LINS, op cit., p. 2. 6 Ibidem., p 2. 4 14 entendimento. Esta autora afirma que a ação monitória é um procedimento de cognição sumária, que possui rito especial, pois seu objetivo é trazer ao conhecimento do Poder Judiciário um título, para que reconheça seu caráter executável. O mesmo raciocínio é extraído do direito estrangeiro com o ilustre Prof. Piero Calamandrei no seguinte trecho: “el procedimento monitorio es una forma especial de processo de cognición abreviado”. 7 O Prof. Carnelutti8 ao contrário, aduz que “este procedimento seria um tertium genus, ocupando posição intermediária entre a cognição e a execução”, pois juntamente com José Rubens Costa, entende que a natureza é mista, vez que trata-se de um processo de conhecimento com prevalente função executiva conforme conclui-se com a explanação abaixo: (...) no novo procedimento há uma mistura de características do processo de conhecimento, com o de execução. Por conseguinte, desenvolve-se em processo de cognição sumária, isto é, não contém a cognição plena do processo de conhecimento e nem a ausência de cognição do processo de execução.9 Também é defensor deste entendimento o desembargador Alexandre de Paula, que através do trecho do acórdão a seguir preleciona sua posição de que existem duas fases dentro do mesmo procedimento “a primeira é a fase de conhecimento, que embargada ou não, resulta, se acolhida, na constituição do título executivo judicial. A segunda é a fase executória, em que acontece a cobrança propriamente dita, com a exclusão de bens se não houver pagamento”.10 Diante das explanações acima suscitadas pelos doutrinadores, conclui-se que o melhor entendimento não deve ser aquele que concebe à ação monitória a natureza de execução, pois não pode ser negada a existência de cognição 7 ALVIM, J. E. Carreira. Código de processo civil reformado. 3.ed. rev. e ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 1996, p. 362. 8 Ibidem., p.361. 9 COL, op cit., p.4. 10 Ibidem, p.4. 15 realizada pelo juiz sobre os documentos trazidos pelo autor, o que seria incompatível com o rito puramente de execução. Mas também não há de se atribuir natureza propriamente de conhecimento porque existe em seu bojo, após a prévia cognição do juiz, atos de índole executória, como, por exemplo, quando é expedido o mandado monitório para que o réu pague em 15 dias. 1.2 Condições de admissibilidade da Ação Monitória Segundo dispõe o art.1.102a do CPC: “A ação monitória compete a quem pretender, com base em prova escrita sem eficácia de título executivo, pagamento de soma em dinheiro, entrega de coisa fungível ou de determinado bem móvel”.11 Pela redação do artigo acima transcrito é possível perceber que o legislador determinou que não é qualquer obrigação ou qualquer documento que poderá ser utilizado na ação monitória, por isso deixou expresso 3 (três) requisitos para a admissibilidade desta ação, tanto que caso o juiz não os reconheça tão logo receba petição inicial indeferirá a mesma. Estes requisitos são: ser o autor portador de prova escrita, sem eficácia executiva, que represente uma obrigação de dar soma em dinheiro, entrega de coisa fungível ou de determinado bem móvel. Cada um destes requisitos será tratado separadamente nos itens a seguir. 1.2.1 Prova escrita: A exigência feita pelo legislador de que o documento deve ser escrito, logo no primeiro artigo que trata do tema ação monitória, transparece o fato de o sistema brasileiro ter eleito o procedimento monitório documental, no qual deve ser juntado à petição inicial, documento escrito que comprove os fatos alegados 11 BRASIL. Código de Processo Civil. 871. ed. São Paulo: Manole, 2004 16 pelo autor. Deve ser entendido como prova escrita, apesar da omissão do legislador na especificação, como um “documento idôneo, hábil, dotado de aptidão suficiente para influir na formação do livre convencimento do juiz acerca da probabilidade do direito afirmado pelo autor”. 12 Por conseguinte não é possível a admissão de prova exclusivamente testemunhal, já que não há inicialmente instrução e nem contraditório, deverá o autor portar documento capaz de construir o juízo de verossimilhança do juiz a ponto de expedir de plano o mandado monitório. O termo “prova escrita” deve ter uma interpretação extensiva, pois não existem dispositivos legais que impõem ao autor quantos documentos deverá trazer para instruir a inicial, portanto, pode ser compreendido no convencimento do juiz um conjunto de documentos. Assim, ressalta-se que não há necessidade que a afirmação de existência de dívida esteja contida em um único documento, nada impede que sejam juntados à inicial 2 ou mais documentos, desde que um deles por si só não seja suficiente para a identificação da dívida assumida pelo réu na ação monitória. O doutrinador Wambier13 adota este raciocínio: “qualquer documento isolado ou grupo de documentos conjugados de que seja possível o juiz extrair razoável convicção acerca da plausibilidade da existência do crédito pretendido”. É necessário que o documento seja grafado, excluindo-se assim provas documentais lato sensu, ou segundo o código, “começo de prova”, tal como as provas gravadas em fita cassete ou videotaipe, em sistema visual ou auditivo (ou produto da combinação de ambos), bem como qualquer registro de informática posto que a lei fala expressamente em prova escrita. As citadas provas só poderão ser utilizadas apenas para complementar a prova documental, ou reafirmar o direito do autor, não podendo sozinhas servir de prova para a monitória, pois não tornam verossímil ou suficientemente provável e possível o direito do autor. Tal conclusão é compreensível em vista das muitas discussões 12 13 LINS, op. cit.., p. 9. WAMBIER, apud, LINS, Ibidem, p. 9. 17 que concretamente surgem acerca da autenticidade dessas formas de reprodução, o que seria incompatível com as características da etapa liminar do processo de conhecimento realizado sobre os documentos. Inclui-se neste rol os documentos públicos ou particulares, tais como a duplicata sem aceite, cheque prescrito, telegrama, fax, duplicata sem aceite protestada, carta confirmando a aprovação do valor do orçamento e a execução do serviço, carta agradecendo ao destinatário pelo empréstimo em dinheiro, certidão de assentos de entidade pública ou de atos processados em juízo que demonstrem a existência da obrigação, documentos extraídos de assentos de escrituração mercantil do credor, relativos a fornecimentos de mercadorias ou a prestação de serviços de qualquer natureza. 1.2.2 Inexistência de força executiva do título: No que diz respeito a inexistência de força executiva ao título, exigiu a lei que o documento fosse desprovido de exigibilidade, ou seja, por si só o documento não é capaz de ensejar a propositura da ação de execução, pois ele não consta no art. 584 do CPC, títulos executivos judiciais, e nem no art. 585 do CPC, títulos executivos extrajudiciais. Um dado importante a acrescentar é que o documento pode até constar no rol dos mencionados artigos, como por exemplo, o cheque ou a duplicata, no entanto, ele não preenche requisitos indispensáveis que caracterizam a exigibilidade do título, pois pode estar prescrito, no caso do cheque, ou sem aceite, essencial para a duplicata. Convém salientar que é uma faculdade do credor portador de titulo desprovido de exigibilidade propor ação monitória, pois nada impede que ele prefira ingressar com uma ação de conhecimento pelo rito ordinário. E, em caso contrário, caso o título possuísse força executiva deixaria de existir o interesse processual na escolha da ação monitória, sendo possível de imediato o ingresso com a ação de execução. 18 1.2.3 Pagamento de soma em dinheiro, entrega de coisa fungível ou de determinado bem móvel: Para ser legítima a propositura da ação monitória, o pedido do autor deve ter como objeto o pagamento de soma em dinheiro, a entrega de coisa fungível ou de determinado bem móvel, estando portanto, excluídas as ações que tiverem por objeto as prestações de fazer e de não fazer e as de entrega de coisa imóvel. O termo “soma em dinheiro” utilizado pelo legislador, quer dizer que a quantia deve ser certa, que independa de liquidação, pois não existe estágio que admita a liquidação do quantum debeatur durante a ação monitória. Portanto, não é possível propor ação com quantia incerta, justificando-se tal proibição pelo fato de que o mandado de pagamento será expedido com base nos valores constates na inicial, sendo impossível o mandado expressar valor ilíquido. Já no que tange à “entrega de coisa fungível” deve ser entendido como coisa “o bem que possui valor pecuniário, compreendendo tanto a coisa móvel, um bem corpóreo, como um bem incorpóreo” 14 e como fungível o que consta no art 85 CC “o móvel que pode substituir-se por outro da mesma espécie, qualidade e quantidade”. Refere-se, portanto, “as obrigações de dar coisas genéricas ou incertas, que constam no art. 243 a 246 do CC, isto é, obrigação de dar coisas que são indicadas pelo gênero e quantidade e cuja satisfação em juízo realiza-se por meio da execução forçada prevista nos arts. 629 e seguintes do CPC”.15 Ainda dispõe o art. 1.102a do CPC que pode ser objeto da ação monitória a entrega de bem móvel, definido no art. 82 do CC como o bem suscetível de movimento próprio, ou de remoção por força alheia. Este bem é o que se apresenta como objeto de obrigação de dar coisa certa conforme os arts. 233 a 242 do CC, destacando-se que somente a coisa certa móvel poderá ser objeto 14 ALVIM, op. cit., p. 366. 19 do procedimento em questão, e jamais os bens imóveis que só serão alcançados pelo juízo contencioso ordinário.16 Em virtude dessas considerações, percebe-se que o procedimento monitório possui requisitos taxativos para sua propositura que constam no art. 1.102a do CPC. Tais requisitos devem ser rigorosamente preenchidos sob pena da petição inicial ser indeferida pelo juiz, que não expedirá o mandado monitório. 1.3 Controvérsias sobre o tema: Sedimentadas as noções básicas acima sobre as condições de admissibilidade da ação monitória, faz-se necessário agora uma análise de várias questões suscitadas pela doutrina e jurisprudência que causam controvérsias sobre o tema. A cobrança de cotas condominiais em sede de ação monitória, já foi fruto de inúmeras posições contraditórias, porém hoje em dia encontra-se mais amena a discussão, desde que preenchidos os requisitos exigidos pela lei será pertinente a ação monitória. É necessário que o documento esteja desprovido de certeza absoluta, mas que seja merecedor de fé quanto à sua autenticidade e eficácia probatória e que seja levado à inicial uma memória discriminada do cálculo, com valores líquidos e atualizados.17 Salienta-se ainda que para a expedição do mandado de pagamento é preciso que se apresente prova escrita (ainda que indireta) de condição de condômino do réu e de elementos que definam o montante que será cobrado. Quanto aos honorários de advogado previstos contratualmente e a sua possibilidade de ser prova escrita capaz de instruir inicial de ação monitória, há 15 HUMBERTO JÚNIOR, Theodoro. Curso de direito processual civil. 16. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 1997. Vol. III. p. 383. 16 Ibidem, p. 383. 17 BRASIL. Tribunal de Alçada de Minas Gerais, 7 º Câmara Cível, Apelação Cível nº 214.163-5, Rel. Lauro Bracarense; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, 4º Turma, Recurso Especial nº 208.870-SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, apud, TALAMINI, Eduardo. Tutela monitória. 2.ed. rev. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2001, p. 209. 20 divergência. Existem julgados que inadmitem, pois o contrato por si só não seria suficiente para preencher os requisitos de liquidez e certeza quanto ao débito reclamado exigíveis na ação monitória, e, em outros é perfeitamente possível pois constitui prova escrita sem eficácia de título executivo extrajudicial.18 As provas indiretas, que são aquelas produzidas sem a participação do réu, como as boletas bancárias, notas fiscais, registros dos livros comerciais (art. 371, III do CPC), são defendidas como prova plausível de instruir ação monitória desde que seja possível a identificação de um crédito, gozando de valor probante, e seja razoável para embasar o juízo de verossimilhança realizado pelo juiz, pois em seu bojo deve trazer indícios de veracidade e principalmente do consentimento expresso do devedor. 19 Conveniente destacar a abordagem do doutrinador Humberto Theodoro Júnior sobre o tema: (...) Pouco importa, outrossim, que o documento escrito não contenha a firma do devedor, se, por outro documento se obtém a certeza de que este o reconheceu como representativo da obrigação. O conjunto documental pode, dessa forma, gerar a convicção do juiz sobre o direito do credor, mesmo quando cada um dos escritos exibidos não seja capaz de comprová-lo.20 Em posição divergente argumenta-se que só é prova hábil a prova escrita através da qual o devedor reconheça expressamente a existência do débito.21 A duplicata, que é um título de crédito que se encontra no rol dos títulos executivos extrajudiciais do art 585,I do CPC necessita de alguns elementos para 18 BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 5º Turma, Apelação Cível nº 133.699-DF, Rel. Adelith de Carvalho Lopes; BRASIL. Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul, 4º Câmara Cível, Apelação Cível nº 196.072.250, Rel. Bertram Roque Ledur; BRASIL. Tribunal de Alçada de Minas Gerais, 6º Câmara Cível, Apelação Cível nº 221.201-1, Rel. Maciel Pereira; BRASIL. Tribunal de Alçada Cível de São Paulo, 7º Câmara Cível, Apelação Cível nº 489.330-00/9, Rel. Willian Campos, apud, TALAMINI, op.cit., p. 212. 19 BRASIL. Tribunal de Alçada de Minas Gerais, 3º Câmara Cível, Apelação Cível nº 228.881-7, Rel. Wander Marotta; BRASIL. Tribunal de Alçada do Paraná, 6º Câmara Cível, Apelação Cível nº 96.261-4, Rel.Ruy Fernando de Oliveira, apud, TALAMINI, op.cit., p. 219. 20 HUMBERTO JÚNIOR, op. cit., p. 385. 21 BRASIL. Tribunal de Alçada Cível de São Paulo, 4º Câmara Cível, Apelação Cível nº 520849, Rel.Rodrigues da Silva; BRASIL. Tribunal de Alçada Cível de São Paulo, 1º Câmara Cível, Apelação Cível nº 54836-00/7, Rel. Diogo de Salles, apud, TALAMINI, op.cit., p. 223. 21 obter tal força executiva. É necessário o aceite do devedor, ou na falta deste, cumulativamente o título deverá ser protestado e acompanhado de entrega e recebimento da mercadoria ou da prestação do serviço. Assim, ausente um deles como a falta de aceite por exemplo, ou desacompanhada do comprovante de entrega das mercadorias poderá ou não ser prova em ação monitória. A duplicata sem aceite, embora protestada, mas desacompanhada do comprovante de entrega, é aceita como prova na ação monitória porque o documento escrito exigido pelo legislador não precisa ser obrigatoriamente emanado pelo devedor. 22 O STJ no julgamento de um Recurso Especial afirmou que “A duplicata cuja validade não foi reconhecida pelo devedor (sem aceite), mas que tenha sido alvo de protesto não impugnado, autoriza o credor a propor ação monitória” 23 O contrato de abertura de conta corrente somado aos extratos de movimentação da conta por muito tempo foi considerado como titulo executivo, porém era alvo de críticas da doutrina. Até que em atendimento ao clamor que havia na doutrina o STJ acabou por sumular o entendimento acerca do assunto nas sumulas abaixo transcritas: Súmula 233: “O contrato de abertura de crédito, ainda que acompanhado de extrato da conta corrente, não é título executivo”. Súmula 247: “O contrato de abertura de crédito em conta corrente, acompanhado do demonstrativo de débito, constitui documento hábil para ajuizamento da ação monitória” Isto posto, concluí-se que os referidos documentos somente poderão ser utilizados em sede de ação monitória e não mais em processo de execução, pois o contrato por sua vez, não é capaz de expressar a liquidez da dívida que é exigida na execução, mesmo com os extratos, ficando desprovido de força 22 BRASIL. Tribunal de Alçada de Minas Gerais, 2º Câmara Cível, Apelação Cível nº 233363-4, Rel. Edivaldo George; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, 3º Turma, Recurso Especial nº 167.222, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, apud, TALAMINI, op.cit., p. 240. 23 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, 4º Turma, Recurso Especial nº 247342-MG, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, apud, TALAMINI, op.cit., p. 229. 22 executiva, mas enquadrando-se dentre as possibilidades de propositura da ação monitória.24 Outro ponto saliente de discussão é o título prescrito ser objeto de ação monitória. É inegável que nestes casos a ação executiva não é mais possível ante ao decurso do tempo, não possuindo mais o título exigibilidade, apesar de presentes a liquidez e certeza. Daí poderá ser útil a ação injuntiva, uma vez que a cártula servirá apenas como documento escrito sem força executiva, mas com a 25 liquidez e certeza da dívida que autoriza o pedido monitório . Há quem entenda, como por exemplo o desembargador Francisco Bueno, que apresenta posição contrária à acima exposta: “(...) não se presta a ação monitória para afastar a prescrição que alcançou uma cambial, servindo-se tão somente para a constituição de título executivo de negócio feito com o requerido, ou de obrigação por ele assumida”. 26 No entanto, em um ponto há convergência de pensamentos, é no que tange a responsabilidade do avalista de cambial que se encontra prescrita, pois a responsabilidade do avalista persiste enquanto são exigíveis os direitos oriundos do título, assim, não pago o cheque pelo sacado, prescrito o título e ultrapassado o prazo para a ação contra o portador, cessada está a responsabilidade do avalista.27 No que tange aos juros e à correção monetária incidente sobre a cambial prescrita que é objeto de ação monitória prevalece o entendimento de que se houve a prescrição do título pela inércia do próprio credor, estará prescrita 24 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, 3º Turma, Recurso Especial nº 188.375 e 203.768-RS, Rel. Min. Carlos Alberto de Menezes; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, 3º Turma, Recurso Especial nº 173.020-MG, Rel. Min. Valdemar Zveiter; BRASIL. Superior Tribunal de Justiça, 4º Turma, Recurso Especial nº 220.887-MG e 218.459-RS, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo, apud, TALAMINI, op.cit., p. 243. 25 BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal, 3º Turma, Apelação Cível nº 43965, Rel. Campos Amaral; BRASIL. Tribunal de Alçada Cível de São Paulo, 2º Câmara Extraordinária “A”, Apelação Cível nº 691359-1-SP, Rel. Min. Salles de Toledo; BRASIL. Tribunal de Alçada de Minas Gerais, 3º Câmara Cível, Apelação Cível nº 226.899-1, Rel. Wander Marotta; BRASIL. Tribunal de Alçada Cível de São Paulo, 10º Câmara Cível, Apelação Cível nº 61427/03, Rel. Marcos Martins, apud, TALAMINI, op.cit., p. 253. 26 BRASIL. Tribunal de Alçada de Minas Gerais, 6º Câmara Cível, Apelação Cível nº 210.933-1, Rel. Francisco Bueno, apud, TALAMINI, op.cit., p. 250. 23 também a cobrança dos juros referentes ao período anterior à citação (art 1.536 § 2º do CC c/c art. 219 caput do CPC). Já a correção monetária, não é um plus ao crédito, mas simples mecanismo destinado a evitar o enriquecimento sem causa do devedor ou, sob outro aspecto trata-se de uma mera “preservação do valor aquisitivo da moeda”, sendo irrelevante por isso a prescrição do título, devendo então iniciar a incidência a partir do momento em que se tornou exigível a dívida. O STJ inclusive já se manifestou a respeito para firmar posição neste sentido na súmula 43 (incide correção monetária sobre dívida por ato ilícito a partir da data do efetivo prejuízo).28 Neste tema de títulos de crédito, cabe uma abordagem especial ao cheque que é regulada pela Lei 7.357/85. Segundo o art. 59 desta Lei, o prazo de prescrição para propositura da ação executiva para cheques é de 6 meses, portanto, transcorrido este prazo, o cheque agora prescrito, poderá ser usado como prova escrita para a ação monitória Nos termos do art. 61 desta Lei, no prazo de 2 anos a contar da prescrição da ação executiva (que ocorre em 6 meses), é possível a propor uma “ação de enriquecimento contra o emitente ou outros obrigados que se locupletaram injustamente com o não pagamento do cheque” que é conhecida como ação de locupletamento. A jurisprudência dominante tem interpretado este artigo no sentido de que conquanto esta ação seja de conhecimento, não tem como causa de pedir a relação subjacente à emissão do cheque, ou seja, o próprio cheque funciona como causa de pedir. Portanto, se já se passaram 6 meses da emissão do cheque, este está prescrito e pode ser objeto da ação monitória, independentemente da relação jurídica que originou sua emissão, bem como dentro de 2 anos a contar desta prescrição de 6 meses, também poderá ser proposta a ação de locupletamento, 27 BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina, 4º Câmara Cível, Apelação Cível nº 98.0009537, Rel. Nilton Macedo, apud, TALAMINI, op.cit., p. 255. 28 BRASIL. Tribunal de Alçada de Minas Gerais, 1º Câmara Cível, Apelação Cível nº 251.202-7, Rel. Alvim Soares; BRASIL, Tribunal de Justiça de São Paulo, 6º Câmara Cível, Apelação Cível nº 24 que igualmente independe da relação subjacente, restando então ao credor optar pela ação de conhecimento ou pela ação monitória. Assim sendo, o prazo para a propositura da ação monitória para o cheque prescrito com a juntada apenas do cheque é de 2 anos, pois após este prazo será necessária a comprovação da relação jurídica material. 29 98.000434-9-RO, Rel. Sebastião T. Chaves; BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo, 9º Câmara Cível, Apelação Cível nº 59.545/8, Rel. Silva Rico apud, TALAMINI, op.cit., p. 256. 29 Neste sentido os julgados: BRASIL. Tribunal de Alçada Cível de São Paulo, 3º Câmara Cível, Apelação Cível nº 736.205-2, Rel. Antonio Rigolin; BRASIL. Tribunal de Alçada Cível de São Paulo, 12º Câmara Cível, Apelação Cível nº 760.379-2, Rel. Artur César. Berreto da Silveira; BRASIL. Tribunal de Alçada Cível de São Paulo, 11º Câmara Cível, Apelação Cível nº 745.140-5, Rel. Silveira Paulino apud TALAMINI, op. cit., p. 254. 25 CAPÍTULO 2 EMBARGOS NA AÇÃO MONITÓRIA 2.1 A expedição do mandado citatório e monitório Preenchidos todos os requisitos, detalhadamente expostos no capítulo anterior, o Juiz expedirá liminarmente inaudita altera pars o mandado monitório conforme preceitua o art. 1.102b: “Estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz deferirá de plano a expedição do mandado de pagamento ou de 30 entrega de coisa no prazo de 15 dias ”. É preciso inicialmente definir a natureza jurídica desta decisão. No entanto, neste tema existe enorme divergência doutrinária, pois os doutrinadores se dividem em três correntes: aqueles que acham que trata-se de uma decisão interlocutória; os que acham que é um mero despacho; ou que possui uma natureza híbrida. Para Alexandre Freitas Câmara31, Humberto Theodoro Júnior,32 Nelson Nery Júnior33, Vicente Greco Filho34, e Eduardo Talamini35 a expedição do mandado é uma decisão interlocutória pois em obediência ao art. 162 do CPC é uma decisão que não põe fim ao processo, e em muito se assemelha à decisão que defere a citação na execução de título executivo extrajudicial. O desembargador Carreira Alvim36 identifica uma natureza híbrida pois afirma que sob o prisma processual ela tem forma de decisão interlocutória mas 30 BRASIL,Código de Processo Civil. 871. ed. São Paulo: Manole, 2004. CÂMARA, apud SILVA, Flávia Machado. Análise sistemática da ação monitória no direito brasileiro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1997. p. 41. 32 THEODORO JÚNIOR, apud SILVA, ibidem., p.41 33 NERY JÚNIOR, NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado. 7.ed. rev. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 1211. 34 GRECO FILHO, Vicente. Comentários ao procedimento sumário, ao agravo e à ação monitória. São Paulo: Saraiva, 1996. p.52. 35 TALAMINI, op cit.,p. 94. 31 36 ALVIM, op. cit., p. 375. 26 conteúdo de decisão definitiva, podendo então ser equiparada a uma interlocutória mista. 37 O Dr. Sérgio Bermudes e o Dr. Ernane Fidélis dos Santos 38 consideram- na um simples despacho tal qual a que determina a citação de um devedor no procedimento comum pois em seu bojo não existe nenhum efeito declaratório de direito. No que tange à possibilidade de interposição de recurso desta decisão 39 também não há um entendimento único, pois para Raphael Salvador , Eduardo Talamini40, Vicente Greco Filho41 e Francisco Fernandes de Araújo42 existe a possibilidade de opor recurso de agravo já que o CPC adotou o sistema recursal de admissibilidade genérica pelo qual todo provimento que não seja sentença nem despacho será impugnável através de agravo. Enquanto que para Cândido Rangel Dinamarco, Carreira Alvim, Ernane Fidélis dos Santos43, Flávia Machado da Silva44, Sérgio Bermudes,45 Nelson Nery Júnior46 e Theodoro Júnior47 não existe interesse recursal para interposição do agravo pois o meio adequado para impugnar o mandado são os embargos, segundo clara disposição legal (art 1.102c do CPC). Portanto, para estes autores a decisão seria irrecorrível, já que existe remédio específico para combatê-la amplamente, que são os embargos. Mesmo que o mandado monitório tenha como objetivo maior o pagamento ou a entrega do bem, não se pode olvidar do seu caráter citatório, ainda que a lei silencie a respeito, pois no corpo do mandado inclui-se uma observação de que se não forem opostos embargos em 15 dias constituir-se-á o título executivo judicial. Por esta razão é que o termo “mandado de pagamento” utilizado pelo 37 BERMUDES, apud SILVA, op. cit., p. 41. SANTOS, apud TALAMINI, op. cit., p. 115. 39 Ibidem, p.116. 40 Ibidem, p.116. 41 GRECO FILHO, op. cit., p. 53 42 ARAÚJO, Francisco Fernandes de. Ação Monitória: Comentários à Lei nº 9.079 de 14 de Julho de 1995. 4.ed. São Paulo: Copola, 1996, p. 63. 43 DINAMARCO, ALVIM, SANTOS, apud TALAMINI, op. cit., p. 116. 44 SILVA op. cit., p. 49. 45 BERMUDES, apud SILVA, op cit., p. 49. 46 NERY JÚNIOR, op. cit., p.1211. 47 THEODORO JÜNIOR, op. cit., p. 386. 38 27 legislador deve ser interpretado como um mandado para dar ciência ao réu para que se defenda, bem como um mandado que o notifica a pagar ou entregar um bem ao credor, pois em caso negativo, será constituído o título. Observando o juiz o não preenchimento dos requisitos do art. 1.102a deverá indeferir a inicial ou mandar o autor emendar a mesma conforme o art. 284 do CPC. A decisão que indefere a inicial de uma ação monitória tem natureza de sentença e pode ser impugnável pelo recurso de apelação. No entanto, quando o Juiz não se convencer em seu juízo de verossimilhança, sobre a afirmação de crédito do autor deverá abrir a oportunidade para a emenda à inicial, pois não se trata de um problema de condição da ação ou pressuposto processual, e sim de mérito, uma vez que simplesmente não foi possível formar o convencimento do juiz com os documentos juntados, cabendo então ao autor, juntar novas provas. Poderá ainda o juiz, ao invés de conceder o mandado monitório, permitir que o feito prossiga sob o procedimento comum de conhecimento. Outrossim, se o defeito da petição inicial for insanável, não há outra possibilidade senão extinguir o processo sem julgamento de mérito (art. 267 do CPC). Com o deferimento da expedição do mandado monitório e o seu recebimento pelo devedor surgirão três 3 hipóteses: 1) efetuar o pagamento, ou entrega do bem, no prazo da citação (15 dias), 2) permanecer inerte (revel), ou, 3) oferecer embargos (art. 1.102c). Na primeira hipótese, poderá o devedor reconhecer sua dívida perante o credor e resolver imediatamente pagar, ficando isento de arcar com o ônus da sucumbência, ou seja, estará livre das custas e honorários advocatícios como determina o art. 1.102c, § 1º do CPC, e o juiz extinguirá o processo, por exaustão da prestação jurisdicional. O legislador, com tal medida quis levar o devedor a pensar duas vezes antes interpor embargos, só o fazendo se estiver convicto de obter decisão diversa da contida no mandado. Antonio Carlos Marcato, também argumenta neste sentido: 28 Representa mais que mera vantagem conferida ao réu, um convite à não interposição de embargos infundados ou protelatórios, afeiçoandose, assim, o ideal da busca da solução dos conflitos através da atividade direta das partes. 48 Todavia, não são todos que vêem vantagem em tal benevolência dada ao devedor, tal como o doutrinador Francisco Fernandes de Araújo: “Entendemos que este parágrafo é inconstitucional porque trata diversamente as partes, dando benefícios ao réu, mas prejudicando o autor, o que não é correto, muito menos justo”.49 Em sentido contrário desta linha de raciocínio está o doutrinador Eduardo Talamini, pois para ele não existe nenhuma inconstitucionalidade: A facultatividade da via monitória confere legitimidade constitucional à isenção: o autor tem a possibilidade de optar pelo processo comum de conhecimento; se prefere a demanda monitória, dispõe do recebimento de honorários advocatícios e reembolso de despesas.50 A segunda hipótese dada ao devedor é se manter inerte ante ao recebimento do mandado, ou seja, ele não realiza o pagamento e não oferece embargos. Neste caso será constituído imediatamente o título executivo judicial, pois o mandado inicial será automaticamente convertido em mandado executivo, como preceitua o art. 1.102c, assim, aberta estará possibilidade do credor de fazer uso do processo executivo, uma vez que agora já possui em mãos um título executivo. Adentrando profundamente neste tema faz se necessária a identificação da natureza deste fenômeno jurisdicional que converte o mandado inicial em titulo executivo. Preliminarmente destaca-se que o art 1.102c dispõe que se os embargos não forem opostos, se constitui de pleno direito o título executivo judicial, convertendo-se o mandado inicial em mandado executivo. Em razão deste termo “constitui-se de pleno direito” é que muitos autores afirmam que não há necessidade de sentença para operar a dita transformação que ocorre 48 49 MARCATO, apud LINS, op. cit., p. 14. ARAÚJO, op. cit., p. 76. 29 automaticamente, inclusive independentemente de decisão interlocutória. O que há é um despacho do juiz declarando ou certificando que uma vez transcorrido o prazo, in alibis, se formou o título executivo judicial na data em que foi expirado o prazo em que deveria ter sido cumprido. Conveniente a transcrição do trecho escrito por Vicente Greco Filho que transmite seu entendimento: Há que se observar, ainda que, o “título judicial”, constituído de pleno direito pela não apresentação dos embargos ou sua rejeição, é um título judicial sem sentença que existe nos moldes do processo de conhecimento. Trata-se de título judicial por equiparação e não pela natureza do provimento. Evidentemente é um título judicial sui generis, porque resulta da soma dos documentos, do provimento judicial interlocutório e o fato da não apresentação ou rejeição dos embargos.51(grifo nosso) Em contrapartida Nery Júnior52 entende que a decisão que determinou a expedição do mandado tem conteúdo e eficácia de sentença condenatória. Eduardo Talamini, segue o mesmo raciocínio da doutrina italiana como Calamandrei, Gabergnati, e Rosenberg53 afirmando que “a decisão monitória transformada em título executivo pela falta de embargos em nada se distingue da sentença proferida em processo comum de conhecimento em que houve revelia”.54 Assim, apresentada a natureza desta conversão, surge-nos o seguinte questionamento: Essa “decisão” faz coisa julgada mesmo sem a participação do devedor no processo? Novamente a doutrina diverge sobre o assunto. O autor Eduardo Talamini55 apresenta vasta argumentação sobre a inconstitucionalidade da atribuição de coisa julgada à decisão monitória quando não há embargos, embora sua posição seja minoritária. Afirma o autor que o 50 TALAMINI op. cit., p. 144. GRECO FILHO op. cit. p. 55. 52 NERY JÚNIOR, op. cit., p. 1211. 53 CALAMANDREI, GABERGNATI, ROSENBERG, apud TALAMINI, op cit., p. 97. 54 Ibidem., p. 98. 55 Ibidem., p. 103. 51 30 deferimento do mandado, com ouvida unilateral e à base de documentos, importa necessariamente em juízo de cognição sumária (superficial), diferentemente do que se dá na sentença proferida em revelia. Pelo tanto, conclui que como o instituto da coisa julgada tem por essência a imutabilidade, é constitucionalmente incompatível com decisão proferida com base em cognição sumária e, por isso mesmo provisória, e sujeita à confirmação. Demais autores como Carreira Alvim56, Theodoro Júnior57, Nery Júnior58, e 59 Flávia Machado da Silva limitam-se a falar que a decisão faz coisa julgada material, sem argumentar extensivamente como o autor Eduardo Talamini o fez. No que se refere ao recurso cabível ao devedor quando já ultrapassado o prazo para interposição dos embargos sem manifestação e transformado o mandado em título executivo que transita em julgado, é possível a interposição da ação rescisória nos casos do art. 485 do CPC, ou, como dispõe em sua obra Vicente Greco Filho60, que não é possível a ação rescisória porque esta pressupõe sentença de mérito, mas sim por ação anulatória ou declaratória de nulidade, contudo, nos casos do art 485 do CPC. A terceira hipótese trazida ao devedor quando do recebimento do mandado é apresentar embargos, que é a sua forma de defesa em ação monitória, de modo que será inaugurado o contraditório e converterá de plano o procedimento em ordinário. Salientando-se que este tema será abordado mais detalhadamente no próximo tópico. No que tange às formas de entrega deste mandado, considerando o seu caráter citatório e intimatório, deverão ser observadas as regras de citação do CPC, podendo então ser entregue por oficial de justiça ou pelas formas fictas previstas no código, tais como por edital (art 231 do CPC) ou por hora certa (art 277 do CPC). 56 ALVIM, op. cit., p. 376. THEODORO JÚNIOR, op. cit., p. 88. 58 NERY JÚNIOR, op. cit., p. 1211. 59 SILVA, op. cit., p. 42. 60 GRECO FILHO, op. cit., p. 55. 57 31 Essa possibilidade de enquadramento da citação ficta na ação monitória já trouxe inúmeras discussões principalmente dentro dos Tribunais e na doutrina. Tal controvérsia foi traçada em razão de que se o mandado de pagamento não for cumprido, e tampouco sejam apresentados embargos, o mandado se converterá automaticamente em título executivo judicial, e, em havendo citação ficta o título se formará sem qualquer participação do devedor, que agora só poderá se defender na execução. Ocorre que, embora o melhor entendimento fosse pela impossibilidade da citação ficta, em 28/04/2004 foi editada a Súmula 282 do Superior Tribunal de Justiça em que admite-se expressamente a possibilidade de citação ficta em ação monitória. Para o réu citado em uma de suas formas fictas que não comparece para pagar ou interpor embargos, aplica-se por analogia a súmula 196 do STJ que dispõe: “ao executado que, citado por edital ou por hora certa, permanecer revel, será nomeado curador especial, com legitimidade para apresentação de embargos”, ou seja, será nomeado curador especial para interpor os embargos. Neste caso de ausência do devedor citado por citação ficta, aplicar-se-á os mesmos argumentos quanto à recorribilidade da decisão que transforma o mandado inicial em titulo executivo judicial, que já fora mencionado anteriormente. 2.2 Embargos Monitórios Após o recebimento do mandado, como acima já fora explicitado, uma das opções as quais poderá se valer o devedor é defender-se por meio de embargos no prazo peremptório de 15 dias (a contar da data da juntada aos autos da prova da citação), eis que a instauração do contraditório fica a cargo do próprio devedor, que discutirá a pretensão do autor. 32 O prazo para interpor os embargos é peremptório, de modo que se não forem opostos tempestivamente, dará ensejo à formação do título executivo judicial, em razão da inércia do devedor, e não mais poderão ser propostos. Todavia, havendo interposição dos embargos a eficácia do mandado de pagamento ficará suspensa até que os mesmos venham a ser julgados de acordo com o disposto no art. 1.102c do CPC. O procedimento deixará de ser o especial monitório, e passando a seguir o rito ordinário, e assim, será admitida a ampla cognição do juiz sobre a lide como se fosse uma ação de conhecimento. É facultado ao devedor discutir nos embargos qualquer matéria lícita conforme permissão do art. 332 do CPC, assim a matéria de defesa é a mais ampla possível, abrangendo, conforme explica Humberto Theodoro Júnior: “toda exceção, material ou processual, que tivesse pertinência com uma ação ordinária de cobrança, poderá ser aventada na resposta à ação monitória”. 61 Os embargos monitórios são um incidente na ação monitória, e serão processados nos mesmos autos de acordo com o mandamento que consta no art. 1.102c §2º do CPC, além disso, não será necessário segurar o juízo, e tampouco realizar preparo, bastando dirigir sua petição juntamente com as razões de impugnação ao juízo da causa. Recebidos os embargos o juiz abrirá prazo para que a parte autora se manifeste, podendo impugnar com questões processuais e/ou de mérito, ou, permanecer inerte, caso em que estará “concordando” com as alegações deduzidas pelo embargante. Insta salientar que aqui o instituto da revelia por parte do autor não será considerado inteiramente, posto que já houve produção de provas na fase inicial do procedimento. Portanto, o silêncio do embargado não constituirá a presunção de que não ocorreram os fatos alegados anteriormente, o juiz deverá examinar o que irá prevalecer, qual será o elemento instrutório mais forte: o silêncio do embargado indicando a inexistência dos fatos constitutivos do seu direito ou a prova escrita produzida inicialmente. 61 HUMBERTO JÚNIOR, op. cit., p. 387. 33 Após a manifestação do autor da monitória, será aberta oportunidade para conciliação, que, obtendo êxito, será homologada pelo Juiz que extinguirá o processo com julgamento de mérito, se for frustrada, o processo será saneado e dará início à fase instrutória que findará com a sentença. 2.2.1 Natureza jurídica dos embargos A natureza jurídica dos embargos é fruto de uma divisão na doutrina em 2 duas correntes de posicionamentos divergentes. Parte da doutrina defende os embargos como mera defesa do réu, já que a lei não lhes conferiu o mesmo tratamento dispensado aos embargos de execução, devendo inclusive o autor ser intimado em réplica para se manifestar. Este entendimento é apoiado pelo desembargador Carreira Alvim, Sérgio Shimura62, Ada Pellegrini Grinover63 e Humberto Theodoro Júnior64. No entanto, subsiste o entendimento que prevalece na doutrina de que se trata de uma ação incidentalmente no curso do procedimento monitório, que é defendida pelos doutrinadores, Sérgio Bermudes, José Carlos Barbosa Moreira, Rogério Cruz e Tucci, Vicente Greco Filho, Eliane Macedo, Cândido Rangel Dinamarco citados por Eduardo Tallamini65. Estes últimos autores argumentam que a nomenclatura (embargos) utilizada pelo Código foi intencional, já que as leis são elaboradas por técnicos jurídicos que se preocupam com o nome dado aos institutos, afinal se o objetivo era que tivessem a natureza de defesa, teria utilizado o termo contestação. Para eles, os embargos seriam ação porque invocam jurisdição, onde é formulado um pedido para que seja desconstituído o pronunciamento que determinou a expedição do mandado monitório, assim, nos embargos não é pedida a 62 ALVIM, SHIMURA apud SILVA, op. cit., p. 50. GRINOVER, apud NERY JÚNIOR, op. cit., p. 1212. 64 THEODORO JÚNIOR, op. cit., p. 387. 65 BERMUDES, MOREIRA, TUCCI, GRECO FILHO, MACEDO, DINAMARCO, apud TALAMINI, op cit., p.146. 63 34 improcedência do pedido do autor, como ocorreria se eles fossem mera defesa do réu. Conveniente neste momento destacar a defesa de natureza de ação dos embargos da doutrinadora Flavia Machado Silva: O processo da ação monitória possui procedimento especial, onde há cognição sumária e expedição de mandado liminar. Quando o mandado é expedido, a cognição da ação monitória já foi encerrada e seu resultado foi apresentado por meio da decisão que determinou a citação do réu. Com o oferecimento de embargos, instaura-se novo processo, que será processado pelo procedimento ordinário. O pedido contido nesses embargos, que deram origem ao novo processo, é que será apreciado pelo juiz em sentença.66 2.2.2 Diferenças entre embargos monitórios e os embargos à execução Não se confundem os embargos monitórios e os embargos à execução. Nos embargos à execução, ao contrário do que ocorre com os embargos monitórios, será necessário garantir o juízo e serão processados em apenso, ou seja, autuados a parte, e ainda, não poderão ser alegados quaisquer tipos de defesa, além do prazo diferenciado de 10 dias. Já os embargos monitórios, são processados nos mesmos autos, e não é necessário garantir o juízo. Neste poderão ser alegadas quaisquer matérias processuais ou materiais dento de um prazo de 15 dias. 2.2.3 A decisão dos embargos Existe enorme controvérsia sobre a possibilidade de rejeição liminarmente dos embargos, pois, enquanto que para Carreira Alvim eles sequer podem ser rejeitados liminarmente porque não se rejeita a defesa (contestação) 66 SILVA, op. cit., p. 54. 67 68 oferecida na ação ordinária , para Cristiane Delfino e Eduardo Talamini 69 35 caso sejam rejeitados será proferida sentença terminativa, que desafiará recurso de apelação, ao passo que para Nery Júnior 70 71 e Cruz e Tucci, a decisão que rejeita os embargos é interlocutória, e pode ser modificada com recurso de agravo de instrumento, já que esta decisão não encerra nenhum processo (considerando-se que os embargos são defesa e não se processam em separado). Caso os embargos sejam rejeitados ao final, o juiz irá proferir sentença, subsistindo a eficácia inicial do mandado anteriormente suspenso, que se transformará de pleno direito automaticamente em título executivo judicial, dando início ao processo de execução. Cabe destacar que não é a sentença de rejeição dos embargos o “título executivo judicial” mas sim a decisão inicial concessiva do mandado monitório. Acolhidos os embargos cujas alegações foram reconhecidas pelo juiz, revogado estará o mandado inicial de pagamento e extinto será o processo, de modo que as relações entre as partes ficarão reguladas pela sentença, que faz coisa julgada material sobre a lide. Ao autor restará o ônus do pagamento das despesas processuais e honorários de advogado. Se acolhidos parcialmente os embargos, o mandado inicial também perderá sua eficácia, sendo regulada a relação processual pela sentença, já que não se pode manter dois atos judiciais distintos (mandado inicial e sentença). Segundo dispõe Humberto Theodoro Júnior poderá ser realizada a execução sobre o remanescente do pedido do autor não alcançado pela sentença.72 2.2.4 O recurso cabível e seus efeitos 67 ALVIM, op. cit., p. 390. LINS, op. cit., p.15-16. 69 TALAMINI, op cit., p.154. 70 NERY JÚNIOR, op. cit., p. 1212. 71 TUCCI, apud NERY JÚNIOR, op cit., p. 1213. 72 HUMBERTO JÚNIOR, op. cit., p. 387. 68 36 Após o recebimento dos embargos, no caso de rejeição ou acolhimento ao fina do procedimentol, poderão ser impugnados com o recurso de apelação. Quanto aos efeitos em que será recebido o recurso, paira controvérsia na doutrina. Há o entendimento de que é cabível o recurso de apelação em ambos os efeitos (devolutivo e suspensivo) para Cristiane Delfino 73 74 e Nery Júnior , pois não são verificadas nenhumas das hipóteses do art. 520 do CPC. O autor Eduardo Talamini 75 ainda argumenta que não é possível a extensão dos casos em que são recebidos os recursos no efeito devolutivo no art 520 do CPC, e também porque não se pode atribuir tamanha eficácia a uma sentença que se baseia numa pretensão que foi chancelada com fundamento em mero juízo de verossimilhança. Já para outra parte da doutrina não deve ser atribuído o efeito suspensivo à sentença, mas tão somente o devolutivo. Sérgio Bermudes76, Vicente Greco Filho, Cláudio da Costa Machado Alexandre Freitas Câmara77, entendem que seria o caso de enquadramento na hipótese do inciso V, do art. 520 do CPC, que autoriza o recebimento somente sob o efeito devolutivo. A discussão sobre os efeitos atribuídos ao recurso interposto, ganha relevância quando é avaliada a possibilidade ou não da execução provisória da sentença, que está regulada no art 587 do CPC, sendo certo que esta só é possível quando o recurso só tem efeito devolutivo. Destaca-se ainda sobre o tema, que em havendo o transito em julgado da sentença, e, contendo algum dos vícios descritos no art. 485 do CPC poderá ser proposta ação rescisória para rever a decisão. 73 LINS, op cit., p. 16. NERY JÚNIOR, op. cit., p. 1213. 75 TALAMINI op. cit., p.165. 76 BERMUDES, apud, NERY JÚNIOR, op cit.., p.1213. 77 GRECO FILHO, MACHADO, CÂMARA apud SILVA op. cit., p.64. 74 37 CAPÍTULO 3 FASE EXECUTIVA DO PROCEDIMENTO MONITÓRIO A formação do título executivo judicial que autoriza a execução imediata, será de duas maneiras quando se tratar de ação monitória. A primeira hipótese é quando ocorre a constituição do título executivo judicial pela rejeição dos embargos interpostos. Neste caso a relação jurídica passará a ser regulada pela sentença dos embargos e não pelo mandado inicial. Esta sentença será o título executivo judicial que autoriza o autor a prosseguir pelo procedimento agora executivo. A segunda hipótese é o caso de omissão do devedor citado, que se mantém inerte ante ao recebimento do mandado inicial, ou seja, não realiza o pagamento e tampouco interpõe embargos. Assim, transcorrido o prazo dos embargos, haverá a formação do título executivo judicial, que será o próprio mandado inicial, o qual se constitui de pleno direito em atendimento ao disposto no art. 1.102c do CPC, como já mencionado anteriormente. Em ambos os casos o processo executivo seguirá na forma prevista no Código de Processo Civil para títulos executivos judiciais: Livro II, Título II, Capítulos II e IV. Insta ressaltar que não será necessário que o autor interponha nova petição para que seja iniciada a execução, pois ela se realizará nos próprios autos, sendo iniciada após o escoar do prazo recursal com a expedição do mandado de pagamento feita pelo juiz para que o devedor pague a quantia pleiteada ou entregue o bem requerido. O mandado de pagamento expedido não terá caráter citatório até porque a citação já ocorreu no início do procedimento, agora o devedor é somente intimado como determina claramente o §3º do art. 167 do CPC. A razão de não haver nova citação é nítida quando se tem a noção de que não se inicia um novo processo, mas apenas uma nova fase do processo monitório, onde será preciso somente dar ciência ao devedor de que o feito foi convertido em executivo. 38 Pertinente a explanação do doutrinador Luiz Rodriguez Wambier citado na obra de Cristiane Delfino Lins a respeito: Precisamente por não existir solução de continuidade entre as etapas de cognição e de execução, não há nova citação do réu (a partir de então, “devedor” – art. 1.102c do CPC), pois ele não é chamado para participar de um novo processo. O ato que lhe dá ciência do mandado (agora já) executivo, abrindo-lhe a oportunidade para pagar ou garantir o juízo, é intimação operada no curso do processo. O § 3º do art. 1.102 c é claro quanto a isso.78 Oportuno sobre a questão destacar o fato de que a intimação deve ser na pessoa do devedor e não na pessoa do advogado, ainda que o devedor o haja constituído. Isso porque envolve a prática de atos pessoais do devedor e não do advogado, como garantir o juízo, permanecer inerte ou permitir que afetem seu patrimônio. O autor Eduardo Talamini79 traz em seu livro uma hipótese em que será possível, com o título executivo obtido na monitória proceder à execução em processo autônomo. É o caso de quando o autor propõe a ação monitória, e o juiz concede a expedição do mandado monitório, mas por algum motivo o processo é anormalmente extinto já na fase executória, como por exemplo quando o autor mesmo intimado deixa de praticar ato indispensável por desistência. Neste caso, será possível ser iniciado novo processo autônomo de execução cujo título será o mandado inicial gerado na primeira etapa do procedimento, já que a atividade jurisdicional desenvolvida nesta fase não ficará prejudicada. 3.1 78 79 Antecipação de tutela e execução provisória WAMBIER, apud LINS op. cit., p.17. TALAMINI, op. cit., p.173. 39 Existe um entendimento de que será possível, ainda que dentro do peculiar procedimento injuntivo da ação monitória, o pedido de antecipação de tutela prevista no art 273 do CPC. Tal entendimento possui o reconhecimento de Eduardo Tallamini.80 A antecipação poderá ser deferida caso o autor a requeira (art 273, caput do CPC) e demonstre o preenchimento dos requisitos do mesmo artigo, como o perigo de dano irreparável ou de difícil reparação (inciso I), ou esteja caracterizado abuso de direito de defesa ou propósito protelatório do réu (inciso II). Há de se observar que caso seja concedido o mandado, já estará caracterizada a verossimilhança favorável ao autor, sendo suficiente para que se considere cumprido o requisito do caput do art 273. Se a urgência alegada estiver muito latente, no momento da concessão do mandado inicial o juiz já poderá antecipar os efeitos da tutela. Pelo tanto, concedida a antecipação da eficácia executiva, o autor está autorizado a providenciar a execução provisória, sendo esta uma das duas situações admissíveis de execução provisória durante a ação monitória. Insta salientar que o provimento que concede a antecipação da tutela, por ser uma decisão interlocutória, poderá ser combatido pelo recurso de agravo de instrumento. Caso a antecipação seja feita junto à expedição do mandado deverá o réu interpor agravo de instrumento e ainda oferecer embargos monitórios ao mandado. O agravo de instrumento ainda será cabível se a antecipação for deferida no curso do processo. Se indeferido o pedido de antecipação de tutela, o autor também poderá valer-se do agravo de instrumento para impugnar a decisão interlocutória. E, tendo em vista a nova roupagem atribuída ao agravo de instrumento com a reforma do CPC, poderá ser atribuído ao recurso o efeito suspensivo ativo, para o caso de indeferimento da antecipação, ou somente o efeito suspensivo para o agravo que se refere à concessão da antecipação da tutela. 80 TALAMINI, op. cit., p.186. 40 A outra situação de cabimento da execução provisória é quando o título já se encontra constituído em razão da rejeição dos embargos, e o devedor interpõe apelação que é recebida somente sob o efeito devolutivo, cabendo então ao autor extrair carta de sentença e prosseguir na execução nos termos do art 521, in fine do CPC, salientando-se porém que como o próprio nome diz a execução é provisória, posto que encontra-se pendente recurso. Se o recurso for recebido com o duplo efeito, não haverá possibilidade de execução provisória, devendo o autor aguardar a decisão do recurso para prosseguir com a execução do Livro II, Título II, Capítulos II e IV do CPC. Oportuno destacar que a execução provisória obedecerá as disposições dos arts 588 e 589 do CPC que regulam as regras para as execuções provisórias. 3.2 Cabimento dos embargos de devedor Iniciada a fase da execução do título executivo judicial, e concretizado o ato de constrição patrimonial com a intimação do devedor, insurge a questão do cabimento ou não dos embargos de devedor como meio do devedor se opor à pretensão autoral. A questão não é pacifica, havendo posições contraditórias. Para a maioria da doutrina o cabimento dos embargos de devedor não encontra óbice no fato de se desenvolver em um mesmo processo cognição e execução, pois a lei apenas excluiu a hipótese de realização da execução em um novo processo, mas referiu-se expressamente aos preceitos do Livro II do CPC onde está prevista a possibilidade dos embargos de devedor, assim, a lei não excetuou o seu cabimento em sede de monitória. Além disso, o título possui uma declaração de certeza do débito, que tem como conseqüência a exigibilidade do pagamento da dívida ou entrega da coisa, sendo necessário que seja iniciado o procedimento de execução forçada. 41 No entanto, para o desembargador Carreira Alvim , é incabível a 81 possibilidade de novos embargos, ainda que o título executivo tenha sido precedido ou não de embargos monitórios, ou seja, mesmo na hipótese de omissão do réu na primeira fase, este não poderá interpor agora na fase executiva embargos de devedor. A única ressalva que aduz é a possibilidade apenas quanto aos embargos na execução de títulos judiciais que são os embargos à penhora, à arrematação, à adjudicação e de retenção. 3.2.1 Da matéria a ser alegada nos embargos Superada a questão do cabimento ou não dos embargos, já que grande parte da doutrina admite esta possibilidade, cabe neste momento a análise sobre a matéria que poderá ser levada a juízo nos embargos de devedor. O Código de Processo Civil restringiu as matérias que poderão ser objeto dos embargos de devedor durante a execução de acordo com o tipo de título que dispõe o credor. Por um lado, se o credor dispuser de um título executivo judicial, somente poderá alegar as matérias que se encontram no rol do art 741. Pois, pressupõese que como o título é judicial certas matérias já foram produto de discussões durante a instrução do processo de conhecimento que lhe antecedeu, atribuindolhes portanto o efeito da preclusão, já que não poderão mais ser fruto de novos debates na execução. Por outro lado, se o credor dispuser de um título executivo extrajudicial, foi contemplado pelo Código com uma vasta amplitude de assuntos a serem aduzidos, pois segundo o art. 745 do CPC será possível alegar as matérias do art. 741 e ainda qualquer outra matéria que alegável caso o processo fosse de conhecimento. Entendeu o legislador neste caso, que como o título foi constituído fora do âmbito do Poder Judiciário,não houve outro momento senão na execução 81 ALVIM, op. cit., p.388. 42 para o devedor argüir suas defesas contra o alegado crédito do autor, razão pela qual lhe disponibilizou um ilimitado rol de matérias de defesa no art. 745 do CPC. Pelo exposto, quando o tema é ação monitória nos surge a questão de que se o título constituído é judicial, mas que pode ter sido precedido ou não de embargos monitórios (defesa do réu) durante a fase “instrutória”, quais seriam as matérias a serem aduzidas na fase “executiva” nos embargos de devedor? As do art. 741 do CPC que se referem aos títulos executivos judiciais, ou as do art 745 do CPC dos títulos executivos extrajudiciais? Novamente aqui se encontra divergência doutrinária. Para a maioria da doutrina, somente poderão ser objeto da cognição do juiz nos embargos de devedor as matérias do art 741 do CPC que tenham sido precedidas ou não de embargos monitórios. São compreendidos neste grupo os autores: Vicente Greco Filho82, Humberto Theodoro Júnior83, Elaine Macedo, Rafael Salvador, Antonio Carlos Marcato84, Eduardo Talamini85, Cristiane Delfino Lins86, Carreira Alvim87 e Ernani Fidélis dos Santos88. O doutrinador Nery Júnior dispõe sobre o assunto, sem no entanto expor seu próprio posicionamento. No trecho abaixo resume em poucas palavras a tese desta corrente: Caso sejam opostos os embargos ao mandado monitório e a final, rejeitados, devem cingir-se à matéria do CPC 741, pois equivalem a embargos em execução fundada em título judicial em sentido estrito. Isto porque o réu, na ação monitória, teve ampla possibilidade de defesa, tendo podido alegar toda a matéria que lhe seria lícito deduzir em ação de conhecimento. Assim, nos embargos de devedor na execução, só pode alegar as matérias do CPC 741.89 82 GRECO FILHO, op. cit., p. 55. THEODORO JÚNIOR, op. cit., p. 388. 84 MACEDO, SALVADOR, MARCATO, apud TALAMINI, op cit., p. 176. 85 Ibidem., p. 176. 86 LINS, op. cit., p. 18. 87 NERY JÚNIOR apud ALVIM, op. cit., p.1213. 88 SANTOS, apud CALDERON, Nei. Ação Monitória no Direito Brasileiro (Uma reflexão diferenciada sobre o tema). 1.ed. Rio de Janeiro: Editora Universitária de Direito, 2004, p. 146 89 NERY JÚNIOR, op cit., p. 1213 83 43 A argumentação sustentada basicamente é que ocorre preclusão absoluta das matérias anteriores à constituição do título conforme o art. 474 do CPC, ainda que não tenha havido os embargos monitórios, ou seja, mesmo que o réu não tenha alegado qualquer matéria na fase de conhecimento porque foi “revél”. 90 Alega Vicente Greco Filho que, tenha havido ou não o contraditório efetivo, desde que se tenha dado a oportunidade de fazê-lo, não haverá qualquer irregularidade, já que o próprio devedor foi quem deixou transcorrer o prazo para embargos monitórios e não se manifestou. Outro argumento trazido por estes doutrinadores é de que o título é judicial, e, em respeito ao Código de Processo não caberá ao interprete aumentar o âmbito de incidência de alegações deduzíveis em embargos que impugnam títulos judiciais com a combinação dos arts 741 com o art 745, já que o legislador foi taxativo quanto a restrição somente ao art. 741 do CPC, não dando margem a qualquer interpretação extensiva só porque trata-se de ação monitória. Além disso, o título judicial é constituído, mesmo que de forma abreviada dos procedimentos de cognição e injunção, detendo uma declaração de certeza tamanha como a de uma verdadeira sentença de processo de conhecimento no rito comum ordinário. Admitir a alegação de defesas do art. 745 do CPC, seria rebaixar o título que é judicial (tal como sentença), a um mero título extrajudicial que sequer correu pelas mãos do Judiciário, fazendo com que a vontade do legislador de que a ação monitória produzisse título executivo judicial não tivesse qualquer efeito. Ainda é preciso destacar o entendimento de que o título judicial formado na ação monitória faz coisa julgada material, ainda que de cognição sumária, concedendo força de imutabilidade às questões que integraram a fase anterior à execução. A atribuição dos efeitos da coisa julgada é o ponto crucial levantado por estes autores, pois a definição do termo coisa julgada por si só já 90 GRECO FILHO, op. cit., p. 55. 44 transparece o caráter invariável das matérias já julgadas, ou que poderiam ter sido alegadas se os embargos fossem interpostos. A outra parte da doutrina é minoritariamente composta pelos autores: José Rogério Cruz e Tucci91, Carlos Alberto Silveira Lenzi92, Nei Calderon93, defendem a possibilidade de alegação de quaisquer matérias nos embargos de devedor, tanto as contidas no art. 741 como do art. 745 do CPC. Essa corrente é uma corrente mais tradicionalista e conservadora, pois acha incabível ou no mínimo inconstitucional cercear a defesa do devedor, principalmente daqueles que não apresentaram embargos na primeira fase do procedimento porque se mantiveram inertes. Neste sentido afirma Nery Júnior, que como já mencionado anteriormente, apresenta os argumentos de ambos entendimentos da controvérsia: A inércia do réu, que deixou de opor embargos ao mandado monitório, não dá ensejo a que seja apenado com medidas restritivas de defesa. Tendo em vista a cognição sumária procedida pelo juiz na expedição do mandado monitório, a preclusão da defesa, aqui, tem menor abrangência do que a decorrente da revelia no processo de conhecimento amplo. Assim, os novos embargos opostos na execução, nada obstante tratar-se de execução fundada em título judicial, seguem o regime do CPC 745, isto é, são de abrangência ampla e podem versar sobre toda e qualquer matéria, inclusive sobre as questões de ordem pública não acobertada pela preclusão nesse caso.94 Os defensores desta tese argumentam também na proteção dos interesses daqueles que ficaram omissos ante ao recebimento do mandado monitório, que este tipo de “revelia” não pode ser comparado ao que ocorre no procedimento comum. Nestes, o réu não fica cingido a se defender em um único momento como na monitória (15 dias para embargos), mas pode a qualquer 91 TUCCI, José Rogério Cruz e. Ação monitória. 2.ed. rev. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1997, p. 94 92 LENZI, apud., CALDERON, op. cit., p. 147. 93 Ibidem., p. 147. 94 NERY JÚNIOR, op. cit., p.1213. 45 tempo ingressar no processo e apresentar documentos que corroborem sua defesa. Isso sem falar que para Nei Calderon95 seria um enorme desrespeito aos princípios da coisa julgada e da ampla defesa dar a mesma certeza aos títulos monitórios dos títulos que foram obtidos mediante amplo contraditório em procedimento comum. 96 Rogério Cruz e Tucci , mais precavido, prefere, atribuir a possibilidade de ampla defesa do art. 745 do CPC somente quando o devedor se manteve silente na fase inicial, pois também seguindo a linha de raciocínio dos demais autores afirma que este réu não pode ter suas matérias de defesas limitadas objetivamente ao art. 741 do CPC uma vez que este título não adveio de um processo judicial onde se viabilizou o mais amplo contraditório entre as partes. Daí porque a execução fundada nesse título não tem por pressuposto a “certeza inequívoca” do direito do credor, não podendo ser negado o seu direito de paralisar a execução infundada ou injusta que é promovida pelo credor. 95 CALDERON, op. 96 TUCCI, op. cit., p. 148. cit., p. 96. 46 CAPÍTULO 4 CABIMENTO DA AÇÃO MONITÓRIA EM FACE DA FAZENDA PÚBLICA 4.1 Origem do problema No que tange à legitimidade passiva, o tema mais discutido na doutrina e jurisprudência sem sombra de dúvida é a possibilidade da Fazenda Pública ser demandada como devedora na ação monitória. Toda essa discussão surgiu porque a lei instituidora da ação monitória, não proibiu nem autorizou seu cabimento, ou seja, foi omissa, já que não restringiu e tampouco admitiu expressamente o seu entendimento. Diante disto, brotaram vários questionamentos doutrinários quanto à conduta do legislador, se este realmente não desejou admitir a fazenda como ré, ou se ele se “esqueceu” de afastar a utilização do novo procedimento neste caso. Os doutrinadores que tendem a admitir a hipótese da fazenda como demandada em ação monitória, utilizam um famoso Princípio de Hermenêutica para explicar a situação: Não se faz lícito ao intérprete da norma restringir onde o legislador expressamente não o fez, pois se assim o fosse, estaria sendo estabelecida uma desigualdade de tratamento que vai de encontro com o Princípio da Isonomia. Para eles não houve lapso de memória do legislador, o legislador quis estender à pessoa fazendária, tal como ocorre no direito Italiano. Por outro ângulo, há a interpretação de que já que a própria constituição no art 100 determinou regulamentação específica para a execução contra a fazenda, bem como o Código de Processo Civil, que ditou regras próprias em capítulo somente para tal execução, fácil de se concluir que não seria necessária mais uma norma excepcional contra a fazenda, por entender que todas as suas regras já estavam claras e incompatíveis com o novel instituto. Neste sentido o Ministro Luiz Pereira, nos autos de um recurso especial: 47 O legislador quando quis disciplinar o uso do processo executivo contra a fazenda instituiu todo um capítulo para esse fim, dotando-o de particularidades próprias (CPC, art. 730). Se, ao disciplinar a ação monitória – cuja característica é mais de natureza executiva do que cognitiva – omitiu-se em fazer disposições específicas atinentes às ações propostas contra a fazenda pública, tudo indica que, intencionalmente, quis limitar o seu uso às lides havidas entre particulares.97 4.2 Como ocorre a execução contra a fazenda Antes de adentrar profundamente no tema, e nos argumentos defensivos de cada posicionamento doutrinário e jurisprudencial, é preciso compreender melhor como é possível a execução em face da fazenda pública, para só então confrontar o rito procedimental especial adotado pelo legislador na ação monitória com todos os requisitos legais para quando a fazenda pública é ré, e verificar se há ou não adequação entre eles. A execução contra fazenda pública, englobando-se nesta expressão as pessoas jurídicas de direito público interno (União, Estados, Municípios, Distrito Federal, autarquias e fundações públicas), encontra-se prevista separadamente dos demais tipos de execução nos arts 730 e 731 do CPC na seção III, capítulo IV e título II e na Constituição em seu art. 100. Estes artigos destacam essencialmente que os créditos contra a fazenda pública devem seguir a ordem de pagamento por precatórios. Outra peculiaridade de que goza a fazenda, é que todas as sentenças onde for sucumbente obrigatoriamente devem ser submetidas ao duplo grau de jurisdição (art. 475, II do CPC), ou seja, sofrem reexame necessário, de modo que só produzirão efeitos após a apreciação da instância superior. 97 PEREIRA, apud CUNHA, Graziela. CPC: É possível propor ação monitória em face da fazenda pública? [s.l.]: Direito, 2003. Disponível em: 48 Este reexame necessário tem como efeito principal o fato de que o objeto levado a instancia superior indispensavelmente deve ser uma sentença de mérito de juiz de primeiro grau, ou seja, não são quaisquer ordens de pagamentos que podem ingressar na “fila” dos precatórios, mister se faz que seja um título executivo judicial (provimento de mérito jurisdicional precedido de processo de conhecimento onde tenha sido concedido amplo direito de defesa à fazenda, vez que contra ela não se produzem os efeitos da revelia, tal como a confissão ficta, pois a fazenda não possui o mesmo regime dos demais demandados). Outros pontos importantes são que os prazos processuais correm em dobro contra a fazenda, e esta não é citada para pagar sob pena de penhora em sede de execução, mas sim para opor embargos em 30 dias. Esta regra se justifica no fato de que os bens públicos são impenhoráveis, sendo impossível que se promova penhora sobre os bens afetados ao patrimônio público, em razão de sua essencialidade na serventia à população, que não poderá sofrer conseqüências pela inadimplência fazendária. 4.3 A divergência doutrinária Ante estas considerações iniciais, tornam-se claras as peculiaridades do procedimento de execução contra a fazenda pública, que visam tutelar o orçamento público. Claro que não se pode olvidar que existe um excessivo rigor e proteção somente porque trata-se da fazenda pública, que até poderia se considerar como burla ao Princípio da Isonomia das partes no processo, mas esta é uma outra enorme discussão que não se faz necessária no momento. Agora, ciente de todas as especialidades que goza a fazenda pública, e de todas as questões que envolvem a ação monitória demonstradas ao longo deste trabalho, será possível uma melhor compreensão dos argumentos da controvérsia < http://www.direitoassessoria.com.br/juris3.asp?codigo=73>. Acesso em 18. Out. 2004, p.1. 49 doutrinária sobre o cabimento da fazenda pública ser demandada em ação monitória. Dentre os que defendem a inviabilidade da ação monitória em face da fazenda pública estão os doutrinadores: Eduardo Talamini98, José Rogério Cruz e 99 100 Tucci , Cristiane Delfino Lins 101 Marcato , Antonio Raphael Salvador, Antônio Carlos 102 e Humberto Theodoro Júnior . Vicente Greco Filho, um dos defensores desta posição, apresenta os seguintes argumentos: Descaber ação monitória contra a Fazenda Pública, contra a qual deve haver título sentencial, com duplo grau de jurisdição, para pagamento por meio de ofício requisitório, tal como previsto no art. 100 da Constituição da República, e dotação, orçamentária. Contra a Fazenda não se admitem ordem de pagamento e penhora, devendo, pois, haver processo de conhecimento puro, com sentença em duplo grau de jurisdição e execução, nos termos do arts. 100 da Constituição e 733 do Código.103 Os autores enfatizam que o procedimento monitório seria incompatível com as peculiaridades da execução contra a fazenda, como por exemplo a exigência do art 100 da CF de precatório o que por si só já serviria para derrubar o principal objetivo da ação monitória que é tentar fazer com que o devedor realize o pagamento com o simples recebimento do mandado monitório, em troca da benesse de se ver livre de arcar com as custas e honorários advocatícios. Ocorre, que a fazenda não pode ser compelida a pagar sem sentença que se submeta a duplo grau de jurisdição e que entre na ordem de precatórios, isso sem falar que a “vantagem” de se livrar de arcar com custas e 98 TALAMINI, op. cit., p. 179. TUCCI, op. cit., p. 74. 100 LINS, op. cit., p. 4. 99 101 SALVADOR, MARCATO apud CALDERON, op cit., P. 84. 102 THEODORO JÚNIOR, op. 103 GRECO FILHO, op. cit., p. 384. cit., p. 52. 50 honorários não é relevante para a fazenda, uma vez que as pessoas jurídicas de direito público são isentas deste ônus. Alguns doutrinadores acreditam que se existisse a possibilidade da fazenda, tão logo recebesse o mandado, o cumprisse, daria a margem à esperteza dos devedores que tentariam burlar a fila dos precatórios, esperando por exemplo o título perder a força executiva, para ser legitimado a propor a ação monitória e depois, com a expedição do mandado, a fazenda realizaria rapidamente o pagamento. Ou, por outro lado deixaria uma brecha para subjetivismos no procedimento, de modo que se o dirigente de um ente público tivesse simpatia pelo credor, caso recebesse o mandado, prontamente o cumpriria, ao invés de embargar e inaugurar o moroso rito ordinário, livrando o credor das delongas do processo de conhecimento e dos precatórios. Humberto Theodoro Júnior enfatiza a questão dos precatórios à qual devem ser submetidos os créditos contra a Fazenda como dispõe o art. 100 da CRFB: Pensamos que a orientação em tela não pode ser transplantada para o Direito brasileiro, em face das características de nosso regime de execução contra a Fazenda Pública, que pressupõe precatório com base em sentença condenatória (CF, art 100), o que não existiria, no caso de ação monitória não embargada. Além do mais, a Fazenda Pública tem a garantia do duplo grau de jurisdição obrigatório, a ser aplicado em qualquer sentença que lhe seja adversa (CPC, art. 475, inc. II) e a revelia não produz contra ela o efeito de confissão aplicável ao comum dos demandados (CPC, art. 320 inc. II). Com todos estes mecanismos de tutela processual conferidos ao Poder Público quando demandado em juízo de acertamento, torna-se realmente inviável, entre nós, a aplicação da ação monitória contra a Administração Pública. 104 Superada a questão do recebimento do mandado, admitindo-se a impossibilidade de a fazenda ser compelida a pagar a dívida de plano com o recebimento do mandado, poderia ser argumentado que já que não pode pagar 104 HUMBERTO JÚNIOR, op. cit., p. 384. 51 que então interponha embargos. Mas, pode acontecer da fazenda perder o prazo e não embargar e nem proceder ao pagamento, ou seja, ocorreria o silêncio, inércia da fazenda, daí que o mandado inicial ganharia força executiva imediata tornando-se de pleno direito o próprio título executivo judicial. No entanto, contra a fazenda não se produz o efeito da revelia, como a confissão ficta, e diante disso como seria resolvida a questão? O mandado ganharia a força executiva admitindo-se todas as alegações autorais contra a fazenda? Isso seria impossível pela flagrante afronta à lei. Alguns autores que defendem a compatibilidade da ação monitória em face da fazenda pública, alegam que diante da impossibilidade do cumprimento espontâneo pela fazenda ante o recebimento do mandado, que esta ficaria sempre obrigada a embargar. Certamente que opostos os embargos, restam minimizados todos os problemas que cercam o tema. Porém, os defensores do entendimento da incompatibilidade contra-argumentam que a tutela processual do credor não poderá ficar condicionada, ou dependente de uma possível atitude a ser tomada pelo devedor, de modo que seu título só se constituirá se a fazenda apresentar embargos. Todos esses obstáculos afetam a questão norteadora da ação monitória que é a celeridade, fortalecendo a opinião dos que entendem pela impossibilidade de ser proposta a ação monitória em face da fazenda pública. A doutrinadora Cristiane Delfino no trecho abaixo enfatiza esta questão da celeridade: Embora seja bem fundamentada a linha de pensamento daqueles que entendem ser cabível a interposição da ação monitória em face da Fazenda Pública, o melhor entendimento deveria ser quanto à sua impossibilidade. Pois se admitida a possibilidade da referida ação contra a Fazenda Publica, com as ressalvas e benefícios que a Fazenda possui, tais como o prazo em dobro para a interposição de embargos, o duplo grau de jurisdição, e o prosseguimento da execução nos moldes do artigo 730 do Código de Processo Civil quando convertido o mandado inicial em executivo, estaríamos abolindo por 52 completo o objetivo primordial da ação monitória, ou seja, a obtenção do título executivo sem as delongas do procedimento ordinário.105 Cada autor interpreta o conjunto de obstáculos apresentados ao caso suscitado como ofensa a algum elemento primordial de uma ação para justificar tal negativa. Alguns tratam o tema sob a ótica da ilegitimidade passiva da fazenda para figurar no pólo passivo, enquanto que para Rogério Cruz e Tucci106, ocorre ofensa a uma das condições da ação, que é o interesse processual, e, para Eduardo Talamini107 existe a impossibilidade jurídica do pedido por “inadequação do remédio”, em outras palavras, não é possível em sede de ação monitória um pedido contra a fazenda porque o procedimento é inadequado. Já em posição contrária, no sentido da admissibilidade da Fazenda Pública como parte adversa na ação monitória estão Ada Pelegrini Grinover108, J. Eduardo Carreira Alvim109, Helder Martinez Dal Col110, Orlando de Assis Corrêa, Salvio de Figueiredo111, Nei Calderon112, Cândido Rangel Dinamarco113 e Luiz Fux114. Na visão desta corrente doutrinária, o procedimento monitório não colide com o rito executivo específico da execução contra a fazenda pública previsto no art. 730 do CPC, pois entendem, que deve haver uma aplicação ordenada das regras de execução da fazenda em harmonia com o rito da ação injuntiva. O ministro Luiz Fux, em julgado proferido em sede de recurso especial sintetiza os argumentos em defesa de sua teoria: A solução para a questão da possibilidade da propositura da ação em face fazenda pública deve ter como ponto de partida a hermenêutica legislativa. Os dispositivos que tratam da matéria não comportam uma 105 LINS, op. cit., p. 7. TUCCI, op cit., p. 75. 107 TALAMINI, op cit., p.180. 108 GRINOVER, apud, TALAMINI p. 180 109 ALVIM, op. cit., p. 393. 110 COL, op. cit., p. 10. 111 CÔRREA, FIGUEIREDO, apud CALDERON, op cit., p.84. 112 Ibidem., p. 84. 113 DINAMARCO, apud TUCCI op. cit., p. 75. 114 FUX, apud CUNHA, op cit., p.2. 106 53 leitura isolada, devendo ser cotejados não apenas com outros comandos legais inseridos na mesma norma, o CPC, senão também com outros dispositivos existentes, especialmente aqueles que tenham assento na Constituição Federal, de forma a homenagear o Princípio da unidade do ordenamento jurídico115 O recebimento do mandado inicial pela fazenda, segundo Helder Martinez Dal Col116 poderia ser perfeitamente cumprido, pois argumenta o autor que não é necessário que toda dívida contra a fazenda seja submetida à execução, pode haver pagamento espontâneo, uma vez que há de se presumir que se a fazenda assumiu uma dívida, certamente este valor já possui previsão na dotação orçamentária do ente fazendário em questão, até porque não significa que a fazenda seja uma devedora contumaz. Ainda há de se cogitar a hipótese de que o inadimplemento da fazenda que ensejou a propositura da ação monitória, pode ter sido um mero atraso, que poderá ser resolvido logo com o recebimento do mandado injuntivo inicial, proporcionando ao credor uma rapidíssima solução para seu caso. Não deixar de lembrar que a monitória não possui em seu bojo qualquer meio de constrição ao patrimônio do réu, pois o mandado inicial traz somente a faculdade do devedor de pagar a dívida ou apresentar embargos. Pelo tanto, o pagamento com o recebimento do mandado não tem força de condenação contra a fazenda, a qual se o fosse deveria sim ser submetida a precatórios, mas tratase apenas de uma cobrança, que em sendo paga extinguirá a relação creditícia, não tendo que se falar em precatórios. Em contrapartida se não houver pagamento e nem opuser embargos, ou se interpostos forem rejeitados, acarretará a formação do título executivo, que aí sim terá caráter condenatório, pois a dívida já estará revestida do reconhecimento do Poder Judiciário, e deverá neste caso ser submetida a precatórios. Até mesmo este argumento de que o crédito contra a fazenda deve entrar na fila dos precatórios não é empecilho para a ação monitória, pois após a 115 Ibidem., op. cit., p.2 54 formação do título executivo judicial, na fase final de cognição sumária pelo juiz, será iniciada a fase executiva que seguirá o rito em conformidade com as regras do CPC para execução contra a fazenda. Se a fazenda não quiser realizar imediatamente o pagamento, deverá propor os embargos, onde poderão ser deduzidas quaisquer matérias de defesa (posto que o processo se converterá automaticamente em processo de conhecimento), tal como um particular, e, ao final se os seus argumentos não forem acatados, formará o título executivo que se submeterá ao duplo grau de jurisdição e, posteriormente a precatórios. Posteriormente, na fase executiva, será novamente citada a fazenda, mas não haverá atos constritivos de patrimônio, a citação terá a especial finalidade de que a fazenda interponha embargos, não o fazendo ou se estes forem julgados improcedentes aí será expedido o precatório. Ada Pelegrini Grinover, é citada por quase todos os autores quando abordam o tema pela simplicidade com que consegue resolver o conflito: Não vejo nenhuma incompatibilidade entre um procedimento que visa exclusivamente a abreviar o caminho para formação de um título executivo e a execução deste título executivo contra Fazenda Pública, que virá depois. O que se consegue, através do procedimento monitório, nada mais é do que o título executivo. Se posso fazer valer um título contra a Fazenda Pública, pelas formas próprias, adequadas à execução contra a Fazenda Pública, também posso constituí-lo de forma abreviada contra a mesma Fazenda Pública. Sem dúvida nenhuma há documentos escritos que podem ser utilizados e que não têm força de título executivo contra a Fazenda Pública, como, v.g., o empenho. Tratar-se-á somente de observar as prerrogativas da Fazenda Pública no procedimento monitório, benefício de prazo para embargar (contestar) e talvez, a garantia do duplo grau quando a sentença condicional se consolidar. Apenas em caso de não oposição de embargos, a Fazenda Pública poderá embargar a execução de maneira 116 COL, op. cit., p. 6. 55 ampla, mas essa visão não se aplica só a ela, mas a qualquer devedor que não tenha impugnado o mandado inicial. 117 (grifo nosso) Outra situação de relevante argumentação pela doutrina contrária, é a impossibilidade da fazenda sofrer os efeitos da revelia quando não interpõe embargos e não atende ao pagamento do mandado. Ocorre que, para esta corrente havendo silêncio na fase cognitiva da ação monitória simplesmente a fazenda terá contra si um título executivo judicial, que seguirá normalmente as regras de execução do art 730 do CPC Seção III que integra o Capítulo IV, e, este capítulo inclusive foi incluído pelo próprio legislador dentre os dispositivos norteadores da fase executiva da ação monitória que segundo o art. 1.102c do CPC é o Livro II, Título II, Capítulo I e IV, ou seja, inexiste empecilho legal pra à execução do título cuja constituição se deu sem a participação do ente fazendário. Ainda é pertinente a alegação de que os efeitos da revelia na ação monitória são relativos, pois não ocorre preclusão das matérias de defesa, já que poderão ser alegadas nos embargos de devedor já na execução com fulcro no art. 745 do CPC. Claro que esta questão de matérias a serem alegadas nos embargos também é discutível, mas somente os autores que concordam que não há preclusão é que mantêm esta argumentação bastante coerente para afastar a aparente incompatibilidade. Em tese, poderia ser alegada afronta ao principal efeito positivo da ação monitória, a celeridade, devido ao excesso de prerrogativas que goza a fazenda, que fariam com que processo demorasse tanto quanto se fosse uma ação comum de conhecimento pelo rito ordinário. Porém, mesmo com o prazo dobrado para a fazenda e a necessidade de remessa à instância superior (reexame obrigatório) o credor só tem a ganhar mesmo assim, pois a cognição realizada sobre o seu título, desprovido de força executiva será sumária, o que não impedirá a aplicação dos arts. 1.102a a 1.102c do CPC em obediência ao art. 475,II do CPC. 117 GRINOVER, apud COL, op cit., p. 5. 56 Diante de toda esta argumentação, entendem os autores desta posição que não existe ofensa à lei e nem aos princípios que regem a ação monitória e tampouco aos princípios protetores dos entes fazendários, não havendo motivos para restringir a propositura da ação monitória em face da fazenda pública. Mas, infelizmente, nos dias atuais, ainda não é possível estabelecer qual a posição mais aceita pela doutrina ou pelos Tribunais. Existe um movimento forte dentro da 1º e 4º turmas STJ no sentido de admitir a fazenda como demandada no procedimento monitório em recentes julgados. 57 CONCLUSÃO Em linhas gerais os pontos mais importantes da ação monitória, bem como os principais pontos controvertidos, espera-se que agora já estejam esclarecidos. Nesta fase final é preciso refletir sobre aspectos positivos e negativos constatados ao longo deste percurso. Num primeiro momento, antes da ação monitória ser incluída em nosso ordenamento, existia uma lacuna legal que necessitava ser sanada, pois não existia nenhum procedimento que proporcionasse ao credor uma rápida constituição de seu documento em título executivo judicial. Hoje, a ação monitória encontra-se presente no Código de Processo Civil, e não se pode olvidar que essa suposta rapidez proporcionada pelo novel instituto, fica subordinada à vontade do devedor de pagar imediatamente quando do recebimento do mandado, ou, à não interposição dos embargos, pois aí sim há rápida formação do título, ao passo que se houver interposição, haverá conversão do feito em ordinário, tão moroso e caro como o processo de conhecimento que tanto se objetivava afastar desde o inicio dos tempos. Daí chega-se a questionar se a monitória veio efetivamente para facilitar a vida do credor ou não. Ainda foi possível concluir que o legislador foi muito omisso. Várias questões são levadas a discussão pela doutrina pelo simples fato de o legislador não ter deixado expressamente sua vontade, como por exemplo, ao não afirmar se a fazenda pública pode ser ré ou não, ou até mesmo quando não consignou as matérias a serem ventiladas em eventuais embargos de devedor quando o réu não se manifestou na fase cognitiva. Todas estas questões dão margem ao surgimento de decisões dos mais diversos tipos sobre o tema, o que ao longo do tempo podem chegar a denegrir a imagem do instituto e a praticamente anular seus efeitos positivos. Também deve-se consignar que com simples soluções seria alcançado um ponto de alto louvor doutrinário e jurisprudencial, em razão do afastamento de 58 questões tidas como controversas e melhor adequação do instituto aos dias atuais. Uma solução para dirimir melhor os conflitos que envolvem as provas escritas seria a admissão de registros informatizados, que é uma realidade significativa em termos de relações comerciais e que infelizmente não pode ser objeto de uma ação monitória, isso sem falar dos demais tipos de provas até mesmo documentais, que se produzidas de modo simples também poderiam ser levadas à inicial. Outras soluções, tais como expressa previsão autorizando a execução provisória e as hipóteses de sua admissibilidade afastariam especulações infundadas sobre o tema. A definição dos efeitos atribuídos à apelação interposta, impediria que cada caso tivesse tratamento diferenciado, pois se existe a omissão, existe a margem para decisões em sentidos opostos. Tais soluções melhorariam a confiança dos credores em obter seu crédito pela ação monitória, pois transpareceria a segurança jurídica almejada por toda a sociedade de que todos os casos serão tratados da mesma maneira, e não haveriam decisões diferenciadas para um ou outro demandante. Outro ponto também de interessante constatação ao longo da pesquisa, é a insatisfação dos demandantes que não vêem mais tantas vantagens em propor a ação monitória, vez que cercada de tantas controvérsias, e de tutela praticamente inócua, pois em quase todos os casos há a interposição dos embargos que converte o feito em ordinário, uma vez que a simples isenção de honorários e custas não tem sido suficientemente forte para afastar os embargos. Claro que não existem somente críticas a serem feitas a respeito da ação monitória, pois surgiu no ordenamento com o objetivo primordial de facilitar a vida do credor, ainda que esse objetivo não tenha sido alcançado em sua plenitude, veio trazer uma opção de se chegar à execução sem deter um titulo executivo, pois até então somente alguns credores gozavam desta prerrogativa. Ainda existe o fato de que até mesmo os credores detentores de titulo executivos que por algum motivo deixassem de preencher algum requisito da executoriedade, seriam rebaixados tal como o portador de um documento qualquer, à ação de 59 conhecimento. A ação monitória, chegou para intermediar este paralelo, deixando para o rito ordinário puro somente os documentos não-escritos pela não adequação à celeridade norteadora da ação monitória. Por todo o exposto, há de se concluir que não obstante existam inúmeras críticas à ação monitória, seu objetivo é muito nobre se alcançado perfeitamente, só necessitando atualmente de pequenas pacificações das questões controversas para que passe a ser encarada com mais seriedade pela comunidade jurídica. 60 BIBLIOGRÁFIA ALVIM, J. E. Carreira. Código de processo civil reformado. 3.ed. rev. e ampl. Belo Horizonte: Del Rey, 1996. ARAÚJO, Francisco Fernandes de. Ação Monitória: Comentários à Lei nº 9.079 de 14 de Julho de 1995. 4.ed. São Paulo: Copola, 1996. BERMUDES, Sérgio. Ação monitória é obrigação ilíquida. [s.l.]: Consultor Jurídico, 2000. Disponível em <http://www.conjur.uol.com.br/textos/4045/>. Acesso em: 16 fev. 2004. BRASIL. Código de Processo Civil.871. ed. SãoPaulo: Manole, 2004. CALDERON, Nei. Ação Monitória no Direito Brasileiro (Uma reflexão diferenciada sobre o tema). 1.ed. Rio de Janeiro: Editora Universitária de Direito, 2004. COL, Helder Martinez Dal. Ação monitória em face da fazenda pública. Teresina: Jus Navegandi, 2000. Disponível em < http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=893>. Acesso em: 09 mar. 2004. CUNHA, Graziela. CPC: É possível propor ação monitória em face da fazenda pública?. [s.l.]: Direito, 2003. Disponível em: < http://www.direitoassessoria.com.br/juris3.asp?codigo= 73>. Acesso em 18. out. 2004. GRECO FILHO, Vicente. Comentários ao procedimento sumário, ao agravo e à ação monitória. São Paulo: Saraiva, 1996. HUMBERTO JÚNIOR, Theodoro. Curso de direito processual civil. 16. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 1997. Vol. III. LIBERATO NETO, Bonadia. Ação monitória ou mandamental. [s.l.]: Jurista, 2002. Disponível em: < http://www.advogado.adv.br/artigos/2002/liberatobonadianeto/monitoria. htm>. Acesso em 16 fev. 2004. LINS, Cristiane Delfino Rodrigues. Ação monitória no direito brasileiro (Lei 9.079/95). Teresina:Jus Navegandi, 2000. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/ doutrina /texto.asp? id=892>. Acesso em 16 fev. 2004. NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil 61 comentado. 7.ed. rev. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. SILVA, Flávia Machado. Análise sistemática da ação monitória no direito brasileiro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1997. TALAMINI, Eduardo. Tutela monitória. 2.ed. rev. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2001. TUCCI, José Rogério Cruz e. Ação monitória. 2.ed. rev. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais. 1997. 62 ÍNDICE INTRODUÇÃO 07 CAPÍTULO 1 LEI. 9079/95: INCLUSÃO DO PROCEDIMENTO MONITÓRIO NO BRASIL 10 1.1 Natureza jurídica do instituto 1.2 Condições de admissibilidade da Ação Monitória 1.2.1 Prova escrita 1.2.2 Inexistência de força executiva 1.2.3 Pagamento de soma em dinheiro, entrega de coisa fungível ou de determinado bem móvel 1.3 Controvérsias sobre o tema CAPÍTULO 2 EMBARGOS NA AÇÃO MONITÓRIA 2.1 A expedição do mandado citatório e monitório 2.2 Embargos Monitórios 2.2.1 Natureza jurídica dos embargos 2.2.2 Diferenças entre embargos monitórios e do devedor 2.2.3 A decisão dos embargos 2.2.4 O recurso cabível e seus efeitos 13 15 15 17 17 19 24 24 30 32 33 33 34 CAPÍTULO 3 FASE EXECUTIVA DA AÇÃO MONITÓRIA 3.1 Antecipação de tutela e execução provisória 3.2 Cabimento dos embargos de devedor 3.2.1 Da matéria a ser alegada nos embargos 36 37 39 40 CAPÍTULO 4 DO CABIMENTO EM FACE DA FAZENDA PÚBLICA 45 4.1 4.2 4.3 Origem do problema A execução contra a Fazenda Pública A divergência doutrinária 45 46 47 CONCLUSÃO 55 BIBLIOGRAFIA 58 ÍNDICE 60 63 FOLHA DE AVALIAÇÃO Nome da Instituição: Universidade Cândido Mendes Título da Monografia: Ação Monitória e seus aspectos controvertidos Autor: Octavio Caio Mora y Araujo de Couto e Silva Data da entrega: 25/11/2004 Avaliado por: Conceito: