A IMPORTÂNCIA DE UM AMBIENTE DESAFIADOR NA RELAÇÃO
ENSINO-APRENDIZAGEM
Ana Paula Lopes
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Fabiana Cristina da Silva Mendes
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Jaynelu de Macedo Arantes Siqueira
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Wanda Miranda Borges
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Núbia Aparecida Imaculada Alcântara
Faculdade Católica de Uberlândia
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Orientadora
Este texto tem como objetivo fazer uma reflexão sobre a relação ensinoaprendizagem a partir de um ambiente desafiador. Buscaremos respaldo nas teorias do
desenvolvimento e da aprendizagem de Piaget e Vygotsky, especificamente nos
conceitos de ‘desequilibração’ (Piaget) e ‘zona de desenvolvimento
proximal’ (Vygotsky).
A aprendizagem é uma atividade social e permeia a vida dos homens. No dia-adia estamos sempre aprendendo, porém é na escola que se dá a aprendizagem
sistematizada. Para Vygotsky, a aprendizagem não é apenas uma transmissão de
conteúdos, mas a própria formação da consciência. Para Piaget, a assimilação leva a
compreensão e possibilita a transformação das estruturas cognitivas, ou seja, a uma
mudança qualitativa da inteligência.
Discutiremos primeiramente os conceitos piagetianos de inteligência, adaptação
e desequilibração e, a seguir, os conceitos vygotskyanos de zona de desenvolvimento
proximal, desenvolvimento real e potencial, desenvolvimento retrospectivo e
prospectivo. Somente a partir da compreensão desses conceitos, é possível pensarmos
uma ação pedagógica com atividades desafiadoras com o intuito de promover avanços
no desenvolvimento da criança.
Piaget, ao se referir à inteligência aponta esta como uma das formas de
adaptação do homem ao mundo exterior. Esta adaptação se dá de forma progressiva,
isto é, de um estado de menor conhecimento para outro de maior conhecimento ou
conhecimento mais complexo, sendo que qualquer ação adaptativa pressupõe uma
organização subjacente. De acordo com Piaget (apud COUTINHO e MOREIRA, 2001,
p. 85) “não há adaptação (assimilação e acomodação) proveniente de uma fonte
desorganizada ou caótica, essa adaptação tem como base uma organização inicial no
esquema – ponto de partida para a ação do individuo sobre os objetos do
conhecimento”.
Piaget postula que o pensamento se organiza a partir da constituição de
esquemas que se formam por meio de processo de adaptação. O bebê somente suga
porque há um objeto para ser sugado. A curiosidade da criança por determinado objeto
ou situação tem a ver com uma necessidade dela em se adaptar, pois ao conhecer ela
passa a dominar este objeto ou situação. Assim, a organização do pensamento, expressa
pelas estruturas cognitivas, produzidas mediante o processo de adaptação, é que permite
que o indivíduo organize a realidade. Por essa razão é que, em cada estágio, o individuo
aborda e se apropria da realidade de modo diferente.
A adaptação é composta pelos dois processos - assimilação e acomodação – que
são distintos, porém indissociáveis, tendo a função de restabelecer o equilíbrio.
Assimilar é incorporar elementos do mundo exterior às estruturas do conhecimento já
construídas, a partir da aplicação dos esquemas (já constituídos) pelo sujeito sobre os
objetos que o rodeiam. Consiste no uso de estruturas até então presentes, procurando
ajustar os objetos a essas estruturas. Quando, porém, os esquemas já existentes não se
aplicam à situação, gerando uma incompatibilidade entre a demanda do objeto e as
condições atuais do sujeito, surge a necessidade de se modificar os esquemas para
acomodar à resistência do objeto. Este é o processo de acomodação, o qual representa o
momento da ação dos objetos sobre os esquemas do sujeito, impondo-lhes
modificações, uma vez que os mesmos não são suficientes para o atendimento às novas
solicitações do meio.
Piaget postula que o ‘esquema’ é a condição inicial das trocas efetuadas entre o
individuo e o meio. No ser humano, os esquemas iniciais, que são o ponto de partida da
interação entre sujeito e objeto, são os reflexos. A partir desses esquemas, todos os
demais são organizados pela dinâmica dos processos de assimilação e acomodação. A
adaptação – composta por esses dois processos – resulta na construção de novos
esquemas. Os esquemas formados são o ponto de partida para novas interações do
individuo com o meio. Entretanto, esses se reorganizam, constantemente, pelas novas
exigências dos objetos, formando verdadeiros sistemas de esquemas (COUTINHO e
MOREIRA, 2001).
Esse desenvolvimento só se dá mediante um processo de equilibração constante
entre o sujeito e o meio. Equilibração refere-se “às trocas do sujeito com o mundo não
como uma simples busca de equilíbrio, mas uma busca do melhor equilíbrio ou em
busca de equilibrações majorantes” (COUTINHO e MOREIRA, 2001, p.89).
Para Piaget, o processo de equilibração é o resultado da ação interatuante de três
fatores: maturação, experiência e transmissão social. Maturação refere-se à base
biológica do comportamento, ao amadurecimento de estruturas biológicas em interação
com o meio; é um processo interno e representa a viabilidade humana de adaptação
inteligente. Experiência é o próprio exercício e ação individual sobre os objetos que
pode se dar de duas maneiras: experiência física que é extrair dos objetos suas
características; experiência lógico-matemática que é extrair propriedades não dos
objetos, mas da ação sobres estes, ou seja, das relações entre eles. Finalmente, a
transmissão social consiste na apropriação das experiências histórico-culturais, somente
possível na espécie humana, e que se dá conforme as estruturas cognitivas presentes no
sujeito naquele momento. Só se transmite conhecimento quando há estruturas para
assimilá-lo e acomodá-lo.
Dessa forma Piaget ressalta que o sujeito que aprende deve ser concebido como
ativo, e não concorda com outras teorias que concebem a aprendizagem como
condicionamento. Para ele não é apenas ensinando que o aluno aprende, repetindo o
conteúdo tantas vezes quantas forem necessárias. A repetição não é garantia de
compreensão ou assimilação. A fórmula da velha escola ‘repetindo se aprende’ deverá
ser substituída por ‘assimilando se aprende’.
Nessa perspectiva, os erros para Piaget devem ser analisados não como um
problema a evitar; mas como algo que faz parte do processo. Quem não sabe ou não
sabe tudo, dificilmente acerta da primeira vez, sobretudo se estiver enfrentando algo
difícil.
Dessa forma Piaget postula que o desenvolvimento acontece numa seqüência de
estágios sendo que cada estágio comporta um nível de preparação e um nível de
acabamento, denotando uma forma de organização da inteligência (das estruturas
cognitivas) naquele momento.
Para Vygotsky o aprendizado é um aspecto necessário e fundamental no
processo de desenvolvimento das funções psicológicas superiores. O desenvolvimento
pleno do ser humano depende do aprendizado que realiza num determinado grupo
cultural. Portanto, é o aprendizado que possibilita e movimenta o processo de
desenvolvimento. Segundo Vygotsky (apud REGO, 2002, p71) “o aprendizado
pressupõe uma natureza social especifica e um processo através do qual as crianças
penetram na vida daqueles que a cercam”.
Vygotsky identifica dois níveis de desenvolvimento, a saber: um nível de
desenvolvimento real ou efetivo que se refere às conquistas já efetivadas, outro nível de
desenvolvimento potencial que se refere às capacidades em vias de serem construídas.
De acordo com Rego (2002) o desenvolvimento real é aquele que a criança já
tem assimilado, as conquistas efetivadas , as capacidades que ela já aprendeu e domina
pois consegue fazê-las sem ajuda de outras pessoas.
Com relação ao nível de desenvolvimento potencial, a criança ainda necessita da
ajuda de adultos ou até mesmo de outras crianças mais experientes. Essa ajuda se dá
mediante um modelo que a criança passa a imitar, a
colaboração, o diálogo, a
experiência compartilhada e as s que lhe são fornecidas.
Vygotsky chamou de zona de desenvolvimento proximal a distância entre aquilo
que a criança é capaz de fazer sozinha e aquilo que ela só é capaz de realizar com ajuda
de outros indivíduos de seu grupo social. Dessa forma o desenvolvimento é visto de
forma prospectiva, ou seja, ressaltam-se mais as funções que estão por se consolidar do
que aquelas que estão consolidadas.
De posse dessas informações sobre os conceitos de equilibração e zona de
desenvolvimento proximal podemos fazer uma síntese destes e compreender melhor o
processo de aprendizagem. Através da consideração da zona de desenvolvimento
proximal é possível verificar os ciclos já completados e os que já estão em vias de
formação. Para Piaget, o desequilíbrio cognitivo é muitas vezes visto a partir dos
‘erros’ apresentados pela criança diante da resolução de um problema. Os
‘erros’demonstram o nível de organização da inteligência da criança. Isto possibilita o
diagnóstico da competência desta e de suas futuras conquistas assim como a elaboração
de estratégias pedagógicas que auxiliem nesse processo.
Entretanto é importante deixar claro que somente se torna potencial para a
criança, um conhecimento próximo de outro já aprendido por ela. Ex. Para uma criança
em idade escolar que já sabe fazer a operação de adição, a subtração se torna um
conhecimento potencial. Esse conhecimento, por mais que seja apresentado a uma
criança de dois anos, jamais se tornará potencial para ela, já que está muito distante de
suas possibilidades. Do mesmo modo, podemos dizer que a criança só assimilará aquilo
que suas estruturas cognitivas tiverem possibilidade de assimilar.
Enfatizando dois dos três aspectos citados por Piaget – transmissão cultural e
experiência – é importante ressaltar que a aprendizagem não só depende do esforço
individual, mas principalmente das oportunidades oferecidas pelo contexto em que o
indivíduo está inserido. O acesso da criança a uma variedade de atividades culturais –
livros, cinema, teatros, museus – possibilita a assimilação mais rápida de novos
conceitos assim como a criação de novas zonas de desenvolvimento proximal.
Vygotsky ressalta a importância de um meio provocador e desafiador, que exija e
estimule o intelecto da criança e do adolescente. Em uma sociedade onde os meios
culturais são escassos, a escola assume uma importância fundamental para a
aprendizagem. As práticas escolares, nesta situação, serão essenciais para que esta
criança tenha condições de construir significados diferentes daqueles construídos por
ela no cotidiano, possibilitando-a participar das exigências de uma sociedade que
valoriza a cultura letrada e escolarizada.
A apresentação de situações desafiadoras para a criança se constitui em uma
forma de desequilibrá-la cognitivamente e criar zona de desenvolvimento proximal.
Como isto pode acontecer? Primeiramente o professor deve conhecer o nível de
conhecimento de cada aluno, assim as situações desafiadoras devem ser no sentido
daquilo que o aluno já tem noção, mas ainda não consegue resolver sozinho. Por ex.,
numa brincadeira de contagem de números pode-se acrescentar um desafio no sentido
da criança ter que substituir certo número da seqüência por uma palavra, se se opta
pelos múltiplos de cinco, a cada cinco números a criança substitui por uma palavra
aleatória. Outro exemplo é o ato de criar perguntas desafiadoras que levem o aluno a
desequilibrar cognitivamente, tais como: Por que a lua não cai do céu? Aonde vai o sol
quando é noite? O sangue que passa na cabeça é o mesmo que passa nos pés? Por que
os objetos têm nome? Os nomes dos objetos correspondem a suas funções?
Além dessas situações, o contato com diferentes pontos de vista sobre um
mesmo objeto ou situação é também uma forma de desafio ao conteúdo que já está
assimilado. Para isso a sala de aula deve ser heterogênea no sentido do desempenho
cognitivo das diversas crianças assim como das suas diferentes experiências anteriores.
Levar as crianças a problematizarem as situações vivenciadas e buscar respostas
é criar ambiente desafiador na relação ensino-aprendizagem.
Finalmente, é importante ressaltar o caráter intencional do processo educativo,
isto é, qual a finalidade desse processo, levar em conta que este não é apenas uma
transmissão de conteúdos, mas a própria formação da consciência. A intervenção do
professor é condição fundamental para que haja aprendizagem já que na perspectiva de
Vygotsky, não é espontaneamente que a criança formula os conceitos, mas a partir da
intervenção do outro (adulto professor).
Concluímos com uma afirmação de Rego (2002), a qual nos mostra que na
escola as atividades educativas têm uma intencionalidade deliberada e compromisso
explícito (legitimado historicamente) em tornar acessível o conhecimento formalmente
organizado. Na escola as crianças são desafiadas a entender as bases dos sistemas de
concepções cientificas e a tomar consciência de seus próprios processos mentais.
REFERÊNCIAS
OLIVEIRA, M.K. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento: um processo sóciohistórico. São Paulo: Scipione, 1997. (Pensamento e ação no magistério).
COUTINHO, M.T.C & MOREIRA,M. Psicologia da educação: um estudo dos
processos psicológicos do desenvolvimento e aprendizagem humanos, voltado para a
educação: ênfase nas abordagens interacionistas do psiquismo humano. Edição revista e
atualizada. Belo Horizonte: Editora Lê, 2001.
PIAGET, J. Seis estudos de Psicologia. Trad. Maria Alice M. D’Amorim e Paulo
Sérgio L. Silva. Rio de Janeiro: Editora Forense Universitária, 1976.
REGO, T. C. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação. 14 ed.
Petrópolis (RJ): Vozes, 2002.
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