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Recurso extraordinário – Atribuição de efeito suspensivo
Mario Helton Jorge*
1. Apresentação
Este trabalho tem por objetivo demonstrar a viabilidade processual da atribuição do
efeito suspensivo ao recurso extraordinário, através de medida cautelar específica, à
luz da doutrina e da jurisprudência da Suprema Corte, sem perder de vista a
tendência atual do suprimento desse efeito aos recursos em geral e a efetividade da
prestação jurisdicional.
2. O efeito suspensivo e a agilização processual.
As transformações que ocorrem na sociedade exigem, por sua vez, a adoção de medidas
legislativas rápidas e eficazes no sentido de acompanhar adequadamente as suas
mudanças. Entretanto, se a lei não pode expressar a dinâmica dos fatos sociais, não
significa que a ordem normativa vigente possa ser incompatível com o direito
reclamado pela sociedade, devendo os operadores do direito buscar mecanismos que
aproximem o descompasso dos fatos (dinâmica) com o ordenamento regulador das
relações da vida relevantes ao direito (estático), tendo por objetivo eliminar tensões,
assegurando
paz
e
segurança
sociais.
A inafastabilidade do controle jurisdicional assegura a efetiva prestação da tutela
jurisdicional do bem almejado, a qual deve ser segura e célere, quer no exame de
qualquer espécie de lesão ou de ameaça de lesão a direito A segurança e celeridade são
desejadas sempre pelos que buscam a tutela jurisdicional junto Estado-juiz. A
conciliação entre a segurança e a celeridade é um dos objetivos, que as reformas do
CPC buscaram implementar, tendo por fim desburocratizar o sistema, possibilitando o
cumprimento da ordem constitucional, no que se refere à efetiva prestação da tutela
jurisdicional (simplificar, agilizar e efetivar) [Sálvio de Figueiredo Teixeira, A
efetividade do processo e a reforma processual. Revista Forense, 1994 325:111].
Dentre as modificações processuais já concretizadas, o que interessa para o âmbito
deste estudo é a possibilidade do reexame da admissibilidade do recurso, pelo próprio
juiz de primeiro grau, após a apresentação da resposta pelo recorrido, aqui, também
compreendida a possibilidade de retratação quanto aos efeitos em que foi recebida a
impugnação [Nelson Nery Jr. Princípios fundamentais – teoria geral dos recursos, 5ª
edição, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2000, pág. 394], e a possibilidade da
atribuição
de
efeito
suspensivo
em
recursos
dele
desprovido.
Assim, o recurso que seja recebido nos efeitos devolutivo e suspensivo (art. 520, caput,
CPC), pelo juiz de primeiro grau, quando deveria sê-lo apenas no efeito devolutivo (art.
520, § único, CPC), deverá ser revogado ex officio o efeito não previsto para o recurso,
eis que integra o juízo de admissibilidade, não havendo necessidade de interposição de
recurso [Nelson Néri Junior. Obra acima citada, pág. 394], para afastar a ilegalidade,
por ser matéria de ordem pública, a qual é insuscetível de disposição pelas partes e pelo
juiz.
Quanto à atribuição dos efeitos aos recursos, importante inovação foi instituída pelo
artigo 558 do CPC (Lei 9.139/95) no sentido de o relator atribuir efeito suspensivo ao
recurso de Agravo, a requerimento da parte ( art. 558, CPC), não podendo ocorrer ex
officio, e ao recurso de Apelação, de acordo com o artigo 558, § único, do CPC. Nelson
Nery Jr ainda assegura que o destinatário primeiro desta norma é o juiz a quo, que
poderá, ao receber o recurso de Apelação, atribuir-lhe o efeito suspensivo.
Contrariamente, Edson Ribas Malachini [Edson Ribas Malachini. Aspectos polêmicos e
atuais dos recursos cíveis de acordo com a Lei 9756/98. Coordenação Teresa Arruda
Alvim Wambier, Nelson Nery Jr. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 1999, pág.
231-232] afirma que, “no caso da apelação, o legislador forneceu o remédio – o mesmo
do art.558, caput, mas não ofereceu os meios, o instrumento para levar ao
conhecimento do relator do recurso o pedido para “suspender o cumprimento da
decisão” – no caso, a sentença – “ até o pronunciamento definitivo da turma ou
câmara”. E continua Malachini: “Quanto às notas de Nery Junior e Andrade Nery,
acima transcritas, diga-se, inicialmente, que não nos parece que “ o juízo a quo é o
primeiro destinatário da norma do par. Único. CPC, 558” . Não é isso que diz a lei. Ao
preceituar, simplesmente, que se aplicará “o disposto neste artigo às hipóteses do art.
520”, está a regra a dizer (a nosso ver de modo evidente), exatamente, que “o relator
poderá, a requerimento do agravante” – no caso, do apelante – “ suspender o
cumprimento
da
decisão
“
–
no
caso,
da
sentença”.
As reformas introduzidas no CPC, mister a inafastabilidade de o juiz, mediante critérios
a serem observados, deferir efeito suspensivo ou, reexaminando a causa, modificá-lo,
guarda inegável tendência à efetividade do sistema jurisdicional, de forma a resgatar a
credibilidade da jurisdição. Importa destacar que a evolução do sistema processual para
a atribuição do efeito suspensivo tende a afastar-se do critério ope legis, para adotar o
critério ope iudicis, agora levando em conta a relevante a fundamentação do recurso,
com nítida característica cautelar, de modo a valorizar o julgamento de primeira
instância
e
assegurar
o
resultado
útil
do
processo.
Essas considerações afiguram-se necessárias porque não existindo previsão do efeito
suspensivo ao recurso extraordinário, de acordo com o artigo 542,§ 2º, do CPC,
sobressai, à primeira vista, antecipação de julgamento de que, ao se possibilitar a
atribuição desse efeito inexistente ao recurso, avulta potencial interesse em protelar a
eficácia da decisão recorrida, retardando a efetividade da prestação jurisdicional. Não é
esse o posicionamento de Luiz Rodrigues Wambier ao destacar que: “Ao sistema todo
interessa a efetividade do resultado do processo, isto é, interessa que as partes possam
receber o resultado do processo de modo que seja possível realizar as transformações no
mundo empírico que foram determinadas pela decisão judicial. Se esta decisão (em
sentido amplo) não servir para isso, de nada terá adiantado a busca da tutela
jurisdicional” [Do manejo da tutela cautelar para obtenção de efeito suspensivo no
recurso especial e no recurso extraordinário. Aspectos Polêmicos e atuais do recurso
especial e do extraordinário. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1998, pág. 368].
O tratamento diferenciado – suspensividade em situações excepcionais, onde avulte a
urgência e a possibilidade de danos irreparáveis, submetidas à apreciação jurisdicional,
com caráter de prevenção - demonstra a compatibilidade entre a segurança pretendida e
efetiva
prestação
jurisdicional,
adequada
ao
tempo.
3. do recurso extraordinário e o efeito suspensivo
O recurso extraordinário, mercê de sua natureza excepcional, porque a revisão que se
opera é sobre questão de direito, pré-questionada, excluída a matéria de fato e afastado
o reexame de provas, de vinculação estrita, exige para a sua interposição, além dos
pressupostos genéricos dos recursos interpostos nas instâncias ordinárias (cabimento,
legitimidade, interesse, tempestividade, preparo, regularidade formal), também os
requisitos essenciais previstos no artigo 102, inciso III, da Constituição Federal:
“Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição,
cabendo-lhe: III – julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única
ou última instância, quando a decisão recorrida: a) contrariar dispositivo desta
Constituição; b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; c) julgar
válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição”.
O recurso extraordinário será interposto, no prazo de 15 dias (art. 508, CPC), perante o
presidente ou o vice-presidente do tribunal recorrido, através de petição de interposição,
devendo conter (i) a exposição do fato e do direito; (ii) a demonstração do cabimento do
recurso interposto; (iii) as razões do pedido de reforma da decisão recorrida, nos termos
do artigo 541 do CPC, com a redação que lhe foi dada pela Lei 8950/94. Após regular
processamento do recurso, a autoridade competente exercitará o juízo de
admissibilidade provisório, ou não, o qual será recebido no efeito devolutivo (art. 542, §
2º, do CPC, e art. 331,§ 4º, RISTF), cujo juízo de admissibilidade definitivo compete ao
STF. Uma vez presente, possibilitará o julgamento de mérito, adotando-se, portanto,
uma ordem lógica e cronológica à admissibilidade relativa ao mérito do recurso, no
dizer de Araken de Assis [Condições de admissibilidade dos recursos cíveis, Aspectos
polêmicos e atuais dos recursos cíveis de acordo com a Lei 9.765/98, Coordenação de
Teresa Arruda Alvim Wambier e Nelson Nery Júnior, 1ª ed, 2ª tiragem, pág. 13-14].
Inexiste qualquer previsão normativa de nesta fase ser examinada a atribuição de efeito
suspensivo
ao
recurso.
Sendo recebido apenas no efeito devolutivo, no Tribunal a quo, a decisão impugnada
pode ser executada provisoriamente, ou incompleta, conforme interpretação sistemática
dos artigos 467, 497 e 587, do CPC, de modo a não deixar o credor submetido ao
esgotamento de toda sorte de expedientes por parte do devedor, abreviando a prestação
jurisdicional. Destarte, ainda que não esgotados os recursos, a lei autoriza a precipitação
dos atos de execução, podendo surgir desta situação a prevenção cautelar para
suspender
os
efeitos
da
decisão.
Em que pese ter-se previsto apenas o efeito devolutivo ao recurso extraordinário, o
Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, nos artigos 21, incisos IV e V, e 304,
admitiu medidas cautelares nos recursos, independente de seus efeitos, necessárias à
proteção de direito suscetível de grave dano de incerta reparação, ou ainda destinadas a
garantir a eficácia da ulterior decisão da causa, ou seja, a possibilidade de ser obtido o
efeito suspensivo da decisão recorrida, evitando a sua execução imediata.
Segundo Berenice Soubhie Nogueira Magri [O papel decisivo dos regimentos
internos... Aspectos Polêmicos e Atuais do Recurso Especial e do Extraordinário. São
Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1998, pág. 96] “...os Regimentos Internos do
Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça, enquanto normas regimentais,
possuem preceitos supletivos (complementares) e que consolidam as normas
constitucionais e infraconstitucionais relativas à organização do Tribunal e ao processo
na parte em que for aplicável à instância superior, devendo ser vistos em harmonia com
a lei processual, o Código de Processo Civil (com a reforma introduzida pela Lei 8.950,
de 13.12.1994) e a Lei 8038, de 25.05.1990. Desempenham, até hoje, papel decisivo
quanto à admissibilidade dos recursos extraordinários e especial, especialmente quanto
à possibilidade de imprimir efeito suspensivo aos recursos extraordinário e especial, no
âmbito
do
poder
geral
de
cautela
do
art.
798
do
CPC....”
Portanto, o efeito suspensivo ao recurso extraordinário se viabiliza através de
provimento cautelar previsto no regimento interno da Suprema Corte, de competência
privativa do Supremo Tribunal, segundo o Ministro Celso de Mello (STF-AGRPET721-SP,
1ª
Turma,
j.
18.5.93,
DJU,
em
13.8.93).
3.1.
Medida
cautelar
para
atribuição
de
efeito
suspensivo,
no
STF.
O artigo 8º, inciso I, do RISTF, prevê a competência do Plenário e das Turmas para
julgamento de medidas cautelares. De igual modo, o artigo 21, IV, incluiu dentre as
atribuições do Relator “submeter ao Plenário ou Turma, nos processos da competência
respectiva, medidas cautelares necessárias à proteção de direito suscetível de grave
dano de incerta reparação, ou ainda destinadas a garantir a eficácia da ulterior decisão
da
causa”.
Quanto à competência dos órgãos colegiados e as atribuições do relator não suscitam
maiores divagações, por ser matéria própria dos regimentos internos dos tribunais.
Entretanto, é de se indagar acerca da necessidade da previsão no art. 304 do RISTF da
admissão de medidas cautelares inominadas a recursos, eis que é matéria processual
expressada no artigo 798 do CPC, o qual estabelece o poder geral de cautela do juiz.
O Ministro Ilmar Galvão [RTJ 174/55-57] afirmou que no âmbito do Supremo Tribunal
Federal “a cautelar na pendência de recurso extraordinário já admitido não constituiu
propriamente ação cautelar, mas, sim, requerimento de cautelar incidente do próprio
recurso, conquanto processado em autos apartados”. No mesmo sentido, o Ministro
Moreira Alves reconheceu que “petição dessa natureza, na pendência de recurso
extraordinário, não constitui propriamente ação cautelar, mas, sim, requerimento de
cautelar nesse próprio recurso – embora processado em autos diversos por não terem
ainda chegado a esta Corte – e requerimento que deve ser processado como mero
incidente do recurso extraordinário em causa”. ( STF-PETQO-2246-SP, 1ª Turma,
j.13.3.2001,
DJU
04.5.2001).
Importante estabelecer a diferença entre medida cautelar e ação cautelar, ainda que o
assunto seja polêmico, no âmbito da doutrina. Nas lições coordenadas por Luiz
Rodrigues Wambier [Curso Avançado de Processo Civil, vol. 3: processo cautelar e
procedimentos especiais, Coordenação de Luiz Rodrigues Wambier, 3ª edição, revista ,
atualizada e ampliada, 2ª tir. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 2000, pág. 29]
“Medida cautelar é termo genérico que abrange todo e qualquer meio de proteção à
eficácia de provimento jurisdicional posterior ou de execução. Abrange, portanto, as
ações cautelares. Açambarca, também, as medidas liminares proferidas em ação
cautelar. E mais: diz também respeito a tantas quantas liminares houver, em outros
procedimentos, fora do CPC ou mesmo dentro dele, que tenham como pressuposto o
periculum e, correlatamente, como finalidade, a de evitar a ineficácia do processo
principal (e mesmo de outro processo em que esta liminar esteja inserida)”.
Isto quer dizer que a existência de uma ação especificamente cautelar, derivada de uma
pretensão de direito material, simplesmente asseguradora, não elide a existência de
medidas processuais cautelares, algumas com conteúdo de ação e outras
correspondentes a provimentos jurisdicionais cautelares, consistentes em atos do
próprio processo, sem autonomia processual. Exemplo: venda de bens deterioráveis,
penhorados em processo executivo, arresto, seqüestro ou depósito judicial, a qual pode
ser ordenada “ex officio” pelo juiz, ou mediante provocação da parte (art. 1.113, CPC).
Embora essas medidas não contenham autonomia processual, não deixam de ter função
cautelar.
Como visto, o exercício da função cautelar como providência jurisdicional pode ocorrer
não só no bojo do processo cautelar, mas também no âmbito do processo de execução
ou no processo de conhecimento. Contudo, não tem o juiz o poder geral de cautela, fora
do âmbito específico do processo cautelar (art. 798, CPC), de forma a determinar de
forma indiscriminada a execução de medidas cautelares incidentalmente no curso do
processo de conhecimento ou de execução. Deve, pois, existir previsão específica da
execução
de
medida
cautelar
fora
do
processo
cautelar.
O entendimento adotado na Suprema Corte de que a providência não é ação cautelar,
mas requerimento de cautelar incidental, está de acordo com o procedimento adotado
pela instituição para atribuição de efeito suspensivo ao recurso extraordinário, eis que
independe de outro provimento no plano do direito material vinculado por dependência
a outro processo. As medidas cautelares que servem de instrumento a um ulterior
provimento definitivo visam à garantia da eficácia da função jurisdicional e nada têm a
ver com a proteção a quaisquer direitos subjetivos. Entretanto, para assim proceder,
deveria haver a previsão normativa para a adoção da medida cautelar incidental no
recurso extraordinário, tal como nas hipóteses anteriormente mencionadas.
Ocorre, contudo, que as normas processuais do RISTF, em vigor desde 01.12.1980,
editado sob a égide do artigo 119, § 3º, da Constituição Federal de 1969, com efeitos de
lei, não ficavam limitadas às disposições do CPC, por força do artigo 1214 [RTJ
106/592, RTJ 115/1188, RTJ 116/1.106], as quais foram recepcionadas pela
Constituição Federal de 1988, no que com esta não se mostrem incompatíveis,
conforme tem decidido o STF: “O fato de a Carta não mais conter permissivo, no
sentido da edição, apenas obstaculiza novas inserções, não implicando revogação das
existentes”
[RTJ
133/955,
RTJ
133/a3,
RTJ
159/731].
No entendimento de Luiz Rodrigues Wambier [Luiz Rodrigues Wambier: “... enquanto
de seu cabimento, nos juízos especial e extraordinário, trata principalmente o Código de
Processo Civil, nas normas gerais a respeito do processo cautelar e, especificamente,
nas normas a respeito do poder geral de cautelar, ou seja, não são os regimentos
internos dos Tribunais superiores que tornam possível o aforamento de processo
cautelar incidental buscando medidas ínsitas ao poder geral de cautela, mas sim o
próprio sistema do Código de Processo Civil”. (aspectos polêmicos e atuais do recurso
especial e do recurso extraordinário, ob. cit. Pág. 376)] seria totalmente dispensável a
previsão da adoção de medidas cautelares no âmbito do Supremo Tribunal Federal,
através do artigo 304 do RISTF, porquanto a matéria é tratada especificamente no
processo cautelar, no CPC. E nem poderia ser diferente, eis que o artigo 800, parágrafo
único, do CPC, dispõe que: “Interposto o recurso, a medida cautelar será requerida
diretamente
ao
tribunal”.
Em que pese essa conclusão, o Ministro Moreira Alves, ao relatar a PETQO-2246-SP,
confirmou que, no âmbito do STF, “não se aplica, em se tratando de medida cautelar
relacionada com recurso extraordinário, o procedimento cautelar, previsto no artigo
796 e seguintes do Código de Processo Civil, uma vez que, a propósito, há norma
especial de natureza processual – e, portanto, recebida com força de lei pela atual
Constituição – em nosso Regimento. Trata-se do inciso IV do artigo 21 que determina
que se submetem ao Plenário ou à Turma, nos processos da competência respectiva,
medidas cautelares necessárias à proteção de direito suscetível de grave dano de incerta
reparação, ou ainda destinadas a garantir a eficácia da ulterior decisão da causa. Assim,
petição dessa natureza, na pendência de recurso extraordinário, não constitui
propriamente ação cautelar, mas, sim, requerimento de cautelar nesse próprio
recurso – embora processado em autos diversos por não terem ainda os dele chegado a
esta Corte – e requerimento que deve ser processado como mero incidente do recurso
extraordinário em causa...[ STF- PETQO 2246-SP. Rel. Min. Moreira Alves. 1ª Turma.
Unânime.
J.
13.3.2001.
DJ,
04.05.2001)]”(destaquei).
Ainda, relatando a PETQO-1863-RS o Ministro Moreira Alves negou medida cautelar,
com amparo no artigo 800, § único, do CPC, para dar efeito suspensivo a recurso
extraordinário que ainda não tinha sido objeto do juízo de admissibilidade no tribunal
de origem, com o fundamento de que: “O disposto no parágrafo único do artigo 800 do
CPC, na redação que lhe deu a Lei 8.592/94, não se aplica ao recurso extraordinário
ainda não admitido, pela singela razão de que sua aplicação implicaria pré-julgamento
da admissão do recurso extraordinário pelo relator da petição de medida cautelar, que se
torna prevento para julgar o agravo contra o despacho contra o despacho da nãoadmissão desse recurso, em detrimento da livre apreciação do Presidente do Tribunal “a
quo” no âmbito da competência originária que a legislação lhe outorga para esse juízo
de admissibilidade...” ( STF-1ª Turma, j. 7.12.99, DJU, 14.4.2000).
Assim, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal adota regras processuais de seu
regimento, de natureza cautelar, mas sem regras procedimentais específicas,
contrariando o posicionamento da doutrina, embora cheguem ao mesmo resultado.
3.2. requisitos da cautelar no Supremo.
O Ministro Celso de Melo, relatando o Recurso de Agravo de Petição 1859-DF (STFAGRPE, 2ª Turma, j, 28.3.2000, DJ, 28.4.2000), destacou que, a outorga do efeito
suspensivo ao recurso extraordinário, viável em sede cautelar, deve revestir-se de
excepcionalidade absoluta, sendo que a eficácia suspensiva ao apelo extremo, para
legitimar-se, supõe a conjugação necessária dos seguintes pressupostos cumulativos: (a)
que tenha sido instaurada a jurisdição cautelar do Supremo Tribunal Federal, ou seja, a
existência de juízo positivo de admissibilidade do recurso extraordinário,
consubstanciado em decisão proferida pelo Presidente do Tribunal “a quo”; (b) que o
recurso extraordinário interposto possua viabilidade processual, caracterizada, dentre
outras, pelas notas da tempestividade, do pré-questionamento explícito da matéria
constitucional e da ocorrência de ofensa direta e imediata ao texto da Constituição; (c)
que a postulação de direito material deduzida pela parte recorrente tenha plausividade
jurídica; e (d) que seja demonstrado, objetivamente, a ocorrência de situação
configuradora
do
“periculum
in
mora”.
Viabiliza-se, pois, o pedido cautelar do efeito suspensivo à decisão impugnada, através
de simples requerimento, protocolado como petição (PET), submetido à apreciação do
relator, que detém a competência para determinar, nos casos de urgência, as medidas
cautelares, “ad referendum” do Plenário ou da Turma, do STF, a teor do art. 21, IV e V,
do RISTF. O regimento interno assegurou a providência preventiva à parte recorrente,
de forma a neutralizar eventual lesividade da execução da decisão impugnada, mas não
a condicionou a nenhuma forma específica, cabendo, portanto, a parte valer-se de
requerimento simples, que pode, ou não, ser formulado nos próprios autos de recurso,
conforme
admitido
pela
jurisprudência
do
STF(RTJ
174/55-57).
De outro lado, vislumbram-se os pressupostos gerais das cautelares (art. 798, CPC),
consubstanciados no “fumus boni juris” (plausividade jurídica do direito material) que é
a pretensão provável, existência provável de um direito, cujo grau de probabilidade é
possível aferir-se pela prova sumária produzida nos autos, e o “pericilum in mora”, que
é a ameaça de lesão grave e de difícil reparação. Assim, se a ameaça não existe, ou se
risco da dilação processual não se refere a ato lesivo, apesar de grave, for de fácil
reparação,
não
estará
justificado
o
pressuposto.
Com a demonstração do “fumus boni juris” e do “periculum in mora” ao juiz não é
dado optar pela concessão ou não da cautela, pois tem o dever de concedê-la, de acordo
com entendimento de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery [ Código de
Processo Civil Comentado e legislação extravagante em vigor, 2ª edição, revista,
ampliada, São Paulo, RT, 1996, pág 910], assegurando o resultado útil do processo.
Ainda que assim se posicione a doutrina, a jurisprudência ortodoxa da Suprema Corte
exige, além dos pressupostos antes destacados, ainda, que o recurso seja admitido no
Tribunal de origem, porquanto, se não ocorrido, não está instaurada a instância cautelar.
O Ministro Moreira Alves, relatando a PETQO-1863-RS, sustentou que: “não cabe
medida cautelar inominada para a obtenção de efeito suspensivo a recurso
extraordinário, que ainda não foi admitido no tribunal de origem, não só porque a
concessão dessa medida pressupõe necessariamente a existência de juízo positivo de
admissibilidade do recurso extraordinário, mas também porque, em se tratando de
recurso extraordinário, que demanda esse juízo de admissibilidade, da competência da
Presidência do Tribunal, que prolatou o acórdão recorrido, não se aplica o disposto no
artigo 800 do CPC, pela singela razão de que, se fosse concedida a liminar, para dar
efeito suspensivo, pela relevância de sua fundamentação jurídica, a recurso dessa
natureza ainda não admitido, a referida Presidência, em virtude da hierarquia
jurisdicional, não poderia desconstituí-la com a não-admissão desse recurso, ficando,
assim, adstrita – o que é incompatível com a sua competência para o juízo de
admissibilidade – a ter de admiti-lo...” (STF-PETQO-1863-RS, 1ª Turma, J. 7.12.99,
DJU, 14.4.2000). Ou, ainda, na pendência do julgamento do agravo de instrumento que
objetive reformar a decisão denegatória de processamento (STF- PET 914-PR, DJU,
17.06.1994).
Em face dessa posição inquebrantável do STF, em 1998, Luiz Rodrigues Wambier
[Aspectos polêmicos e atuais do Recurso Especial e do Extraordinário, ob.cit. pág. 370]
formula a seguinte questão: “que fazer nesse espaço de tempo que vai da interposição
do recurso extraordinário até o exercício do juízo de admissibilidade? Quem é o juízo
competente
para
conhecer
do
pedido
de
tutela
cautelar?”.
A resposta a essa indagação vem do Ministro Moreira Alves, no julgamento da
PETQO-1863-RS, em 07.12.1999, ao indeferir pedido de outorga de efeito suspensivo
em recurso extraordinário, pela não admissibilidade do recurso no Tribunal de origem,
inaugurou a hipótese do suprimento da lacuna, eis que diante da “impossibilidade de
esta Corte deferir pedido de liminar para dar efeito suspensivo a recurso extraordinário
ainda não admitido permite que, entre a interposição desse recurso e a prolação desse
juízo de admissibilidade, não haja autoridade ou órgão judiciários que, por força de
dispositivo legal, tenha competência para o exame de liminar dessa natureza. Para
suprir essa lacuna que pode acarretar danos irreparáveis ou de difícil reparação em
casos em que é relevante a fundamentação jurídica do recurso extraordinário, seria de
atribuir-se ao Presidente do Tribunal “a quo”, que é competente para examinar
sua admissibilidade, competência para conceder, ou não, tal liminar, e, se a
concedesse, essa concessão vigoraria, se o recurso extraordinário viesse a ser
admitido, até que essa Corte a ratificasse, ou não. Essa solução não encontra óbices
em que, assim, haveria invasão na competência deste Supremo Tribunal, certo que,
antes da admissão do recurso extraordinário e por causa do sistema do juízo dessa
admissibilidade, não é possível a ele decidir esse pedido de liminar” ( destaquei).
Contudo para a viabilização do suprimento da lacuna tal como preconizado pelo
Ministro Moreira Alves faz-se imprescindível à mudança da posição da Corte, quanto à
não admissão do efeito suspensivo pelo Juízo de origem, cuja jurisprudência é
majoritária no sentido de que existe usurpação de competência do Supremo Tribunal
Federal. Destaca-se da Reclamação 416, da lavra do relator Celso de Mello, que “O
efeito suspensivo representa uma conseqüência meramente eventual da interposição do
apelo extremo, sendo que a sua concessão, em sede adequada, por decisão exclusiva do
Supremo Tribunal Federal, pressupõe, sempre, a ocorrência de circunstâncias
excepcionais. Tendo em vista que o juízo de admissibilidade, exercido em instância
inferior, resume-se a verificação dos pressupostos genéricos e específicos de
recorribilidade do apelo extremo, não há dúvida de que a concessão do efeito
suspensivo ao recurso extraordinário não se insere nos limites jurídico-processuais da
atuação jurisdicional da Presidência do Tribunal “a quo”. Age “ultra vires”, com
evidente excesso no desempenho de sua competência monocrática, o Presidente do
Tribunal inferior que, ao formular juízo positivo de admissibilidade, vem outorgar, ao
arrepio da lei, efeito suspensivo a recurso extraordinário, interferindo, desse modo, em
domínio juridicamente reservado, com exclusividade absoluta, a atividade processual
do Supremo Tribunal Federal” [STF-RCL-416. Tribunal Pleno, j. 03.12.1992; no
mesmo sentido:RCLMC-252-MG. Rel. Min. Moreira Alves, Tribunal Pleno, unânime,
j.20.04.1988,
DJU,
12.5.1988].
Esta situação tormentosa para as partes foi abordada por Jurandir Fernandes de Souza
[Efeito suspensivo ao recurso extraordinário, in RT 732-132/136 (out/96)] ao
estabelecer a divergência no enfrentamento da questão no âmbito do STF (não viabiliza
o exame da cautelar sem juízo prévio de admissibilidade) e do STJ (o juízo de
admissibilidade prévio não é óbice à concessão de cautelar), onde a matéria não está
pacificada, concluindo que não é crível que, presentes a possibilidade de dano
irreparável e a razoabilidade que embasa a pretensão, haja a negativa de se conceber
efeito suspensivo a recurso extraordinário, ainda que não passado pelo crivo provisório
de admissibilidade, e mesmo que negativo tal juízo, pois tal postura caracteriza a
ineficácia de eventual e futuro provimento do recurso extremo, com indesejável
desprestígio para a atuação jurisdicional, além da afronta ao princípio de que “ a lei não
excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” , previsto no
artigo
5º,
XXXV,
da
Constituição
Federal.
Humberto Theodoro Júnior [Tutela Cautelar durante a tramitação de recurso.Recursos
no Superior Tribunal de Justiça. Coordenação de Sálvio e Figueiredo Teixeira. São
Paulo. Editora Saraiva, 1991, pág. 242] enfrenta a questão destacando que: “O
importante não é a exegese da lei disciplinadora da competência, mas sim a eliminação
do risco de dano que está a comprometer a utilidade e eficácia da tutela jurisdicional,
como um todo. Se há necessidade de medida cautelar e seu retardamento se torna
injustificável, nas circunstâncias do caso concreto, não se deve perder no emaranhado
das regras processuais de competência. A medida haverá de ser examinada e deferida
por aquele juiz que, no momento, se acha em condições fática de impedir a consumação
do
dano
ameaçado
ou
temido”.
Arrefecendo o fulgor da competência jurisdicional, Ovídio A. Batista da Silva
[Comentários ao Código de Processo Civil, vol. 11, Porto Alegre, Letras Jurídicas
Editora, 1985, pág. 172-173] enfatiza em seus comentários que “A proteção cautelar
não seria sequer imaginável se os obstáculos porventura criados por prescrições
meramente instrumentais de determinação de competência acabassem por torna-la
ineficaz e tardia [...] a proteção cautelar nasce e se legitima porque a tutela jurisdicional
ordinária se mostra insuficiente [...] Prometer-se tutela cautelar e torna-la depois inócua
em virtude de prescrições sobre competência será o mesmo que dar com uma mão e
com
a
outra
retirar
o
que
se
deu”.
Nessa esteira, fica aberto, em tese, o caminho para que seja postulado o efeito
suspensivo no Tribunal “a quo”, não por simples requerimento, tal qual possibilita o
RISTF, mas através de ação cautelar, de acordo com o artigo 798 do CPC.
Quanto ao pressuposto (b) de que o recurso extraordinário interposto somente possui
viabilidade processual, caracterizada, dentre outras, pelas notas da tempestividade, do
pré-questionamento explícito da matéria constitucional e da ocorrência de ofensa direta
e imediata ao texto da Constituição, afigura-se isolado e dissonante da própria
jurisprudência do STF, porque caracterizaria duplicidade do juízo de admissibilidade do
recurso extraordinário pendente, levando-se em conta que esse exame é atribuição
inicial do Tribunal “a quo”. Assim, supõe-se que, se o recurso foi admitido, em tese,
preencheu todos os pressupostos de admissibilidade recursal. Evidente, pois, que, se
existe a possibilidade do exame da medida cautelar (se foi instaurada a jurisdição
cautelar no STF, pela admissão do recurso), é porque o recurso admitido preencheu os
pressupostos recursais reclamados. Pode-se concluir esse “pressuposto” é decorrente de
ato isolado, que contraria o montante de decisões da Suprema Corte, que, exceto na
questão da prévia admissibilidade do recurso, está em consonância com a doutrina, no
sentido de que existentes o “fumus” e o “periculum” é vinculante a concessão do efeito
suspensivo.
Observa-se, ainda, no procedimento adotado no STF, que a concessão do efeito
suspensivo, como medida de urgência, é dado, inicialmente, pelo Relator, inaudita
altera pars, “ad referendum” do Pleno ou da Turma, sobre simples requerimento, no
bojo dos autos, assim considerado, e sem contraditório, procedimento criticado por
Teresa Arruda Alvim [Medida cautelar para dar efeito suspensivo a recurso. In:RePro
74/125], posto que “deveriam ser tratados como se fossem verdadeiras ações cautelares
incidentais inominadas [...] em que o contraditório não pode ser dispensado, numa
circunstância como esta”.
4. Notas conclusivas:
1.O recurso extraordinário, por não comportar efeito suspensivo “ex lege”, de acordo
com o artigo 542 do CPC, deve ser recebido tão-somente no efeito devolutivo, de forma
a obstar a formação da coisa julgada, sem impedir contudo, a precipitação da execução
provisória, também dita incompleta, da decisão impugnada;
2. Existe a possibilidade de ser atribuído o efeito suspensivo ao recurso extraordinário,
via requerimento simples, junto ao STF, desde que demonstrados os pressupostos (a) da
comprovação da admissibilidade do recurso no Tribunal “a quo”, (b) do “fumus boni
juris” e (c) do “periculum in mora”.
3. A possibilidade de atribuição do efeito suspensivo “ope iudicis” está de acordo com o
princípio da efetividade da prestação jurisdicional, de forma a assegurar não somente a
rapidez, agilidade, mas acima de tudo o resultado útil do processo, compatível com a
segurança almejada.
4. A medida cautelar no STF é regida pelos artigos 21, IV e V, e 304, sem formalidades
expressas, não se subsumindo às normas do artigo 796 e seguintes do CPC.
5. A Corte Suprema criou óbice ao exercício da medida cautelar ao exigir a
demonstração do recebimento do recurso extraordinário, na pendência de seu
processamento, junto ao Juízo “a quo”, ou em grau de recurso, incompatível com a
natureza da providência jurisdicional.
6. A competência não pode ser obstáculo ao exame da medida cautelar por torná-la
ineficaz e tardia. Prever-se tutela cautelar e torná-la depois inócua, em virtude de
prescrições sobre competência, será o mesmo que dar com uma mão e com a outra
retirar o que se deu.
7. O exercício de medida cautelar inominada (art. 798, CPC) no Tribunal “a quo”,
mesmo antes do exame do juízo de admissibilidade do recurso extraordinário, mostra-se
compatível com o sistema, sem que caracterize a usurpação da competência da Suprema
Corte.
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Teresa Arruda Alvim (Coordenadora). Aspectos Polêmicos e Atuais do Recurso
Especial e do Recurso Extraordinário. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1998.
*Juiz Substituto em Segundo Grau no Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, Mestre em
Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Professor da Escola de
Magistratura do Estado do Paraná e da Faculdade de Direito de Curitiba (FIC). Autor de
editoriais
especializados
em
Direito.
diversas
publicações
em
veículos
[email protected]
Disponível em:
http://www.mundolegal.com.br/?FuseAction=Doutrina_Detalhar&did=20167
Acesso: 14 de junho de 2007
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Recurso extraordinário – Atribuição de efeito suspensivo