CASO CLINICO: FEBRE REUMÁTICA
Adriana de Paula
Eveline Rodrigues
Coordenação: Dra. Sueli R. Falcão (Hospital
Regional da Asa Sul/ESCOLA Superior de
Ciências da Saúde (ESCS )/SES/DF
www.paulomargotto.com.br
Brasília, 12 de junho de 2010
ANAMNESE

ID.: A.P.R.O., sexo feminino, 10 anos, natural de São Francisco-MG,
procedente de São Sebastião.

Q.P.: movimentos descoordenados, há 2 meses

HDA: Mãe refere que há 2 meses criança iniciou dificuldade para segurar
objetos, tremores de extremidades e contorção do corpo e membros (que
só cessavam durante o sono), além de desequilíbrio ao deambular.
Associado, apresentou alguns episódios de febre não-aferida, dor de
garganta e “ínguas no pescoço”, (sic).

Procurou o hospital em Montes Claros-MG, onde realizou exames, sobre os quais a mãe
não sabe informar, foi feito Dx de sopro cardíaco (pela 1ª vez) e realizou tratamento com:
Captopril, haloperidol, amplictil e penicilina benzatina. Recebeu alta em 8 dias, tendo
mantido uso da medicação por 2 meses. Como não houve melhora total dos movimentos,
mãe veio a Brasília para tto mais especializado.
ANTECEDENTES

Pessoais:
 Nascida
de parto-normal, a termo, PN=2900g.
LME até 2 meses, DNPM normal.
 Vacinações em dia.
 Relato de amigdalites de repetição.

Familiares:
 Mãe,
47 a, osteomielite
 Pai, 52 a, fumante
 7 irmãos, todos saudáveis
 Avó materna cardiopata
EXAME FÍSICO – HRAS








BEG, hipocorada +1/+4, acianótica, hidratada, eupneica, afebril.
Orofaringe: sem sinais flogísticos, ausência de secreção purulenta.
Linfonodos não-palpáveis
AR: MVF, sem RA
ACV: Ictus cordis visível em 4° EICE, na LHE, medindo +- 3 cm. Frêmito
palpável neste mesmo local. RCR, em 2T, BNF, B2 com desdobramento
fisiológico, sopro holossistólico, mais audível em foco mitral, +4 / +6,
com irradiação para dorso e axila. FC=104bpm. Pulsos palpáveis,
cheios e simétricos.
Abdome: sem alterações.
Ext.: bem perfundidas, sem edema.
Neurológico: Presença de dismetria na prova index-nariz. Ausência de
tremores ou movimentos atípicos de extremidades.
Ritmo sinusal
Fc= +- 100bpm
Eixo cardíaco entre 0 e 90 graus
Ausência de sobrecarga ventricular (índice de Sokolow-Lyon=19)
Presença de ondas p bífidas = sobrecarga de átrio E)
RX DE TÓRAX
EXAMES COMPLEMENTARES:

19.05:
 VHS=14mm/1ª hora (VN<20mm/h)
 leuc: 14600, 78%neut, 1%bast, 16%linf
 C3=135 (VN<150), C4=28,3 (VN<38,5)
 PCR<0,32 (VN<6mg/dl)
 ASLO=495 (VN: <300)
 alfa-1-glicoproteína=64,4 (VN<120)
EXAMES COMPLEMENTARES:

18.05:
 Ecodooplercardiografia: espessamento mitral com
insuficiência valvar importante / pequeno derrame
pericárdico / Exame sugestivo de atividade reumática
FEBRE REUMÁTICA

A febre reumática (FR) e a cardiopatia reumática crônica (CRC)
são complicações não supurativas da faringoamigdalite*
causada pelo estreptococo beta-hemolítico do grupo A.

Resposta imune tardia a esta infecção em populações
geneticamente predispostas.

Associada à pobreza e às más condições de vida.

indivíduos de 5 a 18 anos.
ETIOPATOGENIA

Anticorpos que reconhecem e atacam tecido do
organismo por mimetismo molecular

Produção de citocinas  resposta celular (Th1) 
quadros de cardite grave e sequela valvar

Resposta humoral (Th2)  quadro clínico com
coréia e artrite.
DIAGNÓSTICO

É clínico, não existindo sinal patognomônico ou exame
específico.

Exames laboratoriais são para o diagnóstico do processo
inflamatório e da infecção estreptocócica.

Critérios de Jones: “padrão ouro” para o diagnóstico do
primeiro surto da FR.
 A divisão dos critérios em maiores e menores é baseada na
especificidade e não na frequência da manifestação.
DIAGNÓSTICO
Retirado das Diretrizes Brasileiras para o Diagnóstico, Tratamento e Prevenção da Febre Reumática
DIAGNÓSTICO

VHS e PCR: se elevam no início do quadro, e caem
já na 2ª semana

Mucoproteínas (alfa1-glicoproteína e alfa2globulina): se elevam 1-2sem após o início do
quadro e só diminuem com o fim da atividade
reumática  mais confiáveis.

ASLO, anti-DNAse B, anti-hialuronidase, cultura de
swab de orofaringe
QUADRO CLÍNICO

ARTRITE
 Manifestação
+ comum (75% dos casos)
 Edema + diminuição da capacidade funcional
 Poliartrite assimétrica, de grandes articulações,
muito dolorosa, não deixa sequelas.
 Resposta dramática aos INE (melhora da dor em
24h).
QUADRO CLÍNICO

CARDITE:
 Manifestação mais grave da FR (única que pode deixar sequelas e
acarretar óbito).
 Tende a aparecer em fase precoce ( +- três primeiras semanas).
 É de acometimento pancardíaco, mas é a lesão valvar a
responsável pelo q. clínico e prognóstico.
 Classificação:




Subclínica: ausculta sem alterações, porém presença de regurgitação
patológica valvar em ecodopplercardiografia.
Leve: taquicardia sinusal desproporcional à febre, hipofonese de B1 e sopros
discretos.
Moderada: sinais de pericardite aguda (dor precordial, atrito pericárdico), sopros
exuberantes (área mitral ou aórtica), cardiomegalia discreta, ECO com
sobrecarga ventricular e derrame pericárdico.
Grave: sinais e sintomas de IC
QUADRO CLÍNICO

CARDITE
 Sopros:
 Mais
comum: sopro holossitólico apical (insuf. Mitral)
 Sopro de Carey Coombs (diastólico, estenose mitralsímile) (diferença: não apresenta estalido de abertura valvar, nem hiperfoneses de B1)
 Sopro protodiastólico aórtico (insuf.aórtica)
 Nódulos
de Aschoff (histopatológico):
 Patognomônicos
da FR
 Encontrados na miocardite reumática: necrose
fibrinóide central + cél. De ASchoff  fase tardia ou
crônica da FR.
QUADRO CLÍNICO

CORÉIA DE SYDENHAM:








Isoladamente, faz DX de FR.
Mais tardia (1-6m do início da FRA), geralmente qdo já há regressão
dos outros sintomas.
Causa mais comum de coréia em crianças
Movimentos bruscos e fora de propósito, presentes nas
extremidades e face: sorriso largo, caretas, contorções.
Disartria, disgrafia, fasciculação da língua, reflexos patelares
pendulares.
Melhora durante o sono ou sedação.
Labilidade emocional, irritabilidade, TOC.
Auto-limitada, sem sequelas, duração de +-3-4 meses (ou flutuante
por até 2 anos)
QUADRO CLÍNICO

Eritema marginatum





Maculopapular, bordas nítidas avermelhadas e centro
claro.
Serpeginoso, migratório.
Sem prurido, nem dor
Duração de semanas ou meses. Não deixa cicatriz.
Nódulos subcutâneos



Firmes, indolores, “em grão de ervilha”
Sem sinais flogísticos, pele é móvel sobre eles.
Superfícies extensoras distais dos MM, tendões e
proeminências ósseas.
TRATAMENTO

Erradicação do S.pyogenes:
 Penicilina benzatina 1.200.000 U (600.000U para
os <20kg).

TTO da poliartrite, febre e sintomas gerais:
 AAS em dose plena até o fim dos sintomas +
redução pra 2/3 da dose até normalização de
marcadores inflamatórios.
 Não usá-los na fase inicial, para que o padrão da
poliartrite migratória possa ser revelado
TRATAMENTO

Cardite:
 Leve:
salicilatos
 Moderada ou grave: prednisona por 2-3meses.
Retirar progressivamente durante 2 semanas,
associando ao AAS (p/diminuir recorrência dos
sintomas).
 Casos com IC grave: uso de drogas com ação
cardiovascular e diuréticos (dobutamina, digoxina,
furosemida...)
TRATAMENTO

Coréia:

Leve e moderada: repouso e a permanência em ambiente
calmo, evitando-se estímulos externos. Os
benzodiazepínicos e fenobarbital também podem ser
utilizados.

O tratamento específico está indicado apenas nas formas
graves da coréia, quando os movimentos incoordenados
estiverem interferindo na atividade habitual do indivíduo.
(Hospitalização poderá ser necessária).

Os fármacos mais utilizados no controle dos sintomas da
coréia são: a) haloperidol, b) ácido valpróico,
c)carbamazepina.
PROFILAXIA DA FEBRE REUMÁTICA


Penicilina Benzatina, a cada 21 dias:
Diretrizes Brasileiras para o Diagnóstico, tratamento e prevenção da febre reumática. Arq Bras Cardiol 2009;
93(3 supl.4): 1-18
Diretrizes Brasileiras para o Diagnóstico, tratamento e prevenção da
febre reumática Arq Bras Cardiol 2009; 93(3 supl.4): 1-18
ENDOCARDITE INFECCIOSA
•
Processo inflamatório do endocárdio causado por
bactérias, fungos, vírus, rickettsias, micobactérias e
clamídias.
•
Classificação:
•
Aguda: Staphylococcus aureus, afeta válvula cardíaca normal,
quadro clínico exuberante e complicações precoces.
•
Subaguda: Streptococcus viridans, afeta válvulas lesadas, evolui
em semanas ou meses: baixa virulência do agente infectante.
Endocardite infecciosa
PROFILAXIA

O Guideline AHA 2007 para prevenção da endocardite
infecciosa modificou profundamente a abordagem da
profilaxia.

Atividades cotidianas causam bacteremia numa proporção tão
ou mais significativa que os procedimentos dentários.

Pacientes suscetíveis a endocardite devem manter um alto
grau de higiene oral e ter seus eventuais episódios de infecção
tratados prontamente.
INDICAÇÕES PARA PROFILAXIA:
Endocardite infecciosa
CONSENSO DE 2007
 Condições cardíacas associadas a alto risco de
consequência adversa da EI:

Prótese cardíaca valvar

EI prévia

Cardiopatia congênita cianóticas

Shunts sistêmico-pulmonares construídos
cirurgicamente com uso de implante de material
protético

Transplante cardíaco com desenvolvimento de
valvulopatia
*Outras condições com alto risco de EI, como: PCA, regurgitação e estenose
aórticas, regurgitação e dupla lesão mitrais, CIV, coarctação da aorta; não teriam
indicação de receber profilaxia pela nova orientação.
Endocardite infecciosa
NESSES CASOS DEVE-SE PROCEDER A
PROFILAXIA EM:

Todos os procedimentos dentários que envolvem
manipulação do tecido gengival, região periapical da
dentição ou perfuração da mucosa oral;

Procedimentos do trato respiratório, como broncoscopia
rígida;

Drenagem de tecido infectado (neste caso o antibiótico
deve ser específico para o germe suspeito Staphilococus sp em geral);

Parto vaginal complicado por infecção.
Endocardite infecciosa
OBSERVAÇÕES

Não é recomendada em procedimentos do trato urinário ou
gastrointestinal ( exceto em cateterismo vesical na vigência
de infecção);

Em condições como a doença reumática sem
comprometimento valvar, a profilaxia da endocardite não é
necessária e não é recomendável desde o guideline 1997.
Endocardite infecciosa
REGIME PADRÃO DE PROFILAXIA
Via oral
Drogas alternativas no caso
de hipersensibilidade
Quando a via oral não é
disponível
Ampicilina
Cefalexina
Amoxacilina
2,0 g VO (adultos), 50mg/Kg
(crianças) em dose única
2,0 g VO (adultos)
50mg/Kg (crianças) em
dose única
Clindamicina
600mg VO (adultos)
20mg/Kg (crianças) em
dose única
2 g EV ou IM
Cefazolina ou
Ceftriaxone
1 g IM ou IV
Drogas alternativas no caso de
hipersensibilidade e
impossibilidade da via oral
Azitromicina ou Clindamicina
600mg EV 30 minutos a 1 hora
Claritromicina
antes do procedimento
500mg VO (adultos)
15mg/Kg (crianças) em
dose única 1 hora antes do
procedimento.
Cefazolina ou
Ceftriaxone
1 g IM ou IV
Endocardite infecciosa

Pacientes de alto risco podem usar esse esquema, mas
casos selecionados de risco maior devem usar esquemas
mais vigorosos.

Em qualquer caso, independente da escolha do antibiótico
a administração da dose deve ser feita a partir de 2 horas
antes do procedimento, sendo ideal entre 30 minutos e 1
hora de antecedência.

A dose profilática pode ser administrada até 2 horas após o
procedimento, mas apenas no caso em que o paciente
inadvertidamente não fez uso da medicação.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Falcão S., Sasaki D. B., Vasconcelos C. E. H. Endocardite Bacteriana.
Rotinas de Atendimento em Pediatria. HRAS – Hospital Regional da Asa Sul,
2009.

Wilson W, Taubert KA, Gewitz M, et al. Prevention of infective endocarditis:
guidelines from the American Heart Association - a guideline from the
American Heart Association Rheumatic Fever, Endocarditis, and Kawasaki
Disease Committee, Council on Cardiovascular Disease in the Young, and
the Council on Clinical Cardiology, Council on Cardiovascular Surgery and
Anesthesia, and the Quality of Care and Outcomes Research
Interdisciplinary Working Group [published correction appears in Circulation
2007;116(15):e376–377]. Circulation 2007;116(15):1736–1754.
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Caso Clinico: Febre reumática