V o lu m e 2 C a p ítu lo s 7 - 1 2 oao ffakino Tradução V a lte r G ra c ia n o M artin s Dados Internacionais p a ra Catalogação n a Publicação (CIP) (C âm ara Brasileira do Livro) Calvino, João, 1509-1S64 Daniel,volume 2, capítulo$7-12 / JoãoCalvino; tradução: Vai ter Graci ano Martins.— S lo Bem ardo do Campo, S P : Edições Parakletos, 2002. ISBN 85-88589-08-7 1. Biblia. A.T. D aniel-Critica c interpretação I. Título. CDD-224.506 02-5878 índices p a ra catálogo sistemático: I. Daniel: Livros proféticos: Bíblia: Intcrprclação c critica 224.506 E dição b asead a em: Calvin s Commentaries V olum e X III ISBN : 0-8010-2440-4 O riginalm ente im presso p or C alvin T ranslation Society, E dim burgo, Escócia. R eim presso em 1998 p o r B a k er B ooks u m a d ivisão d a B ak er B o o k H ouse C om pany P.O. B ox 6287, G ra n d R apids, M I 49516-6287 1° edição em p ortuguês: dezem bro d e 2002 Tiragem : 2.000 exem plares Editoração e capa: E line A lves M artins Rua Adamantina, 36 • Baeta Neves 09760-240 ■São Bernardo do Campo, SP - Brasil Telefax: 11 4121-3350 • e-mait: paraMetoK9uol.com.br L ee 33* E xposição.......................................................................................................... 22 35* E xposição.......................................................................................................... 46 36* E xposição...........................................................................................................59 38“ E xposição...........................................................................................................84 39* Exposição...........................................................................................................98 40a E xposição......................................................................................................... 110 41* E xposição........................................................................................................ 123 42* E xposição......................................................................................................... 135 43* E xposição......................................................................................................... 148 44* Exposição......................................................................................................... 160 45* Exposição......................................................................................................... 172 46* E xposição......................................................................................................... 186 47* E xposição.........................................................................................................201 48* E xposição........................................................................................................ 214 49* Exposição........................................................................................................ 228 50* E xposição........................................................................................................ 242 51*Exposição...................................................................................................... 255 52* E xposição.........................................................................................................268 53* Exposição......................................................................................................... 281 54* Exposição.........................................................................................................292 55* Exposição.........................................................................................................304 5 D A N IE L 56* E xposição........................................................................................................ 318 57* E xposição.........................................................................................................331 58* E xposição........................................................................................................ 343 59* E xposição........................................................................................................ 356 60* Exposição........................................................................................................ 370 6l*E xp o sição .........................................................................................................381 62* Exposição........................................................................................................ 393 63* E xposição........................................................................................................406 64* E xposição........................................................................................................422 65a E xposição........................................................................................................436 66* E xposição........................................................................................................449 índice de referências bíblicas..............................................................................465 índice de palavras hebraicas............................................................................... 469 índice de autores sacros e profanos.................................................................... 471 6 O ra ç ã o q u e Jo ã o C alvino co stu m av a fazer no início d e suas preleções: o S en h o r y e r m ita n os en g a ja rm o s n os m istérios ceíestia is d e sua sa b ed oria , p a r a q u ejjr o g rid a m o s em verd a d eira sa n tid a d e, y a r a o ío u vo r d e sua g íó r ia e y a r a nossa y r ó y r i a edificação. Que A mém. 32a d íip ítu â o 7 1 N o p rim eiro ano d e B elsazar, rei d e B ab ilônia, D aniel teve u m sonho e v isões d e sua cabeça, em seu leito. E ntão escreveu o sonho, e relatou a sum a d os assuntos. 1 A n n o prim o B eltsazar R eg is B abylonis, D aniel som nium v idit, e t visiones capitis ejus in lecto ejus. T unc som nium scripsit, sum m am serm onum exposuit. 2 F alo u D aniel, e disse: Vi e m m inha v isão noturna, e eis que os q uatro v entos d o céu agitavam o grande m ar. 2 L oquutus est D aniel, e t exposuit: Vidi in v isione m ea p er n o c te m , e t e cc eq u a tu o r v e n ti c celorum p u g n a n te s ,1 in raari m agno. Aqui D aniel com eça oferecendo instrução peculiar à Igreja. Pois Deus anteriorm ente o designara com o intérprete e instrutor de reis profanos. Agora, porém , ele o designa com o m estre da Igreja, para que exerça nela seu ofício e sua instrução destinados aos filhos de D eus em seu seio. E m ister que notem os esse fator, antes de tudo, porque até aqui suas predições se estenderam para além dos lim ites d a fam ília da fé; aqui, porém , o dever de D aniel se restringe à Igreja. D iz ele: E sta visão m e foi co n ced id a no p rim e iro ano do rei B elsazar, antes que ocorresse a m udança que já vimos previam ente. A ntes de tudo, devem os tentar enten der o desígnio do Espírito Santo; ou, seja, o fim e o uso p ara os quais ele revelou a Daniel o conteúdo deste capítulo. Todos os profetas insistiram com o povo eleito sobre a esperança de livra mento, depois que Deus houvera castigado neles sua ingratidão e 1Alguns traduzem “erguendo-se de". 9 [7.1, 2] D A N IE L obstinação. A o lerm os o que outros profetas anunciaram concer nente a sua redenção futura, presum iríam os que à Igreja fora p ro m etido um estado feliz, tranqüilo e com pletam ente pacífico, de pois que o povo houvesse regressado do cativeiro. A história, porém , testifica quão diferente foi tal regresso. Pois os fiéis teri am caído exaustos e teriam apostatado, a m enos que fossem ad m oestados sobre as diversas perturbações que estavam por vir. Eis aqui, pois, a prim eira razão por que Deus revelara a seu Pro feta o que logo veremos; ou, seja, que ainda restavam três m onar cas, cada um dos quais sucederia o anterior, e que durante seu governo todos os fiéis teriam que perseverar em perm anente e constante confiança nas prom essas, ainda que vissem o mundo inteiro estrem ecer e severas e angustiantes convulsões prevale cendo por toda parte. Por essa razão, aqui se apresenta a visão de Daniel concernente aos quatro impérios. Talvez seria m elhor adiar seu sum ário até que o Profeta com ece a tratar de cada animal em separado. Mas, com respeito aos dois prim eiros versículos, é bom que observem os o tem po do sonho. A ntes que os medos e persas transferissem o im pério caldaico para si, os profetas foram instruídos sobre este assunto, para que os judeus pudessem reconhecer o cum prim ento parcial do que D eus lhes havia com m uita freqüência prom etido, a eles a seus pais. Pois se seus inim igos houvessem possuído B abilônia sem algum a nova predição, talvez os judeus não atentassem bem para aquelas profecias que outrora foram pronunciadas em seu favor. D aí Deus querer arejar suas m em órias, e então, quando vissem a queda daquele im pério que todos criam ser inexpugná vel, perceberiam o dom ínio dos conselhos secretos de Deus, do m ínio parcial, se não com pleto, cujo cum prim ento fora testifica do pela instrum entalidade de seus profetas. D iz ele: teve u m so nho. Ao falar previam ente do sonho do rei Nabucodonosor, ele mencionou um a visão, porém não pela m esm a razão, porque a descrença, m esm o vendo, não observa. D e fato observavam algo, 10 32* EX P O SIÇ Ã O 17.1, 2] obscuram ente, sem qualquer distinção, enquanto seus pensam en tos im ediatam ente esm aeciam . O m étodo dos profetas era dife rente; visto que não apenas sonhavam , porém divisavam um a visão distinta, e então proveitosam ente passavam para outros o que haviam recebido. O Profeta, pois, expressa algo peculiar por m eio desta frase, pois sabemos com o os profetas costumeiramente atribuíam a Deus tais visões, quando percebiam os segredos do céu, não com os olhos carnais, m as pela ilum inação e inteligên cia procedentes do Espírito. E le acrescenta: visões d e su a cab eça, em seu leito; e assim o sonho teria m ais peso, e não concluiríam os que teria havido al gum a confusão no cérebro de Daniel. E assim ele expressa com o vira tudo quanto o Senhor quis que ele soubesse, através de um sonho, com m ente serena. Ele diz em seguida: E n tã o ele escre veu o sonho e explicou o significado d a s p a la v ra s. Por meio dessa frase, ele nos ensina que a visão que recebera não foi por sua própria causa, m as para a edificação com um d a Igreja. Os que supõem Daniel com o que saltando subitam ente de seu leito, para que esquecesse o sonho, oferecem um com entário fútil e frívolo. D aniel, antes, desejava testificar essa visão com o sendo não peculiar a ele próprio, mas com o algo com um ao povo eleito de D eus; e daí não só teria que ser celebrado oralm ente, m as ti nha que ser entregue à posteridade para m em orial perpétuo. Pre cisam os ter em mente estes dois pontos: prim eiro, Daniel escre veu esta profecia para que o conhecim ento dela fosse sem pre ce lebrado entre os fiéis; e, segundo, ele considerava os interesses da posteridade, e por isso escreveu a visão. Am bos esses pontos são dignos de nota para induzir-nos a prestar m ais atenção à vi são, um a vez que a m esm a não fora enunciada por um m ero indi víduo; senão que Deus escolhera a D aniel com o seu m inistro e com o o arauto e testem unha deste oráculo. D aí virm os com o esse oráculo nos diz respeito; não foi o ensino p ara algum a época sin gular, m as se estende a nós e deve vigorar até o fim do mundo. 11 [7.1,2] D A N IE L Ele repete a m esm a coisa, adicionando: explicou o sen tid o d as p a la v ra s. Pois os que separam essas duas classes parecem ir d i reto ao chão.2 D aniel e n tã o falo u e d isse - Isso não é um a refe rência a palavras, mas a escritos; com o se o Profeta dissesse: Cum pri meu dever! Já que ele sabia que o que m ais adiante vere mos concernente às quatro m onarquias não lhe fora divinam ente confiado devido ao encobrim ento de algo j á conhecido, mas, an tes, ele se sentia um instrum ento escolhido de Deus, que estava assim sugerindo aos fiéis recurso para confiança e paciência. Portanto, ele fa lo u e explicou; ou, seja, ao desejar prom ulgar este oráculo, ele dava testem unho de não haver diferença entre ele e a Igreja de Deus neste anúncio; mas, com o fora eleito e ordenado mestre, assim entregou o que havia recebido, através de suas mãos. D aí D aniel não só enaltece sua própria fé, m as excita a todos os piedosos à ansiedade e atenção, para não desprezarem o que Deus pronunciara por sua boca. Ele reitera um a vez mais: E le viu em su a visão d u r a n te a noite. U m a vez mais, repito, Daniel afirm a que não apresenta nada m ais senão o que autorizadam ente lhe entregara. Pois sabe m os que na Igreja todas as tradições humanas têm de ser tratadas com o algo sem valor, visto a sabedoria hum ana não passar de vaidade e mentira. Com o somente D eus m erece ser ouvido pelos fiéis, assim Daniel aqui assevera que ele nada oferece de si m es mo por m eio de sonhos, no sentido ordinária, m as que a visão é certa, e com o tal não engana os piedosos. Em seguida ele acrescenta: E eis q u e os q u a tro ventos do céu a g itav am o g ra n d e m a r. Dou mais preferência a esta tradu ção. Os intérpretes diferem com respeito aos ventos, m as o senti do genuíno parece-m e ser este: D aniel usa um símile universal m ente conhecido, pois em chão firme, quando estala algum a po1 A frase n o texto latino é um provérbio: nttdum quierere in scyrpo. O francês é correto em sua interpretação: chercher de la difficulté où il n 'y en a point. Tanto Ennius quanto Terence usam o provérbio. 12 32* EX P O SIÇ Ã O [7.1,2] derosa tem pestade, qualquer concussão turbulenta raram ente se ouve com o vinda do mar. Sem dúvida, ele aqui apresenta a im a gem de um m ar furioso para advertir os fiéis contra a proxim ida de de com oções terríveis, com o se o m ar fosse agitado por tor mentas e furiosas tempestades estalassem por todos os lados. Esse é o significado da frase. D aí denom inar ele de quatro ventos, para m ostrar aos fiéis com o o m ovim ento que estilhaçaria o globo não seria único e sim ples, m as que diversas torm entas viriam juntas de todos os lados - exatam ente com o acontece. As vezes é possí vel verm os a terra sacudida justam ente com o se um a tempestade a quisesse arrem essar ao m ar vinda de todas as direções, m as o m ovim ento ainda é único. Deus, porém , queria m ostrar a seu Pro feta não só um a simples concussão, m as muitas e distintas, com o se todos os ventos se centrassem num único conflito geral. É ver dade que os filósofos enum eram os ventos com o sendo m ais de quatro quando desejam tratar do núm ero com precisão, porém o costum e é falar de quatro ventos soprando dos quatro cantos ou regiões do globo. O sentido, contudo, é óbvio e de form a algum a forçado - sendo o m undo com o um m ar conturbado, não agitado por um a única torm enta ou vento, m as p o r diferentes rajadas con flitantes, com o se todos os céus conspirassem para provocarem com oções. Esta visão, num prim eiro relance, parece m uito am arga para os fiéis, porquanto contavam os anos prescritos por Jerem ias; expirando assim os setenta anos, Deus então lhes prom etera o térm ino de suas tribulações. A gora D eus anuncia que não devem deixar-se dom inar pela esperança de repouso e alegria; mas, ao contrário, que se preparassem para enfrentar o ím peto de ventos ainda m ais ferozes, quando o m undo seria por toda parte agitado por diferentes torm entas. Quem sabe chegassem m esm o a sus peitar que Deus não concretizaria suas prom essas; todavia, isso seria suficiente para apaziguar suas m entes e reanim á-las com a esperança de redenção, quando nada viam acontecer, nem abrup 13 [7.3] D A N IE L tam ente, nem casualm ente. U m a vez m ais Deus veio ao encontro de suas tentações a fim de que sua coragem não se desvanecesse, ensinando-lhes que o m étodo de sua redenção não era tão fácil quanto haviam previam ente concebido à luz das predições ante riores. Deus deveras não havia m udado seus planos, pois ainda que passasse um longo período desde que ele falara pelos lábios de Isafas e outros profetas, todavia desejava preparar os judeus contra a delonga, a fim de que não se lhes desvanecesse a cora gem que lhes era requerida para m itigar tão profundas aflições. Mas quando a redenção realm ente se aproxim ava, então D eus explicou seu m étodo mais clara e fam iliarm ente, e m ostrou quão grandes e severas eram as lutas restantes. D aí os fiéis, introduzi dos po r tais profecias, contenderiam exaustivam ente, e todavia avançariam constantem ente em seu curso de fé e obediência. E então prossegue: 3 E q uatro animais grandes, d iferentes uns d o s ou tro s, subiram d o m ar. 3 E t q u atu o r b e s t is raagn® p ro d ib an t e mari. d iv e rs * hsec a b illa.' D epois que Daniel divisou essas grandes com oções que esta vam abalando a terra em diferentes partes, foi-lhe oferecida outra visão. O que já se disse concernente ao m ar agitado e o conflito dos ventos se estende a quatro m onarquias, acerca das quais tra tarem os agora. Insinua-se um a certa preparação quando D eus põe ante os olhos de seu Profeta um m ar conturbado, proveniente do conflito dos ventos. É com o se dissesse: depois dessas turbulên cias, outras surgirão; assim os homens esperarão em vão pela paz e tranqüilidade, pois terão de sofrer sob as agitações d a carne. A gora é expresso o tipo de conturbação, através das palavras: q u a tro an im ais g ra n d e s s u b ira m do m a r. D aí essa concussão, essas torm entas e esse confuso distúrbio do m undo inteiro atra vés de um reino sucedendo a outro. D ificilm ente seria possível ocorrer que algum reino venha a perecer sem que envolva outros ' Ou. seja, diferenciando entre si. 14 32* EX P O SIÇ Ã O [7.4] em sua ruína. D ificilm ente seria possível que um único edifício se desm orone sem que sua colisão seja ouvida por rincões dis tantes e a terra não se em basbaque ante sua fragorosa ruína. E n tão, o que aconteceria quando as m ais poderosas m onarquias su bitam ente perecessem ? D aí Daniel m ostrar neste versículo como o m undo se assem elha a um m ar encapelado, um a vez que vio lentas mudanças, entre seus impérios, estavam tão próxim as. A com paração dos impérios com animais é facilm ente explicável. Sabem os com o a glória e o poder de D eus se m anifestam com fulgor em todos os reinos, se forem corretam ente conduzidos se gundo a lei da eqüidade. Visto, porém , que am iúde vem os a ver dade do que fora dito a Alexandre: Os maiores reinos são os maiores gatunos, e bem poucos assimilam todo o poder num gran de im pério e exercem um a tirania cruel e excessiva. Aqui o Pro feta com para os impérios a animais enorm es e selvagens, dos quais ele tratará m ais adiante. A gora entendem os o significados das palavras: e podem os aprender esta lição do que geralmente acontece nos impérios do mundo; em si m esm os, com o já disse mos, eles são os m ais belos reflexos da sabedoria, virtude e ju sti ça divinas, a despeito de que os que obtêm supremo dom ínio raram ente reconhecem que eles mesm os são criados para o de sem penho de seu ofício. Portanto, com o os reis são, em sua m aio ria, tiranos, sobrecarregados de crueldade e barbárie, esquecidos do espírito de hum anidade, o Profeta caracteriza esse vício com o que em anando deles m esm os, e não da sacra ordenação de Deus. Avancemos mais: 4 O prim eiro era co m o um leão, e tinha asas d e água; e nquanto e u olhava, foram lhe a rrancadas a s asas, e ele foi lev a n tad o d a terra e p o sto em p é co m o um hom em , e foi-lhe d a d o um c o raç ão d e hom em . 4 P rim a sicut leo,1 e t alie a q u ilx ei: vidi donec e v u ls s su n ta lsee ju s, e ts u b la ta fu it e terra, e t su p er pedes suos quasi hom o estetit. e t cor h o m in is datum est ei. É evidente que as quatro m onarquias são aqui representadas. ‘ A prim eira besta como um leio. 15 [7.4] D A N IE L N ão há, porém , concordância entre todos os escritores sobre qual m onarquia é a últim a e qual a terceira. Com respeito à prim eira, todos se dispõem a entender a visão com o sendo um a referência ao im pério caldaico, o qual se uniu ao assírio, com o já se viu anteriorm ente. Pois N ínive foi absorvida pelos caldeus e babilô nios; porém o Profeta discorre por fim sobre o im pério assírio e caldaico, o qual então florescia. N inguém , contudo, teria im agi nado que seu fim estaria tão próxim o; e na m esm a noite em que B elsazar foi morto, vim os com o ele, entregue à segurança e à soberba, m ergulhou em seus prazeres, e que excessiva e desaten ta segurança im perava por toda a cidade. Essa m onarquia, pois, tem de estar, em prim eiro lugar, diante de nossos olhos. Visto com o no segundo capítulo esse im pério foi cham ado a cabeça de ouro da estátua, assim tam bém ele é agora cham ado um leão; ou, seja, é com parado a um animal nobre. Está com preendido sob a imagem de um anim al, e sua ferocidade e atrocidade, com o eu já disse, estão assim im plícitas; mas, com respeito ao outro reino, adm ite-se-lhe algum a superioridade, visto que o m undo está sem pre indo de mal a pior. E ainda que C iro fosse um príncipe bas tante prudente, todavia ele não atingiu a tem perança dos séculos anteriores; era insaciável em sua am bição, avareza e crueldade. Pois Isaías também, ao falar dos persas, diz: "não farão caso da prata, nem tam pouco desejarão ouro” (13.17). Percebem os, pois, a razão por que o profeta diz: O p rim e iro a n im a l e r a com o leão, posto que m aior integridade florescia sob os caldeus do que quando todos os impérios se mesclaram , e os persas subjugaram tanto os caldeus quanto os medos. Pois é evi dente, à luz de todas as histórias, que constituíam um a nação bárbara e feroz. Aliás, eram ostentosos em seu louvor da virtude, visto que viviam suas vidas em austeridade e desprezavam toda e qualquer luxúria e eram excessivam ente tem perantes em seu vi ver; sua ferocidade e brutal crueldade, porém , fizeram deles se res detestáveis. 16 32* EX P O SIÇ Ã O 17.4] O prim eiro anim al, pois, era com o leão, diz ele, e tin h a asas d e ág u ias; ou, seja, em bora fosse um leão. todavia possuía asas. Isso se refere a sua ligeireza, visto sabermos com o em pouco tem po os assírios fizeram sua m onarquia desenvolver-se, pois haviam previam ente subjugado os caldeu, precisam ente com o um leão em sua ligeireza. Pois um leão possuía força, ím peto e cruel dade para a prática de destruição. Além disso, o Profeta viu um leão alado, visto que não só aum entavam seu im pério com sua própria força, mas subitam ente estenderam suas asas em toda direção. Vemos, pois, com o a força e o poder estão im plícitos, de um lado, e m aior rapidez, do outro. Em seguida, ele diz: S uas asas fo ra m a rra n c a d a s . Pois quando os caldeus quiseram es tender suas fronteiras ainda mais, o Senhor os restringiu dentro dos devidos limites e refreou suas vitórias contínuas. Suas asas foram então arrancadas quando Deus os restringiu, pondo-lhes freio para que não avançassem tão livrem ente com o fizeram an teriormente. Então o Profeta acrescenta: E ste a n im al foi lev an tad o d a te rra , im plicitando a cessação do im pério. Porque nem os cal deus nem os assírios foram inteiram ente destruídos; porém sua glória foi com pletam ente obliterada. O rosto do animal não mais apareceu, quando Deus transferiu essa m onarquia para os medos e persas. D aí o Profeta acrescentar: e p o sto em p é com o um h om em , e lhe foi d a d o um co raç ão d e h om em . Por meio dessa form a de expressão, ele pretendia realçar a redução dos assírios e caldeus a sua ordinária condição, e que não mais eram com o um leão, m as com o hom ens individuais privados de seu poder e for ça. D aí a expressão e lhe fo i dado um coração com o de homem não deve ser entendida à guisa de louvor, m as por “ um hom em ” ele tinha em m ente algum a pessoa em particular; com o se quises se dizer: o aspecto dos caldeus e assírios não mais era terrível, visto que, enquanto prevalecia seu domínio, todos os homens eram terrificados por seu poder. D aí D eus rem over do m undo o rosto 17 [7.5] D A N IE L desse animal, substituindo-o por um rosto de hom em , e o fez pôr-se de pé. Anteriorm ente planavam no ar e desprezavam a terra, pondo tudo sob seus pés; Deus, porém , os fe z erguer sobre seus pés\ ou, seja, não se conduziram segundo seus costum es e postura antiga, m as sim plesm ente no nível com um , depois de D eus os privar de seu império. Esse, em meu juízo, é o significa do sim ples do Profeta. Se houver algum a necessidade, m ais adi ante confirm arem os as observações que ora assinalam os, porém rapidam ente. Segue: 5 E e is ou tro anim al, um segundo, sem elhanie a u m urso, e ele se ergueu num d e se u s lados, ten d o n a b o ca três c o stelas e n tre seus d e n te s; e lhe foi dito assim : L evanta-te, d ev o ra m uita carne. 5 E t ecce bellu a, b eslia. p o sterior altera5 sim ilis urso (inquit) et surrexit a d latus unum : e t tres c o s t s in ore ejus in te rd e n tes ejus: e t sic diceb an t e i/' S urge, com ed e carnem m ultam . Aqui o Profeta proclam a com o fora instruído, por m eio de um sonho, acerca do segundo animal. Se sim plesm ente ju lg ar m os à luz do evento, este animal sem dúvida representava o reino dos m edos e persas, em bora o Profeta especifique os persas, quan do o m edos desde outrora se subm eteram a seu jugo. Eis, diz ele, o u tro a n im al sem elh an te a u m urso. Sabem os ser o urso um animal estúpido e im undo, indolente e inerte, bem com o cruel. Ao com parar o urso com o leão, sua aparência é im unda e desa gradável, enquanto que a do leão é notável pela beleza e form idá vel em seu porte. Ele com para os persas a um urso, em virtude de sua barbárie, porquanto já declaram os que essa nação era em ex trem o feroz e selvagem. Repetindo, os persas não eram civiliza dos com o os assírios e os caldeus, que habitavam na mais bela região de todo o mundo, e num país tão encantador que se asse m elhava a um nobre teatro. Os persas, porém, viviam ocultos com o bestas selvagens em suas covas. H abitavam entre suas m ontanhas e viviam com o os brutos. D aí o Profeta com pará-los. ' Ou, seja, o segundo animal seguia o primeiro. * Ou, seja. “Assim lhe foi diio"; pois esta palavra é tomada em sentido indefinida. 18 32* EX P O SIÇ Ã O [7.5] mui apropriadam ente, a um urso. Sim, D eus revelou essa form a a seu Profeta. Em seguida, ele acrescenta: e ele se e rg u e u n u m de seus lados. H á quem pensa que isso foi acrescentado com o in tuito de expressar o dom ínio bem com binado dos m edos e per sas; essa opinião, porém, não se adequa bem. Sabem os quão ex tenso era o dom ínio dos medos antes de serem subjugados pelo poder de C iro e dos persas. Por si sós, os m edos eram mais pode rosos; então os persas foram acrescentados e em seguida Ciro apoderou-se das possessões d a m onarquia caldaica. Ele possuiu inclusive as chaves do Egito, reinou na Síria, dom inou a Judéia e estendeu-se para além do mar, até que, por fim, foi vencido pelos citas. Q uando, pois, se diz: ele se pôs num de seus lados, está im plícita a origem obscura de seu reino, pois a fam a dos persas se espalhou inclusive no seio de suas m ontanhas, até C iro adquirir-lhes um nom e por m eio de suas proezas. Porque ele era um bravo guerreiro, merecidamente eclipsou a glória de todos os mais. Daí, a princípio, esse anim al se pôs num de seus lados\ ou, seja, os persas eram sem fam a ou reputação; não possuíam riquezas e jam ais em ergiram de seus esconderijos. Vemos com o este parti cular se restringe a sua origem em decorrência de sua obscuridade. Então o Profeta acrescenta: ten d o n a b o ca trê s costelas e n tre seus d en tes; e lhe foi d ito assim : L ev a n ta-te, d e v o ra m u ita carn e ! Os que entendem as três costelas com o sendo três reinos definidos parecem dar dem asiada atenção a m inudências. Creio ser um núm ero indefinido, porque esse animal havia abocanhado não apenas uma costela, m as três; um a vez que os persas, com o já dissem os, exibiam em si o poder dos medos, e m ais tarde sub jugaram os assírios e os caldeus, e Ciro tam bém subjugou muitas nações, até que toda a Á sia M enor reconhecesse sua autoridade. Q uando, pois, o Profeta fala de três costelas, o que está im plícito é a natureza insaciável desse anim al, posto que não se contentava com apenas um corpo, m as concom itantem ente devorava muitos homens. Porque, por “muitas costelas” ele tem em vista muita 19 {7.5] D A N IE L presa. Eis o sentido com o um todo. N ão hesito explicar as pala vras foi-lhe d ito [ao animal] com o um a referência aos anjos ou ao próprio Deus. Há quem prefere entendê-las no sentido de estí m ulo pelo qual Ciro fora instigado à crueldade. Visto, porém, que D eus exibe ante seu Profeta a im agem de sua Providência, o que recentem ente sugeri vem a ser m uitíssim o provável, ou, seja: fo i-lh e d ito : E rg u e-te, d e v o ra m u ita ca rn e ; não porque Deus fosse o autor de crueldade; mas, visto que ele governa, por seu secreto conselho, os eventos que os homens realizam sem m éto do, sua autoridade é aqui merecidam ente posta ante nossos olhos. Posto que Ciro não teria penetrado tão ligeiram ente em diferen tes regiões, cum ulado para si tantos im périos e subjugado nações tão poderosas, não houvera Deus planejado punir o m undo, e não teria tom ado a Ciro com o seu instrum ento de matança. Como, pois, Ciro executou a vingança de D eus derram ando tanto san gue hum ano, o Profeta declara que lhe disseram: Ergue-te, devo ra m uita carne. Em um aspecto, D eus não se deleitou com a m atança de tantas nações, pelas m ãos de Ciro e pelo crescente poder e tirania de um só homem através do derram am ento de sangue humano; mas, em outro aspecto, fala-se de Deus com o com andando a conduta de Ciro, um a vez que ele queria punir o m undo por sua ingratidão, à qual acrescentou-se a m ais desespe rada obstinação e rebelião. Não havia rem édio para tais vícios; daí D eus confiar a Ciro o dever de executar seu juízo. Sinto-m e com pelido a deter-m e neste ponto. ORAÇÃO Deus Onipotente, visto que nos expuseste a várias tribulações neste mundo com o propósito de exercitar nossa f é e paciência, concedenos que permaneçamos tranquilos em nossa condição, pelo exercí cio da confiança em tuas promessas. Quando as tormentas nos en volvem de todos os lados, que jam ais desmaiemos e jam ais nossa coragem se descoroçoe; ao contrário, que perm aneçamos firm es em nossa vocação. O que quer que aconteça, possamos reconhecer-te como Aquele que leva a bom termo o governo do mundo, não só para 20 32* EX P O SIÇ Ã O punir a ingratidão dos réprobos, mas para reter a f é de teu próprio povo e revelar-lhe tua proteção, bem como preservá-lo até o fim. Que mantenhamos nossa paciência, sejam quais forem as mudanças que nos afetem; e que nossa mente jam ais se perturbe e mergulhe em profunda angústia, até que, p o r fim , sejamos congregados naquele descanso feliz, onde estaremos isentos de toda guerra e de todas as disputas, e onde desfrutaremos da eterna bem-aventurança, a qual preparaste para nós em teu unigénito Filho. Amém 21 g 33a .xposição 6 Post h oc vidi,7 e t ecce alia, beslia scilicet, sicu t p ardus, sim iiis pardo, e t alse q u atu o r avis su p er d o rsu m ejus, e t q uatuo r capita b c s tis : et p o testas d a ta est ei. 6 D epois disso, continuei olhando, e eis o u tro , sem elhante a u m leopardo, e tin h a q u a tro asas de aves em suas costas; o anim al tin h a tam b ém q uatro cabeças; e foilhe d ad o dom ínio. Daniel acaba de falar de dois im périos, a saber: o caldaico e o persa. Os intérpretes concordam com a necessidade de atribuir esta visão ao im pério m acedônio. Ele com para esse reino a um leopardo, ou, com o alguns o traduzem, a um a pantera, visto A le xandre haver granjeado seu grande poder unicam ente p o r sua ra pidez. E ainda que ele não fosse de m odo algum um animal notá vel, todavia conduziu-se com extraordinária rapidez e subjugou todo o Oriente. O utros encontram muitos pontos de semelhança, nos quais o caráter grego se acha em harm onia com a natureza do leopardo. Receio, porém , que tais minutics sejam de mui pouco peso. Para mim é suficiente que o Espírito esteja aqui tratando do terceiro im pério. A princípio ele não era de grande im portância, e tam pouco podia terrificar as regiões longínquas nem adquirir súditos por sua própria dignidade. Então ele veio a tornar-se se m elhante a um animal veloz, se assim podem os dizer, visto a rapidez de Alexandre tornar-se notória; porém não se destacou em prudência, nem em gravidade, nem em juízo, nem em quais quer outras virtudes. A m era precipitação assenhoreou-se dele; e m esm o que jam ais houvesse provado vinho, só sua am bição o 1 Ou. seja, foi-me oferecida um a visâo. 22 3 3 " EX P O SIÇ Ã O [7.6] teria intoxicado. D aí ser toda a vida de A lexandre a de um ébrio; não havia nele nem m oderação nem com postura. Vemos, pois, quão adequadam ente isso corresponde ao caráter de Alexandre, ainda que o m esm o se tenha estendido a seus sucessores, parti lhando todos eles, em grande escala, da natureza de seu príncipe. Portanto Daniel declara: A p areceu -lh e o u tro an im al sem elhante a u m leopardo. E diz também: T in h a ele q u a tro a sa s n a s co stas e q u a tro cabeças. Algumas pessoas, e creio que obstinadam ente, fazem distinção entre as asas e as cabeças. Pressupõem o reino na figura de anim ais alados, visto A lexandre haver se assenhoreado de m uitos reinos num período m uito curto. O sentido m ais simples, porém , é que esse animal tinha quatro asas e quatro cabeças, um a vez que Alexandre, ao morrer, dificilm ente teria com pletado suas vitórias, contrariando toda e qualquer expectativa; e, depois de sua m orte, cada uma [das cabeças] assenhoreou-se para si de uma porção da presa. Entretanto, isto é indubitável: depois de os prin cipais generais de seu exército haver contendido por m uitos anos, todas as histórias concordam em declarar que o suprem o poder centrou-se em quatro. Pois Seleuco obteve a Á sia M aior e Antígono, a Á sia M enor; Cassandro foi rei da M acedônia, e foi suce dido por Antípater; enquanto que Ptolom eu, filho de Lago, veio a ser o governante do Egito. Aliás, haviam tam bém concordado entre si: pois Alexandre teve um filho com Roxana, filha de Dario; ele teve um irmão, Aridíeus, que chegou à idade adulta, mas era epiléptico e de intelecto avariado. Então, já que os generais de A lexandre eram por dem ais sagazes, agiram sob esse pretexto para que todos jurassem lealdade a seu guarda, e então a Aridasus, em caso de seu guarda m orrer antes que chegasse à idade senil.8 Então Lisím aco foi posto sobre o tesouro, outro com an dou as forças e os outros receberam várias províncias. Quinze ou ' O texto latino na edição de G enebra de 16J7 traz “populi", onde deveria ser "pupillC. A de 1569 é a redação correia - “pupilU". 23 [7.6] D AN IEL vinte líderes dividiram entre si as forças e o poder, enquanto nin guém ousava assumir o título real. Pois o filho de A lexandre era o rei legítim o e seu sucessor era aquele A rid$us de quem já falei. M as logo depois se uniram ; e essa foi um espécim en adm irável de providência divina, o que por si só é suficiente para provar aquela passagem bíblica: “Aquele que derram ar o sangue do ho m em , pelo hom em seu sangue será derram ado” (G n 9.6). Por quanto nenhum dos generais de A lexandre escapou em seguran ça, exceto aqueles quatro de quem já fizem os menção. Sua mãe, com a idade de oitenta anos, sofreu m orte violenta; sua esposa, Roxana, foi estrangulada; seu filho pereceu miseravelm ente; Aridzeus, seu irm ão, homem de mente avariada, e quase se nivelan do aos brutos, foi morto com o restante - na verdade toda a fam í lia de A lexandre sofreu m ortes violentas. C om respeito aos ge nerais, pereceram em batalhas, sendo alguns deles traídos por seus soldados e outros, vítim as de sua própria negligência; e, to davia, posto que previssem um fim sanguinário, não escaparam dele. M as, som ente quatro sobreviveram , e assim todo o im pério de A lexandre foi dividido em quatro partes. Pois Seleuco, cujo sucessor foi Antíoco, obteve a Á sia Superior, ou, seja, o im pério oriental; Antígono, a Á sia Menor, com parte da Cilicia, Panfília e outras regiões circunvizinhas; Ptolom eu apoderou-se do Egito e parte da África; Cassandro e então A ntípater foram reis da M acedônia. Pelas expressões quatro asas e quatro cabeças D aniel tem em m ente aquela partilha que se procedeu im ediatam ente após a morte de Alexandre. Agora, pois, entendem os o que D eus quis m ostrar a seu profeta sob esta visão, quando pôs diante dele a imagem de um leopardo com quatro asas e quatro cabeças. D iz ele: F oi d ad o p o d e r ao an im al, porque o sucesso de Alexandre, o Grande, foi incrível. Pois quem teria im aginado que, ao cruzar o mar, teria ele conquistado toda a Á sia e o O riente? Levou consigo 30.000 homens, e não em preendeu a guerra ex clusivam ente sob sua própria responsabilidade, mas, através de 24 3 3* EX P O SIÇ Ã O [7.7] várias artes, ele obteve dos Estados Livres nom eação para a lide rança da Grécia. A lexandre foi, portanto, um rei de m ercenários gregos, porque não podia levar consigo m ais de 30.000 homens, com o já dissem os. E ngajou na batalha 150.000, em seguida 400.000, e então quase um a miríade. Pois D ario, em sua últim a batalha, havia coletado acim a de 800.000 hom ens, além de cam poneses; de sorte que juntou a seu redor quase um milhão. A le xandre já havia atraído a si alguns auxiliares dentre as nações estrangeiras que havia conquistado; porém não pôde confiar ne les. D aí toda sua força estar centrada nesses 30.000, e no dia em que venceu a D ario sentia-se tão vencido pelo sono que mal po dia m anter-se desperto. Os historiadores que enaltecem sua pru dência justificam esse fato registrando sua vigília durante a noite anterior. A lém disso, todos concordam em declarar que ele se manteve aparentem ente morto, e quando todos seus generais se aproxim aram , quase não puderam acordá-lo, e então proposita dam ente fizeram ecoar um a gritaria em torno de sua tenda, ainda que ninguém ousasse entrar. A lexandre mal esfregara seus olhos, e Dario já havia fugido. D aí ser verdadeira a declaração do Profe ta: ao anim al fo i dado po d er, visto tal acontecim ento ter-se dado além da expectativa natural e de toda e qualquer opinião hum a na, com o se por sua exclusiva orientação ele pudesse apavorar toda a G récia e lançar prostrado tão imenso exército. Ele fala isso em referência ao Terceiro Império. N ão repetirei aqui o que se pode dizer e se pode deduzir da história; pois muitas coisas po dem ser proteladas até o capítulo onze. Portanto, sumariarei em termos breves os pontos que parecem necessários para a inter pretação da passagem. Então prossegue: 7 Postea, post hoc. vidi, hocest, videbam, in visionibus n octis; e t e cc e b e stia q u a rta form idabilis, e t m etuenda,9 e t fortis valde: et dentes ferri, hocest, feire i, illi mag- 7 D epois d isso vi nas visões noturnas, e eis um q uarto anim al, espantoso e tem 'vel e ex ce ssiv a m e n te forte; e ele lin h a g ran d es d e n te s d e ferro; d ev o rav a e d e s- * Ou. seja, o qual pode infligir terror. 25 [7.7] D A N IE L p edaçava e p isava aos pés o que sobrava; e era d iferente d e todos os a n im ais que vieram an te s d ele; e tin h a d ez chifres. ni: com edens e t c onterens, et reliquum pedibus conculcans: e t ip s a diversa erai a b om n ib u s bestiis prio rib u s, e t c o m u a d ecem illi. A dificuldade com esta Q uarta M onarquia é ainda maior. Os que se revestem de juízo m oderado confessam que esta visão se concretizou no im pério rom ano; m as depois discordam , um a vez que o que aqui se diz do quarto animal muitos transferem p ara o papa. ao acrescentar-se o surgim ento de um Pequeno Chifre; ou tros, porém , acreditam que o que está aqui com preendido é o reino turco sob o romano. Os judeus em sua m aioria se inclinam nesta direção, e são necessariam ente com pelidos a agir assim, visto que D aniel mais adiante acrescentará: Vi o trono do Filho do H om em ; visto ser evidente, à luz desta predição, que o reino de C risto foi erigido pela subversão do dom ínio rom ano, os ju deus retrocedem e, com o já disse, reúnem a m onarquia turca com a rom ana, um a vez que não descobrem seu Cristo em conform i dade com sua imaginação. E há entre nossos escritores quem pense dever esta imagem restringir-se ao im pério romano, mas que deve incluir o turco. A m eu ver, não há nada provável nessa opinião. N ão tenho dúvida de que nesta visão m ostrou-se ao profeta a figura do im pério rom ano, e isso se fará ainda mais evidente à m edida que avançarmos. D iz ele que surgira u m q u a r to an im al. N ão fixa um nome, porque nada semelhante existira no mundo. O profeta, não acres centando nenhum a similitude, dá a entender quão terrível m ons tro era aquele, pois previam ente com parara o im pério caldaico a um leão, o persa a um urso e o m acedônio a um leopardo. Em tais comparações havia algo de natural; mas quando se dirige ao quarto anim al, sua descrição é: e r a fo rm id áv el em seu asp ecto , e t e r r í vel, e b rav íssim o , ou m uito forte, e sem qualquer adição o deno m ina “um anim al” . Vemos, pois, seu desejo de expressar algo prodigioso através desse quarto anim al, com o não havendo ani mal tão feroz ou cruel no m undo que pudesse, de algum a forma, 26 33a EX P O SIÇ Ã O [7.7] representar com suficiente força a natureza deste animal. P ortan to, eis o quarto animal, o qual era fo rm id á vel e fe ro z e fo rtíssi mo. N ão temos notícia de um a tal m onarquia antes desta. A inda que A lexandre subjugasse toda o Oriente, sua vitória, bem o sa bem os, não foi estável. Ele apenas se contentou com a fama; con cedeu liberdade a todo mundo; e enquanto fosse bajulado por todos, nada m ais lhe im portava. Sabem os, porém , que os rom a nos se tom aram soberanos até m esm o sobre B abilônia; sabemos ainda que os seguintes países foram subjugados p o r eles: Ásia Menor, Síria, Cilicia, G récia e M acedônia, tanto a Espanha, a Gália, o Ilírico com o parte da Alem anha. Por fim , a B retanha foi subjugada por Júlio César. Não surpreende que esse animal fosse denom inado á t form idável e fo rtíssim o ! Pois antes que Júlio César se tornasse soberano do im pério, todo o M ar M editerrâneo se tornou, em todas suas partes, sujeito ao im pério rom ano. Sua es pantosa extensão é bem notória. É verdade que o Egito teve seus próprios reis, m as era tributário; todos os éditos que os romanos decretavam eram im ediatam ente executados no Egito. Existiam soberanos m enores na Á sia M enor com o um a espécie de espi ões, m as tal estado de coisas tratarem os no m om ento oportuno. É tam bém mui notório que possuíam poder suprem o sobre todo o M ar M editerrâneo, e isso mediante a conquista de M itridates. Pompeu reduziu o Ponto a seu vassalo. As atividades no Oriente foram todas pacificadas. Os medos e os persas lhe trouxeram muita dificuldade, mas jam ais reagiam a não ser que fossem provoca dos. O s espanhóis não estavam ainda acostum ados ao jugo, po rém sabem os que sem pre houve dois pretores ali. Júlio C ésar foi o prim eiro a entrar na Bretanha depois de subjugar a G ália. Daí verm os o quanto e quão am plam ente os rom anos estenderam seu poder, e com que im ensa crueldade. D aí Daniel denom inar este animal d qform idável e fortíssim o. E em seguida acrescenta: p o ssu ía g ra n d e s d e n te s d e ferro . Isso deve ser atribuído a sua audácia e insaciável avidez. Desco27 [7.7] D A N IE L brim os que sua nação era com pletam ente isenta do medo da m or te; pois eram tão im piedosos que, se algum deles se desertasse de suas fileiras para evitar o perigo, o m esm o era em seguida estig m atizado com tais marcas de infâmia, que ou era com pelido a estrangular-se ou aexpor-se voluntariamente à morte! Existe, pois, certa crueldade brutal naquela nação, e sabem os quão insaciá veis eram eles. Por essa razão, Daniel diz que tinham grandes dentes de ferro. E acrescenta: ele co n su m ia, d e sp ed aç av a e p i sa v a aos pés o q ue sobejava. Essas coisas são expressas alegoricam ente, não só porque esta visão foi apresentada ao santo Profeta, m as tam bém porque Deus desejava pintá-la com cores vivas, nas quais pudesse exibir o ca ráter peculiar de cada governo. Pois sabemos quantas terras os rom anos consum iram e com o transferiram para si as pom pas do m undo inteiro, e tudo quanto era valioso e precioso n a A sia M e nor, na G récia, na M acedônia, bem com o em todas as ilhas e na Á sia M aior - era tudo varrido! - e tudo isso era ainda insuficien te para saciá-los! Essa, pois, é a voracidade de que o Profeta ora fala, visto que consumiam, diz ele, e pisavam aos p é s o que sobe ja v a - m etáfora essa digna de observação, porquanto sabemos que estavam acostum ados a distribuir a presa que pudessem le var consigo. D evoravam e rasgavam com seus dentes os tesouros e tudo quanto era objeto caríssim o. Pois suas provisões provi nham dos tributos que, por sua vez, produziam enorm es somas de dinheiro. Se havia algum a porção do M editerrâneo que não pudessem defender sem m anter ali um a guarnição perm anente, sabem os que em pregavam os serviços de reis tributários. Assim o reino de Eum enes aum entou num a grande extensão até os tem pos de seu neto Átalo, m as a concederam em parte aos rodianos e em parte aos cipriotas e outros. Jam ais rem uneravam os aliados que quase exauriam suas próprias possessões no esforço de auxiliá-los, tirando de seus próprios recursos, porém os enriqueciam espoliando outros; e não só apoderavam da propriedade de um a 28 3 3 a EX P O SIÇ Ã O [7.7] cidade e a concediam a outra, m as expunham suas terras à venda. E assim a liberdade dos lacedíemonianos foi entregue ao tirano Nabis. Também enriqueceram os masinissas com tanta riqueza, que adquiriram a Á frica para si a sua própria custa. Em suma, eles agraciaram de tal sorte os reinos, apoderando-se deles e dan do-lhes dom ínio, que se converteram em províncias tranqüilas pela riqueza e às custas de outras. Isso se fez adm iravelm ente conspícuo no caso da Judéia, onde do nada criaram etnarcas, tetrarcas e reis, que outra coisa não eram senão seus satélites - e que não duravam mais que um momento. Pois tão logo algum a m udança ocorria, retraíam o que haviam dado tão facilmente quan to o haviam concedido. D aí essa sua astuta liberalidade ser deno m inada com o pisar sob a planta de seus p és\ pois, o que sobrava do que não podiam devorar e consumir, lançavam debaixo de seus pés e o pisoteavam , m antendo em sujeição todos quantos haviam enriquecido ou favorecido. A ssim vem os com que servi dão eram exaltados por aqueles que haviam obtido algo através de sua generosidade. E quão degradante era a servidão da G récia desde o tem po em que os romanos entraram no país! Pois assim que cada estado adquiria algum novo território, logo erigia um tem plo em honra dos romanos. Enviavam tam bém seus em bai xadores para lá e os erigiam com o espiões que, sob a pretensão de punir o povo vizinho por subtevar-se contra eles, enriqueci am -se por meio de pilhagem. E assim os rom anos mantinham debaixo de seus pés tudo quanto haviam dado a outros. Vemos, pois, com quanta propriedade e justeza fala o Profeta, ao dizer: os rom anos pisoteavam o resto; pois quanto estava em seu poder, o que não podiam consumir, e que sua voracidade não podia de vorar, eles pisavam debaixo de seus pés. E em seguida acrescenta: E este a n im al e r a d ife re n te d e to dos os a n te rio re s , e p o ssu ía dez chifres. A o dizer: este anim al era diferente de todos os anteriores, ele confirm a o que anterior mente eu disse, ou, seja, este era um prodígio horrível, e nada se 29 [7.7] D A N IE L lhe podia com parar na natureza das coisas. E, seguram ente, se alguém atentar e prudentem ente considerar a origem dos rom a nos, com certeza se sentirá atônito ante seu notável progresso de tão im enso poder; pois ele era um m onstro inusitado, e nada se m elhante jam ais aparecera. Os intérpretes analisam de várias m aneiras o que o Profeta anexa no que diz respeito aos dez chi fres. E u sigo um a opinião simples, porém genuína, a saber: o que o Profeta tem em mente é que este im pério pertence a m ais de um a pessoa. Porquanto o anjo a seguir assevera que os dez ch i fres são reis; não que Rom a seria governada por muitos reis, se gundo o tolo sonho dos judeus, os quais são ignorantes quanto a todas as coisas; o Profeta, porém, aqui distingue do resto a Q uar ta M onarquia, com o se quisesse dizer que a m esm a seria um go verno popular, não presidido por apenas um rei, m as dividido em muitas cabeças. Pois ainda dividiam as províncias entre si e fazi am alianças recíprocas, de m odo que um era governador da Macedônia, outra da Cilicia e outro da Síria. E assim notam os quão num erosos eram os reinos. E com respeito ao núm ero dez, sabe m os ser essa um a form a de expressão freqüente e com um na Es critura, onde dez significa muitos. Quando se denota pluralidade, se usa o núm ero dez. Portanto, quando o Profeta declara que o quarto animal possuía dez chifres, sua intenção é que há muitas províncias assim divididas, um a para cada governante, fosse pro cônsul ou pretor, era ele considerado rei. Enquanto o poder su prem o lhes era dado, a cidade e a Itália eram cedidas aos cônsu les. Aliás, o cônsul podia escrever às províncias e ordenar-lhes o que bem lhe agradasse; e assim ele podia elevar em honra a quem quisesse m otivado por algum favor ou am izade; porém, cada um dos pretores e procônsules, ao obter um a província, se convertia num a espécie de rei, um a vez que ele exercia o suprem o poder de vida e m orte sobre todos seus súditos. Não carece ficarm os preo cupados com o núm ero, com o já explicam os. Os que o aplicam às províncias rom anas com etem grave equívoco; om item o ele m ento prim ordial; consideram Espanha com o apenas u m a pro30 3 3 * EX P O SIÇ Ã O [7.8] víncia, quando sabem os que havia duas. N ão dividem a Gália, todavia sem pre houve ali dois procônsules, com exceção de Júlio C ésar que obteve o com ando de am bas as Gálias. D a m esm a for m a se referem à Grécia, e no entanto nem procônsul nem pretor jam ais era enviado para lá. Finalm ente o Profeta sim plesm ente pretende dizer que o im pério rom ano era com plexo, sendo divi dido em m uitas províncias, e essas províncias eram governadas por líderes de grande dignidade em Roma, cuja autoridade e po sição eram superiores aos dem ais. Os procônsules e pretores ob tinham as províncias por sorteio, mas o favor am iúde prevalecia, com o as histórias daqueles tem pos nos asseguram sobejamente. Prossigamos: 8 E stando e u a co n sid erar o s chifres, eis que en tre e le s subiu ou tro ch ifre peque no, d iante d o q ual havia três d e n tre o s p ri m eiro s c h ifre s a rran cad o s pelas raízes; e eis q u e n este c hifre havia olh o s c o m o os o lh o s d e hom em , e u m a boca que falava grandes coisas. 8 In tellig eb am 1“ a d cornua: e t ecc e cornu aliud parvum exo rtu m fuit in te r alia: et tria e x co rn ib u s prio rib u s a b la ta su n t e facie ejus: et e cc e o c u li quasi oculi h o m i n is in cornu illo, e t o s loquens grandia. D aniel prossegue com sua descrição do quarto animal. Pri m eiro, diz ele, eu estav a ate n to [ou considerava], com a inten ção de despertar-nos para séria m editação. Pois o que se diz do quarto animal era extraordinariamente memorável e digno de nota. Eis, pois, a razão por que D eus golpeou o coração de seu servo com indagação. Pois o Profeta não teria dado atenção à conside ração do quarto animal a menos que fosse im pelido pelo instinto secreto de Deus. A atenção do Profeta, pois, proviera de um im pulso celestial. D aí ser nosso dever ler o que aqui está escrito, não com um a m ente displicente, senão com o intuito de pesar seriam ente e com a mais atenta diligência o que o Espírito pre tende com esta visão. Portanto, eu estav a a te n to , diz ele, p a r a os chifres, e eis que 10 Ou. seja, eu estava atento. 31 [7.8] D A N IE L su b iu e n tre eles u m ch ifre p equeno. Aqui os intérpretes com e çam a diferir entre si. A lguns o torcem para significar o papa; e outros, a Turquia. M as nenhum a dessas opiniões me parece pro vável. A m bas são errôneas, um a vez que acreditam que todo o curso do reino de Cristo está aqui descrito, enquanto Deus queria sim plesm ente declarar a seu Profeta o que sucederia até o pri meiro advento de Cristo. Eis, pois, o erro de todos aqueles que querem abarcar nesta visão o estado perpétuo da Igreja até o fim do mundo. A intenção do Espírito Santo, porém , era totalm ente diferente. Explicam os no início por que esta visão foi dada ao Profeta - porque as mentes dos santos desm aiariam constante m ente ante as terríveis convulsões que se aproxim avam , ao ve rem o suprem o dom ínio escapar aos persas. E então os m acedônios se lançaram sobre eles e se revestiram de autoridade por todo o O riente, e em seguida os assaltantes que fizeram guerra sob o com ando de Alexandre de repente se converteram em reis, em parte por crueldade e em parte por fraude e perfídia, o que criou mais discórdia do que hostilidade aparente. E quando os fiéis viram todas essas m onarquias perecerem , e o im pério rom a no surgir com o um novo prodígio, sua coragem se desvaneceu em m eio a tais mudanças confusas e turbulentas. E assim esta visão foi apresentada ao Profeta para que todos os filhos de Deus viessem a entender que graves tribulações os aguardavam antes do advento de Cristo. Daniel, pois, não foi além d a redenção pro m etida e não abrangeu, com o eu já disse, todo o reino de Cristo, m as se contenta em apresentar aos fiéis aquela exibição da graça que aguardavam e pela qual suspiravam. É suficientem ente óbvio, pois, que essa exibição deva ser uma indicação do prim eiro advento de Cristo. Não tenho dúvida de que o pequeno chifre se relaciona com Júlio César e com os ou tros Césares que o sucederam , a saber: Augusto, Tibério, C alígula, Cláudio, N ero e outros. Se bem que, com o eu disse antes, o conselho do Espírito Santo se fazia presente, o qual conduziu os 32 3 3 * EX P O SIÇ Ã O (7.8] fiéis rumo aos prim órdios do reino de Cristo, ou, seja, para a pregação do evangelho, a qual com eçou sob Cláudio, N ero e seus sucessores. Eie o denom ina de pequeno chifre, porquanto César não assumiu o título de rei; quando, porém , Pompeu e a maioria do senado foram vencidos, ele não celebrou sua vitória sem antes arrogar para si o poder supremo. D aí ele se fez tribuno do povo e seu ditador. Entrementes, sempre houve procônsules; existiu sem pre algum a sombra de república, enquanto consultava diariamente o senado e assentava-se em seu trono enquanto os cônsules esta vam nos tribunais. O távio seguiu a m esm a tática, e m ais tarde também Tibério. Pois nenhum dos Césares, a m enos que fosse cônsul, ousava ascender ao tribunal; cada um tinha sua própria sede, ainda que dessa posição ele pudesse com andar todos os dem ais. N ão surpreende, pois, que D aniel tenha denom inado a m onarquia de Júlio e dos dem ais Césares de pequeno chifre, seu esplendor e dignidade não eram bastante grandes para eclipsar a m ajestade do senado; pois enquanto o senado retinha o título e a form a de honra, é suficientem ente notório que um único homem possuía o poder supremo. Portanto, ele diz: este p eq u en o ch ifre se erg u eu e n tre os o u tro s dez. Tenho que prorrogar a explica ção do que segue, a saber: trê s desses dez fo ra m a rra n c a d o s. ORAÇÃO D eus Onipotente, visto que outrora admoestaste teus servos de que teus filhos, enquantoforem peregrinos neste mundo, devem estar bem a par de bestas horríveis e cruéis, caso a m esma coisa vier a suce der-nos, que estejamos preparados para todo e qualquer combate. Que suportemos e vençamos todas as tentações, e que jam ais duvide mos de teu intuito de defender-nos p o r tua proteção e poder, conso ante tua promessa. Que prossigamos pelos meandros de inumeráveis perigos, até que se conclua a trajetória de nossa luta e p o r fim alcan cemos aquele fe liz descanso que nos está preparado no céu p o r Cris to nosso Senhor. Amém. 33 g 34a .xposição (~ 7 rê s coisas restam a serem explicadas p o r nós na exposição dos Q uatro Animais. Em prim eiro lugar, três chifres fo ra m arrancados de seus lugares; segundo, o pequeno chifre, que su biu entre os dez, apareceu com olhos humanos; terceiro, fa la va com magnificência, ou pronunciava palavras arrogantes. Com res peito aos três chifres, é suficientem ente óbvio à luz do testem u nho do anjo que eram três reis; não porque isso deva indicar pes soas, com o refutei na mensagem anterior, m as porque os rom a nos costum avam enviar a cada província governantes com o reis que ali exerciam suprem a autoridade. Os que estendem esta p ro fecia até o final do reino de Cristo crêem que está im plícita um a dispersão que ocorreu certa de três ou cinco séculos depois da m orte de Cristo; porém estão m uitíssim o equivocados. E vidente m ente, boa parte de toda a força do im pério rom ano era exaurida e as províncias gradualm ente elim inadas até tornar-se um a espé cie de corpo mutilado; m as já dem onstrei a inexatidão de qual quer explicação deste oráculo, exceto aquela acerca do estado da Igreja no prim eiro advento de Cristo e a proclam ação do evange lho. N aquele tempo, sabe-se bem , nada fora subtraído das fron teiras do im pério. Pois Júlio C ésar foi form idável não só em rela ção aos gauleses, m as tam bém em relação aos germ ânicos; e, além disso, os negócios do Oriente estavam em paz. A pós sua m orte, ainda que Otávio ou Augusto houvesse sofrido dois m or ticínios m uito destrutivos, especialm ente sob Q uintino Varo, o qual foi enviado à G erm ânia com um poderoso exército, todavia 34 3 4 a E X P O SIÇ Ã O £7.8] ele tam bém estendeu as fronteiras do im pério, especialm ente no Oriente. Ele também subjugou toda a Espanha, onde depois dis so não mais ocorreu nenhum a comoção. Portanto, com o naquele período nenhum a província foi elim inada do im pério rom ano, o que se pretende com a expressão: Três chifres fo ra m arrancados e removido do anim al pelas raízesJ A solução não é difícil. B asta observarm os com o o pequeno chifre é com parado com a prim ei ra estrutura do animal. Ele prim eiro apareceu com dez chifres; quando o pequeno chifre se ergueu, sua figura foi m odificada. O Profeta então diz - um a parte dos chifres foi elim inada, quando o senado então cessou de criar procônsules. Pois sabemos que, quan do Augusto assumiu para si certas províncias, ele fez isso com o propósito de criar presidentes segundo seu talante e de constituir um a força bem resistente, sem pre perto, para que ninguém se rebelasse contra ele. Pois ele não se preocupava tanto com as províncias quanto com um exército, qualquer tum ulto que sur gisse. Portanto, ele nutria o desejo de pôr freio a todas elas a fim de que nenhum a ousasse tentar um a revolução. Tudo quanto foi assim acrescentado ao pequeno chifre foi tirado dos dez chifres, ou, seja, de todo o corpo, quando o estado da m onarquia foi intei ram ente modificado. Não há nada forçado nesta exposição. D e vemos tam bém insistir com um núm ero definido ou fixo sendo estabelecido no lugar de um incerto; com o se o Profeta dissesse: um a parte do poder do animal foi subtraída depois do surgimento do pequeno chifre. E assim m uito da prim eira sentença. Ele então acrescenta: O s olhos n este p eq u en o c h ifre e ra m sem elh an tes aos d e hom em ; e então: ele falav a g ra n d e s coisas. Com respeito aos olhos, esta expressão implica: foi exibida a form a de um corpo humano, porque os Césares não aboliram o senado nem mudaram im ediatam ente toda a form a de governo; m as, com o dissem os na m ensagem anterior, contentaram -se com o poder; e quanto ao esplendor, títulos e pom pa, prontam ente deixaram tudo isso com os cônsules e o senado. Se alguém 35 [7:8] D A N IE L considerar a m aneira na qual esses Césares, os quais são indubi tavelm ente indicados pelo pequeno chifre, se conduziam , sua conduta se assem elhará a um a figura hum ana. Pois Júlio C ésar pretendia, ainda que fosse ditador, obedecer à autoridade do se nado, e os cônsules pediam a opinião dos senadores, segundo a m oda antiga. Ele sentava-se no centro e perm itia que m uitas co i sas fossem decretadas sem interpor sua vontade. A ugusto tam bém usava em dem asia a som bra do poder tribunício só com o propósito de governar o im pério. Assim ele se subm etia aos côn sules; e quando desejava ser eleito para aquele ofício, fazia-se candidato com os dem ais com petidores, e vestia um manto bran co com o um cidadão particular. Tibério tam bém foi um grande pretendente, e enquanto tram ava projetos de tirania, não era fran co nem engenhoso em seus planos. Assim tam bém apareceu no pequeno chifre os olhos de homem, ou, seja, depois que essa m udança ocorreu e o senado e o povo foram privados de sua liberdade. A quele que m antinha o governo da república não era form idável, com o um animal com pleto, m as se assem elhava a qualquer homem em sua form a externa. O Profeta acrescenta: O p eq u en o ch ifre tin h a u m a b o c a q u e fa la v a g ra n d e s coisas. Pois ainda que, com vistas ao favor con ciliatório, os Césares se conduziam com o os hom ens, sabemos quão atrozmente tratavam seus inim igos e quão im periosam ente im pediam ou com etiam tudo quanto desejavam , com o bem lhes apetecia. Havia, pois, um a grande diferença entre sua boca e seus olhos. Pois, com o já dissemos, o esplendor e dignidade do im pé rio estavam , a princípio, no poder dos cônsules e do senado. E n tretanto, por meio de artes insidiosas, os Césares assenhorearam se de todo o poder, até que ninguém ousasse fazer coisa alguma, exceto por ordem deles. M uitos intérpretes explicam isso com o blasfêm ia contra D eus e impiedade; e o anjo fará m enção disso no final do capítulo. M as, se pesarm os toda a expressão ju d icio sam ente, o que afirm o parecerá correto, e falar grandes coisas 36 34* EX PO SIÇ Ã O [7.9] aqui m encionado pelo Profeta significará a soberba com que os Césares estavam inflados, im pondo silêncio a todos os homens e não perm itindo que alguém abrisse a boca contrariando sua von tade. As palavras do Profeta são m uito bem explicadas por este fato; pois os três chifres sendo removidos dentre os dez signifi cam algum a parte do im pério que se separava do corpo principal; então, o pequeno chifre sendo dotado com olhos hum anos im pli ca um tipo de m odéstia, quando os Césares agiam com o pessoas particulares e se privavam da exibição externa ante o senado e o povo; e, terceiro, quando a boca do pequeno chifre fa la va soberbam ente, a consternação se assenhoreava de todos os romanos, especialm ente daqueles que desfrutavam de algum a reputação, pendentes do aceno dos Césares, os quais im punham a m ais vil escravidão e recebiam a m ais torpe e mais vergonhosa bajulação por parte do senado. Então prossegue: 9 Eu vi a in d a que d e sc ia m tro n o s, e o A ncião d e dias tom ou assento, c u ja vestim enta era b ranca co m o a neve; o cabelo d e sua cabeça, co m o a p u ra l i ; seu tro n o e r a como um a cham a ardente, e s u a s rod as com o chama-s d e fogo. 9 V idebam u sque d u m throni erecti su n t," e t A ntiquus, senex, d ieru m sedit: vesti m entum e ju s quasi nix candidum , e t capillu s c apilis e ju s quasi lana m unda, so liu m ejus sei ntillat ignis, rota; ejus ignis ardens. D aniel então relata com o vira outra figura, a saber, D eus as sentado em seu trono para exercer juízo. Veremos m ais adiante acerca de Cristo, m as Daniel agora ensina sim plesm ente o apare cim ento de Deus em seu caráter de juiz. E ssa é a razão por que muitas pessoas estendem esta profecia até a segunda vinda de Cristo - interpretação essa de modo algum correta, com o m ostra rei m ais am plam ente no lugar próprio. M as, antes, é digno de consideração aqui por que ele diz: o A ncião d e d ias, significan do sua própria D eidade eterna, assentou-se no tro n o d o ju ízo . " O u rem ovido; pois a palavra remiv, é explicada pelos intérpretes em dois senti dos: verbalmente, “até que rem ovessem tronos ou os erigissem no ar1'. “A palavra pode ser traduzida "foram arm ados" ou postos para a recepção da Deidade e seus assessores, os santos.” - Winile. 37 {7.9] D A N IE L Esta cena parece desnecessária, porquanto é o ofício peculiar de D eus governar o m undo; e com o sabemos que isso não pode ser feito sem o reto juízo, segue-se que Deus tem sido um ju iz perpé tuo desde a criação do mundo. Ora, m esm o um m oderado conhe cim ento das Escrituras revela quão bem esta passagem se adequa a nós, apelando a nossos sentidos; pois a não ser que o poder de Deus se faça patente, pensam os nele com o que abolido ou inter rom pido. D aí aquelas form as de expressão que ocorrem em ou tras partes, tais como: “A té quando te esquecerás de m im , Se nhor? P ara sem pre? Até quando esconderás de m im teu rosto?” [SI 13.1; 9.7 e outros lugares]. E para o reconhecerm os em seu papel de juiz, assentado em seu trono, temos de crer que ele real e experim entalm ente se nos revela com o tal. Eis, pois, a razão por que Daniel diz que Deus pessoalm ente assentou-se para julgar. M as antes de avançarmos mais, devem os observar o sentido em que ele diz: tronos foram erigidos ou postos - pois a palavra □Tl, rum, pode ser tom ada em am bos os sentidos. Os que a tradu zem: “Tronos foram rem ovidos" a interpretam pelo prism a das Q uatro M onarquias já m encionadas. De m inha parte, porém , in clino-m e, antes, para um a opinião distinta. Se alguém prefere explicá-la pelo prism a dessas m onarquias, não me oponho ao mesm o, pois tal sentido é provável; no que diz respeito ao cerne da questão, não há m uita diferença. Creio, porém, que os tronos são aqui postos com o intuito de exibir o juízo divino, visto que o profeta im ediatam ente representará m iríades de anjos postos em pé diante de Deus. Sabem os quão am iúde os anjos são adornados com este título, com o se fossem assessores da D eidade; e a form a de linguagem que Daniel usa quando diz: “ O juízo foi estabeleci do" tam bém concordará com isso. Ele fala aqui de assessores junto do Juiz, com o se D eus não se assentasse só, mas tivesse conciliares a seu redor. Em m inha opinião, a explicação mais adequadaé: foram criados tronos p a ra o Onipotente sentar-se com seus conciliares; não im plicando isso sua necessidade de algum 38 3 4 * EX P O SIÇ Ã O [7.9] concílio, m as de seu próprio beneplácito e m ero favor ele digni fica os anjos com tal honra, com o verem os a seguir. D aniel, pois, descreve, segundo nossa form a humana, as preparações para o juízo; precisam ente com o se algum rei fosse publicam ente apre sentado com o propósito de realizar algum negócio do m om ento e em seguida assentar em seu tribunal. Os conciliares e nobres assentariam em torno dele, em ambos os lados, não participando de seu poder, mas, antes, aum entando o esplendor de seu apare cim ento. Pois se o rei ocupasse sozinho todo o espaço, a dignida de não seria tão m agnificente com o quando seus nobres, que dele dependem , estão presentes em toda parte, porquanto excedem m uitíssim o à m ultidão ordinária. D aniel, pois, relata dessa forma a visão a ele apresentada; prim eiro, porque era um hom em habi tando na carne; e, segundo, ele não a divisava para si pessoal m ente, m as para o benefício com um de toda a Igreja. E assim Deus quis exibir um a representação que pudesse infundir na mente do Profeta e na de todos os santos um sentim ento de admiração, e todavia pudesse ter algo em com um com os procedim entos hu manos. Portanto, diz ele, fo ra m erigidos tronos\ em seguida, o Ancião de dias tom ou assento. Já expliquei com o Deus então com eçou a sentar-se assim que, previamente, apareceu pacifica mente, e não para exercer justiça no mundo. Pois quando as coisas são conturbadas e mescladas com densas trevas, quem pode dizer: “ Deus reina” ? Q uando as coisas estão desordenadas e turbulen tas na terra, é com o se Deus estivesse encerrado no céu. Em con trapartida, diz-se que ele sobe a seu tribunal quando assum e para si o ofício de ju iz e publicam ente dem onstra que não está dor mindo nem ausente, ainda que esteja oculto da percepção humana. Essa form a de linguagem era m uito apropriada para denotar a vinda de Cristo. Porque então Deus exibiu seu suprem o poder, com o Paulo cita um a passagem dos Salm os [68.8 em E f 4.8]: “Tu subiste às alturas.” Quando o tem a em questão é a prim eira vinda de Cristo, ele não deve restringir-se aos trinta e três anos de 39 [7.9] D A N IE L sua peregrinação neste mundo, m as que abarca sua ascensão e a proclam ação do evangelho que introduziu seu reino - isso será expresso novam ente com mais clareza e copiosam ente. Daniel apropriadam ente relata com o Deus estava assentado quando se descreve o prim eiro advento de Cristo, visto que a m ajestade de D eus resplandece na pessoa de Cristo; por essa razão ele é deno m inado “ a im agem invisível de Deus e o caráter de sua glória” [Hb 1.3]; ou, seja, da substância ou pessoa do Pai. Deus, pois, que por tantos séculos parecia não haver notado o m undo nem se preocupado com seu povo eleito, subiu a seu tribunal no advento de Cristo. Todos os Salmos, do 95 ao 100, se relacionam com esse tema: “D eus reina, regozije-se toda a terra” ; “D eus reina, tem am -no todas as ilhas.” Aliás, Deus não habitou [com os ho mens] em com pleta privacidade antes do advento de C risto; mas o im pério que ele havia erigido estava oculto e invisível, até que m anifestasse sua glória na pessoa de seu unigénito Filho. Portan to, o Ancião de dias tomou assento. Ele então diz: S u a v estim en ta e ra b ra n c a com o a neve; o cabelo d e su a cabeça, com o a p u r a lã. Deus aqui se m anifesta a seu Profeta na form a humana. Sabem os quão im possível nos é visualizar a Deus com o ele realm ente é, até que ele nos transfor me a sua sem elhança, com o João diz em sua epístola canônica [1 Jo 3.2], Visto que nossa capacidade não pode suportar o fulgor daquela inatingível glória que essencialm ente pertence a Deus, sem pre que ele se m anifesta a nós necessariam ente tem de ser através de um a forma adaptada a nossa com preensão. D eus, pois, jam ais foi visto pelos pais em sua própria perfeição natural; mas até onde a capacidade deles perm itia, ele lhes oferecia um a prova de sua presença para o seguro reconhecim ento de sua Deidade. E todavia eles o com preendiam até onde lhes era útil e lhes era possível suportar. Eis a razão por que D eus aparecia com v esti m e n ta b ra n c a , que é característico do céu; com cabelos com o neve, brancos e puros com o a lã. O seguinte tem o m esm o propó40 34* EX P O SIÇ Ã O [7.10] sito: S eu tro n o e ra com o ch am as a rd e n te s, ou, seja, com o fogo candente; su as ro d as e ra m com o ch a m a s d e fogo. Deus, na re alidade, nem ocupa trono algum nem é conduzido sobre rodas; mas, com o eu já disse, não devem os im aginar a Deus, em sua essência, com o apareceu a seu próprio Profeta e outros santos pais, mas se vestia de variadas aparências segundo a com preen são hum ana, a quem ele desejasse fornecer algum sinal de sua presença. Não preciso ficar mais tem po sobre essas formas de linguagem, ainda que as alegorias sutis sejam agradáveis a m ui tos. Fico satisfeito com aquilo que é sólido e seguro. Continuemos: 10 U m a torrente ardente flu ía e saía d e d iante dele; m ilhares d e m ilhares lhe m inistravam e d e z m ilhares vezes dez m iIhares assistiam diante dele; a ssentou-se o ju íz o e abriram -se os livros. 10 F lu v iu s1* ignis flu eb at, e t exibat a p ra sen tia ejus, vel a conspeciu: m illia m i lliu m IJm in istrab an tei:etd eciesm ilH aciecies m illiu m 14 c o ram ip so stabant: ju d iciu m sedit, et libri aperti sunt. Daniel prossegue com o que com eçou no versículo anterior. Ele fala de um esplendor ou torrente de fogo; pois TI3, neher, pode ser usado em ambos os sentidos, visto que TI3, neher, sig nifica tanto ‘fluir’ quanto ‘brilhar’. Todavia, visto que ele previa m ente falara de esplendor, a palavra ‘torrente’ se adequa muito bem à passagem , pois u m a to rre n te ca n d e n te flu ía d a p re se n ça d e D eus, a qual tanto inundava quanto queim ava a terra. Sem dúvida D eus queria inspirar seu Profeta com tem or com o propó sito de despertá-lo m ais profundam ente, visto que jam ais com preenderem os suficientem ente sua m ajestade a não ser quando som os humilhados; e não podem os experim entar essa hum ildade sem temor. Eis a razão p o r que Deus sempre revela algo de terrí vel quando aparece a seus servos, não m eramente para gerar per plexidade, m as para excitar seu tem or e reverência. D aí Daniel parecer haver considerado este ponto nesta visão, quando a to r re n te su rg iu ju n ta m e n te com o a p are cim e n to dele, sim , um 12 alguns, ik luz ou esplendor. " Ou seja. milhões. IJ O u seja. miríades de miríades, ou centenas de milhões. 41 [7-10] D A N IE L rio d e ch am as. Em seguida ele acrescenta: assisten tes in u m e ráv eis estav am d ia n te dele. Sem a m enor som bra de dúvida, o Profeta aqui fala de anjos. Ele declara que som avam m ilh a re s de m ilh ares, ou dez vezes cem milhares: e ainda, dez m ilh ares ve zes dez m ilh ares, ou, seja, dez mil miríades. Aqui os números não são com putados, porém D eus quer dizer que tem a sua dispo sição as m aiores forças que obedecem a sua vontade, as quais excedem infinitam ente os exércitos arregim entados pelos mais form idáveis e poderosos príncipes. Esta passagem nos ensina que os anjos foram criados com o propósito de receber e executar as ordens de Deus e de serem eles os m inistros de Deus, visto que se acham a sua disposição no céu e na terra. N o que respeita a números, não adm ira que tantas miríades sejam m encionadas pelo Profeta. Cristo disse: “O u p en sas tu que eu não poderia agora pedir a meu Pai, e que ele não me daria m ais de doze legiões de anjos?” [Mt 26.53]. Portanto, nesta passagem D aniel diz que estavam ali anjos incontáveis ao dispor de Deus, e que não havia necessidade de convocar exércitos se gundo o costum e dos príncipes, visto que estão sem pre presentes e prontos a obedecer. E assim cum prem im ediatamente todas suas ordens, visto que os anjos percorrem velozm ente todo o céu e terra. Percebem os tam bém denotado aqui o suprem o poder do O nipotente, com o se o Profeta quisesse dizer: D eus não é como um rei ou um ju iz [terreno] que possui um mero título, m as ele possui o mais form idável e o mais infinito poder; ele conta com m iríades de satélites sempre à mão com o propósito de cum prir e executar sua suprem a vontade. E nesse sentido ele diz: assistiam d ia n te dele. Ele usa a palavra para m inistério ou serviço, e em seguida acrescenta: diante dele. Pois nem os m inistros podem prestar seu serviço tão prontam ente com o seus superiores dese jam . O m étodo angélico, porém, é diferente. N ão só estão prepa rados a obedecer, m as num instante percebem o que Deus deseja e ordena sem necessitar de tempo para pronto atendim ento. Ve 42 34* EX P O SIÇ Ã O [7.10] mos ainda que os maiores príncipes não podem p ô r em prática im ediatam ente seus decretos, porque seus m inistros nem sem pre estão à disposição. M as não há necessidade de continuar fa lando ainda dos anjos. D aniel acrescenta: assen to u -se o ju íz o e a b rira m -s e os livros. A inda que unicam ente D eus seja em i nente e conspícuo acim a dos anjos, e a excelência da glória de les e bem assim sua dignidade, não obscurecem o suprem o im pério do O nipotente, todavia, com o já vim os previam ente, ele os ju lg a dignos da honra de serem postos com o conciliares aca d a lado dele, buscando engrandecer sua própria majestade. Pois já declaram os que os mais nobres não tom am assento ao lado dos m onarcas visando a ofuscar sua m ajestade ou d etrair algo dela para si, m as, antes, procuram refletir m ais plenam ente a m agni tude e poder do m onarca. Eis a razão p o r que o P rofeta associa os anjos com Deus, não com o aliados, m as sim plesm ente como seus conciliares. A ssocio a frase abriram -se os livros com a pregação do evangelho. Em bora D eus fosse reconhecido em Judá, com o se acha expresso no Salm o 76 [v. 2], todavia tal reconhecim ento era apenas superficial e envolvida em muitas figuras. D eus era reve lado através de enigm as até a vinda de Cristo; m as então ele m a nifestou-se plenam ente, justam ente com o o abrir de livros anteri orm ente fechados. Há, pois, um contraste a ser observado aqui entre aquela época obscura que precedeu a vinda de Cristo e a claridade que agora resplandece sob o evangelho. Portanto, visto que D eus se fez conhecer claram ente depois que nasceu o Sol da justiça, de acordo com o profeta M alaquias [4.2], essa é a razão por que se diz que os livros fo ra m abertos naquele tempo. Entre mentes, confessam os que Deus não esteve totalm ente oculto, nem falam os de ocultação, mas isso é expresso pelo Profeta com para tivam ente, quando os livros eram abertos sem pre que D eus se m anifestava publ icamente como o Juiz, Pai e Preservador do mun do, na pessoa de seu unigénito Filho. Então prossegue: 43 [7.11] D A N IE L 11 E ntão olhei, p or causa d a voz das grand e s palavras q u e o c hifre proferia; olhei ainda até q u e o anim al foi m orto, e seu co rp o d estru íd o e entregue à cham a ard en te. 11 V idebam tune, p ro p ter v ocem 1' serm onum g ra n d iu m .q u o s c o m u p roferebal. videbam u sque d u m o c cisa fuit bestia, et abolitum corpus ejus, e t d a ta fuit incendio ignis. Visto que os pretensos discursos do pequeno chifre terrificaram o Profeta, ele agora diz que estava atento à consideração dessa parte. Em seguida afirma: O a n im al foi m o rto e seu c o r p o foi co n su m id o pelo fogo a rd en te. Isso deve ser claram ente um a referência ao fim do im pério rom ano. Pois desde o tempo em que os estrangeiros obtiveram o dom ínio, o quarto animal deixou de progredir. O nom e foi sempre retido, todavia com grande desdém daquele antigo monarca. O m ito agora toda e qualquer m enção a Calígula, Nero, Domiciano e m onstros afins. M as quan do os espanhóis e africanos adquiriram o dom ínio absoluto, é possível continuarm os cham ando R om a a senhora do m undo? Seguram ente isso seria total estupidez! Da m esm a form a todos os dias os alem ães tam bém dizem que possuem o im pério rom a no: mas enquanto o título império passou para os alemães, ev i dentem ente m uito de Roma está nesse mesmo dia em escravi dão. Pois quando o papa erigiu ali seu próprio trono, esse im pé rio é indigno do nom e monarquia. M as seja qual for nossa visão desse ponto, cerca de 1500 anos os rom anos têm estado sob es cravidão de príncipes estrangeiros. Pois depois da m orte de Nero, Trajano foi seu sucessor, e desde esse tem po raram ente um único rom ano obteve o império; e D eus o estigm atizou com as marcas mais desditosas de ignomínia, quando um guardador de porcos foi feito im perador pelo desejo da força militar! O senado reteve seu nom e até então; m as se a vontade dos soldados era fazer al guém um único César, o senado foi im ediatam ente com pelido a subm eter-se a seus ditames. Assim o Profeta com grande propri" Ou, seja. estava olhando aquela visão até que: significa a atenção da m ente, e isso não segundo o método humano, mas com o se fosse apanhado no ar pelo espírito profético. E assim ele diz. que seus sentidos estavam fixados naquela visão - portanto "em ra z lo da voz", ou “através da voz". 44 34* EX P O SIÇ Ã O [7.11] edade diz: o anim al fo i m orto logo depois da prom ulgação do evangelho. Então o pretenso discurso do pequeno chifre chegou ao fim, e o quarto anim al foi concom itantem ente extinto. D esde então nenhum rom ano se fez im perador que reivindicasse para si algum a participação de poder; Rom a m esm a, porém , caiu em desditosa escravidão, e não só ali reinaram estrangeiros da forma mais vergonhosa, mas até mesmo bárbaros, criadores de suínos e de bovinos! Tudo isso ocorreu em cumprimento do que Deus mos trara a seu Profeta, ou, seja, após a vinda de Cristo e a abertura dos livros, isto é, depois do conhecimento que resplandeceu sobre o mundo inteiro através da proclamação do evangelho - a destruição do quarto animal do império romano que estava próxima. ORAÇÃO Deus Onipotente, sejam quais forem as revoluções que ocorram dia riamente no mundo, fa z com que estejamos sempre atentos à vista de tua glória, uma vez manifestada a nós em teu Filho. Que o esplendor de tua majestade ilumine nossos corações e penetremos além dos céus visíveis, além do sol, da lua e de tudo quanto esplende; e que contemplemos a bem-aventurança de teu reino, o qual nos propuses te na luz de teu evangelho. Que atuiemos pelo meio das trevas e afli ções do mundo, contentes com a luz pela qual nos chamas à esperan ça da herança eterna que nos prometeste e adquiriste para nós por meio do sangue de teu unigénito Filho. Amém. 45 35a 12 E , q u a n to aos o u tro s anim ais, foi-lhes tirado seu dom ínio; todavia foi-lhes prolo n g ad a a vida por u m a ép o ca e u m tem po. 12 E t reliquis bestiis ab stu leran t potestatem , vel dom inationem, e t lo n g itu d o in vita d a ta iltis fuerat usq u e a d tem p u s et tem pus. Sem dúvida, o Profeta se refere ao que deve vir prim eiro em ordem , visto que os im périos de que está falando foram extintos antes do rom ano. Daí, esses verbos têm de ser tom ados no senti do m ais-que-perfeito, porque o poder já havia sido rem ovido dos outros três animais. Pois os hebreus costum avam repetir algo depois de ser om itido, e nem sem pre observavam a ordem de tem po em suas narrativas. E assim , depois de haver dito que o quarto animal fora m orto e consum ido pelas cham as, ele então acrescenta o que havia om itido acerca dos três restantes, a saber: foi-lhes tira d o seu dom ínio. A crescenta ainda o que é digno de nota: a extensão ou continuação foi-lhes p ro lo n g a d a a v id a p o r a in d a u m a época e u m tem p o . H á duas palavras diferentes usa das aqui, mas o significado de am bas é o m esm o, ou, seja, um tem po conveniente. Aqui o Profeta entende que nada acontece acidentalm ente, mas que todas as coisas ocorrem no m undo em seu devido tempo, segundo D eus as decretou no céu. Provavel m ente, quando o tem a do discurso se estende à vida, significa a protelação do período dessas aflições, para que não se desvaneça repentinam ente com o nuvens. O que se anuncia não são apenas provações severas, mas provações prolongadas aguardam os fi éis, as quais afligiriam suas mentes com exaustão, a m enos que a 46 3 5 a EX P O SIÇ Ã O [7.12] esperança de um m elhor resultado os mitigasse. E assim o Espí rito Santo prediz com o D eus por fim libertaria sua Igreja, ao exer cer ela sua paciência por um a extensão de tempo. O p o d e r dos a n im a is re sta n te s foi tira d o . A cópula na palavra HD1KX vearkeh, “e extensão” , pode ser resolvida assim: “em virtude da extensão da vida” ; com o se ele dissesse: A s provações pelas quais os filhos de Deus estavam para ser oprim idos não seriam perpé tuas, visto que Deus prescreveu e definiu um período fixo. Por tanto, foi-lhes concedido um prolongam ento da vida, ou, seja, p o r uma época e um tempo. A cópula pode ser considerada como sendo “um a partícula adversativa” ; por exem plo, “se bem que um prolongam ento” , ou, seja, se bem que as pessoas não esca pam im ediatam ente dessas preocupações dolorosas que as opri miam, todavia chegará p o r fim a oportunidade de Deus, a saber, o tem po em que aprouve a Deus redim ir sua própria Igreja. M as a prim eira exposição parece a m ais genuína e a mais consistente, porque a extensão de tem po tem seus próprios lim ites e frontei ras. Há tam bém um contraste entre as palavras HD1K, arkeh, ‘ex tensão’, e p t , zemen, ‘tem po’, e ]1Jí, gneden, ‘tem po’, porque extensão ou ‘prolongam ento’ se refere a nossas percepções; pois quando estam os sofrendo dores, o tem po mais rápido nos parece m uito extenso. E assim alguém que enfrenta ansiedade p o r um m elhor estado de coisas conta cada m inuto, e é tão clam oroso em seus desejos que chega ao ponto de questionar com D eus acerca de sua delonga. Com o, pois, a im paciência hum ana é dem asiada mente grande, quando os homens estão esperando com ansieda de a libertação de sua adversidade, o profeta diz, na acepção or dinária da frase: foi concedido aos anim ais um prolongam ento do tempo; m as contrapõe um tem po conveniente; com o a dizer: age sem propósito quem assim se entrega a suas próprias pai xões. Visto que D eus tem fixado seu próprio tempo, requer-se paciência e não devem contar os anos; mas essa única coisa tem de ser concluída: quando o Senhor quiser, não m ais reterá seu auxílio. Este, pois, é o pleno sentido do versículo. Então prossegue: 47 [7.13] D A N IE L 13 E u vi nas visões noturnas, e eis que um se m elh an te a Filho d e hom em veio co m a s n u v e n s d o céu , e se d irig iu a o A ncião de d ias, e o fizeram chegar-se a té cle. 13 V idebam in v isionibus noctis: e t ecce in n u b ib u s1* cceli. vel ccelorum, tanquam F iliu s hom inis veniebat, e t u sque ad Anliquum dierum venit, e t coram e o r e p rs se n laru n t.17 A pós Daniel narrar com o viu a D eus no trono do ju ízo , exer cendo publicam ente seu poder e abrindo ao m undo o que anteri orm ente estivera oculto dele, ou, seja, sua suprem a autoridade em seu governo, ele agora acrescenta a segunda parte da visão: com o foi que o F ilho do h o m em ap a re c e u n a s n u v en s. Sem dúvida isso deve ser entendido com o um a referência a C risto, e os judeus, perversos com o são, se envergonham de negá-lo, em bora posteriorm ente divirjam sobre Cristo, M as o objetivo desta visão era capacitar os fiéis a esperar convictam ente o R edentor prom etido em seu tem po certo. Ele foi dotado com o poder celes tial, e sentou-se à destra do Pai. D aí Daniel dizer: a te n te i bem nessas visões n o tu rn a s. E tal reiteração de form a algum a é su pérflua, com o somos inform ados à luz da vigilância do profeta, quando D eus se m ostra presente. D aniel expressa isso plenam en te em suas própria palavras, pois ele se despertou assim que per cebeu as questões importantes, raras e singulares que se lhe apre sentam . E ssa atenta disposição do profeta deve instigar-nos a ler sua profecia sem apatia e com m entes despertas solicitam ente a derivar do céu genuína e sincera inteligência. Eu estava, pois, diz ele, atento às visões noturnas, e eis u m com o F ilh o d e hom em . Já afirmei que esta passagem não pode ser vista de outra forma, senão com o um a indicação de Cristo. D evem os então ver por que ele usa a palavra ‘com o’, ‘sem elhante a ’, um Filho de ho mem; ou, seja, por que ele usa a letra D, ke, a qual denota sem e lhança. Isso pode ser torcido em favor da estultícia dos maniqueus que pensavam ser o corpo de Cristo apenas im aginário. 14 Pois OJJ, gnenu é nesta passagem tomado da Caldaica, com o 3. be. Esse uso é costu m eiro; daí. “nas nuvens". ” Verbalmente, "fizeram -no aproxim ar-se” . O texto latino de t5 6 I tem “eum " no final do versículo, e a tradução francesa o tem implícito. 48 35a EX P O SIÇ Ã O [7.13] Pois com o torceram as palavras de Paulo e perverteram seu sen tido, fazendo com que Cristo fosse em sem elhança de homem [Fp 2.7], assim também podem usar mal o testem unho do profe ta, quando não se diz ser Cristo um homem, m as sim plesm ente sem elhante a homem. Com respeito às palavras de Paulo, ele não está falando da essência de sua natureza hum ana, m as somente de seu estado; pois ele está falando de Cristo que se fez homem, de sua condição hum ilde e abjeta, e até m esm o servil. M as, na passagem que temos diante de nós, a razão é diferente. Pois o profeta diz: Ele lhe apareceu com o um Filho de hom em , quando Cristo ainda não havia tom ado para si nossa carne. E é bom que observem os este dito de Paulo: Quando chegou a plenitude do tempo, Deus enviou seu Filho, nascido de m ulher [GI 4.4], Cris to, pois, com eçou a ser homem quando apareceu sobre a terra com o Mediador, porquanto ele não assum ira a semente de Abraão antes que se unisse a nós em união fraterna. Eis a razão por que o profeta não diz que Cristo se fez homem nesse período, m as ape nas sem elhante a homem; pois do contrário ele não teria sido aquele M essias outrora prom etido sob a Lei com o o filho de Abraão e de Davi. Pois se desde o princípio ele houvera se vesti do da carne humana, então não teria nascido desses progenitores. Segue-se, pois, que Cristo não era homem desde o princípio, mas apenas apareceu na figura humana. Q uando tam bém Irineu18 diz: Este foi um 'prelúd io ’, ele usa aquela palavra. Tertuliano tam bém diz: “Então o filho de D eus vestiu-se de um espécim en de sua hum anidade.” 19Portanto, este foi um sím bolo da futura carne de Cristo, m esm o quando tal carne ainda não existisse. Então vemos quão adequadam ente essa figura se harm oniza com a coi sa significada, na qual Cristo se m anifestou com o o Filho do ho mem. em bora ele então fosse o eterno Verbo de Deus. " A tradução latina de Irineu é "pncluditim " . A francesa tem aqui "une approche et eniree”. e então acrescenta: "E le usa uma palavra que não podem os traduzir para o fran cês." Ela significa um prefácio ou introdução. As palavras d e Tertuliano são: “Tunc prjeluxii Filus D ei hum anitaie sua.” 49 17.13] D A N IE L Em seguida temos: E le veio ao A ncião d e dias. Isso, em m i nha opinião, deve ser explicado com o um a indicação da ascen são de Cristo; pois ele então com eçou seu reinado, com o transpa rece de inum eráveis passagens bíblicas. Tam pouco é esta passa gem contrária ao que o profeta dissera previam ente - ele viu o Filho do hom em nas nuvens. Pois, com esta expressão, ele sim plesm ente deseja ensinar com o Cristo, em bora sem elhante a um hom em , todavia diferia de toda a raça hum ana e não partilhava da ordem com um dos homens, senão que excelia ao m undo intei ro em dignidade. Ele expressa m uito mais quando diz, na segun da sentença: ele foi co n d u zid o ao A ncião d e dias. Pois ainda que a D ivina M ajestade estivesse oculta em Cristo, todavia ele tom ou sobre si o dever de um escravo e esvaziou-se, com o diz Paulo [Fp 2.7]. A ssim tam bém lemos no prim eiro capítulo de João [Jo 1.14] que a G lória m anifestou-se nele com o a do unigé nito Filho de D eus; ou, seja, a qual pertence ao unigénito Filho de Deus. Cristo, pois, despiu-se assim de sua glória por algum tempo, e contudo, por meio de seus milagres, bem com o de m ui tas outras provas, ofereceu um claro e evidente espécim en de sua glória celestial. Ele realm ente apareceu a D aniel nas nuvens, mas quando subiu ao céu então despiu-se de seu corpo mortal e assu miu um a nova vida. Assim tam bém Paulo, no capítulo 6 de R o manos, diz que ele vive a vida de Deus [v. 10]; e outras frases am iúde usadas por nosso Senhor mesmo concordam m uito bem com isso, especialm ente no Evangelho de João: “Eu vou para o P ai” ; “É conveniente que eu vá para o Pai, pois o Pai é m aior do que eu” [16.7; 14.28]; ou, seja, é conveniente que eu suba para aquele tribunal régio o qual o Pai erigiu para mim por seu eterno conselho, e assim o m undo inteiro saberá que o suprem o poder me foi confiado. Agora, pois, entendem os o pleno sentido das palavras do profeta. Visto, porém , que muitos fanáticos torcem o que foi dito pela pessoa do M ediador, com o se Cristo não fosse o verdadeiro Deus, 50 35* EX P O SIÇ Ã O [7.13] mas que tivesse origem no Pai em algum período de tem po, é m ister que observem os com o a expressão do profeta se adequa não à natureza hum ana, nem à natureza divina de Cristo, propri am ente falando, m as um M ediador é aqui posto diante de nós que é D eus m anifestado em carne. Pois se m antiverm os o princípio de que Cristo nos é descrito, não com o o Verbo de Deus, nem com o a semente de Abraão, m as com o o M ediador, ou, seja, o D eus eterno que se dispôs a tornar-se homem, tom ar-se sujeito a D eus o Pai, ser com o um de nós e ser nosso A dvogado, então não restará dificuldade alguma. A ssim ele apareceu a D aniel com o o Filho do homem, que posteriorm ente tornou-se verdadeira e real mente com o tal. Ele foi visto nas nuvens, ou, seja, separado da sorte com um da humanidade, com o sempre portou em si algu mas marcas da Deidade, m esm o em sua humilhação. E le en tão se ap ro x im a d o A ncião d e d ias, ou, seja, ao subir ao céu, visto que sua divina m ajestade foi então revelada. D aí ele dizer: É-lhes conveniente que eu vá para o Pai, porque o Pai é m aior do que eu [Jo 14.28]. C risto aqui não subtrai nada de sua D eidade, porém, com o sua natureza não era conhecida no mundo, enquanto sua divina m ajestade esteve oculta na form a de um servo, ele cham a o Pai sim plesm ente Deus; com o se quisesse dizer: Se eu perm a necer convosco na terra, o que a presença de m inha carne vos aproveitará? Q uando, porém, eu subir para o céu, então aquela unicidade que tenho com o Pai se fará claram ente m anifesta. Q uando, pois, o m undo entender que eu sou um com o Pai, e que a D eidade é una, a esperança de todos os santos se fará mais sólida e invencível contra todas as tentações; pois por si mesmos saberão estar igualmente sob a proteção tanto de Deus quanto do homem. Se, pois, Cristo perm anecesse para sempre habitando na terra, e testificasse milhares de vezes com o nos sendo dado por seu Pai com o o guardião de nossa salvação, todavia teria havido algum a hesitação e ansiedade. Quando, porém , sabem os que ele está sentado à destra do Pai, e quando sabemos ser ele verdadei ramente Deus, todos os joelhos não se dobrariam diante dele a 51 [7.14] D A N IE L m enos que ele fosse o D eus eterno. Tenhamos em m ente aquela passagem de Isaías [42.8]: “Eu sou o Senhor; este é m eu nome; m inha glória, pois. não a darei a outrem , nem m eu louvor às im a gens de escultura.” Como, pois, a glória de Deus jam ais poderá ser transferida para um homem nem para qualquer outra criatura, a verdadeira unidade e natureza de Deus necessariam ente res plandecem na natureza hum ana de Cristo para que todo joelho se dobre diante dele. A gora, pois, entendem os o sentido no qual o profeta diz que Cristo apareceu como o Filho do hom em , ou, seja, sem elhante a um hom em , apresentando-se diante do A n cião de dias. Porque, depois que Cristo enfrentou o período de seu auto-aviltam ento, segundo Paulo [Fp 2.7], ele subiu ao céu e foi-lhe concedido dom ínio, com o o profeta diz no versículo se guinte. Esta passagem, pois, sem a m enor som bra de dúvida, deve ser visualizada com o um a indicação da ascensão de Cristo, as sim que ele deixou de ser um hom em mortal. D iz ele: Ele a p r e sentou-se d ia n te de D eus, ou, seja, tomou assento a sua destra. E prossegue: 14 E ali foi-lhe dado dom ínio, e g ló ria, e um reino, p a ra que todos o s povos, nações e línguas o servissem . Seu dom ín io é dom ín io etern o , que ja m a is cessará; e seu re in o ja m a is será d estruído. 14 Et ei dala fuii p o testa s, e t glo ria, vel, decus. e t regnum ; et o m nes p o puli, nationes, e t lin g u a ei servient: p o testas ejus potestas seculi. leierna, quse non auferetur, e t regnum ejus non corrum petur.“ O profeta confirm a e explica mais claram ente, neste versícu lo, o que dissera no anterior. Pois podem os extrair dele com o o personagem previam ente m encionado chegou ao A ncião de dias, que é Deus, ou, seja, em virtude do po d er que lhe fo i dado. Pois ainda que Cristo realm ente subisse ao céu [Mt 28.18], todavia devem os evidentem ente considerar seu propósito em agir assim. Foi para granjear o supremo poder no céu e na terra, com o ele m esm o afirma. E Paulo tam bém faz m enção desse propósito no prim eiro e segundo capítulos de Efésios [1.21; 2.7], C risto dei’ O u. n lo será abolido. 52 3 5 a EX P O SIÇ Ã O [7.14] xou o m undo e partiu para o Pai; prim eiro, para subjugar a si mesm o todas as potestades e recom pensar os anjos obedientes; em seguida, restringir o diabo e proteger e preservar a Igreja com seu auxílio, bem com o todos os eleitos de Deus o Pai. Assim, pois, D aniel agora avança com o que anteriorm ente disse sobre a aproxim ação de Cristo a Deus. E assim é refutada a loucura da queles que argum entam contra ser Cristo o verdadeiro e eterno Deus, porquanto diz-se ter ele chegado ao A ncião de dias. Pri m eiram ente. com o já dissem os, isso subentende a pessoa do M ediador, em seguida, toda dúvida é rem ovida quando o profeta acrescenta: foi-lhe d a d o p oder. Aqui temos, portanto, certa me dida de explicação. N ão querem os dizer que o m esm o lhe foi concedido com relação a sua existência e em ser ele cham ado Deus. Foi-lhe dado em seu papel de M ediador, com o Deus m ani festado n a carne, e com respeito a sua natureza humana. Obser vamos que todas essas coisas se harm onizam m uito bem , quando o profeta diz aqui: Proeminente po d er fo i dado a Cristo. Portan to, devem os m anter sua referência a essa m anifestação, porque Cristo foi desde o princípio a vida dos homens, o m undo foi cri ado por ele e sua energia sempre o sustentou [Jo 1.4]; m as foi-lhe dado poder para inform ar-nos com o D eus reinou por m eio de sua mão. Se nos fosse requerido que buscássem os a D eus sem um M ediador, sua distância seria incom ensurável; m as quando o M ediador nos encontra e se nos oferece em nossa própria nature za humana, tal é a proxim idade entre Deus e nós que nossa fé facilmente avança para além do mundo e penetra os próprios céus. Por essa razão, pois, to d o poder, h o n ra e rein o foi dado a C ris to. E acrescenta tam bém : to d a s as nações o se rv irã o , ou, seja, podem servi-lo; pois a cópula deve ser traduzida assim: Q u e to d a s as nações, povos e lín g u as o sirv am . Já m ostram os como isso deve ser propriam ente entendido com o indicação do início do reino de Cristo, e não deve ser conectado com sua conclusão final, com o muitos intérpretes forçam e restringem a passagem. 53 [7.14] D A N IE L Entrem entes, devem os acrescentar que os eventos que o profeta aqui narra não estão ainda com pletos; mas isso deve ser fam iliar a todos os santos, pois sempre que se trata do reino de C risto, sua glória é m agnificentem ente enaltecida, com o se estivesse agora absolutam ente com pleta em todas suas partes. Não surpreende se, segundo o uso freqüente e perpétuo da Escritura, o profeta dissesse poder fo i dado a Cristo para ele subjugar a si todos os povos, nações e línguas, com o se expressa o Salm o 110.1: “D is se Jehovah a m eu Senhor: A ssenta-te a m inha direita até que eu faça de teus inim igos estrado de teus pés.” Vemos, pois, como C risto foi exaltado a seu próprio im pério com o fim de governar sua igreja no nom e e no poder de seu Pai, enquanto, ao mesmo tempo, m uitos inim igos levantam -se contra ele. A obstinação do diabo e de todos os ím pios ainda continua, em bora C risto gover ne céu e terra e seja o supremo rei diante de quem todo joelho há de dobrar-se. Também sabemos quão m arcante diferença existe entre o com eço de seu reino e sua consum ação final. Seja qual for o significado, esta visão se adequa m uito bem às m uitas asseverações de Cristo, nas quais ele testifica do poder que lhe foi dado pelo Pai [Mt 28.18 e outras partes]. Ele não fala aqui do ju ízo final, m as sim plesm ente nos instrui sobre o objetivo de sua ascensão ao céu. O profeta confirm a este ponto de vista, dizendo: seu d o m ínio é d o m ín io e tern o , o q u al ja m a is s e rá rem o v id o , e seu rein o ja m a is p o d e rá s e r abolido. Pois, com estas palavras, ele ensina de m odo fam iliar e franco por que Cristo é o Rei suprem o, isto é: para o perpétuo governo de sua Igreja neste mundo. Precisam os erguer os olhos para o céu, em cada realização, sem pre que o estado da Igreja estiver em consideração, visto que sua felicidade não é terrena, nem perecível, nem tem porária, ainda que tudo o que é terreno seja sólido ou perpétuo. M as quando o profeta diz que o dom ínio de Cristo é eterno, ele indubitavelm ente tem em m ente a perene duração de sua m onarquia até o fim do mundo. 54 35* EX P O SIÇ Ã O [7.15, 16] quando então congregará seu povo para um a vida feliz e uma herança eterna. Portanto, em bora a im ortalidade celestial esteja com preendida sob essas palavras, todavia, num a passagem ante rior, o profeta realçou a perpétua existência da Igreja neste m un do, porque Cristo a defenderá, ainda que esteja diariam ente su je ita a infindas causas de destruição. E quem não asseveraria o quase perecim ento diário da Igreja, se Deus prodigiosam ente não a preservasse pela m ão de seu unigénito Filho? D aí ser correto entender a frase: S eu rein o s e rá o rein o e tern o . E assim recebe mos um a consolação não corriqueira, quando vem os a Igreja agi tada em m eio a várias flutuações e quase sepultada e devorada por contínuos naufrágios, no entanto Cristo está sem pre estendendo-lhe suas mãos e preservando-a e salvando-a de todas as dolorosas e horríveis espécies de destruição. Então prossegue: 15 E u. D aniel, fiquei angustiado em meu e sp írito no âm ago d e m eu co rp o , e as visõ e s d e m inha cabeça m e atribulavam . 15 Succisus fuii spiritus m eus m ihi D anie li,!l in m edio corporis.” e t v isio n es ca pitis mei terruerunt me. 16 C h e g u ei-m e a um dos que e stav a m p erto e lhe pedi a v erd ad e d e tudo isso. E e le m e falou e m e fez sab er a interpretaç ão das coisas. 16 A ccessi ad unum ex his qui aderant, et sciscitatus sum ex e o veritatem su p e r his om nibus: et d ix it m ihi, e t en arrationem serm onum p atefect m ihi. D aniel afirm a que seu espírito estava ou elim inado ou des vanecido, com o se ele estivesse sofrendo de algum a deficiência m ental. D essa form a Deus desejava com unicar a seu servo a m agnitude da visão. E ele nos inspira tam bém com reverência por essa visão, a fim de não a tratarm os com tibiez e com o algo corriqueiro. Devem os, porém, entender com o D eus abre a D ani el, seu servo, e a nós por meio de sua assistência e ministério, esses m istérios que não poderiam de outra form a ser com preen didos por nossos sentidos humanos. Pois se Daniel, que sabemos ter sido um profeta extraordinário, sentiu em seu espírito tanta 11 Ou desvanecido, ou meu espírito estava faltando a mim, Daniel. Ou “invólucro", propriam ente; aqui, porém, esse substantivo é transferido m etaforica m ente para o corpo. A ben-Ezra cham a o corpo “o invólucro” d a mente. 55 [7.15, 16] D AN IEL deficiência e à beira do desfalecim ento, seguram ente nós, que conhecem os ainda tão pouco dos m istérios de Deus, sim , que raram ente experim entam os seus rudim entos m ais elem entares, nunca podem os atingir tão grande altitude, a m enos que vença mos o m undo e nos desvencilhem os de todas as sensações hum a nas. Porquanto essas coisas não podem ser percebidas por nós, a menos que nossa mente seja lím pida e com pletam ente purificada. Portanto, ele diz em prim eiro lugar que m eu e s p írito estav a s u p rim id o , ou desfalecido, no âm ag o d e m eu co rp o ; com o se quisesse dizer que estava quase sem vida e bem próxim o da m or te. E acrescenta, com o razão: as visões d e m in h a cab eça m e a trib u la v a m . Ninguém pode desfalecer - fato esse que às vezes sucede - sem bom motivo. Q uando o terror cham ado pânico se apodera das pessoas, observamos com o se tom am privadas do autocontrole e ficam com o que inânimes. D aniel, porém , se reve lou distinto de tais pessoas, dizendo que ficara angustiado ou per turbado pelas visões de sua cabeça; com o se quisesse dizer que sua perturbação não era sem causa, m as que fora causada pelo m istério do qual a visão lhe fora apresentada. Ele chegou a um dos q ue estav am p erto . Ele dissera um pouco antes que dez mil vezes dez mil estavam à destra do tribunal de Deus. Sem a m enor som bra de dúvida, o pedido do profeta foi dirigido a um desses anjos. E aqui devem os observar sua m odéstia e docilidade em buscar alguém para instrução, visto que estava cônscio de sua própria ignorância, e não encontrava nenhum outro remédio. Ao m esm o tempo, somos instruídos pelo exem plo do profeta a não rejeitar todas as visões, mas a buscar sua interpretação em Deus m esm o. A inda que Deus atualm ente não nos fale por m eio de visões, todavia ele quer que nos contentem os com sua Lei e com o Evangelho, enquanto anjos não se nos m anifestarem e pública e claram ente não descerem do céu; visto, porém , que a Escritura nos é obscura, em decorrência das trevas que nos envolvem, apren dam os a não rejeitar aquilo que vai além de nossa capacidade, 56 3 5 * EX P O SIÇ Ã O [7.15, 161 ainda quando algum véu escuro a envolva, m as corram os para o rem édio que D aniel usava, não buscando em anjos a com preen são da palavra de Deus, os quais não nos aparecem, mas de C ris to mesmo, o qual atualm ente nos ensina fam iliarm ente pela instrum entalidade de pastores e ministros do evangelho. Ora, como nos foi dado um suprem o e único M estre da parte do Pai, assim também ele exerce o ofício de mestre por m eio de seus próprios ministros a quem ele pôs sobre nós [Mt 23.8,10]. Portanto, visto que Daniel aproxim ou-se do anjo que se encontrava perto dele, assim se nos ordena diariam ente a aproxim arm o-nos daqueles que têm sido dotados com o dom da interpretação e que podem fielm ente explicar-nos coisas que de outra form a permaneceriam obscuras. N ossa confiança, tam bém , precisa ser aum entada pelo que diretam ente vem a seguir: O a n jo falo u e esclareceu a in te rp re ta ç ã o d a s p a la v ra s. D aniel aqui dem onstra que sua m o déstia e hum ildade não foram em vão, ao ordenar D eus que o anjo lhe explicasse tudo quanto era obscuro. A ssim , sem dúvida, Cristo hoje atende nossas orações, caso sejam os realm ente seus discípulos; ou, seja, se, depois que os m istérios que ultrapassam e absorvem todo nosso senso, nos tiverem terrificado, corram os para aquela ordem que nos foi prescrita, e busquem os ser fiéis ministros e m estres na interpretação daquelas coisas que são difí ceis e obscuras, as quais se nos acham totalm ente ocultas. ORAÇÃO D e u s O n ip o ten te, v isto q u e a f é d o s p a is e ste ve e n v o lta p o r so m b ra s e n ig m á tic a s, p e la s q u a is q u is e ste q u e e la fo s s e n u trid a , a té q u e teu F ilh o m a n ife s ta m e n te s e n o s re v ela sse n a ca rn e, o ro a ti p a r a q u e h o je, d e p o is q u e ele s e n o s m a n ife sto u c o m o o m e lh o r e m a is p e rfe ito M estre e n o s ex p lic o u te u s c o n se lh o s d e fo r m a tã o fa m ilia r, c o n c ed e n o s q u e n ã o s e ja m o s tã o e stú p id o s n e m tã o d is p lic e n te s a o p o n to d e p e rm itire s q u e e sc a p e d e n o ssa a p re e n s ã o a im e n sa c la re za e a m a n i fe s ta ç ã o q u e n o s o fe re c e s n o ev a n g e lh o . Q u e se ja m o s a ss im e n c a m i n h a d o s à vid a etern a , a té a p ó s a c o n c re tiza ç ã o d o c u rso d e n o ssa p r e s e n te vid a e a rem o ç ã o d e to d o s o s o b stá c u lo s q u e S a ta n á s p õ e 57 D A N IE L e m n o ss o ca m in h o , e m b a ra ç a n d o -n o s o u fa z e n d o -n o s d esviar, p o s sa m o s, p o r fim , a lc a n ç a r o d e sfru to d a q u e la b e m -a v e n tu r a d a v id a n a q u a l C risto, teu u n ig é n ito F ilho, n o s a n te cip o u . E a ss im se ja m o s c o -h e rd e iro s c o m e le : e c o m o o d e sig n a ste ú n ic o h erdeiro , a ss im ele n o s co n g re g u e p a r a a in fa lív e l h e ra n ç a d e u m a b e n d ita im o rta lid a de. A m ém . 58 g 36a .xposição 17 E stes g ran d es anim ais, que são quatro, são q uatro reis q u e subirão d a terra. 17 H æ bestiæ m agnæ quas vidisti quatuor, sunt q uatuor régna, quœ exsurgent e terra. 18 Et sortientur, obtinebunl, regnum sanc- 18 M as o s santos altíssim os receberão o reino e possuirão o re in o p a ra sem pre, e de eternidade a eternidade. torum xcelsorum : e t p o ssidebunt regnum u sque in seculum , e t usq u e in seculum seculorum . Aqui o anjo dá resposta a Daniel no que se refere aos quatro animais que lhe foram mostrados na visão. Portanto, diz ele: s u r g ira m q u a tro reinos, e pela designação reino ele tem em mente monarquia; pois sabemos que os persas tinham m uitos reis até A lexandre transferir para si o im pério do Oriente. Em bora Ciro tivesse sete ou oito sucessores, todavia o im pério persa conti nuou através de todos eles. E, com o vimos antes, em bora tudo o que A lexandre adquirira através de seus exércitos fosse dividido entre seus quatro sucessores, contudo ainda restou o reino macedônio. O m esm o se deve dizer acerca do quarto reino. Em bora saibam os que foram criados cônsules na Rom a m ais antiga, to davia aquele governo durou até que Júlio César o destruiu e con sumiu a resistência do im pério, de m odo a exceder com seu po der a esplêndida altitude que por m uito tem po e am plam ente foi conspícua no mundo. D aí responder o anjo: quatro reinos são denotados pelos quatro anim ais; diz ele: levantarão; e no entan to o caldaico surgira há muito tempo, e estava agora à beira de um colapso sob Belsazar. M as o propósito do anjo era instruir o profeta e a todo o povo que não havia razão para as revoluções os deixarem tão perturbados. Os israelitas, pois, se viram prostra 59 [7.17, 18) D A N IE L dos com o mortos; sim, realm ente sepultados e escondidos sob a terra. Pois o exílio era para eles equivalente a túm ulo. Por essa razão, pois, o anjo anuncia o surgimento de quatro reinos, en quanto o prim eiro era então florescente; mas, com o eu já disse, isso se adequa m uito bem ao escopo e objetivo da profecia. Ele anteriorm ente dissera: do mar, porém a palavra ‘m ar’ é usada m etaforicam ente, visto a condição da terra ser sem pre turbulenta ao longo das eras. Portanto, com o nada era estável. Deus, apro priadam ente, apresenta o m undo inteiro sob a figura do mar. Em seguida ele acrescenta: rece b erão o rein o dos san to s altíssim os. N este ponto, os intérpretes se divergem consideravelm ente, por que, com o já expliquei previam ente, alguns tom am esta profecia em referência ao reino da Turquia; outros, à tirania do papa de Roma, e estendem ao juízo final o que o profeta aqui diz. N ão há, pois, nada de surpreendente nessa diversidade de opinião, reve lando-se mais plenam ente nos diversos detalhes. Pela expressão os santos alguns entendem os anjos; m as resta ainda m uita con trovérsia acerca de palavras, pois o substantivo santos é ‘em re gência’ , com o se o profeta, propriam ente dito, dissesse os santos dos altos.23Passagens afins justificam os que as tom am “no esta do absoluto” . M as se seguirm os a construção gram atical, não podem os explicá-la de outra forma; o prim eiro substantivo, po rém , pode ser expresso num estado de regência, com o já disse mos. Eu, de m inha parte, abraço esta opinião. H á quem a atribui ao único Deus, mas creio que essa é um a form a profana de ex pressão. Não tenho dúvida de que o profeta tem em m ente os filhos de D eus com o sendo os santos altíssimos, porque, em bora sejam peregrinos no mundo, contudo elevam suas m entes para além e têm consciência de que são cidadãos do reino celestial. D aí, pelo term o ■prrVl?, gnelionin, ‘altíssim os’, não tenho dúvi25 O latim. aqui. se refere à construção hebraica. A tradução francesa tem expresso o significado d e Calvino sem m anter estrita às palavras. Les saincts des souverain.s é a reda ção francesa da regência hebraica. 60 36* EX P O SIÇ Ã O [7.17, 18] da de que o profeta tem em mente os poderes celestiais; ou, seja, tudo quanto podem os conceber da divindade e tudo quanto é exal tado acim a do mundo. A gora apresentarei brevem ente m inhas razões por que aprecio este sentido com o sendo o melhor. Se entenderm os os altíssim os com o sendo o próprio Deus, que sentido iremos extrair da passagem ? Teriam os caldeus e o restante das m onarquias usurpado e transferido para si o poder de D eus? H á algum a verdade nisso, porque todo aquele que domina sem adm itir o D eus único o usurpa de sua honra peculiar, e são antes ladrões do que reis. O profeta, porém, em m inha opinião, entendeu algo m ais do que disse o anjo, a saber, que a Igreja perderia toda form a e dignidade no m undo durante a expansão dessas quatro monarquias. Sabem os que os filhos de Deus são herdeiros do mundo; e Paulo, ao falar da prom essa feita a Abraão, diz que ele foi escolhido por D eus com o herdeiro do m undo (Rm 4.13: Hb 1.2). E esta doutrina é suficientem ente conhecida - o m undo foi criado no interesse da raça humana. Quando Adão apostatou de seus direitos legais, toda sua posteridade ficou alie nada; D eus os privou da herança que lhes fora designada. Agora, pois, nossa herança tem de ser restaurada através de Cristo, por cuja razão é ele cham ado o único herdeiro do mundo. E assim não surpreende que o anjo diga que os tiranos, quando exercem o dom ínio suprem o, assumem e arrogam para si a propriedade pe culiar dos santos altíssim os, significando o povo de Deus. E isso se adequa m uito bem às asseverações da presente passagem con cernente à Igreja ao ser privada de sua dignidade, em inência e visibilidade no mundo. Porque então o povo de Deus se assem e lhava a um a carcaça pútrida, cujos membros eram desm em bra dos e dispersos em todas as direções, sem qualquer esperança de restauração. Por fim, ainda que por perm issão de Dario e pelo édito e liberalidade de C iro algum a porção deles regressou a seu país, todavia o que era tal regresso nom inal? N ão tinham senão um a precária prevalecência na herança a eles divinam ente pro 61 17.17, 18] D A N IE L metida; eram oprim idos de todos os lados por seus inim igos e estavam sujeitos à luxúria e injustiça de todos eles. Pois a Igreja não desfrutou de liberdade sob o im pério persa. D epois d a tercei ra m udança, sabemos quão m iseravelm ente foram afligidos, es pecialm ente sob Antíoco. Aquela nação foi sempre sua algoz, porém então estavam quase reduzidos a extrem os, quando Antí oco em preendeu furiosam ente abolir toda a lei e o culto de Deus. Sob o reino m acedônio, os judeus estiveram em constante servi dão; m as quando o exército rom ano adentrou aquelas regiões, sentiram a terrível tirania do quarto animal, com o já vimos. Fi nalm ente, é bastante evidente, à luz da história contínua daqueles tem pos, que os filhos de Deus estavam sempre debaixo de ju g o e eram tratados não só cruelmente, m as também ignominiosamente. E assim esta profecia se cum priu, a saber: os quatro anim ais tom aram para si o império que propriam ente pertencia aos san tos das alturas; ou, seja, aos filhos eleitos de Deus, os quais, ainda que habitantes da terra, são dependentes do céu. N ão vejo nesta interpretação nada que seja forçado, e quem quer que pru dentem ente pese a m atéria, espero eu, reconhecerá que de fato penetrei a intenção do profeta. A gora segue a sentença fin al: r e ce b e rã o o reino, diz ele, p a r a sem p re, d e e te rn id a d e a e te rn i d ad e. Suscita-se aqui um a questão difícil, visto que, pelas pala vras de D aniel, ou do anjo a dirigir-se-lhe, parece expressar uma condição perpétua sob essas quatro m onarquias. Belsazar fora o últim o rei da dinastia babilónica, e no período desta visão já se divisava a ruína dessa monarquia. Com respeito aos reis persas, houve apenas oito deles além de Ciro. E concernente a A lexan dre, sabem os que aconteceu um a m udança súbita; o terror que ele infligiu dissem inou-se por toda parte com o um a torm enta, mas se desvaneceu assim que afetou todos os povos do Oriente. O reino m acedônio também sofreu um a concussão, quando aque les líderes com eçaram a discentir entre si quem havia herdado de A lexandre a autoridade e supremacia; e por fim o reino dividiu62 3 6 * EX P O SIÇ Ã O [7.17, 18] se em quatro, com o já observam os, e disso se fará m enção nova mente. Ora, se contarm os os anos, a extensão dessas m onarquias não foi tão grande que justifique o epíteto ‘perpétuo’. Respondo: isso deve referir-se às sensações que sentem os santos, para quem essa delonga parecia especialm ente tediosa, de modo que elas eram dolorosam ente penetrantes em sua miséria, não houvera esta profecia de algum a form a a mitigado. Vemos no presente m o m ento quão grande é o ardor do desejo quando se faz referência ao socorro divino; e quando nossa m ente é dom inada por tal de sejo, im ediatam ente ela se deixa dom inar pela im paciência. A s sim sucede que as promessas de Deus não são suficientes para sustentar-nos, porque nada é m ais difícil do que enfrentar um a delongada espera. Pois se a Igreja de nosso tem po for oprim ida por cem anos, que constância se discerniria em nós? Se surge um torvelinho, caím os em perplexidade e gritamos: “O que virá em seguida?” Três ou quatro meses não terão expirado sem que to dos os hom ens se ponham a discutir com Deus e a protestar con tra ele, só porque ele não se apressa de vez em dar assistência a sua Igreja. N ão fiquem os surpresos, pois, quando o anjo aqui designa um tempo, ou, ainda, “de eternidade a eternidade”, aos tiranos sob quem a Igreja seria oprim ida. Posto que eu não duvi de que a referência seja à plenitude dos tempos, com o sabemos ter Cristo sido o fim da Lei e com o seu advento se aproximava, assim D eus adm oestou os fiéis a transportarem suas próprias ex pectativas para o advento de seu Redentor. Portanto, quando o anjo usa a frase u m tem p o e d e e te rn id a d e a e te rn id a d e , não tenho dúvida de que ele definia o tem po para os eleitos, a fim de fortalecê-los a pacientem ente suportarem provações de todos os tipos, segundo divinam ente decretado; pois os quatro animais de veriam reinar não por uns poucos anos, mas por eras contínuas; ou, seja, até o tem po em que a renovação houvesse chegado para o mundo, quando D eus restauraria com pletam ente sua Igreja. Avancemos mais: 63 [7.19, 20] D A N IE L 19 E ntão eu quis co n h ec er a verdade a re sp eito d o q uarto anim al, o qual era d iferente d e todos o s outros, excessivam ente terrível, c u jo s d entes eram d e ferro e suas u n h as, d e bronze: o qual devorava, fazia em pedaços e pisava com seus pés o q u e sobrava; 2 0 E a resp eito dos d e z chifres q u e ja /.iam e m sua cabeça, e d o ou tro q u e subia. d iante d o qual os três caíram ; ainda daqu ele c h ifre que tinha olhos e um a b o ca que pro feria grandes coisas, c u ja aparência era m ais ro b u sta q u e a d e seus com - 19 T unc optavi a d v eritatem :J d e bestia quarta, quse erat d iv rsa ab om n ib u s aliis. terribilis valdc, cujus d e n te s erartt ferri, ferrei, et ungues x r is , terei, com edens et conterens, e t residuum pedibus su is conculcans. 2 0 E t su p er c o m ib u s d ecem , de com ibus decem, quíe eram in capite ejus, e t d e postrem o quod surgebat, e t quod ceciderant ex prioribus tria: e t quod c o m u illi eram oculi, e t os loquens grandia: e t aspectus e ju s m agnus prse c o ciis.25 panheiros. Aqui o profeta interroga o anjo acerca do Q uarto Animal, mais atenta e cuidadosam ente; com o anteriorm ente o vim os tocado por profunda adm iração ao divisar o animal que era form idável acim a dos outros três, de m odo que nem um nom e nem descrição se podia encontrar para ele. Visto, pois, que Deus exibia algo grande sob a im agem do quarto animal, ele levou seu profeta a despertar-se para entender o mistério dele [o animal]. Por essa razão ele agora interroga o anjo; pois afirm a que queria saber a verdade concernente ao quarto animal, e tam bém repete o que vim os antes, a saber: ele e r a d ifere n te dos o u tro s. E seguram en te a sujeição de tantos reis ao im pério rom ano era um a diferença digna de nota. Pensemos na origem daquela nação - uns poucos assaltantes apoderaram-se de uma parte do deserto, desenvolvendo grande e brutal audácia e força, até que reduziram todos seus vizinhos a seus vassalos. Então cruzaram o m ar e sob seu dom í nio juntaram um a província, e depois outra. E quando o reino de M acedônia foi posto sob seu poder, isso foi deveras algo porten toso. Por fim tornaram -se senhores de todo o circuito do M edi terrâneo, e não havia canto que não aceitava seu jugo; e isso ja m ais poderia ser im aginado pela mente humana. :J Esta palavra, lO X '1?. litzía, geralm ente é explicada no sentido de "para a verdade", ou seja. desejo saber. A Vulgaia traz "diligentius discere". Wintle: "acurada inform ação.'' Ou. seja, “ além dos outros animais.” 64 3 6 a EX P O SIÇ Ã O {7.19, 20J Então foi dito: este anim al era diferente dos outros, e e r a te rrív e l. No m esm o sentido, seus d en tes foram denom inados de ferro , e su as u n h a s, d e bro n ze. Até aqui não se havia feito m en ção das unhas. O profeta falara som ente dos dentes de ferro, mas agora adiciona unhas de bronze, com o se dissesse: Este animal será dotado de tal dem ência selvagem , ao ponto não só de atacar todas as coisas com sua inusitada violência, m as tam bém de ras gar, lacerar e devorar todas as coisas, ao reiterar ele um a vez mais o que dissera: com endo e destruindo e pisando com seus pés o que sobrava. Com o já expliquei todos os pontos, não tenho disposição de consum ir debalde o tem po do leitor e confundi-lo com repetições inúteis. T am b ém p erg u n te i, disse ele, ace rca d o s dez ch ifres que ja z ia m em su a cabeça. E essa é a razão por que abrevio o tem a neste ponto, visto que o anjo dará sua respos ta diretamente. O profeta, pois, cede agora, sem dúvida, a um im pulso celestial, visto que Deus estava dispondo-se a instruir a ele só com o um a pessoa privativa; ele tinha de ser um a testem u nha e arauto de tão incomensurável mistério; e podem os em nos sos dias aprender à luz desses escritos que devem os fazer o m á xim o uso deles, para nós, ao nos tom arm os plenam ente fam ilia rizados com eles. Portanto, diz ainda: E le ta m b é m in q u iriu a c e rc a dos dez chifres q u e ja z ia m so b re a cab eça d o an im al, b em com o do o u tro ch ifre q u e su rg iu , indicando o pequeno, e a c e rc a dos trê s ch ifres cain d o do ro sto d o an im al. Já indicam os com o as pro víncias eram denotadas pelos dez chifres, e com o se realçava a diferença entre o im pério rom ano e as dem ais m onarquias, por que jam ais houve um governo suprem o em Rom a, exceto quan do Sylla e M arius exerceram sua autoridade usurpada - porém cada um deles só por pouco tempo. Aqui, pois, o estado contínuo do im pério rom ano está em revista, pois ele não era sim plesm en te um animal singular enquanto tinha dez chifres. Um número finito é substituído por um infinito. Com respeito ao pequeno 65 [7.21,22] D A N IE L chifre, eu disse que ele aponta para os Césares, os quais conquis tam para si todo o govem o do estado, depois de privar o povo de sua liberdade e o senado de seu poder, enquanto ainda sob seu dom ínio algum a dignidade se m antinha no senado e algum a m a jestade retida pelo povo. Já explicam os tam bém com o os três chifres falavam; ou, seja, quão astutamente os Césares infringi am e apoucavam a força tanto do povo quanto do senado. Por fim , já explicam os este pequeno chifre sendo exibido com olhos hum anos, um a vez que os Césares exerciam seu dom ínio com astúcia, ao pretenderem ser apenas tribunos do povo e perm itiam que as insígnias do im pério ficassem nas mãos dos cônsules; pois quando adentravam o senado, sentavam -se num a posição secun dária em assentos da mais alta dignidade preparados para os tri bunos. Portanto, visto que tiranizavam com sagacidade e dolo, e não com violência pública, diz-se ser o m esm o dotado com olhos hum anos. Então, no tocante à língua, o sentido é o m esm o; pois ainda que professassem sem pre que o poder consular era supre m o no estado, todavia não conseguiam restringir-se, senão que vomitavam uma infindável verbosidade vituperativa. Por um lado, vem o-los com o notáveis por seus olhos; e, por outro, por sua língua. E seu asp ecto e ra te rrív e l acim a d e seus c o m p a n h e i ros. Isso não parece um a peculiaridade pertencente ao pequeno chifre que se ergueu entre os dez, mas, antes, ao quarto animal. Se alguém, porém , deseja entendê-lo com o indicativo do peque no chifre, não faço questão, visto que o m esm o denota um senti do tolerável. Eu, porém , ao contrário, m antenho m inha opinião anterior, pois não surpreende encontrar o profeta, depois de seu discurso sobre o pequeno chifre, volvendo-se para o animal pro priam ente dito. 21 Eu O lh av a, e o m esm o ch ifre fez g u e rra c o n tr a o s san to s, e prevaleceu c o n tra 21 Vidi, e t c o m u illud faciebat p ra liu m cura sanctis, et p rzev alu it illis. eles; 2 2 A té q u e veio o A ncião d c dias e se estab eleceu o ju íz o e ra prol d o s santos d o 2 2 D o n e c venit A n tiq u u s d ie ru m .e tju d ic iu m d a tu m e s t sa n c tis e x c e ls o ru m , c l 66 36* E X P O SIÇ Ã O A ltíssim o; e chegou o lem po em que os santos possuíram o reino. [7.21,22] venil tem pus, et regnum a ccepeaint sancli. O profeta agora acrescenta o que havia om itido. O anjo nem lhe havia ainda respondido, porém , com o não havia expresso su ficientem ente com o o pequeno chifre deflagrara guerra contra os filhos de Deus, ele então preenche a omissão. Portanto, ele diz que olhou - isso deve ser recebido à guisa de correção; E u olhei, diz ele, o significado me foi m ostrado num a visão, com o o pe queno chifre fez g u e rra c o n tra os san to s ao p o n to d e p rev ale c e r c o n tra eles. Evidentem ente, m uitos outros tiranos assalta ram o povo eleito de D eus com injúrias ainda maiores. D aí m ui tos aplicarem isso a Antíoco Epífanes, que era hostil em relação aos judeus mais do que em relação aos outros, e estava totalm en te determ inado a apagar de Israel o nome do Deus. E sabemos quão am iúde ele suscitava poderosos arm am entos com o fim de extinguir tanto o povo quanto o culto devido a Deus. Portanto, visto que a crueldade de A ntíoco era tão severa contra os israeli tas, muitos crêem que sua imagem fosse exibida pelo profeta como um pequeno chifre, e o que mais adiante verem os sobre ‘tem po’, ‘tem pos’ e ‘m etade de um tem po’, explicam com o indicativo dos três anos e m eio durante o qual o tem plo ficou em ruínas, e o povo com isso ficou privado de oferecer sacrifícios. Portanto, visto que sua religião foi então interrompida, acreditam que a tirania estava implícita, pela qual o povo foi proibido de testifi car sua piedade. A inda, porém, que essa opinião seja plausível, e à prim eira vista tem toda a aparência de veracidade, todavia, se pesarm os todas as coisas em ordem , podem os facilm ente julgar que não se encaixa na figura de Antíoco. Portanto, por que o profeta diz: o pequeno chifre deflagrou guerra contra os santos? Certam ente A ntíoco fez guerra contra a Igreja, e assim fizeram muitos outros; os egípcios, bem o sabemos, com freqüência der rubou e espoliou o tem plo, e bem assim os rom anos, antes da monarquia dos Césares. Eis m inha resposta: isso se expressa com parativam ente, porque nunca se efetuou guerras com tanta assi67 [7.21, 22] D A N IE L duidade e aplicabilidade contra a Igreja com o as que ocorreram depois que os Césares surgiram no cenário da história, e depois que C risto se manifestou ao mundo; pois o diabo estava então mais engajado e Deus também afrouxou as rédeas para provar a paciência de seu povo. Por últim o, era natural que os m ais am ar gos conflitos se irrom pessem quando a redenção do m undo fosse efetuada; e o evento claram ente o dem onstra. Sabem os, antes de tudo, através de hórridos exem plos, com o a Judéia ficou devasta da, pois nunca se praticou tal crueldade contra qualquer outro povo. Tam pouco a calam idade era de pouca duração; estam os bem fam iliarizados com sua extrem a obstinação, a qual com pe lia seus inimigos a ignorar com pletam ente a clem ência. Pois os romanos desejavam poupá-los o quanto possível, porém tão gran de era sua obstinação e a dem ência de sua raiva, que provocavam seus inim igos com o a devotá-los à destruição, até que ocorreu m edonha carnificina, da qual a história nos tem suficientem ente inform ado. Q uando Tito, sob os auspícios de seu pai Vespasiano, tom ou e destruiu a cidade, os judeus foram apunhalados e mortos com o reses por toda a extensa Ásia. Até este ponto, pois, diz respeito aos judeus. Quando D eus inseriu o corpo dos gentios em sua Igreja, a crueldade dos Césares abrangeu todos os cristãos; assim o pe queno chifre deflagrou guerra contra os santos de um a m aneira distinta daquela dos prim eiros animais, porque a ocasião era dis tinta, e a ira de Satanás foi incitada contra todos os filhos de Deus em virtude da manifestação de Cristo. Esta, pois, é a m elhor ex plicação de o pequeno chifre deflagrou guerra contra os santos. E assim diz ele: e p rev aleceria. Pois os Césares e todos os que governavam as províncias do im pério se enraiveceram com tão extrem a violência contra a Igreja, que ela quase desapareceu da face d a terra. E assim aconteceu que o pequeno chifre prevaleceu na aparência e na opinião geral, quando, por pouco tem po, a se gurança da Igreja foi quase posta a pique. 68 3 6 ' EX P O SIÇ Ã O [7.21,22] Então segue: A té q u e chegou o A n cião d e d ia s, e estab e le ceu-se o ju íz o em p ro l dos san to s d o A ltíssim o. Sem dúvida o profeta diz que D eus chegou no m esm o sentido de antes, a saber: quando ele erigiu seu tribunal e publicam ente apareceu com o o Juiz do m undo na pessoa de Cristo. Ele não põe aqui o Filho do hom em diante de nós, com o fizera antes, m as ainda um a mais plena explicação desta passagem deve ser buscada na passagem anterior. Então se nos diz que D eus chegou, quando ele m anifes ta seu poder ao suprir as necessidades da Igreja, com o por meio de um a figura com um dele se diz que se m antém distante de nós, e dorm ir ou repousar quando ele não se nos revela publicam ente com o nosso libertador. Portanto, em contrapartida, dele se diz que veio para nós, quando francam ente prova seu constante cui dado por nós. Sob essa figura, D aniel agora diz que viu o apare cim ento do próprio Deus. Então chegou o A ncião de dias. Se perguntarm os quando, tem os resposta que foi im ediatam ente; foi im ediatamente depois da prom ulgação do evangelho. Então Deus estendeu sua m ão para sua Igreja, e ergueu-a do abismo. Pois, visto que a denom inação ju d eu fora por m uito tem po odiada, e todos os povos desejavam exterm inar os judeus do mundo, o ad vento de C risto aum entou esse ódio e crueldade; e a licença para injuriá-los foi acrescida, quando pensaram que os discípulos de Cristo planejavam um a m udança de governo e desejavam sub verter o existente estado de coisas; com o nestes dias todos os piedosos sofrem gravem ente sob essa falsa im putação. Deus, portanto, é descrito com o que chegando, quando a doutrina do evangelho era mais e m ais prom ulgada e algum descanso conce dido à Igreja. E assim, com essa resposta, os santos receberam o reino que havia sido tirado deles, ou, seja: o reino de D eus e dos santos obteve algum a fam a e celebridade no mundo, através da difusão geral da doutrina da piedade, em toda direção. Agora, pois, entendem os o que Daniel desejava com unicar pela frase: chegou o Ancião de dias e estabeleceu-se o ju ízo em prol dos santos do Altíssim o. O restante fica para a próxim a preleção. 69 D A N IE L ORAÇÃO Deus Onipotente, visto que provas nossa f é e constância com muitas tribulações, como é nosso dever neste aspecto e em todos os demais submeter-nos a tua vontade, concede-nos, peço-te, que não demos motivo aos muitos ataques pelos quais somos acossados. Porque so mos assaltados de todos os lados, p or Satanás e p o r todos os ímpios, e enquanto sua fú ria ainda arde e gera crueldade contra nós, que jam ais cedamos à mesma. Que prossigamos em nossa guerra, confi ando no invencível poder do Espírito, mesmo quando os ímpios pre valeçam p o r algum tempo. Que olhemos para o advento de teu uni génito Filho, não só quando manifestar-se no último dia, mas tam bém sempre que agradar-te que ele assista tua Igreja e a soerga de suas miseráveis aflições. E mesmo que suportemos nossos estresses, que a coragem jam ais nos falhe, até que. p o r fim , sejamos congrega dos para o feliz descanso que já fo i conquistado para nós através do sangue do mesmo unigénito Filho. Amém. 70 37a ia preleção anterior com eçam os explicando com o o juízo em prol dos santos foi estabelecido nos prim órdios da era evangélica. Pois sabemos quão parcial, m esm o naqueles tempos, era a tranqüilidade da Igreja. Porquanto, quando ela era isenta de perseguição externa e de derram am ento de sangue, erguiam-se os inim igos dom ésticos os quais provavam ser m uitíssim o mais injuriosos. E assim o reino de Cristo nunca floresceu no m undo ao ponto de ter algo em com um com aqueles im périos nos quais o esplendor e a pom pa ficavam em evidência. Deus, porém , quis propor este consolo a seu profeta, m ostrando-lhe a futura reputa ção da Igreja e sua elevação a certo grau de honra depois de emergir da obscuridade, de sorte que os eleitos ousassem publicam ente render hom enagem a Cristo e professar a genuína e sincera pie dade. Daí, estabelecendo-se o juízo em prol dos santos, o profeta tem em m ente a restauração do direito do qual tinham sido priva dos e ao m esm o tem po sua obtenção do reino, quando a Igreja não m ais se viu prostrada com o se dera antes do advento de C ris to. Porque a prom ulgação do evangelho estava finalm ente libera da, com o passam os a ver. Volvamo-nos ao contexto: 23 A ssim ele disse: O q u a rto anim al será um q uarto re in o so b re a terra, o qual será 2 3 Sic d ixit,w B estia quarta, re g n u m q u a rtum erit in terra, q u o d e rit d iversum ab 36 A expressão parece concisa, m as visto que ele anteriorm ente acrescentara o que havia om itido, com o propósito de conectar a história, ele repete novam ente “ assim disse o anjo", ou, seja, “quanto àquela porção da visão, assim falou o anjo” . 71 [7.23, 24] D A N IE L d ifere n te de todos os reinos, e dev o rará toda a terra, e a pisará, e a fará em pedaços. om nibus regnis: e l vorabit21 totam terram , e t conteret,2' e t co m m in u et eam . 2 4 E d os d e z chifres d este reino p rocederã o d e z reis; e ou tro se e rg u erá d e p o is d eles; e ele se rá diferen te d o s prim eiros e su b ju g a rá o s três reis. 2 4 E t c o m u a decem a b illo regno, d ecem R eges sunt, qui e xorientur, qui surgent, e t aliud postrem um surget p o st illo s Reges,s e t ip s e ^ e n t divrsus a su p e rio n b u s,51 et tres R eges affliget. E ssa resposta do anjo está sujeita à m esm a obscuridade que a visão propriam ente dita, m as deve ser suficiente para aplacar as m entes dos fiéis e soubessem eles que várias m udanças surgirão e abalarão toda a terra; pois, com o muitas tribulações estavam preparadas para os santos, assim também tinham que tom ar alen to com determ inação e paciência. Pois D eus não se dispunha a explicar plenam ente o que m ostrara a seu profeta; ele apenas d e sejava pôr esta conclusão diante deles: surgirá um reino com ple tam ente diferente de todos os outros. E assim diz o anjo: o Q u a r to A n im a l significa u m q u a rto reino, o q u a l s e rá d ife re n te de todos os reinos. Anteriorm ente a esse período, nenhum estado fora tão extenso em seu domínio. Pois ainda que os espartanos e os atenienses efetuassem extraordinárias e m em oráveis proezas, todavia sabemos que se m antiveram dentro de tacanhas frontei ras; e a am bição e prolixa vaidade dos gregos os levaram a cele brar aquelas guerras que foram de bem poucas conseqüências, com o aprendem os ainda de suas próprias histórias. Q ualquer que seja o cam inho a que isso nos leve, foi com dificuldade que Esparta obteve a segunda posição na Grécia, enquanto A tenas m an tinha a prim eira. N o que diz respeito ao im pério rom ano, sabe m os ter sido ele mais extenso e poderoso do que as dem ais m o narquias. Q uando toda a Itália caiu sob seu dom ínio, isso era su ficiente para qualquer m onarquia nobre; porém a Espanha, a Si M Alguns o traduzem no passivo, “para que não se faça m udança algum a” . 28 Alguns traduzem: "espatifará em pedaços", porém o sentido é o mesmo. 25 Ou. após aqueles chifres. 30 O rei, ou o próprio chifre, será diferente. ” O que se denota pelo chifre. 72 37* EX P O SIÇ Ã O [7.23, 24] cília, parte da G récia e o Ilírico foram adicionados, e m ais tarde toda a G récia e a M acedônia, a Á sia Menor, a Á frica e todas as ilhas; pois com um a só palavra expulsaram o rei de Chipre e ven deram seus bens em leilão público. Quando a ralé do povo foi dom inada, Cláudio prom ulgou um a lei para o banim ento do rei de Chipre, e isso ele conseguiu com sua voz singular, sem o uso da m enor força. Não surpreende, pois, que Deus preanunciasse quão diferente esse reino seria de todos os demais\ ele não tinha um a cabeça única; o senado mantinha a autoridade principal, ainda que todo o poder estivesse centrado no povo. Portanto, havia uma espécie de fusão com binada, visto que o governo de Roma ja mais foi estabelecido. E se pesarmos prudentem ente todas as coi sas, ele não era nem um a república nem um reino, m as um com posto confuso, no qual o povo exercia grande poder de form a tumultuosa, e o senado oprim ia o povo o máximo que podia. Havia três categorias: a senatorial, a eqíiitadoriana e a plebéia, e tal m is tura transform ou o reino num monstro. O anjo, pois, anuncia que o quarto reino seria diferente dos outros. Em seguida ele confirm a o que dissera antes; diz ele: d e v o ra rá to d a a te rr a , a p is a rá e a f a r á em pedaços. Isso se cumpriu depois que a G ália e a B retanha foram dom inadas, a Alem anha parcialm ente subjugada e o Ilírico, G récia e M acedônia reduzi dos a sujeição. Por fim penetraram a Ásia, e Antfoco foi banido para além do Tauro; seu reino m ais tarde tornou-se presa deles, e então obtiveram a posse da Síria. Os reis do Egito foram seus aliados, e no entanto tornaram -se dependentes de seus caprichos; o soberano não ousava designar um herdeiro sem consultar antes seu beneplácito. Portanto, visto que passaram a governar supre m am ente por tanto tem po e tão am plamente, cum priram esta pro fecia, devorando toda a terra. Pois um a voracidade tal por dom í nio jam ais existira antes; guerras cum ulavam -se sobre guerras, e aum entavam sua avidez por sangue alheio e de form a alguma poupavam o seu próprio. O sorvedouro era insaciável, enquanto 73 17.23, 24] D AN IEL absorvia o m undo inteiro e sua soberba o esm agava e o pisava sob a planta de seus pés. Crueldade acrescentava-se à soberba, pois todos olhavam para os rom anos e conciliavam o favor de Rom a por m eio de bajulação, com o propósito de assolar selvagem ente a seu próprio povo. A través dessas artes quase toda a G récia pereceu. Porque sabiam com o tantas pessoas inocentes por toda parte pereciam em cada cidade, um a espécie de diversão que os deleitava; eram plenam ente cônscios quão facilm ente era atrair para si todo o poder do m undo inteiro, quando este não tinha com o apresentar nem força nem habilidade e nem poder contra eles. Porquanto seus nobres estavam constantem ente em discordância; a suprem acia ora estava com um a facção, ora com outra, e assim o esplendor de cada cidade fácil e gradualm ente dim inuía. E assim toda a G récia foi espoliada e os rom anos exer ceram seu dom ínio ali sem qualquer dificuldade, com o se faz com as feras brutas. O m esm o podem os dizer tam bém da Asia. Não nos surpreende, pois, que o anjo tenha dito: esse quarto ani m al pisaria sob seus p és toda a terra. Em seguida ele diz: O s dez chifres são dez reis q u e s u rg i rã o . Esses dez reis são claram ente com preendidos sob um só im pério, e não há dúvida de que aqui são pessoas distintas. No reino persa observam os muitos reis, e todavia a im agem do se gundo animal era singular, enquanto abarcava todos aqueles reis até que ocorresse a mudança. Assim tam bém agora, ao tratar dos rom anos, o profeta não diz que os dez reis procederiam entre si em ordem regular, mas, antes, a natureza m ultiform e do reino, sob m ais de um a cabeça. Porque o ofício régio pertencia aos se nadores ou cidadãos proem inentes, cuja autoridade prevaleceu m uito extensam ente tanto em relação ao senado quanto em rela ção ao povo. E com referência ao núm ero, dissem os que o núm e ro plural era apenas denotado, sem qualquer lim itação ao número dez. A conclusão é esta: esse reino seria sem elhante a um animal singular e terrível portando m uitos chifres, um a vez que nenhum 74 37a EX PO SIÇ Ã O 17.23, 24] único rei manteve ali seu domínio máximo, com o era costum eiro pelo uso com um em outras terras, mas seria um a mescla, sendo m uitos reis em vez de um a m anter a preem inência. O cum pri m ento disso é suficientem ente notório à luz da história de Roma; com o se houvera dito: não haveria um único rei em Roma, como na Pérsia e em outras nações, mas muitos reis ao m esm o tempo, aludindo à mescla e confusão em que a autoridade suprem a se achava envolta. Segue o Pequeno Chifre: S u rg irá u m rei, diz eie, d iferen te d e todos os a n te rio re s, e aflig irá trê s reis. Já demonstramos quão ininteligível isso se tornaria, a m enos que o atribuam os aos Césares para quem passou a monarquia. Porque depois de longas e contínuas intrigas domésticas, todo o poder passou para o Tri unvirato. Teve ingresso um a conspiração m ovida por Lépido, M arco Antônio e Otávio. Otávio, então, não passava de um garo to, quase não atingindo a maturidade, porém todos os soldados veteranos eram a seu favor em conseqüência do nom e de Júlio C ésar e sua adoção por ele. D aí ser ele recebido pelos outros dois naquela aliança, da qual Lépido era o prim eiro e Antônio, o se gundo. Por fim, suscitaram -se discordâncias entre eles, e Lépido foi privado de sua posição no triunvirato e passou a viver como um semi-morto, enquanto sua vida só lhe foi poupada porque foi elevado ao ofício de sumo sacerdote. A reverência pelo sacerdócio restringiu Antônio de efetuar sua morte, enquanto o mesmo se contentou em viver sozinho em retiro. Otávio, por fim, veio a ser supremo, porém por m eio de que artifício? Dissemos que Júlio César assumiu para si não mais que o ofício de ditador, enquanto os cônsules erram eleitos anu almente segundo o costume. Ele não levou o poder da ditadura além da moderação, porém se restringiu tanto que alguns direitos populares poderiam parecer ainda vicejar. Otávio também imi tou a astúcia de seu tio e adotado pelo pai. A m esm a conduta se verá nos dem ais Césares, ainda que houvesse muitas diferenças 75 17.25] D A N IE L entre eles. Visto que ainda perm anecia certa som bra de um a re pública, enquanto o senado m antinha algum a m edida de reverên cia, não surpreende que o anjo tenha predito que o animal sobre viveria, quando se erguesse outro chifre pequeno diferente dos outros. E acrescenta: e aflig irá os trê s reis. Já expliquei este ponto pela leve m udança que os Césares efetuaram nas províncias, pois se qualquer das províncias encetasse um a guerra, fortes exércitos e soldados veteranos geralm ente eram enviados para lá. Os C ésa res os levavam consigo, enquanto alguns dirigentes executivos eram deixados com o senado com respeito às outras províncias. Por últim o, com essa form a de expressão, o anjo retrata o dom í nio vindouro do pequeno chifre e a dim inuição d a força dos pri meiros. Todavia, o animal ficaria aparentem ente inteiro; assim , a insígnia da república era preservada, com o o povo era sempre denom inado: no fórum, pelo título pomposo, rom anos; e na bata lha, com o colegas militares. Entrementes, ainda que o nom e do im pério rom ano fosse assim celebrado, e sua m ajestade estivesse nos lábios de cada um, a autoridade suprem a estava de posse de um pequeno chifre que perm anecia oculto, e não ousava erguer sua cabeça publicam ente. Esse, pois, é o fio da interpretação do que o anjo aqui põe diante de nós. Sigam os em frente: 2 5 E e le p ro ferirá grandes palavras contra o A ltíssim o, e d esfibrará o s santos d o A ltíssim o, e p ensará em m udar tem pos e leis; e serão e ntregues em suas m ãos, por u m tem po e tem pos, e a divisão d e um tem po. 25 E t serm ones ad regionem , vel a d tatus, excelsi loquetur, e t sanctos excelsorum conteret, e t putabit ad m u tan d u m 53 têm pora e t legem : e t trad etu r in m anum ejus u sque ad tem pus, e t e m p o ra , e t d ivisionem tem poris. O anjo então explica um pouco m ais claram ente sobre o que o profeta anteriorm ente tocara, porém de form a breve, a saber: este últim o rei seria um inimigo m anifesto e professo da Igreja. N a preleção anterior m ostram os quão miserável e cruelm ente a O u seja. p en sará co n sig o m esm o em m udar. 76 3 7 * EX P O SIÇ Ã O [7.25] Igreja tinha sido destroçada por muitos tiranos. E se com parar m os esses tiranos uns com os outros, verem os que a Igreja foi muito m ais seriam ente afligida depois do advento de Cristo, bem com o teve que enfrentar a oposição dos Césares em guerra fran ca. Foi assim que surgiu a ocasião. A doutrina do evangelho foi dissem inada através de quase todas as províncias do im pério. O nom e ju d eu era em extremo odioso; e a novidade da doutrina aum entou grandem ente essa im popularidade. H om ens, através dos judeus, haviam inventado p ara si um a nova divindade - Cris to assim , segundo a linguagem deles, parecia im plicar a adora ção de um a nova divindade. Portanto, visto que se lhes era ofere cido algum material para o fogo contra o culto puro de Deus, os Césares se tornaram m ais e mais estim ulados a declarar guerra contra os eleitos e a oprim ir a Igreja. Não era culpa deles se não conseguiram extinguir toda a luz da doutrina celestial, abolir a verdadeira religião e banir do m undo o conhecim ento de Deus. Isso concorda m uito bem com o que D aniel relata desse rei tornando-se tão voluntarioso, proferindo palavras contra o D eus Altíssim o. Alguns o traduzem: da parte do A ltíssim o; eu, porém, não conheço razão algum a para se agir assim. I S 1?, letzed, signi fica ao lado ou região. U m a frase equivalente seria: tão grande será a soberba desse novo rei, que não exercerá seu poder pu blicam ente, m as por m eio de fraude velada, a tal ponto que é com o se sentasse ao lado de Deus para fazer-lhe oposição. Signi fica, pois, que ele seria m anifestam ente inimigo de Deus. O s que entendem isso com o um a referência ao A nticristo crêem que sua opinião é confirm ada pela conduta dos outros tiranos que leva ram a bom term o sua guerra contra Deus, com exércitos e violên cia, porém não com palavras. O profeta, porém , não fala com tanta sutileza aqui. Pois pelo term o palavras ele aqui não quer dizer doutrina, m as aquela vanglória verbal pela qual os Césares ousavam prom ulgar seus éditos pelo m undo todo, instigando os procônsules a punir os cristãos e a não perm itir que as seitas ím 77 [7.25J D A N IE L pias e malditas se expandissem . E assim os terrores percorreram todo o orbe. Cum priu-se então o que Daniel agora relata, ou, seja: a verbalização de palavras de provocação contra Deus; pois aqueles tiranos acreditavam que seus próprios éditos, sem q u al quer m aterial bélico, seriam suficientes para extinguir a m em ória de Cristo. Assim também a verdadeira piedade foi desditosamente denegrida e o próprio Cristo lacerado por horríveis opróbrios, com o os historiadores nos têm am plamente informado. Portanto, esta explicação se adequa m elhor ao pequeno ch i fr e que profere ou pronuncia palavras contra o Altíssim o. E le aflig irá, diz o anjo, os san to s d a s a ltu ra s . Já explicam os sucin tam ente o significado desta expressão, de acordo com sua cons trução gramatical. Por santos ele indubitavelm ente quer dizer os filhos de Deus, ou seu povo eleito, ou a Igreja. Ele os denom ina de “os santos das alturas” , porque, com o eleitos, dependem do céu: e ainda que sejam peregrinos no mundo, sua vida, contudo, está no céu, onde a eterna herança os aguarda, a qual foi obtida por Cristo. Portanto, visto que seu tesouro está agora no céu, m erecidam ente se gloriam de ser cidadãos do céu, aliados e ir m ãos dos anjos. E assim são apropriadam ente cham ados “santos das alturas” ; são separados do mundo e sabem que vivem aqui cotidianam ente até chegarem àquele firm e e perene repouso. Sa bem os que isso se tem cum prido, porque terror esm agador caiu sobre todos os santos e a Igreja quase pereceu, enquanto as m ul tidões suspeitas de serem cristãs foram sujeitadas a torturas cru éis. A prevalecência dessa licença para se perseguirem todos os santos explica com o os m esm os foram então afligidos pelo pe queno chifre. Em seguida, o profeta ou, melhor, o anjo diz: E le p e n sa rá , ou ponderará, em m u d a r te m p o e lei, e eles se rã o e n tre g u es em su a m ão. Q uanto ao tem po aqui indicado, m uitos o atribuem a dias santos. Nós, porém, podem os discerni-lo geralm ente com o um a indicação do pequeno chifre esm agando tudo o que costu78 3 7 * EX P O SIÇ Ã O [7.25] m eiram ente estava no mundo; e assim tam bém interpreto a pala vra m , reth, não da lei de Deus ou do evangelho, m as de quais quer ritos, costum es e instituições. Enquanto os intérpretes con tinuam discutindo acerca desta palavra, alguns a atribuindo ao D ecálogo e outros à pregação do evangelho, creio que a intenção sim ples do profeta era: os Césares perverteram todas as leis, tan to humanas quanto divinas. Já vimos o quanto tentaram fazer isso e quão longe conseguiram ir. N ão surpreende, pois, se o pro feta atribua essa extrem a audácia a este últim o rei, que pensou em m udar tudo quanto anteriorm ente fo r a ordenado no mundo. E por essa razão se disse anteriorm ente que este chifre seria m u nido com olhos humanos; e em seguida ele proferiria grandezas, trovejando horrivelm ente e inspirando em todos os hom ens o m edo do m ero ecoar de sua voz. Sabem os ter sido isso represen tado com o num espelho, se considerarm os a que ponto chegaram os Césares em sua arrogância. Prim eiro, quanto a O távio, en quanto se restringia politicam ente dentro dos devidos lim ites, ele impôs que fosse adorado com o um deus e altares lhe fossem eri gidos; queria que o vulgo fosse persuadido de sua divindade, e celebrou um banquete no qual sentou-se entre as divindades su periores. Tibério negligenciou inteiram ente as cerim ônias religi osas, e todavia sabem os com o ele chegou a desprezar todos os homens. A inda que fosse de um a disposição obtusa, em sua ou sadia ele era extrem ado, e passava todo seu tem po m aquinando em com o enganar o senado. Em seguida, no tocante a Calígula, ele am eaçou Júpiter desta maneira: “E então! tu és aqui um exila do e eu, um nativo da terra; eu te banirei para a G récia, tua terra nativa.” Ele am iúde aplicava golpes na estátua de Júpiter, e não se contentando com o nom e de um deus ordenou que os sacrifíci os m ais im portantes lhe fossem oferecidos. Tal fúria diabólica cresceu ainda m ais em Domiciano. E considerando os Césares com o homens, o que dizer de seu caráter? Um deles disse: “Q ue ro que o povo rom ano tenha apenas um pescoço.” Ele divertiu-se 79 [7.25] D A N IE L com a chacina do senado com o um esporte e desejava fazer de seu cavalo um cônsul. Q uão miserável era tal conduta! Vemos, pois, com o esta predição não foi totalm ente sem causa; ou, seja, tão grande seria a arrogância do pequeno chifre, que o m esm o ousaria m udar e reverter em novo caos toda a ‘lei’, significando toda ordem de todo gênero; e os ‘tem pos’, significando a própria sucessão e natureza de todas as coisas. O profeta, pois, diz que ele pensou. Não expressa o resultado, m as sim plesm ente signifi ca a chegada do pequeno chifre a um grau tal de dem ência ao ponto de supor que poderia trazer do céu o sol, converter a luz em trevas e nada deixar inteiro, nada em ordem no m undo inteiro. Es sas conseqüências realmente ocorreram de acordo com esta profe cia. Não posso entrar em m uitos detalhes aqui. Eu teria que deter o leitor por muitos dias ou mesmo meses com citação da história; e posso apenas tocar de leve no que é necessário com o fim de expli car as palavras do profeta e o significado de sua predição. S erão e n tre g u es em su as m ãos significa: por m ais que o pequeno chifre am ontoe desespero a sua fúria, todavia D eus sem pre governará sobre ele e nada acontecerá sem sua perm issão. E ra Deus, pois, quem entregava nas mãos do rei os santos, o go verno político e as instituições de m isericórdia, perm itindo-lhe derram ar indiscrim inadam ente o sangue humano, violar todo e qualquer direito nacional e arruinar quanto possível toda a reli gião. Traz-nos não pequeno conforto saber que a perm issão divi na é concedida aos tiranos para assenhorearem -se da Igreja e in terferirem em seu culto legítimo; pois se fôssem os deixados à m ercê de seus desejos tresloucados, quão angustiante seria a con fusão universal! Ele, porém, nos socorre, com o diz o anjo, quan do os tiranos se apoderam de nós e perturbam toda a ordem com sua horrível licenciosidade e cruel furor contra o m iserável e o inocente; ele nos socorre, repito, de m odo que são incapazes de m over sequer um dedo contra nós sem que D eus o perm ita. Não nos é perm itido saber por que D eus afrouxa as rédeas dos inim i 80 37* EX P O SIÇ Ã O {7.25] gos de sua Igreja; quem sabe seja para provar e testar a paciência de seu povo! É-nos suficiente que os planos e tram as dos tiranos, em todas suas form as, são incapazes de fazer algo sem a divina permissão. M as um a consolação ainda m aior é acrescida à últim a senten ça: a in d a p o r u m tem p o e tem p o s e a d iv isão [ou m etad e] de u m tem po, com o alguns a traduzem ; é propriam ente um a divi são. Os intérpretes diferem am plam ente sobre estas palavras, e eu não trarei a lume todas suas opiniões, do contrário seria neces sário refutá-las. Eu não teria pouco trabalho em refutar todos seus pontos de vista, porém seguirei meu próprio costum e de expres sar sucintam ente o genuíno sentido do profeta, e assim toda difi culdade será rem ovida. O s que consideram um 'tem p o ' no senti do de um ‘ano’ em m inha opinião estão equivocados. Citam os quarenta e dois meses de Apocalipse [13.5], o que perfaz três anos e meio; m as tal argum ento não é conclusivo, visto que nesse caso um ano não consistiria em 365 dias, m as o ano propriam en te dito seria tom ado figuradam ente por qualquer tem po indeter minado. Por isso é m elhor limitar-se às palavras do profeta. Um ‘tem po’, pois, não equivale a certo núm ero de m eses ou dias, nem ainda a um único ano, m as a qualquer período cuja determ i nação só está no secreto conselho de Deus. Eles, pois, serão en tregues em suas m ãos p o r um tempo, diz ele, e em seguida acres centa tem pos; ou, seja, por um a seqüência de tempos; e, outra vez, ainda até uma seção ou divisão de um tempo; significando: essas calam idades chegariam a um fim quando Deus, em sua m isericórdia por sua Igreja, restringisse aqueles tiranos por meio de sua ira contra eles. Portanto, enquanto a crueldade dos C ésa res oprim ia a Igreja de Deus, ela estava entregue nas mãos deles. Já vimos com o muitos Césares eram inimigos da verdadeira Igreja. Sobretudo N ero que agiu de form a crudelíssim a, porquanto quei mou alguns milhares de cristãos em R om a com o fim de extin guir a infâm ia que lançaram contra ele. O povo não conseguia 81 [7.25] D AN IEL tolerar seu barbarism o: pois enquanto a quarta parte da cidade era destruída pelo fogo, ele estava a divertir-se em suas luxurias e a regozijar-se ante a visão de tão lastimável espetáculo! Visto que tem ia o tum ulto popular contra si, ele lançou m ão de muitos cristãos e os ofereceu ao povo com o um a espécie de expiação. Os que o sudeceram não cessaram de derram ar sangue inocente, e os que pareciam estar im buídos de algum grau de clem ência e hum anidade eram todos, por fim , apossados de um a fúria diabó lica. Trajano, que foi considerado um príncipe m uitíssim o exce lente, contudo sabemos com o ele ordenava que os cristãos por toda parte fossem mortos, já que acreditava serem eles obstina dos em seu erro. E outros eram ainda m ais selvagens. N ão adm i ra, pois, que o anjo tenha predito: ainda p o r um tempo e tempos, e a divisão de um tempo, que se daria licença aos tiranos e inim i gos da Igreja de perverterem todas as coisas, de desprezarem a D eus e renunciarem toda a justiça e executarem uma chacina cruel e bárbara. Isso deve ser predito para duas ocasiões: prim eiro, para que, através de um tem po muito longo, os fiéis não apostatassem, porque quando ‘o tem po' - um espaço de cerca de dez anos - tiver escoado, chegariam o j tempos, consistindo de cerca de cinqüenta ou cem anos. Essa, pois, foi um a razão por que Deus adm oestou os fiéis acerca do tempo e tempos. Mas também ele queria m itigar seu sofrim ento adicionando metade de um tempo, assim prom etendo algum a m oderação e fim de tão grandes calam idades. A lingua gem de nosso Senhor a seus apóstolos concernente a várias co m oções da terra corresponde m uito bem a este ponto de vista. “H averá guerras e rumores de guerras, m as ainda não será o fim” , diz ele. Ele as anuncia com o prelúdio de males ainda maiores, quando toda a Judéia seria devastada com guerras e outras m a tanças. Em seguida ele acrescenta: “A menos que aqueles dias sejam abreviados” [Mt 24.6; Mc 13.7; Lc 21.9]. Essa abreviação dos dias é aqui observada com o se o Senhor encurtasse um a con 82 3 7 a EX P O SIÇ Ã O E7-25] tínua sucessão deles. Pois quando a posse da tirania parecesse feroz, então de súbito e além de toda e qualquer expectativa, Deus por fim arrebataria sua Igreja, e então a doutrina evangélica em er giu e foi celebrada por toda parte. Deus, pois, então abreviou os dias em prol de seus próprios eleitos, e isso é entendido pela últi m a sentença, um a divisão de tempo. Adiarei o restante para a próxim a preleção. ORAÇÃO Deus Onipotente, visto como devemos se r diariamente treinados por várias provações, que ja m a is nos entreguemos à s enfermidades da carne e jam ais nos esqueçamos de tua santa vocação. Anima-nos, te imploramos, para os empreendimentos hostis; que continuemos ina baláveis contra todos os assaltos de Satanás e dos ímpios: e assim renunciemos a nós mesmos e nos devotemos a ti. Que jam ais hesite mos em enfrentar a própria morte, se necessário for. e até mesmo oferecer-nos diariamente a vários tipos de morte, até que tenhamos terminado nossa guerra e possam os desfrutar aquele fe liz e eterno descanso que nos preparaste em teu santo Filho unigénito. Amém. 83 g 38a .xposição 26 E t ju d ic iu m sedebit, e t p otestatem ejus 2 6 M as o ju íz o será estabelecido, e eles tirarão seu dom ínio, para o co n su m ir e o d c sln iir até o fim . au feren t ad d issip an d u m e t p erd en d u m .’ u sque in finem . E ntão o anjo responde a Daniel acerca da m orte do quarto anim al. Pois dissem os que, quando os Césares transferiram o im pério para si, a força do senado e do povo ficou debilitada; visto, porém, que o nome ainda perm anecia, não se diz que o quarto animal fora morto até que estrangeiros desditosam ente se tom aram senhores de Roma. Pois se os romanos houvessem sido conquistados centenas de vezes pelos inim igos confessos, não teriam sofrido um a desgraça tão profunda com o quando homens obscuros e de origem vulgar exerceram um a cruel e bárbara tira nia; porque então nem o senado nem o povo já não desfrutavam qualquer autoridade. O anjo assim m arca corretam ente o tempo no qual o quarto animal devia cair, quando os espanhóis, os afri canos e outros bárbaros, que foram sempre desconhecidos inclu sive em seu próprio país, se ergueram às m ais elevadas posições, m uito além da expectativa da humanidade. Pois sua luxúria opri miu todo o estado; decapitaram os senadores m ais nobres e de signaram em seu lugar os homens m ais miseráveis, em sinal de seu espírito de ignom ínia e repúdio. E n tã o o q u a rto a n im al foi m o rto ; e esta é a explicação desta porção da resposta do anjo. Ele tam bém diz: o ju íz o s e rá estabelecido; ou, seja, D eus no" O u seja. para dissipar e apagar. 84 3 8 * EX P O SIÇ Ã O (7.26] vãm ente restaurará à ordem toda esta confusão, e o m undo senti rá sua Providência adm inistrando a terra e a raça humana. Pois quando se perm ite que todas as coisas se processem im punem en te, e nem a ju stiça nem a honestidade são tidas em qualquer con sideração, supõe-se, pois, que Deus estaria desfrutando de sua vida tranqüila no céu e já teria se esquecido d a raça humana. Daí, em oposição a isso, somos informados que ele subiu ao tribunal, e isso com tal freqüência que real e experim entalm ente sentimos seu cuidado sobre nós. Assim a restauração é aqui denom inada com o um assentar-se em juízo, quando o im pério rom ano foi apa gado e Deus executou a penalidade de tão grande e tão desabrida ferocidade com o a já registrada. Com o esta frase é m uito com um e de freqüente uso na Escritura, não continuarei a explanação. O ju ízo , pois, será estabelecido', ou, seja, depois que todas as coisas ficaram por longo tem po envoltas em trevas, nova luz ir rom perá e os hom ens prontam ente reconhecerão a soberania do Onipotente. E o p o d er, diz ele, s e rá tira d o do an im al, p a r a o d is s ip a r e o d e s tru ir a té o fim . Aqui o anjo anuncia a subversão final do quarto animal. A cerca do plural do verbo, já m enciona m os a opinião de alguns que o atribuem a m ais de um anjo; mas é preferível entendê-lo de um a form a mais sim ples, com o um a form a absoluta e indefinida de expressão. E contudo não faço objeção, com o afirmei antes, ao ponto de vista dos que o tomam em referência a anjos, porém tem o ser isso dem asiadam ente refi nado; prefiro o ponto de vista m ais sim ples com o sendo isento de toda controvérsia. O sentido, pois, é este: Quando o animal tiver agido cruelmente por certo tempo, e especialmente o pequeno chi fre, Deus cum prirá o ofício de juiz, e o animal, com esse pequeno chifre, será removido do caminho. Em seguida o anjo acrescenta: Não haverá esperança de qualquer nova vida semelhante àquela de muitos reinos que amiúde caem num período e se erguem nova mente noutro; ele, porém, aqui anuncia a matança final, com o se quisesse dizer: a ferida é incurável e mortal. Vamos em frente: 85 [7.27] D A N IE L 27 E o rein o e o dom ínio e a g randeza d o reino s o b todo o céu serão d ados ao povo dos san tos d o A ltíssim o, cujo rein o é u m re in o e te m o , e to d o s os d om ínios o servirão e lhe obedecerão. 27 E t regnum . e t p otstas, e t m agnitudo regni sub toto ccelo d a b itu r p o p u lo sanctorum excelsorum . R egnum ejus regnum seculi, hoc esl, perpetuum, e t osnnes p o testates e i servient, atq u e obedient. Este versículo nos assegura com o essas predições concernen tes à destruição do animal consideram a segurança da Igreja. A s sim os fiéis podem saber que são notados por Deus e com o as m udanças que ocorrem sucessivam ente tendem para o mesmo fim - o reconhecim ento por parte dos santos de sua continuação sob o cuidado e proteção de Deus. Pois qualquer discussão acer c a das quatro m onarquias teria sido fria e inútil, a m enos que fosse acrescentado o cuidado peculiar de D eus por sua própria Igreja e sua condução das atividades do m undo para a segurança de seu povo. Com o já dissem os em outros lugares, o povo eleito de D eus é de m aior im portância do que todos os reinos que estão em atividade no m undo [Is 43.3]. Esse, pois, é o sentido das pala vras. Se separarm os este versículo de seu contexto, a profecia ainda terá sua aplicação. Podem os extrair dela com o todas as coisas parecem estáveis no m undo e no entanto são perecíveis, e nada é tão firm e que não esteja sujeito a constante variação a cada instante. M as a principal intenção de sua predição é, com o eu já disse, m ostrar a relação de todos os eventos com a seguran ça dos santos. Q uando, pois, todas as coisas parecem arrebatadas pelo cego im pulso do acaso, devem os sempre contem plar a Deus com o o vigia de sua Igreja e tem perar todas as torm entas e todas as com oções para o serviço e segurança dos santos que repousam em sua Providência. Essas duas coisas, pois, estão em m útua con cordância, a saber: a m o rte d o q u a rto a n im al e a e n tre g a do rein o e a u to rid a d e ao povo dos santos. Isso parece não haver sido ainda concretizado; e daí m uitos, sim , quase todos, exceto os judeus, têm tratado esta profecia com o um a referência ao dia final da vinda de Cristo. Todos os intérpretes cristãos concordam neste ponto; mas, com o já mostrei anteriorm ente, pervertem a 86 38* EX P O SIÇ Ã O [7.27] intenção do profeta. Q uanto aos judeus, sua explicação não é ne nhum a explicação, pois são não só tolos e estúpidos, mas inclusi ve loucos.34 E visto que seu objetivo é a adulteração da sã doutri na, D eus tam bém os cega até que se vejam totalm ente em trevas, frívolos e pueris; e se eu fosse deter-m e a fim de refutar sua rude za, com certeza jam ais terminaria. Esta profecia não parece ter-se concretizada na destruição do animal; mas isso é facilmente explicável. Sabem os com que m ag nificência o profeta fala do reino de Cristo, e adora sua dignidade e glória com esplêndidos louvores; e em bora estes não sejam exagerados, todavia, se julgados pelas percepções humanas, o leitor com certeza concluiria que são excessivam ente extrava gantes, e não descobriria nem solidez nem firm eza em suas pala vras. E não surpreende: pois o reino de Cristo e sua dignidade não podem ser percebidos pelos olhos carnais, nem ainda com preendidos pelo intelecto humano. Os que parecem os mais saga zes dos homens, que reunam toda sua clarividência, pois nem assim poderão jam ais subir à excelsitude do reino de Cristo, o qual vai além dos próprios céus. N ada é m ais contrário a nosso ju ízo natural do que buscar vida na morte, riquezas na pobreza e carência, glória no opróbrio e desgraça - ser peregrino neste m undo e ao m esm o tem po ser seu herdeiro! N ossas m entes não podem naturalm ente com preender essas coisas. N ão surpreende, pois, se os m ortais julgam erroneam ente o reino de Cristo, e são cegos no m eio da luz. A inda não há falha nas expressões do pro feta, pois elas nos descrevem a imagem visível do reino de Cristo e se acom odam a nossa obtusidade. Elas nos capacitam a perce ber a analogia entre coisas terrenas e visíveis e aquela bem -aventurança espiritual que Cristo nos tem oferecido, e as quais agora possuím os através da esperança nele. Pois enquanto apenas es peram os, nossa felicidade está oculta de nós, e não é perceptível por nossos olhos nem por nenhum de nossos sentidos. MA expressão de Calvino aqui c proverbial; o francês traduz: ils n 'en approchent ne près ne loin ; o latim: neque coelum neque terram auingunl. 87 [7.27) D A N IE L Voltemos agora à passagem. D aniel, antes de tudo, diz: U m rein o , e poder, e um extenso d o m ínio se rã o en tre g u es ao povo dos santos. Isso parcialm ente cum priu-se quando o evangelho em ergiu da perseguição; então o nom e de Cristo foi p o r toda par te celebrado e m antido em honra e estim a, em bora previam ente estivera sujeito à m ais intensa inveja e ódio. Pois nada tem sido mais odiado e detestado ao longo de tem pos infindáveis do que o nom e de Cristo. Deus, portanto, então deu o reino a seu povo, ao ser ele reconhecido com o o R edentor do m undo através de suas muitas mudanças, depois de ter sido previam ente desprezado e totalm ente rejeitado. E posso aqui observar ainda, e im prim ir na m em ória o que já mencionei com freqüência, ou, seja: o hábito dos profetas, ao tratarem do reino de Cristo, era estenderem eles seu significado para além de seus prim órdios; e fazem isso en quanto insistem em seu começo. A ssim D aniel, ou o anjo, não prediz aqui ocorrências conectadas com o advento de Cristo como Juiz do mundo, m as com a prim eira pregação e prom ulgação do evangelho e a celebração do nom e de Cristo. M as isso não o im pede de delinear um m agnificente quadro do reinado de Cristo e envolver sua com pletação final. É suficiente perceberm os com o D eus com eça a dar o reino a seu povo eleito, quando, pelo poder de seu Espírito, a doutrina do santo evangelho foi recebida em todas as partes do mundo. A súbita m udança que ele ocasionou foi incrível, porém esse é um resultado costum eiro; pois quando algo é predito, pensam os que o mesmo não passa de fábula e de sonho, e quando Deus realiza o que jam ais teríam os imaginado, o evento parece-nos trivial e o tratam os com o algo sem valor. Por exem plo, quando a pregação do evangelho teve início, ninguém teria im aginado que seu sucesso poderia chegar a ser tão grande e tão próspero; aliás, duzentos anos depois que C risto manifestouse, quando a religião estava quase apagada e os judeus eram exe crados pelo m undo inteiro, quem teria im aginado que a Lei sairia de Sião? Todavia D eus erigiu ali seu cetro. A dignidade do reino 88 3 8 ' EX PO SIÇ Ã O [7.27] havia desvanecido, a fam ília de Davi estava extinta. Pois a fam í lia de Jessé era apenas um tronco, segundo o sím ile usado pelo profeta Isaías [11.1]. Se alguém houvera perguntado a todos os judeus, um após outro, nenhum deles teria crido na possibilidade daqueles eventos que acom panharam a pregação do evangelho; mas por fim a dignidade e a virtude do reino de Davi resplande ceram em Cristo. Todavia, ela desvanece diante de nossos olhos e buscam os novos milagres, com o se D eus não houvera suficien tem ente provado ter ele falado por boca de seus profetas! Assim observam os com o o profeta se m antém dentro dos lim ites quan do diz: Um reino, e poder, e a m agnitude do império passaram para o povo dos santos. E acrescenta: u m im p ério d eb aix o d e to d o s os céus. Aqui o rabino A barbinel, que acredita ser superior a todos os dem ais, rejeita nossa idéia do reinado espiritual de C risto com o sendo um a tola imaginação. Pois o reino de Deus, diz ele, está estabele cido debaixo de todos os céus e é dado ao povo dos santos. Se está estabelecido debaixo do céu, diz ele, então ele é terreno; e se é terreno, então não é espiritual. Esse de fato parece ser um argu mento m uito sutil, com o se Deus não pudesse reinar no mundo exceto com o um ordinário mortal. Enquanto a Escritura diz “Deus reina” , segundo este argum ento D eus deve ser transfigurado na natureza hum ana, do contrário não existiria o reino de Deus a não ser que o mesmo seja terreno; e se é terreno, é temporal, e portanto perecível. D aí inferirmos que D eus m uda sua natureza. Seu reino, pois, consistirá em opulência, o poder e a ostentação m ilitares, bem com o as concupiscências com uns d a vida - de modo que D eus se tornará distinto de si m esm o. Percebem os a pueril trivialidade daqueles rabinos que pretendem gloriar-se em sua engenhosidade que visa à total destruição de todo o ensino da piedade. N ada mais intentam além de adulterar a pureza da Es critura com seus com entários pútridos e sem sentido. Nós, po rém, sabemos que o reino de Deus e de Cristo, ainda que existin 89 17.27] D A N IE L do no mundo, todavia não lhe pertence [Jo 19.36]; o significado das duas expressões é exatam ente o oposto. Deus, portanto, ain da exerce seu reinado celestial no mundo, visto que ele habita os corações de seu povo por meio de seu Espírito. Enquanto Deus m antinha sua sede em Jerusalém , seu reino era m eram ente um reino terreno e corruptível? D e modo nenhum, pois pela posses são de um a habitação terrena ele não cessou de estar tam bém no céu. A ssim o anjo instruiu o profeta concernente aos santos que são peregrinos no mundo, e todavia desfrutarão do reino e possu em o m ais estupendo poder debaixo do céu. D aí tam bém correta mente concluirm os que esta visão não deve ser explicada pelo prism a da vinda final de Cristo, mas do estado im ediato da Igre ja. O s santos com eçaram a reinar debaixo do céu quando Cristo os introduziu em seu reino pela prom ulgação do evangelho. A inda outro ponto precisa ser observado: o que pertence à cabeça é transferido para o corpo. N ão há nada novo nisso, visto que o suprem o poder é constantem ente prom etido pelos profetas à Igreja, especialm ente por Isaías que am iúde prediz sua com ple ta supremacia. Os papistas se apoderam de tais testem unhos para vestir-se dos espólios de Deus, com o se este lhes houvera cedido tal direito! M as se acham im ersos no m esm o erro dos judeus, que se inflam com soberba sem pre que tal dignidade é prom etida ao povo eleito, com o se pudessem perm anecer separados de D eus e ainda assim obter o direito de pisar o m undo inteiro sob a planta de seus pés. Os papistas tam bém fazem exatam ente o mesmo. Nós, contudo, devem os ser guiados por um a regra muitíssim o diferente, a saber: em decorrência da íntim a união entre C risto e sua Igreja, o atributo peculiar do próprio Cristo é am iúde transfe rido para seu corpo. N ão que a Igreja reine por si própria; Cristo, porém , com o sua única e suprem a cabeça, obtém dom ínio nesse particular, e não para sua própria vantagem pessoal - pois que necessidade tem ele desse dom ínio, senão para a com um segu rança de todos seus membros? Por essa razão Cristo é nosso Rei, 90 38* EX P O SIÇ Ã O [7.27] e ele se propõe a erigir seu trono em nosso meio; ele nada usa em seu próprio benefício, m as nos com unica todas as coisas e as converte em nosso benefício; daí sermos m erecidam ente cham a dos reis, porquanto ele reina, e, com o eu já disse, a linguagem que lhe é exclusivam ente apropriada é transferida para nós em decorrência da íntim a com unhão existente entre a cabeça e os membros. Esse é tam bém o sentido da frase aqui adicionada pelo profe ta: Todos os p o d eres o se rv irã o e lhe o b ed ecerão . N ão tenho dúvida de que o anjo aqui confirm ou a profecia de Isaías, com o o Espírito Santo, para m elhor confirm ar e fortalecer a fé dos san tos, am iúde concilia um profeta com outro, e assim sua m útua concordância se torna o selo de sua verdade. Lem os em Isaías: O reino e a terra que não te servirem serão destruídos; os reis virão e te adorarão, o povo oferecerá teus dons [60.12]. Lem os tam bém nos Salmos: “Os reis se reunirão em assem bléia para servi rem a D eus” [SI 102.22]. E Isaías trata mui plenam ente do im pé rio da Igreja. O anjo então reitera a m esm a coisa, com o intuito de acrescentar, com o eu já disse, m ais plena confiança e autori dade à profecia de Isaías. Entrem entes, observam os quão com pletam ente todos os profetas concordam , e ao m esm o tem po in terpretamos essas palavras com o uma referência ao reino de Cristo, desde o período em que a pregação do evangelho se tornou extra ordinariam ente patente; pois então o cetro régio de D eus saiu de Jerusalém e se difundiu m ais e m ais am plam ente, enquanto o Senhor estendia sua m ão e sua autoridade sobre todas as regiões do mundo. Visto que todos esses im portantes eventos se destina vam à com um salvação da Igreja, nos é dito: O rein o p e rte n c e rá ao povo santo. Quanto à frase: os santos das alturas, já expli quei por que o profeta aplica essa frase aos fiéis, e por que o anjo tam bém faz o mesm o; ou, seja, porque D eus os separara do m un do, e estavam sem pre olhando para cim a e voltando todas as suas esperanças para o alto. Então, no tocante ao rabino que citei, ele 91 (7.27) D A N IE L torce esta passagem e tenta provar que o profeta não fala de Cris to quando diz que viu a figura do Filho do homem. Isso, porém , é com pletam ente pueril, pois ele assevera que o Filho do homem significa “o povo dos santos” , e assim a frase não teria nenhum a referência a Cristo, mas a toda descendência de Abraão. N ão de vem os deixar-nos dom inar por perplexidade ante tão deprim ente ignorância desses rabinos e em sua estupidez m esm o no tocante aos rudim entos, já que reconhecem a necessidade de um M edia dor, unicam ente por m eio de quem a Igreja pode obter algum favor diante de Deus. Vangloriam-se no que tam bém admitimos: em que os filhos de A braão são os eleitos, e nesse titulo que os qualifica a tornarem -se o povo santo e herdeiro de D eus e um reino de sacerdotes. Esse é um fato, porém em que se fundava seu pacto de adoção senão em Cristo? Daí, separarem eles a Igre ja de seu M ediador é com o criar um corpo m utilado separando sua cabeça de suas articulações. Além disso, à luz do que o p ro feta declarou antes sobre o Filho do homem, seu tem a é evidente m ente m udado neste versículo. L á ele declarou que o poder foi dado ao Filho do homem depois que ele aproxim ou-se do Ancião de dias, e o Filho do homem ou, pelo menos, sua sem elhança apareceu nas nuvens. Em prim eiro lugar devem os observar essa sem elhança, visto ser ela o Filho do homem, com o já explicam os a visão. Seguramente a posteridade de Abraão era realmente [com posta] de homens, mas a visão oferecida ao profeta era apenas um a m ultidão. Com o Cristo não havia se revestido de nossa car ne, isso era apenas um prelúdio de sua futura m anifestação na carne. Aqui ele fala francam ente e sem figura algum a de o povo dos santos, e esta profecia depende da primeira. Pois a menos que C risto estivesse sentado à destra do Pai e houvesse adquirido dom ínio, fazendo com que todos os joelhos se dobrassem diante dele, a Igreja jam ais poderia exercer seu poder. Assim observa m os com o todas as coisas mutuamente concordam entre si. Entretanto, visto ser um fato que m uitos perversam ente se 92 38* EX P O SIÇ Ã O [7.27] têm rebelado contra Deus e a proclam ação do evangelho, pode parecer absurdo que o anjo declare todos os poderes do m undo com o sendo obedientes e submissos. M as vale a pena estudar os métodos costumeiros de expressão bíblica. Por exem plo, pela frase “todo o povo” o Espírito não quer dizer cada pessoa em particu lar, mas sim plesm ente que alguns dentre cada nação se sujeitari am ao ju g o de Cristo, reconhecendo-o com o Rei e obediente mente se uniriam a sua Igreja. Q uão am iúde esses sentimentos ocorrem nos profetas! Todas as nações virão - todos os reis ser virão. N aquele tem po não existiu sequer um rei que não profes sasse ser inim igo da verdadeira piedade e que não desejasse que a m esm a fosse desarraigada do próprio nom e de sua lei. Os pro fetas am pliam assim, de form a magnificente, a futura restaura ção deste reino, com o já o declaram os antes, em decorrência de o evento ser tão completamente impossível. Portanto, também neste lugar, diz ele: todos os poderes o servirão e lhe obedecerão; ou, seja, nenhum poder se vangloriará, então, em sua em inência, não se dispondo de bom grado a sujeitar-se à Igreja, ainda que, no presente, todos tão plenam ente a desprezem ; sim , em bora se pre cipitem com todo seu poder contra a Igreja tão am esquinhada, e em bora a pisem de form a tão ignom iniosa, ainda assim se lhe sujeitarão. Bem o sabemos nós que isso se cum priu amplamente. Algum as pessoas, além de seu significado, im prim em palavras de cunho universal, com o quando Paulo diz: Deus deseja que todos sejam salvos. D aí dizerem eles que ninguém está predeter m inado à destruição, m as que todos são eleitos, ou, seja. Deus não é Deus [IT m 2.4]. Nós, porém, não nos sentimos surpresos com dem ência desse gênero, a qual corrom pe ímpios e profanos, os quais desejam que suas cavilações prom ovam a descrença em relação a todos os oráculos do Espírito. C om preendam os clara m ente a freqüência dessa figura de linguagem; quando o Espírito Santo diz ‘todos’, sua intenção visa a alguns dentre todas as na ções, e não a cada um universalmente. 93 [7.28] D A N IE L 28 A qui está o final d o assunto. Q u an to a m im , D aniel, m inhas cogitações m e perlurbaram m uitíssim o, e m eu sem blante se m e transm udou; eu, porém , guardei o assu n to em m eu coração. 28 H ucusque finis serm o n is,’5 m ihi D anieii,“ m ultum c ogitaliones m e * terruerunl m e, e t vultus m eus m u ta tu se sl super m e, vel, in m e, e t serm onem se rv a v i," in c orde m eo. N este versículo D aniel prim eiro diz que a visão estava con cluída, e assim os fiéis podiam descansar satisfeitos, olhando para algo para além dela. Pois sabem os quão incansáveis são as fanta sias do gênero humano, e quão insana doença é a fútil curiosida de. Deus está consciente do que é útil para nossa inform ação, e assim ele adota seu m étodo de ensino visando a nossa capacida de e proveito. Todavia somos volúveis e insaciáveis, dizendo: P o r que isso ou aquilo não é adicionado? Por que Deus não se detém aqui? Por que ele não avança um passo mais? Visto, pois, que a engenhosidade hum ana é por dem ais inflam ada e desequi librada, D aniel aqui m erecidam ente diz: a visão chegou a seu fin al, com o fim de levar todos os eleitos a aquiescer-se com ela e contentar-se com esse conhecimento parcial. E em seguida acres centa: fiquei p e rtu rb a d o em m eus p en sam en to s, e m eu sem b la n te se tra n s m u d o u ; pois ele tem ia que os santos concluís sem que esta visão não passava de um m ero espectro evanescente. E ra da m aior im portância distinguir esta visão de qualquer im aginação frívola. Daniel, pois, com o intuito de m ostrar com o a cena exposta a sua observação era um a revelação divina, ex pressa claram ente com o ele fic o u terrificado em seus pensam en tos. Isso ocorreu porque D eus queria estam par em seu coração a infalibilidade da profecia. Com o m esm o propósito é a m udança de seu sem blante. Ele acrescenta: g u a rd e i o assu n to em m eu co raç ão , com o fim de assegurar-nos de que ele era um intérpre te fiel; pois se ele nos fosse suspeito de negligência, não recebe ríam os com reverência a mensagem que enunciou nessas pala 35 Ou. por enquanto há um final do discurso. ** Ou. quanto a mim, Daniel, estou preocupado. 17 Ou. estou disposto a guardá-lo. 94 3 8 * EX P O SIÇ Ã O [8.1] vras com o realm ente procedentes de Deus. Quando, porém , D a niel afirm a que ele se desincum bira do dever de um servo fiel, que guardou todo o discurso em seu coração, acrescenta-se a seu ensino um a autoridade adicional. Concluindo, é preciso que nos lembremos de dois pontos: prim eiro, a revelação celestial que se fez conhecer ao profeta com o intuito de provar que ele era um servo e m ensageiro de Deus destinado a nós; e, segundo, o fiel desencargo de seus deveres, ao guardar em seu coração o que havia recebido, e assim o entregou com suas próprias m ãos, na íntegra, à Igreja. Segue a outra visão: (Z a jyítu ú o 8 1 N o terceiro ano d o reinado d o rei B eisazar. v eio -m e u m a visão, a m im , D aniel, d e p o is d a q u e la q u e m e a p a re c e u n o princípio. I A nno tertio regni B e ltsa z ar R egis. visio visa fuit, visio apparuit, m ihi, m ihi inquam D anieli postquam apparuerat mihi in prin cip io .“ Aqui Daniel relata outra visão, diferindo da anterior com o um a parte [difere] do todo. Pois Deus desejava m ostrar-lhe, p ri m eiram ente, que várias m udanças ocorreriam antes do advento de Cristo. A segunda redenção era o início de um a nova vida, visto que Deus, então, não só restaurou outra vez sua própria Igreja, m as com o se fosse criado um novo povo; e daí a partida de B abilônia e o regresso a seu país serem cham ados o segundo nascim ento da Igreja. Visto, porém, que Deus, naquele tempo, oferecera, então, apenas um a prelibação da genuína e sólida re denção, sem pre que os profetas tratam desse livram ento, eles es tendem seus pensam entos e suas profecias para a futura vinda de Cristo. Portanto Deus, com grande propriedade, m ostra a seu pro feta as Q uatro M onarquias a fim de que os fiéis não desfaleces sem, visualizando o m undo tão am iúde convulso e tudo a mudar sua figura e natureza. E assim eles se veriam sujeitos às mais ” Ou. seja, em adição à visão que m e foi oferecida antes. 95 [8.1] D A N IE L aflitivas preocupações, tornando-se alvo de riso por parte de seus inimigos e permanecendo sempre desprezíveis e hum ilhados, sem poder socorrer-se sob essas constantes inovações. Os fiéis, pois, foram prevenidos acerca dessas Quarto M onarquias, para que não se supusessem rejeitados por D eus e privados totalm ente de sua proteção. Agora, porém , D eus queria m ostrar a seu profeta so m ente um a parte. Com o a destruição do im pério babilónico esta va próxim a, e o segundo reino se avizinhava, este dom ínio tam bém chegaria celerem ente a seu térm ino, e então o povo de Deus seria reduzido a quase total extermínio. E o principal objetivo desta visão é preparar os fiéis para enfrentarem pacientem ente a horrível tirania de Antíoco, de quem o profeta trata neste capítu lo. A gora, pois, entendem os o significado desta profecia, na qual Deus fala somente de duas m onarquias, pois o reino dos caldeus logo seria abolido. Ele trata prim eiro do reino persa; e, em segui da. acrescenta o m acedônio, porém omite todos os outros e desce diretam ente a Antíoco, rei da Síria. Ele então declara a prevalecência da m ais miserável confusão na Igreja; pois o santuário seria privado de sua dignidade e o povo eleito seria por toda parte massacrado, sem ao menos poupar-se o sangue inocente. Vere mos tam bém por que os fiéis foram de antem ão inform ados de calam idades tão graves e opressivas, com o intuito de induzi-los a olharem para Deus quando oprim idos por tão extrem a escuri dão. E nestes dias esta profecia nos é útil, para que nossa cora gem não desfaleça ante a extrem a calam idade da Igreja, visto que um a perpétua representação dela nos é delineada sob aquele ca lam itoso e mortuário estado. A inda que Deus am iúde nos poupe em nossas enferm idades, todavia a Igreja nunca está isenta de m uita angústia, e a não ser que estejam os preparados para en frentar todos os ventos contrários, jam ais perm anecerem os fir mes na fé. Este é o escopo e explanação da profecia. Adiarei o restante. 96 3 8 * EX P O SIÇ Ã O ORAÇÃO Deus Onipotente, visto que outrora permitiste que teus servos m anti vessem sua coragem em meio a tantas e tão variadas comoções, fa z com que extraiamos a mesma edificação dessas profecias; e visto que temos chegado à plenitude dos tempos, fa z com que tiremos pro veito dos exemplos da Igreja antiga e das piedosas e santas admoes tações que puseste diante de nós. E assim possam os perm anecer fir mes e invencíveis contra todos os ataques de Satanás, do mundo e dos ímpios, e assim nossa f é permaneça inexpugnável, até que, por fim , desfrutemos o fru to de sua vitória em teu reino celestial, por Cristo nosso Senhor. Amém. 97 39a / 7 a escrevi um breve prefácio para esta visão, a qual nos é aqui r i descrita neste oitavo capítulo, com o intuito de capacitar o leitor a com preender seu conteúdo e perceber o objetivo para o qual ela foi oferecida ao profeta. Q uanto ao tem po, devem os lembrar-nos de que o profeta fora inform ado da vitória de C iro e D ario ainda que a m onarquia babilónica continuasse a florescer. A inda que Ciro já houvesse alcançado grande progresso e com e çado a restringir os territórios caldaicos, todavia Belsazar, como j á vim os, displicentem ente folgava em seus banquetes. Ninguém jam ais pensaria que Ciro viria a ser o conquistador de tão im ensa m onarquia, por isso Belsazar não pensou em convocar um gran de exército em defesa das fronteiras de seu reino. A creditava que repeliria a todos os em preendim entos de Ciro com toda facilida de possível; por m aior que fosse sua violência, o rei B elsazar esperava poder dom iná-la. Ora, D eus queria m ostrar a seu servo esses eventos futuros. A ntes de tudo, é revelada a m udança im e diata; em seguida, finalm ente se faz conhecida a calam idade que viria - calam idade, digo eu, da Igreja sob o rei A ntíoco e seus sucessores. O profeta, portanto, diz; 2 E vi n u m a v isão ( e sucedeu que, a o olhar, e u e stav a n o palácio d e Susã, q u e íic a n a p ro v ín cia d e E lio ); e e u vi num a v is io . e eis que m e achava próxim o ao n o Ulai. 2 Vidi in visione: ec fuit cum viderem , ut ego essem in Susan,*' qua; est in E lam provincia. Vidi in visione, e( ecc e e ram sup e r fluvium Ulai. N 7 n '3 il, hebireh, o que alguns traduzem por cidadela, ou palácio, ou residência real. 98 3 9 a EX P O SIÇ Ã O 3 E ntão ergui m eus olh o s e vi. e eis que um carn eiro e stav a d e p é d iante d o rio, o qual tinha dois chifres; e o s dois chifres e ram a ltos, p orém u m era m ais alto q u e o outro, e o m ais alto subiu por últim o. [8.2,3] 3 E t extuli oculos m eos, e t vidi: e t eccc aries u n u s sta b at coram fluvio,40 e t ei cornua d uo, e t c o m u a e ran t excelsa, e t unum e x ce lsiu s altero, e t excelsum hoc ascendeb at retro. Sem dúvida alguma, o profeta aqui reconheceu um novo im pério quando estava para surgir, o que não podia acontecer sem que antes B abilônia fosse reduzida à servidão. Isso, porém , não serviria de m odo algum para aliviar as preocupações dos santos nem para m itigar suas angústias, quando viam o que previam ente im aginaram ser incrível, ou, seja, a chegada da destruição daque la horrível tirania sob a qual tinham sido tão cruelm ente oprim i do. E se a liberdade de regressar a sua pátria não fosse im ediata m ente concedida ao povo, não seria pequena consolação divisar o ju ízo divino contra os caldeus com o fora predito pelos profe tas. Temos agora que exam inar a linguagem do profeta. E u vi u m a visão, diz ele. Esta palavra p i n , chezon, um a ‘visão’, é adicionada para m ostrar-nos que o carneiro de que se faz m enção não era visto pelos olhos físicos. D aí ser este um oráculo celesti al, e deve ter elevado o observador acima de todas as sensações humanas, com o fim de capacitá-lo a discernir a altitude da torre de vigia em que o m esm o estava oculto do resto da humanidade. Ele, pois, não via o que os homens ordinários podem ver, porém Deus lhe m ostrou num a visão o que os sentidos m ortais podiam apreender. Em seguida, ele acrescenta: Foi m o s tra d a u m a visão a m im , D aniel, e sucedeu que, diz ele, q u an d o a vi eu m e achava em S usã. H á quem pensa estar Daniel, naquele tempo, residindo na Pérsia, porém tal ponto de vista de m odo algum é provável; pois quem poderia persuadir o profeta de D eus que fora levado cativo com o restante e estava vinculado ao rei de B abilônia a partir com o se ele estivesse inteiram ente livre e fosse para Pér sia, quando os persas eram então seus inim igos? Isso não é de todo provável; e me adm ira que algo tenha induzido os hom ens a ^ Ou. seja, na margem d o rio. 99 [8 .2 ,3 ] D A N IE L adotarem tal com entário, tão contrário a toda a razão. Pois não carecem os de discutir tal m atéria que de m odo algum obscurece a im portância das palavras do profeta, quando ele rem ove toda dúvida, ao dizer: eu me achava em Susã quando vi, ou, seja, quan do fui arrebatado pelo espírito profético para além de m im m es m o e m e vi acima do mundo. O profeta não diz que residia em Susã, nem na circunvizinhança, m as estava ali som ente na visão. O versículo seguinte tam bém m ostra sobejam ente que ele estava então n a C aldéia - no terceiro ano, diz ele, do reinado do rei Belsazar. Ao ser coroado o rei, ele claram ente expressa que então residia sob seu poder e domínio. Dessas palavras se deduz clara m ente, sem a mais leve som bra de dúvida, que o profeta então residia n a Caldéia. E talvez B abilônia já estivesse sitiada, com o vim os anteriormente. Ele diz que estav a no p alácio d e S usã. N ão sei com o deveria traduzir o term o 71T3n, hebireh, já que não vejo nenhum a razão para preferir o significado cidadela em vez de ‘palácio’. Estam os certos d a nobreza e celebridade da ci dadela que m ais tarde seria a cabeça do O riente, pois todas as nações e tribos recebiam dali suas leis, direitos e julgam entos. Ao m esm o tempo, creio que essa cidadela ainda não tinha sido construída, pois seu im pério sobre o território persa não estava solidam ente estabelecido até o tem po dos sucessores de Ciro. Poderíam os, talvez, distinguir Susã da Pérsia na íntegra; todavia, com o ela é tratada com o um a parte daquele reino, não insisto na distinção. O país, contudo, é m uito m ais am eno e m ais fértil do que a Pérsia, visto que recebe seu nom e por ser u m a floricultura e abundante em rosas. Assim o profeta diz que teve ali um a visão. E le em seguida reitera isso: Vi n u m a visão, e eis q u e m e a c h a v a p ró x im o ao rio Ulai. Os escritores latinos fazem m en ção de um rio E ul$us, e visto que existe um a grande sim ilarida de entre as palavras, não hesito em entender a linguagem de D a niel com o um a referência ao E u lsu s. A repetição não é supér flua. E la im prim e certeza na profecia, porquanto Daniel afirm a 100 3 9 a EX P O SIÇ Ã O {8.2, 3] não ter tido qualquer espectro evanescente, com o se poderia sus peitar de um a visão, m as clara e certam ente um a revelação divi na, com o m ais adiante relatará. D iz ele ainda: e rg u i m eus olhos p a r a o alto. Essa atitude atenta tem o mesmo significado, com o a experiência nos inform a, quão am iúde os homens são engana dos por vaguearem em errôneas imaginações. Daniel, porém, aqui testifica que ergueu seus olhos para o alto, porquanto sabia que sua atenção era divinam ente evocada a discernir eventos futuros. Em seguida ele acrescenta: E eis u m c a rn e iro d e p é n a m a r gem do rio , e tin h a dois chifres. Ele agora com para o império persa e medo a um carneiro. Não deve parecer absurdo que Deus tenha proposto a seu servo várias sim ilitudes, porque seu dever era instruir através de vários métodos um povo rude; e sabemos que esta visão foi apresentada diante do profeta não só para sua instrução particular, mas também para o benefício com um de todo o povo. N ão creio que precisem os escrupulosam ente inquirir por que os reis persas são denom inados carneiros. N ão conheço ne nhum a razão plausível, a não ser, quem sabe, para instituir um a com paração entre eles e A lexandre da M acedonia e seus suces sores. Se esse é o caso, quando Deus, sob a imagem de um car neiro, exibe a seu profeta o im pério persa, não está a ilustrar sua natureza em term os absolutos, mas apenas à guisa de com para ção com a de Alexandre. Estam os bem cientes da oposição entre esses dois impérios. A m onarquia persa é cham ada “um carnei ro” , com referência aos macedônios, os quais, com o veremos mais adiante, exibem a designação ‘bode’ em relação a seu antagonis ta. E podem os deduzir a m elhor razão para esta com paração da origem humilde dos reis da Pérsia. Com grande propriedade, pois, Ciro, o prim eiro governante desse im pério, nos é aqui retratado sob a forma ou im agem de um carneiro. Seu ‘ch ifre’ produzia um a concussão por toda a terra, quando ninguém esperava que algo proviesse de um a região de m odo algum farta de algo nobre. E quanto a Alexandre, ele é chamado ‘bode’ em relação ao ‘cam ei101 [8 .2 , 3 ] D A N IE L ro ’. com o sendo muito m ais astuto, e todavia mais obscuro em sua origem . Pois o que era M acedônia senão um m ero canto da G récia? Eu, porém, não me propus form ar um paralelo entre es tes pontos; é suficiente que Deus quisesse m ostrar a seu profeta e a toda a Igreja com o dentre os persas, ignotos com o eram , des prezados por seus vizinhos, se ergueria um rei com o fim de con sum ir o poder medo, com o logo verem os, e tam bém para subver ter a m onarquia babilónica. Portanto, diz ele, eis u m c a rn e iro em p é p ró x im o ao rio, ou na margem do rio, um a vez que Ciro subjugou tanto aos m edos quanto a seu avô, segundo nos infor m am os historiadores. Ciro, pois, irrom peu-se de suas próprias m ontanhas e pôs-se de p é na margem do rio. D iz ainda: E le ti n h a dois chifres. Aqui o profeta apresenta dois chifres no lugar de dois impérios, e de m odo algum de duas pessoas. Pois ainda que C iro se casara com a filho de Cyaxares, seu tio, todavia sabe m os que o im pério persa durou um longo período e forneceu aos historiadores um longo catálogo de reis. U m a vez que Ciro teve tantos sucessores, por dois chifres indubitavelm ente Deus quis m ostrar a seu profeta que os dois im périos, m edo e persa, se uni ram sob um a só soberania. Portanto, quando o carneiro apareceu ao profeta, ele representava ambos os reinos sob um só emblema. O contexto confirm a isso, dizendo: O s dois chifres e ra m a l tos, p o ré m u m m ais alto q u e o o u tro , e o m ais a lto su b iu p o r ú ltim o. Os dois chifres eram altos; porque, ainda que o território persa não fosse rico, e sendo o povo rústico e vivendo nas flores tas. sua vida era austera e desprezavam todos os confortos, toda via a nação estava sempre em guerra. Por isso o profeta diz que esse chifre era m ais alto que o outro, significando que o império medo era mais alto. Ora, Ciro excedia a seu sogro D ario em fama, autoridade e condição, e até m esm o perm itiu sem pre que D ario desfrutasse a m ajestade régia até o fim de sua vida. Já que ele era m ais velho, Ciro podia facilm ente conceder-lhe o ofício m ais ele vado sem qualquer perda pessoal. C om respeito, pois, ao período 102 39* EX P O SIÇ Ã O [ 8 .4 ] seguinte, Ciro evidentem ente foi proem inente, com o sem dúvida era ele superior a D ario, a quem X enofonte cham a Cyaxares. Por essa razão, pois, esse chifre era m ais alto. Entrem entes, porém , o profeta m ostra com o gradualm ente Ciro foi ascendendo às altu ras. O chifre subiu tim idam ente; ou, seja, “m ais tarde” - signifi cando: ainda que o chifre do reino medo fosse m ais em inente e conspícuo, todavia o chifre que se ergueu depois obscureceu o esplendor e glória do prim eiro. Isso concorda com as narrativas da história profana; pois todo leitor dessas narrativas não encon trará nada registrado por D aniel que não se cum prisse através do evento. Vamos em frente: 4 Vi q u e o carn eiro d a v a m arradas p a ra o ocidenie, e para o norte, e p a ra o sul; d e m odo q u e n enhum anim al p odia e star diante d ele, nem hav ia q uem p u d esse escapar d e su a m ão; porém ele fazia conform e sua vontade, e to m o u -se grande. 4 Vjdi arietem ferientem O ccasum et Aquilo n em , Septentrionem e t M e rid ie m : et n u lls b e sti* consistebant coram ipso,41 et nem o eripiens e m anu ejus,4í itaque fecít secundum arbitrium suum , e t m agnificatus est. O Profeta então traça em term os breves o grande sucesso que alcançaria esse duplo reino. D iz ele: O c a rn e iro golpeava todas as nações em d ireç ão oeste, n o rte e sul. O território persa e m edo situava-se ao oriente de Babilônia, Egito, Síria, Á sia M e nor e G récia. Isso, sem dúvida, se estende a todos os sucessores de Ciro, que são registrados com o havendo convulsionado o m undo inteiro. Ciro m esm o foi logo depois cruel e vilm ente as sassinado, de acordo com muitos historiadores, ainda que X eno fonte afirm e que ele morreu em seu leito. Eu, porém , já adverti o leitor a não depositar sua confiança naquele escritor, a despeito de sua grande excelência, visto que, sob a im agem daquele rei, ele desejava pôr diante de nós um exem plo de perfeita virilidade; e daí ele o retratar com o a discursar em seu leito m ortuário e a exortar seus filhos a cultivarem as virtudes régias. Seja qual for o relato verídico, Ciro foi evidentem ente surpreendido em m eio a 41 O u. diante d e sua face. 42 N io havia ninguém para arrebatá-lo de sua m io. 103 [8.4] D A N IE L sua atividade. A ssim D eus quis castigar sua insaciável cupidez, vício esse em que se assem elhava a Alexandre. Q uanto a seus sucessores, excitaram com oções tais no m undo inteiro que agita ram céu e terra. X erxes disse que ele sozinho podia prender o m ar com grilhões! E conhecem os a grandeza do exército que ele com andava; e esta passagem trata não só de um rei, mas de todos os reis d a Pérsia. Visto que obtiveram um dom ínio tão rem oto e am plo, sua am bição e soberba sem pre os inflam aram , e não ha via fim para suas guerras, até que dom inaram as longínquas fron teiras do mundo. Estam os fam iliarizados tam bém com suas nu m erosas tentativas de destruir a liberdade da Grécia. Tudo isso o profeta abarca em umas poucas palavras. D eus tam bém queria dar ao profeta um breve relance do futuro, até onde tal conheci mento pudesse ser proveitoso. Disse ele, pois: Vi um carneiro, ou, seja, um animal que possuía um chifre duplo, representando os m edos e os persas unificados sob a m esm a soberania. E le g olpeava em d ireç ão a oeste, a n o rte e a sul, d e m odo q u e n e n h u m anim a) p o d ia fic a r d ia n te dele. Visto que o reino persa é aqui descrito sob a im agem de um carneiro, todos os reis e povos são denom inados ‘anim ais’. A ssim , n e n h u m a n im al p e rm a n e c ia d ia n te dele, e n in g u ém p o d ia liv rá-lo d e su a m ão. Aliás, é bem notório com o Xerxes e outros fracassaram em seus ataques, e quantas guerras as m onarquias da Pérsia experim enta ram, durante as quais foram vencidos pelos gregos. M as até m es mo seus conquistadores não ficaram em m elhores condições, quando se viram com pelidos a buscar paz com o esm oleres. Tão im enso tornou-se o poder dos persas que inspiravam medo entre todas as nações. Por essa razão o profeta diz: ag iam co n fo rm e su a v ontade, não significando o com pleto êxito dessas m onar quias conform e seus desejos supremos, pois tais desejos eram am iúde frustrados, segundo já referim os acerca do testem unho da evidência histórica. M esm o assim eram sem pre form idáveis, não só em relação a seus vizinhos que entregaram seus pescoços 104 3 9 a EX P O SIÇ Ã O [8.5, 6] a seu jugo, m as em relação às nações mais rem otas, ao cruzarem o m ar e descerem da Á sia para a Grécia. Em últim a análise, ele expressa este fato: o c a rn e iro veio a s e r poderoso. Pois o rei persa chegou a ser o m aior de todos os m onarcas do mundo, e é suficientem ente notório que nada se pôde acrescentar a sua dig nidade e força. Continuemos: 5 E, e nquanto ponderava, e is que um bode vinha d o o cidente so b re a face d e to d a a terra, p orém sem to ca r o chão; e o bode Cinha u m c hifre notável en tre seus olhos. S E t ego eram intentus,4’ ecce, inquit, hircus c aprarum v e n it a b O ccasu,“ su p e r facie m tolius te rra , n eque tam en attingebat terrant,43 e t hirco co m u illu stre erat inter o cuios ejus. 6 E ele chegou ao carneiro q u e tin h a dois c hifres, o qual e u v ira em p é d iante d o rio, e correu em sua direção n a fú ria d e seu poder. 6 E t v e n it ad arietem , cui e ran t c o m u a d uo,46 q uem videram stantem in rip a fluvii,4’ e t cu cu rrit a d e u m cum furore fortitudinis suee. Aqui se m ostra ao profeta outra m udança, a saber: Alexandre chegando do oriente e assum indo para si o poderoso dom ínio dos persas, com o mais tarde aconteceu. Com vistas, pois, a granjear confiança para sua predição, o profeta disse: E u estav a aten to . Indubitavelm ente, ele frisa a reverência com que recebeu a visão com o fim exortar-nos a sair em busca da piedade, e tam bém da m odéstia e atenção. O profeta, portanto, não fora arrebatado pela im aginação de um sonho, sobre o quê se poderia lançar dúvida. Ele sabia que D eus havia posto esta visão diante dele, e reconhe cia seu dever de recebê-la com m odéstia e hum ildade. Pelo quê, diz ele. E u estav a a te n to , e eis q u e u m b o d e saiu do ocidente. É preciso notar a situação da M acedônia com respeito à Pérsia. Visto que os gregos estavam situados ao ocidente da Pérsia, o profeta diz: o bode saiu d o o cidente, e cam in h o u so b re a su p erfície d e to d a a te rr a . Essas palavras significam o mui exten*' Ou. seja. atentei ou eslava atento. 44 Procedente do ocidente. 43 N5o tocava o ch2o. 46 Q ue eslava de posse de dois chifres, ou, literalmente, "dono de chifres". <! D iante do rio. 105 [8.5,6] D AN IEL so dom ínio de Alexandre e o terror das nações circunvizinhas. E sobejam ente notória sua chegada à Á sia com um exército m uito insignificante. Ele cria que era suficiente 30.000 hom ens, depois de ter sido feito seu general pelos Estados da Grécia. D aí a passa gem deve ser entendida não num ericam ente, m as em relação ao terror que se inspirava de todos os lados; pois ainda que ele avan çasse com apenas um a força m oderada, no entanto aterrorizou toda a terra. Ele, p o rém , n ão to cav a o chão, diz o profeta. E ssa é um a referência a sua rapidez, pois ele m ais voava do que viajava, quer por terra, quer por mar, tão incrível era sua rapidez nessa expedi ção. Pois se alguém podia percorrer regiões em com pleta tran qüilidade, então ele podia atravessar a Á sia com mais rapidez. D aí o bode ser exibido ao profeta com o algo que não tocava o chão, ou, seja, sua rapidez se assem elhava a do relâm pago. D iz ele ainda: E o bode tin h a u m ch ifre e n tre os olhos - u m ch ifre notável. Sabem os quanta glória A lexandre granjeou para si num curto espaço de tempo, e no entanto não em preendeu a guerra em seu próprio nome, ou sob sua própria responsabilidade, m as utilizou-se de todo artifício para obter dos Estados gregos o ofício de general-m or contra os persas, com o inim igos perpétuos. E sta mos bem fam iliarizados com a hostilidade dos persas em relação aos gregos que, ainda que amiúde com pelidos a retroceder com grande infortúnio e infâm ia e com a perda de tropas, ainda pros seguiam renovando a guerra com o se possuíssem abundância de hom ens e de recursos pecuniários. Quando A lexandre foi feito general de toda a Grécia, ele teve um chifre extraordinário entre seus olhos; ou, seja, ele se precaveu em que seu título de general fosse a causa do aum ento de autoridade pessoal. Além disso, foi suficientem ente proem inente constituí-lo o único general de todo o exército, enquanto todas as coisas eram efetuadas segundo seu beneplácito, durante o tem po em que em preendia a guerra. Eis, portanto, a razão pela qual o profeta diz: o ch ifre e r a visível 106 39* EX P O SIÇ Ã O [8.7] e n tre os olhos do bode. E então: E le chegou a o c a rn e iro q u e tin h a os dois chifres; ou, seja, veio contra o rei dos m edos e dos persas. C iro tam bém tinha se apoderado de B abilônia e subjuga ra m uitos reis, os dois chifres, porém , se destinam ao carneiro, visto que os reis persas tinham se unificado com os m edos por m eio de aliança. D aí um bode com seu chifre veio contra o car neiro que tinha dois chifres e c o rre u a seu e n c o n tro no a r d o r d e su a b ra v u ra . E assim se denota a perseverança de Alexandre, enquanto se apressava, excedendo a toda expectativa, ante a ve locidade de sua chegada. A inda que D ario continuasse em segu rança, em bora tivesse convocado um grande exército, A lexan dre, porém , avançou na ousadia de sua força, e, com trem enda rapidez, cercou o inimigo. Sigam os em frente: 7 E o vi chegar p e n o d o carneiro, e foi m ovido d e cólera contra ele, e golpeou o cam eiro, e quebrou seus dois chifres; e não havia poder algum n o carneiro para perm anecer d iante dele, porém foi lançado a o ch ão e o pisaram ; e n lo houve ninguém que pudesse livrar o carneiro d e sua m ão. 7 E t vidi appropinquantem ad arietem , et e x asp era n te m se ip su m ,4Sp e rcu ssit arie(em, et confregit d u o c o m u a ejus, e t non fuit virtus in aríete ad standum c oram facie ejus, et d e je cit eu m in cerram,4Vet calcavit eum : e t non fuit qui eru ere t arietem e m anu ejus. Aqui Deus m ostra a seu profeta a vitória de A lexandre, sub jugando quase que totalm ente o oriente. A inda que ele encon trasse m uitas nações no cam po de batalha, especialm ente os hin dus, todavia o nome do império persa era tão celebrado no m un do que a dignidade dos outros nem chegava a seus pés. A lexan dre, pois, ao vencer D ario, tomou posse de quase todo o oriente. Deus mostrou a seu profeta, por m eio dessa figura, a proxim ida de de sua vitória. D iz ele: Vi q u a n d o ele ap ro x im o u -se d o c a r neiro. D ario estava fortificado tanto pela distância de seus pos tos quanto pela resistência de suas fortificações; porque muitas de suas cidades eram inexpugnáveis, segundo a opinião com um J8 Ou, seja, quando o bode aproxim ou-se do carneiro, tornou-se excitado, ou tornou-se furioso contra ele. 45 Lançou-o prostrado. 107 [8.7] D A N IE L d a hum anidade. Era incrível, pois, que o bode pudesse aproxim ar-se do carneiro, cercado com o estava de todos os lados por guarnições m uitíssim o fortes e poderosas. O profeta, porém , diz que ele aproxim ou-se do carneiro, e então: ex asp ero u -se c o n tra ele. Isso se aplica aos furiosos ataques de Alexandre. Estam os bem fam iliarizados com a habilidade de seus dons e com a supe rioridade de sua coragem; todavia, tal era sua desabrida audácia, que sua disposição aproxim ava-se m ais da tem eridade do que da bravura régia. Pois ele com freqüência se lançava com um cego im pulso contra seus inim igos, e não foi por culpa sua se o nome m acedônio não fora destruído dez vezes mais. Como, pois, ele se precipitara com um a tão violenta fúria, não surpreende que o pro feta tenha dito: ele exasperou-se m ovido p o r sua própria índole. E golpeou o carn eiro , diz ele. Venceu a D ario em duas batalhas, quando o poder da soberania persa ficou, por toda a Á sia Menor, com pletam ente subvertido. Estam os bem fam iliarizados com os resultados dessas batalhas dem asiadam ente perigosas, revelando que todo o estresse da guerra repousou sobre aquele envolvim en to no qual D ario foi pela prim eira vez vencido; pois ao arregi m entar novas forças e atacar um a segunda vez, perdeu a esperan ça de m anter seu reino, foi traído por seus seguidores e cruel m ente assassinado. Assim o bode golpeou o carneiro e arrancou seus dois chifres. Pois Alexandre tom ou posse tanto do im pério medo quanto do persa. D iz ele: O c a rn e iro n ão teve fo rç a p a r a re sistir; e ainda que houvera arregim entado um a im ensa multidão, todavia essa preparação de nada valeu, pois não passou de fútil pom pa. Pois D ario era mas resplendente com ouro e prata e jóias, com os quais ele exibia suas luxurias na guerra, do que podia exibir proem i nência e força varonil. O carneiro, pois, não teve po d er para perm anecer diante do bode. Daí, ele o lan ço u p r o s tr a d o p o r t e r r a e o pisoteou; e n in g u ém p ô d e liv rá-lo d e s u a m ão. Aliás, D ario foi morto por seus assistentes; A lexandre, porém, pisoteou 108 3 9 * EX P O SIÇ Ã O [8.7] toda sua glória e a dignidade do im pério persa sob o qual todos os povos do oriente trem iam . Estam os tam bém conscientes da soberba com que ele dem onstrava em suas vitórias, inclusive sob a influência de m eretrizes e orgias, segundo alguns relatam , tu m ultuosam ente pôs fogo naquela celebérrim a cidadela de Susã num acesso de em briaguez. Visto que ele assim indignadamente pisou sob seus pés a glória da monarquia persa, vemos com quanta justeza os eventos cum priram a profecia, na form a com o regis trada por todos os historiadores profanos. ORAÇÃO Onipotente Deus, visto que quiseste que fôssem os arremessados de um lado para o outro em meio a muitas e variadas comoções, perm i te que nossa mente se volva sempre para o alto e para o céu, onde preparaste para nós o infalível descanso e uma tranqüila herança para além do alcance de toda conturbação e estremecimento. Quan do a terra ao longo da qual peregrinamos cair em confusão, que estejamos então ocupados durante suas tormentas, permanecendo firm es e alicerçados na f é em tuas promessas, até que nos vejamos livres de nossa batalha e sejamos congregados naquele fe liz descan so, onde desfrutaremos do deleitoso fru to de nossa vitória, em Cristo Jesus nosso Senhor. Amém. 109 g 40a .xposição 8 P ortanto, o bode se engrandeceu sobrem aneira; e, q u an d o se viu forte, o g rande c hifre foi arrancado; e em seu lu g ar subiu o u tro s q u a tro n o táv e is, p a ra o s q u a tro ventos d o céu. 8 E t h irc u s cap ra ru m m ag n ifica tu s est adm odum : e t c u m in ro b o re suo esset, fractum fu itc o rn u m agnum , e tp ro d ieru n t lo co e ju s illu slria q u a tu o r alia, versus q u atu o r ventos ccelorum . E sta profecia se relaciona com a m orte de A lexandre. Já ex plicam os com o, sob a im agem de um bode, o im pério m acedônio é posto diante de nossos olhos, tendo seu início na pessoa de A lexandre, mas de m odo algum term ina aí, visto que a m onar quia foi dividida em quatro partes. O anjo disse, ou, pelo menos, D aniel registra suas palavras: o b o d e se e n g ran d e ceu so b re m a n e ira , porque vagueava com o que por esporte através de quase todo o oriente, e ao mesmo tempo o subjugou; m as q u a n d o se viu fo rte, diz ele, o g ra n d e ch ifre foi a rra n c a d o . Por esse gran de chifre ele tem em m ente a monarquia, a qual foi a única em poder de A lexandre durante sua vida, visto ser ele o prim eiro e o últim o m onarca de sua raça. E, em decorrência de seus generais, os quais obtiveram o dom ínio dos quatro cantos do mundo, tornando-se reis, com o logo veremos, a palavra ‘bode’ não se res tringe a sua pessoa, mas se estende a seus sucessores. Ele mesmo é cham ado “o grande chifre” . Daí, quando o bode se viu forte, o grande chifre fo i quebrado. Porque Alexandre, quando morreu, havia chegado ao auge da prosperidade. Se pereceu proveniente de doença ou se foi envenenado, não se sabe, já que os historia dores nutrem grande suspeita de trapaça. O anjo não diz sua ida110 4 0 “ EX P O SIÇ Ã O [8.8] de, que era de trinta e três anos em sua morte, em bora aparentas se ter vindo ao m undo com o fim de subjugar toda a terra, ainda que fora arrebatado de form a tão súbita. O anjo, porém , leva em conta aqueles contínuos sucessos, visto que A lexandre quase de um relance subjugara todo o oriente, com o declaram os anterior m ente, e avançava afoitam ente de um lugar para outro. D aí pere nem ente lograr novas vitórias, ainda que na constante azáfam a de sua vida revelasse possuir m uito m ais audácia do que propri am ente habilidade. Quando ele se viu fo rte, diz o anjo; signifi cando: depois de haver subjugado todo o oriente. H avia regressa do da índia, e determ inara cruzar o m ar e reduzir a G récia a seu vassalo; pois o Estado se rebelara contra ele, e os atenienses já haviam se constituído num grande exército; porém , quando A le xandre m orreu, todos os Estados orientais da Á sia já se lhe havi am tornado subservientes. O anjo liga tal fato à quebra do grande chifre. Em seguida, ele acrescenta: E m seu lu g a r ro m p e ra m q u a tro ch ifres pro em in en tes. Porquanto ele faz uso do substantivo n r r n , chezeveth, ‘notáveis’, com o vimos na preleção anterior.30 Há, pois, quatro reinos que exceliam , e cada um deles era cele brado e posto no topo. Tampouco é isso supérfluo, visto saber mos quantos se fizeram reis e que haviam se alistado no serviço de A lexandre com reputação e dignidade. Perdiccas foi o prim ei ro, e todos acreditavam que ele fo ra favorecido por Alexandre com honra especial. Q uando perguntaram a quem ele desejava fosse o sucessor, sua resposta se adequa com a grandeza e sober ba de seu espírito: “A pessoa a quem eu considerar digna do im pério.” Ele teve um filho com Roxana, filha de D ario, bem com o outro filho; então Aridfeus, seu irm ão, adiantou-se; ele, porém , a 50 Este substantivo é conectado a pTH. chezeven, “v isio ”. e em nossa versão é traduzido variadamente. Em Isaías 18, ele é traduzido “concordem ente", e no versículo 5 desse capí tulo, “notável'', e na margem í traduzido corretam ente “de vista” . A tradução latina de Calvino, “ilustre“, é muiü'ssimo adequada. - Nota editorial. 111 [8.8] D A N IE L nenhum deles julgou digno da honra de ser seu sucessor, com o se o m undo não possuísse nada que se lhe igualasse. Sua resposta, pois, deu prova de sua soberba. M as quando ficou im possibilita do de falar, estendeu um a cam painha que se achava em sua mão e a passou a Perdiccas. D aí todos conjeturaram que este estava na preferência de A lexandre, e ele era detentor da autoridade supre ma. D epois disso, Eum enes foi assassinado, o qual o havia servi do. A inda que fosse um aliado, ele foi julgado inim igo e traído p or seus hom ens; sendo Lisâm aco, por outro lado, assassinado. Q uinze generais foram mortos. E visto que tantos assum iram o posto de A lexandre e exerceram autoridade régia, o anjo correta m ente expressa com o quatro chifres proem inentes irromperam do lugar do grande chifre. Porque, depois de vários conflitos e de muitas flutuações durante quinze anos, ou m ais ou m enos isso, a m onarquia de Alexandre foi por fim dividida em quatro partes. Cassandro, filho de Antipater, ficou com o reino m acedônio, de pois de m atar Olím pias, mãe de A lexandre, sua irmã, seus filhos e sua esposa Roxana. Esse foi um m orticínio horrível, e se Deus jam ais oferecesse ao mundo um espetáculo visível, pelo qual pu blicam ente denunciasse o derram am ento de sangue hum ano, se guram ente um a prova m emorável deste existiu em toda a raça de Alexandre! N em sequer um sobreviveu nos quarenta anos depois de sua morte. A inda que sua mãe houvesse chegado à velhice, não lhe foi perm itido descer dignam ente à sepultura, porém foi assassinada. Sua esposa, seu filho e seu irmão, e todos de seu parentesco partilharam de seu destino. E esse m orticínio se afi gurou ainda m ais cruel quando nem um único líder poupava a vida de seus com panheiros, m as cada um ou publicam ente ataca va, ou astuciosam ente assaltava seu am igo e confederado. O m i tindo, porém , os detalhes, quatro reinos foram por fim deixados depois de um a devastação tão nefanda. Pois Cassandro, filho de Antipater, ficou com a M acedônia e algum a parte da Trácia, ju n tam ente com as cidades da Grécia. Seleuco veio a ser o soberano 112 4 0 * E X P O SIÇ Ã O [8.9] na Síria; Antígono, na Á sia Menor, juntando Frigia, Paflagônia e todas as dem ais regiões asiáticas, depois que cinco ou seis gene rais foram mortos. Ptolom eu veio a ser prefeito do Egito. Isso perfaz quatro chifres, aos quais o anjo denom ina de ‘proem inen tes’, pois, com base no testem unho da história, todos os outros principados se desvaneceram . Os generais de A lexandre dividi ram entre si as grandes e férteis províncias, m as p o r fim se resu miram nessas quatro cabeças. D iz ele: pelos q u a tro ventos do céu, ou, seja, da atm osfera. Ora, o reino da M acedônia ficava muito m ais distante da Síria; a Á sia ficava ao m eio e o Egito, ao sul. Assim, o bode, com o já vimos, reinou pelos quatro cantos do globo; posto que o Egito, com o já dissem os, estava situado ao sul; o reino da Pérsia, porém , que foi apossado por Seleuco, fica va ao oriente e unido a Síria; o reino da Á sia ficava ao norte, e o d a M acedônia, ao ocidente, com o anteriorm ente vimos o bode estabelecendo-se desde o ocidente. Portanto, vam os em frente: 9 E d e um d eles saiu um chifre pequeno. o qual prosperou excessivam ente para o su). e p ara o orien te, e p ara a terra aprazivel. 9 E t ex uno illo ru m egressum e sl cornu u num parvum , e t m agniftcatum fuit extm ie versus M eridiem , e t ad O rien tem , et ad g lo riam .’1 A gora Deus m ostra a seu profeta o que peculiarm ente inte ressava ao bem -estar de sua Igreja. Pois era de mui grande im portância advertir os judeus quanto às calam idades que estavam para oprim i-los. Não há nada que m ais atorm enta as mentes hu manas do que tornarem -se presas de falsas im aginações, crendo que o m undo é um joguete do acaso, enquanto jam ais ponderam sobre a Providência de Deus nem atentam para seus juízos. Daí, com tal desígnio, D eus queria ensinar ao profeta e a todos os santos qual é a natureza de suas aflições futuras, visto que assim entenderiam com o os eventos nunca se concretizam ao acaso, '' Ou. desejo; há quem o traduza no genitivo, e entende-se com o "terTa desejável"; pois a Judeia era amiúde cham ada a terra desejável, porque Deus de seu gracioso beneplácito escoiheu ser adorado ati: mas podem os entendê-lo sim plesm ente com o glória. 113 [8.91 D A N IE L senão que todos esses açoites procedem de D eus; pois o m esm o D eus tanto determina quanto executa seus decretos, com o ele tam bém prediz eventos futuros. Pois se nada fora predito, os santos teriam se deslizado furtivam ente para o desespero em decorrên cia de suas aflições profundam ente dolorosas. Sabem os tam bém quão m agnificentem ente os profetas enalteciam a graça de D eus quando prom etiam regresso e livramento. Isaías igualm ente, em outras partes, falou a esse respeito: “ O Senhor desnudou seu bra ço perante os olhos de todas as nações; e todos os confins da terra verão a salvação de nosso D eus” [52.10]. “Porque com alegria saireis, e em paz sereis guiados; os montes e os outeiros rom pe rão em cântico diante de vós, e todas as árvores do cam po bate rão palm as” [55.12]. “ ... todos virão de Sabá; ouro e incenso tra rão, e publicarão os louvores do Senhor” [60.6], Aos judeus se perm itiu regressar a sua própria terra; sabem os, porém , quão cru elm ente foram assenhoreados por todos seus vizinhos, de modo que perm aneceram naquele canto de m undo não sem as m ais ter ríveis dificuldades. A edificação tanto da cidade quanto do tem plo foi dificultada por inúm eros inimigos, até que, por fim, se tom aram tributários dos reis da Síria. Aliás, Antíoco, de quem aqui se faz alusão, avançou com cruel tirania contra o povo de Deus. Se tal coisa não fora predita, teriam concluído que haviam sido enganados pelas esplêndidas e divinas prom essas acerca de seu regresso. Q uando, porém, perceberam que tudo sucedia de acordo com o que haviam sido de antem ão advertidos, isso veio a ser um conforto não insignificante em meio a seus ais. Puderam, pois, determ inar prontam ente quão cabalm ente estava no poder de Deus aliviá-los de tantos e tão opressivos males. Com que intenção, pois, preanunciara D eus todas essas coisas através de seu profeta Daniel! Os judeus puderam perceber o feliz resultado e não se furtaram ao desespero sob os acontecim entos tão carre gados de ansiedade e confusão. Essa, pois, foi a utilidade da pro fecia, com referência àquele período específico. 114 4 0 a EX P O SIÇ Ã O [8.9] Q uando o profeta diz: d e u m d aq u eles q u a tro ch ifre s ergueu-se u m peq u en o , a indicação cai m ais distintam ente sobre A ntíoco Epífanes. O título Epífanes significa ‘em inente', quan do, depois da captura de seu pai, ele foi detido em R om a como refém , e então escapou da custódia. Os historiadores nos infor m am que ele possuía um a disposição servil e m uitíssim o dado a grosseira bajulação. Visto que ele nada tinha de régio nem de heróico em seus sentim entos, mas que era sim plesm ente notável por sua astúcia, o profeta é justificado em denom iná-lo de o p e queno chifre. Ele era m uito m ais poderoso que seus vizinhos; porém o chifre é denom inado de pequeno, não em com paração com os reinos do Egito, ou da Ásia, ou da M acedônia, mas por que ninguém poderia im aginar que ele um dia seria rei e sucede ria a seu pai. Ele era o m ais velho dentre muitos irmãos, e singu larm ente servil e astuto, sem o m ais leve laivo de dignidade para futura realeza. Assim ele era o chifre pequeno que escapou secre ta e fraudulentam ente da custódia, com o já m encionam os, e re gressou a seu país de origem , ao qual m ais tarde governaria. Ele então acrescenta: E ste ch ifre p ro sp e ro u excessivam en te p a r a o sul, p a r a o o rie n te e p a r a a te r r a ap razív el. Porque, a não ser que fosse refreado pelos rom anos, ele teria tom ado pos se do Egito. H á um a extraordinária e celebrada história de Pompilio que diz que lhe foi enviada um a ordem de abster-se do E gi to, sob as ordens do senado. Depois de haver-lhe entregue a m en sagem, A ntíoco pedia tem po para a deliberação, m as Pompilio traçou um círculo com o bastão que tinha na m ão, e o proibiu de m over sequer um pé até que lhe fosse dado resposta. Em bora reivindicasse o Egito com o um direito de conquista, porém não ousou abertam ente esquivar-se ante as exigências de Roma; a princípio ele pretendia ser sim plesm ente o guardião de seu sobri nho, mas certam ente apoderou-se do reino em seu próprio nome. Entretanto, não ousou opor-se aos romanos, porém, ao mudar seu território, seu desejo era despedir Pompilio. Tinha havido 115 [8.10] D A N IE L relações mútuas entre eles enquanto esteve com o refém em Roma; daí oferecer-se para saudar Pom pilio na entrevista, porém este o rejeitou desdenhosam ente e, com o eu já disse, traçou um a linha a sua volta, dizendo: “Responda-m e antes de sair desse círculo; não me engane pedindo tem po para consultar seus conselheiros; responda im ediatam ente, do contrário você sabe com o o trata rei.” Ele se viu im pelido a renunciar o Egito, ainda que anterior m ente se recusara a fazê-lo. A linguagem do profeta, pois, não foi debalde: O pequeno chifre prosperou excessivam ente para o sul, ou, seja, para o Egito, e para o oriente; pois ele estendeu seu reino para além dos Ptolomeus. Em terceiro lugar, ele u sa o ter mo glória [terra aprazível]; ou, seja, Judéia, o santuário de Deus, a qual ele escolhera com o sua habitação e onde queria que seu nom e fosse invocado. E assim esse pequeno chifre estendeu-se para a glória, ou para a terra de glória ou desejo. N ão há nada de incerto no sentido, ainda que a interpretação raram ente concorde com as palavras. Vamos em frente: 10 E se e ngrandeceu m uito, até ao exército d o céu; e a alguns do exército e das estrelas arrojou a o chão c o s pisou. 10 Et m agnificatum est corpu illud parvum a d ex ercttum crelorum , e t d ejecit in terram ex illo exercitu, nempe ccelesti, el ex stelü s, e t calvavit eas. Aqui Daniel prossegue com a visão que havia recebido. Já m ostram os que o objetivo do O nipotente é a preparação dos fiéis para suportarem sérias calam idades, porque não lhes aconteceria nada novo ou inesperado. Ora, a insistência de Daniel neste pon to não causa surpresa, pois seu dever era inform ar os fiéis sobre as pesadas calam idades que estavam chegando, e assim moldálos à paciência e eqüidade. E assim diz ele: O c h ifre to rn o u -se m agnificente, até [chegar] ao ex ército dos céus. Sem a mais leve dúvida, esta figura caracteriza o povo eleito de Deus. Ainda que a Igreja am iúde se veja prostrada no mundo, e seja pisoteada pelos inim igos, e sepultada, todavia ela é sempre preciosa aos olhos de Deus. D aí o profeta adornar a Igreja com este extraordi116 4 0 a EX P O SIÇ Ã O [8.11] nário enaltecim ento, não com o intuito de obter para ela algum a honra diante dos hom ens, m as porque D eus a separou do mundo e lhe providenciou um a herança infalível no céu. A inda que os filhos de D eus sejam peregrinos sobre a terra, e raram ente possu am um a habitação aqui, tornando-se proscritos aos olhos dos hom ens, não obstante são cidadãos celestiais. A utilidade deste ensino nos é evidente ao induzir-nos ele a suportar pacientem en te sem pre que nos virm os prostrados no chão e sem pre que os tiranos e desdenhadores de D eus nos olharem com escárnio. En trem entes, nossa m orada está no céu, e D eus nos nom eia entre as estrelas, ainda que, com o diz Paulo, sejam os com o lixo e escória de todos [IC o 4.13]. Em suma, D eus aqui mostra ao profeta, como num espelho, o apreço que ele tem por sua Igreja, por m ais des prezível seja ela sobre a terra. Esse chifre, pois ,fo i m agnificado diante do exército dos céus, e lançou alguns dentre aquele exército p o r terra, e os apagou das estrelas. Precisam ente com o se proclam asse a liberação das rédeas ao tirano, perm itindo-lhe tratar a Igreja com desprezo, es m agá-la com seus pés e derrubar as estrelas do céu, precisam ente com o se D eus nunca aparecesse para sua proteção. Pois quando D eus quer que nos refugiem os a salvos e seguros em sua m ão, e declara ser im possível que se prevaleça contra seu auxílio, en quanto que os tiranos se assenhoreiam de nós e nos oprim em segundo seus caprichos, isso se assem elha a derrubar as estrelas do céu. Deus, pois, quando nos tom a sob sua guarda, não nos oferece qualquer socorro, mas dissim ula com o se quisesse aban donar-nos nas mãos de nossos inimigos. Portanto, nada é supér fluo nessas expressões do profeta: As estrelas fo ra m p iso tead as e o ex ército celestial foi la n çad o p o r te r r a . E então acrescenta: 11 S im . ele se e ngrandeceu a té c ontra o príncipe d o exército ; e p or ele foi tirado o 11 E t ad P rin cip em e x erc itu s m agnificatum e st,52 e t a b e o ablatum fuit ju g e ,33 et 52 O u seja, avançou até ao príncipe do exército. O u seja. o sacrifício. 117 [8.11] D A N IE L sacrifício d iário e o lugar d e seu santuário foi lançado por terra. p rojectus fuitM lo cu s sanctuaríi ejus. Daniel anuncia aqui aigo ainda mais atroz, a saber: a exalta ção do pequeno chifre contra Deus. Alguns tom am “o príncipe do exército” com o sendo o sumo sacerdote, visto que os prínci pes às vezes são cham ados □'ÍITD, kuhnim , bem com o □"HU?, serinr, m as isso é m uito forçado. O verdadeiro sentido da passa gem im puta a Antíoco um a tal arrogância e estultícia, ao ponto de ele declarar guerra às estrelas do céu, im plicando não só sua oposição à Igreja de Deus, a qual é separada do mundo, m as tam bém em desafiar ao próprio Deus e em resistir seu poder. Ele não só exerceu sua crueldade contra os fiéis, m as profanou o próprio tem plo, e tudo fez para extinguir toda piedade e abolir o culto divino por toda a Judéia, com o explicarem os mais plenam ente em outras passagens. Como, pois, Antíoco não só se enfureceu contra os homens, m as usou de seu m áxim o em penho para sub verter a religião, Daniel relata com o esse ch ifre se ex alto u até m esm o c o n tra o p rín c ip e do exército. D eus é com justiça qua lificado para esse título, porque ele defende sua Igreja e a nutre debaixo de suas asas. Essa expressão deve ser explicada não só pelo prism a da glória e im pério de D eus, m as tam bém de seu favor paternal para conosco, com o ele se digna m anifestar seu cuidado por nós com o se fosse nosso Príncipe. E p o r ele, diz o profeta, foi co m p letam en te tir a d o o s a c rifí cio d iá rio e o lu g a r d e seu s a n tu á rio foi la n çad o p o r te rr a . Estas palavras são terríveis em sua essência; D eus foi assim es poliado de seus direitos, visto que ele escolhera apenas um canto do m undo para seu culto especial. Que pagão, pois, desprezaria essa tolerância de Deus, em perm itir ele ser privado de sua honra legítim a por esse sórdido tirano? Com o já declaramos, A ntíoco não possuía nem grandeza de mente nem coragem bélica, sendo 118 4 0 * EX P O SIÇ Ã O [8.12] que sua habilidade estava estritam ente no cam po da astúcia e dos mais vis atos de bajulação. Além disso, adm itindo que ele tivesse abarcado centenas de A lexandres em sua própria pessoa, que de sígnio é esse do Onipotente em perm itir que seu tem plo fosse profanado e todos os verdadeiros sacrifícios cessados no mundo inteiro? Com o acabei de mencionar, um único canto foi deixado onde D eus quis ser adorado, e então Antíoco se apodera do tem plo e o profana e o m acula com a m áxim a indignidade possível, não deixando assim um único lugar sagrado para o Todo-Poderoso. Por essa razão asseverei que a profecia parece escabrosa de mais. O profeta então aum enta a indignidade ao falar do sacrifí cio perpétuo [diário], Pois D eus sempre deu testem unho de ser seu tem plo o lugar de seu perpétuo ‘repouso’, ou seu ‘habitat’, ou seu ‘trono’. Todavia, ele agora é lançado desse santo lugar, com o se fosse completamente exilado da terra. O templo não podia existir sem sacrifícios, pois que todo o culto sob a lei era um tipo de apêndice ao templo. Visto que Deus prom etera que o sacrifí cio seria perpétuo e eterno, quando Antíoco o destruiu, quem não afirm aria ou que todas as prom essas foram enganosas, ou que toda a autoridade se apartou de D eus, o qual deixou de defender seu direito contra esse ím pio tirano? Seguram ente, essa deve ter sido um a calam idade angustiante e esm agadora para todos os fi éis! E quando, m esm o neste momento, lemos a profecia, todos nossos sentidos são terrificados por sua leitura. Não surpreende, pois, que Deus tenha precavido a seu servo de eventos tão doloro sos, e de males tão incríveis, com o intuito de adm oestar toda sua igreja em tempo hábil e armá-la contra as mais severas tentações, as quais doutra forma chocariam até mesmo os mais corajosos. O sacrifício, pois, diz cie, fo i arrebatado do próprio Deus e o lugar de seu santuário fo i lançado p o r terra ou dissipado. Continuemos: 12 Ei tem pus,55 datum e st su p e r ju g i sa- 12 E um tem po lhe foi dado c o n tra o sa- si Alguns traduzem ‘exército’, eu, porém , aprovo o outro sentido, e o justificarei daqui a pouco. 119 [8.12] D A N IE L c rifício d iário, por causa d a transgressão, e lançou a v erdade p or terra, o fez e pros- crificio in scelere,Me t projiciet veritatem in terram , e t faciet,” et pro sp ere agei. perou. O profeta m itiga a aspereza que agora registra. Parece absur do que D eus conceda a Antíoco tal licença, ou, seja, que seu tem plo seja m aculado e todos os sacrifícios e todo o culto exterm ina dos. É difícil conciliar isso, porque natural e furtivam ente a opi nião se insinuará: possivelm ente D eus esteja constrangido e pri vado do poder de subjugar seus inim igos. O profeta, pois, clara m ente afirm a aqui com o a licença de hum ilhar e oprim ir a Igreja jam ais teria sido concedida a Antíoco sem a perm issão de Deus. Tem po, pois, lhe s e rá d ad o , diz ele. Pela expressão, tempo lhe será dado, ele indica a vontade de Deus, significando: os santos não terão m otivo de sentir-se frustrados quando virem todas as coisas conturbadas e confundidas em cada direção, quando Deus adm inistrará todas essas perplexidades por meio de seu ju ízo se creto. Tempo, pois, lhe será dado, significando que A ntíoco nada pode fazer por sua desenfreada e furiosa audácia, a m enos que divinam ente lhe seja permitido e previam ente limitado. N3X, tzeba, significa tanto ‘exército’ com o ‘tem po’, m as o últim o signifi cado é o m ais adequado aqui; pois quando é traduzido “um exér cito lhe será dado” , o sentido parece forçado. Sinto-m e mais dis posto a abraçar o sentido de um tem po que lhe será permitido; ou, seja, D eus testará a paciência de sua Igreja por certo tempo definido, e então volverá seus problem as para um fim determ ina do. Sabem os ser impossível sustentar o espírito dos fiéis de outro m odo que não seja por sua expectativa de um térm ino favorável e pela esperança de em ergir do abism o de sofrim ento. Eis, pois, a razão por que D eus m ostra a seu profeta, através de visão, a dura ção tem porária do dom ínio de Antíoco. Um período, pois, lhe s e rá desig n ad o so b re o sacrifício p erp étu o . Significando que. 56 Ou. por “com a da impiedade”, literalmente, “tem po será dado" - o tem po futuro. 57 O u. seja, terá a execução preparada, com o às vezes dizemos. 120 4 0 a EX P O SIÇ Ã O [8.12] seja qual for sua intenção, ele não abolirá o culto divino. Porque, por m ais que ele lute, D eus não perm itirá que os sacrifícios pere çam com pletam ente e para sempre; ele os restaurará em seu d e vido tempo, com o m ais adiante veremos; e quando chegarm os ao final, descobrirem os o contexto fluindo em harm onia com este significado - um tempo lhe será dado sobre o sacrifício contínuo. Ele então acrescenta PU7D3, beph-sheng, “em im piedade” ou “em pecado” . Prefiro a tradução sim ples, “em pecado” em vez de “por meio do pecado” , ainda que diferentes sentidos sejam evo cados segundo os diferentes conceitos dos intérpretes. É melhor deixar que cada um escolha livremente, e assim sim plesm ente traduzir “em im piedade” ou “em pecado". A lguns o aplicam a Antíoco, porque im piam ente profanou o tem po de D eus e aboliu os sacrifícios. Este sentido é provável, m as adicionarei outros, e então direi qual deles me agrada mais. A lguns entendem “em pecado” com o um a referência aos sacerdotes, porque, através da perfídia de Jason, Antíoco entrou na cidade, profanou o tem plo e introduziu aquelas abom inações que exterm inaram toda a pieda de e o culto divino [2 M acabeus 4.7]. Como Jason desejava afas tar o sacerdócio de seu irm ão Onias, ele abriu os portões para A ntíoco; então seguiu-se um grande m orticínio, quando todos os adeptos de O nias foram cruelm ente mortos. M ais tarde M enelau expulsou Jason novam ente com sem elhante perfídia. A lguns tra duzem “por m eio da im piedade” , visto que esses sacerdotes in duziram A ntíoco a praticar crueldade na cidade santa e violar o próprio templo. Outros chegam mais perto do sentido real, su pondo que os sacrifícios foram interrom pidos através da im pie dade, porque foram adulterados pelos sacerdotes. M as isso me parece restrito dem ais. Em m inha opinião, inclino-m e antes para o ponto de vista dos que tom am ‘im piedade’ com o um a causa ou origem , com isso ensinando quão justam ente foram os judeus castigados por seus pecados. Já expliquei quão apropriadam ente a visão se limitou a um tem po e foi controlada pela perm issão e 121 [8.12] D A N IE L conselho secreto de Deus. A causa é aqui expressa; pois poderse-ia ainda objetar: “Com o é possível que Deus se subm eta, a si e a seu sacro nome, ao ridículo dos ímpios, e ainda desam pare a seu próprio povo? O que ele pretendia com isso?” O profeta, pois, assinala esta causa: os judeus devem sofrer a profanação do tem plo, a triste devastação de toda a cidade e seu horrível m orticínio, com o um a recom pensada por seus pecados. Um tempo, pois, lhe será designado sobre o sacrifício perpétuo em p eca d o; ou, seja, em virtude do pecado. Aqui vemos com o Deus, por um lado, m odera o peso dos males que sobrevieram aos judeus, e lhes re vela algum a bondade, para que dolorosa ansiedade e desespero não consum issem o povo esm agado; por outro lado, ele os hum i lha e os adm oesta para que confessem seus pecados, e então insta com eles para que apliquem suas mentes ao arrependim ento, de clarando que seus próprios pecados eram a causa de suas afli ções. Ele assim m ostra com o a fonte de todos seus m ales estava nos próprios judeus, enquanto a ira de Deus era provocada por seus vícios. E necessário parar aqui até amanhã. ORAÇÃO Onipotente Deus, visto que nos tens iluminado pelo ensino de teu evangelho, e tens posto diante de nossos olhos teu unigénito Filho como o Sol da Justiça para governar-nos, e tens designado separarnos do mundo inteiro e fazer-nos teu povo peculiar e preparar para nós uma sede segura no céu, concede-nos, a ti oramos, que sejamos herdeiros da vida eterna. Concede-nos também constante meditação em tua santa vocação e que possam os empreender nossa peregrina ção sobre a terra com espíritos contemplativos e inclinados para ti. Que meditemos sobre a justiça de teu reino e devotemo-nos inteira mente a ti. Protege-nos com tua mão agora até o fim , e que marche mos ousadamente sob tua bandeira, até que, por fim , cheguemos àquele bendito descanso onde o fru to de nossa vitória nos aguarda em Jesus Cristo nosso Senhor. Amém. 122 4 1 « fexposição qui Daniel faz m enção de um entre os m uitos crim es de c s í Antíoco: seu ato de lançar p o r terra a verdade. E sta ex pressão deve ser anexada à prim eira; pois A ntíoco não poderia privar a Deus de seu culto legítim o sem abolir a sã doutrina. O anjo aqui parece expressar a razão para a destruição do santuário, porque o culto devido a D eus dependia da instrução da lei, que é aqui subentendida pela palavra ‘verdade’. Esta m ensagem , pois, declara que nenhum a religião é agradável a D eus a m enos que seja fundada sobre a verdade; pois Deus, segundo o ensino inva riável das Escrituras, não quer ser cultuado segundo os caprichos hum anos, mas, antes, prova a obediência dos hom ens prescre vendo o que ele exige e aprova, para que os hom ens não ultrapas sem esses limites. É preciso que aqui observem os a união que Daniel agora estabelece entre a subversão e a abolição do culto de Deus e o ato de lançar a verdade ao chão, quando ela nem obtém sua dignidade, nem subjuga a si todos os mortais. Que se leia: ele lançou p o r terra a verdade; assim fazendo um a distinção entre céu e terra. E caso nos agrade lê-lo assim, o sentido será: a verdade ainda perm anece estável m esm o quando pereça sobre a terra, porque ela m antém sua posição no céu. A s sim o sentido seria: depois da abolição do culto divino, e a cessa ção dos sacrifícios, a piedade não m ais pôde existir entre os m or tais. P or fim ele acrescenta: ele será bem sucedido e prosperará. A prim eira palavra aqui im plica execução. D eus queria que toda 123 [8.13, 14] D A N IE L sua Igreja fosse adm oestada quanto aos prósperos sucessos de Antíoco, para que os fiéis não se sentissem deprim idos ao visua lizarem o ímpio tirano tão petulante e im pudentem ente profa nando o tem plo de D eus e destruindo com pletam ente sua reli gião, com o se ele quisesse provocar a Deus pessoalm ente a um a confrontação. Pois tal conduta era equivalente a um a direta de claração de guerra contra Deus. Pois seu sucesso traria tribulação aos santos, com o se o tirano fosse superior a D eus mesmo. D aí esta predição advertir os fiéis contra a novidade ou subitaneidade de tudo o que pudesse ocorrer. Prossigamos: 13 E ntão ouvi um san to falando, e disse ou tro san to àquele q ue falava: A té q u an d o d u ra rá a v isão a ce rca d o sacrifício d iá r io e a transgressão desoladora, para que seja e n tre g u e tanto o santuário q uanto o e x ército , a fim d e que sejam pisados? 13 E t audivi san ctu m un u m loquentem : dixit ergo sanctus unus m irabiii, dicemus postea d e voce, loquens, Q u o u sq u e visio ju g is sacriflcii, e t sc e le ris v a stan tis ad d an d u m ,’“ e t sa n c tu a riu m , e t e x e rc itu s conculcatio.” 14 E e le m e d iss e : A té d o is m il e trezento s d ia s ;e n tio o s a n tu á r io será purificado. 14 E t dixit m ihi, ad vesperum , m ane,“ duo m illia e t trec en ti anni: e t ju stific a b itu r sanctuarium . Aqui ele expressa mais claram ente o que disse anteriorm en te, desvendando a intenção divina de consolar e am enizar os so frim entos dos santos, para que não fossem esm agados pela seve ridade de suas provações, à vista de um tirano ímpio e dom inador no santuário de Deus. A lém disso, o sítio no qual Deus prom ete ra estabelecer sua perpétua habitação estava entregue a ím pias superstições, pois o ídolo de Júpiter Olímpio fora erigido ali, com o nos inform a a história dos M acabeus [2 M acabeus 1.57; 6.2]. D eus, pois, queria sustentar seus servos, para que um a tão severa tentação não os esm agasse, e para que um a provação em formas M Há quem traduza: A té quando se perm itirá a visão? Mas é antes preferível tratar a questão pelas regras gram aticais - “A té quando se perm itirá a visão do sacrifício perpétuo e a impiedade devastadora?" 5’ Ou, seja. para ser pisado. Esta palavra pode ser repetida. 60 O u. seja, até a tarde e a manhã. A nota de W intle sobre estes versículos são m uito explanatórias e concordam com todos os com entários de Calvino. Ver D issertação sobre este versículo. 124 4 1 * E X P 0 5 IÇ Ã 0 [8.13, 14] tão variadas não os levasse à rendição e a torná-los deficientes em sua piedade pela falta de coragem . M as enquanto Daniel fica estupefato com profunda perplexidade, Deus socorre sua fraque za com a presença de um anjo. Daniel m esm o, sem dúvida, in quiriu sobre a visão, com o o verem os fazer m ais adiante; aqui, porém . Deus queria contentá-lo quando viu o santo varão tão vencido pelo tem or que quase não ousava form ular qualquer per gunta. A qui, pois, D eus oferece um a inusitada prova de sua bon dade e indulgência paternais, ao interpor e enviar seu anjo para fazer inquirições em nom e do profeta. Ele diz, pois, que ouviu um santo, significando um anjo. Porque, ainda que Deus se digne em cham ar os fiéis, enquanto habitam neste mundo, por um títu lo tão honroso, todavia a pureza superior dos anjos nos é fam i liar, visto que são totalm ente isentos dos desejos d a carne. Mas, infelizm ente, estam os detidos neste presídio e encarcerados na m asm orra do pecado e contam inados por profunda corrupção. A santidade dos anjos, contudo, é m uito m aior que a dos mortais, e assim este atributo de ‘santidade’ lhes é apropriadam ente aplica da. Quando D aniel se viu arrebatado pelo espírito profético, ele foi separado da socie'dade dos homens e se viu adm itido à socie dade dos anjos. U m a n jo , pois, d isse ao q u e é m arav ilh o so . Os hebreus am iúde usam esta expressão quando querem dizer: “quem quer que seja" - ploni alm oni - , e a aplicam tanto a lugares quanto a pessoas. U sam -na tam bém em referência a qualquer lugar que lhes seja desconhecido ou velado. Tratam o substantivo com o com posto de duas palavras, e m uitos o interpretam em referência a alguém desconhecido, m as creio que a palavra é m ais enfática do que m eramente isso.61 D aniel aqui apresenta um anjo falando, e adiciona dignidade a sua descrição denom inando-o de ‘santo’. Sem dúvida, pois, a pessoa a quem o anjo fez a pergunta era seu 61 Calvino q uer significar que os judeus usavam essas palavras para expressarem a idéia da frase latina: “omne ignotum pro magnifico." 125 [8.13, 14] D A N IE L superior; não é provável que ele seja cham ado ‘alguém ’ quando o anjo é intitulado um santo. A razão, pois, requer que a expres são seja aplicada a algum anjo superior aos ordinários; pois, com o D aniel o cham a um anjo ‘santo’, assim ele teria cham ado os de mais, com o verem os mais adiante. Não obstante, quando se trata de um ser distinto, ele usa a palavra palm oni, e sua eti m ologia nos guia a seu sentido, com o que significando algo m is terioso e incompreensível. Então, quem não percebe que a pes soa aqui im plícita é Cristo, o qual é o Príncipe dos anjos e m uitís sim o superior a todos eles? No capítulo 9 de Isaías [v. 6], ele é cham ado pela, ‘o M aravilhoso’. A palavra no texto é com posta, com o já dissemos, visto, porém, que K*?D, pela, significa em hebraico ‘oculto’, visto Cristo ser assim cham ado, e visto em Juizes 3 .1 Deus reivindicar esse título com o peculiaridade sua, todos esses pontos concordam plenam ente bem. O sentido, pois, é que um anjo veio a Cristo por causa de Daniel e de toda a Igre ja, e busca da parte dele, com o o supremo M estre e Senhor, o significado das declarações que acabam os de ouvir. N ão carece que fiquemos surpresos com anjos inquirindo sobre o futuro, como se este lhes fosse desconhecido. E tão-som ente propriedade da D eidade conhecer todas as coisas, enquanto que o conhecim ento dos anjos é necessariam ente limitado. Paulo nos ensina a m ara vilharm o-nos de a Igreja ser reunida dentre o povo profano e es tranho; esse era um mistério velado dos próprios anjos, antes de D eus realmente revelar-se com o o Pai do m undo inteiro [Ef 3.10]. D aí não haver absurdo algum em supor-se que os anjos queiram conhecer esse m istério, quando a ignorância não é necessaria m ente m erecedora de vergonha, e quando Deus não ergueu suas criaturas a seu próprio nível. E seu dom ínio peculiar conhecer todas as coisas e m anter tudo diante de seus olhos. O anjo deseja com preender esse m istério, não tanto para si mesmo, mas por causa de toda a Igreja. Porquanto sabemos que os m esm os são nossos m inistros, de acordo com o claro testem unho do apóstolo 126 4 1 * EX PO SIÇ Ã O 18.13, 14] [Hb 1.14]. Visto que m antêm sobre nós cuidadosa vigilância, não nos surpreende encontrar o anjo inquirindo solicitam ente acerca desta visão, e assim beneficiando a Igreja toda pela mão de Daniel. Entrem entes, devem os observar com o Cristo é o Príncipe dos anjos e tam bém seu instrutor, porquanto ele é a eterna Sabedoria de Deus. Os anjos, pois, devem receber dessa Fonte singular toda a luz de sua inteligência. A ssim os anjos, por m eio de seu exem plo, nos atraem para Cristo, e nos induzem a dedicar-nos a ele através da persuasão de que essa é a suprem a e única Sabedoria. Se somos seus discípulos, sendo-lhe obedientes, hum ildes e pas síveis de instrução, desejarem os conhecer som ente o que ele nos quiser manifestar. O anjo, porém, pergunta: Q u a l é o significado d a visão d o sacrifício p e rp é tu o e do pecad o ? Ou, seja, qual é o objetivo da visão concernente à anulação do sacrifício perpétuo e concernente ao pecado que assola? Quanto ao segundo ponto, explicam os na m ensagem anterior as várias opiniões dos intér pretes, alguns torcendo-a em direção a A ntíoco que im piam ente ousou violar o tem plo de D eus; e outros, em direção aos sacerdo tes. D issem os, porém , que a intenção visava ao povo, para que m uitos, com o era o costum e, não se envergonhassem do O nipo tente por afligir ele tão pesadam ente a Igreja. Deus, porém , que ria dar testem unho da origem dessa devastação com o sendo os pecados do povo. É justam ente com o se o anjo dissesse: Até quan do os sacrifícios cessarão? A té quando durará essa vingança pela qual D eus castigará a im piedade de seu povo? Pois o pecado é denom inado devastação, por ser ele a causa de tal calamidade. Em seguida se acrescenta: até q u a n d o o s a n tu á rio e o exército se rã o piso tead o s? Ou, seja, até quando o culto divino e a genuí na piedade, e o próprio povo, serão pisoteados sob tão cruel tira nia de A ntíoco? Esta pergunta, porém , tem m uito m ais eficácia do que se o profeta dissera, com o vimos na m ensagem anterior, que o castigo seria conveniente e tem porário. A gora se fazia ne cessário explicar o que já foi expresso m ais claram ente. Assim 127 18.13, 14] D A N IE L esta questão foi interposta com o intuito de tom ar Daniel mais atento e despertar o povo, com sua narrativa, a buscar o aprendi zado. Pois não é um acontecim ento com um os anjos se aproxi m arem de Cristo m ovidos por nosso interesse e inquirir sobre os acontecimentos que dizem respeito ao estado e segurança da Igre ja. Com o, pois, os anjos tomam a seu encargo esse dever, sería mos piores que um a pedreira se não nos m ovêssem os à solicitu de e prudência na busca do conhecim ento divino. Vemos, pois, por que esta passagem acerca do anjo se interpõe. Segue-se então a frase: E ele m e disse. Isso se deve aplicar não à inquirição do anjo, mas ao M aravilhoso. D aí deduzirm os a grande ansiedade do anjo sobre a interpretação da profecia, não em seu benefício, mas para o com um benefício dos santos. No que concerne a este M aravilhoso, em bora esteja eu persuadido de ser ele o Filho de Deus, todavia, quem quer que seja ele, certa m ente não rejeita o pedido do anjo. P or que, pois, ele se dirige a Daniel e não ao anjo? Porque o anjo não buscava seu próprio benefício, mas lutava em prol da causa de toda a Igreja, segundo já m ostram os com o os anjos se ocupam de nossa salvação. A s sim também percebemos com o o anjo nota a perplexidade do profeta, ficando quase morto e sem ter coragem de inquirir do anjo, ou pelo menos não ousava quebrar o silêncio de um a vez; pois em seguida se recobra e é erguido pela mão do anjo, como logo veremos. O M arav ilh o so m e d isse - ou, seja, o incom preensível ou o om inoso me disse: p o r d u a s m il e tre z e n ta s ta rd e s e m a n h ã s, e e n tã o o s a n tu á rio s e rá ju stificad o . Aqui os hebreus m utuam en te discordam se devem entender o núm ero de anos ou meses; m as é surpreendente perceber quão grosseiram ente se deixam enganar por um a questão tão clara. A expressão tarde e manhã não deixa dúvida, visto que Cristo claram ente tem em mente dois mil e trezentos dias; pois que outro sentido poderia ter a frase tarde e m a n h ã l Ela não pode ser entendida nem de anos nem de 128 4 1 ‘ EX PO SIÇ Ã O [8.13, 14] meses. Evidentem ente, temos de entender aqui dias naturais, con sistindo de vinte e quatro horas cada um. Os que o entendem com o sendo anos e m eses estão m iseravelm ente equivocados, e até ridículos em seus cálculos. Pois alguns com eçam a calcular o tem po a partir de Sam uel, em seguida descem ao reinado de Saul e por fim ao de Davi; e assim tolam ente pigarreiam por não en tenderem a intenção de Cristo, que queria que sua Igreja fosse prevenida sobre a vinda de im périos e de m atanças, com o propó sito de tornar os fiéis invencíveis, por m ais duram ente fossem oprim idos de todos os lados. Cristo, pois, queria projetar luz di retam ente em todos os eleitos através da aproxim ação das trevas sob a tirania de Antíoco, bem com o assegurar-lhes que nas pró prias profundezas dela eles não seriam desam parados do favor divino. A esperança assim elevaria suas m entes e todos seus sen tidos em direção ao térm ino prom etido. C om que propósito, pois, esses intérpretes falam dos reinados de Saul e D avi? Percebem os ser isso totalm ente estranho e adverso à intenção de C risto e ao uso desta profecia. Não menos absurda é a conjetura dos que tagarelam em torno de meses. Sua refutação ocuparia três ou qua tro horas, e seria um injusto desperdício de tempo, totalm ente sem proveito. É suficiente deduzir das palavras este significado simples: Cristo não fala aqui de anos e m eses, m as de dias. D eve mos então buscar a verdadeira interpretação da passagem à luz de todo o contexto. Já dem onstram os quão im possível é explicar esta profecia de outra forma que não aponte para A ntíoco; o pró prio evento prova ser esse o significado. Cegos de fato seriam os que não sustentam este princípio - o pequeno chifre procedeu de um a daquelas extraordinárias e em inentes pessoas que surgiram em lugar de um chifre m uito grande. Os garotos sem saberem disso, estão lendo as histórias autorizadas daqueles tempos. Vis to que C risto aqui aludia à tirania de Antíoco, devem os observar com o suas palavras se harm onizam com os fatos. C risto com puta 2.300 dias para a profanação do santuário, e esse período com 129 [8.13, 14] D A N IE L preende seis anos e cerca de quatro meses. D epois usa períodos intercalados, visto que doze meses lunares não correspondem ao curso do sol. O m esm o costum e prevalecia entre os gregos e os rom anos igualmente. Júlio C ésar prim eiro organizou p ara nós o ano solar e supriu o defeito por dias intercalados, de m odo que os m eses pudessem concordar com o curso do sol. M as, seja com o for, esses dias, com o eu já disse, perfazem seis anos e três meses e meio. O ra, se com pararm os o testem unho da história, e especi alm ente do livro dos M acabeus, com esta profecia descobrire mos que essa raça foi m iseravelm ente oprim ida por seis anos sob a tirania de Antíoco. O ídolo de O lím pia Jove não perm aneceu no tem plo por seis anos contínuos, m as o com eço da profanação ocorreu no prim eiro ataque, com o se ele insultasse o próprio ros to de Deus. Não admira, pois, que Daniel tenha entendido esta visão com o equivalente a seis anos e cerca de um terço, porque Antíoco então insultou o culto divino e a Lei; e quando ele derra m ou sangue inocente indiscrim inadam ente, ninguém ousaria pu blicam ente resisti-lo. Visto, pois, que a religião ficou então pros trada por terra até a purificação do tem plo, vemos quão clara m ente a profecia e a história concordam , no que diz respeito a esta narrativa. A lém disso, é evidente que a purificação do tem plo não poderia ter term inado no sexto ano corrente, m as no mês 1*?DD, Keslu, correspondendo a outubro ou novem bro, com o os hom ens eruditos judiciosam ente decidem que ele foi profanado. Pois este mês entre os judeus com eça às vezes em m eados de outubro e às vezes no final, segundo o curso da lua; pois disse mos que os meses e os anos eram lunares. N o m ês K eslu o tem plo foi profanado; no m ês T1N, A der, cerca de três m eses depois, quase no encerram ento, os m acabeus o purificaram [1 M acabeus 4.36]. E assim a história confirm a de todas as form as o que D ani el predisse muitos séculos antes - sim , quase três séculos antes de sua concretização. Pois isso ocorreu um século e m eio depois da m orte de Alexandre. A lgum tem po também já havia passado 130 4 1 * EX P O SIÇ Ã O [8.15] quando houve oito ou dez reis da Pérsia entre a m orte de C iro e Dario. Recordo apenas os principais eventos, e deve ser-nos sufi ciente saber com o as predições de D aniel se cum priram em seu próprio tempo, com o os historiadores claram ente narram . Sem a mais leve dúvida, Cristo predisse a profanação do tem plo, e isso deixaria o espírito dos santos deprim idos, com o se Deus os hou vera traído, houvera desistido de todo e qualquer cuidado do tem plo e renunciado inteiram ente sua eleição e seu pacto. Cristo, pois, queria sustentar o espírito dos fiéis com esta predição, com isso inform ando-os de quão plenam ente m ereciam esses males futuros em decorrência de haverem provocado a ira de Deus; e no entanto sua punição seria tem porária, porque o próprio Deus que anunciou sua aproxim ação prom eteu, ao m esm o tempo, um resultado de prosperidade. No tocante à frase o santuário será justificado, há quem a traduz assim: “Então o santuário será expiado” ; eu, porém , prefi ro reter o sentido próprio da palavra. Sabem os quão costum eiramente os hebreus usam a palavra ‘ju stificar’ quando falam de direitos. Q uando seus próprios direitos são restaurados em rela ção aos que foram privados deles - quando um escravo é abenço ado com sua liberdade quando aquele que foi injustam ente oprim ido é vencedor em sua causa, os hebreus usam esta palavra “justificado’. Visto que o santuário de D eus esteve sujeito a infâ mia, com a imagem de O lím pia Jove sendo exibida ali, todo res peito por ele se desvanecera; pois sabemos com o a glória do tem plo provinha do culto divino. Com o o tem plo havia sido profana do por tão grande desgraça, então ele foi ‘justificado’, quando Deus estabeleceu novam ente seus próprios sacrifícios e restau rou seu culto puro com o prescrito na Lei. O santuário, pois, será justificado; ou, seja, vindicado daquela desgraça a que outrora estivera sujeito. Prossigamos: 15 E a conteceu que, havendo eu. D aniel, lido a visão e buscado o significado, en- 15 Et factum e st, cum viderem e g o D anie l visionem , e t q u e re re m intelligentiam , 131 [8.15] D A N IE L tão . eis q u e se pôs d ian te d e m im um a c o m o que aparência d e hom em . ecce stetit coram m e quasi aspectus, vel, species. viri. D aniel um a vez m ais confirm a sua declaração original. M as antes ele desce à interpretação, elabora um prefácio concernente à fidelidade e infalibilidade do oráculo, para que a Igreja não hesite em considerar seu pronunciam ento com o realm ente p ro cedente de Deus. Ao agir assim, ele não usa de artifício com o fazem os retóricos; Deus, porém, queria estim ular a ele e aos santos a m editarem nesta profecia, cujo conhecim ento era então tão peculiarm ente necessário e proveitoso. D iz ele, pois; q u a n d o b u sq u e i o significado d esta visão, pôs-se d ia n te d e m im u m a com o q u e a p a rê n c ia d e hom em . Ora, D eus havia antecipado este desejo do profeta por m eio da resposta que o anjo recebeu de C risto que tinha em parte explicado o sentido desta visão. Então D aniel, percebendo que Deus o havia antecipado, não esperando por sua inquirição, reúne coragem e, confiando na disposição de D eus em fornecer-lhe um a resposta, deseja aprender o assunto m ais claram ente; não que ele fosse totalm ente ignorante do tema, m as ainda não percebia com suficiente clareza qual era a utilida de para si e para toda a Igreja. Vemos, pois, com o a resposta de C risto só lhe ofereceu um a prelibação da visão e apenas insistiu com ele a avançar para a plena com preensão dela. M uitos ficam im ediatam ente satisfeitos com apenas um a m oderada inform a ção, e tão logo tenha com preendido um a porção de algum tem a rejeitam toda e qualquer adição, e muitos tão logo param nos prim eiros rudim entos, e sua obstinação obstrui aquele conheci mento com pleto e tão necessário. Daniel, pois, dem onstra estar mui longe de tal indisposição, visto que ele se tornara m ais aten to para ouvir dos lábios de Cristo o real objetivo da visão. En quanto atentava para entender a visão, diz ele, eis que se pôs diante de m im um a com o que aparência de homem. E provável que tenham os de interpretar esta passagem com o um a referência a Cristo que agora é cham ado homem, com o anteriormente [7.13]. 132 4 1 a EX P O SIÇ Ã O [8.16] Porquanto ele ainda não havia se vestido de nossa carne, para que pudesse apropriadam ente assum ir o título hom em ; mas aqui era com o se fosse hom em , porquanto queria que os santos pais experim entassem de antem ão o que podiam entender de sua fu tura vinda com o M ediador, quando se vestisse da natureza hu m ana com o D eus m anifestado em carne [1 Tm 3.16]. Assim D a niel fala adequadam ente com o fez quando disse: Cristo lhe apa receu sob o aspecto de homem. M as ele adiciona com o mesmo propósito: 16 E ouvi u m a v oz d e h o m em às m argens d o U lai, a qual clam ou e disse: G abriel, fa ça este hom em en ten d er a v isão. 16 E t audivi v ocem hom inis in U lai,“ et clam avit, e t dixit, G abriel, d o c e h an c visionem . Ele não usa a partícula que im plica adequação, m as diz ter ouvido a voz de um hom em , porque não mais trata de um homem nem de um a figura, m as de um a voz. E suficiente dizer de um a vez que era sem elhante a hom em , não exatam ente um homem, m as m eram ente sob a im agem e aparência de homem. Cristo, pois, apareceu sob a sem elhança de homem, e é cham ado assim, visto que a Escritura am iúde relata com o os anjos às vezes apare ciam sob a form a hum ana e são cham ados indiscrim inadam ente ou anjos ou hom ens [Jz 8.3], Também neste ponto D aniel relata a aparição de um hom em , ou o aspecto de um homem, na verdade im propriam ente, m as sem qualquer risco de equívoco; pois em seguida adm oesta os fiéis, dizendo que essa pessoa não estava vestida com a substância de cam e, m as sim plesm ente tinha um a form a e aspecto hum anos. O u v i, pois, u m a voz h u m a n a às m a rg e n s d o rio. D isto deduzim os que a m esm a pessoa é aqui indicada, de quem há pouco se fez menção, visto que ele dirige ordens a um anjo; daí, isso só pode referir-se a Cristo. G ab riel, diz ele, in s tru i este hom em . Observam os quem fala às margens do rio, aqui ordenando a G abriel, com o sendo seu 62 Ou, seja. entre as duas m argens do rio. 133 [8.16] D A N IE L superior. Gabriel, com o o nom e de um anjo, é sobejam ente co nhecido à luz de outras passagens da Escritura [Lc 1.19, 26]; e sua etim ologia, “ a força de D eus”, é m uito adequada a este signi ficado. Sem qualquer dúvida, o anjo aqui recebe de Cristo suas ordens. E assim notam os o supremo poder e autoridade represen tados sob a form a e aspecto de um homem, bem com o a obediên cia retratada em G abriel, o qual se desincum be do dever a ele im posto. A Deidade de Cristo é inferida deste fato, visto não po der ele em itir ordens aos anjos sem ter ou autoridade especial ou ser o próprio Deus. M as quando se u sa a frase, “sem elhante a hom em ” , somos inform ados de sua m anifesta superioridade ao homem. E o que isso im plica? N ão natureza angélica, m as divi na. Cristo, ao apresentar-se assim sob um a form a hum ana, m os tra, por meio de um a espécie de prefiguração, com o ele se to m a ria homem quando chegasse a plenitude do tempo. Então real m ente se m anifestaria com o a cabeça da Igreja e o guardião da salvação dos santos. Pois ele mesmo prova ter poder sobre todos os anjos, quando ordena a G abriel que exercesse o ofício de ins trutor do profeta. A diarem os o restante. ORAÇÃO Onipotente Deus, visto que nestes dias a terra se encontra cheia de imundícies que maculam o sacro culto a teu Nome, visto que quase não há um canto do mundo que Satanás não tenha corrompido, e visto que lua verdade é p or toda parte adulterada, permite que per severemos e permaneçamos firm es no curso de nossa piedade. Que estejamos sempre atentos àquela luz que primeiramente fo i posta di ante de nós na Lei e que brilha sobre nós agora mais plenamente sob o evangelho. Que jam ais nos mergulhemos naquelas trevas nas quais vemos o mundo mergulhado e pelas quais os que parecem ser mais perspicazes se acham envoltos. Concede-nos sempre fo rça para se guirm os aquela vida que nos mostraste, até que cheguemos àquele alvo que puseste diante dos olhos de nossa f é e rumo ao qual diaria mente nos convidas a avançar mediante teu unigénito Filho. Amém. 134 g 42a .xposição 17 E n tio ele ap ro x im o u -se d e o n d e e u estava; e, a o aproxim ar-se, tiv e m edo, e c a f so b re m eu rosto; e le, porém , m e d isse: E ntenda, 6 filh o d o h om em , p o is e sta visão se cum prirá n o tem po d o fim . 17 Et venit ad stationem m eam : ei cum veniret territus sum , et cecid i su p er faciem m eam : tunc d ix it ad m e, Intellige, fíli hom inis, q u ia a d tem p u s finis visio.43 N ão reiterarei o que já expliquei. D arei seqüência ao que já com ecei, a saber: a carência que o profeta tinha de instrução, porque não conseguia entender a visão sem um intérprete; daí por que ao anjo se ordenara que explicasse esta revelação divina mais plenam ente. M as antes de narrar isso, ele diz: fiq u ei a m e d ro n ta d o com a a p ro x im a ç ã o d o an jo . Sem dúvida, essa reve rência estava sem pre presente em sua mente. Sem pre que perce bia ser cham ado ou instruído por D eus, se sentia dom inado pelo temor; aqui, porém , é expresso um sentim ento especial, visto que Deus queria influenciar sua m ente com o intuito de deixar-nos um exem plo e fazer-nos m ais atentos. Aqui Daniel nos explica o estado de sua própria m ente, enaltecendo a m agnitude e a im por tância da visão, para que não lêssem os displicentem ente o que ele a seguir relatará e encarássem os a ocasião com sobeja serie dade. Pois Deus usou o anjo com o seu servo para explicar ao profeta sua intenção; ao m esm o tempo, interiorm ente tocou sua m ente para, por m eio de seu Espírito, nos m ostrar o cam inho, e assim ele não só nos educaria com vistas à docilidade, m as tam bém ao temor. Então ele diz: fiq u ei a m e d ro n ta d o e caí. Isso, ' Ou, no tem po d o fim d a visão. 135 [8.17] D A N IE L com o já dissemos, era com um ao profeta, com o deve ser em rela ção a todos os santos. Paulo também, ao celebrar o efeito e poder da profecia, diz: se algum incrédulo entrar na assem bléia e ouvir um profeta falando em nom e de Deus, prostrar-se-á, diz ele, so bre seu rosto [IC o 14.25]. Se isso sucede ao incrédulo, quão gran de será nossa estupidez, a menos que recebam os com mais reve rência e hum ildade o que sabemos ter sido pronunciado pelos lábios de Deus! Entrem entes, devem os recordar o que falei há pouco: a im portância do presente oráculo tal com o nos é aqui recom endado pelo profeta; pois ele caiu sobre seu rosto m ovido de pavor, com o repetirá no próxim o versículo. Tam pouco é supérflua a seguinte exortação: e n te n d a , diz ele, ó filho d e A dão. Ser-nos-ia de pouco proveito ser m ovidos e excitados por algum tempo, a menos que nossas m entes estejam em seguida dispostas a ouvir. Pois muitos são tocados pelo tem or quando D eus se lhes manifesta; ou, seja, quando ele os com pele a sentir a força e o poder de seu domínio; porém continuam em sua obtusidade, e assim seu pavor se torna sem proveito. Aqui, porém , Daniel faz certa diferença entre ele e o profano, o qual se sente apenas aturdido, porém de m odo algum preparado para a obediência. Ao mesmo tempo, ele relata com o seu próprio excitam ento foi afetado pela assistência do anjo. O temor, pois, do qual acabam os de fazer menção, foi um a preparação para a doci lidade; esse terror, porém, teria sido em si m esm o inútil se não fora acrescentado: p a r a q u e ele e n ten d a. É indispensável que entendam os que a piedade não consiste m eram ente em reconhecer-se o tem or de Deus, m as requer-se tam bém obediência, pre parando-nos para recebermos com em oções tranqüilas e equili bradas tudo o que nos será ensinado. D evem os observar diligen tem ente essa ordem. E então prossegue: pois e sta visão se c u m p rirá no te m p o d o fim . H á quem ju n ta |'p _ni7l7, legneth-ketz, fazendo o sentido: “ no fim do tem po” , f p , ketz, estando neste sentido no caso ge 136 4 2 * EX P O SIÇ Ã O 18.18] nitivo à guisa de um epíteto, com o os hebreus com um ente o usam. D eduzem este sentido: a visão será p o r certo tem po prefixado. Outros, porém, preferem : o fim da visão será por certo tempo. Creio que este últim o sentido é o melhor, visto o prim eiro parecer-m e forçado. No côm puto geral, não é de m uita importância, todavia, com o essa form a de expressão é a m ais fácil, ou, seja, o fim ou o cum primento da visão seria em um tem po definido, achei m elhor seguir essa interpretação. O anjo assevera, pois, que isso não era vã especulação, m as um a causa associada a seu efeito, o qual teria sua com pletação num determ inado período. Haverá um fim [cum prim ento}, pois, da visão em seu tem po\ significan do: o que você agora vê não será desvanecido nem será destruí do, porém seu fim se concretizará quando o tem po chegar, o qual Deus já determinou. Y p, ketz, é am iúde tom ado nesse sentido. Daí, haverá um fim [cum prim ento] da visão; ou, seja, a visão será com pletada quando chegar o tem po oportuno. Devem os ter em m ente esta exortação do anjo, porque, a não ser que sejamos inabalavelmente persuadidos da fixidez de tudo quanto D eus fala, não estarem os prontos a receber tudo quanto D eus pronuncia. M as quando somos convencidos dessa afirm ação, Deus nunca separa sua mão de sua boca - significando: ele nunca se contra ria, senão que seu poder acom panha sua palavra, e assim ele cum pre tudo o que declara; isso se converte num infalível e firme fundam ento de nossa fé. Esta adm oestação do anjo deve esten der-se geralm ente a toda a Escritura, visto D eus não pronunciar palavras ao vento, segundo a frase popular. Pois nada sucede pre cipitadam ente, mas tão logo ele fala, sua verdade, a própria m a téria e seu efeito necessário, são todos consistentes. Prossigamos: 18 O ra, e nquanto e le falava com igo, c a í c o m o rosto em te n a , em p rofundo sono; cie. porém , m e tocou, e m e fez fica r em pé. 18 E t cum loqueretur m ecum . sopitus corrui su p er faciem m eam in terram , e t tetigit m e,M e t restitu it m e su p e r stationem m eam .'8 M Alguns traduzem: "aproxim ou-se de m im ", interpretaç5o essa tolerável. 45 Literalm ente, “sobre m eus pés”, como no francês antigo, “en mon estre". 137 [8.19] D A N IE L O profeta reitera o que havia dito, ou, seja: ele se sentira ater rado ante a m agnitude desta visão; entrem entes, ele foi erguido pelo anjo para que não continuasse naquele estado de estupor. Todavia, deve-se notar bem estas duas sentenças: a princípio, D aniel ficara atônito, pois, de outra forma, ele não poderia dis por-se suficientem ente a ouvir a voz do anjo; ao m esm o tempo, porém , acrescenta-se outra sentença: o anjo o pôs em pé. Sem pre que D eus se dirige a nós, necessariam ente somos tom ados pelo tem or e medo, com o fim de produzir hum ildade e nos fazer dó ceis e obedientes. O tem or é a genuína preparação para a obedi ência; mas, com o anteriorm ente dissem os, deve seguir-se outro sentim ento, a saber: visto que Deus nos tem previam ente pros trado e lançado por terra, ele tam bém nos ergue, com isso nos preparando para ouvir; e essa disposição não pode ser gerada, a não ser que nossas mentes estejam tranqüilas e dispostas. O profe ta, pois, expressa aqui am bos esses estados m entais. C om o eu já disse, isso é com um a todos os santos; todavia um a peculiaridade se nota aqui, para que os leitores da visão não se tornem estúpi dos e a recebam criteriosam ente; pois devem coordenar todos seus sentidos, cônscios de sua incapacidade de entendê-la, a não ser que o tem or de Deus preceda e assim prepare a m ente p ara a obediência. Portanto, e n q u a n to ele fa la v a com igo, c a í com o ro sto em te r r a , em p ro fu n d o sono; ou, seja, fiquei atônito, e ele m e tocou. Já expus a opinião de outros, os quais dizem que o anjo aproxim ou-se dele, o que é m eram ente tolerável. Então ele acrescenta: 19 E disse: Eis q ue te farei saber o que h á d e acontecer n o últim o tem po d a indignaçâo; pois no tem po determ inado o fim virá. 19 E t dixit. E cce e g o docebo te“ quod erit in fine i r s : quia ad p rs fix u m , vel, sta- luium lempus fittis. Os que lêem o substantivo ketz, ‘fim ’, no caso genitivo, no versículo 17, neste lugar entendem a palavra ‘visão’ novam ente “ Ou, abrirei a ti; ou. literalmente, te farei conhecer. 138 4 2 * EX P O SIÇ Ã O [8.19) com o se o profeta dissesse: “No tem po do fim haverá um a vi são.” Visto, porém , que i n n , m evegned, ou m oed, significa um “tem po fixo e estabelecido de antem ão” , nada h á de supérfluo nessa form a de expressão; então ketz, com o eu já disse, é apro priadam ente tom ado pelo próprio efeito, e seria abrupto e artifi cial dizer: “no tem po do fim haverá um a visão” , no sentido de com pletar a visão. Pois este term o expressa tudo quanto tais in térpretes desejam que ele implique. Além disso, todos concor dam quanto à questão propriam ente dita, visto que o anjo dá tes tem unho de ser ele o intérprete escolhido por Deus, o qual expli ca ao profeta em term os de futuro. Portanto, diz ele, eis q u e eu te explicarei. Ele aqui, no exercício de seu ofício, granjeia confian ça, visto que aceitara os m andam entos divinos a ele impostos. E devem os atentar para isso também, visto que nossa fé jam ais re pousará nem se fará firm e a m enos que seja fixa a autoridade sobre a qual ela está fundada. Visto, pois, que o anjo declara ser o executor de um ofício divinam ente im posto a si, devem os depo sitar confiança nos homens que se conduzem de m aneira tem erá ria e, em bora assumam autoridade em nom e de Deus, ainda não sentem nenhum a vocação convicta e legítima? Aprendamos, pois, com o nem os anjos, nem os homens devem ser tidos em tal honra ao ponto de nos induzirem a receber tudo quanto eles apresen tam, a menos que o Todo-Poderoso os tenha designado com o seus ministros e intérpretes. Ele então diz: te a n u n c ia re i o q u e a c o n te c e rá no ú ltim o te m p o d a ira. Sem dúvida, o anjo assevera, com esta frase, a subitaneidade da ira divina. Estam os cientes de quão instantane am ente, ao regresso do povo, seus inimigos o atacaram na Judéia, e jam ais cessaram de infligir-lhes infindáveis tribulações. Pelo quê, tão logo os judeus regressaram do exílio, D eus com e çou a exercitá-los de várias m aneiras, e não sem razão plausível. Cada um , em particular, visava a seus próprios interesses, porém sem qualquer respeito pelo tem plo e qualquer sentim ento pelo 139 (8.20,21] D A N IE L culto divino, e assim se entregavam à avareza e aos caprichos. Tam bém defraudavam a Deus m esm o nos dízim os e nas ofertas, segundo se faz evidente à luz dos profetas M alaquias e Ageu (1.12; 3.8). D esde aquele período, Deus passou a castigá-los, porém deferiu sua vingança para os dias de Antíoco. O anjo, pois, denom ina o te m p o d a v in g an ça, quando Deus infligiria o casti go m ais severo assim que o povo ultrapassasse a paciência divi na. Portanto, eu te ensinarei, ou porei diante de ti, o que aconte cerá no fin a l da vingança, porque, diz ele, será o tempo do fim . Aqui ele reitera o que dissera concernente ao efeito da profecia, significando que o cum prim ento ocorreria em seu próprio tempo designado. Então devem os atentar para o substantivo m oed, por que ele aqui se opõe a nosso abrasamento e intemperança. A pressa em desejar tudo conduz, com o costum am os dizer, à delonga; pois tão logo D eus dá testem unho de algum a coisa, j á querem os que tudo se concretize im ediatam ente, e se ele susta sua execução apenas por uns poucos dias, não só indagam os, m as gritamos com ansiedade. Deus, pois, aqui nos adm oesta, pelos lábios de seu anjo, dizendo que ele estabeleceu um tem po, e assim apren dem os a pôr um freio em nós m esm os e a não precipitar e nem irracionalm ente correr, segundo nosso hábito costum eiro. D eve mos, pois, lem brar-nos da explicação dada, e perceber com o o efeito da visão é aqui dem onstrado, e assim ela obterá de nós sua ju sta reverência. Prossigamos: 20 O carn eiro q u e viste, ten d o d o is c h ifres. são o s reis d a M édia e d a P érsia. 2 0 E t aries q uem vidisti h a b en tem duo com ua, reges sunt M edorum e t Persarum . 21 E o bode p eludo é o rei d a G récia; e o grande c hifre que está en tre seus olhos é o prim eiro rei. 21 E t hircus c a p r s , qui naius eril ex hirco, rex G r a c i a , e t co m u m ag n u m quod e ra t inter o culos ejus, est rex prim us. Pela palavra ‘Javan’ os hebreus designam não só os gregos, mas tam bém os macedônios e todo aquele espaço que é dividido pelo H elesponto, desde a Á sia M enor até ao Ilírico. Portanto, este é o significado: o rei da Grécia. 140 42» EX P O SIÇ Ã O [8.22-25] 2 2 O ra, ao ser queb rad o , e nquanto q u a tro se põem em lu g ar d ele, q uatro reinos se erguerão d a m esm a nação, m as não com a força dele. 22 E t co n fractu m est.'1’ e t e x titeru n t qua tuor, co m u a scilicet, loco ejus: quatuor régna a gen te e xsurgent, vel, existent, et non pro fortitudine illius. 2 3 E n o ú ltim o tem po d e seu reinado, q u a n d o o s tran sg resso res c o m p letarem seu tem po, se erguerá um rei, d e sem blante feroz, e e n ten d id o de sentenças obscuras. 23 E t in fin e regni illorum , ubi perfecti fu e rin t sc e ie rati, e x is te t rex p ræ fractu s facie,'* e t intelligens æ nigm ata. D aí Lutero, deixando seus pensam entos correrem à solta, usa esta passagem com o um a referência ao Anticristo; porém discu tirem os este ponto m ais adiante.69 2 4 E sua fo rça será poderosa, m as não por seu próprio poder; e e le d e siru irá pro d i g iosam ente, e prosperará, e fa rá intriga, e d estruirá os poderosos e o povo santo. 2 4 E t ro b o rab itu r fo rtutudo ejus. e t non in fortitudine sua,™ et m irabilia71 evertet, p rosperabitur, e l efficiet, e t perdet, repetit idem verbum , ro b u ste s, e t p o pulum sanctorum . 2 5 E através d e sua política tam b ém fará prosperar em sua m ão a m alícia: e se m ag n ificará em seu coração , e p o r m eio da paz d estruirá a m uitos; tam bém se porá c o n tra o P rín cip e d os príncipes; m as será q u eb rad o sem [o auxílio de] m ão. 25 E l pro intelligentia sua prosperabitur dolus in m anu ejus, e t in corde suo m agnficabil se, el in pace perdet m ultos, vel, fo r tes. et contra Principem principum stabit, vel, exsurgel, e t absque m anu frangetur. Previam ente apresentam os um a breve explicação de todos esses tem as. Aqui, porém, o anjo rem ove toda dúvida, a fim de não inquirirmos ansiosam ente sobre o significado do carneiro que D aniel viu e do bode que seguiu e lançou por terra o carneiro. Aqui, pois, o anjo declara que o carneiro representa dois reinos, os quais se fundiram em um só. Ciro, segundo dissem os, o con cedeu por algum tem po a seu sogro Cyaxares, m as ainda m anti nha todo o poder para si, e os persas com eçaram a estender seu dom ínio a todos os reinos do Oriente. Deus, porém , nesta visão, 67 O u. seja, o chifre foi quebrado. 68 Literalm ente, “em faces” . 6(10 leitor que dom ine o inglês poderá consultar Life o f Luiher. de M ichelet. Edição de Haztin. 1846, pp. 455 e 459. 70 Ou, segundo sua fortaleza; trataremos desta frase lambém. 71 Ou. seja, "de m odo m aravilhoso", •‘m aravilhosam ente"; sendo o substantivo usado em lugar do advérbio. 141 [8.24, 25] D AN IEL indica o início dessa monarquia. Q uando, porém , os persas e m edos se uniram , então no carneiro nasceram dois chifres; e o bode avançou e derrubou o carneiro, com o já vimos. N esse bode houve a princípio um grande chifre, e em seguida surgiram qua tro chifres pequenos. O anjo então responde à pergunta concer nente ao bode representante do reino dos gregos. N ão há a mais leve dúvida aqui, visto que A lexandre apoderou-se de todo o O riente, e assim a m onarquia persa foi com pletam ente destruída. Portanto, no bode se exibiu o reino da G récia ou M acedônia, po rém os chifres indicarão algo especial. A quele g ra n d e ch ifre, diz Daniel, e r a o p rim e iro rei, ou, seja, Alexandre; quatro chifres m enores nasceram depois em seu lugar. Já explicam os isso. Pois quando m uito sangue já havia sido derram ado, e a m aioria dos líderes já havia sido morta, e depois que os seguidores de A lexandre já haviam m utuam ente se ataca do e se destruído, os que perm aneceram dividiram seus dom ínios entre si. Cassander, filho de Antípater, ficou com a M acedônia; Seleuco, com a Síria; Ptolom eu, com o Egito; e A ntígono, com sua quarta parte. D essa form a os chifres m enores sucederam A le xandre, segundo o claro testem unho da história profana. À luz da freqüência com que Deus põe esta profecia diante de nós, dedu zimos sua intenção de dar-nos um conspícuo sinal de sua m ajes tade. Pois com o poderia Daniel conjeturar eventos futuros num período tão distante de sua própria concretização? Ele não pro nuncia meros enigm as, senão que narra coisas exatam ente como se elas já houvessem se concretizado. N o tem po atual, os epicureus desprezam as Escrituras e riem -se de nossa simplicidade, com o se fôssem os dem asiadam ente crédulos. Eles, porém , na verdade expõem sua própria e prodigiosa dem ência e cegueira por não reconhecerem com o divina a predição de Daniel. Infeliz m ente, desta profecia só podem os provar com certeza a unidade de Deus. Se alguém se inclinasse a negar esse prim eiro princípio, e a rejeitar totalm ente a doutrina de sua divindade, o mesmo pode 142 4 2 * EX P O SIÇ Ã O [8.24, 25] ria convencer-se disso sim plesm ente com base nesta profecia. O que se trata aqui não é som ente desse tema, D aniel, porém , apon ta para o Deus de Israel com seu dedo, com o o único em cuja m ão estão todas as coisas, e de quem nada escapa nem se escon de. À luz desta profecia, é tão-som ente a autoridade d a Escritura que se estabelece por m eio de provas perfeitam ente seguras e destituídas de dúvida, com o o profeta trata com perfeita clareza no tem po ignoto, o qual nenhum mortal jam ais pôde prever. Antes de tudo, ele diz: O c a rn e iro q u e viste, te n d o d o is c h i fres, significa os reis dos m edos e p ersas. Isso não havia ainda ocorrido, pois esse carneiro não havia ainda surgido e se apode rado de Babilônia, com o já afirm amos. A ssim D aniel foi como que elevado ao céu, e observou daquela posição coisas ocultas da mente humana. Em seguida ele diz: O b o d e é o rei d a G récia. Filipe, pai de A lexandre, ainda que um guerreiro incansável e m uito habilidoso, o qual excedeu a todos os reis da M acedônia em destreza, todavia, superior com o era, nunca ousou cruzar o mar. Foi-lhe suficiente poder corroborar seu poder na G récia e tornar-se formidável contra seus vizinhos d a Á sia M enor. Ele, porém, jam ais ousou atacar o poder da Pérsia, nem ainda molestá-la, e m uito menos vencer todo o Oriente. A lexandre inflamouse, m ais por tem eridade e soberba do que por bom siso; nenhum pensam ento parecendo-lhe difícil dem ais. M as, quando Daniel viu esta visão, quem jam ais teria im aginado que algum rei da G récia invadiria tão poderosa monarquia, e não só apoderandose de toda a Ásia, m as ainda granjeando o dom ínio do Egito, Síria e outras regiões? A inda que a Á sia M enor fosse um a região m uito extensa, e se sabe m uito bem ser ela dividida em muitas províncias ricas e férteis, todavia não passava de um pequeno acréscim o a seu im enso império. M ais ainda, quando N ínive foi conquistada por Babilônia, e os caldeus vieram a ser senhores sobre a Assíria, esse foi tam bém um acréscim o à m onarquia per sa. Estam os fam iliarizados com as espantosas riquezas dos me 143 [8.24, 25] D A N IE L dos, e todavia foram inteiram ente absorvidas. D ario levou consi go 800.000 homens, e sepultou com pletam ente a terra debaixo de seu exército. A lexandre o encontrou na chefia de 30.000. Que com paração havia entre am bos? Quando X erxes72 veio à Grécia, levou consigo 800.000 hom ens, e am eaçou prender o m ar com cadeias; todavia Daniel fala desse incrível evento com o se o m es m o já houvera ocorrido e já fora m atéria da história. Esses pontos devem ser diligentem ente observados para que as Escrituras nos inspirem com aquela confiança que elas merecem. O g ra n d e chifre, diz ele, q u e e stav a e n tre seus olhos e r a o p rim e iro rei, e q u a n d o ele foi q u e b ra d o , s u rg ira m o u tro s q u a tro . Alexandre, com o já m encionam os, pereceu na flor d a idade, e tinha m ais ou m enos trinta anos de idade quando m orreu pela influência ou de veneno ou de doença. Qual das duas m ortes é incerto, em bora paire grande suspeita de fraude quanto à maneira de sua m orte; e seja qual for a maneira que a m esm a ocorreu, o fato é que o chifre foi arrancado. Em seu lugar ali surgiu quatro chifres, os quais, diz ele, surgiram daquela nação. Aqui devem os observar o seguinte: m uito me adm ira que a mente de muitas pessoas as tenha levado a traduzir “de nações” , não obstante se rem as mesm as hábeis no m anejo do idiom a hebraico. Primeiro, revelam grande ignorância m udando o número, e em seguida não com preendendo a intenção do anjo. Pois ele confirm a o que ante riorm ente dissera concernente à unidade do reino e sua divisão em quatro partes, e aqui ele m enciona a razão. D iz ele que surgi riam de uma nação, significando os gregos, e todos de um a única origem . Pois com que direito Ptolomeu obteve o im pério? U ni cam ente por ser ele um dos generais de Alexandre. A princípio, ele não ousava usar o nom e régio nem ainda usar o diadem a, mas apenas por um lapso de tempo. O m esm o vale para Seleuco, Antígono e Cassandro. Vemos, pois, quão corretam ente o reino dos 73 O editor geral de 1617 leu Merces incorretamenle; o d e Vincente, 1571, e o francês de Perrin. 1569, estão corretos, com o no texto. 144 4 2 * EX P O SIÇ Ã O [8.24, 25] gregos nos é representado sob a figura de um único animal, ainda que fosse im ediatam ente disperso e rasgado em quatro partes. Os reinos, pois, que surgiram da nação, significando a G récia, p e r m a n ecerão , p o ré m n ã o em su a fo rç a to tal. A partícula é aqui tom ada no sentido de ‘porém ’; os quatro reinos permanecerão, porém não em sua fo rç a total, pois A lexandre tocara o m ar indi ano e desfrutara a tranqüila posse de seu im pério ao longo de todo o oriente, havendo enchido todos os hom ens com o pavor de sua atividade, coragem e rapidez. D aí o anjo afirm ar que os quatro chifres seriam tão pequenos, que nenhum deles seria igual ao prim eiro rei. E no fim d e seu rein a d o , q u a n d o o ím p io estiv e r em seu ap o g eu , p e rm a n e c e rá u m rei. A o dizer: no fim de seu reinado, ele não tem em m ente significar que a destruição dos quatros reinos havia cessado. Os sucessores de Antíoco não foram dire tam ente destituídos de seu dom ínio, e a Síria não foi reduzida a um a província até cerca de oitenta ou cem anos depois que A ntí oco o G rande houvesse sido com pletam ente vencido. Ele tam bém deixou herdeiros que, sem dúvida, o sucederam no trono, com o verem os mais claram ente no capítulo onze. M as este ponto é certo: Perseu foi o últim o rei da M acedônia, e os Ptolomeus continuaram até os tem pos de Júlio C ésar e A ugusto, e estam os cientes de com o C leópatra foi com pletam ente vencida e arruina da por Antônio. Visto que m ulheres sucederam ao trono, não podem os pôr a destruição do im pério m acedônio sob Antíoco Epífanes. O anjo, porém, quer dizer: até o fin al d e seu rein ad o , quando tivessem realm ente chegado ao fim de seus reinados e que sua ruína final estivesse próxima. Pois quando Antíoco E pí fanes regressou a seu país, parecia ter restabelecido seu poder, se bem que logo depois com eçou a ser extinto. C ircunstâncias sim i lares tam bém ocorreram no Egito e na M acedônia, pois o reinado de todos seus reis estava precário e, ainda que não diretam ente subvertido, todavia dependiam dos rom anos, e assim sua majes145 [8.24, 25] D A N IE L cade régia não passava de algo efêm ero. Portanto, no fim d e seu rein a d o , a saber, quando chegassem ao apogeu, e sua queda os levasse à ruína, então, diz ele, q u a n d o o ím p io fosse c o n su m a do o u te rm in a d o . H á quem aplica isso aos inim igos professos e externos d a igreja; eu, porém, antes aprovo a outra opinião, a qual presum e que o anjo esteja falando do ímpio que provoca a ira de Deus, até que se tornassem necessárias penalidades graves e severas infligidas sobre o povo, ao qual Deus tão magnificentem ente prom etera felicidade e estado tranqüilo. Entretanto, essa não era um a tentação comum, segundo os profetas haviam trata do tão plenam ente da felicidade e prosperidade do povo depois de seu regresso do cativeiro, de enfrentar tão horrível dispersão e testificar dos assaltos desses tiranos, não só aos homens, m as tam bém ao próprio tem plo de Deus. D aí o anjo, com o fizera an tes, reanim a o profeta e a todo o restante dos piedosos contra esse tipo de tribulação, e m ostra com o Deus não m udara seus conse lhos ao afligir sua igreja, à qual prom etera tranqüilidade, mas que havia sido gravem ente provocado pelos pecados do povo. Ele, pois, mostra a urgente necessidade que havia com pelido Deus a exercer tal severidade. Quando, pois, os ímpios chegaram a seu apogeu, ou, seja, quando chegaram ao pico m áxim o de sua into lerável obstinação, então lhes veio o desespero. Percebem os, pois, com o o anjo aqui enfrenta a provação e instrui de antem ão os pios, desvendando-lhes a inviolabilidade da palavra de Deus, enquanto a im piedade do povo o com pelia a tratá-lo severam en te, em bora houvesse determ inado exibir todo gênero de liberali dade. Então, diz ele, um rei se porá com um sem blante fero z. O restante, porém, deixarem os para amanhã. ORAÇÃO Onipotente Deus, uma vez que temos contemplado tua Igreja ao lon go de todas as eras sendo exercitada de diversas maneiras pela cruz, e com constante sofrimento, que também estejamos preparados para enfrentar tudo quanto puseres diante de nós. Aprendamos também a 146 4 2 * EX P O SIÇ Ã O atentar bem para nossos pecados como sendo a causa de toda adver sidade que nos tem sobrevindo; consideremos bem que tu és não ape nas fie l em todas tuas promessas, mas também um Pai amantíssimo que amaina a miséria daqueles que suplicantemente fogem para ti em busca do perdão. Quando form os humilhados sob tua poderosa mão, sejamos soerguidos pela esperança da salvação eterna que está preparada para nós. E assim miremos aquela felicidade com alegre determinação em todos nossos anseios, até que desfrutemos o fruto de nossa vitória em teu reino celestial, o qual fo i obtido para nós pelo sangue de teu unigénito Filho. Amém. 147 43a • í / jepois de haver o anjo explanado sobre a m onarquia grega, o - c / e l e aponta para a futura origem de um rei que seria de d u ro sem b lan te. Sem a m enor som bra de dúvida, o que ele tem em mente com esta frase é a iniqüidade de Antíoco. Ele era notoria m ente destituído de qualquer nobreza mental e notável por sua vil astúcia, e a essa disposição foi adicionada um a im pudência que a ninguém devia nada. Esse é o sentido no qual tom o as pala vras de duro semblante. A frase seguinte assevera sua astúcia, quando diz que ele s e rá h ab ilid o so em enigm as. Equivale dizer que ele excelia em astúcia e não se deixava enganar facilm ente. P or m eio desses dois epítetos ele não felicita, mas, ao contrário, difam a Antíoco Epífanes, descrevendo-o com o tão em pedernido quanto é possível ao m ais em pedernido dos hom ens, sem a m e nor partícula nem de razão nem de eqüidade nem de vergonha. Ele em seguida reprova sua astúcia e fraude, declarando que ele seria habilidoso em enigmas. Em seguida acrescenta: seu p o d e r s e rá en g ran d e cid o , m as n ã o p o r su a p r ó p r ia fo rça. Há quem endossa a opinião de que Antíoco Epífanes é aqui com parado a Alexandre, com o afirm ara previam ente o anjo, dizendo que os quatro reis seriam inferiores ao prim eiro; pois foram prefigura dos por quatro pequenos chifres. Porquanto o m ais poderoso de todos eles não reinaria sobre um a quinta parte dos dom ínios que A lexandre adquirira para si por m eio de violência e guerra. Ou tros ainda explicam esta passagem com o se o poder de Antíoco fosse grande, mas ainda assim m uito diferente ao de A lexandre e 148 4 3 ' EX P O SIÇ Ã O [8.24, 25] m uito inferior ao dele, segundo o sentido: não em sua própria fo r ç a , ou, seja, a de Alexandre. Entretanto, m uitos aplicam isso a Antíoco, em bora não concordem entre si. H á quem tam bém pre tende um tipo de correção, com o se o anjo quisesse dizer que o poder de A ntíoco seria grande, mas não tão visivelm ente assim. Daí, seu valor será fortalecido, por ‘valor’ não significando aquele espírito heróico com que os reis são geralm ente dotados, nem qualquer crescente m agnanim idade; nem ainda que A ntíoco im i taria tais monarcas com o esses, mas sua força permaneceria oculta. Ele se m overia clandestinam ente e não contenderia em luta aber ta, segundo a prática daqueles que excelem em coragem; secreta mente experim entaria m uitos esquem as e assim im perceptivelm ente expandiria seu im pério. Isso d á um sentido tolerável. O u tros ainda crêem que isso deve ser atribuído a D eus, visto que a força de Antíoco não era o resultado de sua própria indústria ou valor, mas do juízo de Deus, que assim o armou, porque queria usá-lo com o um azorrague a fim de exercer seus juízos sobre os judeus. Portanto, sua fortaleza será engrandecida, todavia não por seu próprio valor, visto que este depende inteiram ente dos justos desígnios e vingança de Deus. A inda que este últim o sentido seja m ais proveitoso, e contenha m uita instrução útil, todavia receio que a m esm a seja distorcida. E assim a últim a sentença ou é um a correção das palavras precedentes, significando “porque ele não progredirá com ingênua sinceridade” , ou, mais, o anjo está ainda com parando sua força com o poder de Alexandre. Portanto, seu poder será engrandecido, mas não pelos hábitos de guerra nem por meio da magnanimidade pública, senão que ele crescerá gran dem ente através de artes fraudulentas e clandestinas; porque ele era, por um lado, m uitíssim o im piedoso; e, por outro, de disposi ção servil, com o já dissem os anteriormente. Então continua: Ele fa r á dano prodigioso e prosperará e pros seguirá, ou, seja, executará e destruirá o fo r te e o povo dos san tos. PorD'OIXU, gnetzum im , entendo não só os judeus, m as tam149 [8.24, 25] D A N IE L bém outras nações vizinhas; com o se o anjo dissesse: A ntíoco será vencedor onde quer que estenda seus braços, até ao ponto de subjugar a Judéia e afligir m iseravelm ente o povo de Deus. R a zão por que ele diz que ele [Antíoco] golpeará ou destruirá o bravo e o povo dos santos, ou, seja, o povo santo, com o já vimos. E, segundo seu entetidimento, sua astúcia prosperará em sua mão. É possível que a conjunção ‘e ’ seja aqui supérflua; nesse sentido a passagem é geralm ente aceita, prosseguindo a leitura num só contexto; segundo seu entendimento, ele prosperará, em bora haja a conjunção ‘e ’ no meio, porém isso, em hebraico, é am iúde su pérfluo. Significa: o engano prosperará em sua mão. Aqui o anjo confirm a a prim eira asserção em referência à astúcia servil de Antíoco, visto não agir com hum ildade sincera, mas com sua audácia e atrevim ento ele uniu as artes m aliciosas e a astúcia indignas de um rei. Portanto, a astúcia prosperará em sua mão, e isso até onde ele compreende. H á quem supõe que aqui o que se nota é a esperteza de Antíoco, com o se o anjo dissesse: a astúcia prosperará em sua m ão em decorrência de sua habilidade e pers picácia superiores. A passagem, porém, pode ser adequadam ente explicada desta forma: Antíoco agirá prosperam ente segundo sua percepção m ental, e será tão assistido por sua astúcia, ao ponto de tom ar posse de tudo quanto agarrar. E prossegue: E le se m a g n ifica rá em seu co ração , ou se exal tará e se fará m agnificente; posto que esta expressão im plica os tentação e soberba e é tom ada num sentido desvantajoso. P ortan to, será insolente em seu coração. O anjo parece distinguir aqui entre as intrigas e perspicácia de A ntíoco e a soberba de seu cora ção; pois ainda que ele obtenha grandes vitórias e subjugue mui tas nações segundo seus desejos, todavia oprim e os judeus e em seguida se engrandece em seu coração; ou, seja, ele se encheria com soberba ainda m aior do que antes, m ovido por seus contínu os sucessos. E em paz destruirá a m uitos, ou o bravo; pois a palavra D'D1, rabbim, significa am bas as coisas. Há quem traduz 150 4 3 ” EX PO SIÇ Ã O [8.24, 25] assim: por causa de sua prosperidade, porque o Senhor queria afrouxar as rédeas para que ele se visse desim pedido no curso de suas vitórias. Em virtude, pois, desse sucesso, ele destruiria a muitos. A liás, os homens profanos, que nada entendem da Provi dência de Deus, têm afirm ado que a fortuna e o acaso prevale cem m ais na guerra que a habilidade ou as armas; m as o êxito dos generais não provém nem do acaso nem da fortuna; mas, um a vez que Deus queira conduzir as atividades do m undo de várias m aneiras, assim em alguns casos os guerreiros maus e des tituídos de habilidade são bem sucedidos, enquanto outros em preendem m uitos esforços e tentativas infrutíferos, ainda que se ja m superiores em conselho e sejam providos com equipam entos m uito melhores. Eu, porém, me inclino m ais para outro sentido que os intérpretes não mencionam ; a saber, A ntíoco destruiria e devastaria muitas nações sem qualquer dificuldade, com a m aior facilidade e com o se fosse um esporte. Razão por que o profeta tem em mente ou o anjo que fala ao profeta que A ntíoco seria o conquistador de muitas nações, não só porque seria dotado de grande astúcia e prom overia guerra m ais por traição do que por violência aberta, mas com o está registrado acerca de Timotheus, o general ateniense: ele tom ará cidades e terras e as subm eterá a si, ao estender-lhe a fortuna sua rede enquanto ele se entrega ao sono. O anjo, pois, parece realçar essa apatia, predizendo m uita devastação pela mão de Antíoco, com aparente facilidade e cal ma. O utros o explicam assim: nações serão devastadas por aque le assaltante que nunca teve motivo algum para atacá-las, visto que jam ais cultivaram qualquer hostilidade contra ele; quando, porém , tentaram cultivar a paz, ele as fustigou sem o m ais leve pretexto. M as, a meu ver, esta interpretação é forçada. Em seguida, ele acrescenta: E ele se p o rá , ou se erguerá, co n t r a o P rín c ip e dos p rín cip es, e s e rá d e s tru íd o sem [auxílio de] m ãos, o u s e rá a rru in a d o . 0 1, vau, é expresso adversativam ente; todavia será destruído sem [auxílio de] mãos. Predizer o anjo 151 [8.24, 25] D A N IE L as contendas de Antíoco, não só com os mortais, mas com o pró prio D eus, constituía algo em extrem o pungente para o profeta e para todo o povo. H á quem entende sar-sarim , com o um a referência ao sumo sacerdote; isso, porém, é por dem ais ta canho e deprim ente. N ão tenho a m enor dúvida de que D eus aqui está im plícito no Príncipe dos príncipes. Por isso o sentido com pleto é: Antíoco seria não só ousado, cruel e orgulhoso em rela ção aos homens, mas essa dem ência e fúria continuariam até o levar a atacar e resistir a Deus mesmo. Esse é o sentido pleno. U m a consolação, porém , é logo acrescentada, quando o anjo diz: ele será destruído sem [auxílio de] m ãos. Aliás, teria sido quase intolerável para os judeus só ouvir a insolência de A ntíoco con tendendo com Deus, a menos que se acrescentasse esta correção: o fim da contenda seria a autodestruição de Antíoco proveniente de sua própria im piedade. Então ele será destruído. M as, com o? Sem [o auxílio de] m ãos, diz ele. Porque, depois de subjugar tantas nações, e depois de obter tudo quanto desejava, o que mais se esperaria no que diz respeito ao hom em ? Q uem ousaria er guer-se contra ele? Mui evidentem ente, se os reis d a Síria esti vessem em disputa por suas próprias fronteiras, não careciam de tem er a ninguém , pois nenhum inimigo os teria m olestado; mas provocaram o ataque dos romanos, e quando quiseram invadir o Egito, suas tentativas foram frustradas. Q ualquer que seja o sig nificado, o anjo aqui anuncia a suficiência do poder divino sem qualquer participação hum ana na destruição e ruína de Antíoco. H á quem acredita que esta profecia aponta para o A nticristo, e assim ignoram com pletam ente a Antíoco e nos descrevem o sur gim ento do A nticristo, com o se o anjo houvera mostrado a D ani el o que aconteceria depois d a segunda renovação da Igreja. A prim eira restauração ocorreu quando ao povo foi restaurada a li berdade e regressaram do exílio para sua terra natal; e a segunda ocorreu no advento de Cristo. Esses intérpretes presum em que esta passagem revela aquela devastação d a Igreja, a qual ocorreu depois da vinda de Cristo e a prom ulgação do evangelho. M as, 152 4 3 * EX P O SIÇ Ã O [8.24, 25] com o vim os previam ente, esse não é um sentido adequado, e não me surpreende que hom ens versados nas Escrituras cubram de nuvens a clara luz. Pois, com o disse na preleção anterior, nada pode ser mais claro ou m ais penetrante, ou m esm o m ais familiar do que esta profecia. E que tendência é essa de atribuir tão vio lentam ente ao Anticristo o que mesmo um a m era criança clara m ente veria ser expresso em referência a A ntíoco, a não ser para privar a Escritura de toda sua autoridade? O utros falam mais m odestam ente e com m ais consideração, quando presum em que o anjo está tratando de Antíoco com o propósito de retratar em sua pessoa a figura do Anticristo. Q uanto a m im , porém , creio ser esse raciocínio suficientem ente sólido. D esejo que os orácu los sacros sejam tratados com tanta reverência, que ninguém in troduza nenhum a variedade segundo o bel-prazer hum ano, mas sim plesm ente m antenha o que é positivam ente certo. Agradarm e-ia m ais ver alguém querendo adaptar esta profecia ao presen te uso da Igreja e aplicar ao A nticristo, por analogia, o que se diz de Antíoco. Sabem os que tudo quanto aconteceu à Igreja de outrora tam bém nos pertence a nós, porque já alcançam os a pleni tude dos tempos. Sem dúvida o Espírito Santo quis ensinar-nos com o levar a cruz fazendo uso deste exem plo; mas, com o eu já disse, pareceme frívolo dem ais sair em busca de alegorias. D evem os contentar-nos com a verdadeira simplicidade e transferir a nós tudo quan to ocorreu ao povo antigo [ 1Co 10.11], Com quanta razão diz o apóstolo que haveria falsos m estres no reino de Cristo, com o outrora houve falsos profetas! [2Pe 2.1]. A ssim devem os deter m inar que o diabo, que foi hom icida desde o princípio, sempre achará a quem ele inspire e im pila a perseguir a Igreja. O diabo, nos dias atuais, não só contende por doutrinas falazes e erros ímpios e im posturas mil, m as tam bém por tirania cruel, visto que ele inflam a m uitos ím pios à dem ência, e com isso acossa os fi lhos de Deus. Com o os judeus não deviam intim idar-se ante as 153 [8.24, 25] D A N IE L calam idades que os oprim iam , m ediante as predições de Daniel concernente a Antíoco, assim a m esm a doutrina deve, em nossos próprios dias, fortificar-nos, para que o eco de nossas calam ida des não nos amedronte, quando a Igreja for oprim ida por fardos pesados e por tempestades e ódio provenientes dos déspotas, com fogo e espada [Rm 8.28]. Pois os pais experim entaram prova ções sim ilares, para quem Cristo não havia sido ainda designado com o o cam inho da vida e os quais não haviam ainda com preen dido tão claram ente nosso dever de conform ar-nos ao unigénito Filho de Deus, visto ser ele o prim ogênito da Igreja; ele é nossa Cabeça e som os seus membros. Isso não havia sido ainda plena m ente desvendado para aqueles santos varões, os quais ainda suportavam tão terríveis aflições, quando presumiam estar a Igreja com pletam ente sepultada, porquanto é certam ente surpreenden te com o não se entregaram centenas de vezes a tantas e tão terrí veis calam idades. Portanto, esta doutrina será m elhor acom oda da a nossa instrução, se nos convencerm os de que a justiça de nossa condição não é m elhor que a dos pais. O que, pois, lhes aconteceu ? Esses ímpios serão destruídos, a saber, os judeus que se confessavam ser o povo eleito de D eus e a santa fam ília de Abraão, e que de inúmeras m aneiras provocaram obstinadam en te a ira divina; assim a Igreja foi m iseravelm ente acossada. A ntí oco, especialm ente, com o um a tem pestade avassaladora, reduziu todas as coisas a ruína, até que o povo se sentisse com pletam ente arrasado e todo o aspecto hum ano ficasse destituído da m ais leve esperança. Visto que D eus castigou tão severam ente a im piedade de seu antigo povo, não nos surpreende quando sentim os sua dis ciplina atual, visto que nestes dias a terra está cheia de im pureza e não cessam os de provocar perpétua e propositadam ente a ira divina [lT s 3.3]. Por último, para evitar a pena devida a nossos pecados, considerem os o fim de nossa vocação, a sujeição de toda nossa vida à cruz. Essa é a guerra à qual nos destina nosso Pai celestial. Visto ser esse nosso quinhão, devem os m irar bem 154 4 3 * EX P O SIÇ Ã O 18.26] esse espelho e ali contem plar a perpétua condição da Igreja. Não surpreende, pois, se, em vez de um Antíoco, Deus suscitasse mui tos que são empedernidos e invencíveis em sua obstinação, e em sua crueldade fizessem inúmeras tentativas com artes clandestinas e arquitetassem a destruição da Igreja. Se os pais experimentaram isso, não nos surpreende se nós, nestes dias, enfrentássem os sofri mentos semelhantes. Esta, digo, é um a analogia útil e não distorce o sentido simples da Escritura. Agora vamos em frente: 26 E t visio m atutina e t v e sp ertin a quse 26 E a visão d a tarde e d a m anhã que foi faiada é verdadeira. T u , porém , e n cerra a visão; porque e la in d ic a dias ain d a distantes. pronuntiata fuit, veritas e st. T u ergo obsigna, vel d a u d e, visionem , q u ia ad dies m uitos protenditur. O anjo novamente confirm a a afirmação de que nenhum a parte desta visão fora m ostrada ao profeta sem algum propósito, por que nem ainda a m ais leve porção dela ficaria sem efeito. E notó ria a necessidade desse m étodo de confirm ar nossa fé, porque, em bora os eventos nos venham a ser bem conhecidos, todavia não podem os aquiescer na palavra de Deus, a m enos que ele tes tifique reiteradam ente a veracidade de suas asseverações, e com tal reiteração sancione ele tudo quanto nos pareça ambíguo. Q uan do se torna perfeitam ente óbvio que o anjo discursa sobre even tos obscuros, e com o tais eram com pletam ente incríveis naquele tempo, não nos surpreende quando ele anuncia um a vez m ais que o profeta nada vira que D eus não concretizasse. Portanto, esta visão, diz ele, é v eríd ica. Ele a denom ina “a visão da tarde e da m anhã” [vespertina e matutina], porque, enquanto o anjo estava tratando dos seis anos e quase m eio, ele usou essa form a de lin guagem. E dissem os que isso foi expresso de form a apropriada, para que ninguém o estendesse a anos ou a m eses, com o alguns o fazem; com o se o anjo dissesse: Eis que, calculando dias simples elevados a seis anos e m eio, a com pletação desta profecia, quan do o tem plo for purificado, será acuradam ente descoberta. Uma vez m ais se assevera que a visão é incerta, porque D eus com pu 155 [8.27] D A N IE L tou dia a dia o tem po da profanação do tem plo até o período de sua purificação. Portanto, diz ele, sela ou e n c e rra a visão, p o r q u e ela vem a lum e depois de m u ito s d ias. É possível que nos sintam os surpresos por que D eus quis que aquilo que ele expli cou a seu servo perm anece velado. Pois D aniel não foi instruído quanto ao futuro para seu proveito pessoal, m as para o proveito com um de todo o povo. Portanto, parece contrário a seu ofício receber a ordem de encerrar a visão e m antê-la em com pleta obs curidade. O anjo, porém, tem em mente que, se a m aioria do povo rejeitasse esta profecia, isso não constituía m otivo para que D a niel se mostrasse hesitante. T\i, pois, sê o g u a rd iã o d e sta p ro fe cia, com o se Deus houvera depositado um tesouro nas mãos de seu servo, e dissesse: “N ão tenhas nenhum respeito por quem desprezar esta profecia; é possível que m uitos escarneçam de ti, e outros concluam que estás a narrar fábulas e bem poucos te nham em ti confiança. Não te deixes vencer por isso, porém guarda fielm ente este tesouro” : visto que ele ép a ra daqui a m uitos dias', ou, seja, em bora seu efeito não seja im ediatam ente evidente, vis to que D eus sustará por algum tem po o castigo de que ela trata, e não restaurará o tem plo prontam ente, nem livrará seu povo im e diatam ente da m ão do tirano. Portanto, em decorrência de deferir ele seus juízos, usará de com paixão por muitos dias, q u a n to a ti, e n c e rra e sta visão, ou, seja, conserva-a para ti mesm o, com o se estivesses sozinho. Assim D eus não ordena sim plesm ente que seu profeta guarde silêncio, ou que oculte o que aprendera, mas, antes, o confirm a em sua consistência, para que ele não avaliasse esta profecia segundo as opiniões ordinárias de seus com patrio tas. E ao mesmo tem po ele m ostra que, ainda que os judeus não prestassem atenção ao que Daniel lhes anunciava, todavia nada seria debalde. E prossegue: 27 E c u . D aniel, d esfaleci, e fiquei doente algun s dias; depois m e levantei e c u i - 2 7 El e g o D aniel deliquium passus sum , vel, fractus sum, e t s g ro ta v i d ie s,7’ et sur- ” Ou, seja. por um tempo. 156 4 3 * EX P O SIÇ Ã O dei dos n egócios d o rei; senti-m e atônito a c e rca d a visão, e não hav ia qu em a entendesse. [8-27] rexi,74 feci o p u s regis,75 e t o bstu p u i propter visionem : neque intelligens.76 U m a vez mais, Daniel se m ostra profundam ente atingido pelo instinto secreto de Deus, porquanto ele sabia que esta visão lhe havia sido divinamente apresentada. Porque Deus queria com isso afetar seu servo a fim de que ele abraçasse com m ais intensa reverência o que ouvira e vira. Já fiz referência a nossa falta de atenção em ouvir a palavra de Deus segundo ela m erece, a não ser que algum tipo de tem or a preceda, para que de algum a forma nossas m entes se despertem de seu torpor; esta profecia, porém, tinha um a intenção especial. Em um caso ordinário, D eus não teria hum ilhado a seu servo; mas, pela enferm idade aqui m enci onada, ele desejava m ostrar com o esta predição se relacionava com algum evento de séria magnitude. D aniel, pois, declara que se sentira atônito, como que sofrendo de algum a deficiência e fo sse afligido p o r algum a doença. Tal enferm idade naturalmente não jazia no profeta, m as que ela lhe sobreviera em decorrência de ser ele repentinam ente terrificado. E em seguida ele m ostra isso, dizendo que ninguém conseguiu entender a predição. Aqui, pois, ele adm oesta a todos os santos que não ouçam nem leiam esta narrativa com displicência, m as que concentrem sua m áxi ma atenção e percebam que Deus aqui lhes m ostra coisas da má xim a im portância e que vitalm ente diz respeito a sua salvação. Isso dá a razão por que Daniel teria que sofrer desalento e ser afligido por enferm idade. Em seguida ele diz: re to rn e i aos n e gócios d o rei, significando sua ocupação ordinária. D essa ex pressão inferim os o grave erro daqueles que pensam estar ele, naquele período, na Pérsia, porque não poderia ter retornado a seus deveres se não estivesse presente no palácio real. N o entan to, por que se acrescenta isso? Para assegurar-nos que o profeta 14 Ou, seja. depois levantei-me. ,s O u, seja. cumpri m eus deveres para os quais o rei me designara. * Ou. seja. não há ninguém que entenda. 157 [9.1, 2] D A N IE L não se afastara dos deveres que o rei lhe designara, ainda que D eus o escolhera para exercer o ofício peculiar de profeta e m es tre de sua Igreja. Esse é um raro exem plo, e não deve ser confun dido com o precedente, segundo a frase usual. Qual de nós, por exem plo, seria suficiente para aqueles deveres do governo políti co designados a Daniel e tam bém aqueles que estão a cargo do pastor ou do professor? Deus, porém, fez uso de seu servo Daniel de um a forma extraordinária, porque ele tinha sobejas razões para querê-lo ocupado no palácio real. Já vim os previam ente com o a glória de Deus foi ilustrada por essa posição, pois D aniel avisou B elsazar de sua m orte iminente, quando seus inim igos já haviam parcialm ente capturado a cidade. E a utilidade disso foi provada ao serem os judeus poupados por C iro e Dario. Enquanto os cal deus m antinham o poder supremo, Daniel não foi de nenhum proveito para aqueles miseráveis exilados; pois ainda quando vi vesse sob tiranos cruéis, todavia tinha algum resto de autoridade, e isso o possibilitava a aliviar bastante os sofrim entos de sua na ção. Deus, portanto, estava tirando proveito de todo o povo, quan do quis que Daniel prosseguisse no curso de seus deveres costu meiros. A lém disso, ele queria conferir-lhe o extraordinário dom de profecia, um dote, com o eu já disse, peculiar a D aniel. Prossi gam os agora: 1 N o prim eiro ano d e D ario, filho d e Assuero, d a linhagem d os m edos, o qual foi constitu íd o rei so b re o reino d os caldeus; 1 A nno uno, id esl, prim o, D arii filii Assu eri e se m in e M e d o ru m , qui rex fuit c o n stitu tu s,” in regno C haldaico. 2 N o p rim e iro a n o d e seu reinado, eu, D aniel, entendi pelos liv ro s q ue o núm e ro d o s anos, d e que falara o S enhor ao profeta Jerem ias, em que haviam d e cum - 2 In anno prim o, inquam,n reg n i illius, ego D aniel intellexi in libris num erum anno ru m , d e quibus fuerat serm o Jehovse ad Jerem iam prophetam ,7' ad im plendum de- r Lileralm ente. foi coroado, isto é. feito rei. 75 E le repete as palavras, o primeiro ano. w Aiguns traduzem a palavra 'n j '2 , binihi, eu estava atento, considerava diligentem ente. 158 4 3 * EX P O SIÇ Ã O [9.1-3] prir-se a s desolações d e Jerusalém , era d e setenta anos. solationem Je n isa le m an n o s septuaginta. 3 E eu dirig i m eu ro sto para o S e n h o r D eus. para o b u sc a r em o ração e sú p licas, com je ju m , cilício e cinzas. 3 E t levavi factem m eam a d D om inum D eum , ut qusererem o ratio n e et precationibus,*0 cum je ju n io , sacco , e i cinere. Neste capítulo Daniel nos explicará duas coisas. Primeiro, quão ardentem ente ele costum ava orar quando o tem po da reden ção, especificada por Jerem ias, se avizinhava; e em seguida ele relatará a resposta que recebera de D eus a suas ardentes súplicas. Estas são as duas divisões deste capítulo: Prim eiro, D aniel nos inform a com o ele orou assim que entendeu, pelos livros, o núm e ro dos anos. D aí deduzirm os que Deus aqui não prom ete a seus filhos bênçãos terrenas, m as vida eterna, e em bora se fizessem estúpidos e destituídos de todo cuidado e interesse espirituais, ele insiste com eles a orarem mais solicitamente. Pois que bene fício as promessas de D eus nos conferem se não as abraçarmos pela fé? A oração, pois, é o principal exercício da fé. E sta obser vação de D aniel é digna de nota: ele f o i estim ulado a orar, p o r que sabia, à luz dos livros, o núm ero dos anos. M as deferirei o restante para amanhã. ORAÇÃO Deus Onipotente, visto que nestes dias nos chamaste a uma sorte se melhante àquela que os pais sob a lei antigamente experimentaram, e visto que os confirmaste na paciência e os armaste para a constância na luta e os tornaste superiores em todos os conflitos deflagrados por Satanás e o mundo , fa z com que, a ti oramos, como em nossos dias quiseste unir-nos a eles, sejamos proficientes em tua palavra. Que bus quemos carregar, p or antecipação, a cruz p or toda nossa vida. Que estejamos preparados para a luta e preferir à miserável aflição sob a bandeira da cruz a levar uma vida de segurança e luxo em nossos próprios deleites, e assim vivermos privados daquela esperança de vitória que nos prometeste e cujo fruto depositaste para nós no céu, por intermédio de Jesus Cristo nosso Senhor. Amém. mas isso é de pouca importância para o sentido. 8,1 Alguns tomam "orações c súplicas” pela caso acusativo. 159 44a • ** ( J / l a preleção anterior com eçam os dizendo que os fiéis não ^ ! í aquiescem nas prom essas de Deus ao ponto de se torna rem estúpidos, ociosos e indolentes, m ovidos pela persuasão de que ele cum prirá suas promessas; mas, ao contrário, se estim u lam à oração. Pois a prova genuína de fé é a certeza de que, quan do oramos, Deus realm ente faz o que ele nos prom eteu. Daniel aqui é posto diante de nós com o um exem plo disso. Pois quando ele com preendeu que o dia da vingança estava próxim o, essa in form ação se lhe transform ou num estím ulo à oração m ais ardo rosam ente do que costum ava fazer. É evidente, pois, com o já dis semos, que o profeta era diligente e ansiava por esse particular. Ele não desistiu de seu hábito cotidiano ao ver-se ante um risco m aior de se ver exposto à morte. Pois quando o édito do rei proi biu que cada um orasse a Deus, ele continuou a volver seu rosto para Jerusalém . Esse era o hábito diário do profeta. M as percebe rem os a extraordinária natureza de sua presente oração, ao dizer ele que orava no pó e na cinza. D isto transparece - visto haver Deus prom etido estim ulá-lo à súplica, e daí deduzim os o que re centem ente mencionam os de leve - que a fé não é um a especula ção im prudente, que se satisfaz sim plesm ente por concordar com Deus. Em bora o estúpido pareça assentir pelo m ero ouvir exter no, para a fé genuína é algo muito m ais sério. Quando alegre m ente abraçam os a graça de Deus, a qual nos oferece, ele nos satisfaz e nos precede com sua bondade, e assim respondem os a tem po a sua oferta e passam os a testificar de nossa expectativa 160 4 4 ' EX P O SIÇ Ã O [9.1-3] de suas prom essas. Portanto, nada pode ser m elhor para nós do que pedir o que ele já nos prom eteu. E assim nas orações dos santos tais sentim entos se congraçam , quando eles confessam as prom essas de Deus à luz das quais eles lhe suplicam . E possivel m ente não conseguim os exercer a confiança genuína em oração, a m enos que descansem os firm emente na palavra de Deus. Um exem plo desse tipo nos é aqui apresentado no caso de Daniel. Q uando ele entendeu que expirava o núm ero de anos, de que D eus fa la ra pelos lábios de Jerem ias, então aplicou sua mente à súplica. Vale a pena atentar para o que já mencionei: Daniel não está aqui tratando de suas orações diárias. Podem os facilm ente fazer um apanhado de toda sua vida, de com o ele se exercitava em oração, m esm o antes de Jerem ias haver falado dos setenta anos. Quando ele percebeu que o tem po da redenção estava pró xim o, então passou a estim ular-se à prática de súplicas com mais instância do que seu costume. Ele expressa isso ao dizer: em j e jum , cilício e cinzas. Pois os santos não costum avam lançar cin zas sobre suas cabeças todos os dias, nem ainda a afastar-se para suas orações, seja para jeju ar ou para vestir-se de cilício. Tal ati tude era rara, só própria para quando D eus m anifestava algum sinal de sua ira, ou quando ele retinha algum benefício raro e singular. A presente oração de Daniel não resultou de hábito usu al, m as quando se vestiu de cilício e se aspergiu com cinzas e suportou jejum , então prostrou-se diante de Deus e apresentou suas súplicas. Ele tam bém im plorava o perdão divino, com o ve remos m ais adiante, e rogava pela concretização do que o TodoPoderoso havia seguram ente prometido. À luz desse fato aprendem os duas lições: Prim eiro, devemos exercer com perseverança nossa fé em m eio a orações; segundo, quando Deus nos prom ete algo notável e valioso, devem os então deixar-nos estim ular m ais e nutrir expectativa com o um estím ulo m ais agudo. Com referência ao jejum , cilício e cinzas, podem os observar sucintam ente com o os santos pais, sob a Lei, cultiva 161 (9.1-3] D A N IE L vam o hábito de acrescentar a suas orações cerim ônias extras, especialm ente quando desejavam confessar seus pecados a D eus e precipitar-se diante dele com o plenam ente culpados e convic tos, lançando nele toda sua esperança e suas súplicas por m iseri córdia. A tualm ente os fiéis são justificados em acrescentar a suas orações certos ritos externos; ainda que, neste caso, estes não carecem , nem podem , nem devem ser estabelecidos. Também sabem os que os orientais se devotavam m ais a cerim ônias do que nós. E deve-se observar essa diferença entre o povo antigo e a nova igreja, visto que Cristo, com seu advento, aboliu muitas cerim ônias. Pois os pais eram, sob a Lei, nesse sentido, com o crianças, no dizer de Paulo [G1 4.3], A disciplina que Deus outrora instituíra envolvia o uso de mais cerim ônias do que se pra ticou m ais tarde. U m a vez que existe essa im portante diferença entre nossa posição e a deles, quem quiser copiar deles todas suas práticas se converterá antes em símio do que em im itador de antigüidade. Entrementes, devem os observar que a realidade per manece para nós, em bora os ritos externos já estejam abolidos. Portanto, existem dois tipos de oração: um que devem os praticar diariam ente, de manhã, à tarde e, se possível, a todo m om ento; pois vem os que a constância em oração nos é recom endada na Escritura [Lc 18.1; Rm 12.12; lTs 5.17]. O segundo tip o é usado quando D eus anuncia sua ira contra nós, ou quando tem os neces sidade de seu socorro especial, ou quando buscam os dele algum favor inusitado. Esse foi o método de oração praticado por D ani el: vestia-se de cilício e se aspergia com cinzas. M as, com o já tratam os desse tem a em outro lugar, então passo a exercer mais brevidade. Q uando Daniel percebeu que o período do livram ento estava próxim o, não só orava segundo seu costum e, m as abandonou to das suas dem ais ocupações com o propósito ficar quieto em sos sego e livre de ocupação, e assim aplicou sua mente intensam en te à oração, e fez uso de outros auxílios devocionais. Pois o cilí 162 4 4 * EX P O SIÇ Ã O [9.1-3] cio e as cinzas eram de m uito m ais proveito do que o m ero teste m unho externo. São auxílios para intensificar nosso ardor em oração, quando quem ora se sente apático e esm orecido. D e fato é verdade que quando os pais sob a Lei oravam vestidos de cilí cio e se aspergiam com cinzas, essa aparência era útil com o uma m arca externa de sua profissão [religiosa]. A testava diante dos homens com o eles se achegavam a Deus na qualidade de supli cantes culpados e depositavam toda sua esperança de salvação unicam ente no perdão. Essa conduta era ainda útil de outra for ma, a saber: despertava neles um desejo ainda m ais ardente de orar. E é preciso que se observe am bos esses pontos no caso de Daniel. Pois se o profeta se sentia tão necessitado dessa assistên cia, o que dizer, pois, de nossas necessidades? C ada um de nós deve seguram ente com preender quão em botado e frio é no exer cício desse sacro dever. Portanto, nada mais resta senão que cada um se torne cônscio de sua enferm idade, reúna todos os auxílios possíveis para a correção de sua apatia, e assim se estim ule à súplica ardente. Pois quando D aniel, segundo seu costum e diá rio, orava correndo o risco de ser morto por essa conta, devem os deduzir disso quão naturalm ente alerta ele estava enquanto orava a Deus. Ele era cônscio d a carência de suficiência em si mesmo, e por isso adiciona o uso de cilício, cinzas e jejum . Passo por alto o que poderia ser tratado m ais difusam ente com o o jeju m é am iúde associado às orações extraordinárias. Também concluím os que as obras em si mesmas falham em apra zer o Onipotente, segundo as ficções dos papistas de nossos dias, bem com o as tolas im aginações de tantos outros. Pois acreditam ser o jejum um a parte do culto divino, ainda que as Escrituras sem pre no-lo recom endem para outro propósito. Ele por si só é de nenhum valor, a não ser quando associado às orações, com exortações ao arrependim ento e com a confissão de nossa pecam inosidade, então se torna aceitável, mas não de outra forma. A ssim observam os com o Daniel fez um uso correto do jejum , 163 [ 9 .1 -3 ] D A N IE L não com o intuito de agradar a D eus com tal disciplina, mas para torná-lo mais obsequioso em suas orações. Em seguida precisam os observar outro ponto. Em bora D ani el fosse intérprete de sonhos, ele não era tão im buído de confian ça e soberba ao ponto de desprezar o ensino m inistrado por ou tros profetas. Jerem ias estava então em Jerusalém quando Daniel foi arrastado para o exílio, onde ocupou o ofício de m estre por um longo período, de m odo que B abilônia veio a ser seu púlpi to.81 E Ezequiel o cham a o terceiro entre os mais excelentes ser vos de Deus [14.14], em virtude de a piedade, integridade e san tidade d a vida de Daniel serem ainda então celebradas. Q uanto a Jerem ias, sabemos que ele ou já havia falecido no Egito ou, tal vez, estivesse ainda vivo quando esta visão foi apresentada a Daniel, que já havia com pendiado suas profecias antes dessa oca sião. O bservam os ainda a grande m odéstia desse santo varão, visto que se em penhava em ler os escritos de Jerem ias e não se sentia envergonhado de pessoalm ente extrair proveito delas. Pois ele sabia que esse profeta fora designado para instruir a ele e ao restante dos fiéis. A ssim ele de bom grado subm eteu-se à instru ção de Jerem ias e enfileirou-se por entre seus discípulos. E se ele não se dignara ler aquelas profecias, não teria sido digno de par tilhar do livramento prometido. Visto ser ele um membro da Igreja, então teria de ser um discípulo de Jerem ias, com o igualmente Jerem ias não teria feito objeção em tirar proveito de seu regres so, se algum a profecia de D aniel lhe houvera sido apresentada. Esse espírito de m odéstia deve expandir-se entre os servos de Deus, ainda quando excelam no dom de profecia, induzindo-os a aprenderem uns dos outros, enquanto nenhum deles deve erguerse acim a do nível com um de todos. A inda que sejam os mestres, ao m esm o tem po é nosso dever continuar com o aprendizes. E Daniel nos ensina isso, ao lermos: ele entendeu pelos livros o 81 Uma m udança de expressão um tanto inesperada. O texto latino é quasi suggeslus', e ambas as edições francesas traduzem cnmmt une chaire pourprescher. 164 4 4 a EX P O SIÇ Ã O [9.1-3] núm ero de anos, e o núm ero era segundo a palavra de Jehovah através do profeta Jeremias. Ele m ostra por que se exercitara nos escritos de Jerem ias: porque se convencera de que D eus falara por m eio de sua voz. E assim não lhe constituiu problem a algum ler aquilo que ele bem sabia haver procedido de Deus. É preciso que observem os agora o tempo desta profecia: o p rim e iro an o d e D ario. N ão nos dem orarem os neste ponto aqui, porque já discuti bastante sobre os anos ao chegarm os à segunda parte do capítulo. N a preleção anterior declarei que este capítulo abrange duas divisões principais. Daniel prim eiro registra sua própria oração, e em seguida adiciona a predição que lhe fora entregue pela m ão do anjo. Em seguida falarem os dos setenta anos, porque a discussão então se provará bastante longa. A gora tocarei apenas de leve num único ponto - o tempo da redenção estava chegando, assim que a m onarquia babilónica fosse m uda da e transferida para os medos e persas. Com o fim de tornar a redenção de seu povo ainda m ais proem inente, D eus quis desper tar todo o oriente depois que os m edos e persas tivessem con quistado os babilônios. Ciro e D ario publicaram seu édito mais ou m enos ao mesmo tempo, por m eio do qual aos judeus se per mitiu regressarem a sua pátria natal. Portanto, n aq u ele a n o sig nifica o ano em que D ario com eçou seu reinado. Aqui alguém poderia perguntar: Por que ele m enciona som ente Dario, quando Ciro lhe era m uito superior em poderio militar, prudência e ou tros dotes? A resposta im ediata é que Ciro partira im ediatam ente em outras expedições, porquanto sabem os que se apoderara dele um a am bição insaciável. Ele não foi estim ulado pela avareza, mas por um a insaciável am bição, ao ponto de não poder ficar quieto em um único lugar. E assim , ao tom ar posse de B abilônia e de toda aquela m onarquia, ele fíxou-se na Á sia M enor e a acos sou até quase à m orte, de form a contínua e incansável. H á quem afirm a que ele foi morto em batalha, enquanto X enofonte descreve sua m orte com o que se reclinando em seu leito, e conforta165 [9.1-3] D A N IE L velm ente a instruir seus filhos acerca do que ele queria que fosse feito. M as, seja qual for o verdadeiro relato, toda a história testi fica de sua incessante m ovim entação de um lugar a outro. D aí não surpreende ouvir o profeta falar aqui apenas de D ario, o qual era m ais avançado em idade e m ais lerdo em seus m ovim entos ao longo de sua vida. É suficientem ente certificado que ele não era am ante da guerra; X enofonte o cham a Cyaxares, e afirm a ter sido ele filho de Astyages. Sabem os tam bém que A styages era o avô m aterno de Ciro, visto a mãe de Ciro ser sua irmã. Quando o profeta cham a seu pai de Assuero, isso não deve constituir-nos um problem a, visto que os nomes variam m uito quando com pa ram os o grego com o hebraico. Sem a m ais leve dúvida, A stya ges era cham ado Assuero, ou, pelo menos, seu nom e era um e seu sobrenom e, outro. Toda dúvida é rem ovida pela expressão: D a rio e r a d a linh ag em dos m edos. Ele distingue aqui entre os m edos e os persas, visto que os m edos se assenhorearam de ricos e esplêndidos territórios, estendendo-os mais e m ais am plamente em todos os lados, enquanto que os persas se encerravam dentro de suas m ontanhas e eram mais austeros em sua form a de vida. O profeta, porém , declara aqui a origem m eda desse D ario, e acres centa outra circunstância, a saber: ele apoderou*se d o rein o dos caldeus. Pois Ciro adm itia que ele [Dario] fosse cham ado rei, não só em virtude de sua idade e de ser seu tio e seu sogro, mas tam bém porque ele não intentava nada contra sua autoridade. Ele sabia que Dario não tinha nenhum herdeiro que viesse no futuro a trazer-lhe aborrecimentos. Ciro, pois, entregara a seu sogro um título vazio, enquanto que todo o poder e influência perm aneci am com pletam ente dentro de seu domínio. Então o profeta afirma: Q u a n d o pelos livros e n ten d i o n ú m e ro dos anos p a r a o cu m p rim e n to d a d esolação de J e r u s a lém , ou, seja, se te n ta anos. Esta profecia se encontra no capítulo 25 de Jerem ias, e é reiterada no capítulo 29. D eus fixara de ante m ão setenta anos para o cativeiro de seu povo, visto que fora 166 4 4 “ EX P O SIÇ Ã O 19.1-3] um a grave provação serem eles lançados fora d a terra de Canaã, a qual lhes fora concedida com o um a herança perpétua. Vieramlhes à m ente aquelas célebres sentenças: “Este será m eu repouso para sem pre” , e: “Possuireis a terra para sem pre” [SI 132.14], Quando foram lançados fora e dispersos por vários países da ter ra, era com o se o pacto divino fora abolido, e com o se não hou vesse qualquer vantagem em sua origem provir daqueles santos pais a quem sua terra fora prom etida. C om o propósito de satisfa zer essas tentações, Deus fixara de antem ão um determ inado tem po para seu exílio, e Daniel agora recorre a essa predição. Ele acrescenta: E n tã o e rg u i m eu rosto. Propriam ente dito, é iTínX, ath-neh, coloquei; visto, porém, que alguns intérpretes parecem receber esta palavra de um a form a tão fantasiosa, com o se Daniel estivesse então olhando para o santuário, prefiro traduzi-la: E r gui m eu rosto para Deus. É plenam ente certo que enquanto o altar esteve de pé, e a arca do concerto esteve no santuário, o rosto de Deus estava ali, para o qual os fiéis deveriam dirigir seus votos e orações; m as agora as circunstâncias eram diferentes, porquanto o tem plo estava em ruínas. Lem os previam ente de D aniel orando e volvendo seus olhos naquela direção e para a Judéia; seu objetivo, porém , não era o desejo de orar em confor m idade com o costum e de seus pais. Pois então não havia em existência nem santuário e nem arca do concerto [Dn 6.10]. Seu objetivo em volver o rosto para Jerusalém era para publicam ente dem onstrar sua confissão de ainda m entalm ente perm anecer na quela terra que Deus havia destinado à raça de Abraão. Por m eio desse gesto e cerim ônia externos, o profeta reivindicava a posse da Terra Santa, a despeito de estar ainda em cativeiro e exílio. Com respeito à presente passagem , sim plesm ente a entendo no sentido em que ele ergueu seu rosto para Deus. D iz ele: p a r a q u e eu p u d esse in q u ir ir p o r m eio d e sú p lica e orações. U m a e ou tra são igualmente adequadas ao sentido, mas a prim eira versão é m enos forçada, porque o profeta buscava a D eus através de sú167 [ 9 .4 ] D A N IE L plica e orações. E essa form a de linguagem é bastante com um na Escritura, quando lemos para buscarm os a Deus quando testifi cam os de nossa esperança de que ele fará o que prom eteu. A gora prosseguim os: 4 E orei a o S enhor m eu D eus. e fiz m inha c onfissão, e disse: Ó Senhor, D eus gran d e e tem ível, que guardas a aliança e a m is e ric ó rd ia p a ra co m a q u e le s q u e te am am , e para com aqueles que guardam teus m andam entos. 4 E t o ra vi Je h o v a m D eum m eu m , e t confessus sum ,8! e t dixi, Q u a s o D om ine D eus m agne e t terrib ilis, custodiens foedus et m isericordiam d iiig en tib u s ip su m , e t custodientibus p rs c e p ta ejus. Aqui D aniel relata a substância de sua oração. D iz ele: O rei, e confessei d ia n te d e D eus. A m aior parte dessa oração consiste num a súplica para que D eus perdoasse a seu povo. Sem pre que rogam os por perdão, o testem unho de arrependim ento deve pre ceder nossa súplica. Pois D eus anuncia que será propício e aten derá prontam ente a súplica quando os homens se m ostrarem sé ria e sinceram ente arrependidos [Is 58.9]. D aí a confissão de cul pa ser um m étodo de obter-se o perdão; e por essa razão Daniel preenche a m aior parte de sua oração com a confissão de sua pecam inosidade. Ele nos lem bra esse fato não m ovido de van glória, m as para instruir-nos por m eio de seu próprio exem plo, para que orem os com o devam os. D iz ele, pois: orei e fi z confis são. A adição de “meu D eus” ao título Jehovah é de m odo algum supérflua. Orei, diz ele, a meu Deus. Ele aqui m ostra que não enunciava suas orações com vacilação, com o tão am iúde ocorre com os homens, pois os incrédulos am iúde fogem para Deus, porém sem qualquer confiança. D isputam consigo m esm os se porventura suas orações produzirão algum efeito; D aniel, pois, nos m ostra duas coisas franca e distintam ente, visto que ele ora va com fé e arrependimento. Pela palavra confissão ele tem em m ente seu arrependimento; e ao dizer, orei a D eus, ele expressa 82 A m esm a palavra em Hiphil significa celebrar o s louvores de Deus; aqui. porém , ela é tomada para confessar uma culpa. 168 4 4 * EX P O SIÇ Ã O [9.4] fé e a ausência de toda e qualquer tem eridade de porventura estar jogando fora suas orações, com o fazem os incrédulos quando oram a D eus confusam ente, e todo o tem po se deixam distrair por enor me variedade de pensam entos intrusos. Orei, diz ele, a m eu Deus. N inguém pode usar essa linguagem sem um a inabalável confian ça nas prom essas de D eus e sem presum ir que ele provará estar disposto a ouvir a súplica. Então acrescenta: ro g o -te, ó S enhor. A partícula N3N, ana, é traduzida variadam ente; m as é apropria dam ente, na linguagem dos gram áticos, a partícula de súplica. O S e n h o r D eus, diz ele, g ra n d e e tem ível. Ao usar tal linguagem, é com o se D aniel pusesse um obstáculo a sua própria oração; pois tal é a santidade de Deus que, tão logo a concebem os em nossa m ente, ela nos repele para longe; razão por que esse terror parece ser rem ovido quando buscam os um acesso fam iliar ao Todo-Poderoso. É possível que alguém presum a ser esse m étodo de oração de m odo algum adequado, visto Daniel pôr D eus dian te de seus olhos com o grande e terrível. Para ele é com o algo assustador; todavia o profeta merece um a oportuna m oderação: enquanto de um lado ele reconhece ser D eus grande e terrível, do outro adm ite que ele g u a r d a su a a lia n ç a p a r a com aq u eles q u e o a m a m e obedecem a seus estatu to s. Em seguida verem os o terceiro ponto adicionado: Deus receberá os ingratos e todos quan tos se apartam de sua aliança. O profeta enfeixa essas duas coisas. Com respeito aos epítetos, grande e tem ível, devem os manter o que já declaram os, a saber: a im possibilidade de nossa oração ser correta, a m enos que nos hum ilhem os diante de D eus; e essa hum ildade é um a preparação para o arrependim ento. Portanto, Daniel se põe diante da m ajestade de D eus, instando consigo m esm o e com outros a lançarem-se diante do Todo-Poderoso para que, em concordância com seu próprio exem plo, sintam -se ver dadeiram ente arrependidos diante dele. Portanto, diz ele, D eus é grande e temível. Jam ais atribuirem os ju sta honra a Deus, a me nos que nos lancem os, com o se estivéssem os mortos, diante dele. 169 [9.4] D A N IE L E é preciso que observem os isso com diligência, porque somos por dem ais displicentes em nossa oração a D eus, e a tratamos com o um a m era m atéria de observância externa. D evem os saber quão impossível é a obtenção de algo da parte de Deus, a não ser que com pareçam os diante dele com tem or e trem or, e nos porte m os com genuína hum ildade em sua presença. Esse é o prim eiro ponto a ser observado. Então D aniel m itiga a aspereza de sua declaração, acrescen tando: q u e g u a rd a s tu a a lian ça e u sas d e co m p aix ão p a r a com a q u eles q u e te a m a m . Aqui temos um a m udança de pessoa: a terceira é substituída pela segunda, porém não há obscuridade no sentido; com o se ele quisesse dizer: Tu guardas tua aliança para com aqueles que te am am e observam teus estatutos. Aqui Daniel ainda não explica plenam ente o tema, pois essa afirm ação é fraca dem ais para granjear a confiança do povo; este se havia revolta do perfidam ente contra Deus, e até onde se relacionavam com ele, seu acordo havia chegado ao fim. Daniel, porém , desce cada degrau e passo a passo vai ao fundam ento com o intuito de inspi rar no povo um a sólida confiança na longanim idade de Deus. Dois pontos estão envolvidos nesta sentença: prim eiro, dem onstra-se-nos que não há razão algum a para os judeus discutirem com D eus ou de se queixarem de ser tratados por ele com extre m a severidade. Daniel, pois, silencia todas as expressões de re belião, dizendo: Tu, ó Deus, guardas tua aliança. D evem os ver aqui a real condição do povo: os israelitas estavam no exílio; sabem os quão dura era essa tirania - com o eram oprim idos pelos mais cruéis opróbrios e desgraças e com o eram brutalm ente tra tados por seus conquistadores. Isso poderia im pelir m uitos de clam arem , com o indubitavelm ente faziam: “O que D eus quer de nós? H á algum a vantagem em sermos escolhidos com o seu povo peculiar? Qual é a vantagem de nossa adoção, se ainda somos os mais m iseráveis de todas as nações?” A ssim os judeus poderiam queixar-se sentindo a mais am arga tristeza e exaustão sob o peso 170 4 4 a EX P O SIÇ Ã O [9.4] do castigo que Deus lhes havia infligido. Daniel, porém , aqui declara que apresentou-se diante de D eus, não para contestar e murmurar, m as apenas para im plorar seu perdão. Portanto, por essa razão, ele prim eiram ente diz: D eus guarda sua aliança para com aqueles que o amam-, mas, ao m esm o tem po, ele passa a orar por perdão, com o verem os m ais adiante. Tratarem os dessa alian ça e da longanim idade do Todo-Poderoso na próxim a preleção. ORAÇÃO Deus Todo-Poderoso, já que no presente tempo merecidamente nos punes em razão de nossos pecados, segundo o exemplo de teu antigo povo, a fim de volvermos nosso rosto para ti com real arrependimen to e humildade, permite que nos lancemos diante de ti com súplica e prostração; e, sem qualquer esperança posta em nós mesmos, depo sitemos toda nossa esperança em tua compaixão, a qual nos prom e teste. Que confiemos naquela adoção que se fundam enta em e é san cionada p o r teu unigénito Filho, e que jam ais hesitemos em chegarnos a ti como que diante de um pai que está sempre pronto a receber o filho que fo g e para seus braços. Entrementes, que afetes tão com pletamente nossas mentes, ao ponto de não só orarmos a ti como uma questão de dever, mas também de genuína e seriamente fu g ir mos para ti em busca de proteção, e deixarmo-nos tocar pelo senso de nossos pecados, e de jam ais duvidarmos de tua disposição propí cia para conosco. No nome de teu próprio Filho, nosso Senhor. Amém. 171 45a « ^ í j / j a últim a preleção, Daniel disse que orou e confessou. Ago^ 9 i v a , ao narrar a form a de sua oração, ele com eça com con fissão. E m ister que notem os isso, a fim de capacitarm o-nos a entender o desígnio que D aniel tinha em vista, bem com o o obje tivo especial de sua oração. Esse é o tipo de abertura que ele faz - o povo é culpado diante de D eus e ora hum ildem ente por per dão; mas antes de o profeta chegar a essa súplica, ele confessa com o o povo fora mui severam ente, e com justiça, castigado pelo Senhor, visto que tão grave e variadamente haviam provocado sua ira. Prim eiram ente, ele qualifica Deus de temível, pois tenho recitado e traduzido suas palavras. Quando o profeta deseja atrair o favor divino para si, ele com eça apelando para sua majestade. Com essas palavras ele se estim ula à reverência, a si e ao restante dos fiéis, instando com eles a se chegarem à presença de Deus com subm issão, para que se reconheçam totalm ente condenados e privados de toda esperança, exceto na m isericórdia de Deus. Portanto, ele o denom ina de grande e tem ível, com o fim de hu m ilhar diante de D eus as mentes de todos os santos e im pedir que aspirem algum a vanglória ou se encham com algum a autoconfi ança. Porque, com o já dissem os noutro lugar, os títulos de D eus algum as vezes são perpétuos, e outras, variáveis, segundo as cir cunstâncias do tem a em mãos. D eus pode ser sempre cham ado grande e temível; Daniel, porém, o cham a assim aqui para, com o j á observei previamente, estim ular a si e a todos os dem ais à reve rência e à humildade. Então acrescenta: Ele é fiel em m anter sua 172 4 5 * EX P O SIÇ Ã O 19.4] aliança e em revelar com paixão para com todos seus verdadeiros adoradores. Já me referi a um a m udança de pessoa nesta senten ça; ela, porém , não obscurece o sentido nem se tom a de forma algum a duvidosa. lá expliquei com o essas palavras tam bém tes tificam da ausência de toda e qualquer causa pela qual o povo m urm ure ou se queixe de estar sendo tratado tão duram ente. Pois onde a fidelidade de Deus a suas prom essas já foi um a vez esta belecida, os homens não têm a m ais leve razão de queixar-se ao serem tratados por ele com m enos clemência, ou se sentirem frus trados só porque eles m esm os são achados falazes e pérfidos; porquanto Deus sem pre perm anece veraz a suas palavras [IC o 1.9; 10.13; 2Ts 3.3], N esse sentido D aniel anuncia que D eus con serva sua aliança para com todos os que o amam. Em seguida tem os de notar com o ele adiciona a palavra ‘com paixão’ em vir tude de sua ‘aliança’. Ele não expressa essas palavras com o que diferindo um a da outra, H '13, brith, e 1DH, chesed, mas as enfei xa, e a sentença deve ser entendida por meio de um a figura co m um de linguagem, im plicando que Deus fez um a graciosa ali ança que em ana da fonte de sua com paixão. Portanto, o que é esse acordo ou aliança e com paixão de D eus? A aliança em ana da m isericórdia de D eus; não em ana nem da dignidade, nem dos m éritos hum anos; é unicam ente na graça de D eus que ela tem sua causa, estabilidade, efeito e com pletação. Temos de atentar para isso, porque os que não são bem versados nas Escrituras poderiam perguntar por que Daniel distingue m isericórdia de ali ança, com o se aí existisse um a m útua estipulação, quando Deus entra em aliança com o homem, e assim o pacto divino depende ria sim plesm ente da obediência humana. Essa questão é solucio nada quando entendem os a form a de expressão aqui usada, um a vez ser esse tipo de frase freqüente nas Escrituras. Pois sempre que se m enciona o pacto de Deus, adiciona-se tam bém sua cle m ência, ou bondade, ou inclinação para amar. Portanto, Daniel confessa, em prim eiro lugar, a natureza gratuita do pacto de Deus 173 [9.4] D A N IE L com Israel, asseverando que ele não tem nenhum a outra causa ou origem além da bondade graciosa de Deus. Em seguida testifica da fidelidade de D eus, pois ele nunca viola seu acordo nem se afasta dele, um a vez que em muitos outros lugares a verdade e fidelidade de D eus se acham jungidas a sua clem ência [SI 36.6, e outros lugares]. É indispensável que confiem os na m era bondade de Deus, já que nossa salvação repousa inteiram ente nele, e as sim rendam os-lhe a glória devida a sua com paixão, e por isso se nos torna indispensável, em segundo lugar, obter um a nítida apre ensão da clem ência divina. A linguagem do profeta expressa am bos esses pontos, ao m ostrar-nos ele com o o pacto divino de pende e em ana de sua graça, e tam bém quando ele adiciona a fidelidade do Todo-Poderoso em m anter seu com prom isso. Ele acrescenta: p a r a com os q u e o a m a m e g u a rd a m seus m a n d am en to s. Devem os diligentem ente notar esse fator, por que D aniel aqui convence todo o povo da defesa que m uitos po deriam propor, já que os hipócritas instintivam ente acendem sua ira contra Deus; m ais ainda, ousadam ente o recrim inam , porque ele ou não os perdoa, ou não os favorece. D aniel, pois, para refre ar essa soberba e para elim inar todo e qualquer pretexto de dis córdia por parte dos ím pios, diz: D eus é f ie l para com os que o amam. Ele assim nos admoesta: Deus nunca é severo, a não ser quando provocado pelos pecados hum anos; com o se quisesse dizer: a aliança de D eus é por si só inabalável; quando os homens a violam , não surpreende se D eus subtrai suas prom essas e re nuncia seu acordo, ao perceber estar sendo tratado com perfídia e desconfiança. Portanto, o povo é aqui diretam ente condenado, enquanto Daniel testifica da constância divina em m anter suas prom essas, caso os homens, de sua parte, ajam de boa fé para com ele. N o todo, ele m ostra com o o povo era culpado quando Deus alterou seu curso usual de tratam ento bondoso e beneficen te e pôs em ação sua m ais severa vingança, fazendo com que o povo fosse expulso da terra de Canaã, a qual era sua perpétua 174 4 5 * EX P O SIÇ Ã O [9.4] herança. Daniel aqui explica com o toda culpa deve ser elim inada de Deus, um a vez que o povo se revoltou contra ele e p o r sua perfídia violou seu com prom isso. Vemos, pois, com o Daniel lan ça toda a culpa das calam idades do povo sobre eles mesm os, e assim ele isenta a Deus de toda e qualquer culpa e responsabiliza o povo por todas as queixas injustas. Além disso, o profeta m os tra com o o objetivo especial do culto divino consiste em induzirnos a amá-lo. Porque m uitos observam a lei de Deus segundo a m aneira dos escravos; porém precisam os lem brar-nos sempre desta passagem: Deus am a o alegre doador [2Co 9.7], Quando, pois, os hipócritas são violentam ente atraídos à obediência, o pro feta aqui distingue entre os verdadeiros adoradores de D eus e os que se desincum bem de seu dever apenas de um a m aneira m ecâ nica, e não de coração. Ele assevera que o princípio que rege o culto devido a D eus consiste em um am or diligente por ele, e tal sentim ento ocorre com freqüência nos escritos de M oisés [Dt 10.12). Portanto, tem os de m anter a im possibilidade de se agra dar a Deus pela obediência, a m enos que ela proceda de um a afeição sincera e espontânea da mente. Aqui está a prim eira regra do culto divino. E preciso que o am emos; é preciso que nos pre parem os para devotar-nos inteiram ente a obedecê-lo e a cum prir espontaneam ente tudo quanto ele requer de nós. Segundo lemos nos Salmos [SI 119.24]: “Tua lei é todo meu prazer.” E nova m ente, no m esm o Salmo, Davi declara ser a lei de D eus, para seu coração, m ais preciosa que o ouro e a prata; sim, m ais agradável e m ais doce que o próprio mel [vv. 72, 103]. A m enos que am e mos a Deus, não teremos razão algum a para concluir que ele apro vará algum a de nossas ações; todos nossos deveres virão a ser corruptos a seus olhos, a menos que procedam da fonte do afeto liberal para com ele. D aí o profeta acrescentar: p a r a com os q u e g u a rd a m seus estatu to s. A observância externa jam ais nos be neficiará, a m enos que o am or a D eus a preceda. M as tem os que observar isso tam bém , por seu turno: D eus não pode ser sincera175 [9.5-7] D A N IE L m ente am ado por nós, a m enos que todos nossos membros exter nos sigam essa afeição da alma. Nossas m ãos e tudo o que nos pertence estarão em prontidão para cum prir seu dever, caso esse am or espontâneo viceje nos recessos de nossos corações. Pois se alguém asseverar seu am or a D eus milhares de vezes, ainda as sim se descobrirá ser fútil e falaz, a m enos que toda sua vida a isso corresponda. N unca poderem os separar am or e obediência. A gora darem os seqüência: 5 Tem os pecado, e tem os com etido iniqüi dade, e tem os procedido perversam ente, e n os tem os rebelado, inclusive apartandon os d e teus preceitos e d e teus juízos: 5 P eccav im u s, et inique e g im u s e t im pro b e nos gessim u s, e t rebellavim us, e t recessim us a præ ceptis tuis, e t ju d ic iis tuis.” 6 N em dem os atenção a teus servos, os 6 E t non auscultavim us servis tuis pro- p rofetas, que falaram em teu n om e a n o s sos reis, a nossos príncipes e a nossos pais e a todo o povo d a terra. phetis, qui loquuti sunt in nom ine tuo ad reges nostros, p rin cip es n ostros, e t patres nostros, et ad p opulum terræ . 7 A ti. ó Senhor, pertence a justiça; a nós, porém , a confusão d o rosto, com o neste d ia: aos hom ens d e Judá, e aos habitantes d e Jerusalém , e a todo o Israel, aos d e per to e aos de ionge, em todos os pafses por onde os tens lançado, por causa d e suas transgressões q u e com eteram contra ti. 7 T ib i dom ine ju stitia, e t n o b isp u d o rv u ltus,*4 sicuti h odie v iro Jehudah,*5 et inco lis Jerusalem , et toti Israeli, propinquis, e t longinquis, in om n ib u s terris, quo expuüsti eos, o b tran sg ressio n es,5" quibus transgressi sunt c o n tra te. Daniel aqui continua sua confissão de pecado. Com o já afir m am os, ele deve com eçar aqui, porque devem os observar em geral a im possibilidade de agradarm os a D eus com nossas ora ções, a m enos que nos aproxim em os dele com o crim inosos, e depositem os toda nossa esperança em sua misericórdia. M as ha via um a razão especial para a natureza extraordinária das ora ções do profeta, bem com o seu uso do jejum , cilício e cinzas. Esse era o m étodo usual de confissão pelo qual D aniel se unia ao restante do povo, com o propósito de testificar a todas as eras da *' O u, tem os nos revoltados contra teus preceitos e teus juízos. “ Literalm ente, de faces. 115O u seja. a todos os judeus. * Ou. p or conta das transgressões. 176 4 5 * EX P O SIÇ Ã O [9.5-7] justiça dos juízos que D eus exercera expulsando os israelitas da terra prom etida e deserdando-os totalm ente. Daniel, pois, insiste neste ponto. Aqui podem os notar, em prim eiro lugar, com o as orações não serão form uladas corretam ente, a m enos que sejam fundadas na fé e no arrependim ento, e assim , não se conform an do com a lei, não podem achar nem graça nem favor diante de Deus. G rande peso, porém, deve ser agregado às frases nas quais Daniel usa m ais que um a simples palavra, ao dizer que o povo agia im piam ente. Ele usa 13KD11, chetcinu, tem o s p ecad o , em pri m eiro lugar, visto que a palavra não im plica algum tipo de falta, mas, antes, um sério crime ou ofensa. Temos, pois, pecado; então tem os p ro ced id o p e rv e rsa m e n te ; em seguida, tem os ag id o im p iam en te; pois S7Un, reshegn, é m ais forte que KDF1 cheta. Te mos procedido perversam ente, temos sido rebeldes, diz ele, ao tra n s g re d ir teus estatu to s e m an d am en to s. Donde procede essa profusão de expressões, senão do anseio de D aniel de incitar a si e a todo seu povo ao arrependim ento? Pois ainda que sejamos facilmente induzidos aconfessar nossa própria culpa perante Deus, todavia raram ente um em cem é afetado com sério remorso; e os que suplantam aos outros, e profunda e reverentem ente tem em a Deus, são ainda m uito apáticos e frios em com putar seus peca dos. A ntes de tudo, raram ente um em cem reconhece; segundo, dos que se conscientizam , poucos avaliam plenam ente sua tre menda culpa; ao contrário, atenuam sua m agnitude; e, em bora percebam ser dignos de cem mortes, todavia não se deixam tocar por sua am argura e tem em hum ilhar-se com o deveriam ; sim, ra ram ente se desgostam de si próprios e não abom inam suas pró prias iniqüidades. D aniel, pois, não acum ula em dem asia pala vras inúteis ao desejar confessar seus pecados pessoais e os do povo. A prendam os, pois, quão longe estam os do arrependim ento enquanto só reconhecerm os verbalmente nossa culpa; em segui da, percebam os a necessidade que temos de m uitos incentivos para despertar-nos de nossa indolência; pois ainda que alguém 177 [9 . 5 - 7 ] D A N IE L venha a sentir grande terror e trem er dos juízos divinos, todavia todo esse senso de medo tão depressa se desvanece. Portanto, faz-se necessário fixar o tem or de Deus em nossos corações com algum grau de violência. D aniel nos m ostra isso ao usar a frase: O p o vo tem pecado; ele tem agido injustamente; tem se conduzido perversam ente e se rebelado e se declinado dos estatutos e m andam entos de Deus. E sta doutrina, portanto, deve receber diligente atenção, porque, com o eu já disse, todos os homens pensam que já se desincum biram de seu dever para com Deus só porque brandam ente se con fessam culpados a seus olhos e reconhecem sua falta num a única palavra. M as, com o o arrependim ento real é algo sacro, é um a questão de m uito m ais im portância do que um a m era ficção. Em bora a m ultidão não perceba, quando confessa um erro, que está enganando a si própria, todavia, ao mesmo tempo, está ape nas desperdiçando palavras com Deus, com o se fossem seus fi lhos, em bora alguns digam que não passam de hom ens, e outros se refugiam na m ultidão de ofensores. “O que posso fazer? não passo de ser humano; tenho apenas seguido o exem plo de m ui tos." Por fim, se exam inarm os cuidadosam ente as confissões dos homens em geral, descobrirem os sem pre algum a hipocrisia la tente, e que existem bem poucos que se prostram diante de Deus com o deveriam fazê-lo. Portanto, é preciso entender esta confis são de Daniel com o sendo um estim ulante, para si e para outros, ao tem or de D eus, e com o um a forte ênfase sobre os pecados do povo, a fim de que cada um sinta nascer em si m esm o um sério e real alarma. Então ele m ostra quão impiamente, quão perversam ente, quão perfidam ente os israelitas haviam se rebelado, e com o se h a vi am declinado dos estatutos e dos m andam entos de D eus. Daniel discorre am plam ente sobre os erros do povo, visto que não ti nham qualquer pretexto em defesa de sua ignorância depois que foram instruídos na lei de Deus. Eram sem elhantes a um homem 178 45* EXPOSIÇÃO [9.5-7] que tropeça em plena luz do dia. Seguram ente, o povo está desti tuído de justificativa para erguer seus olhos ao céu ou para fechálos enquanto anda, ou para precipitar-se adiante em obediência a um cego impulso, porque se cair descobrirá que há adiante de si um a funda vala. Assim D aniel aqui discorre am plam ente sobre o crim e do povo, porquanto a lei de D eus se assem elha a um a lâm pada a alum iar sua vereda com tanta claridade que se revelavam espontânea e m aliciosam ente cegos [SI 119.105], A não ser que fechassem seus olhos, não podiam errar enquanto D eus fielm en te apontava para o cam inho que deviam seguir e nele perseverar. Esse é o prim eiro ponto. Devem os, porém, deduzir desta passa gem outra doutrina, a saber: não há razão algum a para os homens se desviarem totalm ente de Deus, m esm o quando tenham trans gredido seus m andam entos, porque, em bora agradem a si e aos outros, e pensem que granjearam a boa opinião do m undo intei ro, todavia isso de nada vale aos hom ens caso rejeitem eles os m andam entos e os estatutos de Deus. Portanto, seja quem for que tenha a lei em suas m ãos e se afaste em outra direção, ainda que faça uso da eloqüência e de toda retórica, contudo nenhum a defesa surtirá efeito algum. Tal perfídia seguram ente é destituída de justificativa - desobedecer ao Todo-Poderoso quando ele nos indica o que aprova e o que ele requer de nós. Então, quando ele proíbe algo, se nos afastarmos de seus ensinos, ainda que seja bem pouco, som os pérfidos e ímpios, rebeldes e apóstatas. Por fim, esta passagem prova que não há norm a de viver santo, pio e sóbrio, a não ser que resolvam os palm ilhar estritam ente os m an dam entos de Deus. Por essa razão ele exibe estatutos e m anda m entos com o fim de m ostrar que o povo não pecou por ignorân cia. Ele poderia ter concluído a sentença num a única expressão: temos nos afastado de teus m andam entos; no entanto ele associa ju ízo a m andam entos. Por quê? Com o fim de realçar quão fácil, clara e suficientem ente fam iliar era a instituição divina, se os israelitas sim plesm ente se deixassem instruir. Aqui é possível 179 [9.5-7] D A N IE L notar a freqüente recorrência dessa reiteração. É estultícia im agi nar que esses sinônim os são aqui am ontoados sem qualquer ob jetividade, ao usar o profeta os conceitos estatutos, juízos, leis e preceitos; todavia, o Espírito Santo os usa com o fim de assegu rar-nos que nada nos faltará se indagarmos dos lábios de Deus. E le nos instrui perfeitam ente com o regularm os todo o curso de nossa vida, e assim nossos erros se convertem em conhecim ento e disposição, pondo Deus sua lei diante de nós com toda clareza, a qual contém inerentem ente um a norm a perfeita de doutrina para nossa orientação. Em seguida, ele acrescenta: N ão tem os obedecido a te u s s e r vos, os p ro feta s, os q u ais nos tê m falad o em te u nom e. É pre ciso que tam bém notem os diligentem ente esse fator, porque os ímpios am iúde perversam ente deixam de discernir a presença de Deus, toda vez que publicam ente anjos descem do céu para lhes falar; e assim sua im piedade se torna imensurável ao longo das eras. P or isso, em nossos dias, muitos acreditam que podem es capar, vangloriando-se na ausência de algum a revelação proce dente do céu. Afirm am que toda a questão está saturada de con trovérsia; o mundo inteiro jaz num estado de confusão; e o que os m estres da Igreja pretendem ao prom overem tais disputas entre si? Então se vangloriam e pensam segundo lhes apetece, e são cegos porque assim o querem. D aniel, porém , aqui m ostra como nenhum a conversão a Deus é do mínimo valor, a não ser que ele seja atendido quando seus profetas nos ensinam , visto que todos quantos desprezam tais profetas, os quais fa la m em nom e do S e nhor, são pérfidos e apóstatas, perversos e rebeldes. Vemos, pois, a adequação dessa linguagem de Daniel e a ne cessidade da seguinte explicação: O povo era perverso, injusto, rebelde e ímpio, porque não obedecia aos profetas. Ele não asse vera que esse caráter perverso, ímpio, contumaz e pérfido do povo era oriundo de não ouvir ele a Deus trovejando do céu, ou a seus anjos quando lhos enviava, mas porque não obedeciam a seus 180 45* EXPOSIÇÃO [9.5-7] profetas. Além disso, ele cham a os profetas servos de Deus, que falam em seu nome. Ele faz distinção entre verdadeiros e falsos profetas; pois sabemos quantos impostores outrora abusaram desse título na Igreja antiga, com o em nossos dias os perturbadores de nossas igrejas falsam ente se valem do nom e de Deus, e através de tal audácia m uitos dentre os símplices se deixam enganar. Daniel, pois, aqui faz distinção entre os verdadeiros e os falsos profetas, que por toda parte se gabam de sua divina eleição para o ofício de mestres. Ele fala aqui do efeito, acusando a todos esses megalomaníacos com o sendo fúteis e loucos, porquanto não so mos ignorantes da form a com o os m inistros de Satanás se trans formam em anjos de luz [2Co 11.14]. E assim tanto o mau quan to o bom falam em nom e de Deus; ou, seja, o mestre ímpio, não menos que o mestre justo, proclama o nome de Deus; aqui, po rém, com o já dissemos, Daniel faz referência ao efeito e à pró pria matéria, com o a frase é. Assim quando Cristo diz: Quando dois ou três se congregarem em meu nom e [Mt 18.20], isso não deve aplicar-se a imposturas tais com o se observa no papado, quando soberbamente usam o nome de D eus para aprovarem cer tas assembléias suas. E não é algo novo, pois, que um a igreja pratique fraude com o fim de ocultar suas mazelas sob essa m ás cara. M as quando Cristo diz: Onde dois ou três se congregarem em meu nome, isso se refere à afeição genuína e sincera. Assim tam bém Daniel, nesta passagem, diz: Os verdadeiros profetas falam em nom e de D eus; não só porque se refugiavam sob esse título em prol de sua autoridade, mas porque tinham sólidas pro vas do exercício da autoridade de Deus e estavam realmente côns cios de sua genuína vocação. Em seguida, ele diz: a nossos reis, a nossos n o b res, a nossos pais e a todo o povo d a te rra . Aqui Daniel lança por terra toda coisa elevada neste mundo com vistas a enaltecer tão-som ente a D eus e prevenir qualquer laivo de orgulho que porventura surja no mundo com o fim de obscurecer sua glória, com o, do contrá 181 19. 5 - 7 ] D A N IE L rio, ocorreria. Aqui, pois, ele envolve reis, príncipes e pais na m esm a culpa; com o se quisesse dizer: todos devem ser condena dos diante de Deus, sem exceção. U m a vez mais, isso precisa ser diligentem ente observado. Pois vemos com o a plebe crê que tudo lhes é permitido, um a vez seja aprovado por seus reis e conse lheiros. Pois na opinião com um dos homens, em que repousa todo fundam ento do certo e errado senão na vontade e desejo arbitrários dos reis? O que agrada aos reis e a seus conselheiros é estim ado com o lícito, sacro e acima de qualquer controvérsia. E assim D eus é excluído de seu supremo domínio. Portanto, com o os homens assim se vestem de fumaça, e de bom grado se envol vem em trevas, e evitam seu acesso à presença de Deus, Daniel aqui expressa quão inescusáveis são todos os homens que não obedecem aos profetas, ainda quando milhares de reis os obstru am e o esplendor do mundo inteiro os ofusque. A majestade de D eus jam ais poderia ser obscurecida por tais nevoeiros; m ais ain da, isso não pode oferecer o mais leve im pedim ento ao dom ínio de Deus, nem obstruir o curso de sua doutrina. Esses pontos po deriam ser discutidos com mais amplitude; mas estou explicando em termos breves a intenção do profeta e o tipo de fruto que se deve colher de suas palavras. Finalmente, é um notável testem u nho em favor da doutrina do profeta, quando os reis e seus conse lheiros são compelidos a se submeterem, e toda a altivez do mundo é trazida em sujeição aos profetas, com o diz Deus em Jeremias: “O lha que hoje te constituo sobre as nações e sobre os reinos, para arrancares e derribares, para destruíres e arruinares e tam bém para edificares e para plantares” [Jr 1.10]. A í D eus assevera a autoridade de seu ensino e mostra sua superioridade a tudo quan to existe no mundo; de modo que todos os que desejam viver livres dela, com o que dotados com algum privilégio especial, são tanto loucos quanto ridículos. Isso, pois, se deve observar nas palavras do profeta, quando ele diz: D eus fa lo u aos reis, aos p rín cipes e aos pais p o r meio de seus profetas. No tocante aos ‘pais’, 182 45* EXPOSIÇÃO [9.5-7] vemos quão frívola é a escusa dos que usam seus pais com o um escudo em oposição a Deus. Pois aqui Daniel une pais e filhos na m esm a culpa, e m ostra com o todos, sem exceção, m erecem con denação, ao deixarem de dar ouvidos aos profetas de Deus, ou, antes, a D eus mesmo que fala por meio de seus profetas. Em seguida ele junta: A ti, ó D eus, p erte n ce a ju s tiç a , e a nós [pertence] a confusão d o rosto, com o se d á neste dia. O significado é que a ira de Deus, a qual ele m anifesta contra seu povo, é justa, e nada mais resta senão que o povo seja imerso em confusão e hum ildem ente reconheça ser m erecedor de condena ção. M as é preciso que se note tam bém este contraste que une sentenças opostas, porquanto deduzim os das palavras do profeta que Deus não pode ser estimado com o sendo justo, nem sua eqüi dade é suficientem ente proeminente, a não ser quando a boca dos homens se feche e todos se cubram e mergulhem em desgraça e confessem que são passíveis de justa acusação, com o Paulo tam bém diz: Que Deus seja justo, e que a boca dos homens se feche [Rm 3.4, 26]; ou, seja, que os homens cessem suas cavilações e não mais busquem algum alívio de sua culpa em seus próprios subterfúgios. Portanto, enquanto os homens são assim hum ilha dos e prostrados, a genuína glória de Deus é enaltecida. O profeta agora pronuncia a m esm a instrução, juntando essas sentenças de significados opostos: a ti pertence a justiça, porém a nós perten ce o opróbrio. Assim não podem os louvar a Deus, especialm ente enquanto ele nos disciplina e nos pune em decorrência de nossos pecados, a menos que nos envergonhem os de nossos pecados e nos sintamos destituídos de toda e qualquer justiça. Finalm ente, quando sentimos e confessam os a eqüidade de nossa condenação, e quando esse opróbrio se assenhoreia de nos sas mentes, então com eçam os a confessar a justiça divina; pois quem quer que não suporte essa autocondenação m anifesta sua disposição em polem izar com Deus. A inda que os hipócritas apa rentemente dêem testem unho da justiça de Deus, todavia sempre 183 [9.5-7] D AN IEL estão a reivindicar algum a coisa em prol de sua própria dignida de, enquanto que, ao mesmo tempo, detraem o m érito de seu ar bítrio, porque é evidente que a justiça de D eus não pode resplan decer, a menos que mergulhemos em opróbrio e confusão. Como se dá neste dia, diz Daniel. Ele adiciona isso para confirm ar seu ensino; com o se quisesse dizer: a impiedade do povo é suficien temente com patível com seu castigo. Entrem entes, ele sustenta o princípio de que o povo era m erecidam ente castigado; pois os hipócritas, quando com pelidos a reconhecerem o pode de Deus, ainda gritam contra sua eqüidade. D aniel enfeixa ambos os pon tos; assim Deus tem afligido a seu povo, e esse m esm o fato prova que são perversos e pérfidos, ím pios e rebeldes. Como se dá n es te dia significa: eu não me queixo de qualquer rigor imoderado; não direi que tens tratado cruelmente a meu povo; pois ainda quando os castigos que nos tens infligido sejam por dem ais seve ros, contudo tua justiça resplandece neles. Portanto confesso quão plenam ente merecemos todos eles. A u m hom em d e J u d á , diz ele. Aqui Daniel parece querer propositadam ente arrancar a m áscara dos israelitas, por detrás da qual criam poder ocultar-se. Pois era um título honroso ser cha m ado judeu, um habitante de Jerusalém , um israelita. Era uma raça sacra, e Jerusalém era um tipo de santuário e reino de Deus. M as agora, diz ele, ainda que tenham os sido até aqui elevados às alturas ao ponto de ficarmos acim a do resto do mundo, e ainda que D eus se tenha dignado outorgar-nos infindáveis favores e benefícios, todavia a confusão do rosto tom a conta de nós: que D eus seja justo. Entrementes, que cessem todas as vanglorias fúteis, tais com o merecermos nós nossa origem dos santos pais e de habitarmos num a terra santa; que não m ais nos apeguem os a essas coisas, diz ele, porque de nada nos aproveitarão diante de Deus. Percebo, porém, que estou sendo um tanto prolixo. 184 4 5 a EXPOSIÇÃO ORAÇÃO Deus Todo-Poderoso, visto que nenhum outro caminho de acesso a ti se nos abre senão através da humildade sem fingimento, que apren damos, com freqüência, a aviltar-nos com o senso de genuíno arre pendimento. Que aprendamos a viver tão descontentes conosco mes mos, que não fiquem os satisfeitos com sequer uma das confissões de nossas iniqüidades; senão que continuemos no mesmo estado de meditação, e sejamos mais e mais compenetrados com real tristeza. Então poderemos fu g ir para tua misericórdia, prostrando-nos diante de tua face em silêncio, e nenhuma outra esperança reconheçamos senão tua compaixão e a intercessão de teu unigénito Filho. Que assim sejamos reconciliados contigo, não só sendo absolvidos de nossos pecados, mas também governados, ao longo de todo o curso de nossa vida, p or teu Santo Espírito, até ao ponto de podermos des fru ta r a vitória em todo gênero de luta e podermos chegar àquele bem-aventurado descanso que para nós preparaste p o r meio do mes mo Senhor nosso, Jesus Cristo. Amém. 185 46a 8 Ó Senhor, a nós pertence a con fu são d o rosto, nossos reis, nossos príncipes e nossos pais, porque tem os pecado contra ti. ♦ 8 Jeh o v ah , n o b is p u d o r faciei, regibus nostris, prin cip ib u s n o stris, ei p atrib u s nostris, quia peccavim us in te. N este versículo D aniel com pleta sua confissão pessoal. Já declaram os ser este o com eço de sua oração: ele se lançou diante de D eus com o um crim inoso, com todo o povo, e orou ardente m ente por perdão. E ra seu dever com eçar dessa form a; ele previ am ente apontara para todo o povo; agora fala de reis, príncipes e pais, e assim com preende o povo em geral. A lém disso, os reis costum avam absolver de todas as leis ordinárias a si e aos que se chegavam a sua presença. Daí usar Daniel a frase: reis, príncipes e pais. Enquanto tratava do povo, ele mostrou com o os de longe e os de perto eram igualmente sujeitos à ira de Deus, porque, houvera ele executado sua vingança com absoluta eqüidade, e ninguém estaria isento de perversidade ao ponto de ficar livre do castigo. N ão houvera Deus levado todos os judeus ou para a Caldéia ou para a Assíria, e muitos teriam perm anecido nas nações vizinhas. Daniel, todavia, nega-lhes qualquer lenitivo de sua cul pa, ainda que tivessem sido tratados por Deus de form a m ais hu mana, o que lhes pouparia um pouco de seu sofrimento. Somos instruídos por esta passagem que os crim es ou culpa dos homens nem sem pre serão estimados pelo volume de seu castigo. Pois Deus age mui brandamente com alguns que merecem ainda m ai or severidade; e se ele não nos poupa inteiramente, parcialmente remite seu rigor para conosco, seja para conduzir-nos ao arrepen186 46* EXPOSIÇÃO [9.9] dim ento, ou por algum a razão até então a nós desconhecida. Se jam quais forem as razões, ainda quando Deus não pune publica mente a todos nós, isso não deve levar-nos a autojustificativa nem a qualquer auto-indulgência, porque nem sempre experim en tamos a m esm a severidade de Deus. A conclusão a que se deve chegar é esta: todos os israelitas são afligidos com justiça, por que, desde o prim eiro até o últim o, todos têm se conduzido impi amente. Pois Daniel reitera a palavra que não significa m eram en te desvio, m as o agir com grosseira perversidade; com o se qui sesse dizer: os israelitas não m ereciam um castigo corriqueiro, e assim não nos deve surpreender que D eus lhes aplicasse um a vingança tão terrível. Vamos em frente: 9 A o Senhor n osso D eus pertence as m isericórdias e o perdão, ain d a que nos tenham os reb elad o contra ele. 9 D o m in o D e o n o stro m isera tio n e s, et veniae,*7qu am v is rebelles fuerim us in ipsum.*“ Aqui Daniel se vale da m isericórdia de D eus com o se fosse um asilo sagrado; pois não é suficiente reconhecer e confessar os pecados, a menos que sejam os fortalecidos pela confiança de obtermos o perdão na misericórdia divina. Vemos tantos que usam de grande prolixidade a fim de dar testemunho da verdade, di zendo que são sobejam ente m erecedores de todos os tipos de cas tigo; porém nenhum resultado positivo procede disso, visto que o desespero os esmaga e os imerge num profundo abismo. O mero reconhecimento do erro é um a verdade sem o mínim o proveito, a menos que lhe seja adicionada a esperança do perdão. Daniel, pois, depois de sinceramente confessar que o tratam ento que todo o povo recebeu de Deus fora bem m erecido, em bora dem asiada mente severo e escabroso, todavia envolve sua com paixão. Se gundo o provérbio popular, isso é com o o náufrago que se depara 87 n^O. selech, significa "perdoar". É traduzido “propiciações” . mas não há dúvida sobre o sentido. “ Ou, porque sâo rebeldes; pois a partícula *3, jti, é propriam ente causal; mas parece, à luz dc m uitas passagens da Escritura, ser tom ada no sentido adversativo. o que parece adequar-se m elhor à passagem. 187 [9.9] D AN IEL com um a oportunidade. Observamos tam bém com o ele faz uso do m esm o princípio: “M as contigo está o perdão, para que sejas tem ido” [SI 130.4], E essa moderação deve ser diligentem ente determ inada, porque Satanás ou nos acalm a com letárgica segu rança, ou então nos agita tão com pletamente ao ponto de im preg nar nossas mentes com angústia. Esses dois artifícios de Satanás são sobejam ente conhecidos por nós. D aí a necessidade de se m anter a m oderação que ora m encionam os, para que não desen volvamos a letargia em meio a nossos vícios, e assim incorramos no desprezo de Deus, levando-nos tam bém a esquecê-lo. Então, em contrapartida, não devemos ficar apavorados, e assim nos encerrem os fora dos portões da esperança e do perdão. Daniel, pois, aqui segue o m elhor arranjo e nos prescreve a m esm a nor ma. Porque, ao confessar a perversidade do povo, ele não expul sa inteiram ente a esperança e o perdão, mas busca apoio para si e para os outros com esta consolação: D eus é misericordioso. Ele deposita esta esperança de perdão na própria natureza de Deus; com o se dissesse: não há nada tão peculiar a D eus quanto a com paixão, e por isso nunca devem os desesperar-nos. A Deus, diz ele, p erte n ce as m isericó rd ias e o p erd ão . Sem dúvida Daniel tom ou esta frase de M oisés, especialm ente daquela notável e m emorável passagem onde D eus se anuncia com o severo vinga dor, ainda que cheio de m isericórdia e inclinado à clem ência e ao perdão, exercendo infinita longanimidade [Êx 34.6]. Visto, pois, Daniel sustentar a im possibilidade de D eus obliterar seus afetuo sos sentimentos de com paixão, ele tom a isto com o o ponto prin cipal deste ensino, e o faz o principal fundam ento de suas espe ranças e de sua petição por perdão. Ele argum enta assim: A D eus pertence a benignidade; portanto, visto que ele nunca pode negar-se a si mesmo, então será sempre misericordioso. Este atri buto é inseparável de sua eterna essência; e por m ais que nos tenham os rebelado contra ele, todavia jam ais nos repelirá nem fará pouco de nossas orações. 188 46* EXPOSIÇÃO [9.10] Podem os concluir, à luz desta passagem , que nenhum a ora ção é lícita nem corretam ente com posta, a m enos que consista desses dois elementos. Primeiro, todos quantos se achegam a Deus devem lançar-se a seus pés e reconhecer que são m erecedores de mil mortes; segundo, devem ter condição de em ergir do abismo do desespero e despertar-se cheios de esperança e perdão, invo cando a D eus sem medo e isentos de dúvidas e revestidos de firm e e serena confiança. Tal confiança em D eus não pode ter nenhum outro apoio além da natureza de D eus mesmo, e para isso ele dá am plo testemunho. Com respeito ao final do versícu lo, o m esm o pode ser explicado de duas maneiras: Visto que, ou ainda que, sejam os rebeldes contra ele. Já declarei que aprovo mais tom ar a partícula 'D, ki, no sentido de oposição. Ainda que tenham os nos rebelado contra Deus, todavia ele receberá nossa súplica e jam ais negligenciará sua com paixão. Se alguém prefe rir tom á-la no sentido causal, ela se adequará toleravelm ente bem; com o se Daniel dissesse: o povo não tem outra esperança senão a m isericórdia de Deus, ao deixarem -se dom inar paulatinam ente pela convicção de pecado. Visto que temos agido perversam ente para com ele, o que nos é deixado senão lançar-nos com toda nossa confiança sobre a clem ência e benevolência de Deus, já que ele tem testificado ser propício para com os pecadores que verdadeira e sinceram ente imploram seu favor? Vamos em frente: 10 E não o bedecem os à voz d o Senhor. nosso D eus, para andarm os em suas leis, as quais p ôs d ianle d e nós pela instrum enlalid ad e d e se u s servos, os profetas. 10 E t non auscultavim us voei J e h o v s Dei nostri, ui am b u larem u s in legibus ejus, quas proposuil coram facie nosira p e r manum servorum suorum prophetarum . Aqui, um a vez mais, Daniel m ostra com o os israelitas provo caram a ira divina contra si pela perversidade de sua conduta. Ele realça um tipo especial de pecado e m étodo de agir perversam en te, a saber: desprezando o ensino que procedia de D eus com o seu Autor, e o qual lhes fora m inistrado por seus profetas. Devemos diligentem ente observar isso, com o previam ente já notificam os; 189 [ 9 . 10 ] D A N IE L pois ainda que ninguém é justificável diante de D eus a pretexto de ignorância, todavia percebem os com o nossa perversidade é agravada quando consciente e voluntariamente chegamos ao ponto de rejeitar o que Deus ordena e ensina. D aniel, pois, agrava o crim e do povo acrescentando a circunstância: n ã o d e ra m o u v i d o s aos p ro fetas. Tudo quanto constituía culpa no caso dos cal deus ou dos assírios veio a ser a m ais grave perversidade no povo eleito. Sua obstinação era a mais provocante, porque, enquanto D eus apontava o cam inho pela instrum entalidade de seus profe tas, lhe voltavam suas costas. N ão dem os ouvidos. Evidentem en te bastaria adicionar este versículo à guisa de explicação, quando D aniel poderia expressar a razão para sua perversidade. Portan to, ele denom ina as leis de Deus de ‘doutrina’, a qual consiste em muitas partes; pois é indubitável que nada fora om itido p o r Deus que fosse útil conhecer, e assim ele abrangeu em seu discurso toda a perfeição da justiça. Ele está tratando aqui não só d a lei de M oisés, mas tam bém do ensino dos profetas, com o as palavras claram ente o realçam; e o substantivo m i n , torah, ‘lei’, deve ser tom ado por ‘doutrina’. É justam ente com o se Daniel dissesse: Deus foi rejeitado quando desejava governar seu povo através de seus profetas. M as o plural parece denotar o que eu afirm ei, a saber: que a perfeição da doutrina estava com preendida nos pro fetas; pois D eus nada omitiu enquanto com pletava a revelação de tudo quanto se fazia necessário para a diretriz da vida. Toda via isso se tornara totalm ente inútil em virtude da perversidade da natureza do povo, evidenciada em sua rejeição de todas as leis divinas. Daniel confirm a esse sentimento, acrescentando: A quelas leis fo ra m p o stas d ia n te d o povo. Isso m ostra com o o povo foi su prido em tudo, visto que D eus fam iliarm ente lhes entregara tudo quanto era necessário para o supremo grau de piedade e justiça. Pois esta frase: p ô r tudo diante da fa c e de alguém significa m i nistrar todo conhecim ento útil pública, perspícua e lucidamente, 190 46s EXPOSIÇÃO [9.11] e com grande fam iliaridade e habilidade. E assim nada é deixado em dúvida nem em baralhado; nada perm anece obscuro, desco nexo ou confuso. Com o, pois, Deus desvendara todo o escopo da ju stiça pela instrum entalidade de sua lei, a im piedade do povo tom ara-se ainda m ais grave e detestável, porquanto não receberi am nenhum benefício dessa instrução familiar. A intenção do profeta, com essas palavras, é m ostrar com o esses pecadores vo luntários eram dignos de duplicado castigo. São prim eiram ente convencidos de contum ácia, porquanto não tinham nenhum pre texto a apresentar em prol de sua ignorância; fizeram um público e furioso assalto contra Deus, pois ainda que o cam inho lhes ha via sido apontado, todavia se desviaram em todas as direções e se precipitaram de ponta cabeça. D evem os recordar o que previa mente já toquei de leve, a saber: o valor de um m inistério exter no, porque somos cônscios de com o o povo antigo, quando se rebelava contra os profetas, costum ava pretender que na realida de não estavam desprezando a Deus. Com o, pois, os hipócritas pensam que seus pecados estão velados por um véu desse gêne ro, Daniel claram ente expressa que Deus é desprezado em seus profetas, em bora ele não desça do céu nem envie abaixo seus anjos. E este é o significado da expressão; os profetas eram os servos de D eus\ declara com o nada ensinaram tem erariam ente nem em seu próprio nome nem seguindo seus próprios impulsos, m as fielm ente executaram as ordens do Todo-Poderoso. Vamos em frente: 11 E t totus Israel transgress! sum legem tuam . e t d e feceru n t,Mn e auscultarem vo ei tu æ . I d e o .^ e f f u s a e st s u p e r n o s,sl m a le d ic tio ^ e t ju sju ran d u m . q u o d scrip tum est in lege M o sis servi D ei. q u ia peccavim us contra ipsum . 11 Sim . todo o Israel transgrediu tua lei, desviando-se para não obed ecer a tua voz; p o r isso a m ald içã o é d erram ad a sobre nós, e o ju ra m e n to q u e está e sc rito na lei d e M oisés, servo d e D eus; porque peca m os c o n tra ele. ” Literalmente, recuaram ou declinaram. ™ A cópula aqui tem um a força inferenrial. *' Ou, destilou; pois pH2, neihak. tem ambos os sentidos. w H á quem traduza: “execração". 191 [9.11] D A N IE L Daniel um a vez m ais confirm a o que previam ente eu disse sobre ser o castigo aplicado sobre o povo de form a justa. Eles não tinham o mais leve motivo de queixar-se de algum excesso de severidade da parte de Deus. Ele agora diz: todo o Israel tr a n s g red iu . Ele não enum era as classes separadas do povo, com o fizera antes, m as declara serem todos eles transgressores, usando um a palavra singular, ao quebrarem a lei de Deus, desde o m enor até o m aior deles. Ele usa às vezes a segunda pessoa, e às vezes a terceira, com o um a característica de sua veem ência e ardor, visto que Daniel agora fala a todo o mundo, e então se prostra diante de D eus e prepara o acesso a seu tribunal. É com o se a um só tem po ele se confessasse culpado diante de Deus e dos anjos, e em seguida subisse a um palanque para testificar de sua própria infâm ia e a de todo o povo ante os olhos de toda a humanidade. Ao rev o ltar-se, diz ele, p a r a n ão d a r ouvidos. Com essas pala vras D aniel expressa a obstinação determ inada do povo, queren do dizer: isso não foi ocasionado por erro nem por ignorância; ao contrário, nem mesmo a indolência foi a causa da cegueira e de satenção voluntárias de Israel para com os preceitos de Deus, m as foi sim plesm ente o princípio desse ato de rebelião. Portanto, ao revoltar-se para não dar ouvidos a tua voz. A gora entende mos a intenção do profeta. Ele não estava contente com a mera condenação do povo, senão que desejava caracterizar distinta mente as várias form as de rebelião, visando a conscientizar os israelitas com um senso m ais profundo da form a grave com que provaram a ira divina. N ão só tinham se desviado do curso reto através de negligência ou de estultícia, mas tinham consciente mente transgredido a lei divina. É indispensável que observem os bem esse fato. Em bora os hipócritas declarassem que estavam preparados para a obediência, bastando que estivessem plena mente certos de que Deus lhes estava falando, todavia com certe za recuaram para que algum a depravação secreta não viesse cla ram ente à luz. E sempre que a Palavra de Deus é posta diante de 192 4 6 a EXPOSIÇÃO [9.11] nós, m ente todo aquele que não se deixa confirm ar por um a dis posição dócil, m esm o que ju re centenas de vezes de estar perple xo e disposto a abraçar o ensino a ele proposto, porque ele nutre dúvida se D eus está ou não lhe falando. E a veracidade da asse veração de Daniel se fará muitíssim o clara, pois todos os que não ouvem a D eus quando ele lhes fala são apóstatas e interiormente perversos, e pela depravação de sua natureza põem um véu em seus olhos o qual obscurece suas percepções, e então suas própri as m entes os im pedem de tom ar-se obedientes a Deus. Em seguida acrescenta: P o r essa c a u sa a m ald ição so b re a q u a l M oisés escrev era é d e r r a m a d a so b re nós. Por m eio desta circunstância, ele avolum a o crim e do povo, porque desde muito foram advertidos acerca dos juízos pendentes sobre suas cabe ças, e no entanto fecharam os olhos e desprezaram ao mesmo tem po as am eaças e a instrução. Esse foi o clím ax da perversida de; pois os israelitas eram intratáveis, não obstante D eus esten der-lhes suas mãos, apontando o cam inho seguro e ensinandolhes com toda paciência, por m ais que isso fosse inútil; isso, con tudo, só serviu para aum entar sua perversidade, enquanto trata vam as am eaças divinas com o algo com pletam ente sem valor. A lém disso, acrescentaram o desdém contra sua instrução, ridi cularizando suas am eaças, pensando ou que D eus os iludia quan do anunciou por m eio de M oisés a vinda da vingança caso não obedecessem a sua lei, ou im aginavam que tudo não passava de invencionice de M oisés, e não havia com o D eus pudesse execu tar suas am eaças. E assim as pessoas são condenadas p o r sua desesperada im piedade quando ou não atentam para a instrução do Todo-Poderoso ou não crêem na autoridade de suas ameaças. Se um pai am eaça a seu filho, ou um senhor a seu servo, a vin gança será justa, com o disse o poeta cômico: N ão diga que não foi avisado (Terence Andria, Ato I, Cena 2). Com o D eus predisse desde os tem pos rem otos que os israelitas não ficariam impunes se transgredissem a lei, isso prova quão com pletam ente irracio193 [ 9 . 11 ] D A N IE L nais eram eles [Lv 26; D t 28]. E quando diz que a m aldição seria derram ada ou destilada, ele confessa com o a ira de D eus inun dou todo o povo com o um dilúvio, em bora estivesse com pleta m ente sob controle. Porquanto Deus predissera o que ele preten dia fazer pelos lábios de M oisés, e todos quantos lêem aquelas m aldições que M oisés proferiu contra os transgressores da lei confessarão que elas não eram de modo algum imoderadas. Q uan do, pois, a execução realm ente ocorre, não deveríam os reconhe cer o fulgir da justiça divina sem a m ais leve possibilidade de recrim inação? Já afirmei que a palavra n y o itf , shebugneh, é ex plicada por alguns com o um ‘ju ram ento’; e outros, com o ‘m aldi ção’. Ela significa propriam ente um a maldição, e é deduzida da palavra VDW, shebugn, que parece ser tom ada num sentido ex traordinário, porque esta palavra significa propriam ente sete, e a palavra derivada dela significa ‘ju ra r’, através da prática de apre sentar um certo núm ero de testemunhas; e daí o substantivo sig nificar um juram ento. Visto, porém, que um a m aldição é às ve zes interposta, e quem ju ra invoca a Deus com o testem unha con tra si m esm o se deixar de cum prir seu com prom isso verbal, al guns intérpretes deduzem o sentido de um a maldição sendo der ramada. M as pode haver algum a m udança de construção aqui, e assim a interpreto de bom grado. A m aldição e o juram ento, pois, são derram ados; ou, seja, a maldição que D eus sancionou por m eio de um juram ento, por meio de um a figura de linguagem conhecida pelos gram áticos sob o nom e de hipálage.9i A m aldi ção, pois, era pronunciada em form a de juram ento pelos lábios de Deus, pessoalmente; e sabemos com o as ameaças causam mais terror por serem confirmadas por um juram ento, assim como Deus, em contrapartida, acrescenta força às prom essas de seu favor. ” "Figura com que parece atribuir-se a certas palavras de uma frase o que pertence a outras d a mesma frase: enterrar o chapéu na cabeça po r enterrar a cabeça no chapéu." (Pequeno Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa de Aurélio Buarque de Hollanda Ferreira, 11‘ edição. 13' impressão. E ditora Nacional). - Nota do tradutor. 194 4 6 a EXPOSIÇÃO [9.12] Em seguida acrescenta: P o rq u e tem os ag id o p e rv e rs a m e n te c o n tra ele. Com esta expressão Daniel sucintam ente, porém claram ente, afirm a que o povo não tem nenhum m otivo de quei xa, com o se suas calam idades fossem o resultado ou de acidente ou do acaso. Poderiam contem plar a própria fonte de seus males na lei de Deus. N ão houvera nenhum a predição desse tipo, os israelitas poderiam nutrir dúvidas e m esm o questionar consigo m esm os quanto à origem e causa de serem eles escravizados por seus inim igos e de serem eles expulsos com o m áxim o desprezo e crueldade para terras distantes. Poderiam então ter inquirido sobre as causas de seus males, com o se as m esm as fosse total mente desconhecidas. M as quando a lei de M oisés se achava di ante de seus olhos, e D eus tinha ali jurado que cum priria as m es mas am eaças justam ente com o ocorreu, não seria possível restar ainda algum a dúvida sobre isso. Este, pois, é o sum ário da inten ção de D aniel; a própria denúncia desses castigos era suficiente para condenar os israelitas, porquanto seus pecados lhes eram trazidos a lume cada vez mais, quando D eus cum priu contra eles o que havia anteriorm ente predito pela instrum entalidade de seu servo M oisés. Vamos em frente: 12 E ele confirm ou sua palavra, a qual falou contra nós e contra nossos ju iz e s que nos ju lg a v a m , tra z e n d o s o b re nós um grande m al; p orquanto debaixo d e todo o céu nunca se fez co m o se tem feito em Jerusalém . 12 E t sta b iliv it serrao n em su u m , q uem loquutus fueral su p er nos, e t su p e r ju d ices nostros, q ui n os ju d ic a ru n t,1“ u t adduceret super nos m alum m agnum q u o d non factum est sub coto ccelo, sicut factum est95 in Jerusalém . D aniel segue o m esm o diapasão, m ostrando com o os israeli tas não tinham motivo para discutir com Deus sobre a razão de serem tão severam ente afligidos, e não tinham razão algum a para nutrir dúvida sobre sua origem ou intenção. Pois agora tudo ocorria exatam ente com o há m uito fora predito. D eus, pois, instigava ** O u seja. contra nossos juizes e governantes que nos governavam ; pois para os hebreus ju lg a r' significa 'governar'. M O u seja, como aconteceu. 195 [9.12] D A N IE L sua palavra contra nós; com o se quisesse dizer: não há razão por que lutar contra Deus, pois vemos sua fidelidade nos castigos que nos tem infligido, e suas am eaças não são mais fúteis espan talhos nem fabulosas invenções m anufaturadas para am edronta rem crianças. Deus agora realm ente prova quão seriam ente havia falado. Qual, pois, é a utilidade de nosso costum e de voltar-lhe as costas, ou por que buscamos debalde justificativas quando a fi delidade de D eus refulge esplendorosam ente em nossa destrui ção? Porventura pretendem os privar Deus de sua fidelidade? Se guram ente, por mais que sejam os solícitos, jam ais terem os êxito. Portanto, isto é suficiente para condenar-nos: D eus predisse tudo quanto ocorre, e assim eficaz e experim entalm ente prova ser vin gador. Portanto, D eus ratificou sua palavra; ou, seja, a palavra de D eus teria perm anecido sem a m ais leve eficácia e vigor, a m enos que essa maldição perm anecesse suspensa acim a de nos sas cabeças. M as enquanto estam os prostrados e quase sepulta dos sob nossas calam idades, a palavra de D eus se m antém sus pensa; isto é. D eus faz sua fidelidade copiosam ente visível, a qual, do contrário, dificilm ente seria perceptível. A m enos que D eus castigue a perversidade dos hom ens, quem não trataria as am eaças de sua lei com o infantilidade? M as quando ele dem ons tra, por m eio de certas provas, as muitas razões para terrificar a hum anidade, a eficácia e o vigor são im ediatam ente com unica dos a suas palavras. Além disso, D aniel aqui tenciona desfazer todos os subterfúgios e levar o povo a sinceram ente reconhecer e realm ente sentir que é afligido com justiça. D iz ele: c o n tra nós e c o n tra os ju iz e s q u e nos ju lg a v a m . U m a vez m ais Daniel humilha toda a arrogância da carne, com vistas a exaltar a D eus som ente e a im pedir qualquer esplendor moral de obscurecer a autoridade d a Lei. Pois sabem os com o as pessoas com uns im aginam que possuem um escudo para sua de fesa contra todos os crim es, quando podem citar o exem plo de reis e juizes. Em nossos dias, sem pre que argum entam os contra 196 46 a EXPOSIÇÃO [9.12] as superstições do papado, eles dizem: “M uito bem , se com ete mos algum equívoco. D eus ainda tem estabelecido reis e bispos que nos governam segundo seu método; p o r que, pois, devam os ser responsabilizados quando temos o m andam ento de D eus de seguir os que estão investidos de poder e dignidade?” Visto, pois, forjar o vulgo, geralm ente, um subterfúgio com o este, Daniel novam ente afirm a que, em bora os que transgridem a lei de Deus sejam investidos com grande autoridade profana, não estão isen tos nem de culpa nem de castigo, tam pouco pode a multidão or dinária ser justificada caso sigam seu exem plo. Portanto, como ele fa la ra pelos lábios de M oisés contra nossos ju ize s que nos julgavam , diz ele, ou, seja: em bora lhes fosse conferido poder para nos governar, todavia toda sua ordenação provém de Deus. Todavia, depois que abusaram totalm ente de seu govem o e vio laram a justiça de Deus, e assim em preenderam derrubar Deus, caso fosse possível, de sua posição celestial, Daniel assevera que sua altivez de modo algum os livraria das conseqüências da trans gressão. Em seguida acrescenta: tra z e n d o so b re nós u m g ra n d e m al; p o rq u a n to d eb aix o de to d o o céu n u n c a se fez com o ag o ra o c o rre u em J e ru sa lé m . Aqui D aniel predisse um a objeção que aparentava possuir algum a força. A inda que D eus houvesse merecidam ente castigado os israelitas, todavia, ao exibir ele sua ira contra eles, m ais severam ente do que contra outras nações, apa rentem ente se esquecia de sua eqüidade. Daniel aqui remove toda e qualquer aparência de incongruência, m esm o que D eus seja m ais severo contra seu povo eleito do que contra as nações pro fanas, porque a im piedade desse povo era m uito m aior do que a de todas as outras nações em razão de sua ingratidão, contum ácia e im placável obstinação, com o já vimos. Visto que os israelitas excederam a todas as nações em malícia, ingratidão e todo gêne ro de iniqüidade, Daniel aqui declara com o suas desastrosas afli ções eram totalm ente merecidas. Além disso, somos aqui lem197 [9.13] DANIEL brados de que, sem pre que D eus severam ente disciplina sua Igre ja, aquele princípio ao qual voltaremos, a saber, nossa im piedade é ainda mais detestável a D eus à m edida que nos aproxim am os dele; e quanto m ais bondoso ele se nos torna, m ais responsáveis som os, a m enos que, por nossa vez, provem os ser gratos e obedi entes. Este estado de coisas não deve parecer-nos perturbador, um a vez que a vingança com eça na casa de Deus e ele exibe exem plos de sua ira contra seu próprio povo de um a form a m uito m ais trem enda do que contra os dem ais. D igo que não devem os levar isso a mal, com o já expliquei a razão. N ão nos surpreende encontrar os gentios tateando nas trevas, mas quando D eus res plandece sobre nós e o resistimos com determ inação voluntária, na verdade som os ímpios. Esta com paração, pois, precisa ser ponderada, ou, seja, com o o mal foi derram ado sobre Jerusalém ; não significando que nenhum castigo sem elhante fora infligido sobre outras nações, pois o que aconteceu ci Jerusalém , diz D ani el, nunca ocorrera debaixo de todo o céu. Vamos em frente: 13 C om o está escrito n a lei d e M oisés, todo e ste m al nos sobreveio; todavia não fizem os n ossa o ração d iante d o S enhor nosso D eus para nos converterm os d e nossas in iq ü id a d es e c o m p re en d e rm o s tua verdade. 13 Sicuti scriptum est in lege M osis, totum m alum hoc venit su p er nos, e t non deprecati sum us faciem J e h o v s D ei nostri, u i reverterem ur ab iniquitatibus nos tris, e t attenti essem us a d v eriíatem tuam . Ele reitera o que dissera antes, sem qualquer superfluidade, dem onstrando com o os juízos de D eus são provados por seus efeitos, com o a lei de M oisés contém em si todas as penalidades que os israelitas suportaram . Como, pois, um a concordância tão m anifesta existia entre a lei de Deus e a experiência do povo, não deviam tornar-se rebeldes, buscando todo tipo de subterfúgio sem qualquer proveito. Só por isso Deus provou sobejam ente ser um justo vingador de seus crim es, porque predissera muitas eras an tes o que depois cum pre plenamente. Este é o objetivo da repeti ção, quando Daniel diz que o povo sentiu a ju stiça das penas denunciadas contra eles na lei de M oisés, pois entrem entes ele 198 46* EXPOSIÇÃO [9.13] acrescenta: não desaprovam os a fa c e de Deus. Ele aqui severa m ente responsabiliza a dureza do povo, porque, ainda quando golpeados por açoites, nunca chegaram a ser sábios. Lem os que os tolos têm que sofrer calam idades a fim de aprender a sabedo ria. Portanto, este foi o cúm ulo da dem ência em o povo perm ane cer assim irredutível sob a vara do Todo-Poderoso, m esm o quan do ele lhes infligia os m ais severos golpes. Com o o povo se tor nara tão obstinado em sua perversidade, quem não perceberia quão sinceram ente tal conduta tinha de ser deplorada? Portanto, n ã o d esap ro v am o s a face d e nosso D eus. Esta passagem nos ensina com o o Senhor exerce seus juízos, não des truindo com pletam ente os homens, mas m antendo sua sentença final suspensa, com o se por esse meio ele quisesse im pelir os homens ao arrependim ento. Prim eiro, ele am ável e com passiva m ente convida maus e bons, por meio de sua Palavra, e acrescen ta também promessas, com o propósito de atraí-los; e então, quan do os observa ou m orosos ou refratários, ele usa am eaças com o intuito de despertá-los de sua sonolência. E se as am eaças não produzem nenhum efeito, ele sai com varas e azorragues para castigar a letargia d a humanidade. Se tais açoites não produzirem nenhum m elhoram ento, o caráter obstinado do povo se tom a evi dente. E assim D eus, em Isaías, se queixa de sua falta de honesti dade; toda a corporação do povo está tom ada por úlceras, da ca beça à planta de seus pés [Is 1.6]. E todavia ele não perde todo seu trabalho a despeito de o povo ser totalm ente ingovernável. Daniel então assevera a existência do mesmo sentim ento no povo, enquanto declara que os israelitas eram intocáveis pelo senso de suas calamidades, de modo a nunca suplicar por perdão. N ão posso com pletar o pensam ento hoje. ORAÇÃO Deus Todo-Poderoso, permite que aprendamos seriamente a consi derar de quantas maneiras nos tornamos culpados a teus olhos, es pecialm ente quando diariamente continuamos a provocar tua ira 199 D A N IE L contra nós. Que sejamos humilhados com genuíno e sério arrependi mento e corramos solicitamente para ti, quando nada nos é deixado senão unicamente tua compaixão. Quando humilhados e confusos, reduzidos a nada em nós mesmos, que possam os correr para essa sacra âncora, uma vez que tu facilm ente te deixas enternecer e pro meteste agir como Pai de misericórdias, favorecendo a todos os pe cadores que te buscam. Que assim nos aproximemos de ti com genuí no arrependimento, em plena confiança de que tua munificência j a mais deixará de atender nossas súplicas; e sendo libertados p o r tua mercê da tirania de Satanás e do pecado, sejamos governados por teu Espírito Santo e assim dirigidos na vereda da justiça para glori fic a r teu nome ao longo de nossas vidas, até chegarmos àquela feliz e imortal vida que sabemos estar estabelecida no céu para nós, por Cristo nosso Senhor. Amém. 200 47a p ^ f j / l a preleção de ontem dem oram os nos crim es do povo dev t nunciados am plam ente pelo profeta, ao resistirem eles a impressão feita pelos castigos divinos. Agora, porém, ele dem ons tra mais claram ente o tipo de obstinação que foi exibida. Por quanto eles não se converteram de suas iniqüidades, e não a ten taram para a verdade de Deus. Ele dissera antes para não repro varmos a ira de Deus. Aqui, porém, ele expressa algo mais, a saber: adm itindo a existência de algum pretexto na oração, não houve real sinceridade. Sabem os quão im piam ente os hipócritas abusam do nom e de D eus e se escondem na form a externa da oração, e ainda simulam o m ais intenso fervor, todavia não há nenhum a realidade em suas orações. Assim o profeta tem boas razões para unir o que nunca deveria separar-se, e então conven ce os israelitas de obstinação, porque não fugiam hum ildem ente para D eus em busca de sua m isericórdia com arrependim ento e fé. Indubitavelm ente, havia algum a form a de piedade deixada entre o povo; Daniel, porém , aqui avalia a oração segundo a Pa lavra de Deus, e assim põe estas duas coisas diante de nós: arre pendim ento e / e . E devem os observar isso com diligência. Pois nada é mais com um do que um a ardente súplica por perdão quando se evidenciam os sinais da ira de Deus; isso foi sem pre costum ei ro entre todas as nações e em todos os tempos; todavia não exis tia ali nem arrependim ento nem fé. D aí suas orações se tornarem m era falsidade e vacuidade. Esse é o sentido da linguagem do profeta quando diz: não buscam os a fa c e de Jeová nosso Deus, 201 [9.13] D A N IE L convertendo-nos de nossas iniqüidades (ou para que nos conver têssem os) e deixando-nos instruir em tua verdade. Finalm ente, podem os deduzir desta passagem qual a regra da oração real m ente pia e aceitável. Prim eiro, tem os de sentir-nos desgostosos conosco mesm os em virtude de nossos pecados; segundo, deve mos levar em conta as am eaças e prom essas do Todo-Poderoso. Q uanto ao prim eiro m em bro da sentença, a experiência nos ensi na quão tem erariam ente m uitos se prorrom pem em oração, m es m o quando sua m á conduta se insurge francam ente contra Deus. De um lado, se sentem tão exasperados que não hesitam em de clarar guerra contra Deus, e no entanto oram a ele, porque o ter ror se apodera de suas mentes e os com pele a subm eter-se a Deus. O profeta, pois, aqui m ostra a com pleta inutilidade dessa exibi ção externa e perversa m istura de ruídos e bajulação, porque Deus não pode aprovar semelhantes orações, a m enos que emanem igualm ente do arrependim ento e fé. Quando ele diz: o p o vo não atentou para a verdade de D eus, em m inha opinião isso se esten de igualm ente às am eaças e prom essas, e a fé apreende tanto a com paixão de D eus quanto seus juízos. Pois, seguram ente, não pode ser diferente quando o terror incita os pios a buscarem asilo na m isericórdia de Deus. Como, pois. Deus abarca cada qualida de descrita em sua Palavra; com o ele cita todos os que pecaram a com parecerem diante de seu tribunal, e então lhes dá a esperança de reconciliação, se o pecador realm ente se converte a ele, assim tam bém D aniel, ao dizer: os israelitas não atentaram para a ver dade de D eus, indubitavelm ente linha em mente am bos os obje tos, a saber: sua falta de suficiente consideração dos juízos divi nos e, em seguida, sua estupidez em desprezar sua com paixão quando claram ente posta diante deles. Com o um todo, esta pas sagem nos m ostra a im possibilidade de nossas orações serem agradáveis a Deus, am enos que fluam do genuíno arrependimento e fé; ou, seja, quando sinceram ente sentimos nossa perversidade, e então buscamos asilo na misericórdia de D eus depositando nossa 202 47* EXPOSIÇÃO [9.14] confiança em suas prom essas. D aí descobrim os três coisas que se fazem necessárias para tom ar Deus propício a nós: prim eiro, insatisfação conosco mesm os, a qual ocasiona tristeza em decor rência de nossa conscientização do pecado que habita em nós e de haverm os provocado a ira divina. Este é o prim eiro ponto. O segundo é que a fé deve necessariam ente ser adicionada. Em úl timo lugar, a oração deve seguir com o um a prova de nosso arre pendim ento e fé. Quando os hom ens perm anecem sem arrepen dim ento e fé, observam os com o o nom e de D eus é profanado, ainda que form ulem os e pronunciem os m uitas orações, ao m es m o tem po em que duas disposições prim ordiais estão totalm ente ausentes. A gora podem os prosseguir: 14 P o r isso o S enhor velou so b re o m al e o trouxe so b re n ós; p orque o S e n h o r nosso D eus é ju s to era to d as suas o b ras q u e e le fe z. pois não obedecem os a sua voz. 14 El vigilavit Jeh o v ah su p e r m alum . et im m isit illud'* su p er nos: q u ia ju stu s est Jehovah D eus n o ste r in om m ibus operibus suis, quse fecit, hoc est, fa cii, et non auscu liav im u s voei ejus. Daniel confirm a o que dissera anteriorm ente a respeito do m orticínio que afligiu os israelitas, não provindo o m esm o do acaso, m as do infalível e extraordinário ju ízo divino. D aí ele usar a palavra Ipli?, seked, que significa vigiar e aplicar a m ente, aten tando para tudo. É propriam ente usada em referência aos guardas das cidades, os quais m antêm vigilância dia e noite. E sta frase não me parece implicar pressa, mas, antes, desvelo contínuo. Deus am iúde usa esta m etáfora para expressar sua vigilância para dis ciplinar os homens que se acham ávidos dem ais para lançar-se ao pecado. Estam os fam iliarizados com a grande intem perança da raça hum ana e seu desregram ento de toda m oderação sem pre que os desejos da carne se assenhoreiam deles. D eus, em contraparti da, diz que não será indolente nem negligente em corrigir tal in tem perança. A razão que justifica esta parábola é expressa no capítulo 44 de Jerem ias, onde somos inform ados que os homens * Fê-la vir. 203 [9.14] D A N IE L se precipitam e se deixam levar por seus apetites, e então Deus se põe em contínua vigilância até chegar o tem po de sua vingança. Eu já m encionei com o esta palavra denota diligência contínua, e não rapidez im petuosa; e o profeta aqui parece significar que, em bora D eus tenha suportado a perversidade do povo, todavia por fim realm ente concretizará suas am eaças previam ente anun ciadas; e que estava sempre em guarda e im possibilitando que o povo escapasse de seus juízos derram ados sobre a perversidade a que se entregaram. Portanto, J e h o v a h aten to u d etid a m e n te p a r a a c a la m id a d e e a fez v ir so b re nós, diz ele. Com o intuito de com preender a intenção do profeta m ais plenam ente, devem os observar o que D eus pronuncia pelos lábios de Jerem ias em Lam entações [3.38], onde ele acusa o povo de indolência, porque não reconheceram a justiça dos castigos que sofriam; ele os culpa nestes term os: “Por ventura da boca do A ltíssim o não sai tanto o mal com o o bem ?” Com o se ele fosse pronunciar um a m aldição contra os que são ignorantes da origem das calam idades de Deus, quando ele casti ga o povo. Tal sentim ento não se confina a um a única passagem. Pois D eus am iúde investe contra aquela estupidez que nasceu no seio da raça hum ana e a leva a atribuir cada evento à sorte e a ignorar a mão daquele que faz a ferida [Is 9.13]. Esse tipo de ensino é encontrado em toda parte nos profetas, os quais m os tram com o nada pode ser pior do que tratar os juízos divinos com o se fossem acidentes sob a influência do acaso. Eis a razão por que D aniel insiste tanto sobre este ponto. Sabem os tam bém o que Deus denuncia em sua lei: Se andardes contrariam ente a mim, eu tam bém andarei contrariam ente a vós [Lv 26.27,28]; ou, seja, se não cessardes de atribuir à sorte todo o mal que sofreis, eu me lançarei contra vós de olhos fechados e tudo farei para que so frais as conseqüências. Com o se quisesse dizer: Se não podeis distinguir entre o acaso e meus juízos, então vos afligirei de to dos os lados, pela direita e pela esquerda, sem a m ais leve com204 47 * EXPOSIÇÃO [9.14] paixão; com o se eu fosse um ébrio, de acordo com a expressão: com o perverso eu serei perverso. P or essa razão D aniel agora confessa: D eus velava sobre a calamidade para trazer todas es sas aflições por m eio das quais o povo era oprimido. N esta passagem somos ensinados a reconhecer a Providência de Deus tanto na prosperidade quanto na adversidade, com o pro pósito de despertar-nos à gratidão por seus benefícios, enquanto seus castigos têm o propósito de produzir hum ildade. Pois quan do alguém explica essas coisas com o oriundas da sorte e do aca so, tal pessoa com isso prova sua ignorância d a existência de Deus, ou, pelo m enos, do caráter da D eidade a quem adoramos. Pois o que é deixado a Deus se o roubam os de sua Providência? E suficiente aqui tocar apenas de leve nesses pontos que estão ocorrendo amiúde e sobre os quais costumeiramente ouvimos algo todos os dias. E suficiente para a exposição desta passagem ob servar com o o profeta eventualm ente contrastou o ju ízo e a Pro vidência de D eus com todas as noções de acaso. Em seguida ele acrescenta: J e h o v a h nosso D eus é ju s to em to d a s su as o b ras. N esta sentença o profeta confirm a seu ensino anterior; e a frase, D eus é ju sto , aparece com o que apresentando a razão para suas atividades. Porque a natureza de Deus supre a razão por que se torna impossível que algo aconteça m ediante o cego im pulso do destino. D eus se assenta no céu com o juiz; daí essas duas idéias são diretam ente contrárias um a à outra. E assim se um a das seguintes afirm ações for feita, a outra é ao mesmo tem po negada. Se D eus é o ju iz do mundo, o destino não tem lugar em seu governo; e tudo quanto for atribuído ao destino es tará dissociado da justiça de Deus. A ssim temos um a confirm a ção de nossa sentença anterior pelo uso de contrários ou opostos. Porquanto devem os necessariam ente atribuir ao juízo de D eus tanto o bem quanto o mal; tanto a adversidade quanto a prosperi dade, se porventura ele governa o m undo pela instrum entalidade de sua Providência e exerce o ofício de Juiz. E se nos incJinar205 [ 9 . 14 ] DANIEL mos sequer um mínimo grau para o destino, então o G overno e a Providência de D eus cessarão de ser reconhecidos. Entrem entes, D aniel não só atribui poder a D eus, m as tam bém celebra sua ju s tiça; com o se quisesse dizer: ele não governa o m undo arbitrari am ente sem qualquer norm a de ju stiça ou eqüidade, porém ele é ju sto . N ão devem os pressupor a existência de algum a lei superi o r que obrigue o Onipotente; ele é um a lei em si e para si m esm o, e sua vontade é a norm a de toda justiça. Todavia devem os esta belecer este ponto: Deus não reina sobre o m undo com o tirano, em bora na perfeição de sua eqüidade ele realize algum as coisas que nos parecem absurdas, sim plesm ente porque nossas mentes não podem ascender à altura suficiente para captar a razão ev i dente pelo m enos em parte, e quase inteiram ente oculta e incom preensível, dos juízos de Deus. D aniel, pois, desejava expressar esse fato com estas palavras: Jeh o v ah nosso D eus, diz ele, é ju s to em to d a s as o b ra s q u e realiza. Eis o significado: o povo não teria sido tão severam ente castigado e afligido com calam i dades tantas e tão m iseráveis, se não houvera provocado a ira de Deus. Isso poderia ser facilm ente coligido das am eaças que D eus denunciara de antem ão desde os tem pos m ais rem otos, e que ele naquele tem po provou que a verdade genuína não é frívola se quer um m ínim o grau. Em seguida, ele acrescenta uma segunda parte, a saber: não só o poder de Deus, m as tam bém sua justiça, se m anifestam na m atança do povo. E tenho tocado superficial mente em cada um desses pontos, até onde se fez necessária um a explanação. Devem os notar, porém , a alusão do profeta, nessas palavras, sobre os fiéis, com o propósito de provar sua fé. Eles percebiam que eram os mais desprezados e m iseráveis dentre os mortais. O povo peculiar e sagrado de Deus estava sofrendo sob o m ais intenso opróbrio e ódio, em bora D eus os houvera adotado por m eio de sua lei, com a intenção de o enaltecer acim a de todos os dem ais povos. Portanto, enquanto percebiam que eram traga dos por aquele profundo torvelinho de calam idades e desgraça, o 206 47* EXPOSIÇÃO [9.15-17] que mais supunham senão que D eus os enganara ou que seu pacto fora totalm ente aniquilado? Daniel, pois, estabelece a justiça de Deus em todas suas obras com o propósito de acalmar tal tentação e de confirm ar os santos em sua confiança, bem com o induzi-los a buscarem asilo em D eus no extrem o de suas calam idades. Ele acrescenta, com o razão: P o rq u e n ã o deram ouvidos a su a voz. Aqui, um a vez mais, ele realça o crim e do povo que não trans gredira movido por ignorância ou erro, mas propositadamente deu o grito de guerra contra Deus. Sempre que a vontade de D eus uma vez se nos torna conhecida, não mais temos justificativa alguma para a ignorância; pois nosso franco desafio ao Todo-Poderoso pro vém de sermos desviados pelos desejos da carne. E daí deduzir m os quão detestável é a culpa de todos quantos não obedecem à voz de D eus sempre que ele se digna ensinar-nos, e que aquiesce m os imediatamente em sua palavra. A gora podem os prosseguir: 15 E agora, ó S enhor no sso D eus, tro u xeste leu povo d a terra d o E g ito c o m m ão p o d e ro sa e a d q u iriste p a ra ti re n o m e , co m o n este d ia [se v ê]; tem o s pecado, tem o s p rocedido im piam ente. 15 E t nunc D o m in e D eus noster, q ui eduxisti populum tuum e terra /E g y p ti cum m an u fo rti, e t fe cisti, com parasti, tibi nom en secundum d iem hanc,97 peccavim us. im pie egim us. 16 R ogam os-te, ó Senhor, segundo todas tuas ju stiç a s, que a partes d e tu a c id a d e d e Je ru sa lém , teu santo m onte, tua ira e teu furor; porque, por c a u sa d e nossos pecad o s e p o r causa das iniq ü id ad es d e nossos pais, Je ru salém e teu povo se tom aram opróbrio a to d o s quantos nos cercam . 16 D om ine secundum o m n esju stitias tuas avertatur, q u a s o , ira tua, e t ex candescentia tua a b urbe tua Jerusalem , m onte sanctitatis tu a : q uoniam o b peccata n o stra, et o b iniquitates9* patrum nostrorum , Jerusa le m , e t p o p u lu s tu u s e st in pro b ru m cunctis v icinis” circu itib u s n o stris.'00 17 A gora, p ois, ó n osso D eus, o u v e a oraç â o d e teu serv o e suas súplicas, e faz resp la n d e c e rte u ro s to s o b re te u s a n tu á rio q u e e stá desolado, p o r a m o r d o Senhor. 17 E t nunc audias. D eus noster, precationem servi tui, et orationem ejus atque illum in a faciem tu a m 101 su p e r sanctuarium tuum , q u o d vastatum est, vel, desolatum, propter D om inum . ” Ou, seja, como o próprio acontecim ento realçado. * Ou, em nossos pecados e iniqüidades. w Literalm ente, "todos” . 100 Ou, seja, os que e stio em nosso circuito. 101 Ou, seja, faz teu rosto resplandecer. 2 07 [9.15-17] D AN IEL D epois que Daniet confessou suficientem ente a ju stiça d a queles juízos que D eus infligira sobre o povo, novam ente volta a rogar por perdão. Primeiro, ele conquista favor para si mesm o; em seguida, ele incita as m entes dos pios àconfiança, e assim ele põe diante deles aquela prova da graça que deve servir para sus tentar as m entes dos pios até o fim do mundo. Pois quando D eus tirou seu povo do Egito, ele não pôs diante deles algum benefício m eram ente m om entâneo, porém testificou da adoção da raça de A braão na condição de ser seu Salvador perpétuo. Portanto, sem pre que Deus deseja congregar os que se acham dispersos, e des pertar suas m entes do estado de desespero ao de ju b ilo sa espe rança, os lem bra que é ele seu Redentor. D iz ele: Eu sou o Deus que vos tirou do Egito [Lv 11.45, e am iúde em outros lugares]. D eus não só enaltece seu próprio poder em tais passagens, porém insinua o objeto de sua redenção; pois ele então recebia seu povo sob seu cuidado sobre a m esm a base de nunca cessar de agir em seu favor, com o am or e a solicitude de um pai. E quando em seu turno tal solicitude se apoderava dos fiéis, ao ponto de levá-los à consciência de sua própria e total deserção de Deus, tinham o hábito de sobraçar este escudo: não foi em vão que D eus tirou nossos pais do Egito. D aniel agora desenvolve este raciocínio: Tü, ó S e n h o r nosso D eus, diz ele, q u e g u iaste te u povo. Com o se quisesse dizer: ele invocou a D eus porque, por um a única pro va, testificou a todas as eras o sacro caráter da raça de Abraão. Observamos, pois, com o ele estim ula a si e a todo o restante dos santos a orarem , porque, ao lançar este fundam ento, ele podia queixar-se de forma familiar, e destemidamente suplicar que Deus usasse de com paixão para com seu povo, e pôr um basta a suas calam idades. A gora entendem os a intenção do profeta, quando ele diz: o povo foi tira d o d o Egito. Em seguida acrescenta outra causa: D eus en tão g ra n je o u p a ra si renom e, com o o acontecim ento evidentem ente d em o n s tro u . Ele aqui associa o poder de Deus com sua com paixão, signi208 47a EXPOSIÇÃO [9.15-17] ficando que, quando o povo foi guiado, isso não foi apenas um exem plo de favor paternal em prol d a fam ília de Abraão, mas tam bém um a exibição do poder divino. Donde se segue que seu povo não podia ser execrado sem tam bém destruir a m em ória daquele portentoso poder pelo qual D eus granjeou para si reno me. E o m esm o sentim ento am iúde ocorre nos profetas quando usam o argumento: Se este povo perecesse, o que im pediria a extinção de tua glória, e assim tudo quanto conferiste a este povo de ser sepultado no esquecim ento? Assim, pois, D aniel agora diz: A o trazer teu povo da terra do Egito, tu fize ste para ti m esm o uni nome\ ou, seja, granjeaste glória para ti mesmo, a qual deve expandir-se por todos os séculos até o fim do mundo. O que, pois, sucederá se todo teu povo for agora destruído? Em seguida acres centa: P rocedem os im p iam en te, e agim os p erv ersam en te. Nes tas palavras Daniel declara com o nada foi deixado senão que Deus ponderasse para si mesmo, m ais do que para o povo, quando, ao olhar para eles, nada visse senão motivo para vingança. O povo necessariam ente pereceria se D eus o tratasse segundo merecia. M as aqui D aniel desvia o rosto de Deus, por assim dizer, dos pecados do povo, com o intuito de fixar sua atenção somente em si m esm o e na com paixão divina, bem com o em sua consistente fidelidade àquele perpétuo pacto que fora feito com seus pais. Por fim, ele não perm itiria que a redenção fracassasse, a qual era um a prova em inente e eterna de sua virtude, favor e benevo lência. D aí ele agregar: O S enhor, q u e tu a ira e tu a a rd e n te có lera sejam d esv iad as d e tu a cid ad e J e ru s a lé m e d o m onte d e tu a san tid ad e. O bservam os com o Daniel aqui exclui todo e qualquer m érito que pudesse haver no povo. N a realidade não o possuíam , porém fala segundo aquela tola im aginação que os ho mens cultivam . Sem pre tomam crédito para si, ainda que estejam centenas de vezes convencidos de seus pecados, e ainda desejem conciliar o favor divino pleiteando algum m érito diante de Deus. A qui, porém , Daniel exclui todas essas considerações ao supli209 [9.15-17] D A N IE L car a Deus que lhe conceda sua justiça, e usa a expressão forte: segundo toda tua justiça. Os que tom am esta palavra ‘ju stiça’ no sentido de ‘ju íz o ’ caem em erro e são inexperientes na interpreta ção das Escrituras; porque supõem que a justiça de D eus seja oposta a sua piedade. M as nos fam iliarizam os com a ju stiça de D eus quando se m anifesta especialm ente nos benefícios que ele nos confere. É justam ente com o se Daniel dissesse que a única esperança do povo consistia em Deus ter respeito unicam ente por si próprio e de form a algum a pela conduta deles. D aí ele to m ar a ju stiça de Deus em lugar de sua liberalidade, o gracioso favor, consistente com sua fidelidade e proteção, o que ele p ro m eteu a seus servos: Portanto, ó D eus, diz ele, segundo todas tuas m isericórdias que prom eteste; isto é, tu não falhas para com aqueles que confiam em ti; nada prom eteste precipitadam ente; e não costum as abandonar os que fogem para ti. Oh, por tua p ró pria justiça, socorre-nos em nossa tribulação. É preciso tam bém que notem os bem a partícula universal ‘todas’, pois quando D a niel une tantos pecados que pudessem precipitar o povo em um abism o mil vezes profundo, ele opõe a isso todas as m isericórdi as que D eus havia prometido. Com o se houvera dito: ainda que o núm ero de nossas iniqüidades seja tão im enso que pereçam os centenas de vezes, todavia tuas misericórdias prometidas são ainda m ais numerosas, significando: tua justiça excede ao que existe de m aior em nós: o mais profundo abismo de nossas culpas. Ele diz ainda: Q u e tu a ir a re tro c e d a e tu a ir a a b ra s a d o ra se ja a fa s ta d a d e tu a cidade J e ru s a lé m e d e te u sa n to m o n te. A o enfeixar ira e cólera ardente, o profeta não insinua qualquer excesso por parte de Deus, com o se vingasse os pecados do povo com dem asiada severidade, mas novam ente apresenta a gravida de de sua perversidade, levando-o a enfurecer-se contra eles ao ponto de abandonar seu caráter costum eiro e tratar sua adoção com o se fosse vã e infrutífera. Daniel não se queixa, neste caso, d a severidade do castigo, mas, antes, condena a si e ao resto do 210 47* EXPOSIÇÃO [9.15-17] povo por provocarem a necessidade de m edidas tão drásticas. U m a vez mais, ele põe diante de Deus o m onte santo que havia escolhido, e dessa form a desvia a som bra do ju ízo , para que não lhes fosse com putado tantos pecados, pelos quais D eus estava m erecidam ente enfurecido. Aqui, pois, a eleição divina é inter posta, porque ele consagrara para si o m onte Sião e queria ser cultuado ali, onde tam bém seu nom e seria celebrado e sacrifícios lhe seriam oferecidos. Neste respeito, pois, Daniel obtém favor para si diante de Deus e, com o eu já disse, exclui todas as dem ais considerações. Em seguida acrescenta: P o r c a u sa d e nossos p ecad o s e d as in iq ü id ad es d e nossos p ais, J e ru s a lé m e te u povo são vilip en diad o s p o r todos nossos vizinhos. Lançando m ão de outro argu m ento, o profeta deseja m over Deus à com paixão; porquanto Je rusalém e todo o povo se tornaram um a desgraça aos olhos das nações; todavia isso fez com que igual desgraça recaísse sobre o próprio Deus. Com o, pois, os gentios fizeram dos judeus um alvo de chacota, não pouparam nem m esm o o sacro nom e de Deus; mais ainda, os judeus se tornaram tão desprezíveis, que os gen tios raram ente se dignavam falar neles, e o D eus de Israel era desdenhosam ente traduzido, com o se fora com pletam ente venci do, visto que havia tolerado ver seu tem plo ser destruído e toda a cidade de Jerusalém ser consum ida pelo fogo e por cruel m atan ça. O profeta, pois. agora elabora seu argum ento, e, ao falar da cidade santa, indubitavelm ente faz referência à sacralidade do nom e de Deus. Sua linguagem subentende: Tu escolheste Jerusa lém com o um a espécie de residência régia; e tu desejavas ser cultuado ali, porém agora esta cidade se tornou objeto do mais execrando escárnio nos lábios de nossos vizinhos. A ssim ele d e clara com o o nom e de D eus fora exposto às blasfêm ias dos gen tios. Em seguida ele atribui o m esm o ao povo de Deus, não à guisa de queixa, quando os judeus sofriam tais escárnios porque os m ereciam , em decorrência de seus pecados, m as a linguagem 211 [9.15-17] D A N IE L é enfática: a despeito de tudo, ele era ainda o povo de Deus. O nom e de D eus era enfeixado estreitam ente com o de seu povo, e toda infâm ia que os profanos lançavam sobre ele refletia princi palm ente no próprio Deus. A qui D aniel põe diante do O nipoten te seu próprio nome; com o se quisesse dizer: Ó Senhor, sê tu o vingador de tua própria glória; certa vez nos adotaste sobre esta condição: que a m em ória de teu nom e esteja sempre gravada em nós. Tens perm itido que sejam os m assacrados de form a tão des prezível; não perm itas que os gentios te insultem por essa conta. E no entanto ele diz que isso ocorreu p o r causa das iniqüidades do povo e as de seus pais. Com essa expressão ele rem ove toda e qualquer possibilidade de dúvida. Oh, com o foi possível aconte cer que Deus prostrasse seu povo dessa form a? P or que ele não poupou pelo m enos seu próprio nom e? Daniel, pois, aqui testifi ca que Deus é justo, porque a iniqüidade do povo e a de seus pais se erguera num m ontão tão alto, que D eus se vira com pelido a exercer sua vingança contra eles. Eis sua próxim a oração: Tb, q u e és nosso D eus, ouve a o r a ção e as sú p licas d e teu servo, e faz te u ro sto resp lan d e cer. N estas palavras, D aniel se digladia com a desconfiança, não por sua própria causa, m as por causa de toda a Igreja em prol da qual ele apresenta o verdadeiro m étodo de oração. E a experiência ensina a todos os pios quão necessário é este remédio contra aque las dúvidas que interrom pem todas nossas orações e fazem com que nossa solicitude e ardor na oração dêem lugar ao torpor e tibiez de nossa alma, ou pelo m enos oram os sem qualquer con fiança serena e tranqüila; e tal hesitação vicia a tudo quanto ante riorm ente concebem os. Como, pois, isso sucede diariam ente a todos os crentes pios quando abrem mão do dever de orar, pelo m enos por um breve período, e algum a dúvida sorrateiram ente os atrai e fecha a porta do acesso fam iliar a Deus. Eis a razão por que D aniel tão am iúde reitera a sentença: Tu, ó Senhor, ouve a oração de teu servo. Davi tam bém inculca tais sentim entos em 212 47* EXPOSIÇÃO [9.15-17] suas orações, e tem toda razão de agir assim. E os que são real m ente experientes no cam po da oração sentem com o os servos de D eus têm boas razões para usar tal linguagem sem pre que oram a ele. D eixem os, porém, para am anhã a conclusão do resto. ORAÇÃO Deus Onipotente, como designaste que nos reuníssemos entre teu povo e quiseste também que demos testemunho de teu nome e da glória de teu unigénito Filho, ainda que tão amiúde provoquemos tua ira com nossos pecados e nunca cessamos de am ontoar m al sobre mal. con cede que jam ais sejamos expostos como alvo de zombaria e espetá culo, fazendo com que teu santo nome seja denegrido. Como, pois, agora viste os ímpios lançando mão de todas as ocasiões para gros seiramente te difamarem, de teu santo evangelho e do nome de teu unigénito Filho, não lhes permitas, rogo-te, que petulantemente te insultem. Que teu Espírito assim nos governe para que desejemos glorificar teu santo nome. Que o mesmo seja glorificado, a despeito de Satanás e de todos os ímpios, até que sejamos congregados na quele reino celestial, o qual nos prometeste no mesmo Cristo nosso Senhor. Amém. 213 48a / f i n t e m com eçam os nosso com entário sobre a passagem na W q u a l Daniel pede ao Todo-Poderoso que fize sse seu rosto resplandecer sobre seu próprio santuário. Estam os bem cientes de quão am iúde esta expressão ocorre nas Escrituras, quando le m os que D eus m anifesta sua oposição ocultando seu rosto, quan do ele não m ais assiste seu povo, porém se oculta com o se não m ais se lem brasse deles. A s Escrituras por toda parte com param nossas calam idades e adversidades a trevas; por isso se diz que D eus, em cujo favor nossa felicidade é posta, oculta seu rosto quando não nos socorre. E novam ente se diz que ele faz brilhar seu rosto quando nos propicia algum sinal de seu favor paternal. Era com o se por m uito tem po Deus houvera abandonado seu san tuário, e por isso o profeta ora para que ele fize sse resplandecer seu rosto. Devemos notar bem sua expressão: sobre teu santuá rio que ja z em ruína. D eduzim os disso que, em bora o profeta visse todas as coisas perdidas no sentido carnal, todavia ele não se desesperou nem desistiu de suas orações. E esta regra precisa ser anotada: a graça de Deus não deve ser estim ada pelo presente aspecto das coisas, porque ele am iúde se revela irado conosco. N ossa razão cama! precisa ser vencida, caso desejem os orar a D eus na adversidade, com o o profeta aqui nos ensina por meio de seu exem plo pessoal. Pois o santuário estava suprim ido; sua própria devastação poderia ter propiciado um a escusa a D aniel e a todos os santos para não m ais oferecerem suas orações. Que sucesso se podia esperar num estado tão deplorável de ocorrênci214 48* EXPOSIÇÃO [9.18] as? D aniel, através de tais circunstâncias, m ostra com o se esfor çava para não adm itir que algum obstáculo interrom pesse o cur so de suas orações. Ele acrescenta: p o r a m o r d o S en h o r. Todos os doutores hebreus concordam que a palavra ' JTN, Ac/ow, quan do escrita com o grande ponto kam etz, é tom ada unicam ente para Deus. M as em certas passagens da Escritura é m ui claram ente usada tam bém para o Mediador. É bem provável que ela tenha este sentido aqui; ainda que os hebreus usem esta form a p o r am or a D eus ou p o r tua causa quando fazem um apelo direto à D eida de. Eu, contudo, confesso que às vezes é usada a terceira pessoa. Q ue necessidade, porém , há para evitar esta form a de linguagem m ais abrupta, quando o outro sentido parece ser m ais apropriado à passagem ? M ais adiante ele dirá: por tua causa, ó meu Deus; aqui, porém , ele diz: p o r am or do Senhor. Entretanto, se eu tives se contendido com um a pessoa de disposição capciosa, confesso que não poderia convencê-la à luz desta passagem ; mas se pesar mos as palavras do profeta sem o espírito de contenda, nos incli narem os, antes, para este ponto de vista do tema. Aqui, pois, ele põe diante de D eus o M ediador p o r cujo favor espera obter seu pedido. Todavia, se alguém preferir aplicar isto a Deus, que tal pessoa retenha sua opinião. Vamos em frente: 18 Inclina, ó m eu D eus. teus ouvidos e ouve; abre teus o lh o s e contem pla n ossas desolações, e a cidade q u e é cham ado p or le u n o m e . P o rq u e n ão apresentam os n ossas súplicas diante d e ti c o m base em nossa ju stiç a , m as c o m b a se em tuas g ra n d es m isericórdias. 18 In c lin a D eus m i, aurem tuam , e t audi: aperi o culos tuos, e t respice desolationes n o stra s,102 e t c iv itatem su p er q uam invoc a tu m e stn o m e n tuum , su p e r e am ,linquia non propter ju stitia s n ostras nos prosternim u s preces n o stra s coram facie tu a, sed propter m isericórdias tu a s l(“ m ultas, vel, magnas. Esta breve sentença bafeja um m aravilhoso fervor e veem ên cia em oração; pois Daniel derram a suas palavras de form a tor Ou, devastações. 105 A s palavras super eam. “ sobre ela", são redundantes. 1(u Ou, por conta de tuas compaixões. 215 [9.18] D A N IE L rencial com o se fosse desfalecer. Os filhos de D eus am iúde caem em êxtase durante a oração; gem em e suplicam a D eus; usam vários modos de expressão e m uita tautologia; e não podem satisfazer-se. Aliás, em formas de linguagem os hipócritas são às vezes superiores; não só rivalizam os sinceros adoradores de Deus, m as são totalm ente afeiçoados a pompas externas e a um vasto am ontoado de palavras em suas orações; chegam com m uita ele gância e esplendor e inclusive se revelam grandes oradores. M as D aniel aqui apenas exibe algum a porção de seus sentimentos; não há dúvida de que desejava dar testem unho a toda a Igreja de quão veem ente e fervorosam ente ele orava com o intuito de in flam ar outros com semelhante ardor. N este versículo, ele diz: In clin a, ó m eu D eus, te u s ouvidos e ouve. Teria sido suficiente simplesmente ter dito: escuta! Mas, com o Deus parecia perm anecer surdo a despeito de tantas ora ções e súplicas, o profeta roga-lhe a inclinar seus ouvidos. Há um a silenciosa antítese aqui, porque os fiéis pareciam estar p ro nunciando palavras a surdo, enquanto seus gem idos eram conti nuam ente elevados aos céus durante setenta anos sem o m ais leve efeito. Em seguida ele acrescenta: a b re te u s olhos e vê. Pois a indiferença de Deus em responder teria descoroçoado as espe ranças dos santos, já que os israelitas estavam sendo tratados tão indignam ente. Eram oprim idos de todas as form as possíveis pelo opróbrio e sofriam o mais grave m olestam ento em seus bens e em tudo mais. Contudo D eus passou por sobre todas essas cala m idades de seu povo com o se seus olhos estivessem fechados; e por essa razão Daniel agora ora pedindo que ele abrisse seus olhos. Vale a pena notar essas circunstâncias com diligência, com o pro pósito de aprender com o orar a Deus. Prim eiro, quando em paz e capazes de pronunciar nossas petições sem a m ais leve inquietu de; e, segundo, quando a tristeza e a ansiedade se apoderam de todos nossos sentidos e tudo em nossa volta escurece; mesmo então nossas orações devem prosseguir livrem ente envoltas por 216 48* EXPOSIÇÃO [9.18] esses grandes obstáculos. E deduzim os, ao m esm o tempo, en quanto D eus nos com pele aos próprios extrem os de nossas vidas, com o devem os ser ainda m ais importunos, porque o próprio ob jetivo dessa nossa aflição é despertar-nos de nossa indolência. E assim lemos nos Salmos: “Por isso, todo aquele que é santo orará a ti, a tem po de poder encontrar-te” [Sl 32.6]. N ossa oportunida de surge quando as extrem as necessidades nos esm agam , porque Deus, então, nos incita, com o eu já disse, para corrigir nossa len tidão. Que aprendam os, pois, habituar-nos a orar com veem ên cia, sempre que D eus nos im pelir e nos incitar com estím ulos desse gênero. Em seguida ele diz: co n tem p la nossas desolações - disto já falam os bastante - e a cid ad e so b re a q u a l p u seste te u nom e. U m a vez mais Daniel põe diante de si o sólido fundam ento de sua confiança: Jerusalém tinha sido escolhida com o o santuário de Deus. Sabem os que a adoção divina é sem arrependim ento, no dizer de Paulo [Rm 11.29]. Daniel, pois, aqui tom a o mesmo m étodo m ais forte de apelar para a honra de Deus, insistindo que a vontade de Deus era que ele fosse cultuado no M onte Sião e designar Jerusalém para si com o a sede real. A frase ser chamada pelo nom e de D eus significa reconhecer o lugar ou a nação com o pertencente a Deus. Pois lemos que o nom e de Deus é invocado sobre nós quando professam os ser seu povo, e ele nos distingue por sua marca, com o se publicam ente dem onstrasse, aos olhos da hum anidade, seu apreço por nossa confissão. E assim o nome de D eus foi invocado sobre Jerusalém , porque sua eleição fora celebrada há m uitos séculos, e também havia congregado um povo peculiar e designara um lugar onde queria que se oferecem sacri fícios. Em seguida, acrescenta: P o rq u e n ã o d e rra m a m o s nossas o rações d ia n te d e tu a face fiad o s em n o ssa p r ó p r ia ju s tiç a (*D, ki, ‘m as’, em m inha opinião é expresso adversativam ente aqui), m as em v irtu d e d e tu a s m u ita s ou g ra n d e s m isericó rd i217 [9.18] D A N IE L as. Daniel confirm a m ais claram ente ainda o que foi dito ontem, m ostrando com o sua esperança se fundara unicam ente na mercê divina. M as já afirm ei com o ele expressa seu significado mais claram ente, opondo dois membros de um a sentença naturalm en te contrários um ao outro. N ão em nossa própria ju stiça , diz ele, m as em tuas compaixões. A inda que esta com paração nem sem pre seja expressa tão distintam ente, todavia esta regra deve ser m antida - sem pre que os santos confiam na graça de Deus, re nunciam ao m esm o tem po todos seus m éritos [pessoais] e nada encontram em si m esm os que propicie a Deus. E sta passagem , porém , deve ser diligentem ente notada, onde D aniel cuidadosa m ente exclui tudo quanto se opõe à bondade graciosa de D eus; e em seguida m ostra com o, ao apresentar algum a coisa com o sen do propriam ente sua, com o se os homens pudessem m erecer a graça de Deus, eles dim inuem um degrau da m ercê divina. As palavras de Daniel também contêm outra verdade, m anifestando a im possibilidade de conciliar duas coisas opostas, e vice-versa, a saber: buscar os fiéis refúgio na m ercê divina e todavia fazer tudo para si mesm os e descansar em seus próprios méritos. Como, pois, existe um a profunda repugnância entre a graciosa benevo lência divina e todos os m éritos hum anos, quão estúpidos são os que se esforçam em com biná-los segundo a prática usual do p a pado! E mesmo agora os que não se refugiam espontaneam ente em D eus e em sua Palavra pretendem lançar um véu sobre seus erros, atribuindo metade do louvor à m isericórdia divina e reten do o resto com o que pertencendo ao homem. Toda dúvida, po rém, é rem ovida quando Daniel põe esses dois princípios em opo sição um ao outro, segundo m inha observação anterior - a justiça hum ana e a mercê divina. N ossos méritos, na verdade, não se fundirão com a graça de D eus m ais que a tentativa de m isturar o fogo e a água na vã esperança de achar algum a concordância en tre elem entos tão opostos. Em seguida ele cham a essas mercês de ‘grandes’, com o previam ente observam os o uso de um a gran218 4 8 ' EXPOSIÇÃO [9.18] de variedade de palavras para expressar os vários modos nos quais o povo se dispunha a receber seu juízo. Aqui, pois, ele im plora as m isericórdias de Deus com o sendo muitas e grandes, visto que a perversidade do povo havia chegado a seu ponto máximo. Q uanto à expressão seguinte: O povo d e rra m o u su as o r a ções d ia n te d e D eus, a Escritura parece em algum a m edida discrepar-se em seu conteúdo, m ediante o freqüente uso de um a m etáfora diferente, representando as orações com o sendo ergui das aos céus. Esta frase ocorre com freqüência: Elevam os ou apre sentam os a ti nossas orações. Aqui tam bém , com o em outros lu gares, o Espírito dita um a forma diferente de expressão, repre sentando os fiéis com o que lançando no chão seus votos e ora ções. Cada um a dessas expressões é igualm ente adequada p o r que, com o dissem os ontem, tanto o arrependim ento quanto a fé devem estar bem associados em nossas orações. O arrependim en to, porém , arrem essa os homens para baixo, enquanto a fé os soergue e os im pele para cim a novamente. À prim eira vista, es sas duas idéias não parecem facilmente conciliáveis; mas, ao exa m inar esses dois membros de um a form a de expressão verdadei ra e lógica, não acharem os possível erguer nossas orações e vo tos ao céu sem calcá-las, por assim dizer, nas profundezas mais baixas. Porque, de um lado, quando o pecador entra na presença de D eus, necessariam ente ele tem que prostrar-se com pletam en te; m ais ainda, se dilui diante dele com o se fosse destituído de vida. Este é o genuíno efeito do arrependim ento. E assim os san tos se prostram em todas suas orações, sem pre que hum ildem en te se reconhecem indignos da atenção do Todo-Poderoso. Cristo põe diante de nós um quadro desse tipo no caráter do publicano que bate em seu peito e suplica perdão com um sem blante de alguém aterrado [Lc 18.13]. Assim tam bém os filhos de Deus se prostram em suas orações naquele espírito de hum ildade que em ana do arrependimento. Então se erguem de suas orações m o vidos pela fé, pois quando D eus os convida a si e lhes dá teste219 [9.19] D A N IE L m unho de ser-lhes propícios, erguem -se e sobem às nuvens, sim, ao próprio céu. Razão por que esta doutrina tam bém resplandece com esta promessa: Tu és o Deus que ouve as orações - com o lem os nos Salm os [Sl 65.2]. Em decorrência do fato de que os fiéis se convencem de que Deus é fiel, ousadam ente se chegam a sua presença e oram com mentes soerguidas, em plena convicção de que D eus se agrada dos sacrifícios que oferecem. Prossigamos: 19 Ó Senhor, ouve; ó Senhor, perdoa; 6 S enhor, a te n ta e age; não te delongues, p o r am o r d e ti, ó m eu D eus; porque tua cidade e teu povo sâo cham ados por teu nom e. 19 D o m in e audi. D o m in e propitius esto, D om ine a ttende, vel, animadverie, e t fac n e m oreris p ro p ter te. D eus m i. quia nom en tu u m in v o ca tu m e st s u p e r urbem tuam , et su p r populum tuum . Aqui a veem ência é m elhor expressa, com o observei previa mente. Pois Daniel não exibe sua eloqüência, com o geralm ente agem os hipócritas, m as simplesmente ensina por m eio de seu exem plo a verdadeira lei e m étodo da oração. Sem dúvida, ele fora im pelido por zelo singular com o propósito de juntar outros a si. D eus, pois, operou no profeta por meio de seu Espírito, para fazer dele um guia para todo o restante, e sua oração com o um tipo de forma com um para toda a Igreja. Com essa intenção, D a niel agora relata suas concepções pessoais. Ele tinha orado sem qualquer testemunha, m as agora convoca toda a Igreja e quer que ela venha a ser um a testem unha de seu zelo e fervor, e convida todos os homens a que seguissem esta prescrição, procedente não dele, mas de Deus. O S enhor, ouve, diz ele; e em seguida: Ó S enhor, sê propício. Com esta segunda expressão ele insinua a surdez contínua e intencional do Todo-Poderoso, porque era com razão que ele estava irado contra o povo. E devem os observar este fato, porque nesciamente ficamos surpresos de Deus não ouvir nossas orações tão logo quanto desejamos, assim que elas pro m anam de nossos lábios. É preciso que notemos tam bém a razão. A lentidão de Deus prom ana de nossa frieza e em botam ento, en quanto nossas iniqüidades interpõem um obstáculo entre nós e seus ouvidos. Portanto, sê tu propício, ó Senhor, para que possas 220 48* EXPOSIÇÃO [9.19] ouvir. E assim que a frase deve ser entendida. Em seguida ele acrescenta: O S enhor, aten d e. Com esta expressão Daniel pre tende com unicar isto: enquanto o povo tinha de várias m aneiras e por muito tem po provocado a ira de Deus, eram indignamente oprim idos por ímpios e cruéis inimigos, e que essa severa cala m idade deveria inclinar D eus à com paixão para com eles. Por tanto, diz ele, ó S en h o r aten d e e n ã o te delongues. D eus havia destituído seu povo já por setenta anos, e suportara vê-los opri m idos por seus inimigos, levando os fiéis ao clím ax do desânim o mental. E assim percebem os com o nesta passagem o santo profe ta lutou ousadam ente contra a mais severa tentação. Ele suplica que D eus não m ais se delongue ou adie. Setenta anos já havia passado desde que D eus form alm ente destituíra seu povo p o r re jeitarem cada em blem a de sua boa vontade para com eles. A inferência prática desta passagem é a im possibilidade de orarm os de modo aceitável, a menos que nos ponham os acima de tudo quanto nos sobrevem; e se avaliarm os o favor divino pelo prism a de nossa própria condição, perderem os o próprio desejo de orar; m ais ainda, passaremos centenas de vezes por entre nos sas calam idades e seremos totalm ente incapazes de soerguer nos sas mentes na presença de Deus. Finalm ente, sem pre que Deus parecer delongar-se por tem po sem fim, devem os repetir cons tantem ente a súplica: não te delongues. E ele acrescenta: p o r a m o r de ti m esm o, ó m e u Deus. U m a vez m ais Daniel reduz a nada aquelas fontes de confiança pelas quais os hipócritas im agi nam ser capazes de obter o favor de Deus. A inda quando uma parte da sentença não seja realm ente o oposto da outra, com o foi o caso antes, todavia, quando ele diz, p o r am or de ti, podem os entender qual a inferência: logo, não por am or de nós mesmos. Ele confirm a este ponto de vista pelo restante do contexto: p o r a m o r d e ti, ó m eu D eus, p o rq u e teu no m e tem sid o in v o cad o sobre tu a cidade, diz ele, e so b re te u povo. Observamos, pois, com o Daniel não deixou nenhum meio sem experim entar a fim 221 [9.20, 21] D A N IE L de obter seu pedido, em bora confiasse em sua graciosa adoção e jam ais duvidasse dos sentimentos propícios de D eus para com seu próprio povo. N a verdade ele não acha nenhum a causa neles, nem nos m ortais, nem em seus méritos, m as deseja que a hum a nidade perpetuam ente contem ple os benefícios divinos e prossi g a firm e até o fim. Continuemos: 2 0 E e nquanto eu falava e orava, e con fessa v a m eu pecado, e o pecado d e m eu povo Israel, e apresen tav a m inha súplica d ian te d o S e n h o r m eu D eus em fav o r do m onte san to d e m eu D eus, 2 0 E t adhuc ego lo q u en s,I0S e t precarer. e t confiterer peccatum m eum , e t peccatum p opuli m ei Israel, e t p ro ste m e rem ,'“ p re ca tio n e m m eam c o ram Je h o v a D eo m eo, su p er m o n te m 107sanctuarii D ei mei. 21 S im , e stan d o eu ainda faiando em o ra ção . o hom em G abriel, a quem e u vira na v isão no princípio, sendo levado a voar c o m rapidez, tocou-m e. à h o ra d a obla ç ã o vespertina. 21 C um , inquam , lo q u ere r in p recatione m ea, tunc vir G abriel q uem videram in v isio n e p rincipio v olantem volatu, tetigit m c c irca tem pus o b lationis vespertinae. Q uanto à tradução, alguns a tomam com o eu faço; outros di zem “ voando rapidam ente”, subentendendo fadiga e alacridade. Alguns derivam a palavra ‘voando’ de gnof, a qual significa voar, e juntam -na com seu particípio próprio, o qual é com um no hebraico; outros ainda pensam que a m esm a derivou-se de yegnef, significando fadiga, e então a explicam metaforicam ente, com o voando apressadam ente.108 Aqui Daniel com eça mostrando-nos que suas orações de modo algum foram inúteis, nem ainda destituídas de seus frutos, já que G abriel foi enviado para elevar sua m ente em confiança e ilum i nar sua tristeza com consolação. Em seguida ele o apresenta como m inistro da graça de Deus a toda a Igreja, com o fim de inspirar os fiéis com a esperança de breve regresso a seu país e encorajálos a suportarem as aflições até que Deus abrisse um cam inho para seu regresso. Quanto a nós, não carece adm iração se Deus lns Ou, seja. enquanto eu estava ainda falando. "* Ou, fez cair; a m esm a palavra de antes. ,07 Ou, seja. por conta de, por causa de. o monte. "* Ver a nota clara e compreensível de W intie in loco. 222 48* EXPOSIÇÃO [9.20, 21] às vezes se recusa a responder nossas orações, porque aqueles que parecem orar muito m elhor que os dem ais, raram ente possu em um a centésim a parte do zelo e fervor requeridos. Ao com pa rarm os nosso m étodo de oração com essa veem ência do profeta, seguramente estam os m uitíssim o atrás dele; e de forma algum a surpreende se, enquanto a diferença é tão grande, o sucesso tem de ser por dem ais dessem elhante. E ainda podem os assegurarnos de que nossas orações jam ais serão em vão, se seguirm os o santo profeta ainda por um longo intervalo. Se o volum e limitado de nossa fé impede nossas orações de com petir com o zelo do profeta, D eus, não obstante, ainda as ouvirá, contanto que este jam fundam entadas na fé e no arrependimento. Portanto, diz Daniel: E n q u a n to eu a in d a fala v a, e o ra v a , e confessava m eu pecad o e o p ecado d e m eu povo Israel. Antes de tudo, devem os observar com o o Espírito Santo aqui proposi tadam ente ditou ao profeta com o a graça de D eus seria preparada para e estendida a todos os desafortunados que fugissem para ela e a im plorassem . O profeta, pois, m ostra por que som os tão des tituídos de auxílio, pois se a dor ocasiona tanto gem ido, contudo nunca respeitam os a Deus, em quem a consolação deve ser sem pre buscada em todos os males. Ele assim nos concita a form ar mos o hábito da oração, dizendo que seus pedidos eram ouvidos. Ele não apresenta nenhum exem plo singular, mas, com o eu já disse, declara em term os gerais que as orações dos que buscam a D eus com o libertador jam ais serão vãs nem infrutíferas. Tenho m ostrado com o nossas súplicas nem sempre contam ou com a m esm a ou com igual atenção, visto que nosso torpor requer que D eus diferencie o auxílio que ele oferece. M as dessa form a o profeta nos ensina com o os que possuem fé e arrependim ento genuínos, m esm o que sejam frágeis, jam ais oferecerão suas ora ções a D eus em vão. Em seguida ele acrescenta o que é necessário para conciliar o favor divino, ou, seja, que os homens antecipem o juízo divino 223 [9.20, 21] D A N IE L condenando-se. Então ele assevera: confessei m eu pecado e o pecado de m eu povo. Ele não fala aqui de um tipo de pecado, mas sob a palavra U7UFI, cheta, ele com preende todos os tipos de per versidade; é com o se ele dissesse: enquanto me confessava im pregnado de pecados e m ergulhado em iniqüidade, fiz a m esm a confissão em favor de meu povo. Devem os notar tam bém a fra se: o pecado de meu povo Israel. Ele poderia ter om itido este substantivo, porém desejava testificar diante de Deus que a Igre ja era culpada e sem a mais leve esperança de absolvição, a m e nos que Deus, a quem ela havia ofendido de form a tão grave, se dignasse graciosam ente a reconciliá-la consigo. A prim eira sen tença, porém , é m ais digna de nota, na qual D aniel relata a con fissão de seus pecados pessoais diante de Deus. Conhecem os o que Ezequiel diz, ou, antes, o Espírito falando através de sua boca [Ez 14.14], Porque D eus nom eia os três personagens m ais per feitos que então existiram no mundo, e inclui Daniel entre eles, ainda que ele, então, estivesse vivo. Em bora Daniel fosse um exem plo de ju stiça angelical, e seja celebrado por tão em inência e honra, todavia, se m esm o ele estivesse diante de mim, e a mim suplicasse em prol desta situação, eu não o ouviria, porém livra ria som ente a ele em virtude de sua justiça pessoal. Com o, pois, Deus assim enaltece seu próprio profeta e o eleva às alturas com o se estivesse além de toda e qualquer poluição e vícios do mundo, onde acharem os um hom em sobre a terra que possa gabar-se de ser isento de toda m ácula e falha? Q ue os caracteres m ais perfei tos sejam trazidos a nossa presença - que diferença entre eles e Daniel! Todavia ele m esm o se confessa pecador diante de Deus e renuncia com pletam ente sua justiça pessoal e publicam ente dá testem unho de que sua única esperança de salvação está posta exclusivam ente na mercê divina. D aí Agostinho, com m uita sa bedoria, cita com freqüência esta passagem contra os seguidores de Pelágio e Celéstio. Estamos bem cientes com que capciosas pretensões esses hereges obscureceram a graça de D eus, quando 224 48* EXPOSIÇÃO [9.20, 21] argum entavam dizendo que os filhos de D eus não devem perm a necer sem pre na prisão, m as devem atingir o alvo. A doutrina é de fato bastante corrente, a saber, que os filhos de D eus devem estar sem pre isentos de toda falha; m as onde tal integridade é realm ente encontrada? Agostinho, pois, com a m áxim a proprie dade, sem pre respondeu a esses palradores frívolos mostrando que jam ais existiu alguém neste m undo que fosse tão ju sto que não carecesse da misericórdia de Deus. Porque, se tal pessoa exis tisse, seguram ente o Senhor, que é o único ju iz com petente, o poderia ter encontrado. Ele, porém , assevera que seu servo D ani el estava entre os m ais perfeitos, se apenas três fossem tom ados desde o princípio do mundo. M as, visto que D aniel se considera parte do rebanho de pecadores, não usando do expediente de fin gido pretexto ou de hum ildade, porém exprim indo a plenitude de sua mente diante de Deus, quem agora reivindicaria para si mai or santidade do que esta? E n q u a n to , pois, eu co nfessava m eus pecados d ia n te d a face d e m eu Deus. Aqui seguram ente não há ficção, do que se deduz que os que pretendem esta im aginária perfeição são dem ônios em form a humana, com o C astélio e ou tros cínicos, ou, melhor, cães com o ele. Devem os, pois, aderir a este princípio: ninguém , m esm o que fosse sem i-angelical, pode aproxim ar-se de D eus, a m enos que conquiste o favor divino através de sincera e franca confissão de seus pecados; aliás, na realidade um crim inoso diante de Deus. Esta, pois, é nossa justiça: confessando que somos culpados, a fim de que D eus nos absolva graciosam ente. Estas observações, que são a respeito dos israelitas, também nos dizem respeito, como observam os à luz da diretriz que Cristo nos deu, ao dizer: Perdoa nossas transgressões [Mt 6.12; Lc 11.4]. Por quem Cristo quis usar esta petição? Seguram ente por todos seus discípulos. Se al guém se im agina com o não carente dessa form a de oração e des sa confissão de pecado, que o mesmo saia da escola de C risto e se m atricule num a vara de suínos. 225 [9.20, 21] O A N IEL Ele então acrescenta: S o b re o m o n te d o s a n tu á rio d e m eu D eus. A qui o profeta sugere outra razão para ser ouvido, a saber: sua ansiedade pelo com um bem -estar e segurança da Igreja. Pois sem pre que alguém busca seus próprios interesses pessoais e ne gligencia os benefícios de seu próxim o, tal é indigno de obter algo diante de Deus. Se, pois, desejam os que nossas próprias ora ções sejam agradáveis a Deus e produzam fruto proveitoso, en tão aprendam os a associar a nós todo o corpo da Igreja, não con siderando apenas o que nos é conveniente, mas o que prim ará para o bem -estar com um de todo o povo eleito. D iz ele: E n q u a n to , pois, eu falav a a in d a , e no m eio d e m i n h a o raçã o . Tudo indica que Daniel orava não só em seu íntimo, m as se expressava com algum a verbalização externa. E bem ver dade que esta palavra às vezes se restringe à verbalização m en tal; pois m esm o quando um a pessoa não use sua língua, ela pode falar enquanto pensa m entalm ente em seu íntimo. Visto, porém, que D aniel diz: Enquanto eu ainda fa la va em minha oração, tudo indica que ele se expressava de algum a form a tam bém verbal m ente; pois ainda que os santos não pretendam pronunciar algo oralm ente, todavia o zelo se apodera deles e as palavras às vezes escapam de seus lábios. Há ainda outra razão para isso: somos por natureza lentos, e então a língua auxilia os pensam entos. Por essas razões, Daniel fora capaz não só de conceber suas orações silenciosa e mentalm ente, m as tam bém de pronunciá-las verbal e oralmente. Em seguida ele acrescenta: veio G ab riel. Porém não posso com pletar hoje meus com entários sobre esta ocorrência. ORAÇÃO Deus Onipotente, fa z com que aprendamos mais e mais plenamente a provar-nos e a descobrir as falhas das quais somos culpados. Mais ainda, que pesemos seriamente nossa perversidade nos humilhando realmente quando chegarmos ante teu semblante e te invocarmos mesmo em nossas profundezas mais escuras. Que jam ais cessemos 226 48* EXPOSIÇÃO de esperar por tua graça; que sejamos elevados p o r essa esperança aos mais altos céus e a estar sempre seguros de que tu sempre prova rás ser-nos um Pai propício. E como nos concedeste um Mediador para angariar-nos teu favor, que jam ais nos hesitemos em aproxi mar-nos de ti de maneira familiar, pela confiança em t i Sempre que nossas misérias nos induzirem ao desespero, que ja m ais nos sucum bamos a ele; mas, com invencível fortaleza mental, perseveremos em invocar teu nome e im plorar tua piedade, até que recebamos o fruto de nossas orações; e depois de sermos isentados de toda luta, p o r fim cheguemos àquele bem-aventurado descanso que está preparado para nós no céu. Em nome de Cristo, nosso Senhor. Amém. 227 osição ( ] / } a últim a preleção explicam os o aparecim ento do anjo a V t Daniel, o qual satisfez o ardor de seus desejos. Pois ele orou com grande ansiedade quando percebeu que havia passado o tem po que D eus fixara de antem ão pela boca de Jerem ias, quan do o povo ainda perm anecia no cativeiro [Jr 25.11], Já m ostra m os com o o anjo fora enviado por D eus ao santo profeta com o intuito de aliviar sua tristeza e rem over a pressão de sua ansieda de. Ele cham ou o anjo de hom em , porque ele tinha a aparência de hom em , com o já declaram os. R esta apenas um a coisa: a visão lhe foi o ferecida p o r ocasião d o sacrifício vesp ertin o . Setenta anos já haviam transcorridos, durante os quais D aniel nunca ti nha observado qualquer oferecim ento de sacrifício. E todavia ele ainda m enciona sacrifícios com o se cultivasse o hábito de assis tir diariam ente no tem plo, o qual realm ente não m ais existia. Do que transparece com o os servos de Deus, ainda que privados dos m eios externos da graça no atual m om ento, são ainda capazes de tom á-los praticamente úteis por meio da meditação em Deus, bem com o dos sacrifícios, e outros ritos e cerim ônias de sua institui ção. Se alguém nestes dias foi lançado em prisão, e até mesmo proibido de desfrutar da Ceia do Senhor até o fim de sua vida, todavia não deve com isso elim inar a m em ória daquele sacro sím bolo; deve, porém , considerar em seu íntim o, todos os dias, por que essa Ceia nos foi concedida por Cristo e quais as vantagens que ele quer que derivem os dela. Percebem os, pois, que estes foram os sentimentos do santo profeta, porque ele fala desses 228 49* EXPOSIÇÃO (9.22) sacrifícios diários com o se estivessem em uso real. Todavia sa bem os que haviam sido abolidos, e ele não poderia ter estado presente neles por muitos anos, em bora durante tal período o tem plo estava ainda de pé. A gora avancemos mais: 2 2 E ele m e in fo rm o u , e falou c o m ig o , e disse: Ó D aniel, e u cheguei a g o ra para d a r-te cap acid ad e e com preensão. 2 2 E t docuit m e, e t loq u u tu s est m ecum , e t dixit, D aniel, n u n c exivi ut te intelligere facerem intel!igerU iam .l£B Aqui o anjo prepara a mente do profeta, dizendo: aca b ei d e c h e g a r d o céu p a r a in stru ir-te . E u saí, diz ele, p a r a fazer-te en te n d e r. Pois D aniel deve entender, à luz deste exercício do anjo, o que ele m esm o deve fazer. Como D eus se dignara honrálo tão sublim emente, pondo diante dele um de seus anjos com o seu senhor e m estre, o profeta não deve negligenciar tão singular favor, para que não se mostre ingrato a Deus. Ele agora entende por que o anjo testifica de sua vinda para ensinar o profeta. E nós tam bém devem os refletir sobre isso sempre que entrarmos no tem plo de Deus, ou lermos algum a passagem da Santa Escri tura, reconhecendo que os m estres nos são enviados de Deus a nos assistirem em nossa ignorância e a interpretarem para nós as Escrituras. D evem os tam bém adm itir que a Escritura nos é dada com o fim de capacitar-nos a encontrarm os ali tudo quanto de outra form a nos seria oculto. Pois D eus abre, por assim dizer, seu próprio coração para nós, quando ele nos faz conhecer seus se gredos por m eio da Lei e dos Profetas, bem com o de seus A pós tolos. A ssim , Paulo m ostra que o evangelho deve ser pregado para a obediência da fé [Rm 1.5]; com o se quisesse dizer que não escaparem os im punemente, a menos que obedientem ente abra cem os a doutrina do evangelho; do contrário, estarem os fazendo nosso máximo para frustrar os desígnios de D eus e evitar seus conselhos, a m enos que fielm ente obedeçam os a sua Palavra. Si gam os em frente: Ou. seja. para que le ensine o que é necessário saber. 229 [9.23] DANIEL 23 N o princípio d e tuas sú p licas saiu a ordem , e e u vim para m ostrar-te; pois tu é s g ran d em en te am ado. P ortanto, entend e o assu n to e considera a visão. 2 3 P rincipio precationum tu aru m exivit verbum , e t ego veni ut annuntiarem , quia tu d esideriorum v ir," “ ita q u e intellig e in serm one, e t intellige in visione. Aqui o anjo não só arranca docilidade do profeta, m as tam bém o exorta a um a m aior atenção. M ais adiante perceberem os que esta singular e extraordinária profecia exige não estudo ordi nário. Eis a razão por que o anjo não só ordena a D aniel que receba sua m ensagem com a obediência d a fé, m as tam bém a prestar m ais detida atenção do que a usual, porque este era um im portante e singular m istério. Ele declara, prim eiram ente: a palavra foi publicada desde o tem po em que o profeta com e çou a orar. N ão dem orarei recitando a opinião de outros, porque creio entender o genuíno sentido d a passagem ; ou, seja, Deus ouvira as orações de seu servo, e então prom ulgou o que já havia decretado. Porque com a expressão, ‘publicou’, ele fala da publi cação de um decreto que anteriorm ente fora form ulado; ele foi então em itido justam ente com o os decretos dos príncipes são proclam ados e publicam ente divulgados. D eus determ inara o que faria; Daniel diretamente se interrompeu, pois o conselho de Deus jam ais falha em seu cum prim ento; aqui, porém, ele realça a im possibilidade de as orações de seus santos caírem no vazio, só porque ele lhes concede as mesm as coisas que concederia aos que não oram por elas, com o se aquiescesse nos desejos deles e aprovasse sua conduta. É bastante evidente que nada podem os obter por meio de nossa oração sem a prévia determ inação divina de concedê-lo; todavia esses pontos não são opostos entre si; pois D eus atende nossas orações, com o está expresso nos Salmos: Ele satisfaz nossos desejos, e todavia executa o que já havia determ i nado antes da criação do m undo [SI 145.19]. Ele predissera por boca de Jerem ias [25.11], com o já observam os antes, o térm ino do exilo do povo em setenta anos; Daniel já sabia disso, com o " ° O u , seja. tu és um hom em desejável. 230 49* EXPOSIÇÃO [9.23] relatou no início do capítulo; todavia não relaxa em suas orações, pois sabia que as prom essas de D eus não nos propiciam motivo ou ocasião de indolência ou apatia. O profeta, pois, orava, e Deus m ostra com o seus desejos não foram de m odo nenhum infrutífe ros, já que os m esm os visavam ao bem -estar de to d a a Igreja. Em seguida ele afirma: a p a la v ra s a iu assim q u e D aniel com eçou a o ra r; ou, seja, assim que ele abriu seus lábios foi divinam ente atendido. Em seguida acrescenta: eu vim p a r a m o s tra r-te , p o r q u e, diz ele, tu és u m h o m em im en sam en te am ad o . H á quem tom a a palavra ‘desejável’ [im ensam ente am ado] ativam ente, com o se Daniel se inflam asse com intenso zelo; m as isso é força do e contrário ao uso da linguagem. Sem dúvida, o profeta usa a palavra no sentido de aceitação por parte de D eus, e a m aioria dos intérpretes concorda plenam ente comigo. O anjo, pois, anun cia sua chegada a favor de D aniel, porque ele estava no desfruto do favor divino. E isso é digno de nota, pois deduzim os da passa gem a im possibilidade de nossos votos e orações nos granjearem favor diante de Deus, a m enos que já tenham os sido alcançados por seus afetos; pois de nenhum a outra form a fazem os Deus pro pício senão quando fugim os, pela fé, para o refúgio de sua benig nidade. Então, na confiança em Cristo com o nosso M ediador e Advogado, ousam os aproxim ar-nos dele com o os filhos de seu pai. Por essas razões nossas orações seriam de nenhum valor di ante de Deus, a m enos que as mesmas estejam em algum a m edi da fundadas na fé, que é o único m eio de reconciliar-nos com Deus, visto que jam ais podem os agradá-lo sem perdão e rem is são de pecados. O bservam os tam bém o sentido em que os santos devem agradar a Deus, às vezes não recebendo consoante seus pedidos. Pois D aniel esteve sujeito a contínuos gem idos ao lon go de muitos anos, e fora afligido por m uita tristeza; e todavia nunca chegou a perceber estar realizando algo digno de seus la bores: ele poderia de fato concluir que todo seu labor era total mente perdido, depois de orar com tanta freqüência e tão perse231 [9.24] D A N IE L verantem ente sem qualquer efeito. 0 anjo, porém, o satisfaz fran cam ente e testifica de sua aceitação por parte de Deus, e o capa cita a reconhecer que ele não sofria nenhum a rejeição, ainda que não houvesse alcançado o objeto de seus ardentes desejos. Daí, quando nos tom am os ansiosos em nossos pensam entos, e somos induzidos ao desespero em decorrência da ausência de todo apa rente proveito ou fruto de nossas orações, e pela falta de um a resposta franca e im ediata, devem os extrair do ensino do anjo esta instrução: Daniel, que foi m uitíssim o aceito por D eus, foi ouvido extensam ente, sem lhe ser perm itido ver o objeto de seus desejos com seus olhos físicos. Ele morreu no exílio, e jam ais contem plou o cum prim ento de suas próprias profecias concer nentes ao feliz estado da Igreja, com o a preparar-se im ediata m ente para celebrar seus triunfos. E no final do versículo, como já fiz menção, o anjo estim ula Daniel a um zelo m ais intenso e insiste com ele a aplicar sua mente e todos seus sentidos a atenta m ente entender a profecia que o anjo ordenara fosse posta diante dele. Vamos em frente: 2 4 S etenta sem an as estão determ inadas so b re teu povo e sohre tua san ta cidade, p a ra fin alizar a transgressão e p ô r term o aos p ecados, fa ze r reconciliação pela iniqtlidadc e trazer a ju stiç a e te m a , e se iar a visão e a profecia, e para un g ir o S antíssim o. 24 S eptuaginta h ebdom ades fin itx sunt super populum tuum , e t super urbem tuam sanctam ,’" a d claudendum scelus, e t obsignandum peccatum .etexpiandam iniquitatem , e t adducendam justitiam s te m a m , e t absignandam v isio n em ,"2 e t prophetiam . e t ungendum sanctum sanctorum .113 Esta passagem tem sido tratada de m odo variado, e portanto confundida e quase rasgada aos pedaços pelas várias opiniões dos intérpretes, ao ponto de ser considerada quase inútil por con ta de sua obscuridade. Mas, na certeza de que nenhum a predição é realm ente vã, podem os esperar discernir esta profecia, contan to que pelo m enos estejam os atentos e abertos à instrução segun111 Literalm ente, sobre a cidade de tua santidade. A palavra Dnn. chethem. ‘selar’ é reiterada duas vezes. 113 Ou. santidade de santidade, aludindo ao templo. 232 4 9 4 EXPOSIÇÃO [9.24] do a adm oestação do anjo e o exem plo do profeta. Geralm ente não faço referência a opiniões conflitantes, porque não nutro pra zer em refutá-las, e o m étodo simples que adoto me agrada mais, a saber, expor o que creio ter sido dado pelo Espírito de Deus. N ão posso, porém , deixar escapar a oportunidade de rebater vári os pontos de vista em tom o da presente passagem. Começarei com os judeus, porquanto não só pervertem seu sentido em decorrência de sua ignorância, m as tam bém em de corrência de deprim ente impudência. Sem pre que se vêem ex postos à luz que irradia de Cristo, instantaneam ente voltam suas costas em total irresponsabilidade, e exibem um a com pleta au sência de talento. São com o cães que se contentam em ladrar. N esta passagem , especialm ente, deixam escapar sua petulância, porquanto com testa de bronze tergiversam o sentido que o pro feta quis dar. Observemos, pois, o que eles pensam , porque é preciso condená-los por ausência de propósito, a m enos que con sigam os convencê-los p o r razões igualm ente firm es e certas. Quando Jerônim o discorreu sobre o ensino dos judeus que vive ram antes de seus próprios dias, ele lhes atribui m ais m odéstia e discrição do que exibiram seus descendentes m ais recentes. Ele registra sua confissão de que esta passagem não pode ser enten dida de outra form a senão em referência ao advento do Messias. É provável, porém, que Jerônim o estivesse indisposto a enfrentá-los em conflito franco, visto não estar plenam ente persuadido de sua necessidade, e por isso assum iu mais do que teria adm iti do. Creio ser isso bem provável, porque ele não deixou cair um a única palavra sobre qual interpretação ele aprovava, e se escusa por trazer a lume todos os tipos de opiniões sem qualquer pre conceito de sua parte. Daí, ele não ousa pronunciar se os intér pretes judeus estão ou não m ais certos do que os gregos ou lati nos, porém deixa seus leitores totalm ente em suspenso. Além disso, é bem claro que todos os rabinos expuseram esta profecia de Daniel com o um a declaração do contínuo castigo que Deus 233 [9.24] D A N IE L estava para infligir sobre seu povo depois de seu regresso do ca tiveiro. E assim excluíram inteiram ente a graça de D eus, e culpa ram o profeta, com o se ele houvera com etido o erro de pensar que Deus seria propício a esses míseros exilados, restaurando-os em seus lares e reconstruindo seu templo. Segundo seu ponto de vista, as setenta sem anas com eçaram na destruição do prim eiro tem plo e term inaram na ruína do segundo. Em um ponto eles concordam conosco: em considerar o profeta a com putar as se manas não com o dias, mas com o anos, com o está em Levítico [25.8], N ão há diferença entre nós e os judeus na enum eração dos anos: confessam que o número de anos é 490, m as discor dam inteiram ente de nós no tocante ao térm ino da profecia. D i zem - com o eu já pressupus - que as calam idades contínuas que oprim iram o povo são aqui preditas. O profeta esperava que o fim de suas tribulações estivesse se aproxim ando depressa, visto que D eus testificara por meio de Jerem ias sua plena satisfação com os setenta anos de cativeiro. D izem tam bém que o povo foi m iseravelm ente atorm entado por seus inim igos quando da des truição do segundo tem plo; e assim se viram privados de seus lares e a cidade, feita em ruínas, tornou-se um horrendo espetá culo de devastação e desolação. D essa form a m ostrei com o ex cluíram a graça de Deus; e para sum ariar seu ensino em termos breves, eis aqui sua substância: o profeta está enganado em pen sar que o estado da Igreja m elhoraria no final dos setenta anos, porque restavam ainda setenta semanas; ou, seja, D eus m ultipli cou o núm ero desta maneira com o propósito de castigá-los, até que, por fim, abolisse a cidade e o tem plo, dispersasse sua nação sobre toda a terra e destruísse seu próprio nome, até que, p o r fim, chegasse o M essias, a quem esperavam . Esta é sua interpretação, porém toda a história refuta tanto sua ignorância quanto sua te m eridade. Porque, com o observarem os em seguida, todos quan tos são dotados de são ju ízo dificilm ente aprovariam tal coisa, porque todos os historiadores relatam o lapso de um período mais 234 49" EXPOSIÇÃO 19.24] longo entre a monarquia de Ciro e a dos persas e a vinda de Cristo que aquele que Daniel com puta aqui. Os judeus novam ente inclu em os anos que transcorreram desde a ruína do prim eiro tem plo até o advento de Cristo e a destruição final de sua cidade. Daí, segun do a opinião com um ente aceita, eles com putaram cerca de seis centos anos. M ais adiante direi quanto aprovo desta com putação e quanto difiro dela. Entretanto, com bastante evidência, os ju deus são deploravelm ente enganados e ainda enganam a outros, quando com putam períodos diferentes sem qualquer critério. U m a refutação positiva deste erro se deriva claram ente da profecia de Jerem ias, à luz do início deste capítulo e à luz da opinião de Esdras. Barbinel, aquele enganador e im postor que se ju lg a o m ais perspicaz dos rabinos, acredita que tem aqui um modo conveniente de escape, visto tergiversar o tem a com um a única palavra, e responder a um a só objeção. Em breve, porém , m ostrarei com o ele brinca com bagatelas frívolas. A o rejeitar Josefo, ele se gloria de um a vitória fácil. C andidam ente confesso que não posso depositar confiança em Josefo, quer de vez em quanto ou sem exceção. M as que conclusões B arbinel e seus se guidores extraem desta passagem ? A proxim em o-nos daquela profecia de Jerem ias que já m encionei, e na qual ele busca refú gio. D iz ele: os cristãos fazem N abucodonosor reinar quarenta e cinco anos, porém ele não chegou a com pletar esse número. E assim ele corta m etade de um ano, ou, talvez, um com pleto da quelas m onarquias. M as ele faz isso com que propósito, visto que restam ainda duzentos anos, e a contenda entre nós diz res peito a esse período? Percebem os, pois, quão infantilm ente ele tergiversa, deduzindo cinco ou seis anos de um núm ero tão gran de, e ainda há o peso de duzentos anos que ele deixa de remover. Com o já afirmei, porém , aquela profecia de Jerem ias concernen te a setenta anos perm anece inamovível. Q uando, porém , eles com eçam ? D esde a destruição do tem plo? Isso de form a algum a se adequa bem. 235 [9.24] D A N IE L Barbinel faz com que o número dos anos seja quarenta e nove ou em torno disso, desde a destruição do tem plo até o reinado de Ciro. Percebem os previam ente, porém, que o profeta é então ins truído acerca do térm ino do cativeiro. Ora, aquele im pudente in divíduo e seus seguidores não se envergonharam de asseverar que D aniel foi um mal intérprete dessa parte da profecia de Jere m ias, visto que im aginava haver com pletado o castigo, em bora restasse ainda algum tempo. Alguns dos rabinos fazem essa as severação, porém seu caráter frívolo surge disto: D aniel, aqui, não confessa qualquer erro, senão que, confiadam ente, afirm a que sua oração foi em decorrência de haver aprendido no livro de Jerem ias a com pletação do tem po do cativeiro. Então Esdras usa as seguintes palavras: Q uando os setenta anos se com pletaram , segundo D eus predissera por boca de Jerem ias, ele incitou o es pírito de Ciro, rei da Pérsia, a libertar o povo no prim eiro ano de sua m onarquia [Ed 1.1]. Aqui Esdras francam ente declara que C iro deu ao povo liberdade m ovido pelo secreto im pulso do Es pírito. Teria o Espírito de D eus feito ouvido m ouco quando apres sou o regresso do povo? Porque então terem os necessariam ente que convencer Jerem ias de fraude e falsidade, quando Esdras vê o regresso do povo com o um a resposta à profecia. Em contrapar tida, eles citam um a passagem do prim eiro capítulo de Zacarias [v. 12]: “Então o anjo do Senhor respondeu, e disse: Ó Senhor dos Exércitos, até quando não terás com paixão de Jerusalém , e das cidades de Judá, contra as quais estiveste irado estes setenta anos?” A qui, porém, o Profeta não põe em relevo o m om ento em que os setenta anos expiraram , m as quando algum a porção do povo havia regressado a seu país m ediante a perm issão de Ciro e a construção do tem plo era ainda im pedida, depois de um lapso de vinte ou trinta anos, ele se queixa por Deus não haver liberta do seu povo com pleta e plenamente. Se esse é ou não o caso, os judeus devem explicar o com eço dos setenta anos, desde o pri meiro exílio antes da destruição do tem plo; do contrário as pas236 4 9 a EX P O SIÇ Ã O [9.24] sagens citadas de D aniel e Esdras não se harmonizariam. Somos assim com pelidos a concluir esses setenta anos antes do reinado de Ciro; com o D eus dissera, ele então poria um fim ao cativeiro de seu povo, e o período foi com pletado nesse ponto. Além disso, quase todos os escritores profanos com putam 550 anos, desde o reinado de Ciro até o advento de Cristo. Não hesito em pressupor algum erro aqui, porquanto não nos fica a m ais leve dificuldade sobre este cálculo, porém m ais adi ante expressarei o m étodo correto de calcular o núm ero de anos. Entrem entes, percebem os com o os judeus de todas as form as exageram o núm ero de 600 anos, com preendendo o cativeiro de setenta anos sob essas setenta sem anas; e então adicionam o tem po que transcorreu da m orte de Cristo ao reinado de Vespasiano. M as os próprios fatos são sua m elhor refutação. Pois o anjo diz: a s se te n ta sem an as se ex tin g u iram . B arbinel tom a a palavra ■jnn, chetek, com o ‘elim inar’, e pretende que caracterizem os as m isérias contínuas pelas quais o povo foi afligido; com o se o anjo houvera dito que o tem po de redenção não havia ainda che gado, visto que o povo vivia continuam ente em estado de m isé ria, até que Deus infligisse sobre ele aquele golpe final que equi valia a um horrível morticínio. Quando, porém, a palavra é tom a da no sentido de ‘term inar” ou ‘fin d ar’, o anjo evidentem ente anuncia a conclusão das setenta sem anas aqui. Aquele im postor contende, usando este argumento: sem anas de anos são usadas aqui em vão, exceto em referência ao cativeiro. Isso é em parte procedente, porém os alarga m uito mais do que devia. Nosso pro feta faz alusão aos setenta anos de Jerem ias, e fico surpreso que os advogados de nosso lado não tenham considerado isso, visto que ninguém sugere qualquer razão pela qual Daniel com puta anos por semanas. Todavia sabemos que essa figura foi usada propositadam ente, porque ele queria com parar setenta semanas de anos com os setenta anos. E quem quer que se dê ao trabalho de considerar esta sem elhança ou analogia, descobrirá que os ju237 19.24] DANIEL deus se matam com sua própria espada. Porque o profeta aqui com para a graça de D eus com seu juízo; com o se quisesse dizer que o povo foi castigado com exílio ao longo de setenta anos, m as que agora seu tem po da graça chegou; m ais ainda, o dia de sua redenção raiou, e que ele brilha com fulgor contínuo; escure cido, aliás, com umas poucas nuvens, por 490 anos, até o adven to de Cristo. A linguagem do profeta deve ser interpretada assim; Dolorosas trevas vos envolveram por setenta anos; Deus, porém, secundou esse período por um de favor, de sétupla duração, por que, ao ilum inar vosso cam inho e m oderar vosso sofrim ento, ele não deixou de provar ser-vos propício até o advento de Cristo. Esse advento era notoriam ente a principal esperança dos santos que aguardavam o aparecim ento do Redentor. A gora entendem os por que o anjo não usa a com putação de anos, ou meses, ou dias, mas sem anas de anos, porque isso tem um a tácita referência à pena que o povo teve que suportar segun do a profecia de Jeremias. Em contrapartida, isso revela a grande benignidade de Deus, visto ele m anifestar consideração para com seu povo naquele período do assentam ento d a prom essa de sal vação em seu Cristo. S e te n ta sem an as, pois, diz ele, se co n su m a ra m so b re teu povo e so b re tu a s a n ta cid ad e. Não aprovo o ponto de vista de Jerônim o, que pensa ser esta um a alusão à re jeição do povo; com o se quisesse dizer que o povo é teu, e não m eu. Sinto-m e seguro em dizer que isso é totalm ente contrário à intenção do profeta. Ele assevera que o povo e a cidade devem ser aqui cham ados de D aniel [e não de D eus], porque D eus havia se divorciado de seu povo e rejeitado sua cidade. M as, com o eu disse antes. Deus queria m inistrar algum a consolação a seu servo e a todos os santos e sustentá-los injetando-lhes essa confiança durante sua opressão provinda de seus inimigos. Pois D eus já havia fixado o tem po de enviar o Redentor. D iz-se que o povo e a cidade pertencem a Daniel porque, com o dissem os antes, o pro feta estava ansioso pela com um segurança de sua nação, bem 238 4 9 * EX P O SIÇ Ã O [9.24] com o pela restauração d a cidade e do tem plo. Por últim o, o anjo confirm a sua expressão prévia - D eus ouviu a oração de seu ser vo, e prom ulgou a profecia de futura redenção. A sentença que vem a seguir convence os judeus de corrom perem propositada m ente as palavras e a intenção de Daniel, porque o anjo diz: co m p le to u o te m p o d e p ô r fim à p erv e rsid a d e , p a r a la c r a r os p e cados e p a r a e x p ia r a in iq ü id ad e. D eduzim os desta sentença os sentim entos de com paixão de D eus por seu povo depois que pas saram essas setenta semanas. C om que propósito D eus determ i nou esse tem po? Seguram ente para obstar o pecado, curar a perversidade e expiar a iniqüidade. O bservam os que não há con tinuação do castigo aqui, com o os judeus futilm ente imaginam; porque pensam de D eus com o sendo sempre hostil a seu povo, e reconhecem um sinal da m ais grave ofensa na total destruição do tem plo. O profeta, ou, melhor, o anjo nos dá visão totalm ente oposta do caso, explicando com o Deus queria term inar e encer rar seu pecado e expiar sua iniqüidade. Em seguida ele acrescen ta: p a r a tr a z e r em ju s tiç a ete rn a . Prim eiram ente percebem os quão jubilosa m ensagem vem a lum e concernente à reconcilia ção do povo com Deus; e, em seguida, algo é prom etido, muito m elhor e mais excelente do que qualquer coisa que fosse conce dido sob a lei, e mesmo sob os florescentes tem pos dos judeus sob Davi e Salom ão. O anjo aqui encoraja os fiéis a esperar algo m elhor que o que experim entaram seus pais, a quem Deus adota ra. H á um tipo de contraste entre as expiações sob a lei e esta que o anjo anuncia, e tam bém entre o perdão aqui prom etido e aquele que D eus sem pre deu a seu antigo povo; e há tam bém o mesmo contraste entre a justiça eterna e aquela que floresceu sob a lei. Em seguida ele acrescenta: P a r a se la r a visão e a profecia. Aqui o verbo ‘selar’ pode ser tom ado em dois sentidos. Ou que o advento de C risto sancionaria tudo quanto fora anteriorm ente predito - e a m etáfora im plicitará isso sobejam ente ou pode m os tom á-lo diversam ente, a saber: a visão será selada, e assim 239 [9.24] D A N IE L finalm ente ele concluiu que todas as profecias cessariam . Barbinel pensa que o m esm o realça um a grande obscuridade aqui, afir m ando que de modo algum o m esm o está em harm onia com o caráter de D eus, ao privar sua Igreja da extraordinária bênção da profecia. A quele cego homem, porém, nem m esm o com preende a força d a profecia, porque não com preende nada sobre Cristo. Sabem os que a lei é distinta do evangelho por esta peculiaridade: A ntigam ente tiveram um longo curso de profecia segundo a lin guagem do A póstolo [Hb 1.1 ]. Antigam ente D eus falou de várias m aneiras, pelos profetas; nestes últim os dias, porém, ele falou por m eio de seu Filho Unigénito. Além disso, a lei e os profetas duraram até João, diz Cristo [Mt 11.11-13; Lc 16.16; 7.28], Barbinel não percebe essa diferença, e, com o eu disse antes, eie crê que havia descoberto um argum ento contra nós, asseverando que o dom de profecia não pode ser removido. E, realm ente, não de vemos ser privados desse dom, a m enos que D eus quisesse au m entar o privilégio do novo povo, porque o m enor no reino do céu é superior em privilégio a todos os profetas, com o Cristo declara em outro lugar. Em seguida ele acrescenta: p a r a q u e o S an to dos S an to s seja ungido. Aqui, um a vez mais, temos um tácito contraste en tre as unções da lei e a últim a que ocorreria. O que se oferece aqui a todos os santos não é só consolação, visto que Deus estava para m itigar o castigo que havia infligido, mas porque desejava derram ar a plenitude de toda sua m ercê sobre a nova Igreja. P or que, com o eu já disse, os judeus não podem escapar desta com paração, por parte do anjo, entre o estado da Igreja sob o pacto legal e o novo; porque os últimos privilégios haveriam de ser m uitíssim o melhores, mais excelentes e mais desejáveis do que aqueles extintos na antiga Igreja desde seus prim órdios. O res tante virá amanhã. 240 4 9 a EX P O SIÇ Ã O ORAÇÃO Deus Onipotente, visto que através de nossa extrema cegueira não podemos vislumbrar o pleno dia, fa z com que sejamos iluminados por teu Espírito. Faz com que tiremos proveito de todas tuas profeci as p o r meio das quais quiseste guiar-nos a teu Unigénito Filho; que o abracemos com f é verdadeira e infalível e perm aneçamos obedien tes a ele como nosso Líder e Guia; e depois que tivermos completado nossa jornada através deste mundo, que p o r fim cheguemos àquele repouso celestial que obtiveste para nós através do sangue de teu mesmo Filho. Amém. 241 g 50a i .xposição /^ a m e ç a m o s ontem a mostrar quão estultamente os rabinos cor\ s rom pem , com seus com entários, esta profecia da qual ora estam os tratando; pois presumem que o anjo estivesse tratando da ira contínua de Deus, a qual o povo hebreu havia em parte experim entado e a qual teria ainda um a longa duração e seria em extrem o severa, de acordo com sua suposição. Já explicam os quão agudam ente isso se opõe às palavras de D aniel, o qual aqui pro m ete a volta do favor divino para seu povo, e então m ostra o objetivo e intenção do Espírito Santo. Por m eio desta consola ção, ele queria aliviar o sofrimento do santo homem, o qual, com o já vimos, estava extrem am ente ansioso acerca do estado da Igre ja, o qual, percebia ele, era então m uitíssim o deplorável. A frase sobre a qual já com entam os confirm a o m esm o ponto, pois o anjo prom ete, com a chegada do período predito: se p o rá um fim ao pecado e à perversidade e à iniqüidade, porque a iniqüidade será então expiada. Em seguida ele prom ete a chegada da justiça eterna; e, por fim , acrescenta: sela a visão e a profecia, ju n ta m ente com a unção espiritual do Santo dos Santos. C ada um de les adm ite ser esta um a prom essa de um a bênção ainda m ais ex celente do que tudo quanto existia sob a lei. N enhum a outra in terpretação é possível ser aceita além daquela que se refere ao advento de Cristo e à total restauração da Igreja de Deus. Seguem -se outros argumentos. Pois o profeta acrescenta o que eu reiterarei um a vez mais, porque deverei explicar m ais plenam en te o que agora só casualm ente exam ino por alto. 242 50* EX P O SIÇ Ã O 2 5 Sabe, pois, c e n ten d e que d e sd e a saíd a d a o rdem p a ra restaurar e e d ificar Jerusalém , até a o M essias, o P ríncipe, hav erá sete sem anas, e sessen ta e duas sem anas; as ruas s e r io co n stru íd as novam ente, bem co m o o m uro, porém em tem pos angustiantes. [9.25] 25 C ognosces ergo e t in te llig e s,114 a b exitu verbi de red itu ,u5e t d e aedificanda Je rosolym a usque ad C h ristu m d u c em hebdom adas septem , e t hebdom adas sexaginta d uas, e t re d u ce tu r,"6 e re -s d ific a b itu r p latea,’l7et m urus, id q u e in ang u stia tem porum . Daniel aqui reitera as divisões de tem po já m encionadas. Ele afirm ara previam ente setenta semanas; agora, porém , faz duas porções: um a de sete sem anas e a outra de sessenta e duas. Há claram ente outra razão pela qual ele desejava dividir em duas partes o número usado pelo anjo. Os judeus rejeitam sete sem a nas desde o governo de Herodes ao de Vespasiano. Confesso que isso está de acordo com o método judaico de se expressar; em vez de sessenta e duas e sete, eles dirão sete e sessenta e duas; pondo assim o núm ero m enor primeiro. Os anos do hom em (diz M oisés) serão de vinte e um cento (Gn 6.3); os gregos e os lati nos diriam: serão de cento e vinte anos. Confesso que esta seria a fraseologia com um entre os hebreus. Aqui, porém , o profeta não está relacionando a continuação de qualquer série de anos, como se estivesse tratando da vida de um único hom em , m as ele pri m eiro m arca o espaço de sete sem anas e então elim ina outro p e ríodo de sessenta e duas semanas. As sete sem anas precedem claram ente na ordem do tempo, do contrário não poderia expli car suficientem ente o significado pleno do anjo. A gora tratarem os do sentido em que a saída do édito deve ser entendida. Entrem entes, não se pode negar que o anjo pronuncia isto em relação ao édito que fora prom ulgado acerca do regresso do povo e a restauração da cidade. Portanto, seria tolice aplicá-lo a um período em que a cidade não fora ainda restaurada e ne nhum decreto com o tal tinha sido pronunciado ou publicado. Antes 114 Ou, 115 Ou. "* Ou, 111 Um sabe e entende. concernente ao regresso d o povo. o povo regressará. plano, à luz da palavra difundir. 243 [9.25] D A N IE L de tudo, porém , devem os tratar do que o anjo diz: a té que Cristo, o M essias. Há quem deseja dar a este substantivo singular um sentido plural, com o se o Cristo do Senhor significasse seus sa cerdotes; enquanto outros o atribuem a Zorobabel; e outros, a Josué. M as, com bastante clareza, o anjo fala de Cristo, de quem tanto os reis quanto os sacerdotes sob a lei eram tipo e figura. Alguns ainda pensam na dignidade de Cristo reduzida pelo uso da palavra T33,/iegi<i, ‘príncipe’ ou ‘líd er’, com o se em sua lide rança ali não existisse nem realeza, nem cetro, nem diadema. Essa observação é totalm ente destituída de razão; pois Davi é cham a do líder do povo; e Ezequias, quando usava um diadem a e estava assentado em seu trono, é tam bém cham ado líder [2Sm 5.2; 2Rs 20.5], Sem dúvida, a palavra aqui im plica excelência superior. Todos os reis eram governantes sobre o povo de Deus, e os sacer dotes eram dotados com um certo grau de honra e autoridade. Aqui, pois, o anjo denom ina Cristo de líder, visto que ele se so bressaía a todos os dem ais, sejam reis ou sacerdotes. E se o leitor não for capcioso, este contraste será prontam ente admitido. Em seguida ele acrescenta: O povo re g re s s a rá o u s e rá t r a zido d e volta, e as ru a s se rã o co n stru íd as, b em com o o m u ro , e isso ta m b é m n u m estreito lim ite d e tem po. D eduz-se outro argum ento, a saber: depois de sessenta e duas sem anas, Cristo será subtraído. Os judeus entendem que isso se refere a Agripa, o qual certam ente foi elim inado quando Augusto conquistou o im pério. Nisso, eles sim plesm ente buscam o que dizer; porque to dos os leitores equilibrados e sensatos ficarão perfeitam ente sa tisfeitos, percebendo que eles [os judeus] agem sem critério ou sem pudor, e vom itam tudo quanto entra em seus pensamentos. Ficam totalm ente satisfeitos quando acham algo plausível para dizer. Aquele sofista, Barbinel, de quem já fiz m enção prévia, pensa que A gripa tem todo o direito de ser cham ado um Cristo, com o foi Ciro; ele adm ite sua deserção para os romanos, mas declara que isso se deu contra sua vontade, com o se o m esm o 244 50* EX P O SIÇ Ã O [9.25J fosse ainda um adorador de Deus. A inda que, com toda evidên cia, ele fosse um apóstata, todavia ele (Barbinelj o trata [Agripa] com o de form a algum a sendo pior que todos os dem ais, e por essa razão ele deseja que o m esm o seja cham ado o Cristo. Mas, antes de tudo, sabemos que A gripa não foi legitim am ente rei, e que sua tirania era diretam ente contrária ao oráculo de Jacó, vis to que o cetro tinha de sair da tribo de Judá [Gn 49.10]. Ele não pode de form a algum a ser cham ado Cristo, ainda quando tivesse suplantado a todos os anjos em sabedoria, em virtude, em poder e em tudo mais. Aqui se trata do governo legítim o do povo, e isso não se enquadra na pessoa de Agripa. D aí serem os argumentos judaicos totalm ente fúteis. Em seguida, acrescenta-se outra afir mação: ele c o n firm a rá o p acto com m u ito s. Os judeus tentam enfum açar a força desta expressão de um m odo m uitíssim o deso nesto e sem o m enor laivo de pudor. D esviam -no para Vespasiano e Tito. Vespasiano fora enviado por N ero à Síria e ao Oriente. E perfeitam ente procedente que, com o desejo de evitar um seve ro m orticínio de seus soldados, ele tentasse todas as condições de paz e atraísse os judeus por m eio de um a sedução m uito plausí vel a entregar-se a ele em vez de usar a força com o um recurso extrem o e final. Na verdade, Vespasiano insistiu m uito com os judeus a aceitarem a paz; e Tito, depois de seu pai, passou para a Itália e seguiu a m esm a política; isso, porém , porventura confir ma o pacto? Quando o anjo de Deus está tratando de eventos da m áxim a im portância e envolvendo toda a condição da Igreja, sua explicação é um m otejo de quem o atribui aos líderes romanos que desejavam tom ar parte no tratado com o povo. Tentaram ou obter a posse de todo o im pério do O riente por m eio de um pacto, ou determ inar o uso d a força m áxim a para capturar a cidade. Tal explicação, pois, é totalmente absurda. É plenamente claro que os judeus são não só destituídos de toda razão quando explicam esta passagem relacionando-a com a ira contínua de Deus e excluindo seu favor e reconciliação com o povo; porém são totalmente de 245 [9.25] D A N IE L sonestos e pronunciam palavras despudoradas e lançam obscuri dade sobre a passagem. Ao mesmo tempo, sua vaidade é expos ta, visto que não têm justificativa algum a para seus com entários. E agora passo aos escritores antigos. Jerônim o, com o afirmei sucintam ente ontem, recita várias opiniões. Antes, porém , de dis cuti-las individualm ente, preciso responder sucintam ente à calú nia daquele rabino impuro e obstinado, Barbinel. Com o intuito de privar os cristãos de toda confiança e autoridade, ele levanta objeções acerca de suas diferenças m útuas; com o se as diferen ças entre os hom ens não exercidas suficientem ente nas Escritu ras pudessem sublevar inteiram ente a verdade. Suponha-se, por exem plo, que eu estivesse argum entando contra ele sobre a au sência de consenso entre os próprios judeus. Se alguém se sente solícito em coletar suas diferentes opiniões, então que se alegre com o vencedor neste aspecto, porquanto não existe nenhum acor do entre os rabinos. Ao contrário, ele não realça a plena extensão das diferenças que ocorrem entre os cristãos, porque estou dis posto a conceder-lhe muito m ais do que ele requer. Pois esse rixento era ignorante em todas as coisas, e denuncia som ente petu lância e loquacidade. Seus livros são sem dúvida m uito plausí veis entre os judeus que buscam nulidade. Ele, porém , equipara a nós autoridades com o Africanus e N icolaus de Lyra, Burgensis e um certo m estre cham ado Remond. Ele ignora nom es com o Eusébio,118 O rígenes, Tertuliano, Hipólito, A polinário, Jerônim o. A gostinho e outros escritores afins. Aqui percebem os quão im pudente é esse palrador, que ousa tartam udear sobre questões que se acham totalm ente além de seu conhecimento. M as, com o eu já declarei, adm ito haver muitas diferenças entre os cristãos. Eusébio m esm o concorda com os judeus ao atribuir a palavra ‘C risto’ aos sacerdotes, e quando o anjo fala da m orte de Cristo, ele pensa que o que se pretende aqui é a m orte de A ristóbulo, o qual foi assassinado. M as isso é com pleta estultícia. M as você dirá: Ele é "* Ver este versículo citado em Eusébio, História Eclesiástica, livro I. cap. 6. 246 5 0 a EX P O SIÇ Ã O [9.25] cristão. Sim, porém caiu em ignorância e erro. A opinião de Africanus é m ais digna de menção, porém o tem po de m odo algum concorda com o de Dario, filho de Histaspes, com o se m ostrará mais adiante. Ele erra novam ente em outro capítulo, tom ando os anos com o sendo lunares, com o faz Lyranus. Sem dúvida, isso não passa de um a de suas cavilações; não achando seus próprios anos adequados, ele pensava que se podia inventar todo e qual quer número, usando os anos intercalados juntam ente com os 490. Pois antes que o ano fosse ajustado ao curso do sol, os antigos costum avam com putar doze m eses lunares, e em seguida acres centavam outro. O núm ero total de anos podia ser inventado se gundo o im pulso de sua im aginação, se acrescentarm os aqueles períodos adicionais aos anos aqui enum erados pelo profeta. Eu, porém, rejeito isso sumariamente. Hipólito tam bém erra em ou tra direção; pois considera as sete sem anas com o sendo o lapso de tem po entre a m orte e a ressurreição de Cristo, e nisso eie concorda com os judeus. Apolinário tam bém se equivoca, pois crê que devem os com eçar com o nascim ento de Cristo e então estender a profecia até o final do mundo. Tam bém Eusébio, que contende com ele em determ inada passagem , tom a a últim a se m ana com o equivalente a todo o período que deve transcorrer até o fim do m undo chegar. Portanto, estou disposto a reconhecer com o falsas todas essas interpretações, e todavia não adm ito que a verdade de Deus tenha falhado. Com o, pois, chegarem os a um a conclusão certa? N ão é sufi ciente refutar a ignorância de outros, a m enos que possam os pôr a verdade em evidência, e provar isso com razões claras e satisfa tórias. Estou disposto a poupar os nom es de com entaristas ainda vivos e os daqueles que morreram durante nossos próprios dias, todavia devo dizer o que provará ser útil a meus leitores; entre m entes, falarei cautelosam ente, porque nutro um forte desejo de m anter silêncio sobre todos os pontos, exceto aqueles que são úteis e necessários ao conhecim ento de todos. Se porventura al247 [9.25] D A N IE L guém nutre o gosto e tem po necessário para inquirir diligente m ente sobre o tem po aqui m encionado, Cecolam padius correta e prudentem ente nos admoesta, dizendo que devem os fazer a com putação partindo do princípio do mundo. Pois até a ruína do tem plo e a destruição da cidade, podem os certam ente juntar o núm e ro de anos que transcorreram desde a criação do m undo; aqui não há lugar a erro. A série é bastante clara nas Escrituras. Depois disso, porém , deixam os o leitor buscar outras fontes de inform a ção, visto que a com putação da destruição do tem plo é descone xa e im precisa, segundo Eusébio e outros. E assim , desde o re gresso do povo até o advento de Cristo, descobrir-se-á que trans correram 540 anos. E assim vemos quão im possível é satisfazer a leitores sensatos, se sim plesm ente considerarm os os anos da for m a com o procede Cecolam padius.119 Philip M elancthon, que ex cele em gênio e erudição, e felizm ente é versado nos estudos da história, faz um a dupla com putação. Ele com eça um plano a par tir do segundo ano de Ciro, ou, seja, desde o com eço d a m onar quia persa; porém considera as setenta sem anas com o que term i nando com a m orte de Augusto, que é o período do nascim ento de Cristo. Quando chega ao batism o de Cristo, ele acrescenta outro método de contagem, que com eça nos dias de Dario; e quan to ao édito aqui mencionado, ele o entende com o tendo sido pro m ulgado por D ario, filho de H ystaspes, visto que a construção do tem plo foi interrom pida por cerca de sessenta e seis anos. Q uan to a esta com putação, não posso de m odo algum aprová-la. E todavia confesso a im possibilidade de achar-se algum a outra ex plicação além do que o anjo diz; até Cristo, o Líder, a m enos que seja um a referência ao batism o de Cristo. Esses dois pontos, pois, segundo meu critério, devem ser mantidos com o fixos: prim eiro, as setentas sem anas com eçam 1,9 Veja-se sua C ronologia com pleta em seu com entário sobre este versículo, lib. ii. p. 99. Edil. foi. 1567. O editor se aventura a recom endar aos leitores de Danie! d e C alvino que com pulsem os judiciosos com entários de Cecolampadius. S3o dignos de mais atenção do que têm recebido em nosso idioma. 248 50* EX P O SIÇ Ã O [9.25] com a m onarquia persa, visto que um livre regresso foi então concedido ao povo; e, segundo, não term inaram ainda no batis m o de Cristo, quando publicam ente com eçou sua obra de satisfa ção dos requerim entos do ofício que lhe fora designado p o r seu Pai. M as devem os agora ver com o isso concordará com o núm e ro de anos. Confesso aqui a existência de tão grandes diferenças entre os escritores antigos, que temos de usar conjetura, porque não temos nenhum a explicação definida a apresentar, a qual pos sam os realçar com o sendo a única que satisfaz. Estou ciente das várias calúnias daqueles que desejam tom ar todas as coisas obs curas e derram ar trevas espessas sobre a m ais radiante luz. Pois os profanos e cépticos logo lançam m ão disso, pois assim que percebem algum a diferença de opinião, desejam dem onstrar a incerteza de todo nosso ensino. Portanto, se percebem qualquer diferença nos pontos de vista dos vários intérpretes, m esm o nas questões da m enor im portância, concluem que todas as coisas se acham envoltas nas mais densas trevas. Sua perversidade, po rém, não deve atem orizar-nos, porque, quando algum as discrepâncias ocorrem nas narrativas dos historiadores profanos, não concluím os que toda a história não passa de fábula. Tom emos a história grega: quão infinitam ente os gregos diferem entre si! Se alguém fizer disso um pretexto para rejeitar a todos eles, e asse verar que todas suas narrativas são falsas, não deveríam os con denar tal pessoa com o sendo singularm ente im pudente? Ora, se as Escrituras não são em si mesm as contraditórias, senão que m anifestam ligeiras diversidades ou em anos ou em lugares, ou saríam os declará-las com o sendo inteiram ente destituídas de cré dito? Temos ciência d a existência de algum as diferenças em to das as histórias, e todavia isso não as faz perder sua autoridade; são ainda citadas e ainda se deposita confiança nelas. Com respeito à presente passagem , confesso-m e incapaz de negar a existência de m uita controvérsia concernente a esses anos entre todos os escritores gregos e latinos. Isso é certo, porém, 249 [9.25] D A N IE L entrem entes, sepultaríam os tudo o que já passou e concebería mos um m undo interrompido em seu curso? D epois que Ciro transferiu para os persas o poder do O riente, alguns reis o teriam evidentem ente seguido, ainda que não seja evidente que o fize ram , e os escritores também diferem acerca do período e do rei nado de cada um deles, e todavia, quanto aos pontos principais, há concordância geral. Porque alguns enum eram cerca de 200 anos; outros, 125 anos; e alguns se põem num a posição interm é dia, com putando 140 anos. Q ualquer que seja a afirm ação corre ta, houve claram ente algum a sucessão dos reis persas, e muitos anos adicionais transcorreram antes que A lexandre, o macedônio, conquistasse a m onarquia de todo o Oriente. Isso é plena mente claro. Ora, desde a m orte de A lexandre, o núm ero de anos é bem conhecido. Philip M elancthon cita um a passagem de Ptolom eu, na qual perfazem 292; e muitos testem unhos podem ser aduzidos, os quais confirm am aquele período de tempo. Se al guém objeta, dizendo que o número de anos pode ser considera do um período de cinco anos, com o com um ente o fazem os ro m anos, ou pelas olim píadas dos gregos, confesso que a com puta ção com base nas olim píadas remove toda fonte de erro. Os gre gos usavam grande diligência em m inudências e eram ávidos por glória. Não podem os dizer o mesmo do im pério persa, pois so mos incapazes de, acuradam ente, determ inar sob que olim píada viveu cada rei, bem com o o ano em que com eçou seu reinado e em qual ele morreu. Seja qual for a conclusão que adotemos, m inha afirm ação prévia é perfeitam ente procedente, ou, seja, se os homens capciosos se rebelam e entenebrecem a clara luz da história, todavia não podem torcer esta passagem de seu real signi ficado, porque podem os deduzir tanto dos historiadores gregos quanto dos latinos toda a som a dos tem pos que se adequarão cla ram ente a esta profecia de Daniel. Q uem quer que com pare todo o testem unho histórico com o desejo de aprender e, sem qualquer contenção, cuidadosam ente num erar os anos, ele descobrirá ser 250 50* EX P O SIÇ Ã O [9.25] im possível expressá-los m elhor que pela declaração do anjo setenta semanas. Por exem plo, qualquer pessoa estudiosa, reves tida de agudeza, experiência e habilidade, descobre tudo quanto foi escrito em grego e latim, e distingue o testem unho de cada escritor sob tem as distintos, e em seguida com para os escritores juntos e determ ina a credibilidade de cada um e quão longe cada um está de um a autoridade adequada e clássica, então descobrirá o m esm o resultado quanto ao que aqui apresenta o profeta. Isso deve ser-nos suficiente. M as, entrem entes, devem os lem brar-nos de com o nossa ignorância em ana principalm ente desse costum e persa: qualquer um que em preendesse um a expedição de guerra, designava a seu filho com o seu vice-rei. A ssim , Cam byses rei nou, segundo alguns, vinte anos; e, segundo outros, apenas sete. Porque a coroa foi posta em sua cabeça durante a vida de seu pai. Além disso, houve outra razão. O povo do O riente é notoriam en te muito insatisfeito, facilm ente excitável e sem pre querendo um a m udança de governo. Daí, as contendas sempre explodiam entre os parentes próximos, das quais temos narrativas am plas nas obras de H eródoto. Faço m enção dele entre outros p o r ser o fato sufici entem ente notório. Quando os pais viam o perigo de seus filhos naturalm ente destruírem uns aos outros, geralm ente de um deles criavam um rei; e se desejavam preferir o irm ão m ais jovem ao m ais velho, cham avam -no ‘rei’ com a anuência de seu concílio. Daí, os anos de seu reinado se tom avam interm ináveis, sem qual quer possibilidade de um método fixo para com putá-los. E as sim, digo eu, mesmo que as olim píadas nunca nos confundissem , isso não pode ser dito do im pério persa. Enquanto adm itimos m uita diversidade e contradição associadas a grande obscurida de, ainda assim devem os sem pre voltar ao m esm o ponto: podese chegar a algum a conclusão que concorde com esta predição do profeta. Portanto, não com putarei esses anos um a um, mas apenas adm oestarei a cada um dos leitores que pese para si m es mo, segundo sua capacidade, o que lê na história. E assim todos 251 [9.25] D AN IEL os homens sensatos e m oderados aquiescerão quando percebe rem quão bem esta profecia de Daniel se harm oniza com o teste m unho dos escritores profanos, em seu escopo geral, segundo m inhas explicações prévias. D eclarei que devem os com eçar com a m onarquia de Ciro; isso deve ser claram ente deduzido das palavras do anjo, e especi alm ente d a divisão das semanas. Pois ele diz: As sete sem an as tê m refe rê n c ia à re p a ra ç ã o d a cid ad e e d o tem plo. Nenhum sofism a pode de form a algum a privar a expressão do profeta de sua verdadeira força: d esd e a saíd a d o éd ito c o n ce rn en te ao reg resso do povo e à reco n stru ç ão d a cid ad e, até o M essias, o L íder, s e rã o sete sem an as; e e n tão , sessen ta e d u a s sem anas. Em seguida ele acrescenta: D epois d a s sessen ta e d u a s sem a n as, C risto s e rá elim inado. Quando, pois, ele põe as sete sem a nas em prim eiro lugar, e claram ente expressa sua com putação com eçando desse período da prom ulgação do édito, a que pode mos atribuir essas sete semanas senão aos tem pos da m onarquia de Ciro e a de Dario, filho de H ystaspes? Isso é evidente à luz da história dos M acabeus tanto quanto do testem unho do evangelis ta João; e podem os chegar à m esm a conclusão à luz das profeci as de Ageu e Zacarias, quando a construção do tem plo foi inter rom pida durante quarenta e seis anos. C iro perm itiu ao povo ed i ficar o templo; os fundamentos foram lançados quando Ciro saiu a guerrear contra a Cítia; os judeus foram então com pelidos a cessar seus trabalhos, e seu sucessor, C am byses, se m ostrou hos til para com esse povo. D aí os judeus questionarem: Este tem plo esteve em construção quarenta e seis anos, e tu o edificarás em três dias? [Jo 2.20], Em penhavam -se em m ofar de Cristo p o r ele haver dito: Destruirei este tem plo e o reconstruirei em três dias, visto ser esta então um a expressão com um , e havia sido usada por seus pais, isto é, que o tem plo abrangera esse período em sua construção. Se o leitor acrescentar os três anos durante os quais os fundam entos foram lançados, terem os então quarenta e nove 252 50* EX P O SIÇ Ã O [9.25] anos, ou sete semanas. Com o o evento claram ente m ostra a com pletação do que o anjo havia predito a D aniel, quem quiser torcer o significado da passagem sim plesm ente exibe sua própria audá cia. E não devem os rejeitar toda e qualquer interpretação quando a m esm a obscurece um significado tão claro e óbvio? Devemos em seguida ter em mente o que eu disse previam ente. N a preleção de ontem dissem os que as setentas sem anas foram intercep tadas pelo povo; o anjo havia tam bém declarado a saída do édito, pelo qual Daniel havia orado. Que necessidade, pois, existe para tratar um a certeza com o duvidosa? e por que questionar o ponto quando Deus pronuncia que o com eço desse período seria o tér m ino dos setenta anos proclam ados por Jerem ias? E plenam ente certo que esses setenta anos e setenta sem anas devam ser m anti dos juntos. Portanto, visto que esses períodos são contínuos, seja quem for que atribua esta passagem ao tem po de D ario Hystaspes, antes de tudo quebra os elos da cadeia de todos os eventos que se acham conectados, e então perverte todo o espírito da pas sagem; pois, com o vimos ontem, o objetivo do anjo era m inistrar consolação às mentes atribuladas. Por setenta anos o povo fora m iseravelm ente afligido no exílio, e pareciam totalm ente aban donados, com o se Deus não mais reconhecesse esses filhos de Abraão com o sendo seu povo e herança. Com o essa era a inten ção do Todo-Poderoso, é plenam ente evidente que o com eço das setenta sem anas não pode ser interpretado de outra forma, senão em referência à m onarquia de Ciro. Este é o prim eiro ponto. É preciso que agora nos volvam os às sessenta e duas sem a nas; e se não posso satisfazer a todos, todavia me contentarei com grande sim plicidade e confiarei que todos os discípulos de Cristo, íntegros e hum ildes, facilm ente se aquiescerão nesta ex posição. Se com putarm os os anos desde o reinado de D ario até o batism o de Cristo, descobrir-se-á que transcorreram sessenta e duas sem anas ou mais ou menos. Com o previam ente observei, não nutro escrúpulo por uns poucos dias ou m eses, nem mesmo 253 [9.25] D A N IE L por um ano; pois quão grande é a perversidade que nos faria re je itar o que os historiadores relatam só porque nem todos concor dem com a diferença de um ano! Seja qual for a conclusão corre ta, acharem os cerca de 480 anos entre o tem po de D ario e a morte de Cristo. Daí, faz-se necessário prolongar esses anos até o batis m o de Cristo, porque, quando o anjo fala da últim a semana, cla ram ente afirma: O p a c to s e rá c o n firm ad o n aq u ele tem p o , e então o M essias s e rá elim inado. Com o isso deveria ser feito na últim a sem ana, devem os necessariam ente estender o tem po até a pregação do evangelho. E por essa razão Cristo é cham ado ‘L í d e r’, porque, em sua concepção, ele se destinava a ser Rei do céu e da terra, ainda que não tenha iniciado seu reinado enquanto não fosse publicam ente ordenado M estre e R edentor de seu povo. A palavra ‘L íder’ está im plícita com o um nom e antes que o ofício fosse assumido; com o se anjo dissesse: o fim das setenta sem a nas ocorrerá quando Cristo publicam ente assum ir o ofício de Rei sobre seu povo, congregando-os daquela miserável e horrível dis persão sob a qual tinham sido por tanto tem po humilhados. D ei xarem os o restante para amanhã. ORAÇÃO Deus T o d o -P o d ero so , v isto que teus se n o s, antes da manifestação da glória de teu unigénito Filho, foram sustentados p o r esses orácu los que até então não tinham sido concretizados, concede que neste dia possam os aprender a depositar nossa confiança em nosso Se nhor, que tão claramente se nos revelou p or meio do evangelho. Que nos mantenhamos tão firm es e constantes na f é desse evangelho, que jam ais sejamos assenhoreados pelas perturbações e tumultos deste mundo. Que prossigamos sempre no curso de tua santa vocação, até que, porfim , sejamos libertados de todas as oposições e alcancemos aquele bem-aventurado repouso que está preparado para nós no céu, peto mesmo nosso Senhor Jesus Cristo. Amém. 254 51a xposição í j / l a preleção de ontem expus m eus pontos de vista concerV t nentes às setenta semanas. A gora me volvo às palavras do profeta, sobre as quais toquei bem de leve. Ele prim eiram ente diz: Setenta sem anas transcorreram sobre teu povo e sobre a cidade santa. Com essas palavras, ele prim eiram ente insinua que os israelitas estariam sob o cuidado e proteção de Deus até a che gada de Cristo; e, em seguida, que Cristo viria antes da com pletação das setenta semanas. O anjo anuncia estes dois pontos; assegurar-lhes do fiel e perpétuo cum prim ento do pacto divino e sustentá-los no m eio de todas suas ansiedades e angústias. Agora vem a lume um a notável passagem concernente ao ofício de Cristo. O anjo prediz o que eles esperavam de Cristo. A ntes de tudo, ele anuncia a rem issão de pecados; pois ele realça isso pelo uso de um a form a de expressão: proibir ou encerrar a perversidade, se lar a pecam inosidade e expiar a iniqüidade. N ão nos surpreende encontrar o anjo usando muitas frases num a questão de tanta im portância. Tal repetição na linguagem parece-nos supérflua; to davia o conhecim ento da salvação é com preendido sob este tópi co. Somos assim inform ados com o D eus se reconcilia conosco m ediante o perdão gratuito, e essa é a razão por que o anjo insiste sobre este tem a pelo uso de tantas palavras [Lc 1.77]. M as deve mos lembrar o que eu disse anteontem - há um tácito contraste entre a rem issão ora oferecida a nós sob o evangelho e aquela previamente oferecida aos pais sob a lei. Desde a criação do mundo ninguém pôde invocar a D eus com um a mente tranqüila e com 255 [9.25) D A N IE L firm e confiança, a não ser pela confiança na esperança de per dão. Pois sabem os que a porta da m isericórdia está fechada con tra todos nós pelo fato de estarm os m erecidam ente debaixo d a ira divina. Daí, a m enos que a doutrina da rem issão gratuita dos p e cados se m anifeste, não desfrutarem os a liberdade de invocar a Deus, e toda esperança de salvação seria ao m esm o tem po extin ta. Segue-se, pois, que os pais sob a lei desfrutavam esse m esm o benefício que ora desfrutam os, a saber: uma persuasão definida de ser-lhes Deus propício, bem com o de perdoar-lhes suas trans gressões. Qual, pois, é o significado da frase: Cristo, em seu ad vento, selará os pecados e expiará as iniqüidades? Aqui, com o eu disse, é m ostrada um a diferença entre a condição da antiga e da nova Igreja. Os pais deveras tinham esperança de rem issão de seus pecados, porém sua condição era inferior à nossa em dois aspectos. Seu ensino não era tão claro com o o nosso, nem suas prom essas tão plenas e estáveis. Excedem o-los tam bém em ou tro aspecto. D eus nos dá testem unho de ser ele nosso Pai, e assim fugim os para ele em plena liberdade e destemor; e, em adição a esse fato. Cristo já nos reconciliou com o Pai por interm édio de seu sangue [Rm 8.15; Gl 4.6]. Assim somos superiores a eles, não só em nossa instrução, m as em efeito e com pletude, visto que neste dia D eus não só nos promete o perdão de nossos peca dos, m as testifica e afirm a que os apagou totalm ente e foram abo lidos pelo sacrifício de Cristo, seu Filho. E ssa diferença é franca m ente denotada pelo anjo quando ele diz: Os pecados serão en cerrados e selados, e as iniqüidades também serão expiadas na vinda de Cristo. D aí declararm os previam ente com o algo fora prom etido, o qual é melhor do que aquilo que os pais experim en taram antes da manifestação de Cristo. Aqui percebem os o sentido no qual Cristo encerrou os p eca dos, selou a perversidade e expiou a iniqüidade. Pois ele não só introduziu a doutrina do perdão gratuito e prom eteu que Deus seria invocado pelo povo mediante seu desejo de perdoar a ini256 51a EX P O SIÇ Ã O [9.25] qüidade deles, m as realm ente realizou tudo quanto se fazia ne cessário para reconciliar os homens com Deus. Ele derram ou seu sangue pelo qual apagou nossos pecados; ele tam bém se ofere ceu com o vítim a expiatória e satisfez a D eus pelo sacrifício de sua morte, ao ponto de absolver-nos totalm ente da culpa. M oisés usa com freqüência a palavra KDfl, cheta, ao falar de sacrifícios; o anjo, porém , aqui nos ensina figuradam ente com o todas as ex piações sob a lei eram m eramente figura, e nada m ais senão som bra do futuro; porque, se de fato os pecados tivessem sido expia dos, não teria havido nenhum a necessidade da vinda de Cristo. Como, pois, a expiação foi suspensa até a m anifestação de Cris to, nunca houve qualquer expiação legítim a sob a lei, m as que todas suas cerim ônias não passaram de representações envoltas em sombras. Ele em seguida acrescenta: Para trazer a justiça eterna. Essa justiça depende da expiação. Pois, com o poderia D eus considerar justos os fiéis, ou imputar-lhes a justiça, com o Paulo nos inform a, a menos que cobrisse e sepultasse seus peca dos, ou os expurgasse no sangue de Cristo? [Rm 4.11]. Deus m esm o não foi apaziguado pelo sacrifício de seu Filho? Estas frases, pois, devem estar enfeixadas: as iniqüidades serão expi adas e a ju stiça eterna, m anifestam ente apresentada. N enhu m a justiça jam ais se verá num hom em m ortal, a m enos que ele a obtenha de Cristo; e se usarm os grande precisão de expressão, a justiça não pode existir em nós a não ser através do perdão gra tuito que logram os no sacrifício de Cristo. Entrem entes, a Escri tura propositadam ente enfeixa rem issão de pecados e justiça, com o tam bém Paulo diz: Cristo morreu por nossos pecados e ressuscitou para nossa justificação [Rm 4.25]. Sua m orte logrou satisfação para nós a fim de não mais perm anecerm os culpados nem m ais estarm os sujeitos à condenação de morte eterna, e en tão por m eio de sua ressurreição logrou justiça e assim adquiriu para nós a vida eterna. A razão por que o profeta aqui trata a ju stiça com o perpétua ou “das eras” é esta: os pais sob a lei eram 257 £9.25] DANIEL com pelidos a agradar a Deus por meio de sacrifícios diários. Não teria havido necessidade de repetir os sacrifícios, segundo o após tolo nos admoesta, se houvesse alguma virtude inerente num único sacrifício para aplacar o Todo-Poderoso [Hb 10.1], Visto, porém, que todos os ritos da lei tendiam para o m esm o propósito de prefi gurar a Cristo, com o a vítima única e perpétua, para reconciliar os homens com Deus, foi m ister que se oferecessem sacrifícios diari amente. Daí, com o dissemos antes, essas satisfações eram eviden temente insuficientes para lograr justiça. Portanto, somente Cristo pôde trazer justiça eterna - somente sua morte foi suficiente para expiar todas as transgressões. Porque Cristo sofreu não só com o intuito de oferecer satisfação por nossos pecados, mas também para pôr diante de nós sua própria morte, na qual aquiescêssemos com ele. Daí, essa justiça eterna depende do duradouro efeito da morte de Cristo, visto que seu sangue jorrou na presença de Deus, e en quanto somos diariamente purgados e purificados de nossa conta minação, D eus é também diariamente apaziguado em nosso favor. Observamos, pois, com o a justiça não foi plenamente revelada sob a lei, senão que é agora posta diante de nós sob o evangelho. Então prossegue: Sela a visão e a p ro fecia. E sta sentença poderia ter dois sentidos, porque, com o eu disse atrás, C risto se lou todas as visões e as profecias, para que todas elas fossem o sim e o amém nele, com o diz Paulo [2Co 1.20]. Com o, pois, as prom essas de Deus foram todas satisfeitas e cum pridas em C ris to para a salvação dos fiéis, assim com propriedade o anjo decla ra seu advento: Ele selará a visão e a profecia. Este é um sentido. O outro é que a visão será selada no sentido de sua cessação, com o se o anjo dissesse: Cristo porá term o final às profecias, porque nossa posição espiritual difere daquela dos pais. Pois Deus antigamente falou de muitas maneiras sobre a form a com o a Igreja haveria de enfrentar um a variedade de situações e circunstâncias conflitantes. Mas quando Cristo se manifestou, chegamos ao ponto m áxim o dos tempos proféticos. D aí seu advento ser cham ado a 258 51® EX P O SIÇ Ã O [9.25] plenitude dos tem pos [G14.4; Hb 1.1]; e em outra parte Paulo diz que chegam os aos fins dos tem pos [IC o 10.11], visto estarm os esperando pela segunda vinda de Cristo, e não term os necessida de de novas profecias com o antigamente. Então todas as coisas eram m uito obscuras, e D eus governava seu povo sob as escuras som bras de um nuvem. N ossa condição, em nossos dias, é dife rente. D aí não haver necessidade de nos adm irarm os ante o anún cio do anjo; todas as visões e profecias serão seladas. Porque a lei e os profetas duraram até João, m as desse tem po para cá o reino de D eus com eçou a ser prom ulgado; ou, seja, Deus apare ceu m uito mais claram ente do que outrora [Mt 11.13; Lc 16.16]. O próprio título visão im plica algo obscuro e duvidoso. M as ago ra Cristo, o Sol da Justiça, brilhou sobre nós, e desfrutam os o brilho meridiano; a lei aparece apenas com o um a vela no gover no de nossa vida, porque Cristo nos indica em pleno esplendor o cam inho da salvação. Sem dúvida, o anjo aqui queria que distin guíssem os entre o ensino obscuro da lei, com suas figuras, e a luz pública do evangelho. Além disso, o título ‘profecia’ é tom ado tanto para o ofício profético quanto para as predições enunciadas. Em seguida, ele acrescenta: P a r a u n g ir o S an to dos S antos. O anjo aqui faz alusão ao rito da consagração que era observada sob a lei; pois o tabernáculo, com seus apêndices, foi consagrado por m eio de unção. Aqui se m ostra com o a unção perfeita e ver dadeiram ente espiritual foi protelada até o advento de Cristo. Ele m esm o é apropriada e m erecidam ente cham ado o Santo dos San tos, ou o Tabernáculo de D eus, em virtude de seu corpo ser real m ente o tem plo da Deidade, e a santidade ter de ser buscada nele [Cl 2.9]. O profeta aqui nos lem bra a unção do santuário sob a lei com o sendo sim plesm ente um a figura; m as em Cristo temos a genuína exibição da realidade, em bora ele não fosse visivelm en te ungido com óleo, e, sim, espiritualm ente, quando o Espírito de D eus pousou sobre ele com todos seus dons. Por isso ele diz: Por causa deles é que eu me santifico [Jo 17.19]. 2 59 [9.25J D A N IE L E agora prossegue: I \ i sab erás e e n te n d e rá s, d esd e a saíd a d e u m a p a la v ra [ou d ecreto ], p a r a o reg resso d o povo e a e d i ficação d e J e ru sa lé m , a té C risto , o L íder, se rã o sete sem an as, e sessen ta e d u a s sem an as, e o povo re g re s s a rá [ou será trazido de volta], e as ru a s se rã o co n stru íd as, b em com o os m u ro s [ou valas], e isso em b em pouco esp aço d e te m p o (pois é assim que eu ponho a cópula). Com o já dissem os, divide-se o tem po que foi fixado de antem ão para o perfeito estado da Igreja. Em prim eiro lugar, ele põe sete semanas; e então acrescenta sessenta e duas semanas, e deixa uma, da qual falarem os m ais adiante. Ele im e diatam ente explica por que separa as sete sem anas do resto, tor nando desnecessário qualquer outra tradução. Em seguida, quan to à saída do édito, já declaram os quão inadmissível é qualquer interpretação exceto o prim eiro decreto de Ciro, o qual perm itiu que o povo livrem ente regressasse a seu país. Pois as sete sem a nas que perfazem quarenta e nove anos claram ente provam esta asseveração. D esde o início da m onarquia persa até o reinado de D ario filho de H ystaspes, é notória a hostilidade de todas as na ções ao redor dos judeus, especialm ente ao interrom per a edifi cação de seu tem plo e cidade. Em bora o povo tivesse livre per m issão de regressar a seu país, todavia eram ali acossados pelas hostilidades, e eram quase induzidos queixar-se desse sinal do favor divino. U m a grande parte deles preferiu seu exílio anterior a um a vida de opressão e perplexidade gasta entre seus mais cru éis inimigos. Essa é a razão por que o anjo os inform a sobre as sete sem anas transcorridas depois que o povo regressou, pois não deviam esperar gastar suas vidas em plena paz e construir sua cidade e o tem plo sem qualquer inconveniência; pois ele anuncia a ocorrência desse evento na estreiteza do tempo. Pela palavra pIX, tzok, ele não quer dizer ‘brevidade’, mas, antes, significa a natureza angustiante dos tem pos, em decorrência das num erosas dificuldades que todos seus vizinhos trariam ao povo desafortu nado. Valeu a pena apoiar os piedosos com essa adm oestação prévia, para que seu desejo de construir o tem plo não desvane260 51a EX P O SIÇ Ã O [9.26] cesse, ou se tom assem totalm ente decepcionados sob o peso das aflições que teriam que suportar. Conhecem os quais as predições candentes que os profetas enunciavam concernentes ao feliz es tado da Igreja depois de seu regresso; porém a realidade era bem diferente disso, e os fiéis poderiam ter sido totalm ente dom ina dos pelo desespero, a m enos que o anjo soerguesse seu espírito com esta profecia. Assim percebem os a grande utilidade desta adm oestação, e ao m esm o tem po pode ser aplicada a si m esm os com o um exem plo prático. Em bora a benignidade de D eus para conosco fosse maravilhosa, quando o puro evangelho em ergiu dessas trevas m edonhas nas quais ele estivera sepultado por tan tas eras, todavia ainda experim entarem os o aflitivo aspecto das atividades. N ão obstante, os ímpios incessante e furiosam ente se opõem à Igreja envolta em m iséria tanto pela espada quanto pela virulência de suas línguas. Os inimigos dom ésticos usam artes clandestinas em seus esquem as para subverterem nossa constru ção; os perversos destroem toda ordem e interpõem m uitos obs táculos para obstruírem nosso progresso. D eus, porém, ainda de seja, nestes dias, edificar seu tem plo espiritual em m eio às ansie dades dos tem pos; os fiéis têm ainda que sustentar num a das mãos a colher de pedreiro e na outra a espada, segundo lemos no livro de N eem ias [4.17], porque a construção da Igreja deve ainda con tinuar associada a muitas controvérsias. Vamos em frente: 2 6 B d e p o is d as sessen ta e d uas sem an as será c o rtad o o M essias, m as n ã o p o r si m esm o; e o p o v o d o prín cip e q u e há d e v ir d e stru irá a c id a d e e o santuário; e seu tim será com o u m a inundação; e até o fim d a guerra, d esolações são determ inadas. 26 E t post h ebdom adas se x a g in ta duas e x c id e n tu rC h ris tu s ,e tn ih ile rit,e tu rb e m e t sanctuarium perdet populus d u cis ven ie n tis,e t finis e ju s c u m in u n d a tio n e erit, vel, in diluvio, e t ad finem belli definitio desolationum . Aqui Daniel trata das sessenta e duas sem anas que transcor reram entre o sexto ano de D ario e o batism o de Cristo, quando o evangelho com eçou a ser prom ulgado, m as ao m esm o tem po ele não negligencia as sete sem anas das quais esteve falando. Porque elas com preendem o espaço de tem po que form a o intervalo en261 [9.26] D A N IE L tre a m onarquia persa e o segundo édito que um a vez m ais conce dia liberdade ao povo depois da morte de Cam byses. D epois d as sessen ta e d u a s sem an as que sucederiam as sete anteriores, o M essias s e rá co rta d o , diz ele. Aqui o anjo prediz a m orte de Cristo. Os judeus atribuem isto a Agripa, mas tal idéia, com o já observam os, é totalm ente frívola e néscia. Eusébio e outros o atribuem a Aristóbulo, m as isso é igualm ente destituído de ra zão. Portanto, o anjo fala do único M ediador, com o no versículo anterior ele dissera: a té [a vinda de] o Cristo, o Líder. A exten são disto a todo o sacerdócio é tanto forçada quanto absurda. O anjo, ao contrário, tinha isto em mente: Cristo então se m anifes taria para em preender o governo de seu povo; ou, em outros ter m os, até que o M essias aparecesse e com eçasse seu reinado. Já observam os acerca daqueles que errônea e infantilm ente expli cam o título ‘L íder’ com o se fosse inferior em dignidade ao de rei. C om o o anjo usara o título ‘C risto’ no m esm o sentido de M ediador, assim ele o reitera nesta passagem no m esm o sentido. E, seguramente, com o anteriorm ente tratara dessas m arcas sin gulares do favor divino, pelas quais a nova Igreja devia exceder à antiga, não podem os entender a passagem de outra form a senão em relação unicam ente a Cristo, de quem os sacerdotes e reis sob a lei eram igualm ente um tipo. O anjo, pois, aqui assevera que Cristo morreria, e ao m esm o tem po especifica o tipo de morte, dizendo que nada lhe restaria. Esta expressão breve pode ser tom ada em vários sentidos, todavia não hesito em tom ar o anjo com o que dizendo: Cristo m orreria de tal sorte que seria inteira m ente reduzido a nada. H á quem a explica assim: a cidade ou o povo será com o se nada fosse para ele; significando: ele será di vorciado do povo, e sua adoção cessará, pois sabem os que os judeus apostataram de tal sorte da genuína piedade que sua perfí dia os fizera totalm ente alienados de Deus, ao ponto de perderem o nom e de Igreja. M as isso é m uito forçado. Outros pensam que significa que não seria nem hostil nem favorável. A inda outros. 262 51* EX PO SIÇ Ã O [9.26] que nada restaria para ele no sentido de ser destituído de todo auxí lio. Todavia, todos esses comentários me parecem um tanto frígi dos. Não tenho dúvida de que o sentido genuíno é este: a m orte de Cristo seria sem qualquer atrativo ou beleza, como diz Isaías [53.2]. N a verdade o anjo nos informa do caráter ignominioso da morte de Cristo, com o se ele se desvanecesse da vista dos homens pela au sência de beleza. Portanto, nada lhe restará, diz ele; e a razão ób via é porque os homens o considerariam totalm ente abolido. A gora acrescenta: O líd e r do povo v in d o u ro d e s tr u irá a cid ad e e o sa n tu á rio . Aqui o anjo insere o que diz respeito ao fim do capítulo, visto que em seguida ele voltará a Cristo. Ele aqui m enciona o que aconteceria na m orte de Cristo, e proposita dam ente interrom pe a ordem da narrativa para m ostrar que a im piedade deles não escaparia à punição, visto que não só rejeita ram o C risto de Deus, mas o m ataram e tudo fizeram para que sua m em ória fosse de todo apagada do mundo. E em bora o anjo fizesse referência especial som ente aos fiéis, todavia requererse-ia que os incrédulos fossem adm oestados para que ficassem sem justificativa. Estam os bem cientes da inércia e brutalidade desse povo, com o exibido no ato de levar Cristo à m orte; pois esse evento ocasionou um triunfo para os sacerdotes e todo o povo. Daí, esses pontos devem ser enfeixados. O anjo, porém, consultou os interesses dos fiéis, visto que seriam profundam en te chocados com a m orte de Cristo, à qual já fizem os alusão, e tam bém com sua ignom ínia e rejeição. Com o este foi um m étodo de sucum bir tão horrível na opinião da hum anidade, a m ente de todos os homens pios poderia ser totalm ente dom inada pela frus tração, a m enos que o anjo viesse para injetar-lhe ânimo. D aí ele propor um rem édio eficaz: O líder do povo vindouro destruirá a cidade e o santuário; com o se quisesse dizer: não há razão para que os incrédulos se sintam bem e se gabem , porque Cristo foi reduzido a nada segundo o sentido cam al; a vingança lhes so brevirá instantaneamente; o líder do povo vindouro destruirá tanto 263 [ 9 . 26 ] D A N IE L a cidade quanto o santuário. Ele o cham a um líder vindouro, para evitar que os incrédulos repousem seguros em sua própria vanglória, com o se Deus não estendesse instantaneam ente sua m ão para vingar-se deles. Em bora o exército rom ano que des truiria a cidade e o santuário não surgisse im ediatamente, todavia o profeta lhes assegura a chegada do líder com um exército que ocasionaria a destruição de ambos: a cidade e o santuário. Sem a m enor som bra de dúvida, ele aqui tem em m ente que D eus infli giria terrível vingança contra os judeus pelo assassinato de seu Cristo. A quele sofista, Barbinel, ao sentir-se desejoso de refutar os cristãos, diz que transcorreram m ais de duzentos anos entre a destruição do tem plo e a m orte de Cristo. Quão ignorante era ele! M esm o que nos víssem os privados de toda confiança nos evan gelistas e apóstolos, todavia os escritores profanos prontam ente o convenceriam de estultícia. Tal, porém, é a barbaridade de sua nação, e tão enorm e é sua obstinação, que não se envergonham de nada. N o que nos diz respeito, deduzim os com suficiente cla reza, da passagem , com o o anjo fez breve m enção da futura m or tandade da cidade e da destruição do templo, para que os fiéis não se vissem esm agados com angústias em decorrência da m or te de Cristo, e para que os incrédulos não se tom assem ainda m ais em pedernidos em face dessa ocorrência. A interpretação de alguns escritores acerca do povo do futuro líder, com o se Tito quisesse poupar a m aravilhosa cidade e preservá-la intocada, parece-m e por dem ais refinada. Tomo-o sim plesm ente com o um líder que estava para vir com seu exército com o fim de destruir a cidade e subverter com pletam ente o templo. Em seguida ele acrescenta: seu fim s e rá n u m dilúvio. Aqui o anjo remove toda esperança para os judeus, cuja obstinação poderia levá-los a esperar algum a vantagem em seu favor, pois já estam os cientes de sua grande estupidez quando em estado de desespero. Para que os fiéis não condescendessem nos m esm os sentim entos com os apóstatas e rebeldes, ele diz: O fim do líder. 264 51* EX P O SIÇ Ã O [9.27] a saber, Tito, seria num dilúvio: significando: ele subverteria a cidade e a política nacional, e daria um fim sum ário no sacerdó cio e na raça, enquanto que todos os favores divinos ao mesmo tem po seriam subtraídos. N este sentido, seu fim seria num dilú vio. Finalm ente, no fim d a g u e rra , u m a d esolação m uitíssim o decisiva. A palavra flS~\Ul,nech-retzeth, “um a com pletação” di ficilm ente pode ser tom ada de outra form a que não sejau m subs tantivo. Segue um substantivo plural, mflüti), shem m oth, ‘deso lações’ ou ‘devastações’; e tom ado literalm ente significa “ruína definitiva ou consum ada” . Os gram áticos m uito habilidosos ad mitem que a prim eira dessas palavras pode ser tom ada com o subs tantivo para ‘térm ino’, com o se o anjo dissesse: A inda quando os judeus experim entem um a variedade de sucesso na batalha, e te nham esperança de ser superiores a seus inim igos, de sair e proi bir seus inimigos de entrarem na cidade ou, m ais ainda, até m es mo de repeli-los, todavia o fim da guerra resultará em total de vastação, e sua destruição é claram ente definida. D ois pontos, pois, devem ser notados aqui: prim eiro, deve-se elim inar toda e qualquer esperança para os judeus, quando devem ser instruídos ser necessário que pereçam ; e, segundo, um a razão é atribuída a isso, a saber: a determ inação do Todo-Poderoso e seu decreto inviolável. Vamos em frente: 27 E e le con firm ará o pacto com m uitos p o r u m a sem ana; e na m etade d a sem ana ele fa rá c essa r o sacrifício e a oblação, e pelo tran sb o rd am en to das abom inações ele o fará um erm o, e isso até a consum a ção, e o q u e e stá d e term in ad o será d erra m ado so b re o assolador. 2 7 Et roborabit130f a d u s m ultis, hebdom ade una: et dim id ia heb d o m ad e q u iescere fa c ie t121 sacrificium , et o blationem : e t su p e r e x te n sio n e m l22ab o m in atio n u m obstu p esce t,l23e t ad fin em , e t ad determ inationem stillabit su p e r stupentem . O anjo agora se volve a Cristo. Já explicam os por que ele fez IBI Confirmará. 111 Fará cessar. 132 Ou. expansão, literalmente asa. 1,3 Ou, entorpecerá, porque há quem o toma transitivamente. 265 [9.27] D A N IE L m enção da m atança futura: prim eiro, para m ostrar aos fiéis que não têm razão para perm anecerem na corporação d a nação em preferência a serem elim inados dela. E, em seguida, para preve nir os incrédulos de nutrirem prazer com sua obstinação e seu desdém pelas inestim áveis bênçãos divinas, rejeitando a pessoa de Cristo. A ssim esta sentença foi interposta com respeito ã d e vastação futura da cidade e do tem plo. O anjo agora prossegue seu discurso concernente a Cristo, dizendo: ele c o n firm a rá o tr a ta d o com m u ito s p o r u m a sem ana. Esta sentença corres ponde à prim eira, na qual Cristo é cham ado Líder. C risto assu m iu sobre si o caráter de líder, ou assum iu o ofício régio, quando prom ulgou a graça de Deus. Esta é a confirm ação do pacto do qual o anjo ora fala. Com o já afirm amos, a expiação legal de outras cerim ônias rituais que D eus se dignou conferir aos pais é contrastada com as bênçãos derivadas de Cristo; e agora deduzi mos da frase a m esm a idéia: a confirm ação do pacto. Sabem os quão infalível e estável era o pacto de Deus sob a lei; ele foi desde o princípio sempre veraz e fiel e consistente consigo m es mo. N o que diz respeito ao homem, porém , o pacto da lei era débil, com o aprendem os de Jerem ias. “Eis que dias vêm, diz o Senhor, em que farei um a aliança nova com a casa de Israel e com a casa de Judá. N ão conform e a aliança que fiz com seus pais, no dia em que os tomei pela mão, para os tirar da terra do Egito; porque eles invalidaram m inha aliança apesar de eu os haver desposado, diz o Senhor” [Jr 31.31, 32], Assim o pacto divino é estabelecido conosco, porque já fom os reconciliados por m eio da m orte de Cristo; e ao m esm o tem po acrescenta-se o efei to do Espírito Santo, porque D eus escreve sua lei em nossos co rações; e assim seu pacto não é gravado em pedras, m as em nos sos corações de cam e, segundo o ensino do profeta Ezequiel [11.19]. Agora, pois, entendemos por que o anjo diz: Cristo co n firm a rá o pacto p o r uma semana, e p o r que essa sem ana foi pos ta, pela ordem , no fim. N esta sem ana ele confirm ará o pacto com m uitos. Porém não posso concluir esta exposição hoje. 266 51* EX P O SIÇ Ã O ORAÇÃO Deus Onipotente, visto que todos os tesouros de tua benevolência e indulgência foram tão liberalmente difundidos quando teu unigénito Filho apareceu, e nos são agora diariamente oferecidos através do evangelho, concede que não nos privemos de tão importantes bên çãos em fa ce de nossa ingratidão. Que abracemos teu Filho com fé genuína; e desfrutemos dos benefícios da redenção que ele granjeou para nós. Sendo purificados e purgados p o r seu sangue, sejamos aceitos diante de tua fa c e e nos aventuremos, em plena e infalível confiança, a chamar-te de Pai. Que aprendamos a fu g ir para tua mercê e assistência em todas nossas misérias e tributações, a té que , por fim , nos reunamos naquele eterno descanso que adquiriste para nós através do sangue de teu unigénito Filho. Amém. 267 wição í j / l a últim a preleção explicam os com o Cristo confirm ou o ^ f L pacto com m uitos durante a última sem ana; pois ele con gregou os filhos de Deus de seu estado de dispersão, quando a devastação da Igreja assumiu um caráter extrem am ente terrível e miserável. Em bora o evangelho não fosse instantaneam ente p ro mulgado entre as nações estrangeiras, todavia somos corretamente inform ados que Cristo confirmou o pacto com m uitos, visto que as nações foram diretam ente cham adas à esperança da salvação [Mt 10.5]. Em bora ele proibisse os discípulos de pregarem então o evangelho aos gentios ou aos sam aritanos, contudo os instruiu dizendo que muitas ovelhas viviam dispersas pelo m undo fora, e que estava próxim o o dia em que D eus construiria um só aprisco [Jo 10.16]. Isso se cum priu após sua ressurreição. D urante sua vida terrena, ele com eçou a antecipar levem ente a vocação dos gentios, e assim interpreto estas palavras do profeta: ele confir m ará o pacto com muitos. Pois tom o a palavra ‘m uitos’, aqui, D ^ l , rebim, com parativam ente em referência aos gentios fiéis unidos aos judeus. É m uitíssim o notório que o pacto divino este ve depositado por um tipo de direito hereditário com os israelitas até que o m esm o favor se estendesse tam bém aos gentios. Por tanto diz-se que Cristo renovou o pacto de D eus não só com um a nação, m as em termos gerais com o mundo com o um todo. Aliás, adm ito o uso da palavra m uitos com o sendo para todos, com o no quinto capítulo da Epístola aos Rom anos e em outras partes [v. 19], m as ali parece haver um contraste entre a Igreja antiga, in 268 52* EX P O SIÇ Ã O [9.27) crustada dentro de estreitas fronteiras, e a Igreja nova, a qual se estende ao m undo inteiro. Sabem os que m uitos, outrora estran geiros, têm sido cham ados das regiões longínquas da terra por m eio do evangelho, e assim reunidos aos judeus por m eio de ali ança, ao ponto de todos desfrutarem da m esm a com unhão e to dos reconhecidos com o igualmente filhos de Deus. O profeta agora adiciona: E le f a r á c e ssa r o sacrifício e a ob lação d u ra n te m e ta d e d e u m a sem ana. D evem os relacionar isso com o tem po da ressurreição. Pois enquanto Cristo atraves sava o período de sua vida terrena, ele não pôs term o aos sacrifí cios; mas depois de oferecer-se com o vítima, então todos os ritos da lei chegaram ao term o final. Pelas palavras “sacrifício e obla ção” o profeta aponta para todas as cerim ônias, sendo um a parte expressa pelo todo; com o se ele dissesse: depois que Cristo se ofereceu em sacrifício etem o, todas as cerim ônias costum eiras da lei foram abolidas; pois de outra form a a m orte de Cristo teria sido supérflua, caso ele não pusesse fim a todas as velhas som bras da lei. Em bora os sacrifícios continuassem por m uitos anos depois d a m orte de Cristo, todavia não podem os m ais cham á-los ‘legítim os’, pois não se pode apresentar nenhum a razão para que os sacrifícios da lei ainda agradassem a Deus, exceto sua referên cia àquele modelo celestial que M oisés viu no m onte [Ex 25.40]. Daí, depois que Cristo se manifestou e expiou todos os pecados do m undo, fez-se necessário que todos os sacrifícios cessassem [Hb 8.5]. Essa é a intenção do profeta quando diz que Cristo fa ria cessar os sacrifícios durante m etade de uma semana. Ele abarca dois pontos ao mesmo tempo: prim eiro, C risto real e efi cientem ente pôs fim aos sacrifícios da lei; e, segundo, ele provou isso ao m undo através da pregação do evangelho por seus após tolos. O bservam os, pois, o sentido no qual Deus testificou por m eio de seu profeta a cessação dos sacrifícios depois da ressur reição de Cristo. O véu do tem plo então se rasgou em duas par tes; foi proclam ada a verdadeira liberdade; os fiéis, pois, podiam 269 [9.27] D A N IE L sentir-se homens plenam ente am adurecidos, e não m ais sujeitos àquele governo infantil ao qual se sujeitaram sob a lei. A gora vem a lum e a segunda sentença do versículo: já a le m os antes, m as agora a repetim os para renovar a memória. E so b re a extensão ou expansão d a s ab o m in açõ es ele c a u s a rá esp an to , ou estupefação; e isso até a co n su m ação e d e te rm in a ção, ele se d e r r a m a r á so b re o asso lad o r. Alguns traduzem : ela será derram ada ou destilada. Discutiremos as palavras m ais adi ante. A passagem é obscura, e poderia ser traduzida num a varie dade de form as, e p o r conseguinte os intérpretes diferem muito entre si. Alguns tom am ^]D, knaph, “um a asa” , por um ‘queru b im ’; então m udam os números do singular para o plural, e crê em que o profeta está falando de querubim alado. Isso propicia aos que adotam tal tradução um duplo m étodo de explicá-la. A l guns dizem que a abom inação estará acima das asas, ou, seja, a arca do concerto, porque o tem plo foi profanado e a abom inação foi tão desastrosa que destruiu até m esm o o próprio querubim . O utros o tom a no sentido causal - as abom inações serão p o r cau sa do querubim . Eu, porém , ignoro essas sutilezas, um a vez que não me com unicam qualquer solidez. O utros seguem tam bém a versão grega, com o citada por Cristo no capítulo 24 de M ateus e outros lugares. Em bora Cristo pareça antes fazer m enção da m es m a abom inação, não insistirei neste ponto; apenas farei observa ção sobre a tradução de um a palavra. A queles que traduzem “ as abom inações d a desolação" tratam as palavras de Daniel de for m a dem asiadam ente displicente, com o se não houvesse nenhu m a dependência gramatical de um a palavra com a outra, ou, tec nicam ente falando, nenhum estado de regime. A opinião preferí vel é aquela que considera a palavra ‘asa’ no sentido de extrem i dade ou extensão. Outros, ainda, tratam ‘extrem o’ com o se sig nificasse um estado de desespero; com o se o anjo dissesse: por conta da extrem idade das abom inações, enquanto m ales se acu m ulam sobre males, sem fim, até que os problem as chegaram ao 270 52* EX P O SIÇ Ã O [9.27] ponto extrem o de desespero. Outros explicam ainda “a asa das abom inações” m ais sim plesm ente pela expansão propriam ente dita, com o se o anjo declarasse que o tem plo seria publicam ente profanado, e a im pureza seria m uito m ais evidente. O s intérpretes diferem um a vez mais sobre as palavras ÜÜÍ1?D, m esm en, e DDÜ, sem -em, geralm ente traduzidas ‘tom ar-se deso lado’ e ‘desolação’. H á quem tom a a prim eira transitivam ente; e outros, com o neutra; a segunda significando destruir e devastar, e tam bém adm irar e ficar atônito. Penso que essas duas palavras devem ser usadas no m esm o sentido; com se o profeta dissesse que todos ficarão atônitos na m esm a extensão das abominações; quando perceberem o culto do tem plo sendo varrido por um dilú vio, então ficarão profundam ente atônitos. Em seguida ele acres centa a calam idade que com eçou quando D eus m ostrou que a contam inação do tem plo se destilaria ou se derram aria sobre aquele que se sentisse atônito. D iscutirem os a própria ocorrência para capacitar-nos a entender m elhor o sentido das palavras. Não hesito declarar que o intuito de D eus era subtrair dos judeus toda esperança de restauração, os quais, bem o sabem os, foram cega dos por um a insensata confiança, pressupondo que a presença de D eus se confinaria ao tem plo visível. Enquanto eram assim ina balavelm ente convencidos da im possibilidade de Deus jam ais afastar-se deles, seriam privados de sua falsa confiança e não mais se iludiriam por essas prom issoras e ilusórias esperanças. E assim a contam inação tem porária do tem plo foi m ostrada por Ezequiel [10.18], Pois quando os profetas proclam avam incessan temente a aproximação dos inimigos com o fim de destruir a am bos, cidade e templo, a maioria do povo escarnecia deles. Em sua opinião, isso subverteria toda sua confiança em Deus, com o se considerasse falsa sua palavra, ao prometer-lhes descanso perpé tuo no M onte Sião [SI 132.14], Aqui Ezequiel relata sua visão de D eus assentado no templo - ele, pois, desapareceu e o tem plo foi privado de toda sua glória. M as isso foi apenas temporariamente. 271 [9.27] D A N IE L Agora, porém, passam os a tratar da profanação do tem plo, o que deve provar se eu posso usar a frase eterno e irreparável. Sem a m ais leve dúvida, esta profecia cum priu-se quando a cida de foi capturada e subvertida e o tem plo totalm ente destruído por Tito, filho de Vespasiano. Isso explica satisfatoriam ente os acon tecim entos aqui preditos. Alguns consideram a palavra ‘abom i nação’ com o sendo usada metaforicam ente e para significar a subversão da cidade; mas isso me parece m uito forçado. O utros a explicam com o indicando a estátua de Calígula erigida no tem plo; e outros, ainda, com o indicativo da bandeira de Tibério, o qual ordenou que as águias [romanas] fossem colocadas no piná culo do templo. Eu, porém, a interpreto sim plesm ente com o in dicativo da profanação que ocorreu depois que o evangelho co m eçou a ser prom ulgado e do castigo infligido sobre os judeus quando perceberam que seu tem plo ficou sujeito às m ais grossei ras form as de desconsagração, visto que não se dispuseram a ad m itir o unigénito Filho de Deus com o sua verdadeira glória. O u tros, ainda, com o sendo as doutrinas e superstições ím pias, bem com o os perversivos erros com que os sacerdotes se imbuíram. Eu, porém , penso que a passagem m arca a m udança geral que ocorreu diretam ente depois da ressurreição de Cristo, quando a obstinada impiedade do povo foi plenamente detectada. Foram, pois, convocados ao arrependimento; ainda que tivessem se esfor çado em extinguir toda esperança de salvação radicada em Cristo, todavia Deus estendeu-lhes a mão e testou se sua perversidade era ou não passível de cura. Depois que a graça de Cristo foi obstina dam ente rejeitada, então seguiu-se a extensão das abom inações; ou, seja, D eus subverteu o tem plo em total ruína, e fez com que sua santidade e glória se desvanecessem totalmente. Em bora essa vingança não ocorresse im ediatam ente depois de expirar a últi m a sem ana, todavia Deus vingou-se suficientem ente de seu ím pio desprezo por seu evangelho; e, além disso, ele m ostra com o não m ais carecia de algum tem plo visível, um a vez que agora ele dedicou a si o m undo inteiro, desde o oriente até o ocidente. 272 52* EX P O SIÇ Ã O [9.27] A gora volto um a vez m ais à explanação das palavras em se parado. D iz o anjo: Sobre a extensão das abom inações, espanto ou espantoso; pois alguns acreditam ser a palavra um adjetivo, e outros, um substantivo; m as o significado é este: todos ficariam estupefatos, ou atônitos. Eu não faço nenhum a objeção ao signi ficado já indicado, ou, seja, traduzir a palavra ‘asa’ por ‘extre m o’; pois o sentido então será: quando as abom inações chega rem a seu auge ou extrem o; e o sentido será o m esm o se usarmos a palavra ‘expansão’. A intenção de Deus é m ostrar-nos a situa ção extensa da contam inação - para cima, para baixo, de todos os lados, haviam obscurecido e sepultado a glória do templo. Daí, por conta do extremo ou expansão das abom inações haveriam de fic a r atônitos, pois todos ficariam adm irados. O anjo parece contrapor tal estupor à soberba; pois os judeus estavam total m ente persuadidos de Deus estar estritam ente em obrigação para com eles e da im possibilidade de serem eles separados de seu próprio tem plo onde Deus fixara sua eterna habitação. Ele prediz a aproxim ação desse espanto em lugar de sua letárgica segurança. Em seguida ele acrescenta: E até a co n su m ação . n^D, keleh, significando ‘fim ’ e ‘perfeição’, tanto quanto ‘destruição’. Tomo a expressão aqui com o equivalente a consum ação ou destruição. Inundará ao ponto de causar perplexidade. Já observei que as palavras im plicam esse assombro; matança, ou algo similar, deve ser subentendido antes do verbo. N ão há dúvida algum a sobre a intenção do profeta. Ele diz que essa m atança seria com o um aguaceiro contínuo, consum indo todo o povo. Ele fala do povo com o que pasm o ante suas calam idades e privado de toda e qual quer esperança de se escapar delas; pois a m atança jo rrará [como água] sobre o povo estarrecido. Entrem entes, ele m ostra quão loucam ente os judeus se deixaram dom inar pela soberba e quão ilusoriam ente se enganavam supondo que o Todo-Poderoso se com prom etera protegê-los perm anentem ente, a eles e a seu tem plo visível. A m a ta n ç a j o r r a r á até a co n su m ação significa até 273 [10.1] D A N IE L que todo o povo perecesse. Ele acrescenta ainda outro substanti vo: a té a u m d e te rm in a d o fim . Já desvendam os o significado deste substantivo. Aqui o profeta explica a causa daquela eterna distinção que o Onipotente determinara e decretara ser irrevogável. (Z a p ítu ú o 1 0 A gora vem o capítulo dez, o qual Daniel introduz com o um prefácio aos capítulos onze e doze. Ele relata a m aneira com o foi afetado, quando a últim a visão surgiu ante seus olhos. Isso ele sucintam ente explica com o sendo um a referência aos aconteci m entos que estavam para ocorrer até o advento de Cristo; e então ele o estende ao dia final da ressurreição. D eus previam ente pre dissera a seu profeta a futura condição da Igreja desde o regresso de B abilônia até o advento de Cristo; no capítulo onze, porém, ele m ais distinta e claram ente aponta com o dedo para cada um dos acontecim entos, com o perceberem os à m edida que nossos com entários avançam. N este capítulo, D aniel nos assegura que as profecias que ele estava para discutir são dignas de um a atenção mais que a ordinária; quando o anjo apareceu, ele foi im ediata mente afetado com dor e tristeza; então enfrentou um mom ento de perplexidade, e em seguida foi dominado pelo secreto instinto do Espírito; ele se assemelhava a um homem morto, até que fosse restaurado paulatinamente pelo anjo de Deus. Observaremos esses pontos à medida que avançarmos. Em primeiro lugar, ele diz: I N o terceiro ano d e C iro, rei d a P érsia. foi re v e la d a um a c o isa a D a n iel, c u jo nom e e ra B eltessazar: e a palavra era verd a d eira, porém o tem p o d e sig n ad o era longo: e ele e ntendeu a palavra, e teve discern im en to d a visão. 1 A nno tertio C yri re g is P ersarum serm o revelatus fuií D anieü. c u ju s nom en B eitsazar, et veritas se rm o ,1« e( tem pus m agn u m .'“ e t intellexit se rm o n em , e t im elligentia ei fuit in visione, 1MO u. seja, a própria palavra era m uito verdadeira. 111Ou, seja. em bora o tem po de seu cumprimerno fosse longo. 274 52* EX P O SIÇ Ã O [10.1] O bservam os que o profeta de m odo algum está contente com o m étodo usual de discurso, com o propósito de cham ar a aten ção dos hom ens piedosos e de assegurar-lhes quão dignas de nota especial são as profecias que vêm em seguida. Ele observa o tem po, o terceiro ano do rei Ciro, quando os judeus foram então proi bidos por um novo édito de construir seu tem plo, em bora lhes fosse previamente concedida liberdade para fazê-lo. Diz ele: “ u m a p a la v ra ” se lhe fez co n h ecer, e acrescenta: a p a la v ra e r a v e r d a d e ira , em bora o tem po fosse longo. O tem po será tratado mais extensam ente no próxim o versículo. Ao dizer: uma palavra se lhe m anifestou, sua intenção é distinguir esta profecia das outras, quando ela não lhe fora oferecida por m eio de sonho nem por m eio de visão. Ele usa a palavra HNID, m erah, um a ‘visão’, no fim deste versículo, mas não vejo por que o substantivo ‘palavra’ deva ser tom ado num sentido tão restrito. O s intérpretes, além disso, buscam um a razão por que ele m enciona seu próprio nome com o Beltessazar. Há quem pensa estar ele celebrando algum a honra a que fora soerguido; outros o tratam com o que enaltecen do a superioridade de suas habilidades, com o o nom e o implica: descido do céu. Enquanto outros apresentam várias conjeturas. Não hesito em afirm ar que o desejo de D aniel era criar um m o m ento que ilustrasse sua vocação entre os m edos, persas e cal deus. M ui provavelm ente ele ali fosse geralm ente cham ado B el tessazar, e que o nom e Daniel estivesse quase sepultado no olvi do. e assim ele desejava testificar não ser o m esm o estranho ao povo de D eus, em bora experim entasse o fato de um nom e estran geiro lhe ser imposto; pois já vimos a im possibilidade de evitálo. Portanto, penso que o profeta não tinha outra razão senão to r nar esta profecia notória por todas as regiões nas quais ele era bem conhecido sob o nom e de Beltessazar. Além disso, ele dese ja v a testificar a seus com patrícios que não queria ser totalm ente elim inado da Igreja por ser cham ado B eltessazar pelos caldeus; pois ele era sem pre o mesm o; e ainda que banido de seu país, ele 275 [10.1] D A N IE L era revestido com o Espírito de profecia, com o já vim os previa mente. Com o o nom e D aniel era quase desconhecido na Caldéia, ele desejava fazer conhecida a existência de am bos seus nomes. Vamos em frente: E a palavra é verdadeira. D aniel aqui realça a infalibilidade da profecia, com o se quisesse dizer: N ada ponho diante de ti, senão o que é firm e e estável, e cujo real cum prim ento os fiéis devem confiadam ente esperar. A palavra é ver dadeira., diz ele, significando que não havia lugar a dúvidas quanto a suas afirmações, pois ele fora divinamente instruído sobre acon tecim entos que seriam cum pridos em seu próprio tempo. Enten do o que segue neste sentido: em bora o tem po seja longo. Alguns dos rabinos tom am tzeba, pelas hostes angelicais, o que é totalm ente absurdo neste lugar. A palavra significa ‘exército’, bem com o um tem po designado, m as a explicação que im põem à passagem não pode lograr êxito. A partícula ‘e \ segundo penso, deve aqui ser tom ada adeversativam ente, no sentido de ‘em bo ra ’. A ssim o profeta proclam a nossa necessidade de um a mente tranqüila e alma paciente, até que Deus realm ente com plete e concretize o que verbalmente anunciou. Esse sentim ento deve estender-se a todas as profecias. Sabem os quão ardentes são as disposições dos homens e quão precipitadam ente se deixam ar rebatar por seus próprios desejos. Somos com pelidos, pois, a re frear nossa im petuosidade, caso desejem os fazer progresso na escola de Deus, e devem os adm itir este princípio geral: Se uma prom essa tardar, continuem os a esperar p o r ela; pois ela segura mente virá e não delongará [Hc 2.3]. Aqui Daniel afirma, em um sentido especial, que o tempo será longo. Isso deve refrear os fiéis de lançar-se de ponta cabeça em pressa tresloucada. Devem controlar seus sentim entos e perm anecer tranqüilos até que che gue a plena m aturidade do tempo. Em seguida, ele acrescenta: E le entendeu a visão. Com esta afirm ação ele confirm a a profecia que está para explicar, e assim nos assegura que não está enunciando nada de perplexivo nem de 276 52* EX P O SIÇ Ã O [10.2, 3] obscuro. Ele tam bém induz todos os piedosos a esperarem pelo exercício da m esm a com preensão que ele m esm o havia atingido, com o se quisesse dizer: Sei o que D eus queria; ele me explicou, por meio de seu anjo, vários acontecim entos que agora apresen tarei em sua própria ordem: que cada um exam ine essas profeci as atenta e reverentem ente, e que Deus lhe conceda o mesmo dom do discernim ento e o guie a um conhecim ento definido. A inform ação com unicada pelo profeta pertence a todos os piedo sos, para estancar sua indolência e seu desespero. N o prim eiro relance, este ensino pode parecer m uito obscuro, porém devem buscar no Senhor aquela luz de m anifestação que ele se dignou conceder ao próprio profeta. Vamos em frente: 2 N aqueles dias eu, D aniel, pranteei por três sem an as com pletas. 2 D iebus illis e g o D aniel dedi m e luctui trib u s hebdo m ad ib u s dierum . 3 N ão com i pão apetecível, não levei a m inha b o ca nem carn e nem vinho, nem m e ungi ab solutam ente, até que se cu m p riram to d as as três sem anas. 3 P a n e m d e lic ia ru m l2Snon com edi: e t caro e t v inum non intravit in o s m eum : e t unguendo non fui unctus donec im p le ts sunt tre s hebdom ades dierum . D eduzim os desta passagem por que o anjo apareceu ao profe ta no terceiro ano de Ciro. D iz ele: E u estav a, e n tão , n a m ais p ro fu n d a tristeza. E qual foi a causa disso? Sabem os que na quele período houve um a interrupção da obra de reconstrução do tem plo e da cidade. Ciro se pusera a um a distância; deixara a Ásia M enor e fora em preender guerra com os citas. Seu filho Cam byses foi corrom pido por seus palacianos e proibiu os ju deus de prosseguirem com a reconstrução de sua cidade e seu tem plo. A liberdade do povo poderia então parecer infrutífera. Pois D eus prom etera aos judeus em linguagem candente um re gresso a seu país com seus estandartes desfraldados. Além disso, conhecem os a esplêndida linguagem dos profetas no tocante à glória do segundo tem plo [ls 52.12; Ag 2.9; e outros lugares]. Ao se virem privados de toda e qualquer oportunidade para a re '* “D elicado"; literalmente, "de desejos". 2 77 110.2, 3] D A N IE L construção de seu tem plo, o que os judeus poderiam concluir se não que haviam sido enganados depois de regressarem a seu país, e que D eus fizera um a exibição de expectativas frustrantes que se converteram em m era pedra de tropeço e decepção? E sta foi a causa da tristeza e angústia que oprim ia o santo profeta. A gora entendem os por que ele faz m enção do terceiro ano de Ciro, quan do as circunstâncias daquele período, ainda em nossos dias, real çam a razão de sua abstinência de todos os manjares. D iz ele: E stive em aflição p o r trê s sem an as d e d ias. Os hebreus am iúde usam a frase sem anas ou tem pos de dias para um período completo. Mui provavelmente, Daniel usa a palavra ‘dias’ aqui para coibir equívocos que pudessem facilm ente ocorrer em decorrência de recentem ente falar tanto em sem anas de anos. A distinção é assim mais claram ente marcante entre as setenta se m anas de anos previam ente explicadas e estas três sem anas de dias aqui m encionadas. E o anjo parece ter se alongado proposi tadam ente na com pletação dessas três semanas, visto que esse era o terceiro ano do reinado do rei Ciro. D iz ele: n ã o com i p ão d elicad o e m e abstive d e c a rn e e vinho, im plicando sua prática de juntar jejum e pranto. O santo profeta é aqui representado com o que usando livremente carne em outras refeições enquanto a Igreja de Deus perm anecia em estado de tranqüilidade; mas quando ron dava o perigo, para que os poucos que regressaram ao lar não dim inuíssem e muitos estivessem ainda sofrendo em Babilônia as graves calam idades a que estavam sujeitos durante seu exílio dos inim igos vizinhos, então o profeta abstinha de todos os m an jares. N o início deste livro, ele declarou seu contentam ento e o de seus com panheiros em com er pão, legumes e água em vez de carne e bebida. E ssa declaração não contraria a presente passa gem. N ão há necessidade de fugir a essa declaração, a qual adm i te que um hom em idoso use vinho, o qual ele jam ais tocara em sua juventude e na flor de sua idade. Este com entário é por de m ais frígido. Já m ostram os com o no início de seu exílio a única 278 52a EX P O SIÇ Ã O [10.2, 3] razão para a abstenção do profeta de m anjares palacianos era o desejo de m anter-se livre de toda corrupção. Pois qual era o obje tivo da perspicácia do rei em ordenar que Daniel e seus com pa nheiros fossem tratados assim deliciosa e luxuosam ente? Seu intuito era que esquecessem sua nação gradativam ente e adotas sem os hábitos dos caldeus e se deixassem desviar, p o r tais sedu ções, da observância da lei, do culto devido a D eus e dos exercí cios da piedade. Quando Daniel percebeu a astuta m aneira em que ele e seus com panheiros eram tratados, então solicitou que fossem alim entados com legum es e recusou-se provar o vinho do rei e desprezou todas suas guloseim as. Portanto, sua razão con cernia às exigências dos tem pos, com o então realcei bem exten samente. Entrem entes, não carece que nos hesitem os supondo que, depois de dar esta prova de sua constância e de escapar de tais arm adilhas do diabo e do m onarca caldeu, ele passou a viver de form a m ais espontânea do que frugalm ente, e passou a fazer uso de pão, de carne e de vinho mais excelentes que antes. Esta passagem , pois, em bora assevere a abstinência de carne e de vi nho por parte do profeta, não im plica necessariam ente um jejum real. O m étodo de vida de Daniel era claram ente segundo a práti ca com um dos caldeus, e de form a algum a im plica a rejeição de vinho, ou carne, ou viandas de qualquer tipo. A o dizer: não com i pão delicado, esse era um sím bolo de dor e pranto, com absti nência de carne e vinho. O objetivo de D aniel ao rejeitar pão e vinho delicados durante essas três sem anas era não m eram ente a prom oção da tem perança, m as para que pudesse suplicem ente im plorar ao Todo-Poderoso que não perm itisse a sua Igreja a rei teração daqueles sofrim entos sob os quais ela havia previam ente labutado. M as não posso aqui tratar m ais extensam ente do obje tivo e uso do jejum . Já fiz isso em outra parte; ainda que o quises se fazer, não teria tem po agora. Amanhã, talvez, direi um as pou cas palavras sobre o tema, e então prosseguirei com o restante de minhas observações. 279 D A N IE L ORAÇÃO Deus Onipotente, visto que puseste diante de nós tão notável exem p lo em teu santo profeta, a quem adornaste de tantas maneiras para que ele lutasse até sua idade extrema com várias e quase inumerá veis provações, e contudo nunca se deixou abater mentalmente, fa z com que sejamos revestidos com a mesma infatigável fortaleza. Faznos prosseguir no curso de nossa santa vocação sem o mais leve abatimento em meio a tudo quanto vier a suceder-nos. Quando vir mos tua Igreja submersa pelas ruínas e seus inimigos tramando de sesperadamente sua destruição, que busquemos constantemente aque la liberdade que prometeste desde os tempos antigos. Que lutemos com coragem inquebrantável até que, p o r fim , nos desvencilhemos de nossa guerra e nos reunamos naquele bem-aventurado descanso que, bem sabemos, fo i preparado para nós no céu p o r Cristo nosso Senhor. Amém. 280 53a fexposição /£ 7 )n te m declaram os a razão por que Daniel se absteve de carne e vinho durante três semanas. Foi o sofrim ento e a con dição deprim ente d a Igreja ante a proibição aos judeus de cons truir seu templo. Já declaram os os pontos de vista falazes daque les que acreditam fosse ele sempre abstêm io desde a flor de sua idade. Em bora vivesse de pão e legumes, isso foi apenas com o propósito de perm anecer puro sem qualquer propensão para os hábitos dos caldeus, visto que o desígnio do rei era subtraí-lo, bem com o a seus com panheiros, do povo de Deus, com o se ori ginariam ente procedessem da Caldéia. Portanto, essa foi um a ra zão apenas temporária. Agora, porém, ele declara: não provei p ã o delicado, ou, seja, feito de flor de farinha; e não provei nem vinho nem carne, durante o tem po em que foi im pedida a cons trução do templo. É m ister que notem os diligentem ente esse fato; pois muitos celebram o jejum com o se ele fosse a principal parte do culto divino. Pensam nele com o um ato de obediência ineren tem ente aprazível a Deus. M as isso é um erro grosseiro, visto que o jejum , em si mesmo, deve ser tratado com o um a questão sem im portância e indiferente. Ele não m erece nenhum enaltecimento, exceto em referência a seu objetivo. Ora, os objetivos do jejum são vários; o principal deles é este: capacitar o fiel a devo tam ente aplacar a ira de D eus com o solene testem unho de seu arrependim ento e estim ular uns aos outros a um fervor m ais in tenso em suas orações. As orações diárias e ordinárias não reque rem jejum ; m as quando um a grande necessidade nos oprim e, esse 281 [10.2, 3] D A N IE L exercício é adicionado à guisa de auxílio, visando a aum entar a vigilância e fervor de nossas mentes em seu modo de apresentar a oração. Por essa razão as Escrituras am iúde conectam jejum com dor, e D aniel aqui segue a prática usual. Percebem os, pois, a razão de rejeitar ele todas as delícias de com ida e bebida, através de seu desejo de evitar totalm ente todos os obstáculos e tornar-se m ais atento em suas orações. A gora toco de leve na questão do jejum , porque não posso deter-m e em passagens casuais com o estas. D evem os notar, contudo, quão tola e absurdam ente o je ju m é observado nestes dias entre os papistas, os quais crêem que já cum priram esse dever com endo apenas um a vez ao dia e abstendo-se de cam e. A norm a do jejum entre os papistas consiste em evitar cam e e não participar da ceia ou jantar. O jejum real, porém , requer algo bem mais distinto que isso, a saber: perfeita abstinência de toda e qualquer iguaria. Pois D aniel estende este jeju m até m esm o ao pão. D iz ele: não provei vinho, significando que ele se absteve de todo vinho. Então, quanto à palavra ‘carne’, o que ele tem em m ente não é só bois, vitelos, cordeiros, galinhas ou aves em geral, mas todo alimento, com exceção do pão, está incluído sob o term o ca m e. Pois Daniel não se divertia infantil m ente com Deus, com o fazem os papistas em nossos dias, os quais com em sem qualquer escrúpulo religioso de todas as m e lhores e exóticas viandas, enquanto que evitam carne. Isso vem a lume m ais claram ente da afirmação: não com i p ã o delicado, ou, seja, feito de flor de farinha ou do m elhor produto do trigo. Ele se contentava com o sim ples pão para a satisfação de suas necessi dades. Isso prova sobejam ente a superstição daqueles que distin guem entre carne, ovos e peixe. Ora, o jejum consiste nisto: a im posição de um freio nas luxúrias humanas, com endo apenas frugal e levem ente o que é absolutam ente necessário e contentando-se com o pão com um e água. A gora discernim os com o o jejum , n estae em passagens semelhantes, não é tom ado por aquela tem perança que Deus nos recom enda ao longo de todo o curso de nossa vida. O s fiéis devem ser habitualm ente equilibrados, e por 282 53* EX P O SIÇ Ã O [10.4] m eio da frugalidade observar um jeju m contínuo; não devem entregar-se a com ida e bebida im oderadam ente, bem com o a há bitos exuberantes, a fim de não debilitar a m ente e o corpo com tais indulgências. Como um sinal de tristeza e um exercício de hum ildade, os fiéis podem im por a si a lei do jejum além de seus hábitos ordinários de sobriedade, quando sentirem algum sinal da ira de Deus e desejarem estim ular em sua alm a o fervor na oração, segundo nossas afirm ações anteriores, e confessar-se cul pados na presença do m undo inteiro e perante o tribunal de Deus. Tal era a intenção de Davi em não perm itir-se provar o pão deli cado, nem beber vinho, nem com er carne. Vamos em frente: 4 E n o d ia v in te e q uatro d o p rim eiro m ês. eu e sta v a à m a rg e m d o g ra n d e rio H idekel. 4 D ie v icessim a q u a rta m ensis prim i, ego fui su p e r ripam fluvii m gni. n em pe H id e k c l.117 Daniel então narra a aceitação de suas orações, porque o anjo apareceu e o instruiu sobre a futura condição da Igreja. Sem a m ais leve dúvida, o jejum já descrito foi um a preparação para a oração, com o já afirm am os antes, e com o podem os deduzir de muitas passagens da Escritura, especialm ente da afirm ação de Cristo, onde ele diz que os dem ônios não podem ser expulsos senão por meio de oração e jejum [Mt 17.21]. D aniel, pois, não se absteve de todo alim ento e vinho e faustos com vistas a produ zir algum a obediência a Deus, m as para testificar de sua própria tristeza; então sentiu-se ansioso em estim ular-se à oração e por essa m arca de humildade preparar-se bem m ais adequadam ente para o arrependim ento. D iz ele então: E no d ia v in te e q u a tro d o p rim e iro m ês - significando março, o prim eiro m ês do ano judaico - , eu estava à margem do grande rio, a saber, o Tigre. A palavra T ',y id , é m etaforicam ente usada para margem, e os intér pretes concordam em identificar H idekel com o Tigre. Os geó grafos afirm am que o nom e desse rio se deve a alguns lugares, l!’ O pronom e dem onstrativo é aqui usado na função de explicação. 283 [10.5, 6] D A N IE L especialm ente perto de suas fontes, D igliton, que corresponde ao nom e hebraico com um Hidekel. Sem dúvida, esse rio é cham ado Pison, por M oisés, visto o Tigre ter três nom es entre as nações profanas. Seu nom e usual é Tigre, e num a parte de seu curso ele veio a ser o Hidekel, e recebe tam bém os nomes de Pasitigris e Phasis, os quais são equivalentes a Pison. O profeta relata que fic o u em p é na margem desse grande rio. É incerto se ele estava então naquela parte do mundo, ou se D eus pôs diante dele o pros pecto do rio, com o já vim os em outra parte. Sinto-m e m uito in clinado à opinião de que ele foi arrebatado no espírito profético, obtendo assim a visão do rio, e não que ele estivesse realmente ali. Possivelm ente, aquela província fora posta sob seu governo no curso das grandes m udanças que ocorreram naqueles tempos. Enquanto Belsazar ainda vivia, ele não poderia ter estado em Susã, e assim fom os com pelidos a explicar sua linguagem anterior no sentido de êxtase profético. E quanto à presente passagem , não questionarei com a opinião de alguém que porventura suponha que D aniel estava residindo naquele distrito; porém , com o afir mei antes, penso ser mais provável que esse espetáculo fosse ofe recido ao santo profeta quando se achava distante d a m argem do rio, e só foi capaz de vê-lo em espírito. E bem provável que no início desse m ês ele tenha conectado sua abstinência de carne, de refeição e todas as viandas aprazíveis, e então relaxou seu jejum por três semanas, visto ele aqui m arcar a data no dia vinte e qua tro. Deixo, porém , isso suspenso ante a im possibilidade de averi guar o ponto com precisão. Vamos em frente agora: 5 E n tão ergui m eus olhos, e olhei, e eis c erto h o m em vestido de linho, c u jo s lom b os e ram cingidos com ouro fino d e U faz; 5 E t levavi o c u lo s m eos, e t vidi, e t ecce vir unus ín d u tu s lineis, vestibus scilicei, e t lum bí ejus accincti a u ro U phaz. 6 S eu co rp o tam bém era com o o berilo, e seu rosto tin h a a aparência d e relâm pago. e seus o lh o s co m o tochas d e fogo, e seus b ra ç o s e seus pés brilhavam c o m o bronze 6 E t corpus ejus sicu t th arsis, e t fcies ejus quasi aspectus fulguris, e t oculi e ju s quasi lam pades ignis: e t brachia ejus, e t pedes ejus quasi conspectus * r is p o liti,1” ' Alguns traduzem bronze ardente. 284 5 3* EX P O SIÇ Ã O polido, e a voz d c suas palavras co m o a voz d e um a m ultidão. [10.5, 6] e t vox srm onum e ju s q u asi vox m ultitud in is .lív Q uanto à palavra Ufaz, há quem pensa ser um a pérola ou p e dra preciosa, e tom am a palavra OrD, kethem , que a precede, por ouro puro. Outros tom am ufaz adjetivam ente por ouro puro. Não creio ser ela um epíteto; antes, porém , subscrevo o ponto de vista dos que a entendem com o sendo o nom e próprio de um lugar, porque este ponto de vista está em harm onia com a fraseologia do décim o capítulo de Jerem ias. H á outra opinião que é im pró pria. D iz-se que Ufaz deriva-se do substantivo Phas, e é denom i nado ‘puro’, sendo a letra a le f redundante. A passagem supraci tada de Jerem ias é suficiente para provar m inha afirm ação de que ela significa certa região; e assim alguns a têm traduzido p o r ofir. Imagina-se que a palavra UTUHn, tharsis, significa crisólito. A l guns crêem que ela denota a cor do mar, e então, por m eio de um a figura de linguagem, tom am-na geralmente por qualquer mar. D iz-se tam bém que a m esm a significa céu colorido. Daniel então passa a relatar a m aneira com o a visão lhe foi apresentada. D iz ele que, quando ficou em pé na margem do rio, um homem lhe apareceu, diferente da ordem com um dos homens. Ele o cham a um homem, porém o retrata com o vestido ou ador nado com atributos que inspiram plena confiança em sua glória celestial. Em outro lugar declaram os com o os anjos são cham a dos hom ens sempre que D eus queria apresentá-los nesta form a externa. O título hom ens é, portanto, usado metaforicamente sem pre que eles assumiam essa form a em obediência à ordem divina, e agora D aniel fala segundo o modo costum eiro. Entrem entes, há quem absurdam ente im agina os anjos com o sendo realm ente ho mens, posto que assum iam essa aparência, e eram vestidos com um corpo humano. N ão precisam os crer que fossem realm ente homens, só porque apareciam sob um a form a humana. Aliás, líu Alguns tomam yw n. chemon, por ruído ou tumulto. 285 [10.5, 6] D A N IE L C risto era realmente homem em conseqüência de sua origem da sem ente de Abraão, Davi e Adão. M as com respeito aos anjos, D eus os veste com corpos por um único dia ou um curto período, com um propósito distinto e um uso específico. Portanto acuso o erro grosseiro daqueles que supõem que os anjos se transform am em hom ens, ao ponto de se tornarem fisicam ente visíveis num a form a humana. Todavia podem ser denom inados hom ens, por que as Escrituras se acom odam a nossos sentidos, com o o sabe m os suficientem ente bem. Portanto, D aniel afirma: eu vi um hom em \ e em seguida o distingue da raça hum ana, e m ostra marcas fixas e conspícuas inscritas nele, as quais o identificam com o sendo um anjo enviado do céu e não um mero m ortal terreno. A lguns filosofam com sutileza sobre a palavra ergueu, com o se D aniel erguesse assim seus olhos para o alto em um ato de impercepção de todos os objetos terrenos; m as isso não me parece suficientem ente certo. O profeta deseja im prim ir a infalibilidade da visão; sua mente estava não só calm a e recolhida, m as aplica va todos seus sentidos ao único objeto diante de si - a obtenção de algum a consolação proveniente de Deus. O profeta, pois, de nota a sinceridade de seu desejo, pois, quando olhou ao redor, percebeu estar sujeito a m uitos cuidados e ansiedades. Além dis so, com referência às marcas pelas quais Daniel poderia inferir que o objeto de sua visão não era nem terreno nem mortal, pri m eiro ele diz: e stav a vestido d e linho. Esse tipo de vestim enta era bastante com um entre o povo oriental. Essas regiões são no tavelm ente quentes, e seus habitantes não necessitam de prote ger-se contra o frio, com o somos necessariam ente com pelidos a assim agir. Raram ente usavam roupas de lã. M as, em ocasiões especiais, quando queriam usar roupas m ais esplêndidas, vesti am túnicas de linho, com o descobrim os não só à luz de muitas passagens da Escritura, m as tam bém de escritores profanos. D aí tom ar eu esta passagem com o se Daniel dissesse: o hom em me apareceu com aparência esplêndida. Pois supõe-se que □ '1 3 , be286 5 3 a EX P O SIÇ Ã O [10.5, 6] dim , não significa linho com um , mas um tipo de produto mais requintado. Este é um ponto. Em seguida, ele diz: Ele estav a cin g id o co m o u ro p u ro ; ou, seja, com um cinto de ouro. Os orientais antigam ente costum a vam cingir-se com cintos ou faixas, quando seus vestidos eram longos e chegavam aos pés. D aí tornar-se necessário, para quem quisesse m over-se diligentemente, o uso de cintos. Quando o anjo apareceu com atavios desse gênero, o profeta vê exibida diante de seus olhos a diferença entre o anjo e os dem ais homens. Há quem vê na roupa de linho o sacerdócio de Cristo, e trata o cinto com o um em blem a de vigor. Tais idéias, porém, são meros refi nam entos, e parecem -m e destituídas de toda realidade. Portanto, contento-m e com a sim ples opinião sobre a qual tenho feito m en ção, a saber, essa form a de roupa distinguia o anjo dos mortais ordinários. M as isso parecerá mais claro à luz do versículo se guinte. Pois Daniel diz: S eu co rp o tin h a as cores d o céu, ou com o a pedra preciosa cham ada berilo, de um matiz dourado. Sem dúvida, o profeta via algo diferente de um a form a humana, com vistas a averiguar claram ente que a visão não era de um hom em , m as de um anjo na form a humana. D eixo a alegoria nes te ponto, ainda que ela prossiga através de todo o versículo. Es tou ciente da natureza plausível das alegorias, m as quando reve rentem ente com param os os ensinos do Espírito Santo, essas es peculações que a princípio nos agradavam excessivam ente à vis ta se desvanecem diante de nossos olhos. Não me deixo cativar por essas seduções, e gostaria que todos m eus ouvintes se dei xassem persuadir deste fato: não há nada m elhor do que um tra tam ento sóbrio da Escritura. Não devem os jam ais esboçar à dis tância explicações sutis, porquanto o sentido genuíno, com o pre viamente expressam os, flui naturalmente de um a passagem quan do ela é pesada com deliberação mais madura. D iz ele: S eu rosto tin h a a a p a rê n c ia d e relâm p ag o . U m a vez mais isso elucidava ao profeta que o anjo era m ais que um m ero mortal terreno. Seus 287 (10.7) D A N IE L olhos levam à m esm a conclusão: eram com o to ch as d e fogo; então, seus b ra ç o s e seus pés b rilh a v a m com o b ro n ze polido o u a rd e n te ; por últim o, a voz d e suas p a la v ra s e r a a voz d e um tu m u lto , ou estrondo, ou multidão. A sum a de tudo isso é: o anjo, ainda que revestido da form a hum ana, possuía certas m ar cas conspícuas pelas quais D eus o separou da m ultidão com um dos homens. Assim D aniel claram ente percebeu a m issão divina do anjo, e D eus quis estabelecer a fidedignidade e infalibilidade das profecias que m ais tarde virão a lume no capítulo 11. Vamos em frente: 7 E eu, D aniel, fu i o ú n ico a ver a visão; porque os hom ens q u e estavam c o m ig o não viram a visão; p orém lh e s so b re v e io um grande tre m o r, de tal m aneira q ue fu- 7 E t vidi e g o D aniel solus visio n em , e t viri qui eram m ecum , non v id e r u n t visionem , im o linte !T o rm a g n u s irru it super eos. e t fugerunt in iate b ra s.1” giram c se esconderam . Ele dá seqüência a sua própria narrativa na qual aparenta pro lixidade, mas não propositadam ente. Esta profecia dem andava todos os tipos de sanção com o propósito de inspirar inabalável confiança nela, não só por parte dos judeus daquela geração, mas por parte de toda sua posteridade. Em bora as predições do capí tulo 11 já houvessem se cum prido, todavia sua utilidade nos é m anifesta, com o segue: prim eiro, divisam os nelas o perpétuo cuidado de Deus por sua Igreja; segundo, observam os que os san tos nunca são deixados ao léu sem suficiente consolação; e, ter ceiro, percebem os, com o num espelho ou num quadro vivo, o Espírito de Deus falando nos profetas, com o j á observei anterior m ente, e teremos ocasião de notar isso novamente. D aniel, pois, tem boas razões para im pressionar-nos com a infalibilidade da visão e com tudo quanto tende a com provar sua realidade. D iz ele: E u , D aniel, fui o ú nico a v er a visão; m as os ho13(1 A palavra b3N , abei. “porém ” é expressa d e m odo adversalivo; não è um a simples afirm ação. Literalmente, se esconderam. 288 53* EX P O SIÇ Ã O [10.7] m ens q ue estav am com igo n ã o a v iram . Justam ente com o os com panheiros de Paulo não ouviram a voz de Cristo, m as apenas um som confuso. Não entenderam sua linguagem , quando unica m ente a Paulo foi perm itido com preendê-la [At 9.7]. Isso é rela tado com o fim de prom over a confiança n a profecia. O poder que D aniel recebeu para ouvir não era superior ao de seus com panheiros, porém D eus tencionava dirigir-se somente a ele. A s sim a voz, ainda que sem elhante à voz de um a m ultidão, não penetrou nos ouvidos daqueles que estavam com ele. Tão-somente ele foi o receptor destas profecias, com o tam bém som ente ele foi revestido com o poder de predizer eventos futuros e de consolar e exortar os santos, dando-lhes o conhecim ento do que sucederá no últim o dia. A qualquer um que inquirir com o ele levou consi go seus com panheiros enquanto provavelm ente estava deitado em seu leito a longa distância da m argem do rio, a resposta não é difícil. Ele tinha seus dom ésticos a seu lado; a margem do rio só existia na visão; ele estava com pletam ente fora de si, e assim sua fam ília estaria fam iliarizada com o êxtase sem estar ciente da causa. Daniel, pois, continuou em seu próprio lar, e visitou sozi nho a m argem do rio durante a visão; em bora muitas testem u nhas estivessem presentes, D eus chocou a todos com profunda perplexidade, enquanto D aniel sozinho percebeu o que m ais tar de narrou. Deus o considerou digno dessa honra singular, capaci tando-o a tornar-se m estre e instrutor de outros. O s h o m en s q u e estav a m com igo, diz ele, n ã o v ira m a visão; p o ré m ap o d ero u se deles u m g ra n d e te rr o r . E sta distinção, com o já afirm ei, m ostra que Daniel fora escolhido com o o único ouvinte da voz do anjo e com o receptor da inform ação que m ais tarde foi trans m itida a outros. Entrem entes, a intenção divina era que muitas testemunhas notassem em Daniel a total isenção de qualquer frau de, seja por m eio de sonho ou por meio de im aginação m om entâ nea. Seus com panheiros, pois, fica ra m apavorados. Tal terror prova que o profeta fora divinam ente instruído e que não havia 289 [10.8] D A N IE L laborado sob algum delírio. Portanto, fu g ira m em b u sca d e es c o n d erijo . Sigam os em frente: 8 P ortanto, fui d eix ad o sozinho a contem p la r e sta g ra n d e visão, e ali fiquei sem força em m im ; pois m inha aparência transm u d o u -se em c orrupção, e não retive n enh u m a força. 8 E t ego relictus fui soius, e t vidi visionem m agnam h anc, e t non fuit residuum in m e ro b u r,l5! atq u e etiam d e c o r1” m eus eversus fuit su p er m e, in me, a d c orruptio n em ,1“ e t non retinui vigorem . Toda esta linguagem pende p ara o m esm o propósito - assegurar-nos de que Daniel não escreveu seus próprios com entários com precipitação, m as que fora verdadeira e claram ente instruí do pelo anjo sobre todos os pontos que lhe foram confiados a escrever, e assim toda hesitação é rem ovida ao ponto de abraçar mos aquilo que m ais tarde perceberem os, sendo ele um fiel intér prete de Deus. Prim eiro ele declara: vi u m a visão. Ele havia ex presso assim antes, m as o reitera com o intuito de produzir um a adequada impressão; cham a a visão g ra n d e a fim de despertar nossa atenção para sua im portância. E acrescenta: vi-m e p riv a d o d e to d o vigor; com o se o sopro do Espírito lhe restituísse a vida que havia expirada. Assim deduzim os o objetivo da exibi ção de todos esses sinais externos: não só põem D eus diante de nós falando pela boca de seu anjo, m as prepararam o próprio pro feta e o treinaram para a reverência. Deus, contudo, não terrifica seus filhos, com o se nossa inquietação fosse para ele um objeto de deleite, m as unicam ente porque isso nos é proveitoso; pois a m enos que nossos sentimentos carnais sejam totalm ente subju gados, jam ais nos tom am os aptos a receber m elhoram ento. Isso necessariam ente requer violência, em virtude de nossa inerente perversidade; e esta é a razão por que o profeta ficou reduzido a este estado de desfalecim ento. Até m esm o m inha fisionom ia, ou beleza, ou aparência foi transm udada em corrupção; significan do: m inha deform idade era sem elhante àquela induzida pela 112 Ou, nenhum vigor foi deixado em mim. 1,1 Literalmente, e aparência. IU Ou, seja. em desvanecimento. 290 53® EX P O SIÇ Ã O [10.8] morte. Finalm ente, ele acrescenta: n ã o retiv e m eu vigor. Ele usa um a variedade de frases com o fim de m ostrar-se deprim ido pelo sopro celestial, pois lhe restara apenas um a leve porção de vitali dade, e por m uito pouco fora preservado de m orte real. D evem os aprender a transferir esta instrução para nós m esm os, não pelo desvanecim ento de nosso vigor ou pela m udança de nossa apa rência sem pre que se nos dirige, m as m ediante o desvanecim ento de toda nossa resistência e de todo nosso orgulho e altivez, lance m o-nos prostrados aos pés de Deus. Finalm ente, nossa disposi ção carnal deve ser com pletam ente reduzida a nada, visto que real docilidade jam ais se verá em nós até que todos nossos senti dos sejam com pletam ente mortificados; pois nos é m ister ter sem pre em mente quão hostis à vontade de D eus são todos nossos pensam entos naturais. Deveríam os seguir em frente, porém não posso avançar mais hoje. Adiarei para am anhã meus com entári os aos próxim os versículos. ORAÇÃO Deus Todo-Poderoso, como outrora apareceste a Daniel, teu santo servo, e aos profetas, e p o r sua doutrina tornaram esplendente tua glória a nós nestes dias, concede-nos que reverentemente nos apro ximemos e a vejamos. Quando tivermos nos devotado inteiramente a ti, que todos esses mistérios, os quais te agradaste oferecer p o r meio de suas m ãos e labores, recebam de nós sua devida estima. Que nós mesmos nos prostremos e sejamos erguidos ao céu pela esperança e fé; quando nos prostrarmos diante de tua face, poderemos então conduzir-nos no mundo como num intervalo para tom ar-nos livres de todos os desejos e paixões depravados de nossa carne, e mentalmen te habitarmos o próprio céu. Então, p o r fim , sejamos arrebatados desta guerra terrena e cheguemos ao descanso celestial que para nós preparaste, através do mesmo Jesus Cristo nosso Senhor. Amém. 291 54a 9 T odavia ouvi o s o m d c suas palavras; e quando ouvi o som d e suas palavras, então c a í sobre m eu rosto em profundo sono, com m eu ro sto em terra. 9 E ta u d iv i v o c e m se rm o n u m e ju s .e tc u m audirem v ocem serm o n u m ejus, tunc ego fui sopitus su p er faciem m ea m .1” e t fáci es m ea in terram , projecta fu ii scilicel. 10 E eis que c erta m ão m e tocou, a qual m e pôs so b re m e u s jo e ih o s e so b re as p aim as d e m inhas m ãos. 10 Et ecc e m anus tetigit m e ,13'1e t m overe m e fecit s u p e rg e n u a m ea. e t palm as, aut volas, m anuum m earum . N a exposição de ontem D aniel confessou-se atônito à vista do anjo, e sentiu-se destituído de toda sua força. Em seguida ele acrescenta: Ao o u v ir o som d e su as p a la v ra s, a rro je i-m e ao chão. Pois este é o sentido do nono versículo, com o acabam os de ler. Ele se descreve com o estando num estado de síncope e de inconsciência, o que geralmente ocorre quando nossos sentidos são paralisados por excesso de medo. Enquanto perm anecia as sim no chão, inconsciente, ele acrescenta: E is q u e u m a s m ãos m e to c a ra m e m e p u s e ra m so b re m eus jo e lh o s e a s p a lm a s d e m in h as m ãos. Ele faz m enção de ser parcialm ente erguido pelo anjo, não só através do som de sua voz, mas tam bém pelo toque de sua mão. Sua intenção é dizer que não estava ainda totalm ente erguido, nem em pé e nem assentado; sim plesm ente fora posto sobre seus joelhos e suas mãos, apoiados no chão, sendo tal pos tura sinal de seu abatimento. E assim parcialm ente sentiu alento em si e já o medo não se apoderava de su a m ente nem de seus 1,5 Ou. seja. caí sobre meu rosto com o que adormecido. 156 Tocou em mim; mas a □, beth, é supérflua. 292 54* EX P O SIÇ Ã O [10.11] lombos. À luz desta passagem é bom aprenderm os que, quando somos prostrados pela voz de Deus, não h á com o serm os restau rados senão por sua própria força. A menos que D eus m esm o nos estenda sua m ão, sem pre havem os de m anter a aparência de m or tos. E sta é um a lição. Em seguida o profeta adiciona o discurso do anjo dirigido a ele: 1 1 E ele m e disse: Ó D aniel, hom em m uitíssim o am ado, e n ten d e a s palavras que eu te falo. e põe-te ereto, porque a ti sou enviado. E assim que e le m e falou essas palavras, levantei-m e trem endo. 11 E t loquutus est ad m e. D aniel vir dsid e n o ru m intellige. aiienius sis, a d verba q u * loquor tecum e t esta su p er staretuum ; q u ia nunc m issu s sum a d te. E t cum loq u eretu rm ecu m sem ionem hunc, steti trem ens, vel, trepidus. Ele aqui relata com o fora fortalecido pela exortação do anjo. E ntão com eça a erguer-se de sua posição anterior, e o anjo então lhe ordena que recobrasse o ânimo, e o cham a h o m em m u itíssi m o am ad o . Já discutim os previam ente sobre esta expressão, a qual é atribuída por alguns ao zelo de D aniel e a tom am passiva m ente, porque ele foi inspirado p o r um ardor m ui invencível de vido sua ansiedade pelo bem -estar com um d a Igreja. Sou mais inclinado ao ponto de vista oposto, crendo que ele foi assim cha mado pelo vigor de seus desejos, porquanto era mui querido e precioso a Deus. Por esse epíteto o anjo desejava anim ar o santo profeta e acalm ar e aquietar sua mente, levando-o a ouvir aquilo que tão ardentem ente esperava. Portanto, en ten d e, diz ele, ou atenta para as p a la v ra s q u e te fala rei, e põe-te ereto . A lguns o traduzem em tua posição, porém 'posição’ não se refere à posi ção do corpo. Eu já m ostrei com o o profeta não estava agora totalm ente prostrado; seu rosto estava voltado para o chão, en quanto se apoiava em suas mãos e joelhos; e então percebem os que ele passa a outro estágio. Esta doutrina nos é proveitosa, porque m uitos pensam em si com o sendo com pletam ente negligenciados e abandonados por Deus, a não ser que im ediatam ente recubram seu vigor mental. Deus, porém , nem sem pre restaura im ediatam ente à vida aqueles 293 [10.12] D A N IE L a quem reduziu totalm ente à inércia, m as lhes com unica nova vida gradualmente, e inspira os m ortos com ânim o fresco. Perce bem os que esse foi precisamente o caso de Daniel. Portanto, nunca fico surpreso quando Deus nos soergue gradualm ente p o r m eio de passos lentos e distintos, e cura nossa enferm idade aos pou cos; m as se ainda quando um a única gota de sua virtude nos é concedida, então que nos contentem os com essa consolação até que ele com plete em nós o que havia com eçado. Finalm ente, esta passagem nos revela com o Deus opera em seus servos, não os tom ando perfeitos de um a só vez, m as perm itindo que algum a debilidade perm aneça até que sua própria obra esteja completa. Em seguida Daniel acrescenta: Q u a n d o ouvi esse d iscu rso , p u s-m e d e pé. Aqui observamos o efeito e fruto da exortação angélica, visto que D aniel não mais carecia de apoiar-se em suas m ãos e joelhos. Ele pôde ficar ereto, em bora acrescente: p e r m a neci trem en d o . Em bora assim ereto no corpo, não estava inteira m ente isento dos sentim entos íntimos de terror; e, ainda que se firm asse sobre seus pés, ele ainda não se sentia isento de toda perturbação, m esm o ante a ordem angelical. Isso confirm a mi nha observação prévia - D eus deixa em seus servos alguns sinais de tem or com o fim de cientificá-los de sua debilidade; aventuram -se a pôr-se de pé acima do mundo, m ovidos pela esperança, porém não olvidam que não passam de pó e cinza, e assim se conservam dentro dos limites da hum ildade e da modéstia. Siga m os em frente: 12 E n tâ o e le m e disse: N ão tem as. D am cl; porque desd e o prim eiro d ia em que aplicaste teu coração a com preender, e te hum ilhasie d iam e de teu D eus, tuas palav ra s foram ouvidas, e e u vim por causa d e tuas palavras. 1 2 E td ix it a d m e, N e tim eas D aniel, quia a d ie p rim o quo adjecisti c o r tuum ad intelligendum . e t affligendum te. vei, humiliandum, c o ram facie D ei tu i, e x au d ita sunt verba tua: et ego veni in verbis tuis, hoc esl, propler verba tua. À luz da ordem do anjo para que o profeta recobrasse a sere nidade e tranqüilidade da alma, deduzimos que o terror e o senso o faziam ainda incapaz de ouvir com equilíbrio. E não obstante 294 54* EX P O SIÇ Ã O [10.12] esse trem or desenvolveu seu aprendizado. Sem a m ais leve dúvi da, Deus queria preparar seu servo e assim torná-lo m ais atento a suas disciplinas, e contudo esse m esm o terror im pedia Daniel de concentrar todos seus sentidos para ouvir o discurso do anjo. O rem édio é exibido nestes termos: Ó D aniel, n ã o tem as. O intuito do anjo não era rem over da mente de Daniel todo temor, mas, antes, acalm á-la a fim de que seu trem or não o im pedisse de pres tar a devida atenção às profecias que logo discutirem os. Eu já disse bastante sobre o tem a desse discurso. Visto Deus saber que o tem or nos é proveitoso, ele não quer que vivam os totalm ente livres dele, porquanto dem asiada autoconfiança produziria im e diatas indolência e soberba. Deus, pois, quer que nosso tem or seja restringido com o que por um freio, mas, entrem entes, m ode ra esse tem or em seus servos para que suas mentes não perm ane çam estrem ecidas e perturbadas, e assim incapacitadas de ter-lhe acesso com tranqüilidade. O anjo acrescenta: D esde o p rim e iro d ia e m q u e com eçaste a a p lic a r tu a m en te a co m p reen d er, e a aflig ir-te d ia n te de D eus, tu a s o raçõ es fo ra m ouvidas. E sta razão m ostra suficien tem ente em que sentido e com que intenção o anjo vetou os te m ores do profeta: porque, diz ele, tuas orações fo ra m ouvidas. Ele não pretendia banir todo o temor, m as lhe ofereceu alguma esperança e consolação; e confiando nessa expectativa ele pode ria esperar pela revelação que tão ansiosam ente desejara. Ele de clara que suas orações fo ra m ouvidas desde o m om ento em que aplicara sua mente a compreender, e desde que se afligira diante de Deus. É preciso observar estes dois pontos: prim eiro, pela palavra ‘com preender’ o anjo nos inform a que D eus se fez propí cio às orações de seu servo, porque eram sinceras e legítimas. Que espetáculo Daniel contem plava! Ele via a condição da Igreja que era totalm ente confusa, e anelava pela com unicação de al gum sinal de favor que lhe assegurasse que D eus de fato ainda não invalidara seu pacto e que não havia ainda desprezado aque295 [ 10 . 12 ] D A N IE L les desventurados israelitas que outrora adotara. V isto que este era o objetivo da oração do profeta, ele então foi atendido em sua súplica e o anjo testifica de sua oração diante de Deus. Somos instruídos, pois, por esta passagem a não ficarm os ansiosos de ver nossas súplicas sendo ouvidas e aprovadas por Deus, a não dar vazão aos apetites e desejos tolos, os quais nos atraem e nos seduzem. D evem os observar a regra aqui prescrita pelo anjo e elaborar nossas súplicas de acordo com a vontade de Deus. Sabe mos, diz João, que se pedirm os algum a coisa segundo sua vonta de, ele nos ouvirá [lJ o 5.14], Este é o prim eiro ponto. O segundo é a adição de penitência fervorosa e devota, quando o anjo diz: e te afligiste ou te hum ilhaste diante de Deus. U m a segunda condi ção d a oração genuína é aqui posta diante de nós, a saber, quando os fiéis se hum ilham diante de D eus e, sendo tocados de genuína penitência, derram am seus gem idos diante dele. O anjo, pois, m ostra com o D aniel foi atendido em suas súplicas, afligindo-se profundam ente diante de Deus. Ele não form ulara orações em favor da Igreja de um a maneira m eram ente formal, mas, com o já vim os previam ente, associou jejum e súplica e se absteve de to dos os manjares. Por essa razão D eus não rejeitou suas petições. D iz ele: diante de teu Deus. Esta expressão do anjo im plica que a súplica do profeta fluiu de fé genuína. A s orações dos ímpios, em contrapartida, sem pre repelem o Todo-Poderoso, e jam ais lhes asseguram de ser-lhes ele propício. Em decorrência da hesitação e vacilação dos incrédulos, é posto diante de Daniel este teste m unho da verdadeira fé: ele orou a seu próprio Deus. Q uem quer que se aproxim e de Deus, diz o apóstolo [Hb 11.6], é preciso reconhecer sua existência e de que ele é achado por todos quan tos o buscam e o invocam. Devem os diligentem ente notar isto, um a vez que esta falha se m anifesta sobejam ente em todas as épocas - os homens am iúde oram a Deus, m as devido a sua hesi tação derram am suas petições no vazio. N ão apreendem a Deus com o seu Pai. Outra passagem que tam bém nos lem bra quão inú 296 5 4 " EX P O SIÇ Ã O [10.13] teis é a esperança de se obter algo por m eio d a oração é quando nos agitamos e gravitamos em nossas em oções [Tg 1.6, 7]. A m enos que a fé prevaleça, não nos surpreende se porventura os que invocam a D eus percam todo seu labor pela profanação de seu nome. Finalmente, com esta expressão o anjo nos mostra como a oração de D aniel estava fundada na fé; ele não buscou a Deus tem erariam ente, mas estava claram ente persuadido de estar arro lado entre os filhos de Deus. Ele orou, pois, a seu próprio Deus, e por essa razão suas petições foram ouvidas. Então se acrescen ta que o anjo veio p o r causa das palavras de D aniel; com o está registrado nos Salm os [SI 145.19], D eus se inclina obsequioso por atender os que o temem; e nesse sentido o anjo visita Daniel. Sigam os em frente: 13 M as o príncipe do reino d a P érsia m e resistiu vinte e um dias; contudo eis que M iguel, u m dos p rim eiros prín cip es, v eio ajudar-m e; e e u perm aneci ali c o m o s reis d a P érsia. 13 E t P rinceps regni P ersarum stetit coram m e, vel, e regione, viginti diebus et uno. E t ecc e M ichael unus p re c ip u m p rim orum ’” venit ad o pem ferendam m ihi,1“ e t ego resid u u s159 fui a p u d reges P ersa rum , vet, Persidis. Então o anjo assinala um a razão p o r que não apareceu repen tina e im ediatam ente ao profeta, que poderia queixar-se assim: “Q ue tratam ento é esse que tenho de enfrentar, fazendo-m e con sum ir de tristeza por um período tão longo?" Porquanto Daniel havia perm anecido durante três sem anas sucessivas na m ais se vera aflição. N a verdade Deus o ouvira desde o prim eiro dia; com o, pois, era possível que ele ainda ficasse a olhar para esse desventurado homem assim prostrado de m odo tão soturno? Por que D eus não apareceu aberta e realm ente p ara que sua oração não fosse sem efeito? O anjo então satisfaz essa objeção, e m os tra com o estivera ocupado em prom over o bem -estar do profeta. E preciso notar esse fato com m uito critério, porque a delonga m O u, seja, um dos principais líderes. Ou, fortalecer-me. 159 Ou, seja, fui deixado. 2 97 [10.13J DANIEL am iúde nos perturba, quando D eus não estende seu socorro im e diatam ente, e por um longo tem po oculta de nós o fruto de nossas orações. Sem pre que nossas paixões explodem com forte im pe tuosidade, e facilm ente manifestam os sinais de im paciência, de vem os notar esta expressão do anjo, porque nossas orações po deriam ser prontam ente ouvidas, enquanto o favor e a m ercê di vinos continuam ocultos de nós. A experiência de Daniel é p le nam ente concretizada em cada m em bro da Igreja, e sem a mais leve dúvida a m esm a disciplina é exercida na vida de todos os santos. Esta é nossa reflexão prática. Em segundo lugar devem os notar a condescendência divina em dignar-se a explicar a seu pró prio profeta pelos lábios do anjo. Ele oferece um a razão para a delonga do regresso do anjo, e a causa desse obstáculo consistiu, com o já declarei, em levar ele em conta a segurança de seu povo eleito. A m aravilhosa clem ência do Todo-Poderoso é aqui prova da por tão graciosam ente oferecer justificativa a seu profeta, por que ele se revela diariam ente disposto a receber as orações que lhe são oferecidas. Devem os, porém , extrair d a passagem um benefício prático: D eus não cessa de olhar com favor mesmo quando ele não se agrade de tornar-nos cônscios dele, pois nem sem pre ele o põe diante de nossos olhos; antes, às vezes o m an tém oculto de nossa vista. Inferim os disto a constante preocupa ção de D eus por nossa segurança, ainda que não a exiba exata mente da m aneira que nossas mentes possam conceber e com preender. D eus excede toda nossa com preensão na m aneira com o ele provê nossa segurança, visto que o anjo aqui relata sua m is são em m uitas outras direções, e todavia sem pre no serviço da Igreja. E agora se m ostra com o D aniel obteve resposta a suas orações desde o prim eiro dia de seu oferecim ento, e todavia per m aneceu inconsciente dela até que Deus lhe enviou algum a con solação em m eio a suas tribulações. Tem-se proposto um a inter pretação m uito difícil deste versículo, pois alguns expositores pensam que o anjo foi enviado à Pérsia para proteger aquele rei298 54* EX P O SIÇ Ã O [10.13] no. Existe algum a probabilidade nessa explicação, e D eus pode ria ter fornecido algum a assistência aos reis da Pérsia por am or a seu próprio povo. Penso, porém , que o anjo se pôs em direto conflito e oposição a Cam byses com o intuito de im pedi-lo de insurgir-se com mais ferocidade contra o povo de Deus. Ele pro m ulgara um édito cruel, im pedindo os judeus de edificar seu tem plo e m anifestando plena hostilidade a sua restauração. P or certo não teria ele ficado satisfeito com esse rigoroso tratam ento, não houvera Deus restringido sua crueldade pela instrum entalidade e m ão do anjo. Se pesarm os essas palavras judiciosam ente, concluirem os prontam ente que o anjo lutou m ais contra o rei dos persas do que em seu favor. O p rín cip e, diz ele, d o rein o dos p ersas, signifi cando Cam byses, com Ciro seu pai, que cruzou o m ar e conten deu com os citas, bem com o com a Á sia Menor. O príncipe do reino da Pérsia estava furioso contra ele, com o havia dito: Ele me deteve de chegar a ti, porém foi para o bem de tu a raça; pois não houvera Deus me usado para dar-te assistência, e sua crueldade se teria agravado e tua condição teria sido totalm ente irrem ediá vel. D eves perceber, pois, que não houve de m inha parte carência de zelo, porque Deus nunca se fez surdo a tuas súplicas. O p rín cipe do reino dos persas se p ô s contra mim p o r vinte e um dias, significando: desde o período em que com eçaste a apresentar tuas orações diante de Deus, nunca recuei de nenhum ataque ou assal to com o fim de defender teu povo. O príncipe do reino dos p er sas se p ô s contra mim\ significando que irou-se de tal form a con tra os israelitas ao ponto de derram ar a própria borra incandes cente de sua ira, a m enos que eu interferisse com o auxílio divino que vim oferecer-te. Ele acrescenta: E is q u e M iguel, u m dos p rin c ip a is líderes ou p rín cip es, veio fo rtalecer-m e. H á quem pensa que a palavra M iguel representa Cristo, e não faço objeção a essa opinião. Evi dentem ente, é suficiente que todos os anjos m antenham vigilân 299 [10.13] DANIEL cia sobre os fiéis e eleitos, em bora Cristo m antenha a prim eira posição entre eles, um a vez que ele é seu chefe e usa seu m inisté rio e assistência em defesa de todo seu povo. Visto, porém , que isso não é geralmente adm itido, deixo-o em suspenso por en quanto, e direi algo mais sobre o assunto no capítulo 12. À luz dessa passagem podem os deduzir claram ente a seguinte conclu são: os anjos lutam pela Igreja de Deus, tanto de form a geral quanto em favor de membros particulares, sem pre que seu auxí lio se faça necessário. Sabem os ser esta um a parte da ocupação dos anjos, que protegem os fiéis segundo o Salm o 34 [v. 8]. Eles dem arcam seu acam pam ento ao redor destes. Deus, pois, estabe lece seus anjos contra todas as atividades de Satanás e contra toda a fúria dos ím pios que desejam destruir-nos e estão sempre tram ando nossa com pleta ruína. Se D eus não nos protegesse des sa m aneira, seríam os totalm ente destruídos. Estam os cientes do horrível ódio que Satanás nutre por nós e da poderosa fúria com que ele nos assalta; sabemos quão hábil e variadam ente são seus artifícios; o conhecem os com o o príncipe deste mundo, arrastan do e precipitando a m aior parte do gênero hum ano consigo, en quanto im piam ente derram a suas am eaças contra nós. O que im pede a Satanás de diariam ente sorver centenas de vezes toda a Igreja, quer coletivam ente, quer individualm ente? É óbvio que se faz necessário que D eus se oponha a sua fúria, e isso ele faz pela instrum entalidade dos anjos. Enquanto se põem a contender por nós e em prol de nossa segurança, não percebem os essa m a lícia secreta, porque eles a escondem de nós. A gora podem os analisar esta passagem um pouco m ais deta lhadamente. O anjo se estabelecera na Pérsia com o fim de repri m ir a audácia e crueldade de Cam byses, o qual não se contentara com um único édito, mas teria violentam ente arrastado um a vez m ais os desventurados israelitas a um novo exílio. E teria tido êxito, se antes disso um anjo, e então outro, não o tivessem en frentado. O anjo então nos inform a com o M iguel, um dos princi300 5 4* EX P O SIÇ Ã O [10.14] pais líderes, veio com os recursos necessários. A defesa de um anjo poderia ter sido suficiente, pois os anjos não têm m ais poder além daquele que lhes é conferido. Deus, porém , não se obriga ao uso de nenhum m eio particular; ele nunca está lim itado a um ou a mi); quando Josafá fala de um pequeno exército, então de clara: não im porta diante de D eus se tem os poucos ou muitos [2Cr 14.11; IS m 14.6]. Porquanto Deus pode salvar seu povo com um a pequena ou com um a poderosa força; e o m esm o vale também no tocante aos anjos. Deus, porém, está ansioso por atestar o cuidado que ele dispensa em benefício de seu povo, bem como sua singular benignidade para com os israelitas exibida na m is são de um segundo anjo. Ele duplicou seu em penho em dar teste m unho de seu am or por estes m iseráveis e inocentes, os quais eram oprim idos pelas calam idades provenientes de seus inim i gos e pela tirania daquele rei ímpio. Finalm ente, o anjo diz que foi deixado entre os reis persas, com o expresso propósito de rem over os num erosos obstáculos postos no cam inho do povo escolhido; pois, a menos que D eus repelisse aquele arsenal de armas com seu próprio escudo, os judeus teriam sido sepultados ali mesmo. Vamos em frente: 14 A gora vim p ara fazer-te en ten d er o que so b re v irá a teu p o v o nos ú ltim o s dias; porque a visão é ain d a para m uitos d ias. 14 E t veni u t tibi pate fac e re m l40q u o d o c c u rre ip o p u lo tu o 111 in ex trem ita ted ie ru m , diebus postremis, quia adhuc visio ad dies. O anjo persiste no m esm o diapasão. D eclara que sua chegada tinha o propósito de predizer a D aniel acontecim entos futuros, bem com o aqueles que tinham um longo período de tem po pela frente. Ele prova ainda que as orações de Daniel não tinham caí do no vazio nem sido infrutíferas, um a vez que produziram este conflito com os reis da Pérsia, tanto com o pai quanto com o filho. Ele agora apresenta outra prova desse fato, porque Deus queria que seu profeta fosse instruído a aguardar pacientem ente a 140 Para fazer-te entender. 141 Ou, seja. o que acontecerá a teu povo. 301 [10.14] DANIEL chegada dos acontecim entos, depois de estar plenam ente ciente de que o povo eleito estaria sob o cuidado e proteção de Deus. Isso ele de bom grado reconheceria à luz das profecias do próxi mo capítulo. Em seguida acrescenta: no fim dos d ias. Com esta expressão o anjo enaltece a graça de Deus em favor do profeta, já que ele era seu m inistro especial. Sua m issão era não só anunciar-lhe as ocorrências de três ou quatro anos, ou de algum outro breve período, m as estendera suas predições para muitos anos distantes, sim, até as extrem idades dos dias. De bom grado atri buo este período à renovação da Igreja que aconteceu no advento de Cristo. A s Escrituras, ao usarem a frase últimos dias, ou tem pos, sem pre apontam para a m anifestação de Cristo, p o r m eio da qual a face do m undo seria renovada. E exatam ente com o se o anjo dissesse que faria Daniel plenam ente fam iliarizado com to dos os eventos futuros, até a redenção final do povo, quando Cristo fosse exibido para a salvação de sua Igreja. D aí o anjo abranger os 490 anos dos quais se referiu. Pois o advento de Cristo deter m inou a plenitude dos tempos, e a razão anexada adequa a passa gem m uitíssim o bem. A visão é ainda para dias, diz e l e - é assim que alguns expositores tom am essas palavras. Sinto-m e persua dido de que a intenção do anjo era m ostrar com o Deus está agora publicando a seu servo eventos futuros, e assim essas profecias se tom am com o lâm pada a ilum inar a Igreja. Os fiéis se queixam no Salm o 74 [v. 9] da ausência de todos os sinais, porquanto não foi deixado um profeta sequer. N ão vemos sinais, dizem eles, nenhum profeta existe entre nós. Essa era um a indicação de os haver Deus rejeitado e abandonado. Por m ais esm aecida seja a luz de sua doutrina a brilhar sobre nós, o mais leve lam pejo deve ser suficiente para produzir paciência e repouso. M as quando toda a luz d a Palavra se extingue, é com o se fôssem os com pletam ente envolvidos por trevas tartáreas. Visto que os israelitas sofreram tantas aflições por quase 500 anos, este remédio deveria restaurá-los com pletam ente; pois quando o anjo testifica: a visão éa in 302 54* EX P O SIÇ Ã O [10.14] da para dias, sua intenção é dizer que, em bora Deus perm ita que seu povo seja m iseravelm ente afligido, todavia p o r esta m esm a prova ele m ostra que não desistira deles de um a vez por todas. Restou algum a visão, ou, seja: m ediante a luz da profecia, ele sem pre m anifestará seu cuidado por seu povo eleito, e podem ainda antecipar um feliz resultado de todos seus sofrimentos. A gora entendem os a intenção do anjo, quando diz: a visão é ain da para dias. A liás, as profecias cessaram logo depois, e Deus não m ais enviou outros profetas a seu povo; todavia seu ensino sempre perm aneceu perenem ente com o um dedo em riste, pois nele estava com pleta toda a série de tem pos até ao advento de Cristo. Seus filhos nunca foram destituídos de toda consolação necessária; pois em bora não houvesse profetas sobreviventes que pudessem instruir o povo nos m andam entos de Deus, a viva voz, todavia o ensino de Daniel vicejou por quase 500 anos depois de sua morte. Ele tam bém cum priu sua parte em nutrir a coragem dos santos e m ostrar-lhes a sólida firm eza do pacto divino não obstante toda oposição. Em bora a Igreja fosse agitada de inúm e ras m aneiras, todavia Deus é consistente em todas suas prom es sas, até que a redenção de seu povo esteja com pletada com Õ advento de seu Filho Unigénito. ORAÇÃO Deus Onipotente, visto a fragilidade de nossa f é ser de tal vulto que quase se desvanece em ocasião mais insignificante, concede-nos que não hesitemos extrair apoio deste extraordinário e memorável exem plo, o qual desejas propor-nos na pessoa de Daniel, ainda que por um tempo ocultaste de nós tua fa ce e nos puseste prostrados em den sas trevas. Não obstante, permaneces ju n to a nós; e com indubitável esperança podem os ser constantes em nossas orações e gemidos, até que, p o r fim , o fru to de nossas orações esteja sazonado. E assim podemos manter guerra constante com todos os tipos de provações e persistir invencíveis até que nos estendas do céu tua mão e nos rece bas naquele bendito descanso que fo i estabelecido para nós p o r Cristo nosso Senhor. Amém. 303 a 15 E q uando ele m e falou essas palavras. voitei m eu rosto p a ra o chão, e em udeci. 15 E t c u m lo q u eretu r m ecum secundum v erba haec, posui faciem m eam in terram , e to b m u tu i. C om estas palavras, a intenção de D aniel é que ele se vira tão inspirado pela reverência diante do anjo, que fora incapaz de per m anecer ereto. Isso tende a recom endar a profecia a nossa obser vação: mostrar-nos com o o santo profeta foi não só instruído pelo anjo, m as tam bém confirm ar o que logo em seguida registrará no capítulo 11, bem com o isentá-lo de toda dúvida. Por Fim, ele nos capacita a confiar nas palavras do anjo, as quais não foram pro nunciadas de um a form a ordinária, mas que eram tão divinas ao ponto de lançar D aniel de ponta cabeça ao chão. Em m eu juízo, os expositores da frase em udeci estão equivocados quando a en tendem no sentido em que o profeta se arrependeu de seu ofício profético, ao supor que suas orações não haviam sido levadas em conta. Isso é dem asiadam ente forçado, porque o profeta não ex pressa nada m ais senão que fora tom ado de medo, im pedindo tanto seus pés quanto sua língua de exercerem suas funções usu ais. E assim ele se sentiu com o que fora de si. A o lançar-se ao chão, m anifestou sua reverência; e ao em udecer, exibiu seu es panto. Já expliquei brevem ente o objetivo de todas essas afirm a ções: provar-nos com o o anjo estava adornado com seus atribu tos próprios e que se deve atribuir plena autoridade a suas pala vras. Prossigamos: 304 5 5 * EX P O SIÇ Ã O [10.16-18] 16 E eis q u e alguém , sem elhante aos filhos d os hom ens, tocou m eus lábios. E ntão abri m inha boca, e falei, e disse ao que se achava em p é diante d e m im : Senh o r m eu, por cau sa d a visão sobrevieram -m e dores, e não ficou nenhum a força em m im . 16 E t e cc e secundum sim ilitudinem filiorum h o m in is,142 tetig it labia m ea, e t aperui os m eu m , et loquutus sum : et dixi ad eum qui stabat ad conspecium m eu m ,145 D om ine, in visione co n v ersi sunt dolores m ei su p er m e. e t non continui robur. 17 C o m o , pois, p o d e o serv o d este m eu se n h o r fa la r c o m e ste m eu senhor? P orque, q uanto a m im , desd e a gora não reslou n enh um a força em m im , e nem fôlego restou em m im . 17 Et quom odo poterit servus D om ini mei h u ju s loqui c u m D o m in o m eo h o c ? El exinde non stetit in m e 1*4 robur; E t ani m a, húlitus, non fuil residuus im me. 18 E nião aquele que tinha aparência d e hom em , veio e tocou-m e o u tra vez, e m e fortaleceu. 18 E t a ddidit, hoc est, secundo, tetig it m e secundum sim ilitudinem 14* hom inis, e t re boravit me. Aqui Daniel narra com o o anjo que causou a ferida ao mesmo tem po trouxe o remédio. Em bora estivesse aterrado pelo medo, todavia o toque do anjo o soergueu, não porque houvesse algum a virtude no m ero toque, m as sabemos que o uso de sím bolos era sobejam ente estim ulado por Deus, com o já observam os previa mente. Assim o anjo ergueu o profeta não só por sua voz, mas tam bém por seu toque. D aí deduzirm os a natureza opressiva do terror proveniente da dificuldade com que foi despertado nele. Isso se deve atribuir a seu próprio fim, que era selar a profecia com o tim bre da autoridade e publicam ente proclam ar a missão divina a Daniel. Estam os cientes tam bém com o Satanás se trans form a em anjo de luz [2Co 11.14]; e daí Deus distinguir esta predição, por meio de marcas fixas, de todas as falácias de Sata nás. Finalm ente, através de todas essas circunstâncias o profeta m ostra ser Deus o A utor da profecia a ser enunciada m ais adian te, visto que o anjo trouxera consigo credenciais fidedignas, por m eio das quais ele granjeou para si favor e publicam ente autenti cou sua m issão a Daniel. Ele diz que o anjo apareceu na fo rm a de l4! Ou, seja. alguém vestido à m oda dos filhos dos homens. 141 Ou. seja. que ficou do lado oposto ou distante de mim. 144 Há no original pleonasm o das palavras “e eu", o que o idiom a latino não admite. 145 Ou, seja, alguém que assumiu uma aparência humana. 305 [10-16-18] DANIEL hom em , ou dos filhos do homem. Tudo indica que aqui eie está falando de outro anjo; m as à m edida que avançarm os percebere mos ser este anjo aquele mesmo que apareceu prim eiro. A nte riorm ente ele dera a si o nome de homem-, agora, para distinguilo dos homens, e para provar que ele apareceu na fo rm a e não na natureza humana, diz que ele portava a sem elhança dos filhos de um homem. H á quem restringe isso a Cristo, porém temo que isso tam bém seja forçado; e quando todos os pontos estiverem m ais acuradam ente discutidos e eu tiver prontam ente antecipado o resultado, veremos ser mais provável que o anjo aqui designa do seja o m esm o de quem Daniel até aqui falou. Já declaramos que ele não deve ser Cristo, porque esta interpretação m elhor se adequa à pessoa de M iguel, o qual já fora m encionado, e que surgirá novam ente no final deste capítulo. D aí ser m ais simples aceitar a questão assim: o anjo fortaleceu Daniel tocando seus lábios; e o anjo, anteriorm ente cham ado homem, era apenas na aparência, em pregando figura e imagem humanas, todavia sem participar de nossa natureza. Porque, adm itir que am iúde Deus enviava seus anjos revestidos de corpos hum anos não significa que ele os tenha criado homens no sentido em que Cristo se fez homem; pois esta é uma diferença especial entre os anjos e C ris to. A firm am os anteriormente com o Cristo nos foi descrito sob esta figura. E não há nada de surpreendente nisso, porque Cristo assumiu algum a form a da natureza hum ana antes que se m ani festasse em carne, e os próprios anjos às vezes se vestem de apa rência humana. Em seguida ele diz: ele a b riu su a b o ca e falou. Com estas palavras ele explica m ais plenam ente o que previa m ente afirmou, porquanto sentiu-se totalm ente estupefato de ter ror e aparentem ente estava morto. Então com eçou a abrir sua boca e sentiu-se reanim ado em sua confiança. N ão adm ira, pois, se os homens caem e desmaiam quando Deus revela tais sinais de sua glória; pois quando Deus resolve m anifestar sua força con tra nós, o que som os? B asta sua aparência para que as montanhas 306 55* EX P O SIÇ Ã O [10.16-18] se derretam, e sua voz para que a terra se abale [SI 104.32], Como, pois, podem os homens manter-se de pé assim que D eus aparece em sua glória, quando não passam de pó e cinza? D aniel, pois, estava prostrado, porém em seguida recobrou suas forças assim que D eus tam bém recobrou sua coragem. D evem os com preen der a certeza de sermos com pelidos a desvanecer-nos em nada sem pre que Deus põe diante de nós algum sina! de seu poder e m ajestade; e contudo ele nos restaura outra vez e dem onstra ser nosso Pai e testifica de seu favor para conosco tanto verbalmente quanto por m eio de sinais. A linguagem desta sentença poderia ser supérflua - ele abriu sua boca e fa lo u e d isse; mas por meio dessa repetição ele queria, com o já afirm ei, expressar claram ente sua própria recuperação do uso da linguagem depois de ser refri gerado pelo toque do anjo. Ele diz que falou àq u ele q u e e stav a em p é d ia n te d e m im . Esta frase nos capacita a concluir que o anjo aqui enviado era o m esm o que veio antes; e isso aparecerá ainda m ais claram ente no final do capítulo e quando avançarm os com nosso tema. Então ele diz: Ó m eu Senhor, p o r c a u sa d a visão so b rev ieram -m e d ores e eu n ã o p u d e re te r m in h a s forças. Aqui ele cham a o anjo ‘meu Senhor’, segundo o costum e hebreu. A afirm ação de Paulo era legítim a sob a lei - não há senão um só Senhor [IC o 8.6] - , os hebreus, porém, usam a palavra indiferentemente quando se dirigem uns aos outros com o um título de respeito. Para eles o uso desta frase não era m enos um costum e do que para nós, em casos especiais. Confesso que esta posição é m uito inconsisten te; mas, com o era um a form a com um de expressão, o profeta não usa cerim ônia ao cham ar os anjos de ‘senhores’. O anjo, pois, é cham ado senhor simplesmente por causa do respeito, assim como o título se aplica aos homens elevados em dignidade. N a p r ó p r ia visão, ou, seja, antes que com eçaste a falar, eu estava m er gulhado em tristeza e privado de todo vigor. Com o, pois, diz ele, sou capaz de falar agora? Tu, com teu aparecim ento, me deixaste 307 [10.16-18] D A N IE L deprim ido; não surpreende que eu esteja totalm ente em udecido; e agora, se eu abro m inha boca, não sei o que dizer, visto que o pavor que tua presença ocasionou m anteve todos m eus sentidos com pletam ente atordoados. Percebem os que o profeta está ereto só em parte, estando ainda dom inado por algum grau de assom bro, e por isso incapaz de expressar verbal e livrem ente os pensa m entos de sua mente. Portanto, acrescenta: E agora o servo d es te m eu senhor será capaz de fa la r com m eu senhor? O dem ons trativo m , zeh, parece ser usado à guisa de am pliação, segundo a frase bastante com um em nossos dias, com tal gente. D aniel não realça sim plesm ente a presença do anjo, mas tenciona expressar sua rara e singular excelência. Uma disputa seria supérflua e fora de lugar, ou, seja, que alguém assevere a ilegitim idade de se atri buir tal autoridade ao anjo. Porque, segundo m inha observação prévia, o profeta usa a linguagem com um de seu tempo. Ele de form a algum a tencionava detrair absolutam ente o m ínim o grau da m onarquia de Deus. Ele conhecia a existência de um único D eus, e que Cristo era o único príncipe da Igreja; entrem entes, ele espontaneam ente se perm itiu seguir a form a com um e popu lar de falar. E de fato somos tam bém aptos ou a evitar ou a negli genciar a cerim ônia religiosa no uso das palavras. Em bora m an tenham os que o profeta seguiu as form as cerim oniais de expres são, ele em nada detraiu algo de Deus transferindo-o para o anjo, com o os papistas quando manufaturam inúm eros santos patro nos e despojam Cristo de sua ju sta honra. D aniel não sancionaria isso, porém tratou o anjo com honra, com o se fora ele algum mortal notável e ilustre, segundo m inha observação prévia. Ele sabia m uito bem ser um anjo, porém em seu discurso não cedeu a quaisquer fúteis escrúpulos. Já que o vira na form a hum ana, en tão dialogou com ele com o tal; e com referência à infalibilidade da profecia, ele claram ente se persuadira da m issão do anjo como um preceptor celestial. Em seguida, acrescenta: E n tã o n ão re sto u fo rça alg u m a em 308 55* EX PO SIÇ Ã O [10.16-18] m im , e m eu fôlego esvaiu-se. H á quem traduz esta sentença no tem po futuro - não restará; e certam ente o verbo 1 Ü P \ ignem ed, ‘restará’ está no tem po futuro; porém em seguida vem o pretéri to, quando ele diz: m eu fô leg o esvaiu-se. Sem dúvida, isso é ape nas um a repetição do que observam os antes; pois D aniel sentiuse apoderado não só de medo, mas tam bém de estupor à vista do anjo. D aí a im pressão de estar totalm ente destituído tanto do in telecto quanto da língua; tanto para entender quanto para expressar-se em resposta ao anjo. Eis o sentido pleno das palavras. Em segundo lugar, ele acrescenta: senti-m e fo rtalecid o pelo to q u e d aq u ele q u e se vestia com o ho m em ; pois ele m e tocou e m e falou. Com tais palavras Daniel explica mais claram ente com o não conseguiu recobrar suas energias no prim eiro toque, mas que aos poucos foi reanim ado e a princípio só pôde pronunciar três ou quatro palavras. Percebem os, pois, quão impossível é para aqueles que se vêem prostrados por Deus reunir suas energias no prim eiro m om ento, e com o é parcial e gradativam ente que reco bram as faculdades que haviam perdido. D aí a necessidade de um segundo toque para que D aniel fosse capacitado a ouvir dirigir-se-lhe a palavra com um a m ente em perfeito estado. E aqui novam ente ele nos inspira fé na profecia, visto que não estava de modo algum em êxtase enquanto o anjo lhe dirigia a palavra acerca de eventos futuros. Se perm anecesse sem pre prostrado, sua aten ção poderia jam ais captar a m ensagem do anjo e jam ais teria de sem penhado a tarefa de profeta e m estre em nosso favor. Assim Deus associou essas duas condições - terror e renovação das ener gias - para tornar possível a Daniel receber com serenidade o ensino do anjo e nos entregar fielm ente o que recebera de Deus pelas m ãos do anjo. Vamos em frente: 19 E disse: N ão tem as, 6 hom em m uito am ado; paz seja contigo: sê forte. sim . sê 19 E t dixit, N e tim eas v ir desideriorum ,1“ Pax tibi, confortare, e t c o n fo rta re.147 El 146 O u, seja. desejar, com o dissem os antes. 1,1 H á quem traduz: “Age como hom em e sê forte." Am bas as palavras são as mesn as no original. 309 [10.19] DANIEL fo n e . E quando e le falou com igo, fiquei fortalecido e disse: Fala, m eu senhor, porque m e fortaleceste. cum lo quereturm ecum , roboravi me: tunc d ixi, L o q u atu r D om inus m eus, q u ia ro borasti m c. Prim eiro ele explica com o recobrou suas energias em resulta do da exortação do anjo; pois ele se refere a este encorajam ento com o um a ordem para revestir-se de bom ânimo. Portanto, n ão te m as, ó hom em m u ito am ado. Aqui o anjo se dirige a Daniel com m uita brandura, procurando acalm ar seus tem ores, pois ele carecia de algum estím ulo ao se ver oprim ido pelo pavor oriundo das palavras e do aspecto do anjo. Eis a razão p o r que [o anjo] o denom ina de hom em m uito amado. E acrescenta: p a z seja co n ti go, saudação costum eira entre os hebreus, frase cujo significado é o m esm o que daquela [palavra] latina: que o bem seja contigo. Paz, com o os judeus a usavam , significa um estado de prosperi dade, felicidade e quietude e coisas desse gênero. Portanto, paz seja contigo significa: Que sejas próspero. Com esta saudação, o anjo declara sua chegada para favorecer o profeta e dar testem u nho dos sentimentos de D eus repassados de m isericórdia para com os israelitas e da recepção de suas próprias orações. É preci so observar com diligência esse fato, porque, com o eu já obser vei, sem pre que D eus m anifesta algum sinal de sua m ajestade, inevitavelm ente somos apavorados. Não há outro rem édio que se iguale ao favor de D eus plenamente m anifesto a nós, e seu teste m unho de sua aproxim ação de nós na qualidade de Pai. O anjo expressa esse sentim ento mediante a frase que usa, dem onstran do com que justiça D aniel caiu inânim e m ovido de reverência pela presença de Deus e a necessidade de ser tranqüilizado e re cuperado ao saber que o m esm o fora enviado para dar testem u nho do favor divino. Portanto, paz seja contigo. Em seguida acrescenta: Sê fo rte , sim , sê fo rte. Com essa re petição, o anjo ensina quão extrem o esforço se requeria do profe ta para que se despertasse; se houvera sido terrificado apenas su perficialm ente, teria bastado um a palavra para sua recuperação. 310 55* EX P O SIÇ Ã O [ 1 0 . 20 ] Mas com o fora transportado para além de si m esm o, e todos seus sentidos se desvaneceram nele, o anjo inculca duas vezes a m es m a exortação: sê forte! Daí, sê fo rte, sim, sê fo rte \ ou, seja, recu pera tuas energias. E caso não possas fazer isso prontam ente, continua recobrando aquela alacridade que pode tornar-te um dis cípulo apto. Pois enquanto perm aneces assim atônito, m inha pa lavra [dirigida] a ti será sem fruto. H á duas razões pelas quais devem os notar o profeta nos inform ando novam ente quão descoroçoado ele ficara. Prim eiro, prova-se quão livre de am bigüidade realm ente era esta revelação, e quão claram ente ela foi estam pa d a com m arcas de genuinidade. Em segundo lugar, devem os aprender quão terrível nos é a presença de Deus, a não ser que sejam os persuadidos do exercício de seu paternal am or para co nosco. Finalm ente, devem os observar com o, assim que nos vir mos abalados, podem os im ediata e com pletam ente recobrar nos sas energias, porém devem os ficar satisfeitos se Deus gradual e sucessivam ente nos inspirar com energia renovada. Daniel prossegue, dizendo: F u i fo rtalecid o , e disse: Q ue fales, m eu senhor, p o rq u e m e sin to fo rtalecid o . C om essas pa lavras ele indica sua paz mental depois que o anjo o reanim ara tocando-lhe duas vezes, e ao incutir-lhe ânim o através de sua exortação. É-nos m uitíssim o proveitoso tom arm os a devida nota dessa tranqüilidade m ental, porque o profeta deve, antes, conver ter-se num diligente estudante para em seguida capacitar-se ao desem penho, em nosso favor, do ofício de m estre fiel. Com a m aior propriedade, ele reitera sua ordem para que ele recobrasse sua energia, o que o capacitou a dirigir-se ao anjo com facilidade. Vamos em frente: 2 0 E n tão ele d isse: Sabes por q ue e u vim a ti ? A gora, pois, to m arei a p elejar c o m o prín cip e d a P érsia; e, a o sair, eis que o prín cip e da G récia virá. 20 Et dixit, A n cognoscis, scisne, quare venerim ad te, et n u n c re v ertar a d pugnandum cum prín cip e P ersarum : e t ego e g re d ie n s, hoc est, ubi egressus fuero, lunc ecce princeps Javan, hoc est. G rxcorum. veniet. 311 [ 10 . 20 ] DANIEL Aqui é com o se o anjo conduzisse debalde o profeta através de um curso sinuoso; porque poderia direta e sim plesm ente terlhe dito por que viera. Era necessário restaurar o profeta em seus sentidos, visto que num dado m om ento ele deixara de ser senhor de suas ações. N a verdade ele não ficara perm anentem ente preju dicado em suas faculdades mentais, m as o distúrbio das em o ções, pelo qual passara, tinha tem porariam ente desequilibrado a serenidade de seus pensamentos. Esse fato realm ente ocorreu e foi narrado para nosso proveito. Eis a razão por que o anjo nova m ente usa este prefácio: Tu sabes? com o se quisesse reorganizar os sentidos do profeta que um pouco antes se tom aram oscilantes e dispersos. Ele insiste com o profeta a que prestasse m uita aten ção. E a g o ra , diz ele, v o ltarei; ou, seja, depois que eu tiver ex plicado o que em seguida ouvirás: v o ltarei n o v am en te p a r a p e le ja r c o n tra o p rín c ip e dos p ersas. Aqui o anjo indica a ra zão para a delonga de sua missão, não porque D eus negligenciara os gem idos e orações de seu profeta, m as porque o tem po oportu no ainda não havia chegado. O anjo anteriormente declarara como o príncipe persa se lhe opusera, significando que o deteve, e que o anjo fora obrigado a entrar em conflito com ele, porque sua crueldade para com o povo eleito se tom ara m uito m ais terrível e insolente. Este é o relato que ele dá de sua ocupação. M as então acrescenta: Voltarei para pelejar contra o príncipe dos persas. significando que D eus o enviara com o expresso propósito de desvendar a D aniel as ocorrências futuras, m as agora este sabia quão longe estava o anjo de descansar daqui em diante. D iz ele: A gora venho para ser testem unha e arauto de Deus, de seu bene plácito para contigo e teu povo. Na realidade, sou o defensor de tua segurança, visto que tenho de constantem ente pelejar por ti contra o príncipe dos persas. Sua m enção é a Cam byses. Sigo m inha interpretação anterior de um confronto entre o anjo e o rei da Pérsia, a quem homens perversos estim ularam à crueldade; porquanto revogara o édito de seu pai. O anjo resistira a fúria do 312 55* EX P O SIÇ Ã O [ 10 . 21 ] rei, o qual era naturalm ente em extremo turbulento, e os escrito res profanos têm descrito seu caráter de um a m aneira semelhante. Ele agora acrescenta: Irei p elejar contra o príncipe dos p e r sas. Pois a palavra DP, gnem, tem a função de ‘contra’, aqui e em m uitas outras passagens. Em seguida acrescenta: E q u a n d o p a r tir, isto é, quando tiver ido, e n tã o o p rín cip e d a G ré c ia v irá , diz ele. Ou, seja, Deus o usará de outra maneira. C om isso ele não quer dizer Cam byses, m as outros reis persas, com o explicarem os no devido lugar. É plenam ente correto supor que o rei da M acedônia está chegando com a perm issão de D eus; o anjo, porém, sim plesm ente quer afirm ar a existência de vários m étodos pelos quais D eus refreia a crueldade dos reis, sempre que tentam preju dicar seu povo. Enviará o príncipe dos gregos, diz ele. Portanto, Deus assim restringe Cam byses pela assistência do anjo, e então protegeu seu povo da crueldade exercida por A lexandre, rei da M acedonia. Deus está sempre providenciando a segurança de seu povo e tem sempre um a grande variedade de métodos em opera ção. O anjo queria ensinar-nos isso com toda sim plicidade. Por fim, ele acrescenta: 21 M ostrar-te-ei. porém , o q u e e stá anotado n a escritu ra d a verdade: e ninguém há q u e m e su sten te nessas coisas, exceto M iguel, vosso príncipe. 21 Veruin indicabo libi q u o d e xaratum est in S c rip tu ra veraci: e l non u n u s qui se roboret, vel, qui viriliter agat. m ecu m in his, nisi M ichael princeps vester. O m ito a interpretação daqueles que dizem que, após a partida do anjo, o príncipe dos gregos avançou, porque Deus cessou de prestar assistência ao reino dos persas. Isso é totalm ente diferen te da intenção do profeta, e devem os m anter a explicação que tenho adotado. O anjo agora acrescenta o objetivo de sua missão - fazer Daniel fám iliarizar-se com o que ele m ais adiante relata rá. N ovam ente granjeia nossa confiança para sua m ensagem , não só por causa particularm ente do profeta, m as p ara assegurar a todos os santos quão isentos eram os escritos de D aniel de qual quer fraude ou invenção hum ana, e quão plenam ente receberam 313 [10.21] DANIEL a inspiração do alto. Portanto, a n u n c ia re i o q u e foi g ra v a d o ou esculpido n a e s c ritu ra d a v erd ad e. Com esta frase, “a escritura da verdade” , indubitavelm ente ele indica o decreto eterno e invi olável do próprio Deus. D eus não carece de livros; papel e livros não passam de auxílios para a memória, o que de outra form a as coisas facilm ente cairiam no esquecim ento. Visto, porém , que ele [Deus] jam ais sofre de am nésia, daí não carecer de nenhum livro. Estam os cientes de quão am iúde a Sagrada Escritura adota form as de expressão segundo os costum es hum anos. Esta sen tença insinua com o se o anjo dissesse que nada trouxe senão o que Deus já havia determ inado outrora, e assim o profeta deve aguardar um a plena e com pleta concretização. Em seguida acrescenta: N inguém h á q u e m e su sten te neste dever, exceto M iguel, a quem ele cham a o príncipe do povo elei to. É surpreendente que o anjo e M iguel sozinhos lutassem pela segurança do povo. Está escrito: Os anjos acam pam em derredor dos que tem em a Deus [Sl 34.7]; e então só existia um a Igreja no mundo. Por que, pois, Deus não confiou esse encargo a mais de um anjo? Por que não enviou exércitos poderosos? R econhece mos que D eus não se lim ita a algum a regra fixa; ele pode ajudarnos tão bem com muitas forças com o tam bém com um único anjo ou com mais. E ele não faz uso de anjos porque nada pudes se fazer sem eles. Eis a razão daquela variedade que observamos: ele prim eiro se contenta com o uso de um anjo, e então associa outros com ele. Ele dá a um hom em um grande exército, com o lemos de Eliseu, e com o outras passagens da Escritura nos ofere cem exem plos [2R 6.17], O servo de Eliseu viu o céu cheio de anjos. Assim tam bém Cristo afirmou: N ão posso pedir a meu Pai, e ele me enviaria, não apenas um anjo, mas um a legião? [Mt 26.53]. Além disso, o Espírito de Deus designa m uitos anjos para cada um dos fiéis [Sl 91.11]. Portanto, agora entendem os p o rq u e D eus envia mais anjos, nem sempre com o m esm o propósito ou intenção, para inform ar-nos que ele nos é suficiente para propici314 55a EX P O SIÇ Ã O [ 1 1 . 1] ar proteção, m esm o quando nenhum outro auxílio nos seja provi denciado. Ele provê para nossas enferm idades, trazendo-nos au xílio por m eio de seus anjos, os quais agem com o mãos a execu tarem suas ordens. M as já observei previam ente que esta não é um a prática invariável, e não devem os obrigá-lo, p o r quaisquer condições fixas, a suprir nossas necessidades sem pre d a m esm a m aneira. Parecia que Deus, pelo menos por certo tempo, havia deixado seu povo sem qualquer auxílio, e depois dois anjos fo ram enviados para pelejarem por eles: prim eiro, um só foi envia do a D aniel; e então M iguel, que alguns pensam ser Cristo. Não faço objeção a este ponto de vista, porque ele o cham a príncipe da Igreja, e esse título não parece de form a algum a pertencer a qualquer outro anjo, porém é peculiar a Cristo. E m suma, o anjo quer dizer que Deus não exibe sua própria força em pelejar por sua Igreja, mas revela ser um servo a prom over sua segurança até manifestar-se o tem po do livramento. Em seguida acrescenta pois o próxim o versículo pode ser tratado de form a breve e deve ser conectado com este a um só contexto. d iip ítu ú o 11 1 A lém disso, n o prim eiro ano d e D ario, o m edo, m e levantei para c o nfirm á-lo e fortalecê-lo. 1 E t ego a n n o prim o D arii M edi steti in roboratorem , e t auxilium illi.l4S Os intérpretes explicam este versículo de form as variadas. Alguns pensam que o anjo pelejou em prol do rei persa, e refor çam sua opinião dizendo que ele não fez da prim eira vez o que com eça agora a fazer, ou, seja; defender aquele m onarca em fa vor do povo eleito, mas que agira assim desde o início. Outros atribuem isso a M iguel, já que o anjo declara que introduziu a assistência de M iguel. M as isso é forçado e insípido. N ão hesito em expor o argum ento que parte do m aior para o menor, e temos 148 Ou. seja. com o intuito de fortalecê-lo e dar-lhe assistência. 315 [ 11 . 1 ] DANIEL um exem plo disso num a tragédia de Ovídio. Fui capaz de preservá-lo; tu perguntas se posso destruí-lo? A ssim diz o anjo: Erigi a m onarquia persa; não tenho a m ais leve dúvida de poder agora restringir esses reis para que não derram em sua fúria sobre o povo. O significado pleno é este: o rei dos persas é um a nulidade, e nada pode fazer a não ser por meu intermédio. Sou servo de Deus para transferir a m onarquia dos m edos e caldeus para os persas, tanto quanto a dos babilônios para os medos. Deus, diz ele, me confiou essa função, e por isso pus D ario no trono. Tu podes ver agora com o o tenho plenam ente em m eu poder e com o posso im pedi-lo de prejudicar meu povo, caso fosse essa sua intenção. Ao gloriar-se o anjo de fic a r para ajudar D ario, ele nada reivin dica para si, porém fala com o se estivesse na pessoa de Deus. Porque os anjos não têm poder distinto do poder de D eus quando ele usa a agência e assistência deles. N ão há razão para alguém inquirir se o anjo deve ou não usar essa linguagem ostensiva e reivindicar algo para si mesmo. Porquanto ele não reivindica algo realm ente seu. porém dem onstra ser o agente na transferência de dinastia quando B abilônia foi subjugada pelos m edos e o im pé rio foi transferido para Dario. Com o já dem onstrei previam ente, ainda que C iro obtivera a vitória, não obstante transferiu as hon ras do governo para seu tio Cyaxares. Os hebreus costum avam considerá-lo rei nos dois prim eiros anos; C iro com eçou a reinar depois desse período. E agora, ao aparecer o anjo a Daniel, já havia entrado o terceiro ano, com o vimos no início do capítulo. ORAÇÃO Deus Onipotente, visto que diária e fam iliarm ente te dignas conce der-nos a luz da doutrina celestial, que nos acheguemos a tua escola com genuína humildade e modéstia. Seja nossa docilidade de fato evidente; que recebamos com reverência tudo quanto proceda de teus lábios, e que tua majestade seja preeminente entre nós. Possamos provar dessa benignidade que tu sempre nos manifestas em tua Pala vra e sejamos capacitados a triunfar em ti como nosso Pai. Que tua presença não nos aterrorize tanto, mas que desfrutemos do suave 316 55* EX P O SIÇ Ã O testemunho de tua graça e fa v o r paternais. Que tua Palavra nos seja mais preciosa que o ouro e todos os tesouros terrenos; e, entremen tes. nos nutramos de sua doçura, até que alcancemos aquela plena saciedade que está a nossa espera no céu, pela mediação de Cristo nosso Senhor. Amém. 317 g 56a .xposição 2 E ag o ra te m ostrarei a verdade. E is que ainda re sta rã o trê s reis n a P é r s ia ;e o q u a r to se rá m ais ric o d o que to d o s eles: e p o r sua força, a tra v és de suas riquezas, e le in stig ará a todos c ontra o reino d a G récia. 2 E t n u n c veritatem a n nuntio tibi: E cce adhuc tre s reg es sta b u n t in P e rsid e , et q u a rlu s d ita b itu r o p ib u s m a g n is,1*' p r s om n ib u s e t secundum fottudinem suam , in. inquam. opibus s u is ,isn ex citab it om nes contra regnum G ra c o m m . D evem os agora discernir a intenção de D eus em assim infor m ar a seu servo Danie! sobre eventos futuros. Evidentem ente, ete estava disposto a satisfazer um a vã curiosidade, e discorreu sobre acontecim entos cujo conhecim ento se fazia necessário, capacitando assim o Profeta a não só privativam ente confiar na graça de Deus, através desta m anifestação de seu desvelo por sua Igreja, m as tam bém exortar outros a perseverarem na fé. Este capítulo se assem elha a um a narrativa histórica sob a form a de um a descrição enigm ática de acontecimentos futuros. O anjo re lata e põe diante de seus olhos ocorrências que ainda estavam por vir. D eduzim os disto mui claram ente com o D eus falava através de seus profetas; e assim Daniel, unicam ente em seu caráter pro fético, nos é um a clara prova do peculiar favor de D eus para com os israelitas. Aqui o anjo discute, não o estado geral do mundo, m as prim eiram ente o reino persa, então a m onarquia de A lexan dre, e, por fim , os dois reinos da Síria e do Egito. A luz disto, percebem os claram ente com o todo o discurso foi direcionado aos 1411Ou, ele será rico com grande opulência. 150 Ou, com suas riquezas, ou, seja. quando ele prevalecer. 318 5 6 a EX PO SIÇ Ã O [ 11 . 2] fiéis. D eus não levava em conta o bem -estar de outras nações, mas queria beneficiar sua Igreja, e principalm ente sustentar os fiéis em suas próxim as tribulações. Visava a assegurar-lhes que D eus jam ais se esquece de seu pacto e de moderar, assim , as con vulsões que estavam acontecendo por todo o mundo, de m odo a proteger sempre seu povo com sua assistência. M as terem os de repetir isso novam ente, e ainda m ais um a vez, à m edida que pros seguirmos. A ntes de tudo, o anjo declara: L e v a n ta r-se -ã o trê s reis n a P érsia. Com respeito à frase: Eis que te anuncio a verdade, ex pliquei na preleção de ontem quão am iúde ele confirm ava sua profecia sem pre que tratasse de eventos da m aior im portância, o que parecia quase inacreditável. D ir-te-ei a v e rd a d e re a l; trê s reis se le v a n ta rã o . Os judeus são não só ignorantes acerca de tudo, m as tam bém excessivam ente estúpidos. E assim não têm nenhum senso de pudor, e se revestem de perversa audácia; pois pensam que houve apenas três reis na Pérsia, e negligenciam toda a história e m esclam e confundem as coisas perfeitam ente claras e sobejam ente distintas. Houve oito reis na Pérsia dos quais não se faz nenhum a m enção aqui. Por que, pois, o anjo diz: levantarse-ão três reis? Este era o prim eiro ano de D ario, com o vimos antes. Daí, em seu núm ero de reis, inclui-se Ciro, o prim eiro monarca, juntam ente com seu filho Cam bises. Q uando esses dois reis tiverem sido determinados, suscitar-se-á novamente um a nova dúvida; pois alguns acrescentam Smerdis a Cam bises, em bora não passasse de impostor; pois os m agos falsam ente o apresenta ram com o filho de Dario, com o propósito de adquirir para si a soberania. Assim ele foi reconhecido com o rei por sete meses; mas, quando a fraude foi descoberta, ele foi m orto por sete dos nobres, entre os quais estava Dario filho de Hystaspes, e este, segundo a narrativa popular, foi feito rei pelo consenso dos de m ais com base no relincho de seu cavalo. A s variações dos intér pretes costumam dificultar-nos de lê-los, e por isso devem os dedu319 [ 11 . 2] DANIEL zir a verdade do próprio acontecimento. Pois Smerdis, com o eu já afirmei, não pode ser com putado entre os reis da Pérsia, visto que não passou de um impostor. Portanto, eu o excluo, seguindo a prudência de outros que têm considerado o ponto com atenção. Então devemos observar por que Daniel menciona quatro reis, dos q u ais o q u a rto , diz ele, se ria m u ito rico. Cam bises sucedeu a Ciro, que estava reinando quando a profecia foi enunciada. Ele vivia sempre se movendo para lugares distantes; raram ente se perm itia descansar por um só ano; era excessivam ente cobiçoso de glória, insaciável em sua am bição e sempre a instigar novas guerras. Cam bises, seu filho, que assassinara seu irmão, morreu no Egito e ainda adicionou este país ao im pério persa. Dario, filho de Hystaspes, prosperou, e Xerxes o seguiu. Está enganado quem pensa que Dario, filho de Hystaspes, foi o quarto rei; sem dúvida o Profeta quis dizer Xerxes, que cruzou o m ar com um poderoso exército. Ele levou consigo 900.000 homens; e por mais inacreditável que isso nos pareça, todos os historiadores o afir mam constantemente. Sua soberba dominou seu íntimo a tal ponto que disse ter vindo pôr grilhões no Helesponto, enquanto seu exér cito cobria todo os países circunvizinhos. Este é um ponto; os quatro reis eram Ciro, Cam bises, Dario, filho de Hystaspes, e Xerxes, om itindo Smerdis. Podemos agora inquirir por que o anjo lim ita o núm ero a quatro, visto que o sucessor de X erxes foi Artaxerxes, ou D ario Longímano, “mãos alongadas” , e alguns ou tros depois dele. Esta dificuldade é dissolvida pelo seguinte m é todo provável - X erxes destruiu o poder do im pério persa através de sua tem eridade; escapou coberto de infortúnio e foi salvo qua se só pela ignom ínia de sua fuga. Levou consigo apenas uns pou cos com panheiros, às pressas, num pequeno bote, e não conse guiu um único transporte, não obstante o H elesponto fosse previ am ente coberto por seus navios. Quase todo seu exército foi frag m entado, prim eiram ente em Termopile, e então em Leuctra, e mais tarde em outros lugares. D esde aquele período o império 320 56* EX P O SIÇ Ã O [ 1 1 . 2] persa se declinou, porque, quando sua glória bélica foi aniquila da, o povo se entregou à indolência e ociosidade, segundo o tes tem unho de Xenofonte. A lguns intérpretes explicam a frase, levantar-se-ão três reis, com o significando o período florescente da m onarquia persa. Tomam as palavras ‘levantar-se-ão’ enfati cam ente, visto que, desde aquele período, o poder da nação co meçou a declinar-se. Porquanto Xerxes, em seu regresso, passou a ser odiado por todo o povo, prim eiram ente por sua insensatez; em seguida, por m andar executar seu próprio irmão, por sua des ditosa conduta em relação a sua irm ã e por seus dem ais crim es. E visto que se viu tão sobrecarregado de infâm ia à vista de seu próprio povo, foi assassinado por A rtabano, o qual reinou sete meses. Visto que o poder d a Pérsia foi então quase totalm ente destruído, ou, pelo menos, com eçou a declinar-se, alguns intér pretes afirm am que esses três reis vieram à existência, e então acrescentam que X erxes foi o quarto e o m ais opulento. Tome m os, porém , o termo ‘levantar-se-ão’ relativam ente, com respei to à Igreja. Pois o anjo declara que o príncipe persa, Cam bises, levantou-se diante dele, num a atitude de hostilidade e conflito. O anjo parece, antes, sugerir o soerguim ento de quatro reis da P ér sia, com o propósito de lembrar os judeus dos sérios males e das graves tribulações que sofreriam sob seu domínio. N este sentido, interpreto o verbo ‘levantar’ com o um a referência às pelejas p e las quais D eus molestou a Igreja até a m orte de Xerxes. Pois na quele período, quando o poder dos persas eclipsou-se, um perío do m ais longo de repouso e relaxam ento foi propiciado ao povo de Deus. Eis a razão por que o anjo om ite e transcorre em silên cio todos os reis desde A rtabano até D ario, filho de Arsaces. Por que Arsaces foi o últim o rei exceto um , e ainda que O chus rei nasse antes dele, sabemos de historiadores profanos com o sua posteridade foi reduzida à mais vil condição sob o últim o Dario, a quem A lexandre venceu, com o logo veremos. P or essa razão creio ser este o sentido genuíno da passagem: desde Ciro a Xerxes, 321 [11.2] DANIEL reis da Pérsia se levantariam contra os israelitas, e durante todo aquele período as pelejas seriam renovadas, e os judeus quase pereceriam pelo desespero sob aquela série contínua de males. A lguns dizem que quatro reis se levantariam até que todos os judeus fossem retirados; e sabemos que isso nunca foi com pleta do, pois apenas um a pequena porção regressou. Em m inha opi nião, não me sinto disposto a polem inizar com outros, todavia não hesito em reforçar o desejo do anjo de exortar todos os san tos à paciência, pois ele anunciou o soerguim ento desses quatro reis, os quais lhes trariam graves tribulações. Q uanto ao quarto rei, a afirmação desta passagem se adequa perfeitamente a Xerxes. O quarto, diz ele, será enriquecido com riquezas', pois o substan tivo é de significado sem elhante ao verbo, visto que am bos pro vêm da m esm a raiz. Na verdade Dario, filho de Hystaspes, deter m inou em preender guerra contra a G récia; ele fez tentativas, po rém sem sucesso, especialm ente na batalha de M aratona. Ele foi elim inado por m orte súbita, quando seus tesouros estavam pre parados e muitas forças eram arregimentadas. Ele assim deixou o m aterial de guerra para seu filho. Xerxes, na flor de sua idade, viu toda a preparação para a guerra posta em suas mãos; avida m ente aproveitou a ocasião e não deu atenção algum a aos conse lhos sábios. Porque, com o já afirm amos, ele se destruiu, bem com o a toda a monarquia, não por um único m assacre, m as por quatro. E esse poder de suscitar um exército de 900.000 homens não foi um a ocorrência corriqueira. Se tivesse levado consigo, e cruzado o m ar com apenas 100.000 homens, isso teria sido um a grande força. M as seus recursos para alim entar tão grandes for ças, e então fazê-las atravessar o mar, excede os limites ordinári os de nosso raciocínio. Não nos surpreende, pois, que o anjo te nha predito a extrem a riqueza desse rei. E acrescenta: E m su a fo rtaleza e su as riq u e z a s ele in stig a r á a todos c o n tra o rein o dos gregos. Isso não foi realizado por D ario, filho de Hystaspes. Segundo m inha declaração anterior, 322 56* EX P O SIÇ Ã O [11.31 ele atacou algum as cidades gregas, porém sem produzir confu são po r todo o Oriente, com o fez X erxes seu sucessor. Q uanto à frase, o reino de Javã, subscrevo de bom grado a opinião dos que crêem ser a palavra equivalente à palavra grega Iônia. Porque Javã saiu naquela direção e habitou ali com sua posteridade no território grego, donde quase toda a G récia adquiriu seu nome atual. Toda a nação grega é às vezes cham ada ‘C itim ’, e alguns vêem boas razões para a m esm a ser cham ada ‘Machetae’, de C i tim, filho de Javã, e assim com a adição de um a letra chegam os aos m acedônios. Pois há probabilidade na conjetura de que esse povo foi prim eiram ente cham ado Maketae e mais tarde, m acedô nios. Sem dúvida, nesta passagem, e em muitas outras, Javã é expresso por toda a Grécia, visto que Iônia era a porção do país m uitíssim o celebrada na Judéia e por todo o Oriente em geral. X erxes, pois, instigou contra o reino de Javã - significando a G récia - todo o povo do Oriente; pois é sobejam ente notório como seu im pério expandiu-se em todas as direções. Vamos em frente; 3 E se le v a n ta rá u m rei pod ero so , que g o v e m a rá c o m g ra n d e dom ín io e a g irá segundo su a vontade. 3 Et stab it rex fortis, e t d o m in a b itu r dom inatione m agna, e t faciet secundum voluntatem su a m .151 E ssa é um a referência a Alexandre da M acedônia. Já declarei brevem ente a razão por que o anjo passou por todos os reis per sas, de A rtabano ao últim o D ario - não se envolveram em quais quer pelejas com os judeus até Xerxes. M as quando A lexandre invadiu a Ásia, ele chocou os judeus com profundo terror, bem com o todas as nações. Ele veio com o relâm pago, e de m odo al gum causa surpresa que os judeus tenham se apavorado com sua chegada, porque, com o anteriorm ente o expressam os, ele voou com espantosa rapidez. Alexandre, pois, rebelou-se, não só por m eio das riquezas e poderio de suas preparações bélicas, mas necessariam ente inspirou os judeus com perturbação quando per 151 Ou. seja, como ele deseja, ou segundo sua cobiça. 323 [ 11.4 ] DANIEL ceberam sua incapacidade para resisti-lo, e assim foi m erecidam ente hostil com eles, porque, desde o início, haviam desdenha do seu im pério. Josefo tam bém nos inform a com o ele se com o veu à vista do sum o sacerdote e com o determ inou m itigar seu furor contra os judeus. Pois quando estava em casa, antes de p as sar para a Á sia, foi-lhe propiciada a visão do sum o sacerdote, porquanto D eus enviara seu anjo sob esse disfarce.152 A lexandre creu ser ele algum a divindade; m as quando o sum o sacerdote o encontrou em procissão, a visão veio novam ente a sua lem bran ça, e sentiu-se chocado com o se visse D eus vindo-lhe do céu. Seja qual for o objetivo dessa ocorrência, A lexandre evidente m ente entrou na Judéia com a intenção de destruir de vez toda a nação. Eis a razão por que o anjo cuidadosam ente prediz essa mudança. Portanto, se le v a n ta rá u m rei v alen te e g o v e rn a rá com extenso dom ínio, e f a r á seg u n d o seu b e l-p ra z e r; ou, seja, ele avançará com o se tivesse todos os acontecim entos da guerra em sua própria mão e segundo sua própria vontade, com o o pró prio acontecim ento provou sobejam ente. Vamos em frente: 4 E q u a n d o ele levantar-se, seu reino será queb rad o , e será div id id o p a ra o s q u a tro ventos d o céu; m as não para sua posteridade, nem segundo seu dom ín io que e le governou: porque seu re in o será arrancado. e passará a o utros além daqueles. 4 E t ubi constiterit, frangetur. vel, conteretur, regunum ejus, e t d iv id e tu r in quatu o r ventos c a lo n im , hoc e u , in q u a iu o r p la g a s m u n d i, e t non p o steritati e ju s, et non secundum dom in atio n em ejus, qua dom inatus fuerit: q u ia extirpabitur, radic iiu s evelletur, regnum e ju s. e t aliis absq u e illis. E sta linguagem é concisa, porém não há am bigüidade no sen tido. A ntes de tudo o anjo diz: Depois que aquele rei valente tiver se levantado, seu im pério será feito em pedaços. Pois quando A lexandre atingiu seu apogeu, subitam ente caiu enferm o e em curto tem po m orreu em Babilônia. Em baixadores se reuniram IS! H á vários erros m enores na edição d e 1617, os quais s io corrigidos na edição de 1671. Por exem plo, no fólio 94, verso 3, violavitem vez de volavir, e no fólio 95, verso 3, começase a frase com non, em vez de nam. 324 56» EX P O SIÇ Ã O [ 11.4 ] em tom o dele vindo de cada região. Ele ficou com pletam ente intoxicado pela prosperidade, e mui provavelm ente envenenouse. Os historiadores, contudo, o têm considerado com o um notá vel exem plo de valor singular, e assim têm pretendido e relatado porque pelo menos assim pensavam que ele fora fraudulentamente envenenado por Cassander. Todos nós, porém, sabem os quão intem perada e im oderadam ente ele se entregara à bebedice. Quase sepultou-se no vinho, e a perturbação se assenhoreou dele em m eio a suas taças, e mergulhou nela, visto que nenhum remédio havia para ele. Esse, pois, foi o veneno de A lexandre. Seja qual for a m aneira de o entenderm os, o fato é que ele caiu de repente, quase tão logo com eçou a pôr-se de pé. Depois de conquistar quase todo o Oriente, chegou a B abilônia e vacilou em seus pla nos quanto ao em prego de suas forças, depois de obter a paz por todo o Oriente. Então foi tom ado de ansiedade sobre a transfe rência de seus exércitos, se para a Europa, ou para a África. D iz o anjo: D epois que ele se erguesse, significando depois que ele adquirisse a m onarquia de todo o Oriente, seu reino seria que brado. Ele usa esse sím ile em virtude de todo o poder de A lexan dre vir a extinguir-se de tal form a que fragm entou-se em partes. Sabem os com o seus doze generais dividiram entre si os espólios; cada um tom ou um a porção, e assim o dividiram entre si, com o já afirm am os previam ente, com o se ele fosse rasgado do corpo de seu senhor. Todos consentiram em erguer seu irm ão Aridaeus à dignidade real e o cham aram Filipe, com vista a que, enquanto seus filhos fossem ainda jovens, a memória de seu pai os recom en dasse aos olhos do mundo. M as quatro reinos por fim emergiu da m onarquia de Alexandre. É desnecessário aqui referir o que pode mos ler, em nosso lazer, nos escritos de seus historiadores. O Profeta apenas toca de leve sobre os pontos que se relacio nam com a instrução da Igreja; ele não relata em ordem nem com detalhes os eventos narrados na história; sim plesm ente diz: Seu im pério será quebrado e será disperso, diz ele, para os qua325 [11.4] DANIEL tr o ventos do céu. O anjo om ite aquela partilha que destinou o tesouro a um e deu a função de conselheiro a Filipe; Perdiccas foi o guardião de seu filho, e ele juntam ente com outros granjearam um a porção de seus domínios. Seleuco ficou com a Síria, a quem sucedeu seu filho Antíoco; A ntígono veio a ser o prefeito da A sia M enor; Cassander, pai de Antipater, tom ou p ara si o reino da M acedônia; Ptolom eu, filho de Lago, que não passara de um sol dado comum, possuiu o Egito. Esses são os quatro reinos de que o anjo ora trata. Pois o Egito ficava situado ao sul da Judéia e a Síria, ao norte, com o m ais adiante terem os ocasião de observar. M acedônia veio em seguida, e então Á sia M enor, o O riente e o Ocidente. O anjo, porém, não entra em detalhes com plicados, mas brevem ente enum era o que se fazia necessário para a instru ção com um do povo eleito. O consenso geral de todos os escrito res tem transm itido estes fatos: quatro reinos, finalm ente, foram constituídos de muitas porções, depois que os líderes m ataram m utuam ente uns aos outros, som ente os quatro sobreviveram , a saber: Ptolom eu, Seleuco, A ntígono e Cassander. M ais tarde o reino de Antíoco aumentou suas fronteiras com a derrota de A n tígono; pois Antíoco acresceu a Á sia M enor ao reino da Síria. A ntíoco, porém, esteve de pé só por pouco tempo, e daí o anjo real e apropriadam ente afirm ar que esse im pério foi dividido em quatro partes. Em seguida ele acrescenta: e n ã o p a s s a rá a su a p o s te rid a de. N inguém poderia ter im aginado o que o anjo predizia tantos anos antes do nascim ento de Alexandre; pois ele só veio a nascer cem anos depois desse período. Todos quantos conhecem a ousa dia de seus esquem as bélicos, a rapidez de seus m ovim entos e o sucesso de suas medidas, jam ais se persuadiriam de tal resultado - a com pleta destruição de toda sua posteridade e total extinção de sua raça. H ouvera A lexandre vivido tranqüilam ente em casa, e ter-seia casado e se tom ado pai de filhos que teriam sido seus sucesso 326 5 6 ” EX P O SIÇ Ã O [11.4] res sem disputa. Ele m orreu jovem , logo depois de atingir os trin ta anos. Poderia ter se casado e tido herdeiros para seu trono. Ele tinha um irmão, Aridaeus, e outros parentes, entre os quais se achava seu tio Pirro, rei de Epiro» e um a prole régia podia assim ter sido preservada e um sucessor preparado para ele. D epois de haver subjugado a Á sia superior e inferior, ele veio a ser o senhor da Síria, Egito e Judéia, e estendeu seu dom ínio ao m ar persa, enquanto sua fam a se estendia para além da Á frica e Europa. U m a vez que ninguém ousava erguer um dedo contra ele, visto que possuía um exército m uitíssim o m agnificente, e todos seus generais estavam jungidos a ele por benefícios m uito im portan tes e m uitos de seus prefeitos se enriqueceram em virtude de sua extrem a liberalidade, quem teria im aginado que toda sua posteri dade e parentes seriam assim extintos? Ele deixou dois filhos, porém foram assassinados com o o foi seu irm ão Aridaeus, en quanto suas viúvas e sua mãe, com a idade de oitenta anos, parti lharam da m esm a sorte. Tampouco Cassander poupou a sua, por quanto tecera intrigas contra ele. Por fim , se Deus quisesse punir tantos m orticínios com etidos por Alexandre, então teria que co m eçar extinguindo toda sua posteridade. E todavia, com o j á afir mei, nenhum inimigo estrangeiro foi o agente na aplicação de tão pesados castigos. Ele subjugara todo O riente, e seu procedim en to era tal com o se toda a m onarquia daquela parte do m undo lhe tivesse vindo de seus ancestrais por direito hereditário. Já que o m undo não continha nenhum inimigo para ele, seus inim igos pro cederam de seu próprio lar; m ataram sua mãe, suas viúvas, seus filhos e todos seus parentes, e erradicaram totalm ente toda sua raça. O bservam os, pois, com que clareza e certeza o anjo prediz eventos inteiram ente ocultos daquela época e para cem anos de pois, e tais com o jam ais a hum anidade poderia crer. A í parece haver um grande contraste na linguagem; seu reino será quebra do e será disperso para os quatro ventos do céu, e não passará a sua posteridade, ou, seja, em bora os quatro reinos procedessem 327 [11.4) DANIEL dos quatro cantos do mundo, todavia ninguém de sua posterida de restaria num único lugar, nem obteria m esm o a m ínim a p o r ção de seus domínios. E ssa foi um a prova notável da ira de D eus contra a crueldade de Alexandre; não que ele fosse selvagem por natureza, mas a am bição apoderou-se dele e o fez sanguinário e o indispôs a desejar pôr cobro a suas cam panhas m ilitares. Deus, pois. vingou-se daquela disposição gananciosa de Alexandre, per m itindo que toda sua raça perecesse assim com desgraça e horrí vel crueldade. D aí sua soberba de querer ser considerado filho de Júpiter, condenando à m orte todos seus am igos e seguidores que não se prostrassem a seus pés com o que diante de um deus soberba que, repito, nunca poderia assegurar-lhe que um único descendente reinasse em seu lugar, ou mesmo lhe garantisse uma única satrapia. N ão passará a sua posteridade, diz ele, n em se g u n d o seu dom ínio. Ele passa aos quatro reis, dos quais havia dito: N ão procede rá, diz ele; ou, seja, dos quatro reis. Ele já falou de sua estranha procedência, não de algum a form a oriundo da fam ília daquele rei; pois nenhum dos quatro se igualaria em poder, porque seu reino seria extirpado. Aqui o anjo parece om itir eventos interve nientes, e fala de uma destruição final. Sabem os com o o últim o rei, Perseu, foi vencido pelos romanos, e com o o reino de Antíoco foi parcialm ente destruído por guerra e parcialm ente oprim i do por fraude. E o anjo parece apontar para esse fato. Podem os interpretá-lo mais pertinentem ente, considerando a cessação do im pério de Alexandre, com referência a sua raça, com o se o anjo houvera declarado que nenhum de seus sucessores granjearia para si igual poder. E por quê? N enhum deles o poderia realizar. A le xandre adquiriria um nome tão poderoso, que todo o povo sub m eteria de bom grado a sua autoridade, e nenhum sucessor pode ria sustentar esse peso em sua totalidade. D aí seu reino, até onde se relaciona a ele e a sua posteridade, ser dividido, e ninguém atingiu seu poder e sua opulência. E s e rá d a d o a o u tro s. A qui, o 328 5 6* EX P O SIÇ Ã O [ 11 . 5] anjo explica seu significado. A destruição do reino não deve ser explicada particularm ente com o sendo partes isoladas, pois cada um se apoderou de sua própria porção para si, e seus sucessores eram todos estrangeiros. E a outros além daqueles; significando que seu reino será tom ado por outros que não fazem parte de sua posteridade; ou, seja, estrangeiros assum irão o lugar de A lexan dre, e não se erguerá nenhum sucessor de sua própria parentela. Vamos em frente: 5 E o rei d o sul se rá forte, e um d e seus príncipes será m ais forte que ele, e te rá dom ínio; seu d om ínio será um grande dom ínio. S E t ro b o rab itu r rex austri, e t ex principibus ejus, et ro b o rab itu r ad v ersu s eum , et dom inabitur; d om inatio m agna, dom inatio ejus. Aqui o anjo com eça a apresentar os reis do Egito e da Síria. A inda não faz m enção do rei da Síria, mas fará isso no próxim o versículo; porém com eça com o rei do Egito, a vizinha m onar quia de Israel. D iz ele que o rei do sul, significando o rei do Egi to, seria valente. Em seguida diz: e u m d e seus p rín cip es. M ui tos tom am isso num único contexto; eu, porém , penso que o anjo transfere seu discurso para Antíoco, filho de Seleuco. E um de seus príncipes, diz ele, significando os príncipes de Alexandre, se fortalecerá contra ele. Pois a letra 1, vau, é tom ada no sentido de oposição, e im plica um a oposição entre Ptolom eu, filho de Lago, e Antíoco, rei da Síria. D aí o rei d o sul c re sc e rá em fo rça - outros líderes de A lexandre se tornarão fortes contra ele, e as* sum irão o domínio. Sabem os quão m aior e mais sólido o rei da Síria foi que o do Egito, especialm ente quando a Á sia M enor lhe foi acrescida. Sem dúvida, o anjo estava fam iliarizado com a fu tura superioridade de Antíoco sobre Ptolom eu, quando esses dois reis são m utuam ente com parados. D eixem os, porém , o restante para amanhã. 329 DANIEL ORAÇÃO Onipotente Deus, visto que não só designaste desvendar a teu servo D aniel os eventos futuros, bem como aos piedosos que esperavam pelo advento de teu unigénito Filho, para que estivessem bem prepa rados para todos os sofrimentos, e pudessem perceber que a Igreja repousa sob teu cuidado e proteção, mas também quiseste que essas profecias nos fo ssem proveitosas hoje, bem como confirmar-nos na mesma doutrina, sim, permite que aprendamos como lançar de nós todas as preocupações e ansiedades em tua providência paternal. Que jam ais duvidemos de tua supervisão sobre os cuidados de tua Igreja nestes dias, bem como tua proteção contra a fú ria dos ímpios que tentam p o r todos os meios destruí-la. M as que repousemos em p az sob aquela vigilância que nos tens prometido e lutemos sob a bandeira da cruz; e possuamos nossas almas em paciência, até que, por fim , te manifestes como nosso Redentor com m ãos estendidas, na manifestação de teu Filho, quando regressar em seu ofício de Juiz do mundo. Amém. 330 57a fexposição 6 E n o fim d e anos, eles se aliarão; porq u e a filh a d o rei d o sul virá a o rei d o norte com o intuito d e fa ze r um tratado; m as e la não reterá o p o d e r d e seu braço; n e m eie p ersistirá, n e m seu braço; e la, porém , será en treg u e, e o s que a tiv erem trazido, e seu progenitor, e o q u e a fortalec ia naqueles tem pos. 6 E t in fine a n n o m m sociabuntur, convenient inter se, e t filia re g is austri veniet a d regem aquklonis u t faciat recta; et non retin eb it v ires braehii, e t non stab it ipse, neque sem en ejus, e t d a b itu r ipsa, e t qui adduxerit eam , et qui gen u erit ipsam , et roborabit eam lem poribus illis, vel, robo- raerit. Q uanto à explicação das palavras, o rei do su l, j á declaram os ser ele o rei do Egito, e não o do norte, a saber, a Síria. F azer as coisas certas significa prom over a paz m útua; ele não reterá a fo rç a de seu braço significa que seu braço não reterá sua força; ele não perm anecerá é um a referência a seu pai Ptolom eu, ou Antíoco Theos, com o verem os m ais adiante. E então devem os tom ar a \ vau, negativam ente, e ler: nem seu descendente, o que alguns traduzem por seu braço. Ela será entregue im plica ser entregue à morte, enquanto alguns entendem seu p a i com o sendo sua mãe ou sua governanta. Aqui, pois, o anjo profetiza o estado dos reinos do Egito e Síria. E ele está ainda olhando para a Igreja de Deus, com o afirm am os ontem, a qual foi posta no seio dessas duas nações. D evem os sem pre tentar averiguar a intenção do Espírito Santo. Ele queria sustentar os santos sob aquelas con vulsões pelas quais seriam agitados e afligidos. Sua confiança poderia ter sido totalm ente subvertida, a não ser que fossem per suadidos de que nada acontece ao acaso, visto que todos esses acontecimentos foram proclamados de antemão. Além disso, Deus 331 [ 11 . 6 ] DANIEL enviara seu anjo a Daniel para que ele provasse tanto seu poder quanto sua determ inação em defender sua Igreja, e realizaria isso porque queria que os fiéis fossem adm oestados de antemão, não tem erariam ente nem ainda sem proveito. M as devem os, prim ei ram ente, relacionar a história - diz o anjo: N o fim d o s tem pos, dois reis se a lia rã o e fa rã o am izad e. Ele anunciou a superiori dade do rei da Síria; pois quando A ntígono foi vencido, e seu filho foi morto, Seleuco, o prim eiro rei da Síria, suplantou Ptolomeu em seu poder e na m agnitude de seu dom ínio. M as suscita ria um a rivalidade entre eles, e haveria algum as escaram uças de ambos os lados, até que a condição de Ptolom eu viesse a enfraquecer-se, e então Seleuco se precipitou tum ultuosam ente, com a ferocidade de um assaltante, mais que a m agnanim idade de um rei. D epois de prosseguir por algum tem po com a peleja. B ereni ce, filha do segundo Ptolom eu, cham ado Filadelfo, foi dada em casam ento a A ntíoco Theos. Ela tam bém é cham ada Beronice e Bernice. Ele estava tão cego pelo orgulho que chegou ao ponto de dar a si o nom e de Theos, que significa Deus. Foi o terceiro com esse nome, sendo o prim eiro cham ado Soter, que significa preservador. Visto, pois, com o Seleuco adquiriu tantas e tão po derosas possessões, seus filhos não consideraram sua autoridade plenam ente estabelecida, e assim assum iram esses títulos magnificentes com o intuito de inspirar todas as nações com o terror de seus nomes. D aí o prim eiro Antíoco ser cham ado Soter e o se gundo, Theos. Ora, o segundo Ptolom eu, cham ado Filadelfo, deu sua filha em casam ento a Antíoco Theos. Com esse vínculo, estabeleceram -se entre eles a paz e a am izade, justam ente com o em Rom a Pompeu casou-se com Júlia, filha de César. E diariam ente observam os semelhantes ocorrências, pois quando um rei tem em seu poder um a filha, ou sobrinha, ou outras parentas, o outro rei se acha de posse de relações m asculinas ou fem ininas, por cujas relações interconjugais confirm am um tratado de paz. Foi assim neste caso, ainda que os historiadores atribuam a Ptolo332 5 7* EX PO SIÇ Ã O [11.61 m eu algum grau de capciosidade, ao conceder sua filha a Antíoco Theos. Ele presum iu ser esse um m eio de, finalm ente, adqui rir o dom ínio sobre toda a Síria e sobre as dem ais províncias sob o dom ínio de Antíoco. Se esse realm ente foi ou não o caso, os historiadores profanos provam o cum prim ento da predição do anjo. Sem a m ais leve dúvida, Deus, em seus prodigiosos conse lhos, ditou a esses historiadores o que lemos na atualidade, e fez deles testem unhas de sua própria verdade. A liás, tal pensam ento jam ais entrou em suas mentes, porém, quando D eus governa as mentes e as línguas dos homens, sua vontade é estabelecer evi dente e convincente testem unho de sua profecia, com o propósi to de m ostrar a real predição de cada ocorrência. N o fim dos anos, diz ele, eles se aliarão. E em seguida declara: E a filh a d o rei d o sul, significando Berenice, de quem já fizem os menção, v ir á ao rei d o n o rte, sig nificando o rei da Síria, Antíoco Theos. E ssa aliança foi firm ada em oposição à justiça. Pois Antíoco repudiou sua esposa Laodice, que era a mãe de seus dois filhos, os quais gerara de Antíoco, a saber: Seleuco Calínico e Antíoco, o m ais jovem , cham ado Hierax, falcão, em virtude de sua rapacidade. Percebem os, pois, com o ele firmou um segundo matrim ônio, depois de divorciar-se injusta e ilegalm ente de sua prim eira esposa. D aí não causar sur presa que tal aliança tenha sido am aldiçoada pelo Todo-Poderoso. Ela se reverteu em infelicidade para am bos os reis, Egito e Síria. Ptolom eu não deveria ter precipitado sua filha nos braços de Antíoco, que já era casado, nem ainda ter perm itido que ela viesse a ser sua segunda esposa, em bora a verdadeira esposa do rei se divorciasse. Percebem os, pois, com o D eus veio a ser o vin gador desses crim es, enquanto os planos de A ntíoco e Filadelfo se convertiam num grande mal. Há quem pensa que A ntíoco foi fraudulentam ente envenenado por sua prim eira esposa; visto, porém, ser tal ponto duvidoso, não em ito nenhum a opinião. Se tal foi ou não o caso, A ntíoco veio a ter um filho por m eio de 333 [ 11 . 6] DANIEL Berenice e morreu im ediatam ente depois de reconciliar-se com sua prim eira esposa. Alguns historiadores afirm am que, depois de recobrar sua dignidade e posição de rainha, tendo um a vez experim entado a leviandade e perfídia de seu esposo, ela tomou certas m edidas para prevenir-se de outro repúdio. Quando Antíoco foi morto, essa m ulher inflamou-se com o ím peto da vingan ça, e na perseverança de sua disposição, im peliu seu filho a as sassinar sua rival, especialm ente estim ulando Seleuco Calínico que sucedeu a seu pai no trono. H ierax foi então prefeito da Ásia M enor; daí estim ular ela, furiosam ente, seu filho a assassinar sua rival. Porque, em bora A ntíocoTheos houvera se reconciliado com ela, todavia ainda algum grau de posição e honra pertencia a B e renice, filha de Ptolom eu. E seu filho perpetuou esse hom icídio com a m aior obstinação e com a mais abjeta crueldade e perfídia; pois ele a persuadiu a confiar-se a seu cuidado, e então a assassi nou, a ela e a seu filho. O anjo então diz: Q u a n d o a filh a d o rei do sul v ie r ao rei do n o rte , seu b ra ç o n ão re te rá su a fo rça. A linguagem é m etafóri ca, com o se aquele casam ento fosse um braço com um a ambos os lados; pois o rei do Egito estendeu sua m ão ao rei da Síria para proteção mútua. Aquele braço, pois, não reteve sua fo rça i pois Berenice foi assassinada de form a m uitíssim o perversa p o r seu próprio enteado, Seleuco Calínico, com o já vimos. D iz ele ainda que ela v irá p a ra fa z e r alian ças. Aqui, à guisa de concessão, o anjo cham a àquele laço conjugal □"HUTE, misrim, “rectitudines” , “condições de contrato” , porque a princípio todas as partes pen savam que ele viria a ter tal resultado. Antíoco, porém , já havia violado seu juram ento conjugal, e renunciara a sua aliança legíti ma. Portanto, nada estava certo de sua parte. Sem a m ais leve dúvida, ele tirara algum a vantagem do piano, com o os reis sem pre costum am fazer. E com respeito a Ptolom eu, m uitos historia dores, com o já mencionam os, presum em que ele alm ejara arden tem ente o reino da Síria. Se esse foi ou não o caso, suas transa 334 57a EX P O SIÇ Ã O [ 11. 6] ções m útuas não eram sinceras, e assim é usada a palavra “reti dão” , com o dissem os, apenas por concessão. O anjo não fala em louvor deles, nem para justificar a perfídia de am bos, mas, ao contrário, agrava seu crim e; e disso deduzim os o quanto abusa ram da santidade tanto do m atrim ônio quanto dos tratados, os quais D eus queria que fossem mantidos sacros por toda a hum a nidade. Daí, ainda que a palavra seja p o r si só honrada, todavia é usada num sentido deplorável, p ara m ostrar-nos com o o anjo condenou o rei Ptolom eu por essa vil prostituição de sua filha, e Antíoco por rejeitar sua esposa e casar-se com outra que não era sua esposa real, m as um a m era concubina. E é provável que Deus quisesse usar os lábios de seu anjo para realçar a tendência de todos os tratados monárquicos. Eles m antêm sem pre as m ais en ganadoras aparências - a nível nacional, serena paz pública e objetivos sim ilares que podem chegar a ser jeitosam ente proem i nentes. Pois os reis sem pre detêm favor e louvor para si, oriun dos d a insensatez vulgar, sempre que fazem tratados de paz. A s sim todas essas alianças não têm outra tendência além de produ zir o ludíbrio social e por fim se degeneram em perfídia mútua, quando um a parte tram a insidiosa e im piam ente contra a outra. Em seguida o anjo acrescenta: E le n ã o p e rm a n e c e rá ; usan do o gênero masculino, e mui provavelm ente se referindo a A ntí oco, tanto quanto a Ptolom eu, seu avô. N em ele nem seu descen dente perm anecerá, significando seu filho por m eio de Berenice, filha de Ptolom eu. N ão ouso traduzi-lo por ‘braço’, porque, em m inha opinião, a letra 1, vau, é indispensável na palavra ‘braço ’; e assim a tom o no sentido de ‘descendente’. Em seguida ele acres centa: E ela s e rá en tre g u e - volvendo assim para B erenice - ou por m eio de traição ou de morte; e os q u e a le v a ra m - signifi cando seus com panheiros. Sem pre que algum casam ento inces tuoso é consum ado, algum as pessoas de caráter desditoso se as seguram de ser usadas na condução da nova esposa ao rei. E mui provavelm ente houve facções no palácio de A ntíoco; um partido 335 111.7] D AN IEL sendo m ais ligado a Seleuco, seu irmão e sua mãe Berenice; en quanto outros alm ejavam m udança de governo, segundo o esta do costum eiro dos negócios. Os conselheiros do casam ento entre Antíoco e Berenice foram enviados com o guardas de honra para acom panhá-lo à Síria, e o anjo declara que todos estes foram en tregues juntam ente com a rainha. Em seguida, acrescenta: e os q u e e ra m seus p a re n te s. A partir da ausência de um ponto gra m atical sob a letra n , he, há quem pensa que o substantivo deva ser do gênero feminino. E visto que o m esm o pode significar m ãe, o tratam com o a referir-se à governanta; porém deixo a ques tão em suspenso. Ele então acrescenta: e os q u e a fo rta le c e ra m n aq u eles dias. Indubitavelm ente, sua intenção era designar to dos os que desejavam bajular o rei, e assim tom aram parte no casam ento entre ele e a filha do rei do Egito. Toda essa facção pereceu, quando Berenice foi assassinada por Seleuco Calínico. Se, pois, ele não poupou sua própria m adrasta, m uito m enos pou paria a facção por m eio da qual ele foi privado de sua esperança de obter o reino, e da parte de quem sua mãe Laodice havia sofri do a vergonha do divórcio. Vamos em frente: 7 M as d e um ram o d e su a s raízes um se le v a n ta rá em seu lugar, o qual v irá c o m um e x érc ito e en tra rá n a fo rtalez a d o rei d o n o rte, e ag irá c o n tra e le s. e prev alecerá. 7 E t stabit ex grm ine, vel, surcuio, radic u m e ju s. nem pe Berenice.™ in gradu su o ,154et veniet cum e x e rc itu ,'“ e t veniet in m unitionem regis A quilonis, e t faciet in il!is.15fle t prsevalebit. O anjo trata aqui de Ptolom eu Evergete, o terceiro rei do E gi to que sucedeu a seu pai Filadelfo. Ele reuniu grandes forças para vingar-se do insulto sofrido por sua irmã, e assim travou guerra com Seleuco Calínico, o qual veio a ser rei depois da m orte de seu pai. O anjo, pois, agora toca de leve sobre essa guerra, dizen155 O artigo relativo está no gênero feminino. IM Alguns traduzem: “em seu grau"; porém não vejo razão para isso. "tk, al. usado aqui no sentido de 'c o m '; todavia alguns o traduzem literalmente, para seu exército; m as a primeira exposição é preferível. Ou. seja, entre as fortificações, ou entre o povo. O núm ero é trocado, e só pode referirse ao povo. 336 57» EX P O SIÇ Ã O 111.7] do: Brotará um renovo da raiz dessa rainha. M ui provavelm en te, ele era m ais jovem que sua irm ã Berenice. D iz ele: Ele perm a necerá em seu próprio grau, significando na posição régia. É forçada a tradução dos que traduzem: Ele perm anecerá em sua posição de pai. Então, qual deve ser? Ele perm anecerá em sua própria posição; ou, seja, ele chegará a sua própria posição atra vés do direito hereditário. Portanto, em bora a princípio todos pensassem que a morte de Berenice ficaria sem vingança por parte de seu pai, porque este m orreu, aqui o anjo anuncia que seu ir m ão seria sem elhante a um ramo, e veio a ser o vingador dessa grande perversidade. Ele perm anecerá, pois, em sua posição, sig nificando que chegará ao trono real, vindo do ramo ou do gérmen de sua raiz, ou, seja, Berenice. Ele virá com um exército contra Calínico. Escritores profanos testificam desse fato. E virá às p ró p r i a s fortificações do rei do norte. Ele entrou na Síria e causou um tão grande terror que muitas cidades fortificadas foram por ele cercadas. Durante essa guerra, ele tomou para si muitas cidades que pareciam inexpugnáveis; daí não causar surpresa encontrar mos o anjo declarando sua chegada às fortificações. Alguns o tra duzem ‘habitações', porém sem razão, e assim prejudicam a inten ção do Profeta. Ele virá às próprias fortificações, significando que ele chegaria à Síria e possuiria muitas cidades fortificadas. Em seguida, acrescenta: E operará sobre elas, significando que prosperaria; pois esta palavra, quando usada sem qualquer adição, em hebraico im plica a realização de grandes façanhas. Ele prosseguirá e adquirirá poder sobre a m aior parte da Síria, e prevalecerá. Com esta últim a palavra ele explica quão superior ele seria a Calínico. Pois este rei foi enviado por seu irm ão m ais jovem , de cuja fidelidade ele suspeitava, e im aginava ser esse um curso mais seguro para tratar com seu inimigo. M as o jovem Hierax, o falcão, determ inou usar essa expedição para proveito pes soal. Ele não ficara contente com sua própria província da Asia M enor, mas antecipou ser herdeiro exclusivo de seu pai, especi337 [11.8] DANIEL alm ente ao alugar algumas tropas dos gauleses, com as quais in vadira a Á sia M enor, Bitfnia e outras províncias. Ele tornou-se muito enfatuado e foi traído por sua própria cobiça. Seleuco Calínico preferiu fazer as pazes com seu inimigo e fortalecer os recursos de seu irmão. Por fim Hierax desenvolveu m ais e mais a perversidade de sua mente. Pois publicam ente declarou guerra a seu irmão, por cuja assistência pretendia ter vindo, depois de ter sido enviado para firm ar acordo. Seu irmão Seleuco havia lhe prom etido um a porção da Á sia até o M onte Taurus; e quando se viu vítim a de suas ímpias e desgraçadas arm adilhas, abertam ente declarou guerra contra seu irmão. M as p o r fim foi vencido, e assim recebeu o salário de sua im piedade. E assim prevaleceu Ptolom eu Evergete, enquanto partia da Síria depois de espoliar seu inimigo, segundo o que vem a seguir: 8 T am bém seus deuses levará cativos p ara o E gito, c o m seus prín cip es e com seus preciosos vasos d e p ra ta e d e ouro; e continuará m ais tem po que o rei d o norte. 8 A tque etiam deos ipsorum e u m conflatilib u s ip so ru m , e t c u m v a sis p e tio sis ip so ru m ,137auri e t argenti in captivitatem d u c e n t in /£ g y p tu m ,l5‘ e t ipse pluribus annis stabit q uam rex aquilonis. O anjo explica mais plenam ente o que já havia declarado em termos breves, a saber: Ptolom eu seria o vencedor, e espoliaria quase toda a Síria segundo seu desejo. Escritores profanos tam bém nos m ostram o grande núm ero de im agens que foram tom a das, e com o o Egito cobriu seus deuses de prata e ouro, os quais estiveram perdidos por longo tempo. E assim o evento provou a veracidade da profecia do anjo. A partícula DJ, gem , é interposta com o intuito de am pliar o tem a e inform ar-nos da condição desi gual da paz e com o Ptolom eu exerceu os direitos de vencedor ao espoliar toda a Síria segundo sua ambição. A crescenta-se: Ele p e rm a n e c e rá m ais tem p o q u e o re i d o n o rte . Alguns restrin gem isso à duração da vida de cada rei, e outros a estendem mais. 117 Ou. seja, com vasos desejáveis, como anteriorm ente declarei sobre esta palavra. 1,8 Ou. levarão cativos para o Egito seus deuses, juntam ente com suas im agens e seus vasos desejáveis, de prata e de ouro. 338 57* EX P O SIÇ Ã O [11.9-11] O anjo, provavelm ente, fala de Ptolom eu Evergete, o qual reinou quarenta e seis anos. Visto haver D eus estendido sua vida por tanto tempo, não nos surpreende que o anjo tenha dito que sua duração era m aior que a do rei da Síria. E sta explicação é aplicá vel ao presente caso, pois se tivesse m orrido antes, C alínico po deria ter recuperado os resultados da guerra; visto, porém , que Ptolom eu sobreviveu, ele não ousou tentar coisa algum a, estan do certo da total inutilidade de qualquer esforço contra o rei que o vencera. Prossigamos: 9 E n tão o rei d o sul en tra rá em seu reino 9 E t veniet in reg n u m rex au stri, e t redi- e regressará para sua p ró p ria terra. bit in terram suam . E sta sentença pertence ao versículo anterior; com o se ele dis sesse: Ptolom eu regressará em m archa pacífica depois dessa hos til invasão d a Síria. Porque ele poderia nutrir receio de seu inim i go não ser com pletam ente derrotado. M as com o ele partiu com o vencedor, o anjo anuncia sua chegada tranqüila a seu próprio país. A s palavras ‘veio’ e ‘regressou’ são usadas enfaticam ente, deno tando ausência de toda e qualquer im portunação, medo e risco.'59 Ele regressou a seu reino e a sua própria terra, visto não poder confiar n a calm a de seus inim igos a quem deixara prostrados. Prossigamos: 10 S eus ftihos, p orém , se instigarão e reunirão u m a m ultidão d e g ran d es forças; e um certam en te v irá e inu n d ará e passará adiante; e en tão regressará e se in stig ará até ch eg a r a sua fortaleza. 11 E o rei d o sul se exasperará, e sairá, e p elejará c o n tra ele, sim, c o n tra o rei d o norte; este p o rá em cam po grande m ultidão; m as a m ultidão será en treg u e em sua m ão, 10 E t filii ejus provocabuntur. e t congreg ab u n t m ultitudinem c o p ia ru m m agnarum : e t veniendo veniet, inundabit et transibit: re v e rte tu r e t in citab itu r u sque ad m unitionem ejus. 11 T um e x a c erb a b itu rre x austri, e te g ressus pugnabit adversus eum . ad v ersu s regem a q u ilo n is.e t stare faciet, siatuet, muititudinem m agnam , trad etu rq u e m ultitud o illa in m anum ejus. IW A edição de 1617 traz modéstia incorretam ente em vez de moléstia. O erro é corrigido em edições subseqüentes. O leitor do original deve estar preparado para m uitas inexatidões nesta edição. 339 [11.9-11] DANIEL Aqui o anjo passa à terceira guerra, a saber, aquela que o filho de Calínico instigou contra Ptolom eu Filopator. Depois da morte de Evergete, os dois filhos de C alínico uniram suas forças e em preenderam recuperar a Síria, especialm ente aquela parte dela da qual haviam perdido. Quando já se viam em sua expedição, e suas forças já estavam em m archa, morreu o Seleuco m ais velho e seu irm ão sobrevivente era Antíoco, cham ado o Grande. Ptolo meu, cham ado Filopater, que significa amante de seu pai, era então vivo. Ele era assim cham ado em conseqüência do parricídio do qual era culpado, tendo engendrado a morte de seus pais, ju n ta mente com seu irmão. A palavra é aqui usada à guisa de ridículo, e um sentido oposto ao já expresso está im plícito neste epíteto, o qual tem sua própria honra, e expressa a virtude de piedade fam i liar. Ele, porém, m atara seu pai, m ãe e irm ão, e em razão de todos esses ímpios homicídios o nom e de Filopater lhe foi aplicado com o um estigm a de desgraça. Portanto, com o ele veio a ser to talm ente odiado por seu próprio povo, os filhos de Calínico, a saber, Seleuco Gerauno, mais velho, e Antíoco o Grande, pensa ram haver chegado o tem po de reaver as cidades da Síria que haviam perdido. Pois ele era detestado e desprezado em conse qüência de seus numerosos crimes. Portanto anteciparam um p e queno problem a na recuperação de suas possessões, quando seu inimigo era assim estigm atizado com tal infâm ia e granjearam m uitos inim igos dom ésticos. Eis a razão por que o anjo diz dos filhos de Calínico: Serão provocados e levarão um a m ultidão de grandes exércitos. Poderia significar “grandes forças” , visto que alguns historiadores relacionam a coligação de dois exércitos m uitíssim o fortes. A menos que eu esteja equivocado, Antíoco o G rande teve 70.000 a pé e 5.000 cavaleiros. Ptolom eu excedia em cavalaria, visto que tinha 6.000 cavaleiros, porém só 62.000 a pé, com o Políbio nos inform a em seu quinto livro.160 Eram quase Calvino. citando de m em ória, não expressou os números com exatidão. Ver Potibio. lib. v. p. 421, editado porC asaubon. Paris. 340 57® EX P O SIÇ Ã O [11.9-11) iguais em forças, porém a confiança dos dois filhos de Calínico, unicam ente de quem o anjo então fala, foi crescendo quando di visaram seu perverso inim igo tão profundam ente detestado em conseqüência de seu parricídio. Em seguida ele diz: Ele virá. Ele m uda o núm ero, já que o irmão mais velho, sendo o prim eiro filho de Calínico, a saber, Seleuco Cerauno, m orrera enquanto se preparava para a guerra, e dizem que foi morto por seu assistente ao passar pela Á sia Menor. Se esse foi ou não o caso, todos os historiadores são unânim es em afirm ar que Antíoco o Grande, sozinho, levou a cabo a guerra contra Filopater. Ele virá com o um dilúvio que passa adiante. Recuperou aquela parte d a Síria que perdera, e quando aproxim ou-se do Egito, então Filopater veio a seu encontro. H istoriadores profanos afirm am que ele era covar de, e jam ais obteve poder p o r bravura franca, m as tão-som ente por m eio de fraude. Foi tam bém tardo na preparação de suas for ças para resistir seu inimigo. Eis a razão por que o anjo diz: O rei da Síria, ou do norte, virá até as cidadelas, ou fortificações; porque finalm ente Filopa ter se despertou de sua modorra, porquanto jam ais havia tom ado suas armas para repelir um inimigo exceto quando com pelido por prem ente necessidade. D aí acrescentar o anjo: O rei do sul será irritado, ou exasperado. Ele usa o term o ‘exasperado’ por que, com o eu já disse, não teriajam ais feito oposição a seu inim i go A ntíoco não percebera ele que seu reino estava à m ercê de um grande perigo. Poderia ter assum ido pacientem ente a perda da Síria, contanto que o Egito estivesse a salvo; quando, porém , sua vida e todas suas possessões corriam risco, ficou suficientem ente exasperado para desferir o ataque a seu inimigo; e todavia preva leceu, com o verem os a seguir. Não posso com pletar este tema hoje, e por isso corro para o fim. Filopater chegou a ser vitorioso, e todavia a apatia o dom inou de tal sorte que passou a nutrir des confiança de seus amigos e igualmente de seus inim igos, e se viu forçado por esse m esm o medo a fazer as pazes com seu inimigo, 341 [11.9-11] DANIEL ainda que fosse realmente o vencedor. Poderia não só ter recha çado seu inimigo a quem havia vencido; mas poderia ter tom ado posse de seus territórios; porém não ousou fazer isso: era cônscio de ser um parricida, e tam bém sabia que p o r essa conta seu nome veio a ser odioso entre todos os homens. Daí, ainda que superior em força, e realm ente o vencedor de seu inimigo em cam po de batalha, não ousou avançar mais. M as deixarei o restante para explicar noutra ocasião. ORAÇÃO Deus Todo-Poderoso, visto que designaste p ô r ante nossos olhos, como num espelho, aquela tua providência peculiar p o r meio da qual defendeste tua Igreja, concede-nos a bênção de sermos confirmados por meio desses exemplos, a fim de que aprendamos a descansar inteiramente em ti. Em meio a numerosas perturbações, por meio das quais o mundo é hoje tão agitado, que permaneçamos calmos sob tua proteção. E assim confiemos a ti nossa segurança para j a mais nos hesitarmos, seja o que fo r que nos aconteça quanto a nossa futu ra segurança e tranquilidade. O que quer que soframos, que tudo resulte em nossa salvação, enquanto form os protegidos por tua mão; e assim invoquemos teu nome com sinceridade mental, e que te apraz, em troca, revelar-te como nosso Pai, em teu Unigénito Filho. Amém. 342 58a m nossa últim a preleção, explicam os por que o anjo men1 ciona a exasperação do rei Ptolom eu. A não ser que fosse arrastado à guerra, sua disposição era tão apática que preferia que muitas cidades lhe fossem tom adas, do que m over sequer um dedo para im pedir seja o infortúnio ou a perda. M as Finalmente tom ou as armas, ao perceber quão sério e ousado inim igo tinha que enfrentar. Então ele acrescenta: Sairá ao campo de batalha contra o rei do norte, significando Antíoco, rei da Síria. E porá em ordem de batalha uma grande multidão. A referência pode ser a ambos os lados, porquanto Antíoco então trouxe ao cam po de batalha um num eroso exército; tinha 5.000 cavaleiros e 70.000 a pé. Ptolom eu era superior em sua cavalaria, equivalente a 6.000 hom ens. Esta frase se adapta bem ao caso de Antíoco. Ele trará ao cam po de batalha um a grande multidão, e a m ultidão será entregue a suas m ãos, significando m ãos de Ptolom eu. O con texto parece assim fluir m ais facilm ente; mas se alguém preferir considerá-lo com o que aplicável ao próprio Ptolom eu, não dis cutirei a questão. Ela não é de grande im portância, porque o anjo sim plesm ente apresenta a superioridade de Ptolom eu naquela batalha, quando venceu Antíoco o Grande. Além disso, devem os notar que ele não o venceu por sua própria iniciativa nem cora gem nem conselho nem habilidade militar; m as porque o Senhor, que regula os eventos das batalhas, queria, naquela época, descoroçoar a soberba de Antíoco o Grande. A gora podem os ir em frente: 343 [11.12, 13] DANIEL 12 E q u an d o ele tiv e r rem ovido a m uitidão. seu coração se ensoberbecerá; e desen co rajará m uitos dez m ilhares; porém não se rá fortalecido com isso. 12 Et to lle tu r m ultitudo illa, hoc est, sese atlollei, e t e lev ab itu r c o r ejus, e t dejicie! m yriades, hoc est, m agnas copias, e t non roborabitur. O anjo aqui m arca o térm ino da guerra. Tivera a coragem de Ptolom eu corroborado sua boa estrela, e poderia facilm ente asse nhorear-se de todo o reino da Síria, com o relatam os historiado res. Todavia entregou-se de tal m odo a suas próprias luxurias, que de bom grado firmou um pacto com seu inimigo. Em seu regresso a seu reino, m andou m atar sua esposa Eurídice e se fez culpado de outras m onstruosidades; perm itiu que um a m ulher perversa, irmã de A gatocle, vítima de suas paixões, governasse seu reino e, por fim, veio a ser um péssim o exem plo com o ho m em em extrem o cruel e degradado. Portanto, o anjo diz no iní cio que seu exército se elevaria às alturas, e seu coração se en soberbeceria, em conseqüência de sua prosperidade. Ele não só causou terror a Antíoco, m as tam bém a todas as regiões circunvi zinhas. Q uando poderia ter assum ido todo o dom ínio sobre o O riente, em vez disso declinou-se de seu curso. Subjugou, aliás, um exército hostil e, nessa proeza, não foi um m ínim o sequer assistido por sua irm ã A rsinoe, com o relatam os historiadores, mas, depois de grandes m orticínios, não reteve sua posição. E qual foi o obstáculo? Sua ociosidade e bebedice, e de nada cuidar senão de banquetes e orgias, bem com o dos m ais obscenos prazeres. Isso causou sua queda, depois de ter sido elevado às mais altas nuvens por suas vitórias. Vamos em frente: 13 P orque o rei d o norte voltará, e porá em cam po u m a m ultidão ainda m a io rq u e a p rim eira, e d epois d e a lguns anos certam enie virá com um g rande exército e c o m m uitas riquezas. 13 E t redibit rex aquilonis, rex Syrice, et statuet m ultitudinem m ag n am p rx u t ante a ,141 e t c irc ite r fin em 1“ tem porum ann o n im , a d verbum, v eniendo veniet cum exercilu m agno, e t c u m opibus m ag n is.,',:' 11,1 Ou, seja. reunirá um exército m aior que o de anles. 143 Ou. seja, no término, como um tem po fixo. no fim. Ou. ‘m uitos', porquanto há duas palavras no original, “grande e m uito”. 344 58a EX P O SIÇ Ã O 14 E naqueles tem pos m uitos se levantarão c o n tra o rei d o sul; tam bém o s assaitantes d e teu p o v o se exaltarão p a ra estab e le ce r a visão; eles, porém , cairão. [11.13, 14] 14 Et tem poribus illis m ulti stabunt contra regem /E gypti, e t filii dissip ato res populi tui sese attollent, a d stabiliendam visionem . e t corruenc. Aqui o anjo profetiza acerca de outras guerras. Pois prim eira m ente descreve a guerra que foi em preendida por A ntíoco contra os egípcios, depois da m orte de Filopater, que deixou com o seu herdeiro um filho pequeno cham ado Ptolom eu Epifanes. Quan do, pois, percebeu que a terra estava privada de seu rei, formou um exército e invadiu o Egito. Visto que os egípcios não tinham força para resisti-lo, um em baixador foi enviado a Rom a; e sabe mos quão ávidos eram os rom anos em envolver-se em todos os negócios do mundo. C om vistas a estender seu im pério de forma ainda m ais ampla, enviaram im ediatam ente [um m ensageiro] a Antíoco o G rande e lhe ordenaram que desistisse da guerra; po rém depois de dificuldades ele conheceu o insucesso, até que engajou-se num a batalha mui tem erária com Scopas, e por fim obteve a vitória. Entrem entes, os egípcios estavam m uito longe do ócio; ainda que esperassem poder subjugar o im pério de Antí oco, com a assistência do senado, todavia prepararam cuidadosa m ente um a força arm ada propriam ente sua, sob o com ando do general Scopas, o qual foi bem sucedido em m uitos de seus pla nos, porém foi finalm ente derrotado nas fronteiras da Judéia. O anjo agora descreve essa guerra. O rei da Síria voltará, diz ele; significando que, depois da morte de Ptolomeu Filopater, ele descansou por algum tempo, visto não ter tido êxito com suas for ças, que ficaram tão totalmente desorganizadas que não consegui am confiar no sucesso de qualquer expedição. Porém cria que o Egito não lhe seria problema, já que perdera sua cabeça e jazia com o um cadáver inânime. Então sentiu-se reanimado com nova confiança, e voltou ao Egito. E arregimentará uma multidão m ai or que a primeira. Ele tinha um grande e poderoso exército, como já dissemos, e um a nobre força armada de cavalaria: tinha 70.000 a pé e ainda reuniu forças mais numerosas. O anjo tem em mente a 345 (11.14] DANIEL futura chegada do rei da Síria, após um intervalo de certo tempo. N o fim dos tempos dos anos, ele certamente virá, ou, seja, irrom perá. E com o se anjo usasse essa expressão com o intuito de au m entar a infalibilidade do evento; porque a princípio ele despre zou os romanos em conseqüência da grande distância que ficavam dele, e não arreceava o que pudesse ocorrer depois. Ele nunca su pôs que tivessem tal ousadia ao ponto de cruzar o m ar contra ele. Em seguida, acrescenta: E naqueles tem pos m uitos se levan tarão contra o rei do sul, ou Egito. O anjo insinua que A ntíoco o G rande não seria seu único inim igo; e historiadores nos infor mam de seu acordo e aliança com Filipe, rei de M acedônia, para levar a bom term o essa guerra. Sem dúvida, os dois reis instiga ram toda a Á sia M enor, e se tom aram tão irm anadam ente pode rosos, que muitos se sentiram estim ulados a tom ar seu partido. É com o se todos estivessem contra o reino do Egito, e por isso o anjo diz: m uitos se levantarão contra o rei do sul. E acrescenta: e seus filh o s dissipadores. Os hebreus cham am ‘assaltantes’ pheritzim . A raiz desta palavra é y~\D, pheretz, que significa que brar ou dissipar, e às vezes destruir. Sem dúvida, o anjo aqui usa a palavra para denotar hom ens facciosos, porque o povo não ti nha nenhum a outra chance de erguer-se, exceto perm anecendo quieto e unido. A palavra, pois, se aplica aos que violavam essa unidade; pois quando alguém aderia a m onarcas estrangeiros, a Judéia ficava exposta com o presa ou dos sírios ou dos egípcios. Alguns intérpretes aplicam esta passagem ao jovem Onias, o qual apoderou-se de Heliópolis e arrastou alguns exilados com ele, e ali construiu um tem plo, com o aprendem os de Josefo e do livro de M acabeus. Pois pretendia ter a profecia de Isaías, capítu lo 19, em seu favor, onde lemos: E haverá um altar [dedicado] a D eus no meio do Egito [v. 19]. Sem dúvida, o Profeta aqui prediz o alargam ento do reino de Deus através da propagação de sua religião por todo o mundo. Como o Egito ao grau m áxim o se devotara à idolatria, Isaías aqui m ostra com o o culto puro e per346 58* EX P O SIÇ Ã O [11.141 feito, oferecido a Deus, prevaleceria no Egito. Com o se quisesse dizer: A inda os egípcios, que até aqui têm feito tudo para abolir a genuína e sincera piedade, serão congregados ao povo de D eus e o cultuarão aceitavelm ente. Sabem os que o Profeta está aqui tra tando, figuradam ente, do reinado espiritual de Cristo, e está sem pre transportando as sombras de seu próprio tempo. Com a pala vra ‘altar’ ele sim plesm ente tem em m ente o culto divino. A que le impostor, Onias, quando erigiu seu tem plo profano e poluiu o altar sagrado, gabou-se de estar cumprindo essa profecia de Isaías. Este, pois, é o significado da passagem: Os filh o s - dissipa dores de teu povo - se exaltarão para estabelecer a visâo\ ou, seja, sob um pretexto falaz de cum prir a predição de Isaías, e todavia fracassarão. É possível tam bém que tenha um sentido indefinido, com o se o anjo declarasse que essas m ultidões não apareceriam , a não ser mediante o conselho secreto de D eus. Sa bem os quanto este pensam ento tende a clarear o sofrim ento dos santos e quanta consolação ele traz quando reconhecem os que todos os tum ultos do m undo em anam do conselho estabelecido de Deus. N ada. pois, parece acontecer ao sabor da sorte, senão que os m ortais são agitados porque Deus deseja infligir-lhes seus castigos e a Igreja é am iúde abalada porque Deus deseja provar e exam inar a paciência de seu povo. Portanto, podem os tom ar esta profecia em sentido absoluto; como se o anjo dissesse: Esses após tatas e dissipadores nunca propuseram cum prir esta profecia de Isaías, e todavia nada houve de confuso ou fora de ordem em todos esses eventos, visto que D eus estava cum prindo o que h a via testificado através de seus próprios profetas. R azão por que podem os receber esta predição sim plesm ente com o fazem os com outras sem elhantes esparsas por todos os profetas. Já ouvim os com o o Profeta estava avisando de antem ão sobre as m uitas an gústias da Igreja, com o propósito de levar os fiéis a aquiescerem na Providência de Deus, quando vissem as coisas por dem ais con turbadas por todo o mundo. Vamos em frente: 347 [ 11 . 15 , 16] D A N IE L 15 E n tão o rei d o norte virá, e subirá a um m onte e to m a rá as cidades m ais fortificadas; e o s b raços d o sul não resistirão, nem seu povo e scolhido, nem haverá força algum a q u e resista. 15 E t veniel rex aquilonis e t fundei aggere m ,1“ e t cap iet u rbem m u nitionum ; et brachia austri, hoc est, AUgypií, non stabunt, neque populus electorum ejus, neq u e virtus erit ad standum . O anjo avança no mesmo sentimento. D iz ele: Quando Antíoco o G rande avançar com ímpeto, não haverá coragem nos egíp cios que possa resisti-lo, porque ele tom ará um a cidade fortifica da. H á um a m udança de número aqui, pois ele quer dizer cidades fortificadas. Porque recuperaria as cidades que anteriorm ente havia perdido, e chegaria à cidade de Raphia, no Egito. Segue-se a explicação: Os braços do Egito não resistirão, nem o povo de seus tributos. Isso se relaciona com Scopas, que foi enviado com grandes forças; a princípio ele prosperou, porém foi em seguida vencido no conflito, e não teve coragem de perseverar em sua resistência. Vamos em frente: 16 M as aquele que vem c ontra e le fará o q u e bem entender, e ninguém poderá resistif d iante dele; e e stará n a terra gloriosa. a qual. por sua m ão. se rá consum ida. 16 Et faciet veniens ad eum pro benepiacito suo, hoc est, pro suo libidine, et nullus stab it coram facie ejus, e t stab it in terra d e sid era b ili, e t co n su m etu r, alii nomen esse volunt, consumpiio, in m anu ejus. O anjo prossegue com o m esm o discurso. D iz ele: Antíoco o G rande satisfará seus desejos e espalhará o terror de seus braços em todas as direções e assim ninguém ousaria opor-se-lhe. P or tanto, fa r á o que bem entender, diz ele, e ninguém resistirá dian te dele; e estará na terra desejável; significando que ele traria seu exército vitorioso à Judéia, e haverá um a grande devastação debaixo de sua m ão; ou a Judéia será consum ida e arruinada sob sua mão. Originalm ente declaram os que a m issão do anjo não o autorizava a tratar esses eventos com o as façanhas m ilitares cos tum am ser narradas pelos historiadores. O que está revelado é bastante para levar os fiéis ao reconhecim ento da contínua consi deração divina por sua segurança. A experiência tam bém nos asse‘ Ou. seja. ele edificará sobre um monte e fará subir pedras, m adeira e terra. 348 58* EX P O SIÇ Ã O (11.16] gura que cada ocorrência é do pleno conhecim ento de Deus, e assim devem reconhecer com o tudo tendia a prom over seu bemestar. As predições divinas de eventos futuros nunca foram sem propósito, e o anjo agora declara a vinda futura de Antíoco à terra desejável. A presentam os previam ente a razão para o uso desse epíteto com o aplicado à Judéia - não através de algum a excelência natural acima das dem ais terras, m as porque D eus a escolhera para si com o a sede de sua habitação. A excelência dessa terra dependia inteiram ente da graciosa beneficência divi na. Pode parecer inconsistente outorgar tal licença a um tirano e ladrão tão ímpio e perm itir-lhe arruinar a Judéia, a qual Deus distinguira com um a honra tão peculiar, adotando-a com o sede de sua habitação e cham ando-a sua residência [Sl 132.14]. Sabe mos, porém , que a Igreja, enquanto prossegue em sua peregrina ção neste mundo, não desfruta da isenção de inúm eros sofrim en tos; porquanto é proveitoso para os filhos de D eus que sejam hum ilhados sob a cruz, a fim de que não cresçam em rebeldia neste mundo, renunciem às luxurias e arrefeçam os desejos da carne. O anjo deveras om ite a razão pela qual Deus perm itiu que Antíoco assim cruelm ente oprim isse a terra santa; os fiéis, po rém, tinham sido instruídos pela Lei e pelos Profetas com o a Igreja estava sujeita a várias tribulações. É suficiente, pois, relacionar o evento com a simplicidade: e a terra aprazível será consum ida sob sua m ão, ou haverá um a devastação. Pouco im porta de que m aneira lemos no que diz respeito ao sentido. O anjo aqui enco raja a Daniel e aos dem ais ao exercício da paciência, para que não desm aiassem sob o azorrague divino. Pois Deus perm itiu a A ntíoco peram bular com o um ladrão e a exercer severa tirania e crueldade contra os judeus. Não carece discutirm os esses even tos em m aior extensão, com o se encontram nos livros dos M acabeus. Apenas tocarei de leve num ponto: não foi de iniciativa própria que Antíoco apoderou-se dos judeus guiando seu exérci to a seu país, m as foi fom entado pelos sacerdotes ímpios. Tão 349 [11.17] DANIEL grande foi sua perfídia e barbarism o que espontaneam ente traí ram o tem plo divino e expuseram a nação às m ais angustiantes calam idades. Essa foi um a provação dem asiadam ente severa; daí D eus consultar os interesses de seus próprios adoradores, predi zendo eventos que pudessem enfraquecer sua confiança e leválos a c e d e r ao desespero. Prossigamos: 17 E tam bém d irig irá seu rosto para v ir c o m a potência d e todo seu reino, e com e le o s retos; e assim ele fará; e lhe d a rá um a filha d e m ulheres, p a ra corrom pê-la; e la, p orém , não ficará a seu lado nem será para ele. 1 7 E tp o n e t fa c ie m su a m '“ ad veniendum c u m potentia to tiu s regni. ec rectiiudines cum e o :1“ e t faciet, e t filiam m u lierum dabit illi a d p erd en d u m eam . sed non stabil ipsa, e t non e rit ipsa e i.167 Ele aqui descreve a segunda guerra de Antíoco contra Epifanes, o qual então fazia aniversário; e assim lhe deu sua filha Cleópatra em matrim ônio, esperando com isso, por meio de m aqui nações sutis, subjugar o reino do Egito. Porque pensava que sua filha perm aneceria fiel a seus interesses; ela, porém , ao contrá rio, preservou sua fidelidade conjugal a seu esposo e não hesitou em esposar os conflitos de seu esposo contra seu pai. Ela fiel m ente aderiu aos interesses de seu esposo, segundo seu dever, e nunca deu ouvidos aos astutos desígnios de Antíoco. E assim ele se viu privado de sua expectativa, e sua filha nunca chegou a ser instrum ento para a aquisição de sua autoridade sobre o Egito. Antes das núpcias de sua filha com Ptolom eu, ele havia experi m entado os efeitos da guerra, m as nisso fracassara; e quando per cebeu a interposição dos romanos, desistiu de futuras hostilida des, e consolou-se com o pensam ento que já expressam os, a sa ber, de receber assistência im ediata contra o Egito pela instrum entalidade de sua filha. Portanto, ele torna a vir com todo o 145 O u. seja, ele volverá para si mesmo. lw Alguns traduzem: “os retos”, plurai (recti). “com ele”. A cópula pode ser supérflua, com o amiúde a encontram os nas Escrituras. Devem os lê-la num só contexto - ele fará aliança com ele. como vimos antes. I6? O u. seja, não obedecerão a sua vontade, nem ficarão com ele. 350 58* EX PO SIÇ Ã O [11.17] poder de todo seu reino] significando que ele arregim enta todas suas forças para esm agar Ptolom eu Epifanes, que era então ainda jo v em e não havia obtido nenhum a grande autoridade, nem che gado à sólida sabedoria e discrição. Quando percebeu sua falta de êxito na fortuna da guerra, ele lhe deu a filh a das mulheres, se referindo a sua beleza. Essa é a explicação dos intérpretes, os quais presum em estar im plícita nesta frase sua extraordinária beleza. Q uanto à próxim a sentença, os que a traduzem e com ele os retos pensam que os judeus estão subentendidos, pois A ntíoco os havia recebido em rendição e houve muitos que esposaram pu blicam ente sua causa. Pensam que os judeus eram assim cham a dos com o um sinal de honra e com o retos em relação ao culto divino. M as isso me parece forçado dem ais. Não hesito em supor que o anjo esteja m agnificando o caráter superior do acordo entre Antíoco e Ptolom eu, quando o prim eiro descobriu a im possibili dade de obter o reino de seu adversário através da guerra franca. Em bora os rom anos não tivessem ainda enviado algum regim en to, contudo Antíoco com eçou a tem ê-los e a preferir o uso da astúcia em prol de seus próprios interesses. Além disso, com o mencionei há pouco, ele estava ávido noutra presa, pois im edia tam ente transferiu a guerra para a Grécia, com o o anjo nos infor mará. M as prim eiro anuncia: a doação de sua filh a redundará na destruição dela. Ele aqui reprova o artifício de A ntíoco o G rande em vender assim sua Filha, com o se ela fosse um a meretriz. Até onde lhe foi possível, ele a induziu a assassinar seu esposo, quer por meio de envenenam ento ou outros artifícios. Daí, ele lhe deu a filh a para destruí-la, mas ela não perm aneceu de seu lado nem fic o u a seu favor. Q uer dizer, ela não assentiu com os ímpios desejos de seu pai e se indispôs a favorecer um a perversidade tão m onstruosa. Lem os nos escritores profanos o cum prim ento des tas predições do anjo, e assim m ais claram ente transparece com o D eus pôs diante dos olhos dos santos um espelho no qual pudes 351 [ 11 . 18] D AN IEL sem visualizar sua Providência em governar e preservar sua Igre ja . A gora podem os prosseguir: 18 D epois d isso ele v oltará seu rosto p a ra as ilhas, e tom ará m uitas; m as um príncipe fará c essar seu opró b rio c o n tra ele, e a in d a fará recair sobre ele seu opróbrio. 18 E t vertet faciem su am ad insulas, et capiet m ultas, e t q u iesce re faciet, h o c est, retorquebit, p rin c e p s o p p ro b riu m ejus apud ipsum . Id e o non to rq u eb il op p ro brium suum in ipsum . H á um a certa obscuridade nestas palavras, mas a história pos terior determ inará a intenção do anjo. Prim eiro, quanto à palavra ‘ilhas’, indubitavelm ente tem em m ente a Á sia M enor e as costas m arítim as; tam bém a G récia, Chipre e todas as ilhas do M ar M editerrâneo. Era costum e judaico cham ar de ‘ilhas’ todos os lugares de além mar, visto não terem qualquer habilidade com navegação. Portanto ele diz: voltará seu rosto para as ilhas: ou, seja, ele se volverá para as regiões opostas do mundo. Sabe-se m uito bem que o M ar M editerrâneo se interpunha entre a Síria e a Á sia M enor; tam bém a Cilicia fica entre elas, as quais estavam tam bém sob o dom ínio de Antíoco, em bora a sede de seu poder fosse a Síria. D aí cham ar de ilhas a Á sia M enor, G récia e o M edi terrâneo, todas as ‘ilhas’, com respeito à Síria e à Judéia. Isso ocorreu quando os etolianos renovaram a guerra depois da derro ta de Filipe. Os rom anos foram os originadores dessa guerra na G récia, e tiveram o honroso pretexto de libertar toda a G récia depois que Filipe M acedônio se assenhoreou de muitas cidades mui habilm ente fortificadas. Os etolianos, porém , foram dom i nados pela soberba e se inflaram com o desejo de superioridade, com o finalm ente o provou o próprio acontecim ento. G abaram -se de ser os libertadores da Grécia; usaram o auxílio dos romanos, mas declararam ser os principais líderes na guerra, e quando vi ram a Chalcis e outras cidades apoderadas pelos rom anos, o espí rito de inveja tom ou posse deles. Tito Flam ínio retirou suas guar nições de suas cidades, porém os etolianos ainda não ficaram satisfeitos, porque queriam a preem inência unicam ente para si e a partida definitiva dos romanos, C om isso em vista, enviaram 352 5 8 a EX P O SIÇ Ã O [11.18] seus em baixadores a Nabis, tirano dos lacedem ôníos, ao rei Fili pe e tam bém a Antíoco. Thoas foi o principal autor dessa conten da, porque, depois de instigar as nações vizinhas, aliou-se a A n tíoco. Q uando os etolianos se envaideceram ante as grandes pro messas que ele havia feito, esperavam produzir a paz por toda a G récia sem a m ais leve dificuldade. Entrem entes, A ntíoco só avançou até a Á sia M enor, e apenas com um pequeno regimento. Levou com ele Haníba!. cuja fam a por si só inspirava medo nos romanos; e tivera aceito seu conselho, certam ente não teria tido dificuldade algum a em repelir os romanos. M as os bajuladores de sua corte não adm itiram os conselhos de H aníbal para persua dir esse rei insano. Então Villius tam bém sagazm ente tornou A ntíoco suspeito de seu conselho; por ter sido enviado com o em baixador à Á sia M enor, ter-se insinuado em seu favor e adqui rido sua am izade e assim engajado em confabulação diária com ele, que A ntíoco suspeitou d a fidelidade de Haníbal a seus inte resses. D aí ele levar a cabo aquela guerra inteiram ente sem m éto do nem plano nem perseverança. A ssim que chegou em Chalcis, se viu golpeado pela paixão por um a donzela, fazendo celebrar um néscio casam ento com ela, com o se estivesse em tem po de plena paz. E assim ele teve um cidadão de C halcis p o r seu sogro, enquanto ele mesmo era o poderoso monarca, inigualável no m un do inteiro. Em bora se conduzisse assim inconsideradam ente, to davia a celebridade de sua fama, mais que suas ações pessoais, o capacitou a princípio a tom ar muitas cidades, não só na Ásia M enor e na costa do M ar M editerrâneo, mas tam bém na própria Grécia. Ele recobrou C halcis e outras cidades tom adas pelos ro manos. O anjo relata isso com o se o evento já tivesse ocorrido, e no entanto somos informados que todos eles teriam lugar ainda no futuro. E le volverá seu ro sto p a r a as ilh as e to m a rá m u ita s, e um g en era l o f a r á c e ssa r e volverá seu o p ró b rio c o n tra ele m es m o. Antíoco lutou contra os rom anos com m uita freqüência, e 353 (11.18] DANIEL sem pre sem êxito, ainda que, às vezes, pensasse ser superior; mas desde o tem po em que Atílio, prefeito das frotas, interceptava seus suprim entos, e assim interrom peu seu progresso, o cônsul M. A cílio com eçou a granjear o senhorio da terra, então seu po der veio a ser gradualm ente mais e mais debilitado. Q uando ven cido num a batalha naval por Lívio, o pretor, ele sofreu um a seve ra perda, e então, quando tarde dem ais reconheceu seu erro em não obedecer aos conselhos de H aníbal, já tinha perdido a opor tunidade de prorrogar a guerra. D aí o anjo dizer aqui: Um líder fa ria seu opróbrio reverter-se contra ele mesmo. Isso significa o quanto A ntíoco se encheria de tola soberba, e com o suas insanas vanglorias ricocheteariam sobre sua própria cabeça, um a vez que as havia vom itado com boca escancarada contra os rom anos. Ao falarm os aqui de sua desgraça, interpreto isso em term os ativos, significando que seu opróbrio permaneceria; pois a palavra n D in , chereptheth, significa opróbrio, porém há duas form as de interpretá-la, ativa e passivam ente. M as, com o eu já disse, o anjo mais provavelm ente fala de sua louca vanglória, porquanto desprezou os romanos com desdém e insulto. Sabem os quão loucam ente os insultara através de seus em baixadores em todas as assembléias da Grécia. Um líder, pois, seja A cílio ou Lúcio Scípio, que os levou para além do M onte Tauro,/<?z sua desgraça p a ira r sobre si, e ele não evitou sua própria desgraça; ou, seja, A ntíoco vo mitou seus reproches contra os romanos com repulsiva soberba, porém com total futilidade. Toda essa desditosa gabolice se con verteu em nada, e jam ais injuriou os romanos um m ínim o se quer; mas aquele líder, seja Lúcio Scípio ou Acílio, segundo m i nha afirm ação, reverteu tais reproches contra ele m esm o, pelos quais esperava pôr os romanos prostrados, mas não viraram nada, senão vento. O anjo, pois, desdenha do orgulho de Antíoco, di zendo: Um líder virá que devolverá esses reproches a seu autor, e os im pedirá de prejudicar tal líder ou os romanos. Ele tom a a cabeça com o representante de todo o corpo. 354 58* EX P O SIÇ Ã O ORAÇÃO Deus Todo-Poderoso, visto que te agradas exercitar nossa confian ça, não nos permitindo nenhum descanso fix o ou estável sobre a ter ra, fa z com que aprendamos a descansar em ti enquanto o mundo gire em torno de si mesmo vezes sem f i m Faz com que jam ais duvide mos de nossa proteção sob tua mão ou da perpétua cooperação de todas as coisas para nosso bem. Embora não estejamos além do al cance dos dardos, porém dá-nos consciência da impossibilidade de sofrermos qualquer ferid a letal enquanto estendes tua mão a proteger-nos. Que tenhamos plena confiança em ti e jam ais cessemos de marchar sob teu estandarte com coragem constante e invencível, até que, p o r fim , sejamos congregados naquele ditoso descanso que pre paraste para nós no céu, por Cristo nosso Senhor. Amém. 355 59a 19 V irará en tão seu rosto para as fortalezas d e sua própria terra, m as tropeçará e cairá, e n ã o será achado. 4 19 E t vertei facíem suam a d m unitiones te r r a suse, e t im pinget, e t cad e t, neque invenietur. A qui se denota ou o vil fim de Antíoco, que foi m orto num tum ulto popular enquanto espoliava o tem plo de Belus, ou se descreve outro evento da guerra entre ele e os romanos. E ssa guerra foi conduzida sob os auspícios de Lúcio Scípio, porque Cneio Scípio, o conquistador da África, se oferecera para ser generalde-divisão de seu irmão, e depois de sua morte aquela província lhe foi confiada. M as, com o já dissemos, os recursos de Antíoco tinham sido suprim idos antes disso. Ele havia perdido as cidades da Á sia, e se as tivesse cedido no princípio poderia ter tranqüila m ente retido a m aior parte da Á sia M enor. M as, com o estendeu suas asas sobre a Grécia, e esperava por esse m eio tornar-se to talmente senhor de toda a G récia e M acedônia, não pôde induzirse a retirar suas guarnições daquelas cidades, m as por fim foi com pelido a desistir da Á sia Menor. D essa form a, pois, o anjo descreve o progresso d a guerra, dizendo: Ele volverá seu rosto para as fortificações de sua própria terra; ou, seja, quando com pelido a abandonar a Grécia, ele recorre aos lugares fortificados. Sentia-se bem seguro ali, e num a região que desfruta de paz sufi ciente; ele contava com cidades quase inexpugnáveis de todos os lados e pareciam estar livres de guerra. Os historiadores relatam isso com o tendo sido feito pela habilidade de C neio Scípio. Pois seu filho era então um cativo sob Antíoco, e ele sabia possuir 356 5 9* EX P O SIÇ Ã O [11.19] m aior autoridade que seu irmão, em bora só possuísse o título de general-de-divisão. Registram a persuasão de Antíoco de não ten tar sua sorte por algum envolvim ento decisivo. Por mais que seja assim, é evidente que ele delongou a luta até que fosse com peli do pelo senso de hum ilhação, visto que todos os hom ens o acusa vam de covardia em não ousar tentar a saída de um envolvim ento quando possuía um exército tão numeroso. Os rom anos raram en te tinham tom ado o cam po contra um regim ento tão forte, e no entanto, segundo a narrativa de Tito Lívio, nunca dem onstraram m enos terror ou preocupação. A extensão das forças de Antíoco é realm ente aparente à luz do m orticínio que ocorreu; num só dia 50.000 hom ens pereceram ; e isso seria quase incrível não fosse os testem unhos num erosos e fidedignos. D essa form a o anjo dis se: Antíoco voltaria, visto que ele não saiu a encontrar Lúcio Scípio, m as suportou sua passagem. Tivera ele dado o m enor si nal de resistência, sem dúvida Filipe teria em sua m ão e poder toda a força dos romanos. De fato m uitos declararam ser precipi tada a conduta de Lúcio Scípio, ao ousar perm itir a Filipe tal licença, visto que recentem ente tinha sido vencido e ainda estava exasperado em conseqüência da perda e o infortúnio que havia sofrido. Pois se A ntíoco tivera ficado em alerta para rechaçar o inimigo, teria acabado com o exército rom ano naqueles desfila deiros estreitos e escarpados; mas, com o já dissem os, ele m ante ve seu exército no ócio e na luxúria entre as cidades fortificadas. Se porventura se preferir outro e mais provável sentido, a senten ça se aplica a sua hum ilhante retirada para a Á sia distante, onde caiu assassinado pela população rústica. Ele cairá e não será achado. De fato Antíoco continuou a reinar desde o período da destruição de seu exército e de sua aceitação das condições que os romanos lhe impuseram. Obteve paz, porém não sem o paga m ento de um a pesada m ulta enquanto retinha o título de rei. Em bora se unisse aos rom anos num honroso tratado, todavia foi for çado a retirar-se para além do M onte Tauro, a pagar um a grande 357 [11.19] D A N IE L som a em dinheiro por conta das despesas da guerra, a dar garan tias e a dividir os navios em partes iguais com os rom anos. N este últim o caso, ele foi grosseira e fraudulentam ente enganado, pois L úcio Scípio ordenou que todos os navios fossem feitos em p e daços e os materiais entregues a Antíoco, para quem eram total m ente sem o mínimo valor. Ele bem sabia ser o hom em fraudu lento e incansável, e assim o tratou com barbarism o, segundo seus méritos. No que diz respeito aos reféns, acham os A ntíoco e Dem étrio, seus filhos, com o reféns em R om a até depois de sua morte. D e fato ele foi deixado em paz, m as foi privado das cida des da Á sia Menor, a dirigir-se para além do M onte Tauro. A que les desfiladeiros foram os limites de seu im pério; um a parte da Á sia foi designada a Eumenes, e muitas cidades se tornaram in dependentes. Antíoco, com o fim de ocultar sua desgraça, fez troça dela, dizendo que havia adm inistrado habilm ente, pois o governo d a Á sia M enor lhe constituía um grande problem a. Ele tinha outro reino, am plo e opulento, com o qual poderia m uito bem contentar-se. Até aqui não passei de um adm inistrador da Ásia, costum ava dizer, e os rom anos me têm aliviado dessa in cum bência. Q uando, pois, o anjo diz; D epois d e su a q u e d a n ã o m ais s e rá rei, isso pode ser entendido com o sendo um a referência a sua m orte ignom iniosa que se seguiu pouco tem po depois. Sua avareza era insaciável, e quando com pelido a pagar um grande tributo aos rom anos, pretendeu estar reduzido a extrem a pobre za; então quis espoliar o tem plo de Júpiter D odoneus, e foi m orto ali durante um tum ulto. Esta últim a frase deve referir-se propria m ente a esse evento, pois o rei Antíoco não foi encontrado, por que esses rústicos o m ataram no tum ulto que surgiu. Então vem a seguir Seleuco, que foi seu prim eiro sucessor. Ele tinha três fi lhos: Seleuco, a quem muitos cham am C erauno, então Antíoco Epifanes e Dem étrio. Concernente a Seleuco, o anjo prossegue falando: 358 5 9 “ EX P O SIÇ Ã O 2 0 E ntão em seu lu g ar se levantará q uem fará passar um arrecad ad o r d e im postos n a g lória d o reino; porém d entro d e pouc o s d ias e le se rá d estruído, e isso sem ira e sem batalha. [11.20] 2 0 Et stab it su p er locum ejus transire faciens exactorem in h o n o re re g n i,164 et d iebus p aucis c onteretur, idque non ira, neque in prselio. Seleuco, sabe-se m uito bem , não sobreviveu a seu pai por m uito tem po, pois ele foi assassinado ou por veneno ou por seus dom ésticos. A suspeita recaiu sobre seu irm ão Antíoco, que foi enviado de volta a seu país depois que se soube da m orte de seu pai. D em étrio foi retido sozinho, que depois escapou, fugindo, pois deixou a cidade sob a pretensão de caçar, e seguiu à margem do Tigre até Óstia, onde em barcou num pequeno navio, preferin do correr todos os riscos a perm anecer em perpétuo banimento. Concernente a Seleuco, diz o anjo: em seu lugar se levantará, significando que ele sucederá por direito hereditário ao ofício de Antíoco o Grande. E assim ele fa r á p a ssa r um exator. Há quem traduz: ele levou em bora o exator; pois o verbo "Q P, gneber, em hifil, significa levar embora. Os hebreus usam o verbo desta clá usula no sentido de excluir. Alguns intérpretes pensam que essa linguagem im plica elogio a Seleuco por ele ter reduzido os tribu tos im postos por seu pai; os historiadores, porém , m ostram que esse ponto de vista é falso, e condenam sua avareza e rapacidade. E m alguns pontos, ele era superior a seu irm ão A ntíoco; em bora fossem tanto concupiscentes quanto cruéis para com os que os cercavam. Em virtude de despesas exorbitantes, ele não pôde ser m oderado e tolerante para com seus súditos; pois a luxúria e pro digalidade sem pre arrastam consigo a crueldade na exação de tributo. Pois aquele que é assim pródigo deve necessariam ente extrair de seu povo o próprio sangue. Com o Seleuco havia assim se devotado à vida perdulária, este sentido é m uito apropriado ele fe z passar um exator, significando que ele estabeleceu novos e vigorosos im postos sobre todos seus súditos. N ada, senão isso, ,w Alguns traduzem esta palavra como se estivesse em oposição à última: “a honra ou glória do reino.” 359 [11.21] DANIEL se diz dele, já que im ediatam ente foi morto, com o a segunda clá usula do versículo nos informa. Se preferirm os tom ar as palavras - a glória do reino - à guisa de oposição, Seleuco será elogiado com o um a honra e um ornamento. Eu, porém , penso que deve mos suplem entar a letra b , l, e entender a passagem assim: A q u e le que fiz e r o exaíor p a ssa r [pela terra] fica rá em seu lugar e será destruído em poucos dias. Pelo verbo ‘destruído’ ele quer dizer um a m orte sangrenta. M as não em ira, diz ele. Perguntom e por que alguns o traduzem “em conflito m útuo” ; porque, por essa palavra, os hebreus entendem ‘ira’ ; significando que ele não pereceria em guerra aberta, nem no curso de um a batalha, mas pelas mãos de seus domésticos. Os historiadores diferem quanto ao tipo de m orte que ele sofreu, dizendo alguns que ele foi enve nenado; e outros, que foi m orto à espada. E ssa diferença, porém, não é de nenhum a importância. Antíoco Epifanes em seguida o sucede. 21 E em seu lu g ar se levantará um a pess o a vil. a q uem lhe clarão a honra d o rein o; m as e le v irá pacificam en te e o bterá o rein o por m eio d e adulações. 21 Et stabit su p er locum ejus probrosus, e t non d ab u n l e i,M d e co re m re g n i,1’“ et veniet c u m pace. et a pprehendet regnum per blanditias. Os historiadores concordam em representar A ntíoco Epifa nes com o alguém de um a disposição m uito capciosa, e há quem declara que sua partida de R om a foi m otivada por questão escu sa. M ui provavelm ente foi ele dispensado pelos rom anos diante das notícias da m orte de seu pai, um a vez que estavam contentes com seu irm ão Demétrio. C ontavam com outros reféns além des se, que eram dentre os chefes mais nobres da terra, bem com o esse terceiro filho do rei. Por m ais que isso fosse assim , todos concordam em discorrer sobre sua astúcia. Ele era tão cruel e feroz, que Políbio diz ser ele cham ado Epim anes à guisa de alcu nha, e visto que assum ira nom e tão ilustre, passou a ser cham ado 169 Ou, seja, não confiarão nele. in Ou, seja, não lhe conferirão a glória do reino. 360 59* EX P O SIÇ Ã O [11.21] o Louco, em razão de sua disposição turbulenta. Era um monstro entum ecido com vários vícios; sendo de um tem peram ento servil e bajulador, tudo fazia para adquirir o favor de R om a por m eio de artifício, com o m ais adiante descobrirem os. M as quando não es tava sob o efeito do medo, sua crueldade e ferocidade eram além de todos os limites. Por essa razão ele é cham ado desprezível. Era tido em certa estim a em Roma, e foi recebido por um a por ção de seu povo com estrondoso aplauso. Ele, porém , nunca se viu revestido com qualidades heróicas nem ainda régias, porque foi sem pre bajulador dos rom anos e dos cidadãos granjeava seu favor da m esm a forma, até que veio a seu reino na qualidade de suplicante. E então o anjo o cham a um ser desprezível ou vil. É possível apresentar outra razão igualm ente provável, a saber: apoderar-se ele do trono por m eio de fraude e atos de perversida de, após haver-se descartado do herdeiro legítimo. Pois Seleuco deixou um sucessor a quem esse pérfido conspirador privou de seus direitos, e assim fraudulentam ente adquiriu para si o reino. Sabem os com que im portância D eus cham a a cada um, e com o ele restringe os hom ens de precipitadam ente arrogar algo para si, visto que devem estar sem pre satisfeitos com aquela posição que lhes é designada por Deus. Visto, pois, que A ntíoco assenhoreou do reino sem qualquer direito a ele, e expulso o herdeiro legíti mo, ele se tom ou desprezível aos olhos de Deus, e jam ais teria sido rei exceto por m eio de violência e tirania de sua parte, bem com o por meio de artifícios enganosos e astutos. N ão hesito em declarar que o anjo aqui censura a conduta perversa de Antíoco, cham ando-o desprezível em decorrência da ausência de toda e qualquer nobreza de sentimento. Em seguida ele acrescenta: N ão lhe conferirão a honra da realeza. Com estas palavras ele anuncia a injustiça de seu reina do por não haver sido escolhido m ediante os votos do povo. Já declaram os que o filho de Seleuco teria reinado sem qualquer disputa, porém a m esm a pessoa que deveria ter sido o guardião 361 [11.22] DANIEL de seu sobrinho, perversam ente privou seu protetor de sua heran ça patem a. D aí o anjo falar dele antes com o um ladrão, e não com o um rei, porquanto se apossara do reino sem ser eleito pelo voto popular. Prossegue: virá em paz e se apoderará do reino por m eio de adulações. Esta é a explicação da últim a cláusula. Pode-se perguntar: de que form a ele privou seu sobrinho de seu reino? A resposta é: ele virá pacificam ente, significando que ele refrearia tudo quanto estivesse agitando sua m ente e não se van gloriaria publicam ente de ser rei, porém agiria fraudulentam ente no caráter de guardião até que tivesse o poder de destruir seu protetor. Ele virá, pois, pacificam ente, e se apossará do reino po r m eio de adulações. E assim vemos a intenção do anjo nestas palavras. Além disso, em bora D aniel não visse todas essas coi sas, nem ainda m uitos dentre o povo eleito, todavia tiveram so bejas experiências do conforto provindo dessas profecias, banin do de suas mentes toda ansiedade. Foi-lhes perm itido perceber D eus falando através de seu anjo, e a experiência lhes ensinou a veracidade de tudo o que se acha contido aqui, ainda quando m uitos eventos lhes estivessem ocultos. M as era o objetivo de Deus sustentar os espíritos dos piedosos, ainda até o advento de Cristo, e reter-lhes sua tranqüilidade em m eio às m ais profundas conturbações. E assim reconheceriam o valor da prom essa do Redentor, segundo fora descrito, com o se m encionará no final do capítulo. A gora continuarei com as próxim as palavras: 22 Et b ra ch ia m undatione o b ruentur, ad verbum, inundabuntur , a c o n sp e ctu ejus, e t conterentur, atq u e etiam duz fcederis. 2 2 E com o s braços d e um a inundação serâo subm ersos d ian te dele; e serão quebrantados; sim , tam bém o príncipe d a aliança. Poderíam os naturalm ente conjeturar que os dom ínios de Antíoco não estiveram im ediatam ente em paz, porque um a porção de sua corte favorecia o herdeiro legítimo. Como sem pre sucede em cada m udança de governo, houve m uitos tum ultos n a Síria antes que Antíoco pudesse afastar seus adversários de seu cam i362 59* EX P O SIÇ Ã O [11.22] nho. Pois em bora o reino do Egito estivesse então destituído de um líder, visto que Ptolom eu, cham ado Filom etor, era então ape nas um m enino, seus conselheiros eram favoráveis ao filho de Seleuco, e assim, por m eio de suprimentos secretos, ofereceram seus préstim os à facção oposta a Antíoco. Ele teve m uito proble m a não só com seu próprio povo, m as tam bém com as nações adjacentes. Todos lam entaram a sorte de seu protetor e de ser ele totalm ente indigno de tal sorte, e assim com ovendo a muitos a prestar-lhe o máximo possível de auxílio. O m enino foi auxilia do pelo favor do Egito e de outras nações. E assim Antíoco se viu sujeito a muitas graves com oções, porém o anjo anuncia sua con quista final. Os braços, diz ele, serão inundados. Esta é um a ex pressão metafórica; porque todo auxílio que porventura adquiriu o filho de Seleuco não foi devido a seu próprio esforço, porquan to ele não poderia usar nenhum , m as pelo de seus amigos. Os braços, pois, significando todos os auxiliares que dariam assis tência na restauração do filho de Seleuco, seriam esm agados por uma inundação. Aqui temos outra m etáfora, significando que seriam tragados por um dilúvio; e por m eio de tal figura o anjo insinua não só a vitória de Antíoco, mas tam bém sua grande faci lidade. Foi com o um dilúvio, não por sua própria força, m as p o r que D eus queria usar a m ão desse tirano p ara afligir os israelitas, com o verem os mais adiante, e tam bém para perturbar tanto o Egito quanto a Síria. N a verdade Antíoco não passava de azorrague nas mãos de Deus, e é assim com parado a um dilúvio. D aí ele dizer: diante dele. Ele m ostra que o terror de A ntíoco seria tão grande, que com seu m ero aparecim ento ele descoroçoaria e prostraria seus inimigos, ainda que fosse destituído de forças, não sendo um guerreiro nem ousado e nem perseverante. E se rã o q u e b ra n ta d o s , diz ele, e ta m b é m o líd e r d a a lia n ça. Significando que Ptolom eu em vão tom aria o partido de seu parente. Porquanto o filho de Seleuco era prim o de Ptolom eu Filometor, visto que, com o já dissemos, C leópatra se casara com 363 [11.23] DANIEL Ptolom eu Filopator, de quem era procedente este Filom etor, e Seleuco era irmão de Cleópatra. Ele, pois, era o líder da aliança. Aliás, Ptolom eu, que não passava de um a criança, não podia em preender nem concretizar coisa algum a por seu próprio conse lho, porém tal era sua dignidade no reino do Egito, que foi merecidam ente cham ado líder da aliança, visto que todos os dem ais seguiam o poder daquele rei. O evento provou sobejam ente que mal sucesso provinha do fato de que todos os que procuraram desapossar Antfoco de suas possessões tinham tudo contra si. Vamos em frente: 23 E d epois d o pacto fe ito com ele, agirá fraudulentam ente; pois e le subirá e se torn a rá forte c o m pouca genie. 23 El a c o n ju n ctio n e c u m e o fciet d olum , e t ascendet, e t p ra v aleb it cum exigua gente. vel, manu. O anjo aponta para algum a interrupção nas guerras, um a vez que A ntíoco ficaria contente, por algum tempo, com a Síria e não faria tentativa contra o Egito. Era um a grande chance para repelir as tentativas de todos aqueles que queriam recorrer aos direitos de seu sobrinho. Não há dúvida de que todo o país ficou em po brecido e exausto com as contínuas despesas dessas guerras; pois sem pre que novas com oções surgiam, era necessário arrecadar novas taxas dessas províncias, e isso acarretava grandes despe sas. N ão surpreende, pois, que Antíoco, que era de disposição astuta, negociasse um a paz tem porária com seu sobrinho Ptolo m eu Filom etor, rei do Egito. Sua irmã Cleópatra ainda era viva, e essa foi um a justificativa honrosa. O anjo, pois, declara, prim ei ram ente, a proposta de um arm istício conduzindo à paz fixada entre os dois soberanos. Entretanto, ele acrescenta a pérfida con duta de Antíoco em suas amizades. D urante esses acordos, ou depois deles, ele o tratará traiçoeiram ente. Portanto, em bora pretendesse ser am igo e aliado de seu sobrinho, todavia conduziu-se fraudulentam ente em relação a ele. E subirá e prevalecerá com um pequeno bando-, significando que atacaria o m enino de form a súbita. Pois quando Ptolom eu antecipava a recente am iza 364 59* EX PO SIÇ Ã O [11.24] de com seu tio, Antíoco aproveitou a oportunidade para fraudu lentam ente atacar algumas cidades com um a pequena força. Ele assim enganou seu inimigo, o qual im aginava que todas as coisas estivessem tranqüilas para seu lado; e assim , quando Ptolomeu não nutria por seu tio nenhum medo, de súbito perdeu algumas cidades. Eis o que o anjo tinha em mente: ele surgirá através do engano, e prevalecerá sem grandes fo rça s, porque não atrairia sobre si nenhum a suspeita de guerra. É m uito fácil oprim ir um inim igo num estado de tranqüilidade e na ausência do medo. Em seguida ele acrescenta: 24 E!c en tra rá p acificam ente m esm o nos lugares m ais férteis d a p rovíncia; e fará aquilo que seus pais n u n c a fizeram , nem o s p ais de seus pais; rep artirá entre e le s a p resa e o s desp o jo s e as riquezas; sim, e calcu la rá seus p ro jeto s contra a s fortalezas, m as p o r c erto tem po. 24 In pace, e t in pinguedinibus regionis. aut provincia:, veniet, hoc est, in deliciis, e t faciet q u s non fecerunt p atres ejus, et patres patrum ejus; spolia e t p r s d a m , et substantiam illis dispertiet.17' e t su p er m uniliones cogitabit cogitationes suas, idque ad tem pus. Aqui a história tem seguimento: O anjo m ostra com o A ntío co, num curto tempo, e com um pequeno bando, adquirirá muitas cidades, visto que ele viria em paz sobre a fa rtu ra da província, subentendendo que ele os oprim iria enquanto dorm iam em segu rança. Ele m ostra tam bém com o ele viria a ser vencedor, não por m eio de algum a invasão hostil do Egito, mas p o r m eio de astúcia e intenção secreta ele privaria o rei Ptolom eu de suas cidades quando m enos o esperava. N ão haveria nenhum a aparência de guerra; daí ele dizer: virá em paz sobre a fa rtu ra da terra. A palavra ‘fartura’ é usada metaforicam ente para ‘riquezas’. En quanto os egípcios supunham que todo perigo fora rem ovido para bem longe, e se persuadiam da am izade de A ntíoco para com eles, e confiavam nele com o um aliado a aparecer em qualquer adversidade, entregaram -se aos prazeres, até que A ntíoco surgiu de repente e os subjugou. Em seguida ele acrescenta: Ele d es 171 Ou. ele dspersará suas propriedades. 365 [11.24] DANIEL prezará o despojo, a presa e os bens, os quais lhes pertenciam . Alguns tom am as palavras para despojo e presa no sentido de ‘soldados’, e aju n ta m com o verbo “ÍTO’, ibzor, “ele dispersa rá”, significando que ele distribuirá suas possessões entre seus soldados, com o intuito de conciliar sua boa vontade e preparálos para novas guerras, visto saberm os quão facilm ente os solda dos se deixam atrair quando recebem a rem uneração p o r seus serviços; pois são m ovidos unicam ente por cobiça e avareza. Alguns escritores o explicam assim: Antíoco dividirá a presa en tre seus soldados: eu, porém, prefiro o outro sentido: ele disper sará a presa e o despojo e os bens dos egípcios. D epois de opri mir repentinam ente os egípcios, ele procederá a despojá-los como um salteador. Em seguida ele acrescenta: E c o n tra as fo rtificaçõ es en g en d r a r á m aquinações. Significando que ele executará seus planos de apoderar-se de cidades fortificadas. Pois a princípio ele pene trou até onde pôde em certas cidades e ocupou prim eiram ente Ccelo-Syria, e depois Phcenice, porém não pôde possuir im edia tam ente as cidades fortificadas; daí deferir ele a execução de seus planos para o tem po m ais oportuno. Portanto, o anjo diz que ele poria em ordem seus planos contra as cidades fortificadas, mas som ente p o r algum tempo. Significando que ele não m anifestaria suas intenções im ediatamente, esperando oprim ir seu sobrinho quando baixasse sua guarda. E assim, sob o disfarce da paz, o acesso a essas cidades lhe estaria sem pre aberto, e reconciliaria consigo todos quantos pudesse corrom per ou por m eio de pre sentes, ou por meio de truques. Percebem os, pois, que aqui se nos apresenta um sum ário das artes e estratagem as por m eio dos quais Antíoco privaria seu sobrinho de um a porção de seu terri tório e suas cidades, com o subitam ente ele invadiria algum as dentre as m ais fracas, num estado de insuspeita tranqüilidade; e com o gradativãm ente ele inventaria m aquinações para apoderarse de cidades m ais fortes, quanto estivesse a seu alcance. Ele diz 366 59* EX P O SIÇ Ã O [11.25] também: p o r certo tempo. A astúcia e a m alícia de A ntíoco fo ram sem pre veladas em todas essas transações. Ele não se envol via em guerra aberta, m as sempre tudo fazia para aum entar suas possessões por meio de fraudes indiretas - u m a trajetória que nunca ficou sem êxito. Q uando se diz: E le f a r á o q u e n ã o fize ram seus p ais, nem os pais d e seus pais, isso deve restringir-se som ente ao Egito. Pois Seleuco, o prim eiro rei da Síria, desfrutou de um a ampla extensão de dom ínio; então prosperou na guerra e sua fam a flo resceu m esm o quando idoso, e em bora não fosse bem sucedido nas batalhas, todavia em geral foi um guerreiro superior e cele brado. A lém disso, sabem os que ele foi um dos principais gene rais de A lexandre o Grande. Q uanto a seu filho A ntíoco, já ob servam os previam ente a am pla extensão de seu dom ínio, e com o foi nobrem ente estim ado por sua prudência e coragem . O anjo não com para Antíoco Epifanes geralm ente com seu pai, ou avô, ou bisavô, m as somente com respeito ao Egito. Pois seus ances trais sempre alm ejaram o Egito, porém seus desígnios contra ele foram inteiram ente frustrados; ele, contudo, foi mais bem suce dido em sua agressão onde seus ancestrais fracassaram em suas tentativas. D aí tornar-se m anifesto com o D eus controla os even tos da guerra, de m odo que o vencedor e o herói triunfante não é o hom em que excede em conselho ou em prudência ou em cora gem, mas aquele que luta sob o líder celestial. A D eus apraz a um só tem po afligir as nações e a estabelecer sobre elas reis que se ja m realm ente seus servos. A ssim ele desejava castigar o Egito pelas m ãos desse vilão salteador. Vamos em frente: 25 E in stig a rá seu po d er e sua coragem c o n tra o rei d o sul com u m g rande exército; e o rei d o sul será instigado a b atalh ar co m u m ex ército m u ito g rande e p oderoso; m as não subsistirá; porque m aquinarão projetos contra ele. 2 5 E t excitab it ro b u r su u m , e t c o r suum adversus regem austri, cum exercitu magno: e t rex austri irritabitur ad p ra liu m cum exercitu m agno, e t ro b u sto valde: e t non stabit, q u ia co g itab u n t c o n tra eu m cogitatio n e s.172 1Ou, seja, agitarão contra ele conselhos pérfidos. 367 [11.251 DANIEL O anjo aqui anuncia com o Antíoco Epifanes, depois de pre valecer por meio de fraude, se tom aria m ais audacioso em sua ousadia. Aventurar-se-ia a recrutar um exército hostil e a invadir o Egito abertamente, sem qualquer dissim ulação. Portanto, diz ele: p o r fim su sc ita rá s u a fo rç a e su a co rag em . H avia anterior m ente se arrastado por lugares escusos e libertinos, e não desper tou-se sua força nem sua coragem enquanto perm anecia em casa. Entrem entes, obteve a posse de várias cidades por m eio de trai ção e outros artifícios. Isso só se deu por rastejam ento entre fen das subterrâneas. M as agora abertam ente declara guerra e con duz suas forças ao cam po de batalha, e assim instiga sua fo rç a e sua coragem . Como eu já disse, seu novo m étodo de guerra é aqui descrito com o sendo-lhe inusitado, visto que sua audácia, intrepidez, gradualm ente crescem através de um a série de suces so que desfrutara e pelo qual se tornara mais poderoso do que seu sobrinho, pela prática de fraude. Em seguida ele acrescenta: com um grande exército. Ele havia mencionado um pequeno bando; agora lhe contrapõe um grande exército; pois se lhe requeria um longo espaço de tem po para a coleta de vastos recursos pecuniá rios para levar avante a guerra, e tam bém para alargar e estender suas próprias fronteiras. Ele foi assim capaz de alistar novos re crutam entos, enquanto sua prosperidade induziu a m uitos a tornar-se seus auxiliares. Visto que ele se achava em muitos aspec tos superior a seu sobrinho, ele recrutou um grande exército. O rei do sul também fica rá irritado; ou, seja, ele não ousará m oles tar a seu próprio tio Antíoco, m as se verá forçado a declarar guer ra franca. Ele virá, pois, com um grande exército, m uito grande, forte e poderoso, diz ele, m as não subsistirá, porque engendra rão artifícios contra ele. Significando que ele será vencido por m eio de traição. A qui o anjo tem em mente que Ptolom eu teria coragem suficiente para resistir, não houvera ele sido traído por seus adeptos. Perceberem os isso m ais claram ente no próxim o versículo amanhã. 368 59* EXPOSIÇÃO ORAÇÃO Deus Onipotente, fa z com que permaneçamos quietos em teu refugio e proteção, em meio àquelas numerosas perturbações, as quais sem pre puseste diante de nossos alhos neste mundo. Que jam ais perca mos nossa coragem quando a Satanás e a nossos inimigos fo r dada ocasião de oprimir-nos; mas que permaneçamos seguros sob tua pro teção, e que na hora e momento oportunos fujam os para teu porto. Confiando em teu invencível poder, que jam ais hesitemos ao passar mos p o r todas as comoções, tranqüilizando nossas mentes em tua graça, a té que, p o r fim , nos vejamos reunidos naquele fe liz e eterno descanso que preparaste para nós no céu, p o r Jesus Cristo nosso Senhor. Amém. 369 60a 26 Sim , o s que com erem seus alim entos o destruirão, e seu ex ército será arrazado; e m uitos cairão m ortos. • ^ 2 6 E t qui c o m e d en t p o rtio n em cibi ejus, com erent eum , e t e x erc itu s ejus obruetur, ei cadent vuJnerati m ulti. Vimos ontem que o anjo predisse que Ptolom eu não subsisti ria na batalha em decorrência da traição de seus próprios adep tos. Ele agora expressa o gênero de traição, pois seus principais cortesãos ou conselheiros seriam os autores dessa perfídia. Pois ele distingue os soldados com uns de seus líderes, pois na segun da sentença, ele m ostra com o os soldados cum pririam seu dever sem poupar nem sua vida nem seu sangue. A gora entendem os a intenção do Espírito Santo neste versículo, pois eie diz que os autores dessa perfídia não seriam homens com uns, m as os prin cipais dentre os conselheiros. Somos inform ados que eles com i am na m esa do rei, com o vimos no prim eiro capítulo que foi dada a Daniel e a seus com panheiros um a porção do alimento régio da m esa do rei. Assim ele m ostra quão desonrosa era essa perfídia, visto que com iam de sua m esa e eram seus com panhei ros íntimos. E les o d e stru irã o , diz ele, e seu ex ército s e rá es m agado. Ele m ostra que muitos estavam preparados para esse dever, os quais, ousada e livremente, exporiam suas vidas ao pe rigo para a segurança de seu rei e em defesa de seu país, p o ré m m u ito s c a irã o feridos. Ele quer dizer que haveria de ser grande a m ortandade em seu exército, e o resultado da batalha não seria segundo seu desejo, porque seus generais não preservariam sua fidelidade a seu soberano. Com esse exem plo, o anjo nos descre370 6 0 a EX P O SIÇ Ã O [11.27] ve a situação ordinária dos reis. Escolhem seus conselheiros não por sua honestidade, mas pela m era aparência da congenialidade em suas afeições e gostos. Se um rei é avaro, ou astuto, ou cruel, ou sensual, ele deseja ter amigos e assistentes que não obstruam nem sua avareza, nem sua astúcia; nem sua crueldade, nem sua luxúria. D aí m erecerem a conduta que recebem e experim entam a traição daqueles que não deviam ser tratados com m ínim a hon ra, se eles se sentissem obrigados em relação a Deus e a seu povo. A gora prosseguimos: 2 7 Et du o m m regum c o r ipsorum , hoc esl. et cor his duobus regibus, in m alum : et in m nsa eadem , una , m endacium ioquentur, e t non p ro sp ere eveniet, q u ia adhuc fim is a d tem pus statutum . 27 E o s co raçõ es d e am bos esse s reis estarão atentos p a ra fazerem o m a), e a u m a m esm a m esa falarão m entiras; p orém isso nào prosperará, porque ainda verá o fim no tem p o d esignado. Aqui o anjo narra que o térm ino dessa guerra seria p o r meio de tratados e um a vã pretensão de paz depois da m atança que Ptolom eu sustentara. Em bora Antíoco pudesse ter seguido sua própria boa fortuna, todavia não ousou aventurar-se a levar sua vantagem a extremo, mas segundo sua disposição concluiu serlhe interessante fazer as pazes com seu inimigo. Já fizem os alu são a sua astúcia e a sua falta de lhaneza e integridade. O anjo prediz a existência de m á fé em am bos esses reis; o tio e o sobri nho se encontrarão, diz ele, e cearão juntos, insinuando a maior amizade, porém fa la rã o mentiras, diz ele, à m esma mesa', signi ficando que tram arão um contra o outro, e cada um agirá fraudu lentam ente visando a seus próprios fins. Esta profecia de fato parece ser de pouca im portância para os fiéis; mas era necessário m ostrar que num estado tal de confusão não podiam manter-se sem se munir de todos os tipos de apoio. Se o anjo tivesse falado apenas em termos gerais, prim eiro que haveria guerra e então um a paz tem porária, isso não teria sido suficiente para sustentar a m ente dos santos; m as quando os detalhes se revelam tão clara m ente realçados, lhes é oferecida um a notável confirm ação. E assim os fiéis não têm razão para duvidar de que D eus realm ente 371 [11.28] D A N IE L tem falado, quando o anjo prediz o futuro de form a tão exata e tão abertam ente o narra com o um assunto da história. Em seguida ele acrescenta: E isso n ã o p ro s p e ra rá , p o rq u e a in d a v irá o fim no te m p o designado. O anjo traz à lem brança dos fiéis a providência de Deus, visto que nossa m ente sempre descansa naturalm ente nos recursos das coisas terrenas. A preen dem os com nossa mente só até onde nossos olhos vêem. Sempre indagam os sobre as razões “por que isso acontece” e “por que esse modo de proceder não resulta bem ” , om itindo inteiram ente a vontade de Deus. D aí o anjo encontrar essa falha e estupidez nos homens, dizendo que tudo quanto esses reis estavam tram an do não teria êxito: visto que o fim é questão de tem po; significan do que Deus m anteria muitas ocorrências em suspenso. Portanto, enquanto estam os considerando apenas as causas secundárias, percebem os com o o poder suprem o reside som ente em Deus, e que ele governa, por sua vontade, as transações mútuas da hum a nidade. N em a mais leve vantagem resultaria desta instrução para os fiéis, porque, enquanto os reis vivem engendrando m uitos p la nos e usando de grande astúcia em todos os artifícios perversos da diplom acia, Deus ainda restringe a mente deles. Ele mantém os acontecim entos com seu freio secreto e nada perm ite ocorrer fora de seu decreto celestial. Em bora possam os deduzir desta pas sagem esta instrução geral, todavia o anjo sem dúvida restringe o que já dissem os aos eventos históricos im ediatam ente diante de nós. O fim ainda não chegou, mas o tem po oportuno foi fixado de antem ão pelo conselho secreto de Deus, de m odo que Antíoco vence num período e recua noutro, com o verem os. Vamos em frente: 2 8 E ntão ele regressará a su a terra com g ra n d cs riquezas; e seu c o raç ão será contra a alia n ça santa; e fará proezas e reg ressará a sua própria terra. 28 Et revertetur in le n a m suam cum opibus m gnis, et cor e ju s a d fcedus sanctitatis. et faciet. e t re v ertetu r in terram suam . Aqui o anjo prediz a calam itosa natureza daquela paz para o 372 6 0 a EX P O SIÇ Ã O [11.28] povo de Deus, porque Antíoco volveria seus braços contra Jeru salém e todo o povo hebreu. Diz: Ele regressará a sua própria terra, porque não possuirá o Egito. Esse regresso im plica a vitó ria de Antíoco, e todavia se retira para dentro das fronteiras de seu próprio reino. Ao acrescentar: com grande pom pa ou gran d es riquezas, ele m ostra a fonte donde proveio aquela riqueza: seu co raç ão s e rá c o n tra a s a n ta alian ça. Ele parcialm ente des truiu Jerusalém e o tem plo de Deus. Foi com pelido a deixar o tem plo e m uitos tesouros, quer m ovido pela culpa ou pela reve rência ou por um m ilagre, com o lemos no segundo livro de M acabeus [5.2], D e bom grado teria despojado todo o tem plo, po rém D eus então o restringiu, em bora houvesse cum ulado para si grande riqueza. D aí o anjo associar os dois eventos: ele regressa ria à Síria com grande riqueza e seu coração seria contra a santa aliança. Alguns entendem isso com o um a referência a pessoas, com o se o anjo estivesse pensando no povo que firm ara aliança com Deus. M as o sentido mais sim ples me agrada mais: ele de flagraria guerra contra Deus em razão de não haver se enriqueci do com espólio do tem plo com o esperara. Já m encionei a paz que ele fez com seu inimigo. Portanto, para que essa expedição não fosse infrutífera, ele despojou o tem plo de Deus. E assim seu coração se exaltou contra D eus e contra sua santa aliança. A outra explicação é um tanto frígida e forçada demais. E ele f a rá isso e re g re s s a rá a su a p r ó p ria te r r a . Este re gressar no final do versículo é tom ado num sentido distinto da quele no início, com o agora ele faria sua própria vontade como vencedor, e ninguém se oporia a sua chegada em seus próprios territórios. Essas duas expressões devem ser lidas juntas: ele fa rá isso e regressará a seus próprios dom ínios. O significado do ter mo ‘fazer’ j á foi explicado. O anjo tem em m ente a ausência de todo e qualquer obstáculo que obstruísse A ntíoco de destruir a cidade e o tem plo. Essa foi um a provação m uito severa, e levaria a m ente dos fiéis à conturbação e im paciência acerca do fato de 373 [11.29, 30] D A N IE L D eus haver entregue o tem plo a esse cruel tirano e perm itido que os vasos sagrados e os tesouros secretos fossem arrebatados com a m ais intensa ignomínia. Era necessário, pois, inform ar de ante m ão aos fiéis dessa terrível matança, a fim de que a notícia ines perada não os deixasse perplexos e destroçasse a constância de sua fé. D aí deduzirm os esta lição prática: D eus às vezes prediz m uitos acontecim entos dolorosos sobre nós, e contudo essa ins trução não deve am argurar nossos sentimentos; pois ele deseja fortalecer-nos contra as provações, as quais a notícia da ocorrên cia ocasionaria. E assim o anjo, enquanto tratava de ocorrências de m odo algum agradáveis, foi um arauto útil de todas as calam i dades que se concretizariam , a fim de que nada que fosse inusita do ou inesperado caísse sobre os santos. E assim reconheceriam que a aflição era procedente das m ãos de D eus; e em bora estives sem expostos à avidez de Antíoco, todavia Deus, por m eio de seu conselho infalível e com preensível, perm itiu m uita liberdade a esse ím pio tirano. Vamos em frente: 2 9 N o tem po d esignado ele voltará, e virá ao sul; porém não será a últim a vez c o m o t'oi a p rim eira. 2 9 A d te m p u s re v e rte tu r e t v e n ie t in 3 0 P orque virão c ontra ele os n avios d e Q uitim ; portanto, e le se sentirá am argurado e v o lta rá e n utrirá indignação c ontra a san ta aliança; assim fará. e ain d a v oltará, e aten d erá aos q u e tiverem abandonad o a san ta aliança. 3 0 E t venient contra e u m n av es C ithim , e td e b ilita b itu r,1Me t revertetu, e t indignab itu r adversus fcedus sanctitatis, e t faciet, e t revertetur, e tin te llig e t,l,5ad d esertores fcederis sanctitatis. /E gyptum : e t non erit ut prius, it posteriu s.1’3 Antes de tudo, o anjo diz que Antíoco voltaria em pouco tem po e tom aria posse do Egito. Esse foi o fruto daquela pretensa paz e pérfida am izade que já foram m encionadas. Pois o tio e o sobrinho banquetearam juntos em meio a m útua desconfiança, segundo o anjo já afirm ara, e com o encontram os no versículo 27 1.3 Ou, seja. o resultado seria diferente, pois a últim a expedição não seria bem sucedida com o o foi a primeira. 1.4 Ou. se entristecerá, sentido que para m im é preferível. Ou. seja, aplicará sua mente. 374 6 0 a EX P O SIÇ Ã O [11.29, 30] deste capítulo. E ssa im postura foi logo depois desfeita, quando Antíoco, sem qualquer im pulso racional, voltou ao Egito. D essa form a ele m ostrou que nada queria senão a oportunidade de rom per a trégua, e só a prorrogou por certo tempo, porque não queria oprim ir seu sobrinho às pressas. Este, pois, é um ponto. Podemos tom ar a palavra m ogned, ‘te m p o ', com o um período divi nam ente predeterm inado; mas com o essa explicação poderia ser forçada dem ais, contento-m e com a [explicação] com um . Ele voltará, pois, p o r certo tempo, e virá, diz ele, ao Egito\ mas a últim a expedição não será com o a prim eira. Porque toda a pre paração para a guerra, a qual golpeou o Egito com tanto terror, perderia seu efeito. Ele assenhoreou-se de um a porção do reino, e o rei Ptolom eu Filom etor se viu sitiado com a chegada de Públio Pupílio, de quem o anjo falará agora. Em virtude de sua che gada, acrescenta-se: navios virão de Quitim. Já explicam os essa palavra em outro lugar. Fazendo um a com paração de todas as passagens bíblicas nas quais esse term o ocorre, descobrirem os que nele se acham im plícitos todos os gentios, desde a M acedo nia por toda a G récia, até o Ilírico e a Itália. Os antigos usavam outro term o para os m acedônios; cham avam -nos Maketce, e há quem pensa que a letra M é um a adição inútil. M as, se esse é ou não o caso, as circunstâncias m ostram que os m acedônios e os gregos, bem com o outras nações ultram arinas, eram cham ados Quitim. Se alguém ainda discute sobre esta palavra, que de nossa parte desistam os de toda contenda; todavia, não podem os deixar de observar qual o teor perpétuo da Escritura que nos capacita a descobrir isto: que os m acedônios, os gregos e os italianos estão incluídos nesse term o. Esta passagem está isenta de toda dúvida, porque Antíoco foi refreado não pelos gregos, m as pelos rom a nos. Os em baixadores foram enviados por eles, não com esse único propósito, mas para investigar todo o estado da G récia e da Á sia Menor. As atividades da G récia eram então instáveis, e os romanos foram volvendo sua atenção para a Acaia, pois criam que a liga acadiana viria a ser m uito poderosa. Entre esses em 375 [11.29, 30] DANIEL baixadores estava Púbiio Pupílio, hom em inflexível, com o pode mos aventurar-nos a conjeturar, porém austero e bárbaro. Q uan do encontrou-se com Antíoco, o qual então estava sitiando A le xandria e m antinha o rei infante em cativeiro, dirigiu-se a ele segundo sua própria maneira. O rei Antíoco o recebeu graciosa e brandam ente, e mesmo gentilmente, e deseja ainda saudá-lo, pois, com o já afirm amos, sua disposição era naturalm ente servil. Pu pílio rejeitou todos esses artifícios e ordenou-lhe que reservasse suas fam iliaridades para relações privativas; pois Antíoco e ele foram íntimos quando era refém em Roma, enquanto seu pai ain da vivia. Ele rejeitou todos esses atos de cortesia e expôs-lhe as ordens do Senado e ordenou-lhe que deixasse o Egito im ediata mente. O rei disse que consultaria seus amigos. M as foi incapaz de dissim ular sua costum eira aspereza; traçou um círculo com o bastão que tinha em mãos, e ordenou que o rei convocasse seus conselheiros e a deliberar no lugar m arcado, do contrário decla raria guerra no ato. Ao notar o rei a ação tão decisiva desse bár baro, não ousou continuar hesitante ou a dissimular, porém anuiu im ediatam ente ao poder do Senado e retirou-se repentinam ente do país. Essa história é agora descrita pelo anjo. Todos esses even tos estavam ainda por realizar-se, porém D eus os pôs diante dos olhos dos santos o que então estava inteiram ente oculto e contrá rio à expectativa do gênero humano. O anjo, pois, declara a razão por que aquela expedição de Antíoco seria com pletam ente dife rente da prim eira. D iz ele: Virão ali contra ele navios de Quitim, significando Itália, e ele se sentirá amargurado e regressará; ou, seja, ele obedecerá, ainda que sentindo-se indignado ante trata mento tão im perioso, e será com pelido a retirar-se m esm o com o estigm a da desgraça. Era algo indigno de um rei aviltar-se tão hum ilhantem ente à m era palavra de seu adversário. Isto explica sua indignação: M as voltará e se m ostrará indig nado contra a santa aliança; significando que ele volveria seu furor contra o tem plo e a cidade de Deus. E ssa segunda volta 376 6 0 * EX PO SIÇ Ã O [11.29, 30] envolveria os judeus num período ainda de m aior m orticínio do que o prim eiro. Antíoco não estava então disposto a regressar à pátria, a não ser que voltasse carregado de despojo, depois de pretender estabelecer a paz; porém agora foi com pelido a retirarse com profunda desgraça, e isso apenas o exasperou e o enfure ceu ainda mais. D aí agir ele de form a ainda m ais ultrajante con tra o povo e o tem plo de Deus. E assim o anjo diz: Será movido de indignação contra a santa aliança, e p o r isso voltará. Ele reitera duas vezes a m esm a linguagem; com o se quisesse dizer: Antíoco regressará à Síria sem concretizar seu objetivo, obede cendo ao Senado rom ano, ou, antes, a seu velho am igo que co nhecera em Roma. Já declaram os a razão, a qual mais adiante explicarem os m ais plenam ente, por que o anjo predisse a fúria do rei, volvendo-se contra a santa aliança. Eis a razão: a con fiança dos santos naturalm ente seria prejudicada ao observar a divina perm issão outorgada ao tirano para despojar o templo. E então acrescenta: E a g irá com in telig ên cia em p ro l dos que a b a n d o n a re m a s a n ta alian ça. O anjo aqui realça a m anei ra na qual os acordos secretos forem feitos entre A ntíoco e os apóstatas que se desertariam da santa aliança de Deus. E bem sobejam ente claro que ele foi convocado a Jerusalém , prim eiro por Jason, e então por M enelau [2 M acabeus 4.19-23]. Tocarei apenas de leve nas ocorrências registradas na história. Autores profanos nos informam acuradam ente sobre essas ocorrências, e, além disso, todo o livro dos M acabeus nos fornece inform ação sem elhante e claram ente põe diante de nós o que o anjo aqui prediz. Q uem quiser ler estas profecias com proveito deve familiarizar-se com esses livros, bem com o deve tentar recapitular toda a história. O ancião O nias era um santo varão; seu filho já foi m encionado previam ente [2 M acabeus 3.1]. Pois, com vistas a escapar das tram as, fugiu para o Egito e construiu um templo, com o Josefo nos informa, e pretendia ser o cum prim ento daque la profecia de Isaías que diz: H averá um altar de Deus no Egito. 377 [11.31-32] D A N IE L O ancião Onias, porém , que cum priu fiel e sacram ente o ofício de sum o sacerdote, foi posto em fuga e eventualm ente foi morto. Então Jason, que fora enviado a apaziguar A ntíoco, assum iu o sum o sacerdócio e profanou o tem plo, toda a nação e inclusive o culto divino [2 M acabeus 4.35-37; tam bém v. 7], Ele mais tarde teve a recom pensa que mereceu, porquanto foi assassinado, e então M enelau o sucedeu e conciliou o favor de Antíoco [2 M acabeus 5.9; 4.27]. A autoridade do sacerdócio prevaleceu enquanto foi capaz de atrair a si um a grande porção do povo. Aqui, pois, o anjo prediz com o Antíoco, ao aproximar-se da cidade, teria com o seus companheiros desertores e apóstatas. As palavras são: Ele aplica r á a m ente a quem abandonar a santa aliança, e o sentido não é de form a algum a obscuro. Antíoco não haveria deflagrado guerra contra os judeus, se um a facção não saísse a encontrá-lo e se congraçado com ele. Percorri esses eventos bem sucintamente, porque quando chegar ao sumário geral me será bem mais conveniente realçar o desenvolvimento geral. Em seguida o anjo afirma: 31 E o s braços se estenderão so b re eie, e 31 Et brachia a b ipso stabunt, e t profana- pro fan arão o santuário d a fortaleza, e e ltm inarão o sacrifício diário, e porão a abom in ação q u e c a u sa desolação. bunt sanctuarium roboris, aut virtuti, et abolebunt ju g e, sacrificium scilicet, e t ponent abom inationem q u s obstupefaciet.176 3 2 E o s q u e se põem im piam ente contra a aliança, e le c o rrom perá por m eio d e Hsonjas; m as o povo q u e conhece seu D eus será forte e fará proezas. 3 2 E t im p ie a gents c ontra fcedus abducet in e rra re m b )a n d itiis.l7’ e t p o p u lu s intellig e n te s17® D eum suum ro b o rab u n tu r et facient. Aqui o anjo descreve os m ales internos da Igreja, e explica m ais detidam ente o que havia levem ente tocado no últim o versí culo. D iz ele: Os braços se estenderão sobre ele [Antíoco]. Al guns explicam isso com o sendo a guarnição que aquele tirano impôs a Jerusalém . M as isso parece forçado dem ais. N ão hesito em presum ir que o anjo aqui faz referência aos apóstatas que IMJá tratam os desta palavra antes. 177 Isto é, os perverterá m ais e mais por m eio de lisonjaas. I7* isto é. todo o povo que reconhece. 378 60* EX P O SiÇ À O [11.31, 32] abandonaram a lei. Então, a sentença, braços que se estenderão sobre ele, significa que ele não se manterá em sua própria força, mas confiará na assistência do povo. M uitos se ofereceriam a obedecê-lo, e assim Antíoco encontraria um partido que se devo taria a sua vontade. E depois adiciona: Profanarão o santuário da fortaleza. Aqui o anjo associa Antíoco a esses apóstatas ím pios [2 M acabeus 6.2]. Com o intuito de favorecê-lo, lem os que o tem plo seria profanado, e isso se cum priu quando a estátua de Júpiter O lim po foi erigida ali. A tirania e violência de Antíoco continuou até bem depois, com o verem os em seu lugar próprio. E le trouxe a estátua do Olím pio Jove para o tem plo, com o pro pósito de destruir o culto de Deus, e então introduziu outras cor rupções, as quais violaram a pureza do serviço divino. Ele pode ria num só instante ter destruído toda a lei, porém antes de tudo ele tentou m esclar a lei divina com muitas superstições, e assim alienar os judeus gradativam ente de sua piedade genuína e since ra. O anjo fala do santuário da fortaleza, para m ostrar aos fiéis que Antíoco não é vencedor de Deus, o qual jam ais foi privado de seu poder, m as continuava sendo o guardião e m antenedor de seu tem plo até o fim. Ele usa este epíteto p ara o tem plo para assegurar aos piedosos que Deus não tinha aberto o cam inho para a violência e o tirano. Sua autoridade ficou intocada e im aculada, ainda que seu tem plo se visse exposto a essa brutal profanação. Por fim, ele queria que os fiéis, com este ensino, retivesse o senso do poder invencível de Deus em escolher esse tem plo como sua habitação, ainda que por algum tem po fora dado a Antíoco insultá-lo, e lhe fora perm itido profaná-lo com sua guarnição. Esta instrução im pelia os piedosos a buscarem o poder de Deus com os olhos da fé, em bora ele estivesse então oculto de sua vista, e fosse tripudiado pelos pés dos ímpios em seu desbragado orgulho e audácia. D oloroso era deveras o espetáculo dessa está tua erigida dentro do tem plo; porque D eus, segundo nossa afir mação prévia, prom etera ser o defensor desse sacro monte. Quan379 [11.31, 32] DANIEL do os ímpios ficaram assim insultuosam ente furiosos, quem não teria im aginado que D eus se deixara vencer e não m ais era capaz de defender sua residência? O anjo, pois, aqui reanim a os fiéis a cultivarem pensamentos muito diferentes daqueles sugeridos pelo prospecto que estava diante de seus olhos. O tem plo, pois, pare cia enfraquecido e destituído de toda proteção, e todavia com respeito a D eus ele era ainda o santuário da fortaleza. Em segui da ele acrescenta: E a b o lirã o o sacrifício co n tín u o , o que real m ente ocorreu: agora, porém , abordo este fato de form a breve, visto que terei outra oportunidade de abordá-lo m ais adequada e plenam ente. E colocarão, ou estabelecerão, a q u e la a b o m in a ção q u e c a u sa esp an to . Pois quem não teria ficado assom brado contem plando o tem plo abandonado pelo Todo-Poderoso? Pois se Deus se preocupava com os serviços do tem plo, por que ele não resistiu um a fúria tão selvagem ? Por que tolerou sujeitar-se a um a indignidade tão desditosa? O anjo responde a tentações com o essas, dizendo que nem que o m elhor dos hom ens se sentisse espantado com tal desgraça, todavia nada acontece p o r acaso; pois D eus já havia visualizado e decretado todas as coisas. Eles não teriam sido preditos, a não ser que D eus quisesse provar a fé do povo e exigir a punição p o r sua ingratidão. N ão posso, porém, concluir hoje a exposição do tema. ORAÇÃO Deus Todo-Poderoso, uma vez que somos instruídos pelo Espírito e estamos revestidos com o sacro ensino, fa z com que enfrentemos a guerra com bravura contra os inimigos francos e contra tudo quanto ousadamente se opõe à verdadeira religião. Faz com que também desprezemos todos os inimigos e apóstatas domésticos, e os resista mos de maneira varonil. Que jam ais nos sintamos perturbados mes mo quando vários tumultos surgirem no seio de tua Igreja. Que nos sos olhos estejam fixos em ti, e esperemos sempre o mais ditoso resul tado, mesmo que parecer impossível, até que, p o r fim , tu cumpras tuas promessas. E que todos os acontecimentos que ora nos pareçam contrários resultem em nossa salvação, quando teu Filho, nosso Sal vador. manifestar-se. Amém. 380 g 61a .xposição /^ T ^ eclaram o s na últim a preleção a seriedade da prova pela qual c s Z /D e u s testou a fidelidade de seu povo, perm itindo a Antíoco um a liberdade tão ilim itada para profanar o tem plo e abolir, por certo tempo, todos os sacrifícios e liturgia. Em seguida ele esta beleceu no m eio do tem plo aquela abom inação que hum ilhou profundam ente os espíritos dos piedosos; pois tal prodígio não podia ser testem unhada sem o m ais profundo espanto. N inguém jam ais poderia supor ser possível que D eus expusesse seu pró prio santuário a tal desonra, visto que ele foi o único que Deus escolhera no m undo inteiro. E então diz: E ele e n g a n a rá os tra n sg re sso re s d a a lian ça com ad u lação , m a s u m povo q u e conhece seu D eus a re te rá com firm eza e a p ra tic a rá . Aqui Daniel expressa m ais clara m ente o que dissera previam ente da corrupção e subversão do culto divino, com o A ntíoco sedutoram ente persuadiria e atrairia a si uma pérfida porção daqueles que eram nom inalm ente, pelo menos, povo de Deus. E assim ele reitera o que já observam os. Esses hipócritas eram com o os braços de A ntíoco; pois ele cap turara a cidade pela força de braços, e não teria ousado expressar esses insultos ao tem plo de Deus, a m enos que recebesse assis tência daqueles apóstatas que desprezaram todo e qualquer te m or do Todo-Poderoso, e a quem tão-som ente a am bição e a ava reza os haviam im pelido a unir-se àquele ím pio tirano, o qual era o inimigo devotado e confesso de sua religião. O anjo, pois, aqui 381 111.31, 32] DANIEL confirm a o que previam ente dissera, mostrando com o os perver sos e ímpios zombadores da aliança seriam instrumentos nas mãos desse ladrão. Pois a prim eira palavra do versículo 32 deriva-se de PU n, reshegn, “proceder perversam ente” , e se refere àquele ato especial de pecam inosidade, seu desprezo para com a aliança de Deus. Isso tem referência aos inim igos dom ésticos que previ am ente se gabaram de ser filhos de Abraão, e que foram m arca dos pela circuncisão, que era o sinal daquele pacto. Ele aqui não realça alguns do mero refugo do povo, m as os sacerdotes ímpios, M enelau, Jason e outros com o eles, segundo a explicação já feita à passagem . Ele diz, pois: esses se rã o e n g an a d o s pelas b a ju la ções d e A ntíoco. Com certeza ele ofereceu aos sacerdotes e aos dem ais o que pensava mais valessem: um ele pôs no tem plo; ou tro ele enganou com prom essas vãs e falazes por certo tempo, distribuindo entre eles um a variedade de presentes. E assim ele a todos corrom peu com suas bajulações. O profeta confronta esses com os sinceros adoradores de D eus; e a cópula hebraica deve ser entendida aqui com o a subentender esse contraste. Ele já ha via falado de m uitos com o sendo enganados por prom essas vãs, e os cham ara transgressores da aliança; ele agora acrescenta: M as o povo q u e conhece a Deus se fo rta le c e rá e p rev alecerá. A intenção do anjo é que a perfídia daqueles de quem falara não prevaleceria contra os piedosos levando-os à m esm a aliança com a perversidade e precipitando-os de ponta cabeça nas mesmas arm adilhas. Em bora tal fosse a perfídia desses revoltosos, toda via todos quantos conhecem a Deus, diz ele, se fortalecerão. Esta passagem é especialm ente digna de nota, com o a experi ência ensina quão poucos ficam de pé quando muitos fogem. O exem plo de um às vezes conduz cem à m esm a ruína; m as a cons tância de cem raramente é suficiente para m anter um em sua po sição. Neste caso, olhem os bem para os recônditos de nossa de pravação natural. Pois somos não apenas m ovidos, mas até m es m o abalados pelas m ais leves brisas, e inclusive quando Deus 382 6 1 * EX P O SIÇ Ã O [11.31,32] põe diante de nós um firm e refúgio, até que nossa vacilação seja curada. Quando o Apóstolo põe diante de nós o exem plo dos santos, ele diz que um a nuvem de testem unhas está sem pre nos encarando, com vistas a conservar-nos no tem or de D eus e na pura confissão de nossa fé [Hb 12.1], M as essa nuvem se dissipa m uito depressa de nossa vista. Entrem entes, se algum a pessoa tagarela a quem sabemos não ser de nenhum a im portância e a quem nós m esm os temos condenado - se tal pessoa se declinar ainda que bem pouco do cam inho reto, crem os que tal exem plo é suficiente para nos justificar. Por isso tive boas razões para de clarar com o esta passagem descerra diante de nós nossa disposi ção perversa e maligna. D ificilm ente som os atraídos para Deus em decorrência de um a m ultiplicidade de dispositivos, porém somos facilm ente arrastados rumo ao diabo p ara nossa própria destruição. D aí a necessidade de diligentemente meditarmos nesta passagem e refletir continuam ente sobre a linguagem do profeta. A despeito de os apóstatas se deixarem enganar por bajulações e rejeitarem o culto divino, traindo a Igreja e destruindo em si toda som bra de piedade, todavia todos os santos se m anterão firmes na fé. Portanto, que ninguém cite o exem plo dos im ponderados quando justificam seu erro, se o m esm o im ita os pérfidos, os le vianos e os hipócritas. O anjo aqui nos pinta um quadro d a Igreja, m ostrando com o tantos provam ser apóstatas; m as tal levianda de, inconsistência e perfídia não deve jam ais ser um obstáculo usado pelos inimigos de Deus a im pedir o progresso dos santos na fé e na piedade. D evem os notar ainda o epíteto que designa os santos. Eles são ch am ad o s u m povo q u e conhece o seu D eus. E possível supor que povo, aqui, signifique a classe ordinária, m as isso é forçado. Também é possível supor esteja ele representando os gentios profanos; eu, porém , creio haver aqui um contraste im plícito entre os verdadeiros e genuínos filhos de A braão e os fal sos israelitas, que se vangloriavam em ser m em bros da Igreja, 383 [11.31, 32] DANIEL quando nada m ais tinham senão um m ero título sem conteúdo. Pois nos profetas e nos escritos de M oisés a designação ‘povo’ é às vezes usada num sentido favorável para aquela nação eleita que D eus havia adotado com o peculiarm ente sua. Todos os isra elitas que eram descendentes de A braão segundo a cam e costu m avam gabar-se orgulhosam ente de ser o povo eleito, e assim a palavra estava sempre em seus lábios. Por isso o profeta reprova a tola vanglória daqueles que costum avam esconder-se debaixo do nom e de D eus sem ter nada de real em si mesmos. D aí o povo, significando o povo de Deus, se fo rta lecerá ; mas, à guisa de cor reção de algum conceito errôneo, ele adiciona: q u e c o n h ec erá a D eus, com o no Salm o 73 [v. 1]: Quão bom é o D eus de Israel para com os de coração reto! Aqui o profeta restringe o título Israel aos filhos eleitos de A braão que cultivavam a piedade sé ria e sinceram ente, com o se tornara um hábito prevalecente m e dir cuidadosam ente esse nome de Deus. Assim aqui, o povo que conhecerá seu D eus significa seu povo genuíno - aqueles a quem ele reconhece com o seus eleitos. O anjo aqui faz um a distinção entre os filhos piedosos de A braão e os adoradores piedosos de D eus. E digno de cuidadosa observação que o anjo assinala seu conhecim ento de Deus com o a causa e fundam ento de sua cons tância. Com o, pois, podem os perguntar, é possível que alguns poucos sejam deixados, enquanto os apóstatas continuam a pros tituir-se? Porque seu conhecim ento de D eus prevalecerá e os ca pacita a vencer esses ataques e bravam ente os repelem e se tor nam superiores a qualquer tentação. Vemos, pois, a fonte donde em ana nossa própria fortaleza - o conhecim ento de Deus. Tal reconhecim ento não é um a im aginação fútil e fria, senão que flui daquela fé que finca bem fundo suas raízes em nossos corações. Donde se segue que não reconhecerem os realm ente a D eus a não ser que ousadam ente encarem os com otim ism o o teste e perm a neçam os firmes e resolutos, em bora Satanás tudo faça, usando infindas m aquinações para m inar nossa fidelidade. E a menos 384 6 1 * EX P O SIÇ Ã O [11.31, 32] que persistam os naquela firm eza que é aqui descrita, é por de m ais evidente que Deus jam ais será verdadeira e realm ente reco nhecido por nós. A relação também não é destituída de peso na frase: o povo que conhecerá seu Deus. Aqui está um a reprovação silenciosa, visto que D eus se revelou aos israelitas o quanto lhes era suficiente para reterem seu com prom isso de fidelidade. N in guém , pois, poderia oferecer qualquer justificativa sem se fazer culpado de im piedade, sacrilégio e perfídia, depois de ser tão ple nam ente instruído pela lei e pelos profetas. Essa instrução deve agora aplicar-se a nosso próprio tempo. Observamos em nossos dias quantos abandonam a Igreja. A perse guição peneira todos os que professam pertencer a Cristo, e assim m uitos são joeirados com o palha, e apenas um a pequena porção permanece inabalável. Sua apostasia não deve subverter nossa fi delidade quando tão displicentemente abandonam toda piedade, ou quando se vêem atraídos pelos entretenimentos de Satanás, ou quando enganados pela conduta dos ímpios. M antenham os em mente a declaração do anjo, e assim o verdadeiro conhecim ento de Deus reinará supremamente em nossos corações, e ainda avança remos no curso que já começamos e cujo alvo perseguimos. E para m ostrar quão consistentemente os fiéis progridem na instrução da lei e do evangelho, ele diz: eles se fo rtalecerão e o farão . Aqui o verbo “fazer’ é tom ado no sentido de ‘executar’ - ‘exploicter’, com o dizemos em francês. Significando: eles concentrarão sua coragem no cumprimento de seu dever; pois o verbo ‘fazer’ ou ‘executar’ aponta para a vocação dos piedosos; eles não seriam lerdos nem indolentes no cumprimento de seu dever, diz o profeta, m as reuniriam coragem para essa peleja. E o que dizer do reconhe cimento de Deus? Observamos também que a fé não é um senti mento ocioso nem um a imaginação fria, permanecendo sufocada em nossa mente, mas um princípio energizante. Pois podem os afir m ar que da fé em ana a força; e da força, a execução; e assim evita mos toda indolência em nossa vocação. Prossegue-se: 385 111.33,34] DANIEL 3 3 E aq u eles d o p o v o q u e e ntendem instruirão a m uitos; todavia cairão pela espada, pelo fogo, peto cativeiro e p e lo e spólio, p o r m uitos dias. 3 3 E t intelligentes populi d ocebunt m ulto s, et c adent in glad io , e t flam m a, e t exilio, vel, capiivitate, et direptione, diebus rnultis. 3 4 O ra. q u a n d o caírem , serão a judados c o m p e q u e n o so c o rro ; m u ito s, p o ré m , ad erirão a eles com lisonjas. 3 4 E ti n c a d e n d o ,l79ju v a b u n tu ra u x ilio 1“ m o d ic o :e ta d ju n g e n ts e ilIis m u ltiin b la n ditiis. Com referência às palavras, elas significam aqueles que se rão ensinados entre o p o vo fa rã o com que m uitos entendam. A l guns tomam a prim eira palavra do versículo transitivamente, como “aqueles que instruirão” , porém estão equivocados. E revelam sua ignorância ao presum irem que o pronom e relativo vem antes do próxim o verbo, por exemplo: “e aqueles que ensinarão” . O sentido sim ples é este: “Aqueles que serão sábios entre o povo ensinarão a m uitos.” Aqui o profeta, sob a diretriz do anjo, prediz a m ultidão de apóstatas, bem com o a existência de alguns de um caráter contrário, que conservariam o povo dentro do culto puro e do tem or de Deus. Sem dúvida, ele fala especialm ente dos sa cerdotes. A grande m aioria era contum az, e envolvia o vulgo in sensato em sua perversidade. O bservam os os efeitos similares, em nossos dias, no papado, com o corrom pem o m undo inteiro com seus sacrifícios. N aquele tempo, os sacerdotes arm avam re des para o povo e arrastavam consigo quase todos para a m esm a im piedade. Aqui o anjo adm ite a existência de alguns sábios en tre o povo; não restrinjo isso inteiram ente aos sacerdotes, ainda que entendo o anjo com o que com eçando com eles. U m a peque na porção deles ensinava a verdade, e Deus uniu com eles uma parte, mas ainda o anjo prediz a existência de outro rem anescen te. Contudo depois, em segundo lugar, ele envolve os outros que eram realm ente proficientes na lei de Deus, e em bora as obriga ções do sacerdócio não os obrigassem , todavia labutavam para convocar os peregrinos ao cam inho da salvação. D iz ele, pois: Q uando caírem. '* Essas duas palavras procedem d a mesma raiz; com o “serão fortificados” é oriundo de ‘fortaleza’; assim "eles serão assistidos”, de assistência." 386 6 1 * EX P O SIÇ Ã O [11.33, 34] Quem fo sse habilidoso deveria ensinar a muitos. H á tam bém aqui um tácito contraste entre os honestos servos de D eus e os m estres de ficção que se orgulhavam de seus títulos; com o observam os o m esm o exem plo disso no papado de nossos dias. Pois os bispos e cardeais, os abades e pretendentes desse gênero se pavoneiam com insolência e im becilizam o vulgo m iserável. Porventura não representam os a Igreja? N ão nos com pete ju lg ar e interpretar a Lei e as Escrituras? Portanto, com o é possível que nestes tempos tais im postores arroguem para si todo conhecim ento e preten dam ser vistos com o em pé de igualdade com os anjos, quando sabem os que o m esm o se deu entre o povo antigo! O profeta, pois, aqui castiga a confiança estúpida, dizendo: Aqueles que serão entendidos entre o povo, significando os que eram realm ente sá bios. Com o se ele dissesse: os hipócritas m ascarados adquirem reputação para si, porém sem a m ínim a som bra de razão. Deus considera som ente os inteligentes que perm anecem na pura dou trina de sua lei e praticam a piedade com sim plicidade e sinceri dade. D aí ele os cham ar de os inteligentes dentre o povo. Ele reitera a palavra ‘povo’ no m esm o sentido de antes, significando que nem todos os que usam este nom e são de fato israelitas dian te de D eus, quando se requer verdadeiro conhecim ento dele. Que tipo de conhecim ento ou habilidade está im plícito facilm ente apreendem os do próxim o versículo. Pois todo conhecim ento que os hom ens im aginam possuir sem essa fam iliaridade com Deus nada mais é do que vaidade. Portanto, esses ensinarão a muitos. Esta predição angelical não só assevera a existência de alguns dentre o povo que perm aneceriam firm em ente no m eio de tão graves assaltos, e preservariam a integridade de sua fé, m as diz que eles seriam diretores de outros; com o se dissesse: Deus ou torgará a cada um de seus eleitos não só o poder de resistência ousada e perseverança pura e incontam inada no m eio de toda corrupção, mas, ao m esm o tempo, ele converterá esses bons ho mens em suportes para outros, seja im pedindo-os de se declina rem , ou de apostatarem , reconduzindo-os à reta vereda. 387 [11.33, 34] DANIEL Finalmente, o anjo tenciona dizer quão pequena semente Deus preservaria em sua Igreja com o m estres e líderes de outros, não passando de um pequeno número; com o diz Isaías: D eus consu m iria seu povo, porém , no meio d a destruição, ficaria um rem a nescente que se converteria [Is 10.22], A idéia desta passagem é a mesm a; mesmo que muitos se degenerassem e se apartassem da fé, e esse espírito se estendessem a todo o povo, todavia al guns poucos ficariam firm es - talvez dez em mil - e esses seriam m inistros de D eus na ação de congregar um a nova Igreja; e assim a terra outrora estéril se tom aria fértil com essa irrigação e pro duziria nova semente. Portanto, esses que seriam sábios no seio do povo ensinariam a muitos. Enquanto o anjo está aqui predi zendo o futuro, devem os levar a sério esta adm oestação: quanto m ais cada um de nós tom ar-se proficiente na fé, m ais deve ele esforçar-se ao máximo p o r m inistrar o ensino aos amigos rudes e ignorantes segundo esta exortação do anjo. D eus não nos estende sua mão para conduzir a cada um de nós em seu próprio curso, mas para dar assistência a outros e buscar seu avanço e progresso espirituais. Portanto, lemos aqui a condenação da indolência d a queles a quem D eus tem concedido m uito conhecim ento e fé, quando falham em usar aquela confiança que lhes foi entregue para a edificação de seus irmãos. Esta predição angelical deveria influenciar a cada um de nós, com o um a lei e norma, na busca do proveito de seus irmãos segundo a m edida de sua inteligência. O anjo acrescenta que esses não seriam mestres de sombras, os quais prescrevem os deveres dos homens em sua com odidade, e im pugnam sem aborrecim ento, perigo ou preocupação pessoal o que em si mesmo é certo e agradável a Deus, senão que seriam incansáveis guerreiros em prol da verdade. A qui, pois, o anjo ju n ta instrução com fortaleza, com o se com esta m edida fosse possível vencer todos os perigos, ansiedades e terrores. A passa gem se nos tom a, dessa forma, m ais útil em nossos dias, se ape nas aprenderm os a refletir sobre o que D eus nos entrega pela 38S 61* EX P O SIÇ Ã O [11.33, 34] instrum entalidade de seu anjo através de seu profeta. E m conclu são, pois, o anjo dem onstra com o D eus jam ais aprovará quais quer m estres com o verdadeiros e legítimos, a m enos que procla m em sua m ensagem e se prontifiquem a defendê-la, bem com o estejam preparados a selá-la com seu próprio sangue sem pre que fo r necessário. D evem os ler as duas sentenças juntas: A queles q u e en sin am a m uitos a a d o ra re m a D eus c a irã o p e la e sp a d a e pelo fogo; significando que preferirão cair ou perecer cem vezes pela espa da e pelo fogo antes que desistir de seu ofício de ensinar. Além disso, o anjo aqui m enciona os vários tipos de m orte, à guisa de exortação. Pois houvera ele m encionado apenas a espada, e não teria expresso plenamente a utilidade desta instrução. Sejam quais forem os m estres que D eus envie a sua Igreja, não serão plena m ente aprovados no cum prim ento de seu dever recebendo uma única form a de tentação, m as terão que contender com inimigos que se postam a sua direita e a sua esquerda, e não deverão per m itir que a variedade de perigos debilite ou sua constância ou sua coragem . Se a espada os am eaça de um lado, e o fogo do outro - se sofrerem o espólio de seus bens e o banim ento de seus lares, não obstante esses m estres irão perseverar e prosseguir em seu curso. O bservam os, pois, a m ultiplicidade de conflitos aqui enum erados pelo anjo, com vistas a ensinar-nos sobre a força da graça do Espírito em apoiar os m estres e líderes d a Igreja e a im pedi-los de ceder a qualquer tentação, ainda que estejam a con tender com a espada, o fogo, o exílio e o espólio de seus bens. Ele acrescenta: E isso ta m b é m p o r m u ito s dias. E sta cir cunstância possui grande peso, quando observam os m uitos su portando por algum tem po com coragem varonil e intrépida, mais tarde se debilitam e então desaparecem e chegam a ser totalm en te diferentes do que eram antes. O anjo, contudo, aqui prom ete aos que forem sustentados pelo Espírito de D eus um a constância invencível. Eles devem reunir nova coragem para novos confli 389 [11.33, 34] DANIEL tos, não só por um único dia, ou mês, ou ano, m as que jam ais fracassem diante deles. Em seguida acrescenta: E q u a n d o caí re m , ou se caírem , s e rã o fortalecid o s, ou assistidos, com p e q u e n o so co rro . Sem a mais leve dúvida, o anjo aqui fala dos M acabeus, por m eio de cuja assistência os fiéis foram congrega dos e com pletam ente separados daqueles apóstatas que haviam profanado o tem plo e o culto de Deus. Ele qualifica o socorro de pequeno, e realm ente assim foi. Pois seria possível que os M aca beus resistissem a Antíoco? A poderosa influência desse rei é bem notória; e o que era a Judéia com parada com a Síria? Os judeus de fato tinham destruído seu próprio poder; já vimos como violaram os tratados e corromperam a maioria de seu próprio povo: não restou entre eles nem habilidade, nem plano, nem concerto. O socorro, pois, enviado por Deus a eles era pequeno. M as então o anjo m ostra com o D eus providenciou socorro para seu povo quando em angústia, e lhes perm itiu algum alívio da crueldade do tirano. Em seguida ele acrescenta: M u ito s se ju n ta r ã o a eles p o r m eio d e lisonjas. D esse pequeno número o anjo ainda elim ina a m aioria, e lhes inform a sobre a m iserável condição da Igreja, porque bem poucos ousariam opor-se à dem ência do tirano, e desses poucos muitos seriam hipócritas. A totalidade deste capí tulo deve ser interpretada com o que apontando para Antíoco, e no entanto sem dúvida D eus deseja prom over nosso m elhora mento através dessas profecias. Elas nos pertencem igualmente; pois com o Deus governa a Igreja num a variedade de form as, as sim ele sem pre a sustenta sob grande variedade de cruzes e pro vações. Além disso, o velho inimigo, o diabo, que desde outrora é opositor da Igreja, nos é igualmente im pertinente. Ele nos as salta em parte por meio de inimigos externos e em parte por meio de inimigos internos. U m ensino com o este era útil, não só aos antigos, m as tam bém a nós nestes tempos. A ntes de tudo, o anjo prediz que a assistência que os fiéis receberiam seria pequena. 390 6 1 * EX P O SIÇ Ã O [11.33, 34] A prendam os, pois, quando Deus quer socorrer-nos e ajudar-nos, ele nem sem pre exerce a plenitude de seu poder. Ele não usa o trovão do céu nem subjuga nossos inim igos golpeando-os com seu relâm pago; m as nos capacita a enfrentar vitoriosam ente nos sa cruz, e assim ele nos faz ainda mais separados dos réprobos através de nossa firm eza e resistência. Além disso, à luz d a se gunda sentença observam os com a absoluta certeza que muitos hipócritas se infiltram no meio dos filhos de D eus; e quando Deus purifica sua Igreja, apenas um a pequena porção dela permanece sincera, justam ente com o nestes dias a m esm a reprodução desta profecia é exibida ante nossos olhos. Todo o papado é cham ado a Igreja de Deus; somos apenas um pequeno núm ero; e no entanto que m escla ainda existe entre nós! Quantos nestes dias profes sam fidelidade ao evangelho, em quem nada existe de sólido ou de sincero! Se D eus fizer um a busca bem detida nas pequenas igrejas, ainda entre esses poucos alguns seriam achados engana dores. N unca foi diferente, tam pouco será diferente quando o fim do m undo chegar. Aqui, pois, somos admoestados a desejar, quan to estiver em nosso poder, a pureza da Igreja e evitar toda e qual quer im pureza; porque, ao desejarmos auxiliares tão ávidos pela com pulsão de algum a necessidade urgente, estejam os certos de ser m anchados com muitas nódoas que poderão, por fim, cobrirnos de confusão. O anjo, sem dúvida, aqui reprova a falha na conduta dos M acabeus. Em bora D eus os incitasse a propiciar al gum a consolação a sua Igreja, seu procedim ento não deveria ser reprovado; pois não se deduz que todas suas ações fossem louvá veis, porque sua causa era pia e santa, m as preciso prorrogar para am anhã a discussão deste tema. ORAÇÃO Deus Todo-Poderoso, visto que neste dia tu provaste a f é de teu povo com muitos testes, fa z com que eles obtenham fo rça daquela invencí vel coragem oriunda de teu Espírito Santo. Que marchem constante mente sob teu estandarte, até o fim , e que jam ais sucumbam ante 391 DANIEL qualquer tentação. Que a i juntem os inteligência e zelo na edificação de tua Igreja. Que cada um de nós seja dotado com dons superiores, e assim lutemos pela edificação de seus irmãos com mais ousadia, varonilidade e fervor, enquanto ele busque aum entar o número para tua causa. E enquanto o número dos que são meros membros profes sos de tua Igreja diminui, mas que alguma semente dela sempre per maneça, até que abundante produção flu a dela e uma fertilidade tal surja que fa ça com que teu nome seja glorificado pelo m undo inteiro. Em Jesus Cristo nosso Senhor. Amém. 392 62a • /W //f e m e ç a m o s ontem explicando o que o anjo disse sobre a fuO tura perseguição d a Igreja e sua subseqüente consolação. Ele prim eiram ente m ostrou com o todos os inteligentes dentre o povo se sujeitariam à crueldade de seus inim igos, em conseqüência de sua varonil perseverança em instruir a outros. Já m ostram os quão ineficientes seriam aqueles m estres a quem Deus poria sobre sua Igreja, caso cum prissem seus deveres no ócio e à som bra e sem preparado para enfrentar todos os em bates e a intrepidam ente expor sua vida a um a variedade tão grande de perigos. Este, pois, é o m étodo de ensino vivo e eficaz, a saber: quando não cessa mos de cum prir nossos deveres por entre a espada e as chamas. M as, em contrapartida, é preciso notar por quantos essa instru ção é buscada quando surgem esses conflitos fatais. M uitos em nossos dias ouvem nossa instrução concernente a C risto; som en te eles continuariam sem injúria ou aborrecim ento. Observam os m uitos avidam ente bebendo as doutrinas evangélicas; m esm o assim , quando algo dispersa a m ultidão, fogem im ediatam ente, e com m enos consideração ainda de quando se uniram antes à as sembléia. Tal conduta que diariamente observamos era igualmente com um nos prim eiros tem pos. Evidentem ente basta essa falha que tanto prevaleceu ao longo de todas as eras, e é inato nos ho mens não só escapar da cruz e de todas as coisas vexatórias, mas especialm ente exibir suas próprias fraquezas, visto que se indis põem a enfrentar qualquer risco pelo culto divino e pela livre confissão da verdade. 393 [11.33, 34] D A N IE L Esta passagem , pois, merece ser bem analisada, visto que o profeta não só exorta que os eruditos e os sábios instruam a ou tros, m as prescreve um a regra para o leviano e iletrado, insistin do que se fortaleçam contra todas as tentações quando virem to das as coisas em confusão e Satanás tram ando a com pleta aniqui lação da piedade. Com o esta é a linguagem do anjo, devem os observar diligentem ente as circunstâncias dos tem pos, pois ele aqui não estava instituindo um a escola pacífica e discursando com o fazem os filósofos em sua com odidade acerca da virtude sem qualquer contestação prática; porém reforça o dever de apren der e de ensinar, ainda quando um a variedade de m ortes for posta diante de nossos olhos. Em seguida ele usa, com o já afirm ei, a linguagem de consolação. D eus m ostra com o providenciaria au xílio para seus eleitos, em bora possivelm ente não lhes parecesse de nenhum a conseqüência. Pois ele insiste sobre a pequenez da assistência - a qual literalmente se concretizou. Sem dúvida o anjo se referia a M atatias e seus filhos, geralmente cham ados os M acabeus [1 M acabeus 2.1]. A restrição im posta a esse auxílio consiste na alusão aos m em bros daquele pequeno grupo que pro variam ser hipócritas. Estam os plenam ente cientes com o a Igreja seria reduzida em sua extensão, pois nem todos provariam ser sadios na fé, senão que a m aioria seria desviada por aquelas falá cias que aqui o anjo denom ina de bajulações. Isso constituiu uma provação muito grave para os fiéis, ao perceberem seu núm ero tão exíguo e sua força tão pouca para enfrentar seus inimigos. Além disso, não ousavam confiar naqueles aliados que lhes ti nham penhorado sua fé e feito m aravilhosas prom essas, já que m uitos foram enganados por suas lisonjas e abandonaram a cau sa pela falta de sinceridade mental. Jácham am os a atenção para a inutilidade de tal instrução para nossos dias; pois devem os aplicá-la pessoalm ente a nós mesm os, visto que nossas circunstâncias se assem elham às dos antigos. D a grande multidão dos que desejam ser considerados cristãos, 394 62* EX P O SIÇ Ã O [11.33, 34J observam os quão poucos retêm o culto divino em sua pureza e integridade. O s papistas tratam sua própria com unidade, que está m aculada com todo gênero de corrupção, com o se fosse a única igreja; ali a piedade é totalm ente subvertida ou contam inada com incom ensurável acúm ulo de superstições. E m esm o naquela pe quena com panhia que se tem afastado das idolatrias papais, a m aioria está saturada de perfídia e fraude. Pretendem um zelo extrem ado, porém se você os exam inar detidam ente, descobrirá que estão cheios de falsidade. Pois se Deus esquadrinhar sua Igreja em seu âm ago, com o fez alguns anos atrás na Alem anha, e como pode fazer brevem ente em nosso próprio caso, em todos esses graves conflitos e em meio a essas perseguições, m uitos que se vangloriam da bravura de sua com panhia, e todavia seu zelo se evaporará im ediatamente. Q uando o Senhor, pois, exercitar-nos por m eio de m étodos sem elhantes àqueles por meio dos quais provou a Igreja antiga, essa instrução deve sem pre vir a nossa m em ória, para que nossa mente não se tom e obtusa e lânguida. Esta passagem pode levar-nos a inquirir se o anjo aprovou todas as lutas dos M acabeus. Podem os responder à pergunta de duas maneiras. Em prim eiro lugar, se alguém persistir em argu m entar com base nas palavras do anjo em prol d a aprovação divi na da própria ação dos M acabeus, tal ponto de vista de form a algum a é correto. D eus poderia usar os M acabeus para socorrer os desditosos israelitas, e contudo não se segue que conduzissem a boa causa com propriedade e licitude. C om m uita freqüência ocorre que os fiéis oferecem seus serviços a D eus sem terem um objetivo definido diante dos olhos, de m odo que falham ou por inconsiderado zelo ou por ignorância parcial. Se assum irm os ou não esse ponto de vista, nosso objetivo é às vezes bom quando nosso modo de proceder é passível de objeção. E assim se deu com os M acabeus; Deus, sem dúvida, incitou M atatias a reunir o rem anescente disperso do povo para restaurar seu culto e expur gar seu tem plo das abom inações que Antíoco ali estabelecera. 395 [11.35] D A N IE L Todavia nos tempos turbulentos que transcorriam , seus filhos, sem dúvida, fracassaram em seus deveres em muitos aspectos. A causa que defendiam era justa, enquanto os detalhes de suas ações não podem ser aprovados por nós. Então prossegue: 3 5 E alguns d o s en ten d id o s cairão , para serem p rovados e purificad o s e em branq u ecid o s, até aquele tem po do fim ; porque será ainda p ara o tem po determ inado. 3 5 E t e x inteüigentibus c adent ad proband u m 1’ 1 tn ipsis,l!J e t m u n d an d o s.1*’ e t dea lbandos u sque ad tem pus finis, id est, f i nitum, quoniam adhuc usq u e a d prsefixum tem pus. O anjo persegue a m esm a idéia de antes; ele nos m ostra com o os filhos de Deus, em sua ânsia por defenderem a causa da pieda de, seriam objetos de muitas e graves perseguições. A lg u n s dos e n ten d id o s cairão . Significando que a calam idade não sobrevi rá apenas por um m om ento; pois os que avidam ente desejavam defender o verdadeiro culto de Deus pereceriam pela espada e pelo fogo e por outros m étodos de destruição, e seus sucessores tam bém sofreriam as mesm as calam idades. A frase os entendi dos cairão im plica o perecim ento da própria flor da Igreja. H ave rá sem pre muito refugo entre um povo, e a m aior parte dele foge e se revolta quando sua religião requer deles o sacrifício de sua própria vida. Uns poucos ficam, aqui cham ados inteligentes, os quais, com o declaram os ontem, não são os sábios segundo a car ne. Fazer provisão para a carne significa cuidar de si m esm o e de seus próprios interesses, não correndo riscos e evitando todo e qualquer problem a; enquanto que os assim cham ados inteligen tes, os quais, esquecendo duas próprias vidas, se oferecem em sacrifício a Deus. Estes não hesitam em incorrer no ódio univer sal e estão preparados p ara encontrar a m orte com coragem . O anjo, pois, prediz o perecim ento da flor da Igreja. Pois quem po deria ter esperado que o nome de D eus continuasse a existir so 181 O u. p ara ser tentado; a palavra significa propriam ente derramar. 142 Isto é, purificá-los. Ou, purificá-los novamente. 396 6 2 * EX P O SIÇ Ã O [11.35] bre a terra quando todos seus sinceros adoradores fossem assim im punem ente assassinados? A severidade do despotism o de Antíoco é notória. N inguém ousava pronunciar um a palavra. Todos os livros sacros eram queim ados, e ele cria que o culto divino tinha sido totalm ente abolido. As m ulheres com seus filhos eram prom iscuam ente levados para a fogueira, e os líderes desse tira no não poupavam nem as m ães com seus pequeninos que pendi am de seus peitos [ 1 M acabeus 1]. Durante o progresso de cruel dade tão atroz, quem não teria im aginado que toda a sem ente de Deus tinha sido extinta? M as o anjo aqui m ostra que o verdadei ro resultado seria diferente, isto é, os filhos de D eus seriam pu rificados e em branquecidos. Sua intenção era dizer que todos os acontecim entos não se provariam destrutivos, mas, antes, pro m overiam sua salvação. Esta passagem nos revela a natureza da verdadeira prudência aos olhos de D eus; pois devem os estar pre parados para a m orte, em vez de renunciar a espontânea e corajo sa profissão da doutrina celestial e do verdadeiro culto de Deus. Pois isso necessariam ente está im posto aos filhos de D eus - ou caírem pela espada ou pelo fogo, ou sofrerem o espólio de seus bens e serem banidos de seus lares. O anjo realça à luz do resul tado com o as perseguições que parecem resultar na destruição da Igreja na verdade são proveitosas e salutares para os filhos de Deus, sendo este o m étodo usado para que sejam purificados, lavados e embranquecidos. M as devem os ter sem pre em mente com o algum as borras viciosas precisam ser extraídas, as quais perm anecem nos eleitos; sim , até m esm o entre os santos m árti res. O anjo aqui não trata de hipócritas nem de crentes com uns, m as de tudo quanto é m ais conspícuo e m ais em inente no seio da Igreja, e não obstante assevera sua necessidade de purificação. N inguém , pois, conclui ele, possui tal santidade e pureza que o isentem de algum resto de poluição que reclam a remoção. Daí tornar-se necessário que passem pela fom alha e sejam purifica dos à sem elhança do ouro e prata. Isso se estende a todos os m ár tires de Deus. 397 [11.35] DANIEL Isso nos lem bra a grande estupidez dos papistas que im agi nam que os m éritos dos santos são transferidos em nosso favor, com o se nada mais lhes fosse requerido. As indulgências, com o as cham am , dependem desse erro, de conform idade com o se guinte raciocínio: se Pedro tivesse vivido o período ordinário da vida humana, ele teria provado ser fiel até o fim , e então teria m erecido a coroa do reino celestial; mas, ao ir além disso, e der ram ado seu sangue em martírio, alguns m éritos foram supera bundantes; esses não podem ser perdidos, e daí o sangue de Pe dro e de Paulo nos é proveitoso hoje para a rem issão dos peca dos. E ssa é a teologia dos papistas, e esses sofistas m iseráveis não se envergonham de tão grosseiras blasfêm ias, enquanto vo mitam tão torpe sacrilégio - os próprios m ártires são beneficia dos ao enfrentarem a m orte por causa de sua adesão à verdade, porque D eus os purga e lava e os refina e os em branquece. O anjo não teria dito isso se não restasse nos santos algum a mistura de escória que ainda os macula. M as esta doutrina deve ser mais que suficiente para animar-nos a enfrentar todos os perigos, quan do nos virmos m anchados e contam inados com escória secreta; além disso, devem os certam ente determ inar que a m orte seria proveitosa nesse sentido, com o D eus então nos purgará daqueles vícios pelos quais somos tanto infectados quanto manchados. D aí o valor da repetição aqui; o anjo não diz sim plesm ente que serão purificados, mas acrescenta: lavados e embranquecidos. Seja qual for a santidade que se m anifeste no m elhor dos hom ens, todavia m uitas m anchas e m uita poluição perm anecem escondidas em seu íntimo; e assim, em conseqüência de suas muitas falhas, a perseguição sem pre lhes será proveitosa. O anjo m itiga tudo quanto possa parecer excessivam ente amargo, dizendo: a té o te m p o do fim , significando um tem po fixo e definido. Essas palavras im plicam o caráter m isericordio so de Deus, não insistindo que seu povo vá além de sua força, com o Paulo tam bém declara sua fidelidade em conceder-lhes um 398 6 2 * EX P O SIÇ Ã O [11.36] resultado feliz de suas provações, e em não pressionar-nos além da m edida daquela força e coragem que ele nos tem conferido [IC o 10.13]. O anjo prediz um térm ino desses m ales, e confirm a essa opinião, dizendo: até um tempo determ inado. N a últim a sen tença, ele expressou a natureza tem porária das perseguições de que falara; pois não cessariam diretam ente, nem ainda por dois ou três anos. C om as palavras: até um tempo determ inado, ele insiste com os filhos de D eus que se preparem p ara novas lutas, visto que ainda não alcançariam o alvo pelo espaço de um ano. M as se D eus os quisesse hum ilhar por três ou dez ou cem anos, não dependeriam de apenas esperar pelo tem po divinam ente pre determinado, sem depender de sua própria vontade. Essa é a subs tância da instrução com unicada. A gora ele prossegue: 3 6 E o rei fa rá conform e sua vonlade; e se exaltará e se m agnificará acim a d e todo deus, e falará c oisas m aravilhosas contra o D eus dos deuses, e p ro sp erará até se r co n su m ad a a indignação; porque aquilo que está determ inado se fará. 3 6 E t faciet secund um voiu n tatem suam , vel, libidinem, rex: e t e x to lle t se, e t m agnificab it se su p ra o m n em D eu m , e t contra D eum d eo ru m lo q u e iu r m irb ilia, e t prospere aget u sque ad consum m ationem i r a , q uoniam d ecisio facta e st, vel decisa esl, nempe consumptio. Esta passagem é m uito obscura, e conseqüentem ente tem sido explicada pelos intérpretes de muitas formas opostas. E tudo quan to é obscuro é geralmente duvidoso, e haveria pouca utilidade e nenhum a conclusão se eu fosse narrar as opiniões de todos eles. Portanto, seguirei outro método; e, om itindo todo labor supér fluo, sim plesm ente buscarei a intenção do anjo. Entretanto, devo referir-m e sucintam ente às opiniões aceitas pelo consenso da maioria, porque elas ocupam as m entes de muitos, e assim fecha rei ap o rta em prol da interpretação correta. Os judeus, por exem plo, não concordam entre si, e sua diferença de opinião só serve para produzir e perpetrar as trevas, em vez de difundir a clara luz. H á quem o aplique a Antíoco, e outros aos romanos, m as de uma m aneira diferente daquela que eu apresentarei depois. Os exposi tores cristãos apresentam grande variedade, m as a maioria se incli 399 [11.36] DANIEL na para o Anticristo com o cum prim ento da profecia. O utros, ain da, usam mais moderação, supondo ser Antíoco um tipo e im a gem do A nticristo. Esta últim a opinião tem grande probabilida de, porém eu não a aprovo, e posso refutá-la com facilidade. A ntíoco não sobreviveu muito à profanação do tem plo, e então os acontecim entos que seguiram de m odo algum se adequam às ocorrências de seu tempo. Tam pouco seus filhos podem honesta m ente ocupar seu lugar, e daí devem os buscar algum outro rei, distinto de A ntíoco e seus herdeiros. Com o já afirm ei, alguns dos rabinos aplicam isso aos romanos, m as sem razão, porque pri m eiram ente aplicam a passagem a Vespasiano e a Tito, seu filho, e então a estendem aos tem pos atuais, o que é totalm ente sem razão, quando tagarelam tolam ente, segundo seu habitual costu me. Os que a aplicam ao Anticristo têm algum laivo de razão em prol de seu ponto de vista, porém não há solidez em sua conclu são, e perceberem os isso m elhor no progresso de nossa exposi ção. Devem os agora descobrir que rei o anjo aqui designa. Em prim eiro lugar, a aplico inteiram ente ao im pério rom ano, porém não o considero com o iniciando-se com o reinado dos Césares, pois isso seria inadequado e fora de data, com o veremos. Pela palavra ‘rei’ não creio estar indicada um a só pessoa, m as um im pério, tudo o que envolve seu governo, seja através do senado ou dos cônsules ou dos procônsules. Isso não precisa parecer abrupto ou absurdo, quando o profeta esteve previam ente discu tindo as quatro m onarquias, e quando ao tratar dos rom anos ele denom ina seu poder de reino, com o se tivessem sobre si apenas um único governante. E quando falou da m onarquia persa, ele não se referiu a um único governante, m as incluiu todos eles, desde C iro até o últim o, Dario, que foi vencido p o r Alexandre. Esse m étodo de linguagem já nos é bastante familiar, quando a palavra ‘rei’ às vezes significa ‘reino’. O anjo, pois, ao dizer um reifa r á tudo, a alusão não é a Antíoco, pois toda a história refuta tal idéia. Além disso, ele não tem em m ente um único indivíduo, pois onde acharemos um que se exaltasse acim a de todos os deu400 62* EX P O SIÇ Ã O [11.36] ses? Q uem oprim iu a Igreja de Deus e fixou seu palácio entre dois m ares e se assenhoreou de todo o O riente? Tão-som ente os romanos fizeram isso. Pretendo m ostrar m ais claram ente am a nhã quão bela e pertinentem ente tudo o que o anjo relatou se aplica ao im pério romano; e se tudo parecer ou obscuro ou duvi doso, um a interpretação contínua o trará à luz e o confirm ará. Estabeleçam os isso um a vez por todas; a profecia do anjo não aponta para Antíoco. nem para um único monarca, m as para um novo im pério, ou, seja, o romano. Temos em mãos a razão por que o anjo passa diretam ente de Antíoco para os romanos. Deus queria dar suporte aos espíritos dos santos, para que não se sen tissem esm agados pelo núm ero e peso dos m assacres que eles e toda a Igreja aguardavam ainda no advento de Cristo. N ão era suficiente predizer as ocorrências sob a tirania de A ntíoco; p o r que depois desse tem po a religião judaica foi m ais e m ais injuri ada, não só por inim igos estrangeiros, mas por seu próprio sacer dócio. N ada ficou sem ser profanado, um a vez que sua avareza e am bição chegaram a tal ponto que pisaram sob seus pés toda a glória de D eus e a própria lei. D em andou-se dos fiéis que se for talecessem contra tão num erosas tentações, até que Cristo viesse e então Deus renovasse a condição de sua Igreja. O tem po, pois, intercalado entre os M acabeus e a m anifestação de Cristo não deve ser omitido. A razão é agora bastante clara por que o anjo passa im ediatam ente de Antíoco para os romanos. Em seguida devem os averiguar com o os rom anos se conecta ram com o povo eleito de Deus. Seu dom ínio se lim itava apenas à Europa, e a alusão a eles teria sido inútil e fora de lugar. Mas desde o período em que os reis d a Síria se viram oprim idos por muitas e constantes devastações oriundas da guerra, tanto inter nas quanto externas, se viram incapacitados para prejudicar os judeus com o havia feito anteriorm ente. Então novos problem as provinham dos romanos. Sabem os, aliás, quando m uitos dos reis da Síria se deixaram dom inar pela arrogância, os rom anos impu401 [11.36] DANIEL seram sua autoridade e isso tam bém com má fé, com o propósito de sujeitar a si o oriente. E quando Á talo fez o povo rom ano seu herdeiro, toda a Á sia M enor veio a ser absorvida por eles. Converteram -se em senhores da Síria pela vontade desse rei insano, o qual defraudou seus herdeiros legais, pensando que com essa conduta adquiriria algum respeito a sua m em ória depois de sua morte. D esde aquele período em que os rom anos prim eiro adqui riram um a prova da riqueza dessas regiões, nunca m ais deixaram de achar algum a causa para guerra. Por fim Pom peu subjugou a Síria, e Luculo. que anteriorm ente declarou guerra contra M itridates, restaurou o reino para Tigranes. Pom peu, com o já obser vei, subjugou a Síria aos romanos. N a verdade ele deixou o tem plo intocado, mas podem os conjeturar a crueldade que ele teria exercido sobre os judeus em virtude da prática usual desse povo. A clem ência dos rom anos para com as nações que subjugavam é bastante notória. D epois que Crasso, o mais rapace de todos os hom ens, ouviu falar da riqueza dos judeus, ele desejou aquela província para si. Sabem os tam bém com o Pompeu e César, en quanto eram amigos, partilharam o mundo inteiro entre si. A Gália e a Itália foram designadas inteiram ente a César; Pom peu obteve a Espanha e parte da Á frica e Sicília; enquanto Crasso obteve a Síria e as regiões orientais, onde m iseravelm ente pereceu, e sua cabeça, coberta de ouro, foi carregada com m otejo de um lugar a outro. U m a segunda calam idade ocorreu durante aquela incursão de Crasso, e desde esse tem po os judeus foram acossados por muitas e contínuas guerras. Antes desse período, tinham entrado em aliança com os romanos, com o somos inform ados pelos li vros dos M acabeus, bem com o por escritores profanos. Portanto, quando concederam liberdade aos judeus [1 M acabeus 8 e 14], difundiu-se184 que eram generosos à expensa de outros. E ra sua prática ordinária e usual; a princípio recebiam com am izade a 1810 latim é “ille d i c e b a t o francês tem “un quidam sidoiC - um a curiosa m istura que im plica incerteza. Seria Crasso? 402 6 2 * EX P O SIÇ Ã O [11.36] quantos buscassem sua aliança por meio de tratado, e então os tratavam com extrem a crueldade. O s desditosos judeus foram tra tados dessa forma. O anjo, pois, os m enciona prim eiro, e depois fala de Antíoco. Todos esses pontos, assim brevem ente m encio nados, devem ser m antidos na mente, para capacitar-nos a enten der o contexto e m ostrar a im possibilidade de interpretar a profe cia de outra form a que exclua os romanos. E agora tom o as palavras: O rei f a r á seg u n d o su a vontade. Já declarei que não precisam os restringir esta expressão a um a única pessoa, visto que o anjo profetiza sobre o curso contínuo d a m onarquia romana. E le se e x a lta rá e se m a g n ifica rá, diz ele, acim a d e to d o deus. Isso será explicado passo a passo, onde lemos que o rei desprezava todas as divindades. M as, com refe rência à presente passagem , em bora a im piedade e o m enosprezo por Deus se difundissem por toda parte do mundo, sabemos como peculiarm ente isso se pode dizer dos romanos, porque sua sober ba os levou a em itir a opinião sobre o direito de cada divindade de ser adorada. E, portanto, o anjo usará um epíteto para Deus, significando força moral e provisões, □'tUD, m egnezim , com o no versículo 38. E ssa mensagem, m ostrarei am anhã, tem sido m uito mal explicada; pois os intérpretes, com o descobrirem os, estão totalm ente “à deriva” quanto a seu sentido. M as aqui o anjo, ao atribuir aos romanos desprezo por D eus e por todas as divin dades, subentende seu intenso orgulho e arrogância, no quê su plantaram a todas as nações profanas. E na verdade não preserva ram nem m esm o um tem or supersticioso por D eus; e enquanto jactanciosam ente ostentavam a piedade superior de seus ances trais e de si próprios, todavia um a acurada leitura de seus escritos revelará o que realm ente pensavam . Faziam de todas as divinda des alvo de zom baria e ridicularizavam a própria palavra e a apa rência de piedade, e só a usavam com o propósito de m anter seus súditos em obediência. O anjo então fala desse im pério em term os m ais reais: se 403 [11.36] D A N IE L m a g n ific a rá c o n tra to d as as div in d ad es; e fa la rá coisas m a rav ilh o sas c o n tra o D eus dos deuses, pelo quê subentende a religião judaica. Pois antes de haver passado para a Á sia M enor e penetrado além do Tauro, eles eram ignorantes quanto à lei de Deus e jam ais ouviram falar do nom e de M oisés. Então com eça ram a ter notícias do culto a algum deus peculiar daquela nação e d a form a de sua piedade com o distinta daquela de todos os d e m ais povos. A partir do período em que o conhecim ento das pe culiaridades d a religião judaica passou a difundir-se entre os ro manos, com eçaram a vomitar suas blasfêm ias contra o D eus dos deuses. N ão precisam os reunir provas deste fato de suas históri as; porém Cícero, em sua oração a Flacus [sec. 28], rasga desde nhosam ente em mil pedaços o nome do verdadeiro D eus; e esse im undo blasfem o - porquanto ele m erece tal título - assim vom i ta suas calúnias, com o se o Deus que se revelou a seu povo eleito por m eio de sua lei fosse indigno de ser posto lado a lado com Venus ou Baco, ou seus dem ais ídolos. Finalm ente, ele trata os num erosos massacres aos quais os judeus foram expostos com o um a prova de que sua religião era odiada por todas as divinda des; e ele crê que isso era um sinal suficiente do caráter detestá vel de sua religião. O anjo, pois, tem m uita razão em declarar que os rom anos se entum eciam de soberba e arrogância com o se não hesitassem em tratar o nome do verdadeiro D eus com tão m ar cante desprezo. D iz ele: Ele p ro n u n c ia rá coisas e x tra o rd in á ria s c o n tra o D eus dos deuses. O anjo parece indicar um único indivíduo, mas já declaramos que sua referência é a esse império. Ele então acres centa: E p r o s p e ra rá a té a co n su m ação ou conclusão ou térm i no d a in d ig n ação , j á q u e a d e te rm in a ç ã o j á estav a d e c re ta d a . Aqui o anjo também trata de um a longa sucessão e série de vitó rias, as quais im pedem a aplicação da passagem a Antíoco. Pois ele m orreu im ediatam ente depois de haver saqueado o templo; toda sua prole pereceu uns nas mãos dos outros; e os romanos, 404 6 2 * EX P O SIÇ Ã O [11.36] para sua grande desgraça, adquiriram a posse da Síria e aquela porção do Oriente. Temos de necessariam ente explicar isso com o aplicando-se aos rom anos, com o notoriam ente prosperaram em suas guerras, especialm ente no continente asiático. E se às vezes se viram em dificuldades, com o verem os am anhã ao tratarmos das palavras que o anjo então usará, logo recuperavam seu habi tual sucesso. O anjo aqui diz: E ste re i p ro s p e ra rá a té o fim d a indignação; significando que, até D eus haver castigado os hipó critas e assim hum ilhado sua Igreja. Atribuo isso a Deus, com o explicarei com m ais detalhes amanhã. ORAÇÃO Deus Todo-Poderoso, visto que nestes dias as atividades do mundo se encontram em estado de conturbação e para onde volvamos nos sos olhos nada mais vemos senão horrível confusão, rogo-te que nos concedas a bênção de poderm os atentar bem para teu ensino. Que jam ais divaguemos seguindo nossas próprias imaginações, jam ais nos desviando pela vereda das preocupações, perdendo os rumos de nosso curso predeterminado p or ti. Que perseveremos firm es em tua palavra, te buscando sempre e sempre confiando em tua providên cia. Que jam ais nos hesitemos no que diz respeito a nossa seguran ça, já que te dispuseste a ser o guardião de nossa salvação; que te invoquemos sempre no sacrossanto nome de teu Filho unigénito. Amém. 405 63a ♦ / \ j jntem com eçam os um a exposição d a profecia, na qual o anjo \ __' com eça tratando do im pério romano. M ostrei então a im possibilidade de aplicar qualquer outra exposição à passagem , quando teria sido absurdo fugir do ponto m ais necessário a ser conhecido. Bem no início declaram os que D eus não inform ou a D aniel outras ocorrências com propósito de despertar a tola e vã curiosidade de m uitos, mas de fortificar seus servos e evitar que apostatassem no m eio das mais graves lutas. D epois da m orte de Antíoco, porém, sabemos por que várias e terríveis m aquinações Satanás em preendeu subverter a fé de todos os santos. P or essa razão sua coragem dem andava apoio. Se todo esse período tives se passado em silêncio, pareceria que D eus houvera negligencia do seus servos. Portanto, ou nosso tem a iniciado ontem teria sido inútil, ou esta sentença deve ser acrescida, para que a profecia não parecesse nem defectiva nem mutilada. E observam os previ am ente que, enquanto o anjo estava predizendo m udanças futu ras, não houve nenhum a om issão do im pério rom ano que seja novam ente introduzida aqui. Lem bremo-nos, pois, que o anjo não está agora falando de Antíoco, nem está fazendo um salto para o tem po do Anticristo, com o pensam alguns, m as ele tem em m en te um a série perpétua. E assim os fiéis seriam preparados para todos os assaltos que porventura fossem feitos a sua fé, se essa tirania não tivesse sido interposta. Cabe agora explicar o restante do versículo: A té o fim d a ira , p o rq u e a decisão se c u m p riu . O anjo havia narrado a perversidade desse rei, não poupando nem 406 6 3 * EX P O SIÇ Ã O [11.361 m esm o o D eus vivo, dardejando suas calúnias contra ele. E então ele acrescenta: Ele p r o s p e ra rá até o fim d a ira . Sem dúvida, o anjo aqui responde àquela provação que poderia esm agar com pletam ente os fiéis, a menos que esperassem que a m esm a che gasse a um final. Por ira ele não quer dizer a fúria daqueles que foram enviados com o procônsules à Á sia e ao O riente, nem ain da à am argura e rigor do povo rom ano e do senado, senão que a palavra se refere a Deus. Devem os lembrar, pois, o que expressei previam ente, isto é, os filhos de D eus são convocados a exam i nar suas faltas, a hum ilhar-se diante de D eus, sem qualquer m ur m uração ou queixa quando castigado por suas varas. Sabem os quão im paciente é a natureza hum ana ao deparar-se com adversidades, e quão de m á vontade os homens se subm etem à cruz, não só obstinadam ente recusando-a, mas francam ente se rebelando contra Deus. D aí os que são oprim idos por sua m ão são sempre insultuosos, a m enos que ele se m anifeste com o Juiz. O anjo, pois, aqui nos apresenta a razão p o r que Deus ousadam ente não expôs sua Igreja à sanha dos ím pios; ele apenas desejava aplicar o castigo devido a seus pecados; e o ju ízo terá sem pre que com e çar pela casa de Deus, segundo aprendem os de outro profeta [Is 10.12; Jr 25.29; IPe 4.17]. Em conclusão, pois, o anjo, em prim eiro lugar, exorta os san tos ao arrependim ento, e lhes m ostra quão m erecidam ente Deus estendeu sua m ão sobre eles, porque isso era absolutam ente ne cessário. Ele, pois, m itiga o que de outra form a teria sido por dem ais severo, acrescentando: a té o fim , ou consum ação. A pa lavra significa extinção e fim , m as aqui significa fim ou consu mação. A explicação vem a seguir: j á q u e a d e te rm in a ç ã o , ou decisão, foi feita, diz ele. Significa que Deus não conduzirá seus filhos a extrem os sem aplicar a m oderação, m as levará seu casti go a um fim depois de se hum ilharem . Com o lem os no capítulo 40 de Isaías, o tem po de seus conflitos estava com pletado, quan do D eus se apiedou de sua Igreja e a livrou d a tirania de seus 4 07 [11.37] DANIEL inim igos [v. 2]. Isaías ali fala na pessoa de D eus; a Igreja recebe ra duplo castigo, significando que lhe fora aplicado um castigo suficiente. Significa que ele quase se desgostou consigo mesmo por haver sido tão severo contra sua Igreja, quando estam os fa m iliarizados com a indulgência com que ele geralm ente trata seus filhos. Portanto, ele diz nesta passagem: A té o fim da ira\ signifi cando que o castigo seria apenas temporário, visto que D eus pres crevera um certo térm ino que poria fim a todos seus problem as e ansiedades. E prossegue: 3 7 E n ã o terá respeito pelo D eus d e seus pais, n e m p e lo d esejo d as m ulheres, n e m te rá resp eito p o r deus algum ; p o is ele se m agnificará acim a d e tudo. 3 7 E t ad d e o s patrum suorum non attend e t, e t a d d esiderium , vel, am orem , m ulie ru m .e ta d u llu m D e u m non attendet, quia su p er om ne, super om nia, se se m agnificabit. Não me adm ira ver que alguns apliquem esta profecia a Antíoco, experim entando algum a dificuldade com essas palavras; pois não podem satisfazer-se, um a vez que esta predição do anjo nun ca se concretizou em Antíoco, que não negligenciou todas as di vindades, nem o deus de seus pais. Então, com respeito ao am or das m ulheres, isso não se adequa a tal pessoa. É fácil, porém, provar, por outras razões já m encionadas, a ausência aqui de toda alusão a Antíoco. Alguns aplicam esta profecia ao papa e a M aomé, e a frase, o am or das mulheres, parece conferir probabilidade a este ponto de vista. Pois M aom é perm itiu aos homens a brutal liberdade de castigar suas esposas, e assim ele corrom peu aquele am or e fidelidade conjugais que unem o esposo a sua esposa. A m enos que o próprio homem esteja satisfeito com um a única es posa, não pode haver amor, porque não pode haver felicidade conjugal onde quer que exista rivalidade entre as esposas inferi ores. Com o, pois, M aomé perm itiu plena expansão a várias luxu rias, perm itindo a um homem ter muitas esposas, isso parece ser um a explicação plausível de seu descaso pelo am or das m ulhe res. O s que pensam estar aqui em pauta a pessoa do papa, nos lem brando que ele impôs o celibato obrigatório, por m eio do qual 408 6 3 * EX P O SIÇ Ã O [11.38] a honra matrim onial é tripudiada. Sabem os com que vileza os pontífices romanos vociferam quando o m atrim ônio lhes é insi nuado, com o podem os ver nos decretos do Papa Sirício, no séti m o capítulo do prim eiro volum e dos C oncílios.185 Citam a passa gem: A queles que estão na carne não podem agradar a Deus; e assim com param o m atrim ônio com a fornicação, e com isso des ditosa e hum ilhantem ente lançam escárnio sobre um a ordenança sancionada por Deus. Observamos, pois, algum a leve correspon dência, porém os pontos restantes não se adequarão a esta idéia. A lguns asseveram que, com o M aom é inventou um a nova forma de religião, assim tam bém procedeu o papa; é verdade, m as ne nhum deles está em pauta aqui, e a razão é porque D eus desejava sustentar o espírito de seu povo até a vinda de Cristo. D aí ele predizer, por meio de seu anjo, os sofrim entos que sua Igreja ti nha de suportar até que Cristo se m anifestasse na carne. D eve mos agora volver-nos para os rom anos, acerca dos quais com e çam os a explicar a passagem. D iz o anjo: O rei n ã o te r á n e n h u m resp eito pelos d eu ses de seus pais. A aplicação desta sentença é à prim eira vista obscura; mas se refletirm os sobre o ultrajante orgulho e barbarism o dos rom anos, não mais nutrirem os dúvida quanto ao significado das palavras do profeta. O anjo declara duas circunstâncias; esse rei seria alguém que desprezava todas as divindades, e todavia cul tuaria um deus, enquanto a pom pa singular e m agnificente exibi d a excederia a todas as práticas com uns. Estes dois pontos, tão evidentem ente opostos, se acharam unidos nos rom anos. N ossa explicação aparecerá m ais clara pelo acréscim o dos versículos seguintes: 38 E t D eum fo rtitudinum , vel, munilionum, in loco suo honorabit: e t D eum quem 38 M as em seu lu g ar ele honrará o deus d a s forças; e um deus a qu em seus pais não conheceram ele h o n rará com ouro e n o n c o g n o v eru n t p a tre s e ju s h onorabit 185 A edição francesa om ite totalmente esta referência à Concilia. 409 111-38, 39] DANIEL prata e com pedras preciosas e coisas agradáveis- cum auro, e t argento, e t lapide pretioso, et d e sid era b ilib u s,18'1hoc est, rebusom ni- 3 9 E assim e le fará c o m o auxílio d e um d e u s estranho, a q uem ele reconhecerá e co b rirá com g lória; e o s fará re in a r so b re m uitos, e div id irá a terra p o r preço. 3 9 E t faciet adversus m u n iiio n es fortitudtm im cum D e o alieno, q u e m agnoverit, m u ltiplicabit gloriam , e t d om inari faciet eos in m ultis. e t terram d iv id e t pretio. bus pretiosis. Com o j á sugeri, à prim eira vista essas afirm ações parecem opostas um a à outra; o rei de quem ora estam os tratando despre zará todas as divindades, e no entanto adorará um certo deus de um a form a ordinária. Isso concorda m uito bem com os romanos, se estudarm os suas disposições e costum es. Com o tratavam o culto de suas divindades sim plesm ente com o um a m atéria de negócio, evidentem ente foram destituídos de qualquer percep ção d a divindade e não passavam de pretensos religiosos. Em bo ra outras nações profanas em seu cam inho tateassem no escuro, contudo ofereciam um culto supersticioso a algumas divindades. Os rom anos, contudo, não se sujeitavam nem ao erro nem à igno rância, m as m anifestavam um grosseiro desdém por Deus, en quanto m antinham a aparência de piedade. D eduzim os esta opi nião da visão de toda sua conduta. Pois em bora trouxessem m ui tas divindades de todos os quadrantes do mundo, e cultuassem em com um com outras nações a M inerva, Apoio, M ercúrio e outros, todavia observamos com o tratavam todos os dem ais ritos com o sendo de nenhum préstimo. Consideravam Júpiter como sendo a divindade suprema. M as o que para eles Júpiter repre sentava em seu próprio país? O que tinha m ais valor, um a m oeda ou a divindade do O lím pio? N a verdade execravam tanto seus adoradores quanto a ela própria. Qual, então, era realm ente seu deus suprem o? Por que a glória do C apitólio? Sem um título adi cional de Senhor do Capitólio, ele não valia absolutam ente nada. E sse título o distinguia com o especialm ente lim itado a eles pró prios. P or essa razão o profeta cham a esse Júpiter rom ano um ’ Isto é, com iodas as coisas preciosas. 410 6 3 * EX P O SIÇ Ã O 111.38, 39] deus das fortalezas ou de poderes. O s rom anos jam ais puderam persuadir-se de que algum outro Júpiter ou Juno fosse digno de culto; confiavam em sua própria força inerente; consideravam -se de m ais im portância do que os deuses, e consideravam Júpiter com o seu deus único. U m a vez que sua sede estava em sua capi tal, ele lhes era m ais que cem reis celestiais, pois sua soberba se centrava totalm ente no poder da divindade sediada em sua pró pria capital. Pensavam em si m esm os com o estando além do al cance de toda e qualquer m udança da fortuna, e tal era sua audá cia que cada um cunhava novas divindades a seu bel-prazer. Ha via um tem plo dedicado à fortuna no dorso dos cavalos, pois isso satisfazia a vaidade do general que fizesse bom uso de sua cava laria e granjeava vitória p o r esse m eio; e ao construir um templo à fortuna eqüestre, ele desejava, com o divindade, granjear um a m ultidão de estim a. Então Júpiter Estator era um deus, e por quê? Porque isso agradava a todo m undo; e assim R om a ficou repleta de templos. Um erigia um a im agem da fortuna; outro, da virtude; um terceiro, da prudência; e um quarto, de algum a outra divinda de, e cada um ousava estabelecer seus próprios ídolos segundo sua própria fantasia, até que R om a veio a ficar com pletam ente abarrotada deles. D essa form a Rôm ulo foi deificado; e que rei vindicação tinha ele em sua honra? Se alguém fizer aqui algum a objeção - outras faziam o m esm o - , o adm itim os, m as tam bém sabem os em que estado de estultícia, brutalidade e barbarism o continuaram na antigüidade. Os rom anos, porém , com o já suge ri, não foram instigados a essa m anufatura de ídolos por erro ou superstição, mas por um a arrogante vaidade que os elevava à p ri m eira categoria no seio d a hum anidade e reivindicavam superio ridade para todas suas divindades. Por exem plo, perm itiam que um tem plo fosse erigido e sacrifícios oferecidos a elas, n a Ásia, bem com o o nom e da divindade ser-lhes aplicado. Q uanta sober ba tem os aqui! Seria esta um a prova da crença na existência de outro deus e de muitos? R om a é seguram ente a única divindade e ela deve ser reverentem ente adorada antes que todas as demais! 411 [11.38, 39] DANIEL O bservamos, pois, com o a expressão deste versículo é bem aplicável aos romanos; adoravam o deus das fo rta leza s, ou, seja, reivindicavam um poder divino que se aplicava a si próprios, e só adm itiam a seus deuses o que criam ser útil a seus próprios pro pósitos. Com vistas a reivindicar certas virtudes com o inerente m ente suas, inventaram todo gênero de divindades segundo seus gostos. Omito o testem unho de Plutarco com o não bem aplicável ao presente tema. Ele diz em seus problem as que era ilícito pro nunciar o nom e de qualquer divindade sob cuja proteção e pater nidade o estado romano constasse. Ele nos diz com o Valério Sorano foi executado por estultam ente pronunciar o nom e d a divin dade, m asculina ou feminina. Essas são suas próprias palavras. E acrescenta com o razão sua prática de usar encantam entos m ági cos na adoração de sua divindade desconhecida. Além disso, sa bem os quão honrosam ente estim avam “a boa deusa”. O sexo m asculino era inteiram ente ignorante quanto a sua natureza e nin guém senão as m ulheres entravam na casa do sum o sacerdote e ali celebravam suas orgias. E com que propósito? O que era essa “boa deusa” ? Seguram ente sem pre existiu ali esse deus das f o r talezas, já que os rom anos não reconheciam qualquer divindade senão as suas próprias. Erigiam altares para si e sacrificavam todo gênero de vítimas a seu próprio sucesso e boa fortuna; e dessa form a reduziam todas as divindades dentro de seu próprio dom í nio, enquanto lhes ofereciam somente suas pinturas ilusórias e falazes alvos de sua reverência. N ão há nada forçado na expres são do anjo: ele não dará nenhum a atenção aos deuses de seus pais; ou, seja, ele não seguirá o costum e habitual de todas as nações em reter as cerimônias supersticiosas com base no erro e ignorância. Pois em bora os gregos fossem muito críticos, todavia não ousaram fazer qualquer movimento, nem propuseram qual quer discussão sobre questões religiosas. U m a coisa sabemos terse fixado entre eles: cultuar os deuses que tinham sido estabeleci dos por seus pais. Os romanos, porém, ousaram insultar todas as 412 6 3 * EX PO SIÇ Ã O [11.38, 39] religiões com liberdade e petulância, e ousaram prom over o ateís m o o quanto puderam. Portanto, o anjo diz: ele não deu atenção ao deus de seus pais. E por quê? Não lhes terão respeito e nem reco nhecerão qualquer divindade exceto sua própria confiança em sua fortaleza peculiar. Interpreto a frase, o desejo das mulheres, no sen tido daquela figura de linguagem que põe a parte pelo todo, ou, seja: a barbaridade de seus métodos. O amor das mulheres é uma frase bíblica para a afeição muito peculiar; e Deus instilou essa afeição m útua nos sexos com o fim de mantê-los unidos enquanto retiverem um a fagulha de humanidade. E assim Davi declarou ter amado Jônatas de forma mais extremada que o amor das mulheres [2Sm 1.26]. Não existe falha alguma em tal correspondência, do contrário o am or de Davi para com Jônatas seria estigmatizado com o um a desgraça. Sabem os quão sacros eram seus sentimentos para com ele, porém “o am or das mulheres” é aqui usado p a r excellertce, implicitando a excessiva força dessa afeição. Como, pois. Deus designou esse mesmo laço rigoroso de afeição entre os se xos, com o sendo um vínculo natural de união em toda a raça hu mana, não surpreende se todos os deveres de humanidade estejam compreendidos sob essa palavra por meio de um a figura de lingua gem. É justam ente com o se o anjo dissesse: esse rei de quem pro fetizo será ímpio e sacrílego, ousando assim a desprezar todas as divindades; e então ele será tão mau, ao ponto de despir-se total mente de todo sentimento de caridade. Observamos, pois, com o os romanos eram completamente destituídos de afeição natural, não am ando nem a suas esposas e nem o sexo feminino. N ão preciso referir-me sequer a uns poucos exemplos por meio dos quais esta afirmação seja provada. M as essa extrem a barbaridade existiu em todas as nações, o que realmente nos enche de horror. Ninguém pode chegar a um a idéia adequada disso se não for bem versado em suas histórias; mas quem quer que estude suas proezas, verá com o num espelho o que o anjo queria dizer. Esse rei, pois, não cultivaria nem a piedade e nem o espírito de humanidade. 413 [11.38, 39] DANIEL E ele n ã o d a r á a ten ção a o u tro s deuses, p o rq u e se m a g n i fic a rá c o n tra todo s eles. A causa é aqui assinada por que esse rei seria um grosseiro m enosprezador de todas as divindades e seria feroz e bárbaro contra todos os m ortais, porque se m agnifi cará acim a de todos eles. Tal soberba cegou os rom anos de tal form a que os levou a ignorar a piedade e o espírito de hum anida de; e assim essa sua intolerável autoconfiança era a razão por que não prestaram nenhum a honra a qualquer divindade, e pisaram todos os m ortais sob a planta de seus pés. A hum ildade é certa m ente o princípio de toda a verdadeira piedade; e essa semente da religião é im plantada no coração do homem, levando-o, vo luntariam ente ou não, a reconhecer algum a divindade. Os rom a nos, porém , eram tão entum ecidos pela visão de sua própria im portância, que chegaram a exaltar-se acim a de todo e qualquer objeto de culto, e a tratar todas as religiões com desdenhoso es cárnio; e ao desprezarem assim todos os seres celestiais, neces sariam ente olhavam com desdém para toda a hum anidade, o que veio a ser notoriam ente um fato inegável. Ora, a segunda senten ça é oposta a esta: Ele adorará ou honrará o d eu s d a s fo rtalezas. Previam ente ele usara esta expressão em referência ao tem plo, aqui, porém , tal aplicação não parece adequada, porque o anjo expressara antes a unidade de Deus, enquanto agora ele cataloga m uitos deuses. O anjo, porém , usa a palavra ‘fortalezas’ ou m a terial bélico em referência àquela perversa confiança com a qual os romanos se entum eciam e foram induzidos a tratar a Deus e aos homens com o se nada fossem em com paração a eles pró prios. Com o, pois, esses dois pontos concordam - o m enosprezo por todas as divindades entre os rom anos, e não obstante a exis tência de algum culto? Prim eiro, desprezavam toda tradição rela tiva aos deuses, m as depois se ergueram acim a de todo objeto celestial, e vindo a sentir-se envergonhados de sua bárbara im piedade, pretenderam honrar suas divindades. Onde, porém , bus cariam eles tais divindades, com o Júpiter, por exem plo, às quais 414 63* E X P O SIÇ Ã O [11.38, 39] toda a m ultidão deles estava sujeita? E por que em seu próprio capitólio? Suas divindades eram o produto de suas próprias im a ginações, e nada era estim ado divino senão o que lhes agradasse. D aí dizer-se: Ele o honrará em seu próprio lugar. Aqui o anjo remove toda dúvida, m encionando o lugar em que esse deus das fortalezas seria honrado. Os rom anos veneravam outras divinda des sem pre que lhes fosse conveniente, m as isso era m era preten são externa. Sem dúvida lim itavam Júpiter a seu próprio capitó lio e cidade; e o que quer que confessassem respeitar com o ou tras divindades, não havia verdadeira religião neles, porque as adoravam em preferência a esses seres fictícios. D aí ele adorará o deus das tiranias em seu lugar, e honrará um deus estrangeiro a quem seus pais não conheceram ,187 Além disso, ele o h o n r a r á co m o u ro e p r a ta e p e d ra s p re c i osas e to d a s as coisas desejáveis; ou, seja, ele adorará sua p ró pria divindade de form a m agnificente e com pom pa extraordiná ria. E sabem os com o as riquezas do m undo inteiro eram am onto adas com o fim de ornam entar seus tem plos. Pois tão logo al guém se propunha erigir algum tem plo, e se via com pelido a apo derar-se de todas as coisas, vindas de todas as direções, e em seguida a espoliar todas as províncias a fim de enriquecer seus próprios templos. R om a tam bém não originou esse esplendor em virtude da superstição, m as tão-som ente para exaltar-se e susci tar a adm iração de todas as nações; e assim observam os quão bem é esta profecia expl icada pelo curso dos acontecim entos sub seqüentes. É verdade que algum as nações eram supersticiosas no culto de seus ídolos, mas os rom anos eram superiores a todas elas. Q uando a princípio se tornaram senhores da Sicília, sabe m os que enorm e quantidade de riqueza tom aram de um a única cidade. Pois se alguns tem plos foram adornados com grande e copioso esplendor e m uitas riquezas, seguram ente confessariam ,n A palavra ‘M ahuzzim " tem ocasionado uma grande variedade de traduções. Veja W inüe in loco. 415 [11.38, 39] DANIEL a extrem a excelência daquelas da Sicília. M arcelo, porém , des piu quase todos os templos para enriquecer Rom a e ornam entar os santuários de suas falsas divindades. E por que fizeram isso? Era porque Júpiter, Juno, Apoio e M ercúrio eram m elhores em Rom a do que em outro lugar? Claro que não; m as porque ele desejava enriquecer a cidade e transform ar toda sorte de divinda des em alvo de zom baria e levá-las em triunfo para m ostrar que não havia outra divindade ou excelência exceto em Roma, a se nhora do mundo. D epois ele acrescenta: E le re a liz a rá . Aqui um a vez mais o anjo parece falar de prosperidade. Sem dúvida ele aqui injeta coragem nos santos, que de outra form a vacilariam e viriam a apostatar quando observassem um sucesso tão contínuo e incrí vel , num a nação tão im piedosa e sacrílega, e notável p o r cruelda de tão bárbara. D aí ele declarar com o os rom anos obteriam seus Fins em tudo quanto em preendessem , com o sua força prevalece ria, com o se ela fosse sua divindade. Em bora desprezassem to das as divindades, e fabricassem som ente um deus para si através de um espírito de am bição, não obstante até isso lhes faria bem sucedido. Esta é agora cham ada d iv in d ad e e s tra n h a . A Escritu ra usa esta expressão para distinguir entre ídolos fictícios e o Deus verdadeiro. O anjo parece nada dizer que se aplique especial m ente aos romanos. Pois os atenienses e espartanos, os persas e os asiáticos, bem com o outras nações, adoravam deuses estra nhos. Qual, pois, é o significado do título? Pois evidentem ente o anjo não falava segundo a maneira ordinária. Ele o denom ina de estranho, visto que o m esm o não procedia de um outro; pois en quanto se vangloriavam futilm ente em sua veneração dos ídolos recebidos de seus ancestrais, juntam ente com todas suas institui ções sacras e seus ritos invioláveis, contudo intim am ente os ridi cularizavam e não os estim avam com m ais valor do que a palha, m as simplesmente desejavam reter algum a form a falaz de reli gião pelo senso de pudor. Lem bram o-nos do dito de C ato con416 6 3 a EX P O SIÇ Ã O [11.38, 39] cem ente aos áugures: “ Pergunto-m e se quando um encontra o outro é possível que consigam refrear um a gargalhada!” D em ons trando assim com o ele os ridicularizava. Se alguém perguntasse a Cato, no senado ou privativam ente: O que você pensa dos áu gures e de toda a nossa religião? Ele responderia: “Ah, que todo o m undo pereça diante dos áugures; pois eles constituem a pró pria segurança do povo e de toda a república; nós os recebemos de nossos ancestrais; portanto, conservemo-los para sem pre!” D es sa form a teria falado aquele astuto hom em , e assim tam bém to dos os dem ais. M as enquanto eles assim tagarelavam uns com os outros, não se envergonhavam de negar a existência de um a D ei dade, e então ridicularizavam a tudo quanto fora alvo d a crença com um desde o princípio, com o intuito de reduzir inteiram ente a nada as tradições recebidas de seus pais. Não nos surpreende encontrar o anjo falando de um deus estranho, o qual era adorado em Rom a; com o eu já disse, não através de superstição ou equí voco, m as tão-som ente para evitar que sua barbaridade viesse a tornar-se abom inável em todo o mundo. Lem os que ele re c o n h e ceu esse deus. Esta palavra recebe grande peso. O que o anjo tem em m ente é que toda divindade repousava na opinião e vontade do povo soberano, porque isso concordava com sua inclinação e prom ovia seus interesses particulares. Com o o plano de cultuar quaisquer deuses seria aprovado, e se vangloriavam em seu pró prio deleite, tam bém se vangloriavam com grande confiança de que não poderia existir qualquer piedade senão em Roma. Mas, por quê? Porque reconhecem deuses estranhos e determ inam e decretam a form a do culto que devia ser preservado. O anjo as sim põe toda a religião de R om a no desejo, e m ostra que eles seriam os im undos desprezadores de Deus. Em seguida ele afirma: E le m u ltip lic a rá a g ló ria. Possivel mente isso se refere a Deus, eu, porém, prefiro aprovar um a in terpretação diferente. Os rom anos adquiririam para si grande ri queza e aum entariam prodigiosam ente sua opulência, na mag417 [11.38, 39] DANIEL nitude de seu im pério e em todas as dem ais fontes de energia. Portanto, m ultiplicarão a glória, ou, seja, adquirirão novos terri tórios e aum entarão seu poder e acum ularão um grande volum e de tesouros. E sta explicação se adequa m uito bem com o final do versículo, onde ele acrescenta: ele os f a r á reis p o r to d a p a rte . E ssa é um a porção daquela glória que esse rei am ontoará sobre si, pois ele será superior aos reis sobre muitas ilhas e distribuirá o despojo que tiver adquirido, e isso tam bém a certo preço. Por tanto, ele diz que os fa rá reis sobre m uitosi pois o relativo está sem sujeito, o que é um a prática freqüente dos hebreus. Sobre quem , pois, o rei rom ano ou o im pério rom ano chegaria assim a ter dom ínio? Quem quer que lhes prestasse assistência receberia sua recom pensa de um estrangeiro, com o bem sabemos que Eumenes se enriqueceu com o despojo de Antíoco. A s províncias tam bém foram distribuídas conform e seu arbítrio. A ilha foi dada aos rodianos, enquanto um reino foi extorquido de outro, e os etolianos alargaram seus domínios. Com o cada parte labutou ar duam ente em prol de seu próprio benefício, e incorreu em gran des despesas, assim os rom anos lhes conferiram riquezas. De pois de vencer Antíoco, eles se tornaram m ais liberais com Átalo e Eum enes, e assim vieram a ser senhores d a m aior parte da Ásia. Além disso, quando privaram N abis, o tirano de Esparta, da m ai or parte de seus territórios, aqueles que se preocuparam em agra dar os rom anos foram favorecidos com os despojos que tom aram dele. Temos outro exem plo nos favores conferidos a M assinissa depois de conquistar Cartago; porque depois de ser expulso de seu próprio reino, seu dom ínio se estendeu am plamente por todo o continente da África; depois de ser privado de sua soberania paterna, ele não teve um lugar no m undo em que pisar até que lhe concederam o que haviam tom ado dos espartanos. E com o adm i nistraram isso? D iv id iram o espólio p o r p reço , diz o anjo. R e provando assim indiretam ente a sagacidade do senado e do povo rom ano, porque não se privaram desses amplos dom ínios gra 418 6 3* EX P O SIÇ Ã O [ 11 . 38 , 39 ] tuitam ente; voluntariam ente teriam devorado tudo quanto havi am adquirido, porém descobriram que a m elhor política seria vendê-lo em vez de retê-lo. N ão venderam a preço fixo - pois a palavra ‘preço’ aqui não carecia de restringir-se a um a som a de finida de dinheiro m as revelaram sua avareza vendendo-o e distribuindo-o por am or ao lucro, fazendo com que todos esses territórios fossem im ediatam ente reduzidos em províncias de seu império. Tinham necessidade de grandes recursos; era objetável continuar com sua guarnição perpetuam ente nas cidades da G ré cia, e daí proclam arem plena liberdade através de todas elas. Mas, que sorte de liberdade era essa? Cada estado pode escolher seu senado de acordo com o beneplácito dos rom anos, e assim cada um adquiria posição e honra em sua própria nação; tornando-se anexado e escravizado ao povo romano. E então, nesta condição das atividades, se qualquer guerra fosse deflagrada, buscariam ajuda desses amigos e aliados. Pois se tivessem sido apenas con federados, os rom anos jam ais teriam ousado fazer de cada um deles um estado tributário. Tomemos o caso dos cartagineses. Depois de serem reduzidos ao mais baixo nível de pobreza, por m eio de tantos tributos, quando os rom anos declararam guerra a Filipe da M acedônia e contra Antíoco, exigiram navios daqueles aliados. Exigiram , além disso, com o subsídio, um a im ensa quan tidade de ouro, prata, provisões, vestim entas e arm aduras, até que, por fim , esses m iseráveis cartagineses, cujo próprio sangue os rom anos sugaram, por fim enviaram para a guerra todo o ouro que lhes restara, e tudo o que conseguiram ju n tar com penúria. E assim Filipe, rei da M acedônia, é com pelido a destruir-se m ergu lhando sua espada em seu próprio corpo; pois cada estado da G récia se viu forçado a contribuir com sua própria porção para as despesas d a guerra. Percebem os, pois, com o as terras foram divididas por preço, cada um a com respeito a sua própria utilidade, não p o r fixar um certo valor definido em dinheiro, m as segundo o padrão da conve 4 19 [11.38, 39] DANIEL niência política. E que tipo de barganha depois executaram m u tuam ente? Temos um exem plo disso na prevalecência da pros crição entre os romanos, por m eio do quê volveram sua rapacida de contra suas próprias partes vitais. Confiscaram previam ente os bens de seus inimigos. Filipe, por exem plo, se viu forçado a pagar um a grande som a em dinheiro para readquirir o título de rei e a porção do território que lhe restou. A ntíoco e os cartagine ses se viram sujeitos à m esm a dureza. Os rom anos, em suma, nunca conquistavam qualquer reino sem exaurir tanto a m onar q uia quanto seus dom ínios para satisfazer sua insaciável avareza e cupidez. A gora percebem os com o dividiram as terras p o r p re ço, m antendo todos os reis em sujeição a si, e outorgando favores a um à expensa de outro. A gora percebem os a intenção do anjo em todo o versículo: o rei seria tão poderoso que concederia dom ínio a quem q u er que lhe agradasse em m uitos e am plos territórios, porém não gratui tam ente. Já tivem os exem plos de alguns sendo despojados de sua dignidade e poder régios e de outros sendo restaurados à au toridade da qual tinham sido privados. Lucullus, por exem plo, decide expulsar um rei de seus dom ínios, enquanto a outro gene ral ele restaurou suas possessões. Um único cidadão rom ano po dia assim criar um a grande m onarquia; e era o que acontecia com freqüência. Cláudio propôs ao povo banir o rei de Chipre, em bo ra ele fosse da raça real; seu pai tinha sido am igo e aliado do povo romano; ele não com etera crim e algum contra o im pério rom ano, e não houve nenhum a razão para declarar guerra contra ele. Entrementes, ele permaneceu em segurança em casa, enquanto não se realizou nenhum a das cerim ônias pelas quais a guerra é geralm ente deflagrada. Ele foi banido na praça do m ercado por uns poucos vagabundos, e Cato é im ediatam ente enviado para sublevar toda a ilha. Ele tom ou posse dela para os rom anos, e esse hom em miserável se vê obrigado a lançar-se ao m ar em um ato de desespero. Observamos, pois, com o esta predição do anjo 4 20 6 3 * EX P O SIÇ Ã O [11.38, 39] de form a algum a era sem sentido; os procônsules rom anos distri buíram os reinos e as províncias, entretanto p o r um preço, por quanto ele se assenhoreou de tudo que havia no m undo e tom ou posse de todas as riquezas, de todos os tesouros e de cada partí cula de valor, im pelido pelo redem oinho de sua insaciável avare za. Prorrogarem os o restante. ORAÇÃO D e u s T o do-P oderoso , v isto q u e e m to d a s a s e ra s a c e g u e ira d a h u m a n id a d e tem sid o tã o im e n sa q u e a te m le v a d o a a d o r a r -te e rrô n e a e s u p e r stic io sa m e n te ; e v isto q u e m a n ife s ta m ta l d u p lic id a d e e s o b e rb a a o p o n to d e d e sp r e za r teu n o m e e ta m b é m o s p r ó p r io s íd o lo s q u e fo r ja r a m p a r a si, o ra m o s p a r a q u e n o s c o n c e d a s a q u e la g e n u ín a p ie d a d e q u e se ra d ic a n o s re c ô n d ito s m a is p ro fu n d o s d e n o s s o s c o rações. Q ue o te m o r d e te u n o m e se ja e sc u lp id o e m n o s s o ín tim o p a r a q u e s e ja m o s sin c e ra e in c o n d ic io n a lm e n te d e v o ta d o s a ti. Q ue ca d a u m d e n ó s s in c e ra m e n te d e se je m o s g lo r ific a r teu n o m e ; q u e n o s e sfo rc e m o s em g u ia r n o ss o s ir m ã o s n a m e sm a vereda. E x p u rg a n o s m a is e m a is d e to d a d issim u la ç ã o , a té q u e, p o r fim , a lc a n c e m o s a q u e la p e r fe ita p u re z a q u e n o s a g u a rd a n o céu , p e la m e d ia ç ã o d e J e s u s C risto n o sso Senhor. A m ém . 421 64a 4 0 E n o tem po d o fim o rei d o sul iu tará c o n tra ele, e o rei d o norte virá c o n tra e le co m o u m turbilhão, c o m carros e c o m cav aleiro s e com m uitos navios; e entrará nos países e os inundará, e passará. 4 0 E t tn tem p o re finis c o n flig et cum eo rex a u stri, e t tan q u a m tu rb o irru e t rex aquiionis, c u m cu rru e t equitib u s, e t navibus m ultis: et veniet in terras, e t exund a b it, et transibit, pervadet. Q uanto ao tem po aqui m encionado, trata-se de um certo ou determ inado período: os reis do sul e os do norte já provam os significar o Egito e a Síria, cada um tendo sua posição em relação à Judéia. A palavra FI3], negech, confliget, é literalm ente ele “em purrará com os chifres”, enquanto a palavra traduzida “ele se pre cipitará com o um turbilhão” é deduzida de " W , segner, “ser tem pestivo” . O anjo aqui prediz as num erosas vitórias p o r meio das quais os romanos estenderiam seu im pério am plam ente, ainda que não sem grandes dificuldades e perigos. Ele afirma: O rei d o sul d e fla g ra rá g u e rra c o n tra os ro m a nos p o r u m p erío d o definido. N ão ouso fixar o tem po preciso pretendido pelo anjo. Tão grande era o poder do Egito, que tives sem os reis daquele país confiado seus recursos naturais e eles poderiam ter reunido coragem para declarar guerra aos romanos. O procônsul G abínio levou seu exército para lá por causa da res tauração de Ptolom eu. Ele expulsou Arquelau sem m uito proble ma, e então, com o m ercenário, ele arriscou sua vida e sua fam a ali, bem com o seu exército. C ésar estava em perigo ali, depois de vencer Pompeu; então A ntônio em seguida fez guerra a Augusto, assistido pelas forças de Cleópatra; então o Egito ofereceu toda 422 6 4 a EX P O SIÇ Ã O [11.40) sua força, e em seu fracasso se viu reduzido a um a província romana. O anjo não se propôs m arcar um a série contínua de tem pos, m as apenas adm oestar em termos breves os fiéis a perm ane cer firm es em m eio às m ais graves conturbações que então se aproxim avam . Seja qual for o significado preciso, o anjo sem dúvida queria indicar a dificuldade natural da pugna entre os ro manos e os egípcios. Já apresentei o testemunho da história quanto ao fato de que os egípcios nunca declaravam guerra contra os rom anos em seu próprio nom e; às vezes os acontecim entos eram tão confusos que os egípcios se uniam aos sírios, e então temos de ler as palavras em conjunção - assim o rei do sul, assistido pelo rei do norte, deflagrariam guerra contra os rom anos. O anjo assim nos m ostra com o o rei da Síria forneceria m aiores forças e suprimentos do que o m onarca egípcio, e isso realm ente aconte ceu no início do triunvirato. Em seguida ele afirma: O rei do sul viria com c a rro s e cavalos e m u ito s navios. Tam pouco é neces sário aqui indicar o período preciso, já que os rom anos em preen deram muitas guerras no oriente, em cuja ocasião ocuparam a Ásia, enquanto um a parte da L íbia lhes coube pela vontade de seu rei sem armas ou forças de qualquer gênero. Com referência a esses dois reinos que têm sido tão am iúde m encionados, muitos líderes governaram a Síria dentro de um curto período. Prim eiram ente um dos nativos foi posto no trono e depois o outro, até que o povo se cansou deles e transferiu a so berania a estrangeiros. Então A lexandre subiu gradualm ente ao poder e finalm ente adquiriu mui grande fama. Ele não era nobre de nascença, pois seu pai era de origem obscura. Esse hom em procedeu de um a fam ília obscura e em certo período não possuía nem autoridade nem recursos. Ele foi feito rei da Síria, porque pretendia ser filho de Seleuco, e foi im ediatam ente assassinado, enquanto seu sucessor im ediato reinou por um curto período. Assim a Síria passou para os rom anos com a m orte desse Seleu co. Tigrane, rei da Arm ênia, foi então enviado e veio a ser go423 [11.40] DANIEL vernador sobre a Síria até que Lucullus o venceu e a Síria foi reduzida a um a província. O m ais vil dos homens reinava sobre o Egito, Fiscon, que foi restringido pelos rom anos quando tentava esbulhar a Síria do poder de sua soberania; era excessivam ente depravado, tanto no corpo quanto na mente; e daí granjear ele esse desditoso apelido. Pois a palavra vem do grego e equivale ao francês audouille\ pois physce significa aquele intestino mais delgado no qual os outros geralm ente se acham inseridos. Essa deform idade deu origem a seu nom e usual, significando ‘obeso’, im plicando um a deformidade tanto física quanto sem elhança com os brutos, enquanto ele não era dotado nem de intelecto nem de engenhosidade. O últim o rei que fez dos romanos os guardiães de seus filhos recebeu o nom e de A uletes, e Cícero usa este ep í teto com o procedente de “tocador de flauta” , porque ele era im o deradam ente am ante desse instrum ento musical. Em cada reino, pois, havia horrível deformidade, visto que todos quantos exerci am a autoridade real se assemelhavam m ais a cães ou suínos do que a seres humanos. Tigranes, sabe-se m uito bem , deu muito trabalho aos romanos. Em contrapartida, M itridates ocupou sua atenção por um período bem longo, e com sucessos vários e opos tos. Os rom anos por toda a Á sia viviam um período entregues à espada, e quando term inava um a investida, M itridates às vezes se m ostrava superior, e m ais tarde uniu suas forças com as de Tigranes, seu padrasto. Quando Tigranes dominou a Armênia, veio a ser um rei de outros reis, e mais tarde adicionou a seus domínios um a porção da Síria. Por fim , quando o últim o A ntíoco foi constituído sobre o reino da Síria por Lucullus, ele foi rem o vido de seu com ando pelas ordens de Pompeu, e então, com o já afirm am os, a Síria veio a ser província romana. Pom peu cruzou o m ar e subjugou toda a Judéia juntam ente com a Síria; mais tarde entrou no tem plo e se assenhoreou de um a parte de suas possessões, porém poupou os tesouros sacros. Crasso o sucedeu - um insaciável sorvedouro, o qual desejava essas províncias por 424 6 4 * EX P O SIÇ Ã O [ 11 .41 , 42 ] nenhum a outra razão senão para saciar sua ilim itada sede de ri quezas. Ele despojou o tem plo de Jerusalém ; e por fim, depois que Cleópatra foi vencida, o Egito perdeu sua estirpe real e pas sou a ser um a província romana. Se os romanos tivessem con quistado centenas de outras províncias, o anjo não teria feito m enção deles aqui; pois já observei previam ente seu respeito es pecial pelo povo eleito. Portanto, ele se realça som ente naquelas m atanças que tiveram m ais ou m enos relação com os judeus des troçados. Em prim eiro lugar, ele prediz a grande disputa que sur giu entre os reis do Egito e da Síria, q u e v iria à sem elh an ça de u m to rv elin h o , enquanto os romanos se p re c ip ita ria m so b re as te rr a s com o u m dilúvio, e p a ssa ria m . Ele com para o rei d a Sí ria a um torvelinho, pois a princípio ele se precipitaria im petuo sam ente, enchendo a terra e o m ar com suas forças. E assim ele excita os terrores da carne e no entanto se desvanece rapidam en te com o um tufão que passa. M as os rom anos são com parados a um dilúvio. O novo rei de quem o anjo já falou viria, diz ele, e transbordaria, sepultando todas as forças do Egito e da Síria; denotando que todos os fundam entos de ambos os reinos seriam varridos quando os rom anos passassem sobre eles. Ele passará, diz o anjo; ou, seja, por onde passarem , para eles um cam inho será aberto e não encontrarão nada fechado. Ele repetirá essa idéia de outra forma. N ão fala agora de apenas um a região, porém diz que eles viriam sobre as terras, denotando um a vasta desolação, enquanto ninguém ousaria opor-se-lhes resistindo sua fúria. 41 E le tam b ém en tra rá n a terra gloriosa, e m uitos p aíses serão subvertidos; m as os m esm os e sc ap a rão d e sua m ão, inclusive E dom e M oabe e o p rín cip e d o s filh o s d e A m on. 4 2 E le esten d e rá sua m ão tam b ém so b re o s p aíses; e a terra d o E g ito não escapará. IS* Isto 41 E t v eniet in terram d esiderii, e t m ult®, regiones scilicet, cad en t, e l hse e v ad en t e m an u ejus, E d o m , M oab, e t principium filiorum A m m on. 4 2 E t m ittet, hoc est, extendet, m anum suam in terras, et terra /E gypti non erit in e v a sio n e m .1“ é, “ não escapará”, ou “se em aranhará”. 425 [11.41, 42] DANIEL A terra da Judéia é cham ada a terra aprazível ou desejável, porque D eus quis que ela fosse digna de seu favor peculiar. Ele a escolheu para sua habitação, cham ou-a de lugar de seu repouso e fez com que sua bênção perm anecesse nela. N este versículo tam bém se tratam de regiões, e não m eramente de cidades, com o as regiões de Edom e de M oabe. Depois de o anjo brevem ente pre dizer a ocorrência das mais graves guerras com os rom anos, ele agora acrescenta o que em termos breves com eçara no últim o versículo, isto é, eles chegariam a ser os conquistadores de todas as nações. E les v irão , diz o anjo, à te r r a desejável. Eis a razão por que o anjo profetiza sobre o im pério rom ano, pois ele não fora enviado a explicar a D aniel a história do m undo inteiro, mas para m anter os fiéis em seu com prom isso e os persuadir, sob as m ais perturbadoras convulsões, a perm anecerem sob a proteção e guarda de Deus. Por essa razão ele afirma: eles virão à terra desejável. Esta seria um a terrível tentação e poderia destruir todo sentim ento de piedade, visto que os judeus seriam acossados de todos os lados, prim eiro pelos sírios e então pelos egípcios. E sabem os com que crueldade Antíoco em preendeu não só a opri mir, mas tam bém a apagar totalm ente do m apa toda a nação. Nem os sírios nem os egípcios os pouparam . Os rom anos vieram de quase todos os cantos do globo; a princípio fizeram aliança com esses estados, e então entraram na Judéia com o inimigos. Quem suporia que um a região sob a proteção de Deus seria exposta a todos os ataques de pilhagem e opressão? Por isso era necessário admoestar os fiéis a não desmaiarem em meio a essa total confusão. Eles virão, pois, à terra desejável, e m u ita s regiões cairão ; ou, seja, não restaria nenhum a esperança para os judeus depois da chegada dos rom anos, visto que a vitória já estava preparada em suas mãos. Ao pôr o anjo diante dos fiéis esta visão de deses pero, provavelm ente não os induziria a nutrir confiança e confor to, mas, com o estavam cientes dessas previsões divinas, sabiam tam bém que o remédio estava preparado pelo mesmo D eus que 426 6 4 a EX P O SIÇ Ã O [ 11 .4 1 , 42 ] os adm oestava por m eio do anjo. Estava em seu poder salvar sua Igreja de centenas de mortes. Esta profecia veio a ser um inesti m ável tesouro, inspirando os fiéis com a esperança do livram en to prom etido. O anjo m ais adiante acrescentará a prom essa desti nada a apoiar, afortalecer e a reavivar seus espíritos desalentados. Ele aqui, porém , anuncia que o auxílio divino não surgiria im ediatam ente, porque ele daria aos rom anos plena perm issão de exercer dom ínio, tirania e pilhagens cruéis, p or todo o m undo da Á sia e do Oriente. D iz ele: As te r r a s d e E d o m , de M o ab e e u m a p o rção d e A m on e sc a p a rã o d e seu m o rticín io . Tal prova ção não afetaria em grau suave as m entes dos santos. O que ele queria dizer? Ele faria com que a terra que havia prom etido esta ria em repouso fosse agora assenhoreada e devastada por seus inim igos! A terra de M oabe está em paz e desfruta de m aior tran qüilidade, e a condição dos filhos de Amon é de prosperidade! Aqui precisam os reter na m ente o que os profetas dizem dessas terras: Esaú foi banido para as m ontanhas escarpadas, e Deus destinou aos m oabitas um território fora das fronteiras da terra de bênçãos [MI 1.3]. Tão-som ente os judeus tinham algum direito e privilégio peculiares de com pleto repouso. Ora, quando a Judéia se vê devastada e seus inimigos, a seu bel-prazer, não só se asse nhoreia de tudo quanto é valioso na cidade e no país, recebendo especial perm issão de saquear a terra à vontade, o que os judeus conjeturariam ? O anjo, pois, responde a essa objeção e alivia es ses sentim entos de ansiedade aos quais os fiéis poderiam estar sujeitos diante de tanta mortandade. Ele declara que os territórios de E dom , de M oabe e dos filh o s de Am on perm aneceriam em tranqüilidade e segurança, isentos dessas calam idades. Pela ex pressão, ao início dos filh o s de Am on, provavelm ente ele se refi ra àquele refúgio do qual os am onitas se originaram . Pois sem dúvida os romanos não teriam poupado os am onitas, a menos que estivessem escondidos por entre os m ontes, pois todo o dis trito na vizinhança da Judéia estava sujeito à m esm a aflição. Os 427 [11.433 DANIEL que interpretam esta passagem com o um a referência ao Anticristo presum em que se concedeu segurança som ente àquela porção dos fiéis que escaparia do m undo e acharia refúgio nos desertos. M as não há razão para tal opinião, e é suficiente reter o sentido já proposto com o sendo o genuíno. Em seguida ele acrescenta: Os romanos enviariam seus exér citos à terra, e inclusive à terra do Egito, e eles não escapariam. O anjo sem dúvida trata aqui das num erosas vitórias que os ro m anos alcançariam em curto tempo. Fariam guerra a M itridates por um longo período, e então a Á sia estava quase perdida; mas logo depois com eçou a estender seu poder, prim eiro sobre toda a A sia Menor, e então sobre a Síria; a A rm ênia foi em seguida adicionada a seu dom ínio, e o Egito depois dela. Entrem entes, essa foi apenas um a adição m oderada, até que, p o r fim, vieram a governar sobre os persas, e assim seu poder se tornou form idá vel. Por isso esta profecia se cum priu quando estenderam seu p o d er sobre m uitas regiões, e a terra do Egito veio a ser uma porção de seu despojo. E prossegue: 43 M as e ie (erá po d er sobre os tesouros de o u ro e d e prata, e sobre todas a s c oisas preciosas d o E gito; e o s libaneses e os etío p e s estarã o em seus passos. 4 3 E t d o m in a b itu r thesauris auri, e t ar genti, e t om nibus d esid erab ilib u s18* JEgypti, e t Lybiae, e t ^ th io p is e in g ressib u s suis. A firm ei previam ente que, em bora a linguagem se aplique a um único rei, todavia um reino está subentendido, e nossas ob servações anteriores são aqui confirm adas. Em bora muitas na ções tudo fariam para resistir os rom anos, não obstante seriam com pletam ente vitoriosos, e finalm ente adquiririam im enso des pojo. Sua avareza e cobiça eram profundam ente assustadoras; pois ele diz: adquirirão dom ínio sobre os tesouros de ouro e de prata, e arrastarão após si todas as coisas preciosas do Egito, da Líbia e da Etiópia; e isso também em seus passos. Com essas 189 Isto é, sobre todas as coisas preciosas. 428 64* EX P O SIÇ Ã O [ 11. 44] palavras ele explica mais claram ente nossas preciosas observa ções sobre o em blem a do dilúvio. Todas as terras seriam postas diante deles; em bora as cidades fossem fortificadas, e assim os resistiriam com seus portões fechados, contudo o cam inho lhes seria aberto, e ninguém os im pediria de irrom per-se sobre todo o oriente e de subjugar ao m esm o tem po m etrópoles, cidades e vi las. Sabem os que foi precisam ente isso o que aconteceu. D aí não haver em todo este contexto nada forçado, e a profecia é invaria velm ente interpretada pela história. E então ele prossegue: 4 4 M as a s n o tícias d o o rien te e d o n o rte o espantarão; por isso ele sairá c o m g ra n d e fú ria a destruir, e e x tirp ará totalm ente a m uitos. 4 4 R um ores v ero,1* terrebuni e u m a b oriente, e t a b aquilone: eg red ietu rq u e cum ira m agna, ut p e rd at et in te m ec io n e delea t m uitos. A narrativa do anjo aqui parece diferir um pouco d a prece dente, quando os rom anos não conseguiriam tão com pletam ente evitar ser interrom pidos no meio de seu curso vitorioso. D iz ele: E les s e rã o a m e d ro n ta d o s p o r ru m o res, e os acontecim entos se adequam a este caso, pois em bora os rom anos subjugassem todo o oriente com bem pouca dificuldade, e em poucos anos, não obstante m ais tarde foram refreados por adversidades. Pois C ras so pereceu m iseravelm ente depois de despojar o tem plo, e des truiu a si e à flor do exército rom ano; foi vencido em Carre, nas proxim idades de Babilônia, em um importante envolvimento atra vés da traição de espiões em quem ele pusera toda sua confiança. Antônio, novam ente, depois de dividir o m undo em três partes entre si, O távio e Lépido, sofreu m iseravelm ente na m esm a vizi nhança contra os partos. N ão nos surpreende o anjo dizer: Os romanos serão amedrontados com notícias do oriente e do nor te., com o de fato aconteceu. Então acrescenta: s a irã o co m g ra n d e fu ro r; ou, seja, em bora perdessem muitas tropas, contudo esse severo m assacre não im pressionaria seu espírito. Q uando suas circunstâncias ficavam desesperadoras, se deixavam excitar com o lw Provavelm ente ‘notícias' ou ‘declarações- que seriam ouvidas. 429 [11.45] D A N IE L bestas selvagens após sua presa, até que se precipitavam em sua própria destruição. Isso aconteceu m ais especialm ente sob o rei nado de Augusto; p o r um curto período, ele contendeu sucessi vam ente com os partos e os com peliu a render-se. Então lhes im puseram condições de paz; e quando as águias rom anas entra ram na Pérsia, para sua própria desgraça, ele com peliu esse povo a retroceder para eles. Por meio dessa com pulsão ele apagou a desgraça que sofrera de Antônio. Vemos, pois, quão excessiva m ente bem isso se adequa ao contexto: os romanos virão com grande fu r o r para destruir a m uitos; quando os partos espera vam desfrutar tranqüilidade por m uito tem po e viver perfeita m ente livres de qualquer tentativa ou ataque futuro por parte dos rom anos. E prossegue: 45 E p lantará o s tabernáculos d e seus palácios en tre os m ares n o glorioso e san to m onte; todavia chegará a seu fim e ning uém o ajudará. 4 5 E t fig et tab e m a c u la palatii sui inier m aria ad m ontem desiderii sanctitatis, et veniet ad finem suum , e t non a u xiliator ei. O anjo por fim conclui com o dom ínio dos rom anos estabele cido na Á sia M enor e nas regiões do oriente, tanto quanto na Síria, Judéia e Pérsia. Já m ostram os com o tudo o que é predito aqui é relatado pelos historiadores profanos, e cada evento é bem conhecido de todos os que são m oderadam ente versados no co nhecim ento daqueles tempos. E preciso agora notar bem a frase: o rei rom ano fix a rá as te n d a s d e seu p alácio. E sta expressão significa não só a deflagração da guerra pelos rom anos no orien te, m as em se tornarem os senhores de toda aquela região. Q uan do ele disse que fixariam suas tendas segundo a prática usual da guerra, poderia ter se contentado com o m étodo usual de lingua gem, porém contrasta a palavra ‘palácio’ com as m igrações fre qüentes, e significa que seu acam pam ento não se m ediria segun do o costum e da guerra, m as que ocuparia uma posição fixa para certa perm anência. P or que então ele fala de tendas? Porque a A sia não era a sede de seu império; pois eram cuidadosos em não 430 6 4 * EX P O SIÇ Ã O [ 11 .45 ] atribuir m ais dignidade a algum palácio do que lhes era conveni ente. Por essa razão, os procônsules lhes proporcionavam num e rosa assistência para evitar a necessidade de algum palácio fixo. Eles tinham suas próprias tendas e às vezes perm aneciam nessas habitações tem porárias quando se viam em suas jornadas. Esta linguagem do anjo - fix a r a m as tendas de seu palácio - se ade quará à excessiva com odidade dos rom anos, porque reinaram ali tranqüilam ente depois que o oriente foi subjugado; e contudo não tinham habitação fixa, porque não queriam que algum palácio viesse a tornar-se bastante forte ao ponto de rebelar-se contra eles. Ao dizer: e n tre os m ares, há quem pensa estar em pauta o M ar M orto e o Lago de Asfalto, com o opostos ao M ar M editerrâ neo. N ão hesito em pensar que o que está na m ente do anjo é o M ar Pérsico. Ele não diz que os rom anos se tornariam senhores de todas as terras subjacentes entre os dois m ares, m as apenas diz que fixariam as tendas de seu palácio entre os mares\ e sabe mos que isso foi feito quando estabeleceram o dom ínio entre o Euxine e o G olfo Pérsico. É bem conhecido a extensão do dom í nio de M itridates, pois os historiadores registram vinte e duas nações sujeitas a seu poder. M ais tarde, de um lado ficou a Á sia M enor, que consistia de muitas nações, segundo nossa afirm ação em outro lugar, e a A rm ênia veio a ser sua depois que Tigranes foi vencido, enquanto a C ilicia, ainda que apenas a parte de uma província, era um a região m uito extensa e opulenta. Possuía m ui tos desertos e muitas montanhas pedregosas e estéreis, enquanto havia na Cilicia muitas cidades ricas, ainda que não form asse um a única província, com o a Síria e a Judéia, de modo que não surpreende quando o anjo diz que os ro m a n o s/ã fln a m suas ten das entre os m ares, pois sua habitação ficava além do M ar M edi terrâneo. Prim eiro passaram pela C ilicia, em seguida pela E spa nha; em terceiro lugar, com eçaram a estender seu poder sobre a G récia e Á sia Menor, contra Antíoco, e então se apoderaram de todo o oriente. D e um lado estava a Á sia M enor e m uitas outras 431 [11.45] D A N iEL nações; e do outro lado estava o M ar Sírio, inclusive a Judéia, até o M ar Egípcio. Observamos, pois, a tranqüilidade do império rom ano entre os m ares, e contudo não tinha sede perm anente ali, porquanto os procônsules passavam seu tem po com o forasteiros no m eio de um país estranho. P or fim ele acrescenta: Eles v irão a o m o n te d o an seio de sa n tid a d e . Já expressei a razão por que esta profecia foi pronun ciada, isto é, para im pedir que as notícias desses acontecim entos perturbassem as mentes dos santos, quando vissem um a nação tão bárbara e longínqua os tripudiando e governando com sober ba, insolência e crueldade. Q uando, pois, um espetáculo tão do loroso estivesse diante dos olhos dos santos, dem andariam não pouco apoio para que não se rendessem à pressão do desespero. O anjo, pois, prediz acontecim entos futuros para produzir o reco nhecim ento de que nada realm ente acontece por acaso. E em se guida m ostrar com o todas esses m ovim entos turbulentos p o r todo o m undo são governados pelo poder divino. Segue-se a consolação: p o r fim c h e g a rã o a seu fim e n in guém os a ju d a rá . Isso não se cum priu im ediatam ente, porque depois que Crasso despojou o tem plo e sofreu um revés contra os partos, os rom anos não fracassaram total e repentinam ente, po rém sua m onarquia floresceu ainda mais e m ais sob Augusto. A cidade foi então arrasada por Tito até o pó, e o próprio nom e e existência da nação ju d aica ficaram quase aniquilados. Então, depois disso, os rom anos sofreram derrotas desastrosas; e foram expulsos de quase todo o oriente e com pelidos a negociar com os partos, os persas e outras nações, até que seu im pério ficou total m ente arruinado. Se estudarm os a história dos cem anos seguin tes, não se encontrará nenhum a nação que sofresse mais severos castigos que os romanos, e nenhum a m onarquia jam ais foi sub vertida com m aior desgraça. Deus, pois, derram ou tal fúria sobre aquela nação, que a m esm a veio a ser o espanto do mundo. As palavras do anjo não são debalde: seu próprio fim virá logo\ de 432 6 4 * EX P O SIÇ Ã O [12.1] pois que tinham devastado e despovoado todas as terras, e pene trado e invadido tudo, e o m undo inteiro se rendeu a seu poder, então os rom anos foram totalm ente arruinados e varridos. Não terão ninguém que os ajude. Sem dúvida esta profecia poderia estender-se aqui à prom ulgação do evangelho; pois ainda que Cristo nascesse num a época antes d a proclam ação do evangelho, não obstante ele verdadeiram ente resplandeceu no m undo por m eio dessa prom ulgação. O anjo, pois, conduziu sua profecia àquele ponto do tempo. Ele agora ju n ta isto: íZ iip ítu ú o 1 2 1 E n aq u ele tem po se levantará M iguel, o grande príncipe que favorecerá o s filh o s d e teu p ov o ; e h averá u m tem po d e tribulação, tal co m o nunca h ouve desd e q u e e xiste u m a nação até aquele tem po; e n aqu ele tem p o teu povo será libertado, todo aquele q u e for achado inscrito n o livro. 1 E t tem p o re illo stab it M ich ael princeps, m agnus stans pro filiis p opuli tu i. e t erit tem pus afflictionis, q u a le non fui abcsse g entem , hoc esl, ex quo ca p eru n t esse gentes, ad tem pus illud usque: e t tem pore illo servabitur populus tuus quicunque inventus fu erit scriptus in libro. O anjo não mais relata especialm ente ocorrências futuras, mas proclam a que D eus é o general e guardião de sua Igreja, para preservá-la m aravilhosam ente no meio de muitas dificuldades e de terríveis com oções, bem com o nas profundas trevas de desas tres e de morte. Esse é o sentido dessa sentença. Este versículo consiste de duas partes: a prim eira se relaciona com aquele des ditoso período que seria saturado de várias e quase inum eráveis calam idades; e a segunda nos assegura daquela proteção e a pre servação infalíveis de D eus em prol de sua Igreja, usando seu próprio e inerente poder. N esta segunda parte, a prom essa se res tringe aos eleitos, e assim um a terceira sentença pode ser distin guida, porém é apenas um a adição à segunda supram encionada. N a conclusão do versículo, o anjo nos apresenta um a definição d a Igreja: quantos professavam ser o povo de Deus e na realidade não o eram. 433 [12.1] D AN IEL D iz ele: M iguel, o príncipe do povo se levantará. Então declara a razão: as calam idades daquele período serão de tal natureza, que nunca foram testem unhadas desde o princípio do mundo. Visto que ele se dirige a D aniel, então diz: filhos de teu povo; porque ele era um dos filhos de Abraão, e a nação da qual D aniel procedia era nesse sentido ‘su a’. D isto se segue que as calam idades de que paulatinam ente trata pertencem à verda deira Igreja, e não às nações profanas. O auxílio singular de M i guel não teria sido necessário, a menos que a Igreja fosse oprim i da com as m ais desastrosas aflições. Percebem os, pois, que a in tenção do anjo se harm oniza com m inha explicação. A Igreja estaria sujeita às m ais num erosas e graves calam idades até o ad vento de Cristo, não obstante ela sentiria a disposição propícia de D eus assegurando seu próprio bem -estar sob seu auxílio e prote ção. Por M iguel muitos concordam em interpretar com o sendo Cristo a C abeça da Igreja. M as se parecer preferível entender M iguel com o sendo o arcanjo, este sentido provará ser adequa do, pois sob Cristo com o a Cabeça os anjos são os guardiães da Igreja. Seja qual for o verdadeiro sentido, D eus era o preservador de sua Igreja pelas mãos de seu Filho unigénito; e visto que os anjos estão sob o governo de Cristo, ele poderia confiar tal tarefa a M iguel. Aquele hipócrita imundo cham ado Serveto tem ousa do apropriar-se desta passagem e a aplicar a sua pessoa; porquanto a inscreveu com o frontispício em seus horríveis com entários por ser ele tam bém cham ado M iguel ! Observam os que fúria diabóli ca se apoderou dele ao ponto de usar com o se aplicando a ele o que aqui se diz do singular auxílio propiciado por C risto a sua Igreja. Ele era um homem dos mais im puros sentim entos, com o j á se fez sobejam ente notório. M as essa foi um a prova de sua im pudência e sacrílega dem ência - adornar-se com esse título de Cristo sem o mais leve rubor e assentar-se no lugar de Cristo, gabando-se de ser M iguel, o guardião da Igreja e o poderoso prín cipe do povo! Este fato é bem notório, porque, tendo o livro em minhas mãos, ninguém precisará pôr em dúvida m inha afirmação. 4 34 6 4 " EX P O SIÇ Ã O ORAÇÃO D e u s T o do-P odero so , v isto q u e e sta m o s p o s to s e m e stre ss e s s e m e lh a n te s a o s q u e tu q u is e ste n o s p r o v a r p o r m e io d o a n jo , c o m o s e d eu ta m b é m co m teu p o v o a n tig o , f a z c o m q u e tu a lu z b rilh e so b re n ó s p o r m e io d e teu u n ig é n ito F ilho. Q u e n o s s in ta m o s s e m p r e se g u ro s so b teu in v e n c ív e l poder. Q u e h a b ite m o s s e g u r o s so b tu a so m b ra , e lu te m o s so líc ita e o u sa d a m e n te a té o f i m c o n tr a S a ta n á s e to d a su a h o ste ím p ia . E q u a n d o to d a n o ssa g u e rr a c h e g a r a o fim , c h e g u e m o s p o r f i m à q u e le b e n d ito d e sc a n s o o n d e o f r u t o d e n o ss a v itó ria n o s ag u a rd a , n o m e sm o C ris to n o ss o Senhor. A m ém . 435 65a / \ j j capítulo 12 com eçou, com o afirmei na preleção de ontem, com a predição angélica quanto ao estado futuro d a Igreja depois da manifestação de Cristo. Teria sido um tem a de muitas m isérias, e daí esta passagem ter suavizado a dor de D aniel e a de todos os santos, ao prom eter ele ainda a segurança d a Igreja atra vés do socorro divino. Daniel, pois, representou M iguel com o o guardião da Igreja, e D eus deu a Cristo a incum bência desse de ver, com o aprendem os do capítulo 10 de João [vv. 28, 29]. Como afirmei ontem, M iguel pode significar um anjo; porém adoto a opinião dos que aplicam isso à pessoa de Cristo, porque se adequa m elhor ao tem a representá-lo com o se pondo em defesa de seu povo eleito. Ele é cham ado poderoso príncipe, porque natu ralm ente colocou a invencível fortaleza de Deus contra aqueles perigos aos quais o anjo representa a Igreja com o estando sujeita. Bem conhecem os as muitas causas superficiais pelas quais o ter ror às vezes se apodera de nossas mentes, e quando com eçam os a trem er, nada pode acalm ar o tum ulto e agitação de nosso íntimo. O anjo, pois, ao tratar de lutas tão graves e do im inente perigo que paira sobre a Igreja, denom ina M iguel o príncipe poderoso. Com o se dissesse: M iguel seria o guardião e protetor do povo eleito e exerceria imenso poder; e ele sozinho, sem a m ais leve dúvida, seria suficiente para propiciar-lhe proteção. Cristo con firm a a m esm a asseveração, com o acabam os de dizer, no capítu lo 10 de João. D iz ele que todos os eleitos lhe foram dados por seu Pai, e nenhum deles pereceria, porque seu Pai era m aior que 4 36 65* EX P O SIÇ Ã O [12.1] tudo; ninguém , diz ele, arrebatará as ovelhas de m inha mão. Meu Pai, que as deu a mim, é m aior que tudo; ou, seja, D eus possui poder infinito, e o exibirá para a segurança daqueles a quem ele escolheu antes da fundação do mundo, e as entregou a mim, ou as depositou em m inhas mãos. A gora percebem os a razão de tal epíteto, o qual designa M iguel com o sendo o grande príncipe. Pois em conseqüência da m agnitude da pugna, é preciso que acei temos a oferta de força insuperável a capacitar-nos p ara o desfru to de tranqüilidade no m eio das com oções m ais graves. N ão era de form a algum a supérfluo que o anjo predissesse calam idades de tal vulto pendentes sobre a Igreja, e nos dias atuais as mesmas expressões nos são de m uita valia. Percebem os, pois, com o os judeus im aginavam um a condição de felicidade sob Cristo, e o m esm o erro foi adotado pelos apóstolos que, quando C risto dis correu sobre a destruição do tem plo e da cidade, pensavam que o fim do m undo estava chegando, e conectaram isso com sua pró pria glória e triunfo [Mt 24.3]. O profeta, pois, é aqui instruído pelo anjo sobre com o Deus dirigiria a trajetória de sua Igreja quan do lhes m anifestasse seu Filho unigénito. Todavia o que aguarda va todos os santos era tribulação em extrem o severa; com o se dissesse: O tem po de seu triunfo ainda não chegou; contudo de vem continuar sua luta, que será de m uita dificuldade e aborreci mentos. A condição do novo povo é aqui com parada àquela do antigo povo que sofreu muitos perigos e aflições nas m ãos de Deus. O anjo, pois, diz que, ainda quando os fiéis sofressem com extrem a severidade sob a lei e os profetas, não obstante um tem po ainda m ais opressivo está por vir, durante o qual Deus trataria sua Igreja m ais estritam ente do que antes, e a subm eteria a p ro vações ainda m ais execrandas. Esse é o significado da passagem: está para surgir um tempo de m uitas aflições, tais com o as na ções ja m a is viram desde que com eçaram a existir. E possível que esta seja um a referência à criação do m undo, e se a aplicar m os às próprias pessoas, a exposição se revelará correta; pois 437 [12.1] DANIEL em bora a Igreja fosse miserável nos prim eiros períodos, contu do, depois do aparecim ento de Cristo, ela sofreria m uito mais calam idades do que antes. Lem brem o-nos d a linguagem do sal mista: “M uitas vezes me angustiaram desde m inha juventude, diga agora Israel; muitas vezes me angustiaram desde m inha ju ventude; todavia não prevaleceram contra mim. O s lavradores araram sobre m inhas costas; com pridos fizeram seus sulcos” [SI 129.1-3]. A través de todos os tempos, pois, Deus sujeitou sua Igreja a muitos males e desastres. M as um a com paração é aqui instituída entre dois diferentes estados da Igreja, e o anjo m ostra com o depois do aparecim ento de C risto ela estaria m uito mais longe de tranqüilidade ou felicidade. Com o seria oprim ida com aflições m ais pesadas, não surpreende que os pais quisessem que nos conform ássem os à imagem de seu Filho unigénito [Rm 8.29]. D esde o período da ressurreição de Cristo, ainda quando um a guerra angustiante nos aguarde, devem os suportá-la com grande equanim idade, porque a glória do céu é posta diante de nossos olhos m uito m ais claram ente do que o foi para eles. P or fim, ele acrescenta: N aq u ele tem p o te u povo s e rá p r e serv ad o . Com esta expressão o anjo nos realça a grande im por tância da proteção de M iguel. Ele prom ete a seu povo eleito um a salvação infalível, com o se dissesse: em bora a Igreja seja expos ta aos m aiores perigos, não obstante, com respeito a Deus m es mo, ela estaria sem pre segura e vitoriosa em todas as lutas, por que M iguel seria superior a todo inimigo. O anjo, pois, ao exortar assim os fiéis a suportar a cruz, m ostra quão livres eles seriam de toda dúvida quanto ao evento e da absoluta certeza de sua vitória. E m bora à prim eira vista esta profecia pudesse inspirar-nos tem or e desalento, contudo este conforto nos deve ser suficiente: “Sere m os vitoriosos no meio do fogo e da espada, e no m eio de muitas m ortes estarem os certos da vida.” Com o um a perfeita segurança nos é aqui posta diante dos olhos, devem os sentir-nos seguros e entrar com júbilo em todo em preendim ento. Na verdade nos ve 436 6 5* EX P O SIÇ Ã O [12.1] mos obrigados a lutar, porém Cristo já venceu por nós, com o ele m esm o diz: “Confiai em mim; eu já venci o m undo” [Jo 16.33]. O anjo, porém , restringe o que disse em term os gerais à guisa de correção. M uitos professavam pertencer ao povo de Deus, e cada um naturalm ente oriundo da estirpe de Israel se vangloriava de proceder da semente divina. Com o todos indiscrim inadam ente queriam pertencer ao povo de Deus, o anjo restringe su a expres são usando um a frase que delimitava: to d as as pessoas, diz ele, q u e estiv erem in sc rita s no livro. Esta sentença não significa todo o Israel segundo “a carne” [Rm 9.6-8], m as as pessoas que Deus estim a com o sendo realmente israelitas tão-somente segundo a eleição da graça. Ele aqui distingue entre os filhos carnais e os filhos espirituais de Abraão: entre a Igreja externa e a Igreja in terna, que constitui a verdadeira com unidade que o Onipotente aprova. Então, do que depende a diferença entre os que se glori am de ser filhos de Abraão, enquanto são rejeitados por Deus, e os que são real e verdadeiram ente seus filhos? D epende da mera graça e favor de Deus. Ele declara sua eleição quando regenera seus eleitos pela ação do Espírito Santo e assim os distingue com um a m arca infalível, enquanto provam a realidade dessa filiação ao longo de todo o curso de suas vidas, e confirm am sua própria adoção. Entrem entes, som os com pelidos a ir im ediatam ente à fonte: unicamente Deus, por sua eleição gratuita, distingue a Igreja externa, que nada tem senão m ero título, da verdadeira Igreja, a qual jam ais pode perecer ou apostatar. E assim observam os em quantas passagens da Escritura os hipócritas são rejeitados no m eio de sua entum ecida soberba, com o nada tendo em com um com os filhos de D eus, senão os símbolos externos de sua profis são de fé. D evem os observar essa restrição, a qual nos assegura da total inutilidade da pom pa externa e da natureza im profícua inclusive de um a posição elevada na Igreja externa, a m enos que estejam os verdadeiram ente no seio do povo de Deus. Isso é expresso plena439 [12.1] DANIEL m ente nos Salm os 15 e 24, enquanto o Salm o 73 confirm a a m es m a idéia. Q uão bom é D eus para Israel, especialm ente para os de coração íntegro! N estas passagens dos Salm os a causa não está na eleição secreta de Deus, mas no testem unho extem o da con duta; e esta, em bora inferior em grau, não é contrária à prim eira causa que a produz. Este é seu lugar apropriado, m as a eleição divina é sempre superior. A palavra livro se refere ao eterno con selho de Deus, por m eio do qual ele nos elegeu e nos adotou com o seus filhos antes da fundação do mundo, com o lemos no prim eiro capítulo de Efésios [v. 4], N o m esm o sentido, Ezequiel investe contra os falsos profetas que enganavam o povo de Israel [13.9], M inha mão, diz Deus, será contra esses profetas que en ganam m eu povo; portanto, não perm anecerão n a assem bléia se creta de meu povo, nem serão achados no rol da casa de Israel. A palavra usada aqui significa escrever - não serão escritos nos registros da casa de Israel. A palavra livro é aqui usada no m es m o sentido, e no entanto não precisam os adotar a idéia grosseira de que o Onipotente tem algum a necessidade de um livro. Seu livro é o eterno conselho que nos predestina para ele m esm o e nos elege para a esperança da salvação eterna. A gora entende mos o pleno sentido desta instrução, a saber: a Igreja perm anece rá em segurança em meio a muitas m ortes; e m esm o no último estágio de desespero, ela escapará através da m isericórdia e so corro de Deus. D evem os tam bém lembrar-nos desta definição de igreja, porque muitos se gloriam de ser filhos de Deus, os quais lhes são totalm ente estranhos. Isso nos leva a considerar o tema da eleição, visto que nossa salvação em ana dessa fonte. N ossa vocação, que é seu testemunho extemo, depreende aquela graciosa adoção que se acha escondida em seu íntimo; e assim Deus, quan do nos regera pela operação de seu Espírito, esculpe em nós suas m arcas e sinais para poder reconhecer-nos com o seus filhos re ais. E prossegue: 2 E m u ito s d os q ue d orm em n o pó d a ter- 440 2 E l m ulti e x d orm ientibus in lerra pulve- 65* EX P O SIÇ Ã O ra aco rd arão , alguns para a v id a e te rn a e alguns p a ra v ergonha e d esprezo eternos, [12.2] re, evig ilab u n t hi in vitam secu ii. ho est, perpetuo, hi vero in o pp ro b iu m e t in abom inationem perpetuam . Q uanto à tradução das prim eiras palavras, literalm ente é: m uitos que dorm em no terra do pó, ou que estão na terra e no pó; pois o genitivo é usado com o um epíteto, ainda que po ssa ser lido com o se estivesse em oposição à palavra anterior, dorm ir, signi ficando os que são reduzidos à terra e ao pó. O anjo aqui parece m arcar um a transição do com eço da pre gação do evangelho ao dia final da ressurreição, sem ocasião su ficiente para ela. Pois, por que ele passa do tem po im ediato du rante o qual muitos acontecim entos poderiam ser o tem a da pro fecia? Ele une esses dois tem as com justeza e apropriadam ente, conectando a salvação da Igreja com a ressurreição final e com a segunda vinda de Cristo. P or mais que olhem os em nosso redor, jam ais encontrarem os qualquer fonte de salvação sobre a terra. O anjo anuncia a salvação de todos os eleitos. Eles são oprim idos m iseravelm ente de todos os lados, e para onde quer que volvam seus olhos, nada percebem senão confusão. D aí a esperança da salvação prom etida não poder ser concebida pelo hom em antes que os eleitos ergam suas mentes para a segunda vinda de Cristo. É precisam ente com o se o anjo dissesse: D eus será o constante preservador de sua Igreja, até o fim. M as a m aneira com o ele a preserva não deve ser tom ada em um sentido carnal, com o a Igre ja será sem elhante a um corpo morto até que ela ressuscite. Aqui percebem os o anjo ensinando a m esm a verdade que Paulo ex pressa em outros termos, a saber: estam os mortos, e nossa vida está oculta com Cristo; então ela se m anifestará quando ele apa recer nos céus [Cl 3.3]. D evem os defender esta verdade a todo custo: Deus é suficientem ente poderoso para defender-nos, e não precisam os hesitar, se de fato estam os seguros em suas mãos e proteção. Entrem entes, é necessário acrescentar este segundo ponto: enquanto tiverm os nossos olhos fixos som ente neste 441 [12.21 DANIEL presente estado de coisas, e nos agarrando ao que o m undo nos oferece, seremos sempre com o se estivéssem os mortos. Por quê? N ossa vida deve estar oculta com C risto em Deus. N ossa salva ção está segura, porém ainda esperam os por ela, com o Paulo nos diz em outra passagem [Rm 8.23, 24], O que é esperado não é visto, diz ele. Isso nos m ostra quão com pletam ente razoável é a transição desta doutrina relativa aos eleitos de D eus e o últim o advento de Cristo. Isso, pois, é suficiente com respeito ao con texto. A palavra muitos aqui parece claram ente expressar o todo, e isso não deve ser considerado com o absolutam ente absurdo, pois o anjo não usa a palavra em contraste com todos ou poucos, m as apenas com o unidade. Alguns dos judeus forçam esta ex pressão para significar a restauração da Igreja neste m undo sob eles m esm os, o que é com pletam ente frívolo. N este caso a se guinte linguagem não seria correta: A lguns re ssu sc ita rã o p a r a a vida, e o u tro s, p a r a a m isé ria e desprezo. Daí, se isso não diz respeito a ninguém senão à Igreja de Deus, certam ente ninguém ressuscitaria para a m iséria e condenação. Isso m ostra que o anjo está tratando da ressurreição final, a qual é com um a todos, e não adm ite exceções. Já expliquei por que ele cham a nossa atenção para o advento de Cristo. Visto que todas as coisas no mundo estarão constantem ente em confusão, nossas mentes devem ne cessariam ente elevar-se ao alto e tom ar posse da vitória que ob servam os com nossos olhos, e com preendê-la com nossos senti dos externos. O s q u e d o rm e m n a te r r a e n o pó; ou, seja, sem pre que exis tir terra e pó, não obstante ressuscitarão, significando a esperan ça de um a ressurreição não fundam entada nas causas naturais, m as dependendo do inestimável poder de Deus, o qual excede a todos nossos sentidos. Daí, em bora os eleitos e igualm ente os ímpios serem reduzidos à terra e ao pó, isso de form a algum a constitui um obstáculo para D eus os fazer vir novam ente à exis tência. Ele usa a expressão terra e pó. Em meu raciocínio, HD1K, 4 42 6 5 s EX P O SIÇ Ã O [12.3] admeth, ‘d a terra’, é o gênero; e IDl?, gnepher, ‘p ó ’, é a espécie, ou, seja: em bora não passem de cadáveres putrefatos, contudo serão reduzidos a pó, o qual é constituído por dim inutas partícu las de terra. Deus, pois, é vestido com poder suficiente para cha m ar os m ortos à novidade de vida. E sta passagem é digna de especial nota, porque os profetas não contêm algum testemunho m ais claro do que este relativo à ressurreição final, particular mente quando o anjo distintam ente assevera a ressurreição futura igualmente de justos e injustos. A eternidade é aqui oposta às m isérias tem porais a que ora estam os sujeitos. Aqui podem os notar a adm oestação de Paulo, que aquelas aflições m om entâne as pelas quais Deus nos prova não podem com parar-se com aquela eterna glória que jam ais cessará [Rm 8.18]. Portanto, esta é a razão por que o anjo tão claram ente expressa que a vida eterna está aguardando os eleitos, e a desgraça e condenação eternas serão a sorte dos ímpios. Em seguida ele acrescenta: 3 E o s q u e fo rem p ru d e n te s b rilh a rã o co m o e sp len d o r do firm am ento; e os que a m uitos ju stific are m , co m o as e strelas se m p re e eternam ente. 3 Ei prudentes fulgebunt quasi fulgor e x pansionis,"" et qui ju stific an t m u ito s,1,2 sicut stellæ in secu lu m e t seculum , id est. in perpetuum. A palavra ‘prudente’ significa revestido com intelecto. A l guns a tom am transitivam ente, e nesta passagem sua opinião pro vavelm ente seja correta, porque o ofício de ju stificar logo será designado aos prudentes. M as o prim eiro sentido se adequa m e lhor ao capítulo 11, e no versículo 10 ele será expresso em ter mos absolutos. D aí significar os que são dotados com inteligên cia. O anjo aqui confirm a o que acabei de expressar concernente à ressurreição final, e m ostra com o desfrutarem os de seus frutos, porque a glória eterna está estabelecida para nós no céu. Não devem os queixar-nos de serm os tratados injustam ente, sempre que parecerm os sofrer abruptam ente nas m ãos de Deus, porque 1,1 D os céus. significando o firmamento. 195 Isto é. os que justificaram a muitos. 443 [12.3] DANIEL devem os viver satisfeitos com a glória celestial e com perpétua existência daquela vida que nos foi prom etida. Ele então diz os m e stres, ou aqueles que excelem em entendim ento, b rilh a rã o com o a luz do céu. Se o term o ‘m estres’ for preferível, então há aqui um a figura de linguagem, um a parte sendo expressa pelo todo, e portanto eu sigo a explicação usual. Ele aplica a frase “dotado com entendim ento” aos que não se apartam do verdadei ro e puro conhecim ento de Deus, com o a seguir será explicado mais plenamente. Pois o anjo contrasta o profano que soberba e desdenhosam ente se enfurece contra D eus e contra os fiéis cuja sabedoria é subm eter-se a D eus e ao culto que lhe pertence com a mais pura afeição de suas mentes. D irem os m ais sobre este tema am anhã. Agora, porém , ele diz que os que m antinha sincera p ie dade seriam com o a luz do firmamento', ou, seja, serão herdeiros do reino do céu, onde desfrutarão daquela glória que excede a todo o esplendor do mundo. Sem dúvida, o anjo aqui u sa figuras para explicar o que é incompreensível, significando que nada pode ser encontrado no m undo que corresponda à glória do povo eleito. E os q u e ju s tific a re m a m uitos serão com o as estrelas, diz ele. Ele repete a m esm a coisa em outros term os, e agora fala de estrelas, tendo a princípio usado a frase o b rilh o d o firm a m e n to no m esm o sentido; e em vez de “os que são dotados com enten dim ento” , ele diz: os q u e a m u ito s ju stific a re m . Sem dúvida, o anjo aqui denota especialm ente os m estres d a verdade, porém em m inha opinião ele abarca também todos os pios adoradores de Deus. N enhum dos filhos de D eus deve confinar sua atenção par ticularm ente em si, mas, o quanto possível, cada um deve interessar-se no bem -estar de seus irmãos. Deus depositou o ensino de sua salvação em nós, não com o propósito de o guardarm os em nosso íntimo, mas para que apontemos o cam inho da salva ção a todo gênero humano. Portanto, este é o dever com um dos filhos de Deus - prom over a salvação de seus irmãos. P or esta palavra, ‘ju stificar’, o anjo pretende não que esteja no poder de 444 6 5 a EX P O SIÇ Ã O [12.3] um hom em justificar outro, mas a propriedade de D eus é aqui transferida para seus m inistros. Entrem entes, tanto som os clara m ente justificados por qualquer ensino que produza fé dentro de nossa esfera, quanto somos justificados pela fé que procede do ensino. Por que nossa justificação é sem pre atribuída à fé? Por que nossa fé nos conduz a Cristo em quem está a com pleta per feição da justificação, e assim nossa justificação pode ser atribu ída igualm ente à fé ensinada e à doutrina que a ensina. E os que põem diante de nós este ensino são os m inistros de nossa ju stifi cação. A afirm ação do anjo, em outros term os, é esta: O s filhos de Deus, que se devotam inteiram ente a D eus e são governados pelo espírito de prudência, apontam o cam inho da vida a outros, não só serão eles mesm os salvos, m as possuirão incom ensurável glória m uito além de qualquer coisa que exista neste mundo. Esta é a explicação com pleta. D aí deduzirm os que a natureza da ver dadeira prudência consiste em nos submetermos a D eus com o sim ples alunos, e em m anifestarm os a qualidade adicional de prom over cuidadosam ente a salvação de nossos irmãos. O efeito desse nosso labor deve aum entar nossa coragem e espírito de jú bilo. Pois quão grande é a honra conferida a nós por nosso Pai celestial, quando ele quer que sejam os m inistros de sua justiça! Com o diz Tiago: “Irm ãos, se algum dentre vós se tem desviado da verdade, e alguém o converter, saiba que aquele que fizer con verter um pecador de seu cam inho errado, salvará da m orte um a alm a e cobrirá um a m ultidão de pecados” [Tg 5.19, 20]. Tiago nos cham a de preservadores, justam ente com o o anjo nos cham a de justificadores; nem o anjo nem o apóstolo deseja detrair algo da glória de Deus, mas com esse m odo de falar o Espírito nos representa com o m inistros da justificação e da salvação, quando nos unimos nos mesmos laços a todos quantos necessitam de nossa assistência e esforços. Vamos em frente: 4 E t tu D aniel, claude, vel, obsera verba, sennones, e t o b sig n a librum ad tem pus 4 T u, porém , ó D aniel, e n cerra as palavras e se la o livro, até o tem po d o fim ; 445 [12.4] DANIEL m uitos correrão d e um a parte para o utra, e o con h ecim en to se m ultiplicará. finis; d iscurrent im ilti, e t au g eb itu r scientia. Já explicam os "o tem po do fim ” com o sendo um período pre viam ente fixado por Deus e estabelecido por seu próprio conse lho. A palavra seguinte indica seguir e correr de um lado para o outro, mas não necessariamente em um mal sentido, enquanto significa tam bém investigar. Os intérpretes explicam a intenção do anjo com o se muitos fossem indignos de receber esta profecia de D aniel; e daí ter ela que ser encerrada e só enigm aticam ente entregue a uns poucos, porque raram ente um em cem atenderia ao que ele tinha declarado. Creio que o Espírito Santo tem um a intenção diferente aqui. O conselho do anjo é este: Não há razão por que esta profecia viesse causar desesperança e desânim o, só porque poucos a receberiam. Em bora ela fosse universalm ente desprezada e ridicularizada, não obstante fo i encerrada como um precioso tesouro. Isaías tem um a passagem quase sim ilar [8.16]: Encerra m inha lei, sela o testem unho entre m eus discípu los. O espírito de Isaías seria quebrantado quando percebesse que ele era um objeto da irrisão universal, os oráculos sacros de D eus tripudiados; e assim ele quase perdeu toda coragem e seu ofício de mestre se declinou. Deus, porém, lhe oferece conforto: E ncer ra, diz ele, m inha lei entre meus discípulos e não atentes para estirpe profana; em bora todos desprezem teu ensino, não presu m as que tua voz m ereça ser ridicularizada; encerra-a, encerra-a entre meus discípulos, diz ele; quão poucos são aqueles que po dem abraçar teu ensino; não obstante, que ele perm aneça sagrado e estabelecido nos corações dos santos. Em seguida o profeta diz: Eis meus filhos comigo. Aqui ele exulta em seu contenta m ento com bem poucos, e assim triunfa sobre os ímpios e a m ul tidão insolente. E assim no tem po atual, no papado e por todo o m undo, a im piedade prevalece tão extensam ente que raram ente há pelo menos um único canto em que a m aioria concorda com a genuína obediência a Deus. Com o Deus vislum brou que bem 446 6 5 a EX P O SIÇ Ã O [12.4] poucos abraçariam esta profecia com a devida reverência, o anjo desejou anim ar o profeta para que ele não se sentisse exausto e avaliasse esta profecia com o de pouco valor, em conseqüência de seu fracasso em com andar o aplauso do m undo inteiro. Então, e n c e rra o livro! Enfim, o que a frase im plica? Não significa ocultá-lo de todos os homens, mas satisfazer o profeta quando viu tão poucos reverentem ente abraçando o ensino tão claram ente posto pelo anjo diante de seus olhos. Esta não é pro priam ente um a ordem; o anjo simplesmente diz a Daniel que ocul tasse ou selasse este livro e estas palavras, propiciando-lhe ao m esm o tem po m uita consolação. Se todos os hom ens despreza rem tua doutrina, e rejeitarem o que puseste diante deles - se a maioria a encarar desdenhosamente, encerra-o e sela-o, não tra tando-o com o algo sem valor, mas preservando-o com o um tesou ro. Deposito-o contigo, coloca-o entre meus discípulos. ’Hi, D ani el; aqui o nome do profeta é mencionado. Se pensas estar sozinho, m ais tarde companheiros te serão acrescentados, os quais tratarão esta profecia com real piedade. Encerra-o, pois, e sela-o, a té o tem p o do fim; pois Deus provará pelos próprios fatos que não falou em vão, e a experiência me mostrará ter sido enviado por ele, com o cada ocorrência foi previamente predita. Avancemos mais: M u ito s in v e stig arão , e o co n h ecim en to se m u ltip lic a rá . Alguns escritores tom am a segunda sentença em um sentido con trário, com o se muitos espíritos errantes corressem de um lado para o outro com vagas especulações e fugindo da verdade. M as isso é forçado dem ais. Não hesito em presum ir que o anjo está prom etendo a chegada de um período quando D eus ju n taria m ui tos discípulos em torno de si, em bora no início fossem bem pou cos e insignificantes. M uitos, pois, investigarão', ou, seja, ainda que sejam mui im prudentes e displicentes, enquanto se gabam de ser o povo de Deus, contudo D eus congregaria para si um a gran de m ultidão de um quadrante a outro. Pequeno e insignificante deveras é o aparente núm ero dos fiéis que se preocupam com a 447 [12.4] DANIEL verdade de D eus e que m ostram algum a solicitude em aprendêla, m as que isso de form a algum a te impressione. Os filhos de D eus logo virão a ser multiplicados. M uitos in v estig arão e o conhecim ento se m u ltip licará . Esta profecia nem sem pre é sepultada em obscuridade; o Senhor por fim levará m uitos a abraçarem -na para sua própria salvação. Este evento realm ente se concretizou. A ntes da vinda de Cristo esta doutrina não foi valorizada segundo seu real valor. A extrem a ignorância e rudeza do povo se fizeram notórias, enquanto sua religião era quase subvertida, até que Deus, por fim, multiplicou sua Igreja. E no tem po presente qualquer um que criteriosam ente considerar esta predição experim entará sua utilidade. Isso difi cilm ente poderá ser verbalm ente expresso; porque, a m enos que esta profecia fosse preservada e depositada com o um tesouro ines tim ável, m uito de nossa fé já teria desaparecido. Esta assistência divina nos propicia resistência e nos capacita a vencer todos os ataques do m undo e do diabo. ORAÇÃO D e u s T o do-P oderoso . u m a ve z q u e j á n o s a c h a m o s e n g a ja d o s em b a ta lh a a o lo n g o d e to d o o c u rso d e n o ss a vida, e n o ss a fo r ç a é p a s s ív e l d e q u e d a d e v á ria s m a n e ira s, f a z c o m q u e se ja m o s su s te n ta d o s p o r teu p o d e r e a ssim p o ss a m o s p e r s e v e r a r a té o fim . Q u e ja m a is n o s s in ta m o s ca n sa d o s, m a s a p re n d a m o s a v e n c e r o m u n d o in te iro e a v is u a liz a r a q u e la f e l iz e te r n id a d e p a r a a q u a l n o s a c e n a s. Q u e j a m a is h e site m o s en q u a n to C risto, te u F ilho, lu ta p o r n ó s, em c u ja m ã o e p o d e r s e e n c o n tr a n o ss a v itó ria ; e q u e s e ja m o s a d m itid o s n a q u e la a lia n ç a c o m e le n a c o n q u is ta q u e n o s te n s p ro p o r c io n a d o a té que, p o r fim , n o s re u n a m o s n o ú ltim o d ia n o d e sfru to d a q u e le tr iu n fo p a ra o q u a l f o s te a n te s d e nós. A m ém . 448 ^ 66a xposição 5 E ntão e u , D aniel, olhei, e eis que e sta vam e m p é o utros dois, u m d este lad o da m argem d o rio , e o outro, d o ou tro lado d a m arg em d o rio. 6 E um d eles disse ao hom em vestido de linho, o qual e stav a so b re as águas d o rio: Q uando será o fim d e ssa s m aravilhas? 5 E t aspexi ego D aniel, e t e c c e d u o alii stantes, u n u s hac ad rip am flu m in is, et unus, id est, alter, illac a d ripam flum inis.is” 6 E ld ix ita d v im m q u i indutus eras lineis v estibus subaudiendum e st, qui erai su p ra aquas flu m in is,w Q u o u sq u e finis m irabilium ? 7 E ouvi o h om em vestido d e linho, o qual estava sobre as águas d o rio, quando le vantou sua m ão direita e sua m ão esquer d a p ara o céu, e ju ro u por aquele que vive para sem pre, que seria por um tem po, tem pos e m etade d e um tem po; e quando ele tiver term inado d e difundir o poder d o povo santo, todas essas coisas serão cum pridas. 7 Et audivi virum ind u tu m lineis, qui erat s u p ra a q u a s flu v ii, e t su s tu lit d e x tra m suam , e t sinistram suam versus c a l o s , et ju ra v it p er viventem in s te rn u m , q u o d ad tem p u s p r s f ix u m , tê m p o ra praefixa, et d im idium ; e t ut consum pserint, vel, com pleverint, dispersionem , vel contriiionem , m anus p opuü sancti, co m p le b u n tu r om n ia h s c . Aqui D aniel relata sua visão de outros anjos em pé em cada m argem do rio. S ua alusão é ao Tigre que previam ente m encio nara, segundo a visão lhe fora apresentada. D iz ele: U m p e rg u n to u ao o u tro : Q u a n d o s e rá o fim ? O que recebeu a pergunta jurou com as mãos erguidas pada o céu, pelo D eus vivo, que nenhum a predição fora proferida em vão, visto que a verdade se m anifestaria em seu próprio período, e os homens deviam espe rar por u m tem p o , tem p o s e m e tad e d e u m tem po. E sse é o sum ário da passagem . Ao dizer eis, ele cham a nossa atenção para 1,3 Isto é, um de um lado e o outro do lado oposto. Isto é. de pé acim a da margem. 449 [12.5-7] DANIEL a infalibilidade da visão. A menos que ele atentasse e aplicasse sua m ente com toda seriedade a esses mistérios, sua narrativa teria fracasso em produzir confiança. M as, com o sua m ente esta va plenam ente calma, e nutria o desejo de receber a instrução com unicada por Deus através do anjo, nem a mais leve dúvida poderia ser lançada ou im pedir que ele nos entregasse fielm ente o que recebera. Ele fala de anjos com o se fossem hom ens pela razão previam ente assinalada. Não im plica que fossem realm en te homens, porém usa essa expressão em decorrência de sua apa rência externa, pois com o tinham um rosto humano, assim foram denom inados de homens. Não asseguro que seus corpos fossem m eram ente im aginários, nem direi que D aniel viu apenas formas e figuras humanas espectrais, porque Deus poderia ter vestidos seus anjos de corpos reais por algum tempo, um a vez que ele se m anifestou em carne [IT m 3.16]. M as isto não diz respeito aos anjos, os quais só receberam um corpo tem porário enquanto cum priam os deveres de seu ofício. Não há dúvida quanto a esta asse veração - o título ‘hom ens’ não pode pertencer propriam ente aos anjos, m as se adequa m uito bem à form a ou sem elhança humana que às vezes usavam. N ão surpreende depararm o-nos com um anjo questionando outro. Quando Paulo louva o m istério da vocação dos gentios, o qual esteve oculto das eras precedentes, ele acrescenta que o mesm o foi objeto do espanto dos anjos, com o se jam ais esperas sem por ele, posto que ele ainda não lhes fora revelado [E f 3.10], Tão m aravilhosam ente Deus operou em sua Igreja, que causou adm iração entre os anjos celestiais, deixando-lhes m uitas coisas desconhecidas, com o Cristo testifica acerca do últim o dia [Mt 24.36], Eis a razão por que o anjo interroga: Q uando será o fim dessas m aravilhas? Deus, sem dúvida, aqui insistiu com o anjo para inquirir quanto ao fato oculto em obscuridade, com o propó sito de despertar nossa atenção. Deveras absurdo nos seria deixar que tais coisas passassem sem prestarm os-lhes atenção, quando 450 6 6 a EX P O SIÇ Ã O [ 12 . 5 - 7 ] os próprios anjos dem ostram tal ansiedade por suas perguntas, enquanto percebem indícios do poder secreto de D eus. A menos que sejam os extrem am ente estúpidos, essa dúvida do anjo deve ria incitar-nos m aior diligência e atenção. E ssa é tam bém a força da palavra m íÒ D , phlaoth, “coisas m aravilhosas” ; pois o anjo denom ina tudo quanto não entendia de m aravilhoso. Se a com paração fo r adm issível, quão grande seria nossa ingratidão não pondo toda nossa atenção em considerar esses m istérios que os anjos são com pelidos a confessar estarem os m esm os além de sua com preensão! O anjo, com o se sentisse atônito, denom ina essas coisas de ‘m aravilhosas’, as quais estiveram ocultas não só das mentes humanas, mas tam bém dele m esm o e de seus com pa nheiros. O o u tro , p o ré m , resp o n d e. Donde existir algum a dife rença entre os anjos, ainda que não perpétua. N ão se deve adm itir aqui a filosofia de D ionísio, o qual especula tão astuciosam ente, ou, melhor, tão profanamente, ao tratar da ordem angelical. Quanto a m im , sim plesm ente declaro a existência de algum a diferença, porquanto D eus designa vários deveres a determ inados anjos e dispensa a cada um determ inada m edida de graça e revelação, segundo seu beneplácito. Sabem os que só h á um m estre de ho m ens e anjos - o Filho de D eus, que é sua eterna sabedoria e verdade. E sta passagem pode estar apontando para C risto, porém não posso fazer qualquer asseveração positiva. Contento-m e com a m era afirm ação já formulada. Ele diz que esses anjos estão vestidos de vestes de linho, im plicando esplendor. Vestes de li nho eram então de grande valor; daí um ornam ento ou decoração ser aqui aplicada aos anjos, visto que Deus os distingue da estir pe com um dos homens. Assim D aniel com preenderia m ais facil mente que tais pessoas não eram dentre os m ortais oriundos da terra, m as anjos vestidos por D eus da form a hum ana por um cur to período. D iz ele: E ste a n jo erg u eu su as m ãos p a r a o céu. Estão equi vocados os que consideram esta ação com o um sím bolo de po 451 [12.5-7] DANIEL der, pois sem dúvida o profeta pretendia m anifestar o m étodo usual de juram ento. Costum eiram ente erguia-se a m ão direita, segundo o testem unho de num erosas passagens da Escritura. Er gui m inha m ão para Deus [Gn 14.22], Aqui o anjo ergue ambas as m ãos, desejando com este ato expressar a im portância do tema. A ssim erguer am bas as mãos, com o se o juram ento fosse duplo, é m ais forte do que erguer a mão direita segundo o costum e ordi nário. D evem os considerar, pois, o uso de ambas as mãos com o tendo o propósito de confirm ar o juram ento, visto que o assunto era de grande importância. E continua: p o r u m tem po, tem p o s e m e ta d e d e u m tem po. Já expressei m inha objeção à opinião dos que crêem que o pro pósito aqui é expressar um ano, dois anos e m etade de um ano. Confesso que a passagem deve ser entendida com o um a alusão à profanação do tem plo, a qual o profeta j á havia discutido. A his tória claram ente nos assegura que o tem plo não seria purificado até que se com pletasse o terceiro ano e sete ou oito m eses depois. E possível que essa explicação se adeqúe a sua própria passa gem; mas, com referência à doutrina aqui enunciada, seu signifi cado é m uito simples: tempo significa um longo período; tem p os, um período mais longo ainda; e m eio significa o fim ou o período final. A som a total é esta: m uitos anos devem passar an tes de D eus cum prir o que seu profeta declarara. Portanto, tempo significa um longo período; tempos, esse período duplicado; como se ele dissesse: Enquanto os filhos de D eus são m antidos em sus penso por tanto tem po sem obter um a resposta a suas perguntas, o tem po será prolongado; sim , inclusive duplicado. Vemos, pois que um tem po não significa precisam ente um ano, nem tempos significam dois anos, m as um período indefinido. Com respeito à m etade de um tempo, isso é adicionado para o conforto dos santos, para evitar que desalentassem im aginando que a delonga era porque D eus não atenderia seu anseio. A ssim descansam p a cientem ente até que esse ‘tem po’ e ‘tem pos’ passassem . Além 4 52 66* EX P O SIÇ Ã O [12.5-7] disso, o resultado é posto diante deles pelas palavras m etade de um tem po, para im pedi-los de cair em desespero pela excessiva exaustão. A dm ito a alusão a anos, mas as palavras não devem ser entendidas literalmente, m as metaforicamente, significando, como já afirmei, um período indefinido. E m seguida ele acrescenta: E n o té rm in o ou consum ação d a d isp e rsã o ou com punção d a m ã o d o povo d e D eus, to d a s essas coisas se c u m p rirã o : prim eiro, o tem po deve passar; segundo, os tempos devem ser acrescidos; terceiro, a metade de tem po deve vir. Todas essas coisas chegariam a seu cum prim ento, e quando fossem plenam ente cum pridas, diz ele, então virá a compunção da mão do povo santo. O anjo novam ente proclam a com o a Igre ja de D eus seria oprim ida por muitas calam idades; e assim a tota lidade deste versículo contém um a exortação à paciência, com vistas a im pedir que os fiéis caíssem totalm ente em desespero e perder com pletam ente seu alento, em decorrência de o m esm o enfrentar severas e múltiplas preocupações, não m eram ente por uns poucos m eses, mas por um a duração m uito extensa. Ele usa esta frase: a exaustão da m ão do povo santo - caso o leitor queira ler assim - metaforicamente, significando que o povo santo seria privado da força, justam ente com o se suas mãos pendessem com pletamente pelo cansaço. Qualquer agilidade que os homens pos suam, ela se revela geralmente nas mãos, e estas foram dadas por D eus aos homens com um propósito especial de estenderem-se a todas as partes do corpo e para executarem as operações ordinárias do gênero humano. Esta m etáfora é agora bem adequada, quando o povo se via tão mutilado ao ponto de ser privado de toda energia e vigor. Esta é um a ligeira visão do significado d a sentença. Se lerm os ‘dispersão’, segundo a significação com um , ela se adequará m uito bem, visto que a m ão do povo santo seria disper sada; ou, seja, a Igreja seria algo estranho no m undo, e seria dis persa por toda parte dele. Isso se cum priu continuam ente desde aquele tem po até agora. Quão triste é a dispersão da Igreja em 4 53 [12.8] OANIEL nossos dias! N a verdade D eus a defende com seu poder, mas isso está além da expectativa humana. Pois de que form a o corpo da Igreja se nos apresenta agora? De que form a ela tem se m anifes tado através de todas as eras? Seguram ente, sem pre se apresenta rasgada em pedaços e dispersa. D aí a predição do anjo não ser para proveito, se adotarmos a interpretação: a m ão do povo santo seria dispersa; porém no fim ela seria próspera, com o ele previa m ente anunciara ao tratar de sua ressurreição e salvação final. Vamos em frente: 8 E u ouvi. porém não eniendi. E ntão e u disse: O h . m eu Senhor, qual será o fim dessas coisas? 8 E t ego audivi, e t non intellexi: e t dixi, D om ini m i, quod postrem um h o ru m ? 1“ A gora Daniel com eça a form ular perguntas em concordância com o exem plo do anjo. Prim eiram ente ele ouviu um anjo inqui rindo do outro [anjo]; em seguida reuniu coragem e quis receber inform ação, e pergunta qual seria o fim ou resultado. D iz ele: E u ouvi, p o ré m n ã o entendi. Pelo verbo ‘ouvir’ ele testifica a au sência de ignorância, de indolência ou de m enosprezo. M uitos divergem sem qualquer percepção de um tema, em bora ele seja m uito bem explicado, porquanto não atentam para ele. Aqui, po rém , o profeta assevera que ouviu; significando que seria culpa de sua diligência se não entendia, porque estava desejoso de apren der e tinha exercitado todas suas faculdades, com o anteriorm ente sugerim os, e contudo confessa não haver entendido. Daniel não pretende confessar total obtusidade, porém restringe sua igno rância ao tem a de sua interrogação. Do que D aniel era ignorante? D o resultado final. Ele não podia atentar para o significado d es sas predições, as quais lhe soavam extrem am ente obscuras, e isso dem andava sua plena e total com preensão. É m uito evidente que D eus nunca enuncia sua palavra sem esperar fruto; com o diz Isaias: “N ão falei em segredo, nem em algum lugar escuro da terra; Isto é. que fim essas coisas terão? 454 6 6 * EX P O SIÇ Ã O [12.9) não disse à descendência de Jacó: Buscai-m e em vão” [Is 45.19]. D eus não queria deixar seu profeta nessa perplexidade de ouvir sem entender, porém estam os cientes dos graus distintos de pro ficiência na escola de Deus. Além disso, a revelação suficiente era notoriam ente conferida aos profetas para o cum prim ento de seu ofício, e contudo nenhum deles nunca entendeu perfeitam en te as predições que enunciavam . Também sabem os o que Pedro diz: “ Aos quais foi revelado que, não para si mesm os, m as para nós, eles m inistravam essas coisas que agora vos foram anuncia das por aqueles que, pelo Espírito Santo enviado do céu, vos pre garam o evangelho” [IP e 1.12]. Essas coisas de form a algum a foram inúteis para sua própria época, m as quando nossa época é com parada com a deles, certam ente a instrução e disciplina dos profetas nos são mais úteis e produzem frutos m ais ricos e mais sazonados em nossa época do que na deles. N ão nos deve surpre ender, pois, que D aniel confesse não entender, se restringirm os as palavras a este caso único. Vamos em frente: 9 E ele disse: S egue leu c am inho, D aniel; pois as palavras estão encerradas e sela- 9 E t d ix il, Vade D aniel, q u ia clau si sunt, e t o bsignati serm ones ad tem pus fin is,196 das até o tem po d o fim. A inda que D aniel não fosse induzido por algum a tola curiosi dade a inquirir do anjo o resultado desses acontecim entos m ara vilhosos, todavia seu pedido não é atendido. D eus queria que algum as de suas predições fossem parcialm ente entendidas e o resto perm anecesse velado até que chegasse o período pleno da revelação com pleta. Eis a razão por que o anjo não respondeu a Daniel. De fato o desejo era pio, com o previam ente já afirm a mos, não contendo nada de ilícito; D eus, porém , sabendo o que lhe era bom, não atende seu pedido. Ele é dissuadido pelo anjo: p o rq u e as p a la v ra s estav am e n c e rra d a s e seiadas. O anjo usa esta expressão em um sentido diferente do anterior. Pois ele o r Isto é, o tem po prefixado, com o o explicam os anteriormente. 455 [12.10] D A N IE L denou que Daniel encerrasse e selasse as palavras com o precio sos tesouros, visto que seriam estim adas em nada por m uitos in crédulos e por quase todo o povo. Aqui, pois, ele diz: as palavras fo ra m encerradas e seladas, visto que não havia um a ocasião oportuna para revelá-las. É com o se ele dissesse: nada foi predito vã ou precipitadam ente, m as o pleno esplendor da luz ainda não foi projetado sobre a predição: daí term os que esperar até que a própria verdade seja provada pelo acontecim ento, e assim a divi na proclam ação do anjo se faça m anifesta. Esse é o sumário. Ele, pois, diz: até o tem p o d o fim . É possível que alguém objete: então, com que propósito esta predição foi enunciada? Pois se D aniel pessoalm ente, sendo instruído pelo anjo, não pôde com preender plenam ente sua própria mensagem, o que dizer do res tante dos fiéis, ainda que versados nesses estudos proféticos, não se sentiriam m ergulhados num labirinto aqui? A resposta está em mãos: até o tempo d o fim \ e devem os tam bém recordar que nem Daniel e nem o restante dos Fiéis estava privado de todos os be nefícios desta profecia, porque D eus lhes explicara tudo quanto lhes era suficiente para as necessidades de sua própria época. Temos que passar por alguns pontos ligeiram ente com vistas a encerrar a preleção de hoje. Segue: 10 M uitos serão purificados e em branquec id o s e provados; m as o s ím pios con tin u a r lo agindo im piam ente; e nenhum d o s ím pios entenderá; os sábios, porém , entenderão. 10 M undabuntur, e t dealbabuntur, e t fund entur m ulti, e t im p ie se gerent im pii; et non in telü g en t o m nes im pii, e t p rudentes inteJligent. O anjo novam ente m enciona as perseguições que estavam próxim as com o propósito de arm ar os fiéis para os conflitos já à vista. Sabem os de outras fontes quão tenras e frágeis são nossas m entes naturalm ente, pois tão logo surja algum a causa para te m ores, antes mesmo de soprar os ventos, desm aiam os em desa lento ante o terror. Portanto, com o nossa natural im becilidade é por dem ais arraigada, necessariam ente dem andam os m uitos esti m ulantes à paciência e se nos dem anda contender com ardor a 456 6 6 * EX P O SIÇ Ã O [12.10] jam ais nos entregarm os a qualquer tentação. Eis a razão por que o anjo anuncia a necessidade dessas m últiplas purificações: limpá-los, com o o trigo da palha; em branquecê-los, com o a roupa bem alvejada; e fund i-lo s, com o o metal que é separado d a escó ria. Em prim eiro lugar, com o já expliquei previam ente, ele ad m oesta a Daniel e a todos os santos quanto ao estado futuro da Igreja, a fim de levá-los a se prepararem e a se cingirem para a batalha, bem com o a reunir sua invencível resistência, visto que a condição de vida posta ante seus olhos é a de forçar passagem pelo m eio das dificuldades. Este é um ponto. O anjo novam ente m ostra a utilidade prática desse tipo de vida, o que de outra for m a poderia parecer am arga dem ais. N aturalm ente recusam os a cruz só porque sentim os ser a m esm a contrária a nossa disposi ção, enquanto D eus m ostra aos santos que nada pode ser-lhes mais proveitoso do que um a variedade de aflições. Este é o se gundo ponto. M as as aflições, por si sós, poderiam consum irnos, e daí sermos lançados num a fom alha. Com o, pois, podería mos esperar que tais sofrim entos prom overiam nossa salvação, a não ser que D eus m udasse sua natureza de algum a m aneira m a ravilhosa, com o se sua tendência natural fosse efetuar nossa des truição? M as enquanto somos derretidos e em branquecidos e p u rificados, percebem os com o D eus leva em conta nosso bem -estar, pressionando-nos com sua cruz e fazendo-nos subm eter à ad versidade. Agora, em terceiro lugar, o anjo m ostra a insuficiência de um único ato de purificação e nossa necessidade de muitos outros. Este é o objetivo desse num eroso acúm ulo de palavras: serão purificados, em branquecidos e derretidos ou descarrega dos. Ele poderia ter abrangido toda a idéia num a única palavra; mas, com o ao longo de toda nossa vida D eus nunca cessa de testar-nos de várias m aneiras, o anjo acum ula estas três palavras para m ostrar aos fiéis sua necessidade de purificação contínua enquanto viverem vestidos de carne; justam ente com o as vestes que são diariam ente usadas necessitam de lavagem contínua. Por 457 [12.10] D AN IEL m ais alvejada seja um a cam isa, ela se torna im ediatam ente suja quando usada apenas por um dia; dem andando constante lava gem para a restauração de sua pureza original. A ssim som os pos tos em contato com as máculas do pecado; e enquanto formos peregrinos neste mundo, inevitavelm ente nos tornam os sujeitos a constante contam inação. E com o os fiéis tam bém são infecta dos com o contágio de num erosas iniqüidades, dem andam puri ficações diárias de diferentes maneiras. D evem os, pois, diligen tem ente observar estes três processos distintos. Em seguida o anjo acrescenta; O s ím pios a g irã o im p ia m e n te, e ja m a is e n te n d e rã o algo; m a s os p ru d e n te s s e rã o se m p re d o ta d o s com inteligência. Aqui ele deseja fortificar os santos contra as pedras de tropeço em seu cam inho, quando percebem os profanos desprezadores de D eus exultando em cada direção e desafiando a D eus em sua face. Q uando os fiéis vêem o mundo tão saturado de ímpios, é com o se eles se entregassem tão livre mente à luxúria, com o se não existisse D eus no céu. D aí serem eles [os santos] naturalm ente dom inados por graves tristezas e angústias. Para evitar que tal provação agite assim sua m ente, o anjo anuncia que os ímpios se conduzirão im piam ente; im plican do que não há razão por que tu, ó Daniel, ou os dem ais justos, dependam do exem plo de outros; Satanás astutam ente porá dian te de ti todos e quaisquer oráculos com o fim de arrastar-te ao desprezo de Deus e ao abism o de im piedade, a menos que sejas em extrem o cauteloso; mas que a conduta dos ímpios não leve a ti e ao resto dos santos a tropeçarem. Seja qual for sua conduta, tu deves perm anecer invencível. Em seguida ele assinala a razão para a conduta deles: n a d a en ten d em ; são perfeitam ente cegos. M as, qual é a fonte de tal cegueira? Em ser eles dom inados por um senso réprobo. Se al guém visse um cego cair, e im itasse a esse cego, tal pessoa seria justificada? Seguram ente, sua cegueira seria a causa de o m esm o perecer tão m iseravelm ente; por que, pois, a outra p esso a se 458 6 6 a EX P O SIÇ Ã O [12.11, 12] destruiria voluntariam ente? Sem pre que virm os o ím pio se preci pitando furiosam ente em sua destruição, enquanto Deus o adm o esta de que sua cegueira procede de Satanás, e que cure sua m en te réproba, não seríamos duplamente dem entes se voluntariamente o seguíssem os? A causa, pois, desse ím pio com portam ento por parte dos ím pios é adicionada com boa razão; isto é, nada enten dem. Entrem entes, os fiéis são lembrados do genuíno rem édio, e o anjo acrescenta; M as os p ru d e n te s en te n d e rã o ; ou, seja, não perm itirão que sejam envolvidos nos erros daqueles aq u em vêem inteiram ente devotados a sua própria destruição. Finalm ente, o anjo nos aponta o verdadeiro rem édio que obliterará Satanás de arrastar-nos para a im piedade, bem com o os ímpios de infectarnos com seus maus exem plos, se energicam ente nos aplicarmos a seguir a doutrina celestial. Se, pois, sinceram ente desejarm os ser instruídos por D eus e nos converterm os em genuínos discípu los, a instrução que derivarm os dele nos arrebatará da destruição. Este é o verdadeiro sentido d a passagem. A gora vam os em frente: U E d e sd e o tem po em q u e o sacrifício d iário fo r tirad o , e p o sta a abom inação desoladora, h averá m il duzentos e noventa djas 12 B em -av en tu rad o o q u e e sp e ra e c hega até m il trezen to s e trin ta e cin co dias. 11 E t a tem p o re quo ab latu m fu erit juge, nempe sacrificium , e t p o sita fu erit abom in a tio o b stu p e fa c ie n s,l,, eru n t d ies roille d u c en ti e t n onaginta. 12 B eatus qui e x p erctav erit, e t attigerrit usq u e a d dies m ille trecen to s et triginta quinque. Em decorrência da obscuridade desta passagem , a m esm a tem sido torcida de várias form as. N o fim do capítulo 9 mostrei a im possibilidade de a m esm a referir-se à profanação do templo que ocorreu sob a tirania de Antíoco; nessa ocasião, o anjo testi ficou que a destruição do tem plo seria tão com pleta que não fica ria lugar para a esperança de o m esm o ser reparado ou restaura do. Então as circunstâncias do tem po nos convencem disto. Pois então ele disse: Cristo confirm ará a aliança com m uitos por um a 1,7 Traduzim os a frase assim antes; alguns traduzem assim : “da desolação” . A p ilavra significa “ser desolado” , m as o outro sentido se adequa m elhor aqui. 459 [12.11, 12J DANIEL sem ana, e fará cessar os sacrifícios e as abluções. D epois será acrescentada a abom inação que causa perplexidade, e a deso lação ou estupor, e então a m orte destilará, diz ele, sobre aquele que ficar perplexo e aturdido. O anjo, pois, ali trata d a devasta ção perpétua do templo. Então nesta passagem , sem dúvida, ele trata do período após a destruição do tem plo; não poderia haver esperança de restauração, visto que a lei com todas suas cerim ô nias chegariam então a seu término. Com isto em vista, Cristo cita esta passagem em M ateus 24, onde adm oesta seus ouvintes a diligentem ente atendê-la. A quele que lê entenda, diz ele. Já de claram os que esta profecia é obscura, e por isso ela requer um grau m uito elevado da m ais estrita atenção. Em prim eiro lugar, devem os reter este ponto: o tem po que o anjo agora trata com eça na últim a destruição do tem plo. A quela devastação aconteceu assim que o evangelho com eçou a ser prom ulgado. D eus, pois, tom ou seu tem plo desolado, porque ele fora fundado p o r algum tem po, e era um a m era sombra, até que os judeus violassem todo o pacto de form a tão com pleta, que nenhum a santidade perm ane ceria no tem plo, na nação e na própria terra. A lguns restringem isso àqueles estandartes que Tibério erigiu no pináculo m ais alto do tem plo; e outros, à estátua de Calígula; quanto a m im , porém, já declarei meu ponto de vista sobre essas opiniões, de que são forçadas demais. Não hesito em ligar esta linguagem do anjo àque la profanação do tem plo que ocorreu depois da m anifestação de Cristo, quando os sacrifícios cessaram e as som bras da lei foram abolidas. Portanto, desde o tempo em que o sacrifício realmente cessou de ser oferecido. E sta é um a referência ao período em que Cristo, com seu advento, aboliria as som bras da lei, fazendo as sim toda a oferenda de sacrifícios a D eus totalm ente sem valor. Portanto, desde o tempo. Em seguida, desde o tempo em que a assustadora abom inação f o r estabelecida. A ira divina seguiu à profanação do templo. Os judeus jam ais anteciparam a cessação final de suas cerim ônias, e sem pre se vangloriaram em seu pecu4 60 6 6* EX P O SIÇ Ã O {12.11, 12) liar culto externo, e a não ser que D eus dem onstrasse publica m ente, diante de seus olhos, eles jam ais teriam renunciado a seus sacrifícios e ritos com o meras representações um brosas. D aí Je rusalém e seu tem plo serem expostos à vingança dos gentios. Portanto, esse era o estabelecim ento dessa abom inação assusta dora; era um claro testem unho d a ira de D eus que exorta os ju deus em sua confusão a não m ais se jactarem de seu tem plo e sua santidade. Portanto, desde aquele período haveria 1290 dias. Esses dias perfazem três anos e meio. N ão hesito em entender o anjo falando em term os metafóricos. Visto que ele anteriorm ente ex pressara um ano, ou dois anos, e a metade de um ano, por uma longa duração de tem po e um feliz resultado, então agora expres sa 1290 dias. E por qual razão? Para m ostrar-nos o que deve acontecer quando as ansiedades e trabalhos nos oprim irem . Se um hom em caísse doente, ele não diria: Eis que já passou um mês, porém tenho diante de m im ainda um ano - ele não dirá: Eis que já passaram três dias, porém agora me enfraqueço m iseravel m ente por trinta ou sessenta dias. O anjo, pois, propositadam ente põe dias em lugar de anos, im plicando isto: em bora esse tempo pudesse parecer incom ensuravelm ente prolongado, e pudesse assustar-nos com sua duração, e prostrar com pletam ente os ânimos dos santos, todavia chegarão ao fim. O núm ero de dias, pois, é de 1290, contudo não h á razão para os filhos de D eus se desespera rem em conseqüência desse núm ero, porque deverão sem pre lem brar desse princípio: se todas as aflições nos aguardam por um tem po e tem pos, a metade de um tem po virá em seguida. Então acrescenta: Feliz é aquele que tiver esperado e su portado até os 1335 dias. N ão me disponho a dedicar-m e a cál culos num éricos, e os que explicam esta passagem usando de extrem a sutileza apenas se divertem com suas próprias especula ções e prejudicam a autoridade da profecia. A lguns pensam que os dias devem ser tom ados por anos, e fazem com que o número 461 [12.13] D A N IE L 1260 sejam anos. O tem po que passou desde esta profecia até o advento de Cristo foi cerca de 600 anos. D esde esse advento, já passaram 2000 anos, e crêem que este é o período assinalada até o fim do mundo, visto que a lei tam bém vigorou cerca de 2000 anos desde a data de sua prom ulgação até seu cum prim ento no advento de Cristo. D aí se fixam nesse sentido. M as estão com pletam ente errados ao separar os 1290 dias dos 1335, pois clara mente se referem ao mesmo período, com ligeira exceção. É com o se o anjo tivesse dito: em bora m etade do tem po fosse prorroga da, todavia os fiéis devem constantem ente persistir na esperança do livramento. Pois ele acrescenta cerca de dois meses, ou um m ês e meio, ou mais ou menos isso. P or m etade de um tempo, já dissem os, o resultado foi realçado, com o Cristo nos inform a em M ateus 24.22. A menos que esses dias fossem abreviados, ne nhum a carne seria salva. A referência aqui é claram ente àquela abreviação do tem po por causa da Igreja. M as o anjo então acres centa quarenta e cinco dias, os quais perfazem um m ês e meio, im plicando que Deus protelará o livram ento de sua Igreja além de seis meses, e contudo é preciso ser forte e de bom ânim o e perseverarem vigilância. Deus por fim não nos d e sa p o n ta rá -e le nos socorrerá em todos nossos ais e nos receberá em seu bendito descanso. Daí, a próxim a sentença da profecia é esta: 13 T u , porém , segue teu cam in h o até o fira; porque descansarás e te levantarás em Lua so rte [herança] n o fim d os dias. 13 E t tu vade a d fin em , e t q u iesces, e t stabis in so rte tua ad finem dierum . Aqui o anjo reitera o que já havia dito antes, a saber: o tem po com pleto da luz perfeita ainda não chegara, porque D eus deseja va conservar a mente de seu povo em suspenso até a m anifesta ção de Cristo. O anjo, pois, despede o profeta, e ao m andá-lo em bora diz: Contenta-te com tua sorte [herança], porque Deus deseja protelar a manifestação com pleta desta profecia para ou tro tempo, o qual ele m esm o sabe ser o tem po oportuno. Em se guida acrescenta: E tu d e sc a n sa rá s e te le v a n ta rá s. O utros o 462 66* EX P O SIÇ Ã O [ 12 . 13] traduzem assim: descansa e levanta-te; m as não m e parece que o anjo esteja ordenando o que deseja fosse feito, m as anuncia acon tecim entos futuros, com o se quisesse dizer: Tu descansarás, ou, seja, tu m orrerás e então te levantarás; ou, seja, tua m orte não será destruição com pleta. Pois Deus fará com que te levantes em tua sorte [herança] com os dem ais eleitos; e que também, no fin a l dos dias, em tua sorte; isto é, depois que Deus tiver provado suficientem ente a paciência de seu povo, e por longas e num ero sas lutas, sim , lutas infindas, tem hum ilhado sua Igreja e a purifi cado, enquanto não chegar o fim. Naquele período final tu te le vantarás em tua própria herança, em bora um tem po de repouso deva necessariam ente intervir. ORAÇÃO D e u s T o d o -P o d ero so , v isto q u e n ã o n o s p r o p u s e s te n e n h u m o u tro fi m a lé m d a q u e le d e c o n sta n te luta , d u ra n te to d a n o ssa vida, e n o s su b m eteste a m u ita s p re o c u p a ç õ e s a té q u e a lc a n ç á sse m o s o a lv o d esta c o rr id a tem p o ra l, o ra m o s p a r a q u e ja m a is n o s s in ta m o s d e s fa le c i d o s. F a z-n o s se m p re a r m a d o s e e q u ip a d o s p a r a a b a ta lh a , e se ja m q u a is fo r e m a s p ro v a ç õ e s c o m q u e n o s p ro ves, q u e ja m a is se ja m o s a c h a d o s d efic ie n te s. Q u e a sp ire m o s se m p re o c é u n a c o m p a n h ia d a s a lm a s ju s ta s , e n o s e sfo rc e m o s co m to d o n o ss o e m p e n h o p o r a lc a n ç a r a q u e le b e n d ito d e sc a n s o q u e e s tá p re p a r a d o p a r a n ó s n o céu, em J e s u s C risto n o sso Senhor. A m ém . JZ o iw a èo saf a < ^ È íeusí 463 ín d ic e de referências 9(9ficas G ê n e sis 2 R e is 110.1 ( 5 4 ) 6 .3 ( 2 4 3 ) 6 .1 7 ( 3 1 4 ) 1 1 9 .1 0 3 (1 7 5 ) 9 . 6 (2 4 ) 2 0 .5 (2 4 4 ) 1 1 9 .1 0 5 ( 1 7 9 ) 1 1 9 .2 4 ( 1 7 5 ) 1 4 .2 2 ( 4 5 2 ) 4 9 .1 0 (2 4 5 ) 2 C rô n ic a s 1 1 9 .7 2 ( 1 7 5 ) 14.11 (3 0 1 ) 1 2 9 .1 -3 (4 3 8 ) 1 3 0 .4 ( 1 8 8 ) 1 3 2 .1 4 ( 1 6 7 .2 7 1 ,3 4 9 ) Ê xo d o 2 5 .4 0 (2 6 9 ) E sd ra s 3 4 .6 (1 8 8 ) 1.1 (2 3 6 ) L e v ític o N e e m ia s 1 1 .4 5 (2 0 8 ) 4 .1 7 (2 6 1 ) 1 4 5 .1 9 ( 2 3 0 , 2 9 7 ) Isa ía s I .6 ( 1 9 9 ) 8 .1 6 (4 4 6 ) 2 5 .8 ( 2 3 4 ) 2 6 (1 9 4 ) 2 6 .2 7 . 2 8 ( 2 0 4 ) 9 .6 (1 2 6 ) S a lm o s 9 .1 3 (2 0 4 ) 9 .7 (3 8 ) 1 0 .1 2 (4 0 7 ) 13.1 (3 8 ) D e u te ro n ô m io 1 0 .1 2 (1 7 5 ) • 2 8 (1 9 4 ) j 1 0 .2 2 (3 8 8 ) 3 2 .6 ( 2 1 7 ) I I .1 3 4 .7 (3 1 4 ) 3 4 .8 (3 0 0 ) 4 3 .3 (8 6 ) 4 5 .1 9 (4 5 5 ) 3 6 .6 (1 7 4 ) J u iz e s 6 5 .2 ( 2 2 0 ) 8 .3 (1 3 3 ) 6 8 .8 (3 9 ) (8 9 ) 1 3 .1 7 ( 1 6 ) 5 2 .1 0 (1 1 4 ) 5 2 .1 2 (1 1 4 , 2 7 7 ) 7 3 .1 ( 3 8 4 ) 1 Sam uel 7 4 .9 (3 0 2 ) 1 4 .6 (3 0 1 ) 7 6 .2 ( 4 3 ) 6 0 .6 (1 1 4 ) 6 0 .1 2 (9 1 ) 9 1 .1 1 (3 1 4 ) J e re m ia s 2 Sam uel 9 5 - 1 0 0 (4 0 ) 1 .2 6 ( 4 1 3 ) 1 0 2 .2 2 (9 1 ) 1 .1 0 (1 8 2 ) 1 0 4 .3 2 ( 3 0 7 ) 2 5 .1 1 ( 2 2 8 , 2 3 0 ) 5 .2 ( 2 4 4 ) 4 65 DANIEL 2 5 .2 9 (4 0 7 ) 3 J .3 1 , 3 2 (2 6 6 ) 4 .7 (1 2 1 ) 2 .2 0 ( 2 5 2 ) 4 .1 9 - 2 3 (3 7 7 ) 1 0 .2 8 , 2 9 (4 3 6 ) 4 .2 7 ( 3 7 8 ) 1 4 .2 8 (5 0 ) L a m e n ta ç õ e s 4 .3 5 - 3 7 (3 7 8 ) 1 6 .7 (5 0 ) 3 .3 8 (2 0 4 ) 5 .2 (3 7 3 ) 1 6 .3 3 (4 3 9 ) 5 .9 (3 7 8 ) E z e q u ie l 1 7 .1 9 ( 2 5 9 ) 6 .2 (1 2 4 ) 1 9 .3 6 (9 0 ) 1 0 .1 8 ( 2 7 1 ) 1 1 .1 9 (2 6 6 ) M a te u s A to s 1 3 .9 ( 4 4 0 ) 6 .1 2 (2 2 5 ) 9 .7 ( 2 8 9 ) 1 4 .1 4 ( 1 6 4 , 2 2 4 ) 10.5 (2 6 8 ) D a n ie l 11 .1 3 ( 2 4 0 . 2 5 9 ) 7 .1 3 ( 1 3 2 ) 17.21 (2 8 3 ) 11.11 ( 2 4 0 ) 6 .1 0 (1 6 7 ) Rom anos I .5 (2 2 9 ) 3 .4 (1 8 3 ) 1 8 .2 0 ( 1 8 1 ) 3 .2 6 (1 8 3 ) 2 3 .8 . 1 0 ( 5 4 ) 4 .1 1 ( 2 5 7 ) H abacuque 2 4 .3 (4 3 7 ) 4 .1 3 (6 1 ) 2 .3 (2 7 6 ) 2 4 .6 (8 2 ) 4 .2 5 ( 2 5 7 ) A g eu 2 4 .3 6 2 .9 ( 2 7 7 ) 2 6 .5 3 ( 4 2 , 3 1 4 ) 3 .8 ( 1 4 0 ) 2 8 .1 8 (5 2 , 54) 2 4 .2 2 ( 4 6 2 ) (4 5 0 ) 5 .1 9 ( 2 6 8 ) 6 .1 0 (5 0 ) 8 .1 5 (2 5 6 ) 8 .2 3 , 2 4 ( 4 4 2 ) 8 .2 8 ( 1 5 4 ) Z a c a ria s M a rc o s 8 .2 9 ( 4 3 8 ) 1 .1 2 ( 2 3 6 ) 1 3 .7 (8 2 ) I I . 2 9 (2 1 7 ) 1 2 .1 2 ( 1 6 2 ) M a ta q u ia s Lucas 1.3 ( 4 2 7 ) 1 .1 9 ( 1 3 4 ) 1 .1 2 ( 1 4 0 ) 1 .2 6 ( 1 3 4 ) 1 .9 ( 1 7 3 ) 4 .2 ( 4 3 ) 1.77 ( 2 5 5 ) 4 .1 3 (1 1 7 ) 1 C o rtn tio s 7 .2 8 ( 2 4 0 ) 8 .6 IM a c a b e u s 11.4 (2 2 5 ) 1 0.11 (1 5 3 , 2 5 9 ) 1 (3 9 7 ) 1 6 .1 6 ( 2 4 0 , 2 5 9 ) 1 0 .1 3 2.1 ( 3 9 4 ) 18.1 (1 6 2 ) 1 4 .2 5 ( 1 3 6 ) 8, 1 4 ( 4 0 2 ) 1 8 .1 3 (3 0 7 ) (1 7 3 . 3 9 9 ) (2 1 9 ) 2 1 .9 (8 2 ) 2 C o rín tio s 1 .5 7 ( 1 2 4 ) João 9 .7 (1 7 5 ) 3.1 (3 7 7 ) 1 .1 4 ( 5 0 ) 1 1 .1 4 (1 8 1 ,3 0 5 ) 2 M acabeus 1 .2 0 ( 2 5 8 ) 466 ÍN D IC E D E R E F E R Ê N C IA S B ÍB LIC A S T iago Gálatas 1 T e ssa lo n ic e n ses 4 .3 (1 6 2 ) 3 .3 (1 5 4 ) 4 .4 (4 9 , 2 5 9 ) 5 .7 ( 1 6 2 ) 5 .1 9 , 2 0 ( 4 4 5 ) 2 T essa lo n ice n se s / P ed ro 1 .6 ,7 ( 2 9 7 ) 4 . 6 (2 5 6 ) E fésio s 1 .1 2 ( 4 5 5 ) 3 .3 (1 7 3 ) 4 .1 7 ( 4 0 7 ) 1.21 ( 5 2 ) 2 .7 ( 5 2 ) í T im ó teo 3 .1 0 (1 2 6 , 45 0 ) 2 4 .8 (3 9 ) 2 .4 (9 3 ) 3 .1 6 ( 1 3 3 ,4 5 0 ) F ilip e n se s H e b reu s I João 2 .7 ( 4 9 , 5 0 , 5 2 ) 1.1 (2 4 0 , 2 5 9 ) 3 .2 (4 0 ) 1.2 ( 6 1 ) 5 .1 4 ( 2 9 6 ) P ed ro 2 .1 ( 1 5 3 ) C o lo ssen ses I .3 (4 0 ) 2 .9 ( 2 5 9 ) 8 .5 (2 6 9 ) A p o c a lip se 3 .3 (4 4 1 ) 10.1 ( 2 5 8 ) 1 3 .5 (8 1 ) I I . 6 (2 9 6 ) 12.1 ( 3 8 3 ) 4 67 Jhidice de j)a(avras hebraicas H TIDIK (4 7 ) T I N (1 3 0 ) X IX (1 6 9 ) *?3N (2 8 8 ) 'JN ( 3 3 6 ) H E IN (4 4 2 ) H3HK ( 1 6 7 ) '3 1 N (2 1 5 ) 3 n n (336) y n n (99) rm n ( n i ) -|on (173) Nun (177, 224, 257) •UNUn (177) onn (232) i n n (237) p a n (285) n o m (354) □ (4 8 ) 17ÜD3 ( 1 2 1 ) ’m'3(158) n-na (173) 0H 3 (2 8 6 ) *]V' (222) 1 ' (283) - im r (309) n n ' (366) n m '3 n (îoo) r o i N i (4 7 ) î y a t (4 7 ) m (3 0 8 ) D iy iü ( 1 3 9 , 375) DüffiG (271) HN1Ü (275) D 'IÜ 'D (334) D 'tyD (403) 3 m 3(4i) pra(i9i) n x i m (265) T1M (422) V}3 (244) 0 0*70(187) 5 D J (3 3 8 ) 1 ^ 7 (77) p p -n y 1? (136) D 3 (4 8 ) 'D (189) (270) hVd (273) o r o (285) D'3mD(118) V?CD(130) y r » (47) Dy (48) •pjv'py (60) *py (222) V o y (313) *? (360) -Qy (359) H 3 T b (64) “IDy (443) 469 D A N IE L D 'Q lïy (149) 3 '3m*?D(126) K^D (126) D 'r i D (346) P D (346) niN^D (451) S N 3 S (!2 0 ) PIS (260) K2X (276) W D'1U;(n8) P Q '-Iü "l© (1 5 2 ) nU1DU?(194) yi3ti?(194) ip © (203) niDQîI? (265) Dtttt! (27 t) nPW (422) y p (136, 137) 1 1 (1 5 1 ) 1'I21 (37) □11 (38) n i (79) n '2 - |( l 5 0 , 268) UttH (177, 382) 470 n m i n (190) UTUnn (285) Jln d ice de autores sacros e profanos P ro fa n o s S acro s A g o s tin h o , a d v . P e la g ., ( 2 2 4 , 2 4 6 ) J e r ô n im o ( 2 4 6 ) O r íg e n e s ( 2 4 6 ) T e r tu lia n o ( 2 4 6 ,4 9 ) I r in e u ( 4 9 ) O v íd io , T r a g é d ia (3 1 6 ) P o lib io , lib . v. ( 3 4 0 ) T e r e n c e , A n d r ia (1 9 3 ) C íc e r o , p r o F l a c u s (4 0 4 ) P lu ta r c o ( 4 1 2 ) L u te r o ( 1 4 1 ) H ip ó lito (2 4 6 ) N ic o la u d e L i r a (2 4 6 ) A p o lin á r io ( 2 4 6 , 2 4 7 ) C e c o la m p a d iu s ( 2 4 7 ) E u s é b io ( 2 4 6 ) M c ia n c th o n ( 2 4 8 , 2 4 9 ) C o n c ilia . (4 0 9 ) 471 DANIEL Decfaração de João Cafvino: A respeito de m inha doutrina, ensinei fielm ente e Deus m e deu a graça de escrever. Fiz isso de m odo m ais fiel possível e nunca corrompi uma só passagem das Escrituras, nem consciente m ente as distorci. Q uando fui tentado a requin tes, resisti à tentação e sem pre estudei a sim plici dade. N unca escrevi nada com ódio de alguém, m as sem pre coloquei fielm ente diante de m im o que julguei ser a glória de Deus. Fides REFORMATA, vol. ÍV, n° 2. p. 155. julho - dezembro de 1999. citado e traduzido pelo Rev, Hermisten Maia Pereira da Costa. ED IÇÕES \'ARAKLETOS