OMC: DESAFIOS NA QUESTÃO AGRÍCOLA
Carol Proner*
O acordo interino da OMC sobre agricultura, firmado por 147 membros no último dia 01
em Genebra, na Suíça, serve de alento para aqueles que aplicam às relações internacionais de
comércio uma análise realista com reflexão niilista. Superando 10 meses de impasse – desde as
fracassadas reuniões de Cancun em setembro de 2003 – o novo acordo determina que países
desenvolvidos eliminem subsídios agrícolas responsáveis pelas distorções de comércio. Contudo, há
que se observar atentamente os próximos passos dos governos que representam nações acostumadas
à prática do protecionismo.
Antes de ser uma violação às regras de livre comércio, o protecionismo atua como
instrumento de promoção e incentivo à economia nacional. Sua prática já era comum no século XIX
para combater os desequilíbrios da lex mercatória e, após a Segunda Guerra, passou a ser
deliberadamente utilizado por países desenvolvidos – neoprotecionismo – que, paradoxalmente,
combinavam sua aplicação ao discurso da ampla liberalização de todos os setores de comércio
(posição defendida pelos governos dos Estados Unidos e do Japão durante as Rodadas de
Negociação). Novas formas protecionistas foram desenvolvidas em especial após a Rodada de
Tóquio, com a instituição das barreiras não-tarifárias ao livre comércio.
Os países da União Européia, tradicionalmente representantes de “posições intermediárias”
no GATT/OMC, são responsáveis pela aproximação de posições e interesses neste novo Acordo.
No entanto, é a presença dos Estados Unidos dentre os cinco países que formaram o grupo de
negociação – chamados de NG5: União Européia, EUA, Brasil, Austrália e Índia – que determina o
alcance do consenso possível.
O Embaixador Celso Amorim, protagonistas do sucesso brasileiro nas negociações, está
otimista quanto ao futuro do acordo e ao gradativo desaparecimento dos subsídios à exportação
agrícola. Comemoram igualmente o diretor geral da OMC, Supachai Panitchpakdi, e os
representantes dos Estados Unidos, Robert Zoellick, e da União Européia, Pascal Lamy.
Não obstante o otimismo necessário para conduzir a política externa de um país, não se
deve perder de vista a percepção da real importância e abrangência deste compromisso no contexto
das demais negociações da OMC. O Acordo final não incluiu os prazos e as taxas de redução
previstas no pré-acordo (redução imediata de 20% dos subsídios agrícolas no prazo de um ano a
partir da implementação do acordo). Além disso, a redação final incluiu, como contrapartida dos
países em desenvolvimento, o compromisso de liberalização dos setores de serviço e produtos
industriais. Na França, o Acordo foi recebido com ceticismo e a hostilidade pelos agricultores e
sindicatos. Nos Estados Unidos e nos demais países desenvolvidos não será diferente.
Para os países em desenvolvimento, o final da Rodada de Doha trará ao menos dois grandes
desafios: buscar a materialização das metas, atualmente vagas e imprecisas, para o setor agrícola e,
ao mesmo tempo, promover uma liberalização cautelosa e baseada em princípios de reciprocidade
nos demais temas comerciais.
* Professora de direitos humanos e relações internacionais da UNIBRASIL. Pesquisadora do Centro de
Estudos Estratégicos Sul-Americano – CEESA. [email protected]
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