Cecília Zylberstajn
Psicóloga e Psicodramatista | CRP 06/65279
MENDIGOS DO AMOR
Cecília Zylberstajn*
Encontrar uma pessoa especial, amar e ser amado, viver uma relação plena. Este é o
sonho da maioria das pessoas. De fato, encontrar um parceiro para a vida é um dos nossos
maiores objetivos, e merece mesmo muita atenção e investimento. Mas será que isso é mais
importante que a nossa felicidade individual? O que significa, de fato, estar com alguém?
Por que será que existem pessoas que fazem de tudo – de tudo mesmo – só para estar com
alguém, transformando-se em mendigos do amor, recolhendo migalhas que o parceiro
deixa cair?
Algumas pessoas, quando estão sozinhas, ficam obcecadas em encontrar alguém
para chamar de seu. Criam uma ilusão de que, ao encontrar um namorado ou uma
namorada, instantaneamente seus problemas deixarão de existir. A ciência de fato já provou
que nossa química se altera quando estamos apaixonados, e a sensação de bem estar é
renovadora. Mas ela só é efetiva em uma relação recíproca, quando amamos e somos
amados de volta. Em outros casos, a química pode se alterar de modo diferente. É o que
ocorre quando ficamos “viciados” em outra pessoa e nos comportamos em relação a ela
como um drogadito se comporta com a cocaína.
Conforme a idade avança, os homens e – principalmente – as mulheres ficam
ansiosos com a idéia de ficarem sozinhos, de nunca encontrarem alguém. A pressão da
família e dos amigos é grande, mas não é pior que a pressão que vem delas mesmas. Isso
gera ansiedade, o que os deixa menos relaxados e espontâneos. Tanta energia empenhada
em encontrar um companheiro, mais atrapalha que ajuda. Não são raras as pessoas que
pensam “as minhas opções diminuem com o tempo, então tenho que ser menos exigente
para conseguir alguém”. E de menos exigente passam a aceitar ficar com qualquer um, só
para não estarem sozinhos.
E o que dizer de quem já está em uma relação, mas não é feliz? Muitas pessoas
permanecem em relações com parceiros que as fazem de gato e sapato. Os companheiros
ligam quando querem, são grossos e rudes, as brigas são constantes. Essas pessoas
reclamam dos companheiros, mas não tomam nenhuma atitude para manifestar a
insatisfação ou terminar a relação. Ficam à disposição do outro, e qualquer contato – não
importa a qualidade do mesmo – é melhor que nada. Aceitam a relação que o companheiro
impõe porque percebem que esse é o único jeito de ficar com ele.
É claro que queremos ter certeza que tentamos de tudo para a relação funcionar,
fizemos o possível e, mesmo assim, não deu certo. Caso contrário, vamos ficar com a
dúvida. Mas muitas pessoas continuam em relacionamentos frustrantes porque não querem
admitir para elas mesmas que o tempo, a energia e os sentimentos investidos foram por
água a baixo. Mas se é difícil admitir que a relação fracassou adiar o término só faz com que
ele seja mais doloroso. Equivale a postergar o luto. É como adiar a perda para evitar
enfrentar o “estar sozinho de novo”.
Rua Cardoso de Almeida, 313 cj. 61 - Perdizes, São Paulo/SP CEP 05013-000
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Cecília Zylberstajn
Psicóloga e Psicodramatista | CRP 06/65279
Qualquer que seja a situação, estar com alguém priorizando o fato de estar em uma
relação, e não a qualidade da mesma faz com que nos coloquemos em uma situação
desfavorável, mendigando amor. Na posição de quem não pode ter vontades, não deve
satisfazer seus desejos, não se permite ter aspirações. Na posição de quem tem que aceitar
qualquer migalha, senão vai morrer de fome. Qualquer coisa que venha do outro serve,
melhor que nada. Melhor que estar sozinho.
Quem está nesse tipo de relação se livrou do “problema” da solteirice, mas
arrumou um problema real. A preocupação excessiva em estar com outra pessoa cria um
problema que não deveria existir, e camufla outro.
Estar sozinho não é um problema. Quando achamos que é um problema, na
verdade procuramos a relação e o parceiro para servir de escudo que nos protege de nós
mesmos. Para muitas pessoas, estar sozinho é o contrário de estar em um relacionamento.
Ledo engano. Esta crença nos protege da cruel verdade: nós SOMOS sozinhos. A jornada
da vida é solitária; a cultura humana inventou o casamento e a vida a dois para amenizar a
solidão, para compartilharmos nossas vidas com outra pessoa. Um casal é composto de
duas pessoas diferentes que se encontram e que decidem, de maneira responsável, trilhar o
mesmo caminho.
Precisamos ser inteiros para estar em uma relação. Só podemos ser bons para o
outro quando somos bons para conosco. Precisamos gostar de nós mesmos e da nossa
companhia para esperar que o outro goste também. Viver das migalhas de amor do outro,
além de nos deixar subnutridos, nos impede de nutrir a nós mesmos. Devemos esperar ser
amados. Caso contrário, só encontraremos alguém para estar conosco por caridade.
*Cecília Zylberstajn é Psicóloga pela PUC-SP e Psicodramatista pela Sociedade de Psicodrama de São Paulo e
Pelo Instituto J. L. Moreno. Tem especialização em Psicologia Hospitalar pelo Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina da USP e participou do Seniors Educators Program no Melton Center pela Universidade
Hebraica de Jerusalém/Israel. É psicoterapeuta de Adolescentes, Adultos e Grupos
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