MINISTÉRIO DA DEFESA
EXÉRCITO BRASILEIRO
DECEx - DFA - DEPA
ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO DO EXÉRCITO E COLÉGIO MILITAR DE
SALVADOR
1º Ten Al JEAN FELIPE MENDES
A IMUNIDADE TRIBUTÁRIA E SUA APLICAÇÃO EM QUESTÕES
RELACIONADAS A BENS JURISDICIONADOS AO EXÉRCITO BRASILEIRO
Salvador
2010
1º Ten Al JEAN FELIPE MENDES
A IMUNIDADE TRIBUTÁRIA E SUA VERIFICAÇÃO EM QUESTÕES
RELACIONADAS A BENS JURISDICIONADOS AO EXÉRCITO BRASILEIRO
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à
Comissão de Avaliação de Trabalhos
Científicos da Divisão de Ensino da Escola de
Administração do Exército, como exigência
parcial para a obtenção do título de
Especialista em Aplicações Complementares
às Ciências Militares.
Orientador: Cap QCO Wladimir Estevam.
Salvador
2010
1° Ten Al JEAN FELIPE MENDES
A IMUNIDADE TRIBUTÁRIA E SUA VERIFICAÇÃO EM QUESTÕES
RELACIONADAS A BENS JURISDICIONADOS AO EXÉRCITO BRASILEIRO
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à
Comissão de Avaliação de Trabalhos
Científicos da Divisão de Ensino da Escola de
Administração do Exército, como exigência
parcial para a obtenção do título de
Especialista em Aplicações Complementares
às Ciências Militares.
Aprovado em: 03 / 11 /2010
_____________________________________________________
ADONES JOSÉ GONÇALVES PADILHA – Cap – Presidente
Escola de Administração do Exército
_________________________________________________
WLADIMIR ESTEVAM– Cap – 1º Membro
Escola de Administração do Exército
______________________________________________________________
JULIO CESAR MACEDO FELICIANO DA SILVA– 1º Ten – 2º Membro
Escola de Administração do Exército
RESUMO
A pesquisa em tela trata da análise da aplicabilidade de regras constitucionais de exoneração
tributária em determinadas situações de interesse do Exército Brasileiro. Para isso, a análise
recai sobre os Próprios Nacionais Residenciais e os Círculos Militares, em virtude de alguns
entes políticos estarem exigindo impostos sobre situações que envolvem estas duas figuras.
Diante desta problemática, o trabalho objetiva explicar boa parte das questões envolvendo a
imunidade tributária recíproca bem como da imunidade tributária das instituições de
assistência social para, então, afastar a incidência de impostos, como o Imposto Predial
Territorial Urbano (IPTU), sobre os PNRs e os Círculos Militares. Ademais, focaliza a estudo
sobre os Círculos Militares com o intuito verificar da possibilidade de enquadrá-los como
instituição de assistência social para, com isso, fazer jus a imunidade das instituições de
assistência social. Em virtude disso, a investigação se vale da pesquisa aplicada, qualitativa e
exploratória, fazendo uso de fontes bibliográficas e documentais. Além disso, parte da
hipótese de estudo com o fim de verificar a aplicabilidade das regras imunizantes fiscais em
situações que envolvem os PNRs e os Círculos Militares. O trabalho traz, a título de obtenção
de resultados e através de uma verificação aprofundada das normas de imunidade tributária e
também das que regulam o regime jurídico dos PNRs e dos Círculos Militares, que é
juridicamente possível a incidência da regra imunizante tanto no que toca a situação dos
PNRs quanto a dos Círculos Militares. Com relação a este último, não só em relação ao
imóvel sobre o qual sua estrutura está edificada, mas como também em relação a própria
instituição.
Palavras-chave: Imunidade tributária. Próprio Nacional Residencial. Círculo Militar.
Imposto Predial Territorial Urbano.
ABSTRACT
This research is about the analysis of the applicability of the constitutional laws of tax
exemption in certain situations of interest to the Brazilian Army. For that, the analysis rests on
the Army’s National Habitation and the Military Circles, and some situations involving
political entities demanding taxes over these two figures. With that in mind, this paper aims to
explain many of the issues involving the reciprocal tax immunity and the immunity from
taxation to social welfare institutions, then, rejecting the levy of property tax on the Army’s
National Habitation and Military Circles. Moreover, the study focuses on the Military Circles
in order to verify the possibility to fit them as an institution of social assistance, to then be
entitled of the tax immunity. This research draws on applied research, qualitative and
exploratory, using bibliographic and documentary sources. Furthermore, the study aims to
verify the applicability of immunizing tax rules in situations involving Army’s National
Habitation and Military Circles. The work brings by the possibility of applying the
immunizing tax rule to both the Army’s National Habitation and the Military Circles.
Regarding the Military Circle, not only in relation to the property on which the structure is
built, but also in relation to the institution itself.
Keywords: Immunity tax. Army’s National Habitation. Military Circle. Property Tax.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
PNR
Próprio Nacional Residencial
CF/88
Constituição Federal de 1988
IR
Imposto sobre a Renda
IPVA
Imposto sobre a Propriedade de Veículo Automotor
IPTU
Imposto sobre a Propriedade Territorial Urbana
CTN
Código Tributário Nacional
SPU
Secretaria do Patrimônio da União
STJ
Superior Tribunal de Justiça
STF
Superior Tribunal Federal
INFRAERO
Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 7
2 REFERENCIAL TEÓRICO .......................................................................................... 10
2.1 A COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA ............................................................................ 10
2.2 A IMUNIDADE TRIBUTÁRIA ................................................................................. 11
2.3 A IMUNIDADE RECÍPROCA ................................................................................... 14
2.5 A IMUNIDADE DAS INSTITUIÇÕES DE ASSISTÊNCIA SOCIAL ....................... 18
2.5 DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO SOB JURISDIÇÃO DO COMANDO DO EXÉRCITO
......................................................................................................................................... 21
3 REFERENCIAL METODOLÓGICO ........................................................................... 29
3.1 TIPOS DE PESQUISA ............................................................................................... 29
3.2 HIPÓTESES/QUESTÕES DE ESTUDO .................................................................... 30
3.3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ................................................................. 30
4 ANÁLISE DE DADOS E APRESENTAÇÃO DE RESULTADOS .............................. 31
4.1 A IMUNIDADE TRIBUTÁRIA E O PNR.................................................................. 31
4.2 A IMUNIDADE TRIBUTÁRIA E O CÍRCULO MILITAR ....................................... 34
5. CONCLUSÃO .............................................................................................................. 401
REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 43
7
1 INTRODUÇÃO
A Constituição Federal de 1988 prevê hipóteses em que é vedado às pessoas políticas
instituir e cobrar impostos sobre determinados fatos jurídicos constitucionalmente elegidos.
São as chamadas imunidades tributárias, verdadeiras regras de competência que
obstam as pessoas políticas de adentrar em campos não sujeitos à tributação.
Dentro da tipologia desta regra de não competência tributária existe a imunidade
recíproca, a qual proibi a União, os Estados, o Distrito Federal e os Munícipios cobrarem
impostos sobre a renda, os serviços e o patrimônio um dos outros e, ainda, a imunidade das
instituições de assistência social que veda aquelas mesmas pessoas políticas instituir impostos
sobre o patrimônio, a renda e os serviços dessas instituições nas atividades ligadas a suas
finalidades essenciais.
Sabe-se que a sociedade atual vive sob a égide de um Estado Fiscal, isto é, de um
Estado que tem como sua principal fonte de recursos os tributos. Nestes termos, é válido dizer
que a eficaz garantia dos direitos fundamentais pelo Estado está condicionada a arrecadação
tributária.
Acontece que, no afã de alcançar excelentes indíces de recolhimento fiscal, alguns
entes políticos atropelam algumas normas constantes no ordenamento jurídico brasileiro.
A primeira vista, é exatamente o que acontece aqui. Observou-se, como exemplo
daquela constatação, que alguns Municípios, na ânsia por arrecadar mais e mais, fecham os
olhos para a norma constitucional da imunidade tributária.
Diante disso, o presente trabalho tem como objetivo geral averiguar se a cobrança de
impostos sobre o patrimônio da União, especialmente os Próprios Nacionais Residenciais
(PNRs) e os imóveis cedidos aos Círculos Militares, é legítima, tendo em vista as regras
constitucionais de imunidade. Para além desta questão, o trabalho abordará o ponto atinente
aos Círculos Militares como instituição, isto é, se ele como associação sem fins lucrativos faz
jus algum tipo de exoneração fiscal. Com o fim de atingir esse objetivo geral serão estudados
os seguintes objetivos específicos: o conceito e as peculiariedades das imunidades tributárias
recíproca e da instituição de assistência social, a definição e o regime jurídico dos Próprios
Nacionais Residenciais e dos imóveis cedidos aos Círculos Militares, o regime jurídico dos
Círculos Militares, os julgados dos tribunais brasileiros que tratam de matéria semelhantes à
problemática apresentada e ainda a legislação constitucional e infraconstitucional que regula a
matéria em estudo.
8
Observa-se que a presente pesquisa se mostra importante, visto que a observação da
(in)constitucionalidade da cobrança dos tributos incidentes sobre os PNRs e sobre os imóveis
cedidos aos Círculos Militares, irá colaborar com os interesses do Exército Brasileiro em não
pagar impostos, cuja cobrança, aparentemente, é inconstitucional.
Com o fim de se alcançar com êxito todos os objetivos traçados anteriormente, o
trabalho adotará a metodologia a seguir designada. Quanto a natureza, a pesquisa será do tipo
aplicada, posto que parte de problemas práticos; já quanto aos procedimentos técnicos, adotarse-á a pesquisa documental, consistente na análise de leis e demais normas jurídicas. Será
também utilizada a pesquisa bibliográfica, através do estudo das doutrinas relacionadas a
presente pesquisa; quanto à forma de abordagem do problema, será utilizado o método
qualitativo e no que concerne ao objetivo geral o método usado será o exploratório, vez que
será feita uma análise das legislações nacionais sobre o assunto para explicitar o tema da
pesquisa.
Ainda como forma de otimizar a pesquisa, a primeira seção, da qual trata do
referencial teórico, está subdividia em seis capítulos. O primeiro capítulo discorrerá sobre a
competência tributária, como forma de introduzir o estudo das imunidades tributárias, já que
essas são tidas pela doutrina como regra de incompetência tributária.
O segundo capítulo, por sua vez, tratará das imunidades tributárias de forma genérica
apresentando seu conceito e sua finalidade dentro do ordenamento jurídico brasileiro. O
terceiro capítulo trará o estudo mais aprofundado acerca da imunidade recíproca,
demonstrando seu conceito e algumas problemáticas que giram em torno de sua aplicação. Já
o capítulo quarto, nos mesmos moldes do terceiro definirá a imunidade das instituições de
assistência social, demonstrando o que é assistência social e também qual o entedimento
doutrinário no que concerne sua aplicabilidade.
Para fechar a seção, o quinto capítulo, abordará os regimes jurídicos dos Próprios
Nacionais Residenciais e dos Círculos Militares, imprescíndiveis para a análise da aplicação
das regras constitucionais de imunidade tributária.
Na seção seguinte, serão evidenciados os aspectos metodológicos envolvidos no
trabalho, tendo em vista a descrição dos objetivos, dos tipos de pesquisas e dos procedimentos
metodológicos.
Na terceira seção, será feita a apresentação dos dados obtidos por meio da pesquisa
bibliográfica e documental. Especialmente quanto a subsunção das situações envolvendo os
PNRs e os Círculos Militares às regras de imunidade constitucional.
9
A última seção será dedicada à exposição das conclusões do trabalho, conforme à
análise feita das seções anteriores.
10
2 REFERENCIAL TEÓRICO
A seção em tela apresenta os diversos entendimentos e conceitos acerca das
imunidades tributárias, especificamente, das imunidades recíproca e das instituições de
assistência social e também o regime jurídico do patrimônio da União sob jurisdição do
Exército Brasileiro.
2.1 A COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA
A competência tributária é definida, em termos simples, como a faculdade que as
pessoas políticas, isto é, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Munícipios, têm para
criar tributos. (CARRAZA, 2010, p. 744)
Primeiramente, cumpre estabelecer que a competência tributária não se confunde
com o poder tributário. Esse último é manifestação da soberania estatal, e como tal é
originariamente ilimitado, ou seja, o Estado (em sentido amplo), como um ente soberano, tem
o dever-poder de institituir e cobrar tributos para a mantença de toda a sociedade. De acordo
com que bem explica Costa (2006, p.54), a limitação e os balizamentos a este poder vão ser
verificados no momento da definição da organização jurídica do Estado. Sendo assim, o poder
tributário em um primeiro momento ilimitado, passa a sujeitar-se as nomas definidoras do seu
exercício. Nasce então, a competência tributária, caracterizada pelo poder tributário
juridicamente limitado.
No caso brasileiro, esta limitação ocorre com a vigente Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988 que desenha um minucioso Sistema Tributário, além de
estabelecer toda organização política e jurídica do Estado brasileiro e, também, abarcar um
extenso rol de direitos fundamentais individuais e coletivos.
Aliás, a Constituição brasileira é reconhecidamente uma Constituição ímpar e única
no mundo, visto que estabeleceu não apenas a autorização para criar tributos (competência
tributária) como também, trouxe em seu texto normativo uma exaustiva regulamentação para
os limites da tributação. (FISCHER, 2008, p. 358)
Daí o porquê, se fala que o Sistema Tributário brasileiro é mais bem denominado
como um Sistema Constitucional Tributário, pois as materialidades dos tributos, ou seja, a
11
descrição dos fatos e das situações sobre os quais eles incidirão, encontram quase todas
inseridas no texto constitucional. Desta forma, sobra pouco espaço de manobra para o
legislador infra-constitucional (seja ele ordinário ou complementar), que ficará rigorosamente
adstrito aos termos constitucionais, sob pena de inequívoca inconstitucionalidade. Se se faz
esta observação quanto ao legislador, com muito mais rigor se aplica ao administrador fiscal
que, do mesmo modo, ao aplicar a legislação tributária não pode esquivar-se da Constituição
Federal.
Nota-se ainda, a partir deste panorama, o fato de ser voz comum na doutrina a
constatação de que o problema tributário no Brasil é apenas cultural e não normativo.
Segundo o entendimento de Fischer (2006, p. 358) a Constituição do Brasil além de impor
rigidamente a competência tributária, traça limites rigorosos para o exercício da tributação,
todavia, limites estes que nem sempre são respeitados e garantidos. Visto isto, é fácil a
percepção de que não se trata de ter uma Constituição com mais direitos e garantias para o
cidadão, mas sim de instituições que respeitem tais limites.
A atual Constituição Republicana brasileira é considerada como uma das mais
avançadas do mundo em termos de estabelecimento de garantias individuais, organização e
delineamento do Sistema Tributário. O problema, então, não são as normas positivadas, ou
melhor, escritas no texto supremo e sim dos intérpretes dessas regras que as aplicam conforme
seu interesse.
Observadas estas premissas concernentes a
nossa Lei Maior de 1988,
especificamente em matéria tributária, veja-se que essa além de disciplinar rigidamente a
competência tributária, previu dois grandes grupos de limitações ao poder de tributar: as
imunidades e os princípios constitucionais tributários (FISCHER, 2006, p. 358).
Por ocasião desta pesquisa, apenas o primeiro grupo será abordado, por estar
umbilicalmente ligado às questões aqui levantadas.
2.2 A IMUNIDADE TRIBUTÁRIA
A origem do termo imunidade advém de Imunitas, ou exonerado de munus, indica a
liberação de munus ou encargos, dispensa de carga, de ônus, de obrigação ou até de
penalidade. Quem não está sujeito a munus tem imunidade (munus público é aquilo que
procede de autoridade pública, ou da lei, e obriga o indivíduo a certos encargos). Sendo assim,
12
o vocábulo imunidade dá a ideia de um privilégio concedido a alguma pessoa de não ser
obrigada a determinados encargos ou ônus. (PAULSEN, 2009, p. 240)
Verificou-se que a competência tributária é traduzida pela autorização constitucional
para a criação de tributos, o que pode ser exemplificado pelo teor do art. 156, inciso I da
Constituição Federal de 1988 (CF/88), o qual autoriza os Municípios a instituir impostos
sobre a propriedade territorial urbana. Esta é uma regra positiva de competência tributária, ou
seja, legitima as pessoas políticas a criarem tributos em conformidade com a moldura
constitucional. (BRASIL, 1988)
Ocorre, todavia, que a competência tributária não é definida apenas por seu aspecto
positivo, isto é, que diz, exemplificadamente, que os Estados são competentes para instituir
tributos sobre a propriedade de veículos automotores, mas sim também pelo seu aspecto
negativo, que impõe os limites constitucionalmente estabelecidos na atividade de criação do
tributo.
Nesta esteira, é na definição da competência fiscal, em seu aspecto negativo, que se
alocam as imunidades tributárias. Deste modo, visto certas situações trazidas pela
Constituição que não são passíveis de tributação, as pessoas políticas não podem instituir e
tão pouco cobrar tributos em circunstâncias que estão acobertadas sob o manto constitucional.
Segundo Carraza (2010, p. 746)
A imunidade tributária é um fenômeno de natureza constitucional. As normas
constitucionais que, dirata ou indiretamente, tratam do assunto fixam, por assim
dizer, a incompetência das entidades tributantes para onerar, com exações, certas
pessoas, seja em função de sua natueza jurídica, seja porque coligadas a
determinados fatos, bens ou situações. Encerram limitações, postas na própria
Constituição Federal, à ação estatal de criar tributos.
Este sistema de desoneração fiscal, que delimita o campo tributário das pessoas
políticas, preconizando que não há competência para tributação, não está inserido na CF/88
por acaso, como uma simples benesse do legislador constituinte.
Ao contrário, veja-se que a Constituição Federal é norma fundamental de um Estado e
de uma sociedade. De modo que, nela constam as normas (os valores) mais importantes e os
direitos mais relevantes de uma comunidade, além de normas sobre a organização e limitação
do poder público. (FISCHER, 2006, p. 357)
A par disso, observa-se que nada adiantaria de um lado a CF/88 estabelecer o princípio
federativo de organização do Estado brasileiro, que importa na autonomia política e
13
administrativa dos Estados-membros (BRANCO; COELHO; MENDES, 2010, p. 930), se de
outro lado a mesma Constituição permitisse que a União cobrasse impostos dos Estadosmembros, ou estes dos Munícipios e vice-versa. A autonomia, anteriormente referida estaria
aniquilada.
E mais, do mesmo modo seria em vão a CF/88 prestigiar valores como a liberdade de
comunicação, a liberdade de manifestação do pensamento, a expressão da atividade
intelectual, artística, científica (previstos nos artigo 5º, incisos IV, IX, XIVe XXVII da
CF/88), se com a outra mão o texto constitucional, mais a frente, autorizasse às pessoas
políticas criar impostos sobre livros, jornais, periódicos e o papel destinado à sua impressão.
O que se quer afirmar com estas considerações, é que as imunidades, enquanto normas
de incompetência tributária, possuem uma gigantesca razão de ser. Elas impedem que alguns
dos valores mais nobres alojados na Constituição Republicana sejam maltratados pela
cobrança de tributos. Até porque, resta claro que os direitos fundamentais de liberdade de
expressão e pensamento estariam obstacularizados caso os tributos incidissem de maneira
sobrecarregada sobre os meios de veiculação da informação.
Este raciocínio encontra forte respaldo no entendimento do ministro do Supremo
Tribunal Federal, Celso de Mello, citado por Paulsen (2009, p. 241):
Não se pode desconhecer, dentro desse contexto, que as imunidades tributárias de
natureza política destinam-se a conferir efetividade a determinados direitos e
garantias fundamentais reconhecidos e assegurados às pessoas e às instituições.
Constituem, por isso mesmo, expressões significativas das garantias de ordem
intrumental, vocacionadas, na especifidade dos fins a que se dirigem, a proteger o
exercício da liberdade sindical, da liberdade de culto, da liberdade de organização
partidária, da liberdade de expressão intelectual e da liberdade de infirmação. A
imunidade tributária não constituiu um fim em si mesma. Antes, representa um
poderoso fato de contensão do arbítrio do Estado na medida em que esse postulado
da Constituição, inibindo o exercício da competência impositiva pelo Poder Público,
prestigia, favorece e tutela o espaço em que florescem aquelas liberdades públicas.
Por fim, é possível vislumbrar que vários são os valores protegidos pela Constituição
pátria, sendo que, para não derrubar aqueles, ela trouxe em seu bojo diferentes tipos de
imunidades a fim de dar ampla proteção a esses valores. No momento, apenas será tratada a
chamada imunidade recíproca e a imunidade das instituições de assistência social por estar
intimamente ligada a problemática apresentada.
14
2.3 A IMUNIDADE RECÍPROCA
O texto constitucional, em seu art. 150, VI, “a”, estatui ser vedado às pessoas políticas
instituir impostos sobre o patrimônio, renda ou serviços umas das outras, sendo que os
parágrafos 2º e 3º do aludido dispositivo desenham os contornos da proibição constitucional.
(BRASIL, 1988)
O que a Constituição quer dizer, fácil modo, é que é vedado, por exemplo, à União
cobrar o Imposto sobre a Renda (IR) dos Municípios ou dos Estados, ou aos Estados exigirem
o Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) em razão dos automóveis de
propriedade da União, ou então aos Municípios cobrar o Imposto sobre a Propriedade
Territorial Urbana (IPTU) dos imóveis da União.
Neste dispositivo está estruturada a imunidade tributária recíproca das pessoas
políticas, a mais antiga das exononerações constitucionais tributárias. (COSTA, 2006, p. 136)
Esta exoneração remonta à primeira Constituição Republicana que adotou a forma
federativa de Estado (1891, art. 10), sendo contemplada por todas as subsequentes
Constituições que adotavam a república como forma de governo.
Sua inspiração adveio de um instituto similar constante no direito estadunidense. Sabese que a Constituição Norteamericana de 1787, concisa por excelência, não prevê as
imunidades fiscais expressamente, todavia coube à Suprema Corte explicitá-las. (COSTA,
2006, p. 136)
O reconhecimento surgiu por ocasião do célebre julgamento do caso McCullhcoh vs
Maryland, de 1819. No início do século XIX, o Estado de Maryland pretendeu cobrar
imposto sobre a selagem com estampilhas de uma filial do banco oficial, Bank ou US,
irresignado com tal exigência fiscal, o gerente deste banco na sucursal de Baltimore
McCulloch insurgiu-se contra isso e decidiu levar o caso à Corte Suprema, então presidida
pelo lendário juiz John Marshall. (CARRAZA, 2010, p. 762)
Segundo bem explica Carraza (2010, p. 762-763), a decisão trouxe importantes ideias,
até hoje utilizadas:
Sob a coordenação deste conceituado Chief-justice, a Suprema Corte norteamericana, numa decisão que marcou época, transformando num autêntico leading
case, deixou assentadas as seguintes ideias, que valem até hoje, inclusive para o
Brasil, que, nesta matéria, adota o modelo estadunidense: I – a competência para
tributar por meio de impostos envolve, eventualmente a competência para destruir;
15
II – não se deseja – e a própria Constituição não admite – nem que a União destrua
os Estados-membros, nem que estes se destruam mutuamente ou à União; e III –
destarte, nem a União pode exigir impostos dos Estados- membros, nem estes da
União, ou uns dos outros.
Neste sentir, firmou-se a imunidade dos meios de ações do Governo Federal frente às
pretensões do Fisco dos Estados, uma vez que “the power to tax involves the power to
destroy.” (COSTA, 2006, p. 136)
Quando o jurista Rui Barbosa foi chamado para redirgir o anteprojeto daquilo que
seria nossa primeira Constituição Republicana (1891), admitiu ter sido alvo de forte influência
da Constituição estadunidense, todavia, neste ponto das imunidades decidiu inovar.
Sabedor dos problemas que este celeuma constitucional poderia causar perante a
ordem jurídica interna, podendo o Tribunal Supremo decidir de forma diversa caso o mesmo
problema surgisse no Brasil, Rui Barbosa deliberou inserir em seu anteprojeto proibição
expressa à tributação, por meio de impostos, entre as pessoas políticas. (CARRAZA, 2010, p.
762-763).
Visto isso, se torna fácil entender a razão de existir da imunidade recíproca. De acordo
com o salientado anteriormente, verificou-se que estas exonerações fiscais não são um fim em
si mesmas, de forma que a finalidade destas figuras jurídicas é essencial para compreender o
instituto.
A Constituição Federal do Brasil de 1988, ao homenagear o modelo federal de Estado,
perfilhou o sistema de federalismo de equilíbrio, tendo por susbstrato a necessária igualdade
político-jurídica entre as unidades que compõe o Estado Federal. (PAULSEN, 2009, p. 243)
Em virtude disso, a imunidade tributária recíproca é um fator indispensável à
preservação instituicional das próprias unidades componentes da Federação. Com o fim de
petrificar e proteger o nosso federalismo, o legislador constituinte inibiu, pela repulsa a
submissão de uma entidade federada a outra, qualquer tentativa tendente a inviabilizar o
normal caminhar da Federação. (PAULSEN, 2009, p. 243)
Aliás, circunstância relevante é o fato da imunidade recíproca, por ser garantidora da
forma federativa de Estado, ter presença no rol das cláusulas pétreas (art. 60, § 4º, I da
CF/88), ou seja, imutáveis, não podendo ser abolidadas nem por emenda constitucional.
(BRASIL, 1988)
16
Ao mesmo passo caminham as lições de Carraza (2010, p. 761-2):
Decorre do princípio federativo porque, se uma pessoa política pudesse exigir
impostos de outra, fatalmente acabaria por interferir em sua autonomia. Sim porque,
cobrando-lhe impostos, poderia levá-la a situação de grande dificuldade econômica,
a ponto de impedi-la de realizar seus objetivos institucionais. Ora, isto a
Constituição absolutamente não tolera, tanto que inscreveu nas clásulas pétreas que
não será sequer objeto de deliberação a proposta de emenda constitucional tendente
a abolir “a forma federativa de Estado”(art. 60, paragrafo 4º, I). Se nem a emenda
constitucional pode tender a abolir a froma federativa de Estado, muito menos
poderá fazê-lo a lei tributária, exigindo imposto de uma pessoa política.
(...)
Ora, entre as pessoas políticas reina a mais absoluta igualdade jurídica. Umas não se
sobrepõe às outras. Não, pelo menos, em termos jurídicos. É o que basta para
afastarmos qualquer ideia de que podem sujeitar-se a impostos.
Em derradeiro, denota-se que a imunidade tributária recíproca é indispensável para a
sobrevivência do Estado brasileiro, tal como posto em na Constituição pátria. Por isso,
qualquer ação, seja ela legislativa ou administrativa, tendente a maltratar imunidade tributária
recíproca, como os Municípios cobrando impostos da União, por exemplo, deve ser
prontamente reprimida, sob pena de fazer cair por terra o Estado Federal brasileiro.
Ainda no que pertine aos contornos da imunidade recíproca, a Constituição Federal
dispõe em seu art. 150, § 3º que:
Art. 150 (...)
§ 3º - As vedações do inciso VI, "a", e do parágrafo anterior não se aplicam ao
patrimônio, à renda e aos serviços, relacionados com exploração de atividades
econômicas regidas pelas normas aplicáveis a empreendimentos privados, ou em
que haja contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas pelo usuário, nem
exonera o promitente comprador da obrigação de pagar imposto relativamente ao
bem imóvel. (BRASIL, 1988)
Nota-se que a norma imunizante não alcança a exploração de atividades econômicas
em concorrência com a iniciativa privada, isto é, somente estão abarcados pela regra
constitucional as atividades vinculadas às ações essenciais, ou delas decorrentes, das
entidades mencionadas. (COSTA, 2006, p. 146)
Desta forma, no momento em que os poderes públicos atuam como particulares, sem
as prerrogativas próprias das atividades estatais, especialmente a prerrogativa da supremacia
do interesse público sobre a do particular, não se cogita em desoneração tributária. Ao
17
contrário, em situações nas quais tais entidades atuam como se particulares fossem, sob a
regência do princípio da autonomia da vontade, em plena concorrência com aqueles e sob o
regime de liberdade contratual, a incidência de tributos é normal. (MELO; PAULSEN, 2010.
p. 351)
Argumenta-se, nesse ponto, que a exploração da atividade econônomica pelo poder
público faz com que o mesmo chame para si a capacidade de contribuir, ou seja, a entidade
exploradora de atividade econômica é dotada de capacidade contributiva para arcar com o
ônus fiscal. Desta forma, o poder público não pode gozar de privilégios em atividades que
tenham por objeto a exploração econômica e que não são extensivos aos particulares.
Aliás, a ausência da capacidade contributiva das pessoas políticas é encarada como
outro fundamento legitimador da imunidade recíproca. Com base nisso e para um melhor
entendimento, veja-se a explicação acerca do princípio da capacidade contributiva realizada
por Paulsen:
Decorre deste princípio, basicamente, que o Estado deve exigir que as pessoas
contribuam para as despesas públicas na medidade da sua capacidade para
contribuir, de maneira que nada deve ser exigido de quem só tem para sua própria
subsistência, a carga tributária deve variar segundo as demonstrações de riqueza e,
independentemente disso, a tributação não pode implicar confisco para ninguém. Os
extremos desta formulação (preservação do mínimo vital e vedação do confisco)
aplicam-se a todas as espécies tributárias. Entretanto a possibilidade de graduação
do tributo (e.g. alíquota maior para bese de cálculo maior) depende de que se cuide
de uma hipótese de incidência efetivamente reveladora de capacidade contributiva.
(2010, p. 65)
No que se refere às pessoas políticas, fala-se que as mesmas são desprovidas de
capacidade contributiva porque seus recursos destinam-se à prestação dos serviços públicos
que lhes incumbem. (COSTA, 2006, p. 138)
Inobstante isso, a capacidade econômica não se confunde com a capacidade
contributiva. Isto porque, é claro que os entes políticos são providos de capacidade econômica
para arcar com algum ônus fiscal, visto que ano após ano são recorrentes as notícias da grande
quantidade de dinheiro existente nas mãos do Estado, em virtude dos recordes da arrecadação
tributária. No entanto, toda a capacidade econômica das pessoas políticas é revertida em
prestação de serviços à sociedade, transparecendo, assim, a completa falta de capacidade
contributiva.
Neste viés, explica Costa:
18
Pensamos que dentre os casos de imunidade estão, exatamente, os mais
significativos exemplos de situações de existência de capacidade econômica, mas de
ausência de capacidade contributiva. Basta apenas lembrar a imunidade recíproca
das pessoas políticas. Mesmo podendo verificar-se a existência de capacidade
econômica de tais entres, certamente lhes falta aptidão para contribuir, pois que toda
sua capacidade econômica dever ser vertida à consecucção dos serviços que estão a
seu cargo. Exatamente por reconhecer a presença de capacidade econômica de
determinada pessoa é que a Constituição quer mantê-la intangível, para que a mesma
possa bem atingir suas finalidades, que coincidem com as do Estado. (2006, p. 87)
As pessoas políticas não possuem recursos disponíveis para sofrer incidência
tributária, vez que aqueles são voltados para a concretização de ações direcionadas à
manutenção da sociedade. Daí eclode outro fundamento da imunidade tributária recíproca, a
preservação do dinheiro destinado à manutenção das finalidades essenciais da entidade, visto
sua incapacidade contributiva.
2.5 A IMUNIDADE DAS INSTITUIÇÕES DE ASSISTÊNCIA SOCIAL
Para além da imunidade recíproca, o Ordenamento Jurídico brasileiro prevê a
denominada imunidade das instituições de assistência social, capitulada no art. 150, VI, “c” da
CF/88, que assim prescreve:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à
União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
(...)
VI - instituir impostos sobre:
(...)
c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das
entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência
social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei;
(...)
§ 4º - As vedações expressas no inciso VI, alíneas "b" e "c", compreendem somente
o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das
entidades nelas mencionadas. (BRASIL, 1988)
As instituições, das quais trata o dispositivo constitucional, são aquelas entidades
criadas com o propósito de servir a coletividade e coadjuvar a ação do Estado, quando este se
19
mostra deficiente no amparo à sociedade. São pessoas jurídicas de Direito Privado, sem fins
lucrativos, que possuem como finalidade essencial a atividade de colaboração com o Estado
em funções cujo desempenho é, em princípio, atribuição deste. Em virtude disso, a imunidade
em tela tem por objetivo impedir sejam tais entidades oneradas por via dos impostos,
dificultando assim, a consecução de seus fins essenciais. (COSTA, 2006, p. 173)
A tributarista Costa (2006, p. 174) expõe de forma precisa a finalidade com que esta
imunidade está posta no direito pátrio:
A razão da outorga desta imunidade é a realização, pelas instituições por ela
beneficiadas, de atividades próprias do Estado, de relevante interesse público (...).
Assim, por ajudarem a suprir as deficiências da autação estatal nessas áreas, são
recompensadas com a vedação constitucional da exigência de impostos.
O que se pretende, portanto, com esta desoneração tributária constitucionalmente
qualificada, é incentivar a sociedade organizar-se para suprir as deficiências do organismo
estatal, colaborando com o Poder Público no exercício de atividades de fim público, mas que
o Estado, sozinho, não consegue desempenhar de modo satisfatório. (MARTINS;
RODRIGUES, 2008, p. 145)
Percebe-se, ainda, diante da prévia exposição do objetivo da imunidade das
instituições sociais, que a capacidade contributiva, ou melhor, a falta dela, também aparece
sobressaltada nesses casos, já que as entidades de assistência social realizam atividades de
interesse público não lastreadas na exploração econômica. Por isso, os recursos econômicos
porventura advindos da atividade são totalmente revertidos em prol dela, denotando, deste
jeito, a ausência da aptidão para contribuir. (DERZI, 1993, p. 77)
Visualizada a finalidade da imunidade em questão, importa estabelecer o que é
instituição de assistência social.
A assistência social, de acordo com as lições de Costa (2006, p. 173), é um conceito
constitucional, ou seja, está positivado na Constituição Federal. Segundo Melo (2010, p. 358)
a assistência social pode significar o atendimento aos direitos sociais enumerados no art. 6º da
CF/88 (a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à
maternidade e à infância, a assistência aos desamparados), sendo responsabilidade do Estado
e da sociedade.
20
Mas de quem é a incumbência de promover esses direitos sociais? A sociedade,
recorrentemente, é dividida em três setores. No primeiro, está o Estado e seus vários braços,
com a finalidade de atender diretamente ao público e suprir as necessidades essenciais. O
segundo setor abrange a iniciativa privada voltada ao desenvolvimento das atividades
econômicas, trata-se do setor voltado à produção do lucro. E por último, está o terceiro setor,
composto por entidades privadas de interesse público, que desempenham um papel
fundamental na sociedade, suprindo a ineficácia do primeiro setor na busca do bem estar da
população. (TOMAZETTE, 2008, p. 333)
Nesta toada, observa-se que as instituições de assistência social estão dentro do
terceiro setor, pois os direitos sociais, cuja efetivação, a princípio, estava integralmente a
cargo do Estado, passa parcela às mãos da iniciativa privada por ineficiência daquele.
Segundo Tomazette (2008, p. 347), a pessoa jurídica de Direito Privado, para ser
considerada uma instituição de assistência social tem, em primeiro lugar, que atentar-se para
sua forma jurídica.
Assevera o autor, que as sociedades sempre desenvolvem atividades econômicas,
enquanto as associações desenvolvem atividades ideais, ou seja, morais, literárias, artísticas.
Nas associações são objetivados fins não econômicos (art. 53 do Código Civil de 2002), o que
não impede o exercício de eventual atividade econômica, apenas não pode ser o fim dela.
Então, como as entidades de terceiro setor não desenvolvem atividade lucrativa, não há como
se cogitar a forma de sociedade para tais entidades. Restam, assim, as associações e fundações
que são entidades de Direito Privado, sem fins lucrativos. (TOMAZETTE, 2008, p. 350)
Mas não basta isso, outros requisitos constitucionais e legais concorrem para que estas
entidades sejam consideradas de assistência social e façam jus à exoneração tributária.
Conforme já observado, as instituições não podem ter finalidade lucrativa. Isto não
quer dizer que elas não podem obter lucro, pelo contrário, o lucro é relevante e necessário
para que a instituição possa continuar desenvolvendo suas atividades. Bem por isso, a
cobrança dos serviços prestados por instituições de assistência social é permitida. O que a
qualificação sem fins lucrativos pretende é que não haja a distribuição dos lucros auferidos
entre os dirigentes, ou seja, o superávit tem que retornar à instituição para a sobrevivência
dela e, também, o patrimônio não pode ser revertido às pessoas que a criaram. (COSTA,
2006, p. 180-1)
O Código Tributário Nacional (CTN), em seu art. 14, estabelece ainda como requisito
a aplicação integral, no País, dos recursos para a manutenção dos objetivos fundamentais da
entidade e, também, que essa mantenha escrituração contábil em dia. (BRASIL, 1966)
21
Questão contrvertida diz respeito ao art. 12 da Lei 9.532 de 10 de fevereiro de 1997,
que a pretexto de veicular novos requisitos para o reconhecimento do direito à imunidade
tributária, previu ser necessário que os serviços prestados pela entidade estejam colocados à
disposição da população em geral, em caráter complementar às atividades do Estado.
(BRASIL, 1997)
Contudo, este requisito da generalidade do serviço à toda população não é válido, pois
o dispositivo legal acima mencionado padece de inconstitucionalidade formal. Ora,
basicamente, sabe-se que as imunidades tributárias são consideradas limitações ao poder de
tributar. Conforme visto anteriormente, o art. 150, VI, “c” da CF/88, condiciona o
reconhecimento da imunidade das instituições sociais ao atendimento de certos requisitos
constantes em lei. Ocorre que esta lei da qual trata a norma constitucional não é qualquer Lei
Ordinária, e sim de uma Lei Complementar.
Essa conclusão é alcançada com base no que prevê o art. 146, II da Constituição Pátria
que assim dispõe: “Art. 146. Cabe à lei complementar: II- regular as limitações
constitucionais ao poder de tributar.” (BRASIL, 1988)
Desta forma, tem-se que a Lei 9.532/1997 é formalmente inconstitucional por ter
disciplinado matéria de competência de lei complementar. Em razão disso, as instituições de
assistência social podem, tranquilamente, exercer suas atividade de maneira setorizada,
voltadas a um universo determinado de sujeitos, pois ainda assim estarão auxiliando o Poder
Público a suprir suas deficiências no campo da prestação de assistência social. (COSTA,
2006, p. 182)
2.5 DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO SOB JURISDIÇÃO DO COMANDO DO EXÉRCITO
O estudo em voga pretende verificar a problemática envolvendo dois bens da União
sob a jurisdição do Exército Brasileiro: os Próprios Nacionais Residenciais (PNRs) e os
imóveis cedidos aos Círculos Militares.
Inicialmente, é importante esclarecer que o patrimônio imobiliário da União
jurisdicionado ao Comando do Exército Brasileiro, em sentido amplo, corresponde ao
conjunto de imóveis de propriedade da União Federal que está sob a administração militar.
Tais bens, conforme dispõe o art. 76 e seguintes do Decreto-Lei nº 9.760 de 05 de
setembro de 1946, compõe a categoria dos bens da União utilizados em serviço público, seja
22
para ocupação em serviço federal, seja para ocupação de sevidor da União, como residência.
(BRASIL, 1946)
A Secretaria do Patrimônio da União (SPU) é o orgão que, mediante o instituto
jurídico da entrega, tem competência para atribuir determinado imóvel de propriedade da
União Federal ao uso por algum órgão da Administração Pública Federal direta.
Esta atribuição da posse se efetiva com a lavratura de um ato administrativo chamado
“Termo de Entrega e Recebimento”, instrumento pelo qual a SPU passa o imóvel à jurisdição
de determinado órgão da Administração Pública Federal direta.
O procedimento acima verificado está previsto no Decreto-Lei nº 9.760 de 05 de
setembro de 1946, conforme se vê abaixo:
Art. 79. A entrega de imóvel para uso da Administração Pública Federal direta
compete privativamente à Secretaria do Patrimônio da União - SPU. (Redação dada
pela Lei nº 9.636, de 1998)
§ 1º A entrega, que se fará mediante têrmo, ficará sujeita a confirmação 2 (dois)
anos após a assinatura do mesmo, cabendo ao S.P.U. ratificá-la, desde que, nêsse
período tenha o imóvel sido devidamente utilizado no fim para que fôra entregue.
§ 2º O chefe de repartição, estabelecimento ou serviço federal que tenha a seu
cargo próprio nacional, não poderá permitir, sob pena de responsabilidade, sua
invasão, cessão, locação ou utilização em fim diferente do que lhe tenha sido
prescrito.
§ 3o Havendo necessidade de destinar imóvel ao uso de entidade da
Administração Pública Federal indireta, a aplicação se fará sob o regime da cessão
de uso. (Incluído pela Lei nº 9.636, de 1998)
§ 4o Não subsistindo o interesse do órgão da administração pública federal
direta na utilização de imóvel da União entregue para uso no serviço público, deverá
ser formalizada a devolução mediante termo acompanhado de laudo de vistoria,
recebido pela gerência regional da Secretaria do Patrimônio da União, no qual
deverá ser informada a data da devolução. (Incluído pela Lei nº 11.481, de 2007)
(...) (BRASIL, 1946)
Visto isso, observe que este é o rito obedecido no caso de entrega de imóveis da União
ao uso pelo Exército Brasileiro. A SPU mediante a lavratura do Termo de Entrega e
Recebimento destina certo patrimônio imobiliário da União Federal à jurisdição do Exército
Brasileiro.
Uma vez atribuído ao Comando do Exército um imóvel, compete a este definir sua
utilização.
Com efeito, a Portaria nº 513 de 11 de julho de 2005, que aprova as Instruções Gerais
para a utilização do patrimônio imobiliário jurisdicionado ao Comando do Exército (IG 10-
23
03), define sob quais hipóteses os imóveis serão utilizados para a atividade militar, ou para as
atividades complementares:
Art. 2º Os bens imóveis da União sob jurisdição do Comando do Exército destinamse à utilização em finalidade militar pela Força Terrestre, precipuamente, ou em
finalidade complementar.
§ 1º O uso em finalidade militar objetiva:
I - a edificação e instalação de organização militar (OM);
II - a utilização como área ou campo de instrução, atracadouro ou porto e campo de
pouso;
III - a utilização como residência (Próprio Nacional Residencial) do militar em
atividade na Força;
IV - a preservação histórica, cultural ou ambiental; e
V - a edificação de instalações de natureza social, cultural, desportiva, recreativa e
religiosa motivada pela necessidade de assistência à tropa, administrada diretamente
pelo Exército.
§ 2º O uso em finalidade complementar objetiva:
I - apoiar as demais forças singulares, forças auxiliares, órgãos públicos e entidades
civis de reconhecido interesse militar;
II - prestar serviços, cuja exploração não recomende o empenho de efetivos
militares; e
III - otimizar o emprego do patrimônio imobiliário para gerar receitas financeiras
que serão revertidas em benefício da Força. (EXÉRCITO BRASILEIRO, 2005a)
A finalidade militar, da qual trata a portaria em tela, é utilizada para caracterizar a
atividade essencial ou principal do órgão da Administração Pública Federal que, no caso, é o
Exército Brasileiro. Em outras palavras, nesta categoria estão postos os imóveis
jurisdicionados à Força Terrestre e que são utilizados para o desenvolvimento da atividade
principal do Exército Brasileiro, tais como a defesa da pátria, a garantia dos poderes
constitucionais e por iniciativa de qualquer um deles a da lei e da ordem, nos exatos termos do
texto constitucional brasileiro. (BRASIL, 1988)
Observa-se desta forma, que os imóveis destinados à moradia dos militares em
atividade na Força (Próprio Nacional Residencial - PNR) compõe a categoria do conjunto
imobiliário empregado com finalidade militar.
Pode parecer estranho a afirmativa de que os PNRs são empregados em finalidade
militar, mas o raciocínio correto é o de que o uso desse imóvel PNR constitui a atividade meio
no exercicío das finalidades essenciais da Força Terrestre, tais quais aquelas postas acima.
Corrobora com este pensamento o seguinte precedente do Tribunal Regional Federal da 2ª
Região:
24
CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO – IMUNIDADE RECÍPROCA
ESTENDIDA (ART. 150, § 2º, DA CRFB) – AUTARQUIA – APARTAMENTO
FUNCIONAL – IMÓVEL AFETADO FORA DE USO – COBRANÇA DE IPTU –
IMPOSSIBILIDADE. I – A manutenção, por autarquia, de imóvel com destinação
de servir de moradia (apartamento funcional) a seus diretores está ligada à realização
da finalidade essencial desta. Ainda que não constitua atividade-fim, esse uso é
atividade-meio no exercício da finalidade essencial do órgão.II – Sobre o imóvel
autárquico afetado, ou seja, ao qual foi atribuída finalidade específica, deve incidir a
imunidade tributária recíproca estendida (art. 150, § 2º, da CRFB), ainda que este
esteja fora de uso. III – Apelação e remessa necessária improvidas. (BRASIL, 2004)
Nos termos da Portaria nº 277 de 30 de junho de 2008 (Instruções Gerais para a
administração dos Próprios Nacionais Residenciais do Exército – IG 50-01), em seu art. 2º,
inciso I, “Próprio Nacional Residencial (PNR) é a edificação de qualquer natureza utilizada
com a finalidade específica de servir de residência para os militares da ativa do Exército.”
(EXÉRCITO BRASILEIRO, 2008)
A relação estabelecida entre a Administração Militar e os militares que residem nos
PNRs é a de Permissão de Uso, a qual, por sua vez, é formalizada através da assinatura do
Termo de Permissão de Uso, em conformidade com o que dispõe o art. 18 da IG 50-01.
Art. 18. A ocupação do PNR será precedida da lavratura, pelo representante da
administração do PNR e permissionário (ou seu representante), do Termo de
Permissão de Uso e do Termo Inicial de Vistoria, cujos modelos serão estabelecidos
pelas RM.
§ 1º O Termo de Permissão de Uso caracterizará a submissão do permissionário às
normas concernentes ao uso de PNR no Exército.
§ 2º O Termo Inicial de Vistoria do PNR registrará as condições verificadas,
inicialmente, no imóvel e nos bens móveis que a ele estiverem distribuídos.
(EXÉRCITO BRASILEIRO, 2008)
Uma vez assinado o aludido termo e recebida as chaves, o permissionário terá direito à
ocupação do PNR além de outros direitos dela decorrentes e também assumirá diversos
deveres. Eis os direitos dos permissionários dos PNRs constantes na IG 50-01:
Art. 41. São direitos dos permissionários:
I - usar o PNR e as partes comuns sem prejudicar os moradores dos demais PNR e
sem comprometer a estética, a segurança e a tranqüilidade do edifício residencial ou
do conjunto habitacional, tudo sem prejuízo da responsabilidade pessoal perante a
legislação correspondente, por cuja violação responderá;
II - solicitar ao órgão de administração, dentro da rotina estabelecida, os trabalhos de
manutenção necessários ao PNR, sob responsabilidade desse órgão;
25
III - permanecer como permissionário do PNR durante Licença para Tratamento de
Saúde ou Licença Especial; e
IV - fazer uso de todas as prerrogativas previstas nestas IG e na legislação em vigor.
(EXÉRCITO BRASILEIRO, 2008)
Importante anotar, contudo, que não se pode confundir a Permissão de Uso fruto da
ocupação do PNR com o regime jurídico estabelecido para a Permissão de Uso de imóvel
jurisdicionado à Força Terrestre em atividades complementares.
De acordo com o visualizado anteriormente, os bens imóveis jurisdionados ao Exército
Brasileiro possuem sua utilização vinculada à finalidade militar ou à finalidade
complementar. Sendo que, essa última tem outros objetivos em comparação com aqueles
traçados para os bens utilizados em finalidade militar, como, por exemplo, a prestação de
serviços cuja exploração não recomende a utlização de efetivos militares ou para otimização
do patrimônio a fim de gerar receitas em benefício da Força (art. 2º, § 2º da IG 10-03).
(EXÉRCITO BRASILEIRO, 2005a)
A distinção é fundamental, pois, em que pese as mesmas situações abarcarem o
mesmo nome, seus regimes jurídicos são totalmente diferentes. E, a vista de olhos menos
atentos, isto pode provocar conclusões para lá de incorretas. Para se ter uma idéia, a Portaria
011-DEC, de 4 de outrubro de 2005, que aprova as Instruções Reguladoras de utilização do
patrimônio da União jurisdicionado ao Comando do Exército (IR 50-13) prevê que na
hipótese de utilização do imóvel para fins complementares o regime da Permissão de Uso é
verificada em casos de utilização do imóvel para realização de eventos e atividades em curto
espaço de tempo (art. 30), com prazo máximo de três meses prorrogáveis por mais três meses.
Neste caso, observa-se que este tipo de instrumento jurídico é muito utilizado na Permissão de
Uso auditórios, instalações desportivas, estandes de tiro, piscinas, etc. (EXÉRCITO
BRASILEIRO, 2005b)
Veja-se, desta maneira, que os regimes jurídicos são inteiramente distintos e não
devem ser confundidos.
De outra banda, ainda no estabelecimento dos contornos dos direitos e deveres do
ocupante de PNR, tem-se que esse é obrigado a recolher uma quantia mensal denominada
“taxa de uso por ocupação de próprio nacional residencial”. Este dever encontra respaldo
legal na Medida Provisória n 2.215-10, de 31 de agosto de 2001, a qual trata da reestruturação
da remuneração dos militares e arrola, em seu art. 15, inciso VII, como desconto obrigatório
26
na remuneração do militar o valor pertinente a referida taxa de uso por ocupação de próprio
nacional residencial. (BRASIL, 2001)
O Decreto nº 4307, de 18 de julho de 2002, regulamentou a Medida Provisória acima
mencionada, estabelecendo, em seu art. 84, com redação dada pelo Decreto 4.808 de 15
agosto de 2003, limite máximo de dez por cento sobre o valor do soldo do posto ou graduação
do militar a título de desconto da “taxa de uso”, incumbindo ao Ministério da Defesa e a cada
Força a regulamentação específica. (BRASIL, 2002)
Coube a Portaria nº 520, de 15 de outubro de 2001, do Comandante do Exército,
estabelecer o percentual da referida taxa de uso por ocupação de próprio nacional residencial
no âmbito do Exército Brasileiro.
Dispõe a supracitada Portaria:
Art. 1º Estabelecer o percentual de 5,0% (cinco vírgula zero por cento) sobre o soldo
do permissionário como o valor mensal da taxa de uso por ocupação de próprio
nacional residencial (PNR) sob a jurisdição do Exército Brasileiro.
Parágrafo único. Quando adotado um dos sistemas de administração especial em
PNR de natureza apartamento, a taxa de uso terá o valor mensal correspondente ao
percentual de 3,5% (três vírgula cinco por cento) sobre o soldo do permissionário.
(EXÉRCITO BRASILEIRO, 2001)
Pois bem, mas qual é o significado desta quantia cobrada dos militares da ativa
usuários dos imóveis da União para fins domiciliares e, ainda, qual é a sua destinação? Estas
respostas são facilmente encontradas na própria Instrução Geral que regula a Administração
dos Próprios Nacionais Residenciais do Exército (IG 50-01). O art. 2º, inciso VII, define o
que é Taxa de Uso a cargo dos permissionários: “Taxa de Uso é o pagamento mensal devido
pelo permissionário, decorrente da ocupação do PNR que lhe foi concedido, a ser cobrado
pela Administração e correspondendo a um percentual do soldo estabelecido pelo
Comandante do Exército.” (EXÉRCITO BRASILEIRO, 2008)
Mais a frente, no art. 36, inciso I, a normativa em questão expõe por qual razão a Taxa
de Uso é cobrada dos permissionários:
Art. 36. São também despesas de responsabilidade do permissionário, os serviços e
as atividades de manutenção necessários ao adequado funcionamento do PNR e,
quando for o caso, do edifício residencial e suas áreas comuns, tais como:
I - Taxa de Uso do PNR;
II - consumos de energia elétrica, de água e gás;
III - conta telefônica do PNR;
IV - taxas de gás, água, energia elétrica e esgoto;
27
V - outras taxas cobradas por órgãos estaduais e municipais;
VI - despesas de combate a insetos e roedores;
VII - seguro contra incêndio; (EXÉRCITO BRASILEIRO, 2008)
Nesta esteira, observa-se que a o montante cobrado dos usuários dos PNRs é revertido
integralmente para o custeio de serviços e atividades de manutenção e adequado
funcionamento das residencias funcionais. Desta forma, é errôneo qualquer pensar no sentido
de que a quantia em referência seria uma contraprestação pelo uso do PNR.
De outro lado, quanto aos imóveis da União utilizados pelos Círculos Militares, é
verdade que os mesmos remontam uma situação jurídica mais delicada para o trato da matéria
em questão, pois, a primeira vista, são enquadrados na categoria dos imóveis utilizados em
finalidade complementar, por estarem sujeitos ao regime jurídico da Cessão de Uso, conforme
regulamentação expressa do art. 26 da Portaria 011-DEC, de outubro de 2005 (IR 50-13).
(EXÉRCITO BRASILEIRO, 2005)
A Cessão de Uso é uma das formas de uso de imóvel da União jurisdicionado ao
Exército em finalidade complementar e destina-se, substancialmente, ao exercicío de
atividades de apoio, necessária ao desenrolar da vida da Organização Militar (Portaria 513 de
11 de julho de 2005, art. 3º, parágrafo único). São exemplos de Cessão de Uso, os imóveis
oferecidos aos postos bancários, postos de correios e telégrafos, restaurante e lanchonete,
barbearia, sapataria, alfaiataria, entre outros. Em suma, estes imóveis visam a apoiar as
atividades que irão proporcionar amparo às necessidades da Organização Militar e de seus
servidores (art. 25, inciso I, IR 50-13). (EXÉRCITO BRASILEIRO, 2008)
Dadas estas circunstâncias, observa-se que o regime jurídico estabelecido para reger a
utilização do imóvel pelos Círculos Militares é próprio daqueles observados pelos particulares
que exploram atividade econômica. Regime esse que vai acarretar diversas consequências
como, por exemplo, prazo máximo contratual e caráter precário do contrato, podendo ser
revogado a qualquer tempo (art. 25 da IR 50-13). (EXÉRCITO BRASILEIRO, 2008)
Quanto a finalidade destas entidades, veja-se apenas a título histórico, que o art. 511
do Decreto 42.018, de 9 de agosto de 1957, que regulava o Regulamento Interno dos Serviços
Gerais, hoje revogado, preconizava que a finalidade dos Círculos Militares era desenvolver os
laços de camaradagem, incentivar o espírito social entre os oficiais, suas famílias e a
sociedade local. Em que pese tal previsão não constar no atual RISG, aprovado pela Portaria
nº 816, de 19 de dezembro de 2003 do Comandante do Exército, a referência é válida a fim de
denotar a função que essas entidades têm na vida castrense.
28
Tendo isso em mente, a normativa geral acima referenciada irradia seus preceitos para
a elaboração dos Estatutos dos Círculos Militares das diversas guarnições espalhadas pelo
Brasil. Como exemplo, o Estatuto do Círculo Militar de São Paulo traz a mesmo ideal
constante no RISG.
Artigo 1º O CÍRCULO MILITAR DE SÃO PAULO (CMSP) - fundado em 24 de
maio de l947, com sede e foro na Cidade de São Paulo, Estado de São Paulo, pessoa
jurídica de direito privado, é uma associação civil, desportiva, amadorista e
comunitária, sem fins lucrativos e com duração ilimitada, regulada pelas leis
vigentes no País e por este Estatuto, elaborado de acordo com as diretrizes editadas
pelo então Ministério do Exército, conforme anexo.
Artigo 2º O CMSP tem como finalidade promover o congraçamento sóciodesportivo-cultural, com espírito de fraternidade e harmonia, entre oficiais das
Forças Armadas, oficiais das Forças Auxiliares e representantes de elevado conceito
da sociedade local, bem como entre suas famílias, buscando sempre o sentimento de
respeito às instituições, o culto à nacionalidade e o amor à Pátria (CÍRCULO
MILITAR DE SÃO PAULO, 2003)
Pelo exposto, tem-se que os Círculos Militares são associações civis sem fins
lucrativos, cujas personalidades jurídicas são de direito privado e têm por finalidade a
promoção da integração e camaradagem entre os oficiais das forças armadas, seja através do
desporto, cultura ou lazer.
Além disso, fazem uso de imóveis da União jurisdicionado ao Comando do Exército
por meio da Cessão de Uso, modalidade de utilização de bens da União em finalidade
complementar.
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3 REFERENCIAL METODOLÓGICO
O referencial metodológico indica o método usado pelo pesquisador no
desenvolvimento de sua pesquisa. Nesse sentido, o capítulo em tela apresentará os tipos de
pesquisa, as hipóteses de estudo e os procedimentos metodológicos utilizados.
3.1 TIPOS DE PESQUISA
Quanto ao tipo, a pesquisa pode ser classificada em relação a três aspectos: natureza,
forma de abordagem, objetivos gerais e procedimentos técnicos.
No que diz respeito à natureza, a presente pesquisa pode ser classificada como
aplicada, pois busca a solução de problemas concretos. A pesquisa se desenvolve no intuito de
buscar uma solução legal ao problema verificado no ambito do Exército Brasileiro, que é a
cobrança de tributos sobre alguns imóveis da União, com os Próprios Nacionais Residencias e
os imóveis utilizados pelos Círculos Militares.
Quanto à forma de abordagem do problema, foi utilizada a pesquisa qualitativa, por
meio da interpretação de normas jurídicas, principalmente da Constituição Federal de 1988
bem como de normativas internas do Exército Brasileiro, atribuindo-lhes significados e
verificando os regimes jurídicos com que o patrimônio da União está empregado no Exército,
com o fim de analisar a incidência de tributos.
Em relação aos objetivos gerais, o presente trabalho se classifica como exploratório,
pois visou tornar explícito um tema ainda pouco debatido tanto na doutrina como na
jurisprudência, esclarecendo conceitos e realizando subsunções de fatos à norma ainda não
levados a cabo.
Por fim, no que diz respeito aos procedimentos técnicos, todo este trabalho foi
realizado com base nas fontes bibliográficas, consistentes na análise de livros e artigos
científicos, e nas documentais, estas relacionadas ao estudo das legislações nacionais sobre o
assunto.
30
3.2 HIPÓTESES/QUESTÕES DE ESTUDO
O ponto norteador da pesquisa está em verificar a aplicabilidade das regras
imunizantes fiscais em situações que envolvem os Próprios Nacionais Residenciais (PNRs) e
os Círculos Militares.
Para isso, duas hipóteses de estudo podem ser apresentadas para a presente pesquisa.
A primeira diz respeito com a inconstitucionalidade da cobrança de impostos sobre os PNRs e
os Círculos Militares, visto a regra constitucional da imunidade recíproca, e no caso somente
dos Círculos Militares da imunidade das instituições de assistência social. De outro lado,
caminhando em sentido diverso, outra hipótese apresentada é a de que essas exigências fiscais
são constitucionais, observada a situação destes imóveis da União estarem sendo utilizado em
natureza privada.
3.3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A presente pesquisa foi conduzida pela análise de doutrinas, artigos científicos e
legislação. Por meio dos procedimentos bibliográficos e documentais, puderam-se analisar
normas e livros e assim conduzir a pesquisa na ordem interna. O estudo das modalidades de
imunidades tributárias constantes no texto constitucional bem como dos regimes jurídicos que
estão submetidos os PNRs e os Círculos Militares, como forma de expressão da metodologia
exploratória, foi de grande importância para fazer o encaixe normativo e analisar sob quais
situações a imunidade tributária poderá ser aplicada. Todos estes aspectos em conjunto irão
refletir na análise dos dados e, posteriormente, na conclusão do trabalho.
31
4 ANÁLISE DE DADOS E APRESENTAÇÃO DE RESULTADOS
Observaram-se, com os elementos trazidos no referencial teórico, os contornos da
imunidade tributária recíproca bem como o regime jurídico de alguns bens da União
jurisdicionado ao Exército Brasileiro.
A par disso, cumpre analisar a inconstitucionalidade da cobrança de alguns impostos, à
luz das imunidade recíproca e da imunidade da instituição de assistência social, especialmente
do IPTU que tem sido levado a cabo por algumas municipalidades.
4.1 A IMUNIDADE TRIBUTÁRIA E O PNR
Em conformidade com o que foi visto, verificou-se que os Próprios Nacionais
Residenciais são imóveis da União, sob a administração militar e que são destinados à
moradia dos militares da ativa.
Constatou-se, no mais, segundo disposições normativas, que esses imóveis compõe a
categoria do patrimônio imobiliário utilizado em serviço público e empregados em finalidade
militar.
Tendo como base essas premissas, não é difícil enquadrar tal situação de suposta
exigência fiscal, como uma daquelas que estão submetidas à regra constitucional da
imunidade recíproca. Já que, primeiramente, os PNRs fazem parte do patrimônio da União
Federal e, segundo, são utilizados em serviço público. Portanto, qualquer investida de outros
entes políticos, com intuito de exigir algum imposto que tenha por objeto estes imóveis é
inconstitucional.
Acontece, todavia, que alguns Municípios passaram a exigir o IPTU sobre a
propriedade dos PNRs. Sendo que o principal argumento das municipalidades exatoras para
ilidir a regra imunizante é a de que a Administração Militar recebe uma contraprestação dos
usuários pela utilização do imóvel, fato que afastaria a aplicação da imunidade tributária
conforme expressa previsão constitucional (art. 150, § 3º da CF/88). (BRASIL, 1988)
Ora, nesses casos o ponto que, aparentemente, poderia levantar algum tipo de dúvidas
é em relação à natureza jurídica do valor recolhido mensalmente dos usuários do PNR,
denominado “Taxa de Uso”, ou seja, se o mesmo possuíria ou não caráter contraprestacional.
32
Sendo que, em caso positivo, a incidência da norma imunizante estaria afastada. Isto porque,
o Poder Público estaria atuando em concorrência com os particulares na exploração de
atividade econômica e, com isso, sujeitaria-se aos benefícios e vantagens não extensivos
àqueles.
Fala-se que aquele é o único ponto, pois, conforme visto, os PNRs são imóveis da
União utilizados em serviço público e empregados em finalidade militar, sendo assim, é
inequívoca a incidência da imunidade recíproca relativa ao imposto sobre o patrimônio, dada
a circunstância do imóvel ser propriedade da União e visto a finalidade pública com a qual ele
é empregado.
No que se refere a quantia cobrada dos usuários do PNR, a contradição em saber se
sua natureza é contraprestacional ou não, como dito, é apenas aparente.
Demontrou-se anteriormente, de forma inequívoca, que este montante tem todo o seu
regime definido em disposições normativas, desde o valor que será cobrado dos militares até
sua destinação.
Somente com base nestes dois elementos é possível refutar o argumento advogado
pelos Munícipios que possuem pretensão fiscal sobre os PNRs. Lembre-se, que a validade da
cobrança defendia pelas municipalidades se consubstancia no racicínio de que a “Taxa de
Uso” é uma contraprestação pela utilização do imóvel da União paga pelo militar, motivo pelo
qual a imunidade tributária recíproca não tem guarida em relação ao PNR.
O raciocínio não tem qualquer respaldo. Em primeiro lugar, viu-se que a quantia
exigida dos usuários do PNR não varia conforme as características e qualidades do imóvel, o
quantum a ser pago é obtido através do cálculo de cinco por cento ou três e meio por cento
(em caso de apartamento) sobre o valor do soldo do militar. Isto é o bastante para afastar a
presunção de competição do Poder Público com a iniciativa privada na exploração de
atividade econômica, pois se assim o fosse, o imóvel seria levado em conta no cômputo do
valor a ser pago pelo militar, fato que não se verifica.
De outro lado, existe expressa previsão normativa quanto à destinação da quantia paga
pelos permissionários de PNR, conforme visto acima. Sendo que a natureza jurídica da taxa
de uso é apenas indenizatória e não remuneratória, pois visa apenas indenizar a Administração
dos PNRs os gastos com manutenção e conservação destes imóveis.
33
Ao lado deste entendimento, está a jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 5ª
Região:
TRIBUTARIO. CONSTITUCIONAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL.
CDA. INCLUSÃO DE ÓRGÃO DA UNIÃO NO PÓLO PASSIVO DO TÍTULO
EXECUTIVO. AUSÊNCIA DE NULIDADE. IPTU. IMÓVEL DA UNIÃO
DESTINADO À MORADIA DE MILITARES. IMUNIDADE. FATOS
GERADORES ANTERIORES À INCIDÊNCIA DA LC Nº 118/05. PRESCRIÇÃO.
INTERRUPÇÃO. CITAÇÃO PESSOAL DO DEVEDOR. SÚMULA 106 DO STJ.
NÃO INCIDÊNCIA. - A inclusão, no pólo passivo da execução fiscal, do Ministério
da Aeronáutica - entidade desprovida de personalidade jurídica, ao invés da União,
se apresenta como uma mera irregularidade que, por si só, não é apta a fulminar de
nulidade o título que embasou o feito executivo, uma vez que, na hipótese dos autos,
não ocorreu qualquer prejuízo para a defesa da União. - Afigura-se indevida a
cobrança de IPTU sobre os imóveis de propriedade da União ocupados por militares
da ativa, uma vez que o sentido da referida norma é o de impedir que o ente público
desfrute de privilégio não extensivo ao particular, quando pretenda se dedicar à
exploração da atividade econômica lucrativa, situação não presente na hipótese dos
autos, em que a taxa de uso prevista no artigo 84 do Decreto nº 4.307/02 (com a
redação dada pelo Decreto nº 4.808/03), correspondente ao valor mensal devido pelo
ocupante de PNR, descontado preferencialmente em folha de pagamento, até o
limite de dez por cento do valor do soldo do posto ou da graduação do militar,
destina-se precipuamente à manutenção e conservação dos imóveis ocupados pelos
militares. – (...) Apelação da União parcialmente provida. - Apelação do Município
de Natal(RN) não provida. (BRASIL, 2008)
E, mais:
PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS DO DEVEDOR. IPTU.
IMÓVEL DA UNIÃO DESTINADO À MORADIA DE MILITARES. IMUNIDADE.
PRESCRIÇÃO. INTERRUPÇÃO. TERMO. CITAÇÃO PESSOAL DO DEVEDOR.
- A nulidade da CDA não deve ser declarada por eventuais falhas que não gerem
prejuízos para o executado promover a sua defesa. - Os imóveis funcionais da União
destinados à habitação dos militares estão resguardados da tributação pela imunidade
constitucional, uma vez que a contraprestação devida pelo seu uso tem caráter
meramente indenizatório, destinando-se tão-somente ao custeio das despesas com
manutenção e conservação do imóvel ocupado. - Em execução fiscal, a prescrição
tributária somente se interrompe quando realizada a citação pessoal do devedor.
Precedentes do STJ. - Apelação do Município e remessa oficial improvidas. Apelação da União parcialmente provida. (BRASIL, 2005)
Desta feita, exigir o IPTU sobre o PNR culminaria da afronta aos dois princípios que a
imunidade tributária recíproca visa blindar. O princípio federativo, pois o Município estaria
colocando em cheque, por mais improvável que isto possa parecer, a harmonia entre a União e
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os Municípios, pois o PNR, sendo imóvel da União, estaria sucetível a ingerências dos
Municípios e, consequentemente, autonomia da União estaria ferida.
Ademais, e com mais ênfase, o princípio da capacidade contributiva vê-se abalado.
Ora, de acordo com o verificado o montante pago pelos militares não constitui
contraprestação pela utilização do imóvel e sim tão somente para indenizar os gastos com
conservação e manutenção. Por isso, neste caso a União não possui capacidade contributiva,
vez que não atua em concorrência com a iniciativa privada.
Pelo exposto, tem-se que os PNRs constituem imóveis da União jurisdicionados ao
Comando do Exército Brasileiro, destinado à moradia dos militares da ativa, insucetíveis de
tributação pelo IPTU, visto a natureza indenizatória da taxa de uso, sendo aplicável, portanto,
a imunidade tributária recíproca.
4.2 A IMUNIDADE TRIBUTÁRIA E O CÍRCULO MILITAR
O estudo da imunidade tributária atinente aos Círculos Militares importa na
verificação de dois aspectos: o primeiro, relativo ao bem imóvel sobre o qual a estrutura do
Círculo Militar está assentada e, o segundo, condiz com a instituição propriamente dita.
Quanto ao imóvel observou-se que o mesmo compõe o patrimônio imobiliário da
União cedido à utilização das associações civis sem fins lucrativos por meio do intrumento
jurídico denominado Cessão de Uso.
Conforme visto, o regime jurídico da Cessão de Uso caracteriza a modalidade de
utilização de bens da União em finalidade complementar, tendo como características, dentre
outras, o carater precário e a possibilidade de revogação a qualquer tempo do contrato.
Trata-se aqui, em verificar se a incidência do IPTU sobre a propriedade destes bens
imóveis é válida ou não. A jurisprudência dos tribunais superiores se mostra um tanto quanto
tormentosa nesse aspecto, não veiculando um entendimento pacífico quanto a incidência do
IPTU em casos semelhante como o presente.
Porém, como forma de resguardo, é oportuno observar que os casos decididos tanto
pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) como pelo Supremo Tribunal Federal (STF) tinham
em um de seus pólos uma empresa exploradora de atividade ecônomica. De modo diferente,
lembre-se que os Círculos Militares são associações civis sem fins lucrativos. Desta forma
qualquer argumento pautado exclusivamente na afronta a livre concorrência e no indevido
35
privilégio a exploração ecônomica do particular não tem guarida aqui, visto a condição
jurídica que se revestem os Círculos.
Realizadas as devidas ressalvas, o primeiro entendimento que salta aos olhos é aquele
prolatado pelo Ministro do STF, Galvão, no momento do julgamento do Recurso
Extraordinário n. 253.394/SP (BRASIL, 2003). Discutia-se a pretensão de empresa
delegatária dos serviços do Porto de Santos de ver-se exonerada da exigência do IPTU,
lançado sobre os imóveis que compõe o acervo patrimonial do respectivo porto, integrantes
do patrimônio da União, e o qual a empresa detinha guarda e responsabilidade.
O acórdão recorrido, levado a revisão pelo Supremo, mencionava não ter dúvidas
quanto à proibição voltada às municipalidades em instituir imposto sobre o patrimônio da
União, porém observava que a imunidade constitucional prevista no art. 150, VI, “a”, da
CF/88 é ratione personae, isto é, só há imunidade enquanto a União estiver na posse direta do
imóvel. Assentou, ainda, que o fato gerador do IPTU, de acordo com o art. 32 do Código
Tributário Nacional, não é só o domínio do bem, mas como também a posse, fato que
possibilitaria a cobrança do IPTU de quem está usando imóvel da União. (BRASIL, 2003)
Estes argumentos foram combatidos da seguinte forma pelo Ministro Relator Galvão:
No presente caso é incontroverso que os imóveis tributados são de domínio público
da União, encontrando-se ocupados pelo recorrente em caráter precário, na
qualidade de delegatária dos serviços de exploração do porto e tão somente enquanto
durar a delegação.
O acórdão, ao invocar a norma do art. 32 do CTN, além de incidir no mau vezo de
buscar na lei a interpretação da Constituição, não atentou para a circunstância de que
o art. 32 do CTN não pode ser interpretado como tendo englobado, no conceito de
posse, de forma indiscriminada o ocupante de bem público, sempre em caráter
precário; o mero detentor, como o locatário; e, finalmente, o possuidor com animus
domini; esse, sim, responsável pelo tributo incidente sobre o imóvel privado de
quem tem a posse, na qualidade de substituto do proprietário, figura de ordinário
desconhecida ou, no mínimo, alheia ao destino do bem tributado.
Nesse caso, tratando-se de bem público de uso especial, é fora de dúvida que se acha
acorbetado pela imunidade constitucional, sendo insucetível de tributação pelo
IPTU. (BRASIL, 2003)
Por ocasião do mesmo julgamento, assim arrematou o Ministro Alves:
O que se pode suscitar não é problema de posse com animus domini, mas posse
exclusiva, porque aqui há desdobramento de posse, pois, obviamente, ele tem posse
direta. Esta, a concessionária, evidentemente, tem. O problema é saber se o Código
Tributário, quando fala em posse, fala em posse exclusiva, em que não há
36
desdobramento; e quando se trata de posse exclusiva, aí, sim, o possuidor responde.
Quando se trata de posse desdobrada – o caso de locação e comadato -, o possuidor
direto não responde.
Estou de acordo, porque a posse é direta, e não há direito real que a justifique.
(BRASIL, 2003)
Em julgamento mais recente, o Supremo Tribunal Federal teve a oportunidade de
novamente refletir sobre a questão, na apreciação do Recurso Extraordinário n.° 451152.
Desta vez, tratava-se de uma academia de ginástica que estava na posse de imóvel situado do
Aeroporto de Jacarepaguá, por força de contrato de Concessão de Uso, por ela celebrado com
a INFRAERO, empresa pública administradora de aeroportos brasileiros, abrangendo área de
terras de propriedade da União Federal, afetada à administração do Comando da Aeronáutica.
Com isso, o conflito estava em saber se a cobrança do IPTU pelo Município do Rio de Janeiro
sobre imóvel da União Federal era válida. (BRASIL, 2007)
O Ministro Relator Mendes rechaçou essa possibilidade, asseverando que:
Com efeito, o cerne da controvérsia não está em saber se há ou não imunidade
recíproca quando o imóvel da União for destinado à exploração comercial, mas se a
impetrante, ora recorrida, pode figurar no pólo passivo da obrigação tributária do
IPTU.
No caso dos autos, a recorrida não preenche nenhum dos requisitos para ser
contribuinte do IPTU, porquanto é detentora de posse precária e desdobrada
decorrente de contrato de concessão de uso. (BRASIL, 2007)
Veja-se desta forma, que a orientação defendida pelo Supremo baseia-se no
desdobramento da posse. Isto porque a posse, como instituto jurídico, pode ser desdobrada em
posse direta e posse indireta. A primeira é aquela em que o sujeito detém materialmente o
bem, mas não possui o sentimento de propriedade sobre a coisa (é o chamado animus domini,
isto é o ânimo de ser dono). Como exemplo, podemos citar o locatário, ele não tem o ânimo
de ser dono, mas detém o bem materialmente. Já o locador, por sua vez, não detém o bem
materialmente, mas é provido do animus domini, configurando a posse indireta.
Segundo o entender do Supremo Tribunal Federal, quando o Código Tributário
Nacional, em seu art. 32, prescreve ser fato gerador do IPTU não só a propriedade de bem
imóvel, mas também a posse, esta posse da qual trata o dispositivo é a posse exclusiva,
insucetível de desdobramento, em que o possuidor detém tanto bem imóvel materialmente
como também o ânimo de proprietário sobre a coisa. (BRASIL, 2007)
37
Ora, naqueles casos submetidos à análise da Suprema Corte, verificou-se que a posse
era desdobrada e precária, pois se tratava de uma Concessão de Uso de bem público, em que o
particular não possuía o animus domini sobre a coisa. Sendo assim, o concessionário não pode
figurar como sujeito passivo da relação tributária do IPTU, vez que é mero detentor do bem,
escapando à regra do art. 32 do CTN. Em razão disso, não podendo o IPTU ser exigido do
particular, a obrigação recairia sobre a União Federal, o que é afastado tendo em vista a regra
constitucional da imunidade recíproca.
Transportando a situação para a esfera dos Círculos Militares, nota-se a aplicação do
mesmo entendimento. De acordo com o visto, observou-se que o regime jurídico da Cessão de
Uso, o qual rege a utilização de imóveis da União pelos Círculos Militares, absorve as
características da precariedade contratual, tempo certo e a possibilidade de revogação a
qualquer tempo.
Neste sentido, do mesmo modo que nos julgados vistos acima, os Círculos Militares
são meros possuidores diretos do bem imóvel da União, não abarcando a aptidão para figurar
como sujeito passivo da obrigação de pagar o IPTU. Isto poque, a posse dos Círculos
Militares é precária e desdobrada, conforme se vê no regime jurídico da Cessão de Uso. Não
existe, portanto, fundamento legal para os Círculos Militares serem responsáveis pelo
pagamento do imposto. Recaindo a obrigação para a União Federal, a mesma é repelida em
virtude da imunidade constitucional, em casos em que a utilização se dá a título gratuito.
Ocorre todavia que, no mesmo julgamento do caso da academina de ginástica usuária
de imóvel no Aeroporto de Jacarepaguá, o Ministro Barbosa, em seu voto vista, discordou do
posicionamento tomado pelo Ministro Mendes:
Ora, no caso em exame, é incontroverso que o imóvel de propriedade da União é
empregado em atividade de fim exclusivamente privado e com intuito lucrativo.
Com efeito, lê-se a fls. 03 que a recorrida presta serviços de academia, atividade
inequivocadamente alheia a administração aeroportuária.
(...)
Observo que a imunidade tributária recíproca opera como mecanismo de ponderação
e calibração do pacto federativo, destinado a assegurar que entes desprovidos de
capacidade contributiva vejam diminuída a eficiência na consecução dos seus
objetivos definidos pelo sistema jurídico.
Por outro lado, a imunidade recíproca também é clara salvaguarda contra o risco de
utilização de tributos como instrumento de pressão econômica entre os membros do
pacto federarivo.
(...)
Entendo que a circunstância objetiva de o imóvel tributado pertencer à União não
justifica que a imunidade tributária tenha como efeito colateral a concessão de
vantagem que não se coadune com as normas garantidoras da livre iniciativa e
concorrência entre os agentes do mercado.
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Assim entendo, em primeiro lugar, porque a tributação do imóvel pertencente a
União mas explorado economicamente por particular não implica risco algum ao
equilíbrio entre os entes federados; em segundo, porque a recorrida demonstra
capacidade contributiva objetiva, por dedicar-se a atividade de exploração
econômica em caráter privado. (...)
Noto que a recorrida e os demais empreendedores deixam de concorrer em
igualdade de condições por força de disposição constitucional que não contempla o
exercício privado de atividades ecônomicas (imunidade recíproca), e não em razão
de questões econômicas ou de gerenciamento próprias do mercado. O valor do IPTU
deixa de ser um custo e, portanto, ou aumenta o lucro do negócio, ou diminui o
preço do serviço. (BRASIL, 2007)
As poderações realizadas pelo Ministro Barbosa possuem completo fundamento, mas
tão somente para o caso em que estava sob julgamento. A diferença em relação aos Círculos
Militares é que os mesmos não têm como fim o intuito lucrativo e tampouco o imóvel é
explorado economicamente, ao revés disso, como se verá mais a frente, os Círculos Militares
estão intimamente ligados às finalidades essenciais do Exército, fazendo-se jus a aplicação da
imunidade tributária recíproca.
Para se ter uma idéia de como a questão é controvertida no âmbito dos Tribunais
Superiores, o Superior Tribunal de Justiça tem julgados voltados para os dois lados. O
primeiro complascente aos entendimentos dos Ministros Galvão, Alves e Mendes, visto no
julgamento do Recurso Especial n.° 964.789/PR (BRASIL, 2009). E o segundo corroborado
pelo raciocínio de Barbosa, presente na decisão no Agravo Regimental no Recurso Especial
n.° 1096229/SP. (BRASIL, 2010)
De outro lado, com relação a instituição propriamente dita, ou seja, a associação civil
formadora do Círculo Militar, é possível afirmar que a mesma também está sob a égide de
uma regra imunizante.
O trabalho desenvolvido nos Círculos Militares não pode ser confundido como uma
simples atividade particular, acessória ou intrumental à vida militar, como leva a crer o
regime de utilização de bens da União estabelecido para estas entidades.
Ao revés, os Círculos Militares são tão importantes que estão intimamente ligados à
finalidade essencial da Força Terrestre e, embora não faça parte da atividade fim, está
presente na atividade meio.
O Estatuto dos Militares dispõe, no art. 27, IV, ser manifestação essencial do valor
militar, dentre outras, “o espírito de corpo, orgulho do militar pela organização onde serve.”
(BRASIL, 1980). E ainda, no art. 28, VIII, prevê:
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Art. 28. O sentimento do dever, o pudonor militar e o decoro da classe impõem, a
cada um dos integrantes das Forças Armadas, conduta moral e profissional
irrepreensíveis, com a observância dos seguintes preceitos da ética militar;
VIII – praticar a camaradagem e desenvolver, permanentemente, o espírito de
cooperação; (...) (BRASIL, 1980)
Veja que a camaradagem entre os militares e o espírito de corpo são vigas mestras da
instituição militar, de forma que se algum deles for ausente é capaz de fazer cair por terra toda
a instituição.
O Regulamento Disciplinar do Exército, Decreto n. 4.346 de 26 de agosto de 2002, é
ainda mais enfático no enaltecimento da camaradagem entre os militares, alocando-a na seção
dos Princípios Gerais do Regulamento: “Art. 3º A camaradagem é indispensável à formação e
ao convívio da família militar, contribuindo para as melhores relações sociais entre os
militares.” (BRASIL, 2002)
Denota-se desta maneira que a finalidade dos Círculos Militares está intimamente
ligada a missão essencial das Forças Armadas, não como atividade fim, mas como atividade
meio, como possibilitador de que atividade fim será realizada com a maior presteza possível.
Até porque, não há como a pátria ser defendida de forma satisfatória, se seus recursos
humanos não estão integrados em um corpo único, agindo de forma individual e fracassada.
Aliás, é impossível deixar de constatar que a própria IG 10-03, no art. 2º, § 1º, V,
qualifica a edificação de instalações de natureza social, cultural, desportiva, recreativa e
religiosa motivada pela necessidade de assistência à tropa, administrada diretamente pelo
Exército, como imóvel de uso em finalidade militar. (EXÉRCITO BRASILEIRO, 2005a)
Ora, se estas atividades arroladas acima, quando administradas diretamente pelo
Exército, são classificadas como militares, então o raciocínio de que os Círculos Militares, no
desenvolvimento daquelas mesmas atividades, coadjuvam o Poder Público na prestação desta
assistência social, é totalmente válido. Não é demais pensar, fazendo uso da mesma lógica
usada no meio civil, de que a prestação direta desta assistência pelas Organizações Militares é
inviável, tendo como base a falta de recurso. Por esse motivo, que as associações civis
supririam a deficiência do Estado neste aspecto.
Nos termos das normativas citadas anteriormente, viu-se que o lazer é um direito
social previsto no Texto Constitucional (art. 6º), e que a assistência social visa a atendê-lo.
Não obstante isso, no ambiente da caserna, os Círculos não desenvolvem apenas o
atendimento de um direito social, que é o lazer, mas sim de uma verdadeira atividade com
finalidade militar.
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Por isso, não é nem um pouco forçoso qualificar os Círculos Militares como
associações de assistência social, para fins de aplicação da imunidade tributária das
instituições de assistência social.
De fato, aos Círculos Militares faltam a capacidade contributiva no que se refere a
cobrança de imposto, já que os recursos advindos com suas atividades são integralmente
revertidas em prol do Círculo.
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5. CONCLUSÃO
A cobrança de tributos traz consigo o poder para destruir caso não seja corretamente
dosado.
Diante dessa situação, é que a Costituição brasileira abarca em seu corpo normativo
uma série de limitações ao poder de tributar, encontrando-se no meio delas as imunidades
tributárias. Verificou-se ao longo desta pesquisa, que vários são os motivos e as finalidades
destas normas imunizantes, contudo sempre convergindo em uma mesma direção: a proteção
de direitos e valores postos na Lei Maior.
Ocorre, infelizmente, que nem sempre os ditames constitucionais são respeitados por
aqueles que possuem a competência tributária, isto é, de instituir, exigir e cobrar tributos. As
situações verificadas no presente estudo são exemplos destes deslizes democráticos.
É neste sentido que se estabeleceu o parâmetro do presente estudo, qual seja, a
investigação dos motivos que levam certos Municípios a vislumbrarem a possibilidade de, em
despreso às imunidades expressamente previstas na CF/88, cobrarem IPTU sobre bens
jurisdicionados à União, essencialmente os PNRs e os Círculos Militares.
Para levar a cabo a presente pesquisa, foi necessário observar a conceituação das
imunidades tributárias em sentido amplo, para ver que elas são normas de incompetência
tributária, de modo ser extremamente vedado às pessoas políticas exigir tributos em situações
constitucionalmente elegidas como imunes a tributação.
Dentro das imunidades tributárias, destacaram-se para o desenvolvimento do trabalho
a imunidade recíproca e a imunidade das instituições de assistência social. Sendo a primeira
caracterizada pela proibição dos entes políticos cobrarem impostos sobre o partrimônio, a
renda e os serviços um dos outros. A segunda, pela imunidade das instituições de assistência
social definida pela vedação dirigida à União, Estados, Distrito Federal e Munícipios de
instituírem impostos sobre a renda, patrimônio e serviços relacionados às atividades
essenciais das entidades de assistência social.
Ademais, viu-se que os PNRs são imóveis da União, jurisdicionado ao Exército
Brasileiro, utilizado em finalidade militar. De outro lado, os Círculos Militares também
compõe o acervo dos imóveis da União que, embora cedidos seu uso à associações privadas,
também estão albergadas por normas de imunidade tributária.
Em relação ao PNR, é flagrante a inconstitucionalidade da conbrança do IPTU sobre a
propriedade desse bem imóvel. Isto porque, a uma, trata-se de patrimônio da União que está
albergado pela regra da imunidade recíproca e, a duas, a situação não apresenta qualquer
42
circunstância excludente da regra exonerativa, como querem alguns Munícipios diante da
cobrança da Taxa de Uso. A natureza jurídica dessa cobrança, como visto, é indenizatória,
pois visa tão somente indenizar os gastos com a manutenção e conservação desses imóveis e
não remuneratória, pela utilização dos mesmos.
Sobre a cobrança do IPTU sobre o prédio dos Círculos Militares viu-se que a mesma é
afastada, pois não existe previsão legal para que essas entidades figurem no pólo passivo da
relação tributária, já que são meras detentoras do bem imóvel, dado caráter precário da Cessão
de Uso. Bem por isso, como não existe fundamento legal para que detentor de bem imóvel
seja responsável pelo pagamento do IPTU, o Círculo Militar não pode figurar no pólo passivo
da relação tributária. De outro modo, se a obrigação racair sobre a União, esta é afastada
devido à regra da imunidade recíproca, em que o Munícipio não pode cobrar imposto sobre o
patrimônio da União.
Ademais, tem-se ainda que os Círculos Militares são objetos de outra regra
imunizatória, isto é, da imunidade das instituições de assistência social. O raciocínio
justificador é o de que os Círculos Militares, sendo associações civis, sem fins lucrativos,
destinados a dar assistência social aos militares, através da cultura e do esporte, promovendo
assim, a camaradagem e o espírito de corpo àqueles cidadãos, coadjuvam a atuação do Estado
na prestação de um serviço essencial para a mantença do organismo militar. Deste modo, todo
o imposto que incida sobre o patrimônio, a renda, os serviços ligados a finalidade essencial
dos Círculos é inconstitucional.
A pesquisa que ora se finda, com seu conteúdo dissertativo e conclusão pontual,
mostra sua importância pela contemporaniedade do tema. A Administração Militar vem
constantemente enfrentando este celeuma em sua prática jurídica, firmando-se aqui a principal
contribuição deste trabalho, qual seja, servir de base para ações administrativas na motivação
de seus atos, bem como para defesa dos interesses da Força em não onerar-se ainda mais em
razão de pagamentos indevidos e de ponto de partida para futuros estudos sobre o tema, uma
vez que não se intencionou o esgotamento com o presente estudo.
43
REFERÊNCIAS
BRANCO, P. G. G.; COELHO, I. M.; MENDES, G. F. Curso de Direito Constitucional. 5.
ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2010.
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Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm>.
Acesso em: 18 jun. de 2010. Não Paginado.
______. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional
e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios.
Brasília, DF. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5172.htm>.
Acesso em: 8 jul. 2010. Não Paginado.
______. Lei nº 9.532, de 10 de fevereiro de 1997. Altera a legislação tributária federal e dá
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ccivil_03/Leis/L9532.htm>. Acesso em: 8 jul. 2010. Não Paginado.
______. Lei nº 6.880, de 9 de dezembro de 1980. Dispõe sobre o Estatuto dos Militares.
Brasília, DF. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6880.htm>.
Acesso em: 24 jun. 2010.
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