AS FONTES DO DIREITO 1. As Fontes do Direito no Sistema Jurídico Português Direito encontra-se em permanente evolução Fontes Âmbito científico • inovações nos processos de interpretação; - interpretar uma lei consiste na determinação ou fixação do exacto sentido com que ela deve valer. • aplicação e integração da lei; - integração da lei traduz-se na actividade jurídica que tem por fim encontrar uma solução jurídica para os casos omissos, também designados de lacunas da lei. 1. As Fontes do Direito no Sistema Jurídico Português Os vários sentidos da expressão «fontes do Direito» A expressão «fontes do Direito» pode ser utilizada em vários sentidos, de entre os quais destacamos: sentido sociológico-material sentido histórico sentido instrumental sentido político-orgânico sentido técnico-jurídico Em sentido sociológico-material são fontes do Direito todos os factores ou circunstancialismos sociais que estiveram na origem de determinada norma jurídica. Exemplos: -Aumento do parque automóvel -Aumento das doenças respiratórias O sentido técnico-jurídico é aquele que maior relevância assume para o nosso estudo. Em sentido técnico-jurídico, são fontes do Direito todos os modos de formação e revelação das normas jurídicas. Neste sentido, são fontes do Direito: a lei a jurisprudência o costume a doutrina De entre as fontes direito é tradicional distinguir: Fontes imediatas do Direito, são aquelas que têm força vinculativa própria, sendo por isso verdadeiros modos de produção do Direito. Fontes mediatas do Direito, são aquelas que não tendo força vinculativa própria, são importantes porque influenciam no processo de formação e revelação das regras jurídicas. Com base nesta distinção só a lei é fonte imediata do Direito. A lei Os vários sentidos da lei Como decorre do n.º 2, do artigo 1.º do Código Civil são leis «todas as disposições genéricas provindas dos órgãos estaduais competentes…» Provir de uma autoridade competente Pressupostos da lei Observar formas previstas para essa actividade Introduzir um preceito genérico Vários sentidos que a lei pode assumir: Lei em sentido formal Lei em sentido material Todo o acto normativo emanado de um órgão com competência legislativa, quer contenha ou não uma verdadeira regra jurídica. Todo o acto normativo emanado de um órgão do Estado mesmo que não incumbido da função legislativa, desde que contenha uma verdadeira regra jurídica. Exemplo: as leis da Assembleia da República, os decretos-lei do Exemplo: uma postura de uma Governo. Câmara Municipal. Lei em sentido amplo Lei em sentido restrito Abrange toda e qualquer norma Compreende apenas os diplojurídica. mas emanados da Assembleia da República. O processo de elaboração da lei O processo de elaboração dos actos legislativos não é uniforme, variando em função de diversos factores, sendo que cada órgão dotado de competência legislativa tem o seu modo próprio de agir na feitura das leis. Destaca-se a actividade legislativa da Assembleia da República do Governo Processo de formação das leis na Assembleia da República Iniciativa legislativa ( art. 167.º da C.R.P.) Discussão e votação ( art.168.º da C.R.P.) Promulgação e referenda ( arts.134.º, 136.º e 140.º da C.R.P.) Publicação ( arts. 134.º e 119.º da C.R.P.) Processo legislativo do Governo No âmbito da sua função legislativa o Governo emite Decretos – leis. Esta competência pode ser: própria do Governo [ art.198.º, n.º 1,a) da C.R.P] resultar de autorização legislativa concedida pela Assembleia da República [art.198.º, n.º 1, b) da C.R.P.] A aprovação da proposta elaborada pelo Governo pode ser: em Conselho de Ministros; submetida a assinaturas sucessivas, isto é, submetida separadamente à assinatura do Primeiro-ministro e à de cada um dos ministros competentes. Promulgação; após a aprovação, o diploma é enviado sob a forma de decreto ao Presidente da República, para promulgação [arts.134.º, b) e 136.º, n.º 4 da C.R.P.] Referenda ministerial ( at.140.º C.R.P.) Publicação [art.119.º, c) da C.R.P.] Distinção entre Direito substantivo e Direito adjectivo Direito substantivo Direito adjectivo Conjunto de normas que regulam as Conjunto de normas que indicam os condutas dos cidadãos em socie- trâmites e as entidades a que o dade. cidadão tem de recorrer para exercer o seu Direito. Exemplo: as normas que integram o Direito Civil, Comercial, do Trabalho, Exemplo: Direito Processual Civil, Administrativo e Fiscal. Penal e do Trabalho. O início da vigência da lei A vigência da lei não depende do seu conhecimento efectivo, pois é necessário que a mesma seja objecto de publicação. Actualmente, em Portugal, a publicação é efectuada por edição electrónica do Diário da República (art. 119.º, n.º 1 da C.R.P.) A falta de publicação oficial implica a ineficácia juridica do acto (art. 119.º, n.º 2 da C.R.P.) Vacatio legis é o intervalo que decorre entre a publicação e a entrada em vigor da lei. Prazos de vacatio legis: as leis entram em vigor no dia nelas fixado, podendo verificar-se duas situações: encurtar-se o prazo, impondo-se a imediata entrada em vigor do diploma – carácter urgente; dilatar-se o prazo, por necessidade de adaptação ou pela complexidade da matéria. na falta de fixação do dia, as leis entram em vigor no 5.º dia após a publicação. Os referidos prazos contam-se a partir do dia imediato ao da sua disponibilização na Internet. Termo de vigência lei expressa Quanto à forma tácita Revogação Total – ab-rogação Formas de cessação de vigência da lei Quanto à extensão Parcial - derrogação expressa Caducidade Eliminação de pressupostos A hierarquia das leis O facto de existirem várias categorias de leis torna necessário estabelecer entre elas uma certa ordenação, ou hierarquia. A hierarquia das leis implica que : as leis de hierarquia inferior não podem contrariar as de hierarquia superior, antes têm de se conformar com elas; as leis de hierarquia igual ou superior podem contrariar as de hierarquia igual ou inferior, sendo que a lei mais recente revoga a lei mais antiga; acresce que a hierarquia das leis depende da hierarquia das fontes estão contidas. Para estabelecer a hierarquia das leis há que distinguir: leis ou normas constitucionais – as que se encontram contidas na Constituição; leis ou normas ordinárias – são todas as restantes leis e podem agrupar-se em: leis ou normas ordinárias reforçadas; São consideradas, nos termos do art.º 112.º da C.R.P., verdadeiros actos legislativos e provêm de órgãos com competência legislativa: leis; decretos-leis; decretos legislativos regionais. leis ou normas ordinárias comuns; Estão subordinadas às leis ordinárias reforçadas e, em consequência, encontram-se num nível hierárquico abaixo destas; é o caso dos decretos e dos decretos regulamentares. A Assembleia da República é considerada o órgão legislativo por excelência e dela provêm as leis, moções e resoluções art.º 166.º da C.R.P. Porém, só a lei se destina a estabelecer verdadeiras regras jurídicas. •reserva absoluta da competência legislativa – art. 164 •reserva relativa de competência legislativa – art. 165 O Governo, no exercício das suas funções legislativas, emite decretosleis: •do seu poder legislativo próprio art.º 198.º, n.º1, alíneas a) a c) da C.R.P. •do uso de autorizações legislativas que lhe são conferidas pela Assembleia da República art.º 198.º, n.º 1, alínea b) da C.R.P. O Governo, tem ainda competência regulamentar, que exerce através de regulamentos art.º 199.º da C.R.P., sendo o principal órgão com competência regulamentar. Os regulamentos do Governo podem assumir as seguintes formas: •decretos regulamentares; •resoluções do conselho de ministros; •Portarias •despachos normativos e ministeriais; •instruções; •circulares. O facto de tanto as resoluções como as portarias não terem de ser promulgadas (art. 119 n.1 h da CRP)pelo Presidente da República confere-lhes um valor inferior aos decretos regulamentares na hierarquia das leis. Decretos podem provir: •do Presidente da República, é por decreto que o Presidente da República nomeia o Primeiro-ministro e os membros do Governo [art.º 133.º f) e h) da C.R.P.]; •do Governo, pois é por decreto que o Governo aprova os tratados internacionais [art.º 200.º, c) da C.R.P.]. Decretos Legislativos Regionais art.o 112.o, n.º 1 e 4 e art.º227.º, n.º1, a), b) e c) da C.R.P. e competência regulamentar art.º 227.º, n.º1, d) da C.R.P. Poder regulamentar local específico, de entre os quais se destacam as autarquias locais (art.º 241.º da C.R.P.), que, no exercício deste, emitem posturas. Daqui decorre que as posturas ocupam o lugar mais baixo da hierarquia das leis. O costume O costume constitui um outro processo de formação do Direito, essencialmente distinto da lei. No costume, a norma forma-se espontaneamente no meio social, é a própria comunidade que desempenha o papel activo que nas outras fontes pertence a certas autoridades. A base de todo o costume é uma repetição de práticas sociais, que se designa por uso. Assim, podemos definir costume como o conjunto de práticas sociais reiteradas e acompanhadas da convicção de obrigatoriedade. O costume pressupõe a existência de dois elementos: corpus – pratica social constante; animus – convicção de obrigatoriedade. A generalidade dos autores considera o costume como uma fonte mediata. Relação costume-lei •o costume e a lei serem coincidentes (costume secundum legem); •o costume regula matérias que a lei não regula (costume praeter legem); •o costume e a lei terem conteúdos opostos (costume contra legem). Artigo 3. o do Código Civil (Valor jurídico dos usos) 1 Os usos que não forem contrários aos princípios da boa fé são juridicamente atendíveis quando a lei o determine. (...) «Assim, em Direito internacional público valem, não apenas as convenções internacionais, mas também aquele rico manancial de princípios constantes dos costumes.» o costume internacional é aceite sem qualquer contestação - art.º 8.º da C.R.P., vigora directamente na ordem jurídica portuguesa. Vantagem do Costume como fonte de Direito • pela própria natureza da sua formação vai-se adaptando espontaneamente à evolução social (maior flexibilidade) Desvantagens do Costume como fonte de Direito: • problema de segurança na sua vertente de certeza jurídica; • de difícil prova O costume, quer na teoria, quer na prática, assume um relevo muito limitado. A jurisprudência A palavra jurisprudência usa-se frequentemente para designar: a orientação geral seguida pelos tribunais nos diversos casos concretos da vida social; o conjunto das decisões dos tribunais sobre os litígios que lhe são submetidos. O juiz tem de julgar unicamente de «harmonia com a lei e sua consciência» (art.º 8.º do Código Civil). De acordo com o art. 156.º do Código de Processo Civil, as decisões podem assumir a forma de : acórdão – tribunal colegial sentença – tribunal singular despacho – decisão proferida pelo juiz As decisões proferidas pelos diferente tribunais só se tornam definitivas, após trânsito em julgado das mesmas. Artigo 677. o do C.P.C. (Noção de trânsito em julgado) As decisões dos tribunais podem ser impugnadas por via de recurso nos termos do art. 676.º do Código de Processo Civil. O recurso é, assim, o meio processual de que as partes se socorrem para impugnar as decisões judiciais que as não satisfazem, pela devolução do julgamento a um tribunal superior e, deste modo, tentar obter uma nova decisão que vá ao encontro da sua pretensão. Artigo 676. o do C.P.C. (Espécies de recursos) Artigo 678. o do C.P.C. (Decisões que admitem recurso) A jurisprudência é, actualmente, na ordem jurídica portuguesa uma fonte mediata do Direito, embora até à reforma do C.P.C. de 1995, existissem decisões do Supremo Tribunal de Justiça reunido em pleno, denominadas assentos que eram consideradas como fontes imediatas do Direito. Contudo, dada a reconhecida importância que a uniformização da jurisprudência assume, nomeadamente como forma de garantir a segurança, na vertente de certeza jurídica, os referidos assentos foram substituídos pelo «julgamento ampliado de revista» art.º 732.ºA do C.P.CAinda assim, a jurisprudência não é fonte imediata do Direito na actual ordem jurídica portuguesa; no entanto, na medida em que vai explicitando uma determinada consciência jurídica geral, contribui para a formação das normas jurídicas. A doutrina compreende as opiniões ou pareceres dos jurisconsultos sobre a regulamentação adequada das diversas relações sociais, que pode atingir uma relevância tanto maior, quanto maior for o mérito reconhecido dos autores. Na ordem jurídica portuguesa, a doutrina não é considerada fonte do Direito. De facto, o valor de uma opinião, por mais categorizado que seja o jurista que a emite, não lhe confere razão extrínseca, de carácter formal, que a imponha como obrigatória. Quanto muito, será fonte mediata, para acentuar a sua relevância prática e a maneira como contribui, quer para a formação, quer para a revelação do Direito. «A doutrina limitar-se-á, portanto, pelo seu influxo sobre as fontes imediatas do Direito, a provocar alterações na ordem jurídica vigente.» 1.5 Os tratados internacionais Tratado – acordo de vontades, em forma escrita, entre sujeitos de Direito internacional, agindo nessa qualidade, de que resulta a produção de efeitos jurídicos Os tratados internacionais assumem grande relevância no Direito internacional, na medida em que são uma das suas fontes mais importantes, como estabelece o Estatuto do Tribunal Internacional de Justiça (art.º 38.º). 1.5 Os tratados internacionais É corrente distinguir três fases do processo de elaboração de Tratados: negociação assinatura ratificação A ratificação é o acto jurídico individual e solene pelo qual o órgão competente do Estado afirma a vontade deste estar vinculado ao tratado cujo texto foi por ele assinado. 1.5 Os tratados internacionais De acordo com a Constituição da República Portuguesa, as normas constantes dos tratados internacionais, depois de aprovadas pela Assembleia da República [art.º 161.º, i)], ou pelo Governo [art.º 197.º, n.º 1, c)], ratificadas pelo Presidente da República [art.º 135.º, b)] e publicadas em Diário da República, 1.ª série [art.º 119.º, n.º 1, b)], fazem automaticamente parte do Direito português, de acordo com o art.º 8.º, n.º 2. O art.º 8.º, n.º 3, estabelece, também, que as normas emanadas dos órgãos competentes das organizações internacionais a que Portugal pertence vigoram directamente na ordem interna, desde que se encontre previsto expressamente nos respectivos tratados. O problema das fontes do Direito consiste em saber como e onde nascem, como se formam e revelam as normas jurídicas. A expressão fontes do Direito é utilizada em vários sentidos, sendo o que interessa ao nosso estudo o sentido técnico jurídico, que considera como fontes do Direito a lei, o costume, a jurisprudência e a doutrina. Consideram-se leis todas as disposições genéricas provindas dos órgãos estaduais competentes (art.º 1.º, n.º 2, do Código Civil). O termo lei compreende, no entanto, diversos sentidos, nomeadamente: material, formal, amplo e restrito. Na ordem jurídica portuguesa, a lei é considerada a única fonte imediata, sendo todas as restantes consideradas fontes mediatas. Estas não têm força vinculativa própria, mas são importantes na medida em que podem influenciar o processo de formação e revelação das normas jurídicas. A Assembleia da República no âmbito da sua competência legislativa elabora leis, cuja iniciativa das mesmas compete aos deputados, aos grupos parlamentares, ao Governo e a grupos de cidadãos eleitores. O Governo, no âmbito da competência legislativa própria, ou resultante da autorização legislativa concedida pela Assembleia da República, elabora decretos-leis. A actividade legislativa da Assembleia da República e do Governo obedece a processos de feitura próprios, previstos na C.R.P. O Presidente da República intervém no processo legislativo promulgando ou exercendo o direito de veto, nos termos do art.º 136.º da C.R.P. Do Direito interno fazem parte o Direito substantivo e o Direito adjectivo, apresentando -se este último como acessório do primeiro, dado que serve para estipular a forma como o Direito substantivo vai ser aplicado. Para que o cidadão cumpra a lei é necessário que esta lhe seja dada a conhecer, o que se verifica através da sua publicação no jornal oficial que é o Diário da República, 1.ª série. Com a publicação, a lei passa a ser obrigatória, mas isso não significa que entre imediatamente em vigor, pois em geral decorre um intervalo entre a publicação e a sua entrada em vigor, que se denomina vacatio legis. As formas de cessação de vigência da lei são, unicamente, a caducidade e a revogação. A hierarquia das leis pressupõe que entre estas exista uma certa ordenação, da qual resulta que as leis de hierarquia inferior não podem contrariar as de hierarquia superior, antes têm de se conformar com elas; as leis de hierarquia igual ou superior podem contrariar leis de hierarquia igual ou inferior e, então, diz-se que a lei mais recente revoga a lei mais antiga.