UNIVERSIDADE FEDERAL DE CIÊNCIAS DA SAÚDE DE PORTO ALEGRE –
UFCSPA
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HEPATOLOGIA
Márcio Luís Lucas
IMPORTÂNCIA DO ÓXIDO NÍTRICO NA ISQUEMIA E REPERFUSÃO HEPÁTICA
EM RATOS
Porto Alegre
2012
Márcio Luís Lucas
IMPORTÂNCIA DO ÓXIDO NÍTRICO NA ISQUEMIA E REPERFUSÃO HEPÁTICA
EM RATOS
Dissertação submetida ao Programa de PósGraduação em Hepatologia da Fundação
Universidade Federal de Ciências da Saúde
de Porto Alegre como requisito para a
obtenção do grau de Mestre.
Orientador: Dr.Angelo Alves de Mattos
Co-orientadora: Dra.Cláudia Ramos Rhoden
Porto Alegre
2012
L933i
Lucas, Márcio Luís
Importância do óxido nítrico na isquemia e reperfusão hepática em
ratos / Macio Luís Lucas.  Porto Alegre, 2012.
101 f. : il.
Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-Graduação em Hepatologia
– Fundação Universidade Federal de Ciências da saúde de Porto Alegre,
2012.
Orientador: Dr. Ângelo Alves de Mattos
Co-orientador: Dra. Cláudia Ramos Rhoden
1. Óxido nítrico. 2. Isquemia-reperfusão. 3. Fígado. 4. Ratos. 5. Larginina. 6. NG-Nitroarginina Metil Éster. I. Título. II. Mattos, Ângelo Alves
de. III. Rhoden, Cláudia Ramos.
CDD 615.704
Eleonora Liberato Petzhold
CRB 10/1801
AGRADECIMENTOS
À minha querida esposa Elisa, pelo carinho, companheirismo e compreensão
dos momentos que dediquei para fazer esta dissertação;
Aos meus pais e ao meu irmão, pela excelente educação e suporte para a
minha formação profissional;
Ao Professor Angelo Alves de Mattos, pela orientação e inestimável
colaboração para o término deste trabalho;
Aos Professores, Cláudia Ramos Rhoden e Ernani Luiz Rhoden, pelas
oportunidades de produção científica e co-orientação durante a realização deste
trabalho;
Ao Professor Telmo Pedro Bonamigo, pelo estímulo à produção científica e
exemplo de dedicação a ser seguida;
Ao Professor Paulo Roberto Ott Fontes, pela compreensão e apoio para a
finalização deste projeto;
Ao médico Fernando Chemale, pela colaboração na execução de grande
parte deste trabalho;
Ao Professor Cláudio Galeano Zettler, pela participação no estudo através da
análise histo-patológica;
Aos funcionários do Biotério da Universidade Federal de Ciências da Saúde
de Porto Alegre (UFCSPA), o Farmacêutico Alexandre Maslinkiewics e o Técnico em
Biotério Mário Serapião Martins Pereira, pela inestimável colaboração e apoio nos
cuidados e preparo dos animais para os procedimentos experimentais;
À Farmacêutica-Bioquímica Maria Letícia Maya Vasques, do Laboratório da
Disciplina de Farmacologia da UFCSPA, pela análise laboratorial despendida neste
trabalho;
A Terezinha Stein e Rosalva Thereza Meurer, Técnicas em Patologia, pela
preparação das lâminas utilizadas nesta pesquisa;
A todas as pessoas, que de uma forma ou de outra, incentivaram a realização
e promoveram a conclusão deste projeto.
LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS E SÍMBOLOS
7-NI
7-nitro-indazol
ALT
alanina aminotransferase
AMP
momofosfato de adenosina
ANOVA
análise de variança
AST
aspartato aminotransferase
ATP
trifosfato de adenosina
BH4
tetrabiopterina
C
controle (grupo)
Ca+2
cálcio iônico
cNOS
óxido-nítrico sintase constitutiva
CO
monóxido de carbono
CV
congestão vascular
D-NMMA
D-monometil-L-arginina
EAN
espécie ativa de nitrogênio
EAO
espécies ativas de oxigênio
eNOS
óxido nítrico sintase endotelial
EST
esteatose hepática
FAD
dinucleotídeo adenina-flavina
FDRE
fator relaxante derivado do endotélio
FMN
mononucleotídeo flavina-reduzida
GCs
guanilato ciclase solúvel
GMPc
monofosfato de guanosina cíclico
GTP
trifosfato de guanosina
H2O2
peróxido de hidrogênio
HO
hemeoxigenase
ICAM
molécula de adesão intercelular
IL-1
interleucina 1
INF
infiltrado inflamatório
iNOS
óxido nítrico sintase reduzível
IR
isquemia-reperfusão
kD
quilodalton
kD
quilodalton
L-ARG
L-arginina (grupo)
L-ADMA
N- N-dimetil-L-arginina
L-NMMA
N-monometil-L-arginina
L-NA
N-nitro-L-arginina
L-NAA
N-amino-L-arginina
L-NAME
N-nitro-L-arginina metil-éster
L-NIO
N-imino-etil-L-ornitina
L-OHArg
N-hidroxil-L-arginina
LPS
lipopolissacarídeo
L-SDMA
N- N-dimetil-L-arginina
MMP
matrix metaloproteinase
Na+
sódio iônico
NaCl
cloreto de sódio
NADPH
nicotinamida difosfato reduzida
NEC
necrose hepatocitária
NF-κВ
fator nuclear κВ
NH3
amônio
nNOS
óxido nítrico sintase neuronal
NO
óxido nítrico
NOS
óxido nítrico sintase
NO2-
nitrato
NO3-
nitrito
•O2
oxigênio
•O2-
radical superóxido
•OHONOO
radical hidroxil
-
peroxinitrito
SPSS
statistical package to social sciences for Windows
TLR
tool-like receptor
TNF-α
fator de necrose tumoral alfa
UI
unidade internacional
XO
xantina oxidase
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Mecanismo simplificado de relaxamento vascular das células musculares
lisas mediado pelo óxido nítrico (NO).........................................................................17
Figura 2 – Reação de formação do óxido nítrico (NO) a partir de L-arginina............18
Figura 3 – Formação das espécies ativas de oxigênio (EAO) durante a isquemia e
reperfusão tecidual através da via da xantina oxidase..............................................30
Figura 4 – Rato anestesiado, com tricotomia abdominal e marcação do local da
incisão para a realização do procedimento de isquemia-reperfusão hepática..........47
Figura 5 – Fígado exteriorizado, protegido com gazes, sendo realizado pinçamento
hepático seletivo (lobos mediano e esquerdo)................... .......................................49
Figura 6 – Comparação dos níveis de aspartato-aminotransferase (AST) entre os
grupos de animais......................................................................................................55
Figura 7 – Comparação entre os níveis de alanino-aminotransferase (ALT) entre os
grupos de animais......................................................................................................57
Figura 8 – Aspecto microscópico das alterações histopatológicas do fígado de ratos.
A) Aspecto normal de fígado de rato submetido à cirurgia simulada (grupo controle).
B) Áreas de necrose e infiltrado inflamatório em fígado de rato submetido à
isquemia-reperfusão hepática (x 200; hematoxilina-eosina)......................................60
Figura 9 – Efeito da L-arginina nos aspectos histopatológicos nos fígados de ratos
submetidos à isquemia-reperfusão hepática. A) Áreas de esteatose hepática e
congestão vascular de rato submetido à isquemia-reperfusão hepática sem prétratamento (x 200). B) Atenuação das áreas de esteatose e congestão vascular em
ratos pré-tratados com L-arginina (x 400; hematoxilina-eosina)................................61
Figura 10 – Mortalidade dos ratos submetidos à isquemia-reperfusão hepática
normotérmica, tratados ou não com L-NAME ou L-arginina......................................62
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Características gerais das diferentes enzimas óxido nítrico sintases
(NOS).........................................................................................................................20
Tabela 2 – Principais inibidores da enzima óxido nítrico sintase (NOS)....................25
Tabela 3 – Número de animais por grupo usados para a análise das alterações das
enzimas de dano hepatocelular (n=112)....................................................................50
Tabela 4 – Número de animais por grupo usados para a análise das alterações das
histopatológicas (n=63)..............................................................................................52
Tabela 5 – Resultado das alterações histopatológicas do fígado de ratos submetidos
à isquemia-reperfusão hepática, pré-tratados ou não com L-arginina ou L-NAME...59
RESUMO
Objetivo: O óxido nítrico (NO) é um importante mediador em vários processos
fisiológicos,
tais
como
na
isquemia-reperfusão
(IR)
tecidual.
Este
estudo
experimental avaliou o papel da L-arginina (precursora do NO) e do L-NAME
(inibidor da síntese do NO) na isquemia-reperfusão (IR) hepática em ratos.
Material e Métodos: Cento e cinqüenta e dois ratos Wistar machos com
massa corporal entre 220 e 330g foram divididos em quatro grupos: controle
(operação simulada); IR hepática; L-arginina + IR; e L-NAME + IR. O dano
hepatocelular foi avaliado no primeiro, terceiro e sétimo dia após os procedimentos
através dos níveis de aspartato-aminotransferase (AST) e alanina-aminotransferase
(ALT), bem como através das alterações histopatológicas: infiltrado inflamatório
(INF), congestão vascular (CV), esteatose (EST) e necrose (NEC) hepática.
Também foi avaliada a taxa de mortalidade dos animais após os procedimentos.
Diferença estatística foi considerada quando p<0,05.
Resultados: O pré-tratamento com L-NAME piorou, significativamente, os
níveis de AST após a IR hepática no primeiro dia (p<0,05) e a L-arginina demonstrou
um efeito atenuante nos níveis de ALT no sétimo dia (p<0,05). Além disso, a
administração de L-arginina foi capaz de amenizar o grau de CV e EST no sétimo
dia após a IR em ratos (p<0,05). A análise das taxas de mortalidade não demonstrou
diferença estatística significativa entre os grupos.
Conclusão: A via L-arginina/NO desempenha um papel relevante na IR
hepática, com um possível efeito protetor do NO, pois o pré-tratamento com Larginina foi capaz de atenuar parcialmente o dano hepatocelular após a IR hepática
em ratos.
Palavras-chave: Óxido nítrico. Isquemia-reperfusão. Fígado. Ratos. L-arginina. NGNitroarginina Metil Éster.
ABSTRACT
Objective: Nitric oxide (NO) is a relevant mediator in several physiopathologic
processes, as a tecidual isquemia-reperfusion (IR). This experimental study
evaluated the effects of L-arginine (a NO precursor) and L-NAME (an inhibitor of NO
synthesis) in the hepatic ischemia-reperfusion (IR) in rats.
Material and methods: One hundred fifty two male Wistar rats weighting
between 220 and 330g were divided into four groups: control (sham operation);
hepatic IR; pretreatment with L-arginine followed hepatic IR; and L-NAME plus
hepatic IR. The hepatocelluar damage was evaluated at first, third and seventh days
after the procedures throught the alanine-aminotransferase (ALT) and aspartateaminotransaminase (AST) levels, as so as histopathologic features: inflammatory
infiltration (INF), vascular congestion (VC), steatosis (STE) and necrosis (NEC). Also
was evaluated the mortality rate after the procedures. Statistical difference was
considered when p<0,05.
Results: The pretreatment with L-NAME significantly worse the AST levels
after hepatic IR (p<0,05) in the first day and L-arginine demonstrated a attenuate
effect on ALT levels at seventh day (p<0,05). Furthermore, the administration of Larginine was capable to ameliorate the VC and STE in the seventh day after hepatic
IR (p<0,05). The analysis of the mortality rates did not demonstrate any difference
between the groups.
Conclusion: We concluded that the L-arginine/NO pathway has a important
role in the hepatic IR because the pretreatment with L-arginine had partially attenuate
the hepatocellular damage induced by hepatic IR in rats.
Key words: Nitric oxide. Ischemia-reperfusion. Liver. Rats. L-arginine. NGNitroarginine Methyl Ester.
SUMÁRIO
1
INTRODUÇÃO......................................................................................... 14
1.1 Óxido nítrico........................................................................................... 14
1.1.1 Histórico................................................................................................... 14
1.1.2 Características bioquímicas do óxido nítrico ........................................... 15
1.1.3 Mecanismo de ação do óxido nítrico........................................................ 16
1.1.4 Síntese do óxido nítrico: a via L-arginina/NO .......................................... 17
1.1.5 Óxido nítrico sintase ................................................................................ 19
1.1.6 Importância da via L-arginina/NO............................................................ 21
1.2 Moduladores da produção do óxido nítrico ........................................ 22
1.2.1 Doadores de óxido nítrico ........................................................................ 23
1.2.2 Precursores do óxido nítrico.................................................................... 23
1.2.3 Inibidores da produção de óxido nítrico ................................................... 24
1.3 A isquemia-reperfusão hepática........................................................... 26
1.3.1 Espécies ativas de oxigênio na isquemia-reperfusão hepática................ 28
1.3.2 Mediadores inflamatórios e moleculares na isquemia-reperfusão hepática
............................................................................................................................32
1.3.3 Células envolvidas na isquemia-reperfusão hepática .............................. 35
1.3.4 Alterações microcirculatórias na isquemia-reperfusão hepática.............. 37
1.3.5 Morte celular após a isquemia-reperfusão hepática ............................... 38
1.4 Óxido nítrico e IR hepática.................................................................... 39
2
JUSTIFICATIVA ...................................................................................... 41
3
HIPÓTESE DO ESTUDO ........................................................................ 42
4
OBJETIVOS ............................................................................................ 43
4.1 Objetivo geral ......................................................................................... 43
4.2 Objetivos secundários .......................................................................... 43
5
MATERIAIS E MÉTODOS....................................................................... 44
5.1 Delineamento da pesquisa.................................................................... 44
5.2 Amostra e grupos de animais............................................................... 44
5.3 Drogas e diluições ................................................................................. 45
5.4 Administração ........................................................................................ 46
5.5 Anatomia cirúrgica do fígado do rato .................................................. 46
14
5.6 Procedimentos cirúrgicos experimentais............................................ 47
5.6.1 Cirurgia simulada ..................................................................................... 48
5.6.2 Técnica de isquemia e reperfusão hepática em ratos ............................ 48
5.6.3 Técnica de hepatectomia parcial em ratos .............................................. 49
5.7 Experimentos realizados....................................................................... 49
5.7.1 Análise dos níveis séricos das aminotransferases em ratos submetidos à
isquemia-reperfusão hepática normotérmica, pré-tratados ou não com L-arginina ou
com L-NAME .................................................................................................... 50
5.7.1.1 Técnica de coleta de amostra de sangue e análise laboratorial........... 51
5.7.2 Análise das alterações histopatológicas em ratos submetidos à isquemiareperfusão hepática normotérmica, pré-tratados ou não com L-arginina ou com LNAME .............................................................................................................. 51
5.7.2.1 Técnica de análise das alterações histopatológicas ............................ 52
5.7.3 Análise da mortalidade peri-operatória de ratos submetidos à isquemiareperfusão hepática normotérmica, pré-tratados ou não com L-arginina ou com LNAME ............................................................................................................... 53
5.8 Sacrifício dos animais ........................................................................... 53
5.9 Análise estatística.................................................................................. 54
5.10 Normas bioéticas adotadas no estudo ................................................ 54
6
RESULTADOS ........................................................................................ 55
6.1 Análise dos níveis séricos das aminotransferases (AST e ALT) em ratos
submetidos à isquemia-reperfusão hepática normotérmica, pré-tratados ou não
com L-arginina ou com L-NAME ................................................................... 55
6.2 Análise das alterações histopatológicas em ratos submetidos à isquemiareperfusão hepática normotérmica, pré-tratados ou não com L-arginina ou com
L-NAME ........................................................................................................... 58
6.3 Análise da mortalidade peri-operatória de ratos submetidos à isquemiareperfusão hepática normotérmica, pré-tratados ou não com L-arginina ou com
L-NAME ........................................................................................................... 61
7
DISCUSSÃO............................................................................................ 63
7.1 A isquemia e reperfusão hepática........................................................ 63
7.2 Interação entre óxido nítrico e espécies ativas de oxigênio durante a
isquemia e reperfusão hepática.................................................................... 64
7.3 Metodologia empregada no estudo...................................................... 67
7.4 Análise dos níveis séricos das aminotransferases em ratos submetidos à
isquemia-reperfusão hepática normotérmica, pré-tratados ou não com Larginina ou com L-NAME............................................................................... 72
7.5 Análise das alterações histopatológicas em ratos submetidos à isquemiareperfusão hepática normotérmica, pré-tratados ou não com L-arginina ou com
L-NAME ........................................................................................................... 75
7.6 Análise da mortalidade peri-operatória de ratos submetidos à isquemiareperfusão hepática normotérmica, pré-tratados ou não com L-arginina ou com
L-NAME ........................................................................................................... 77
7.7 Perspectivas terapêuticas na isquemia e reperfusão hepática.......... 78
8
CONCLUSÕES........................................................................................ 82
REFERÊNCIAS................................................................................................ 83
14
1 INTRODUÇÃO
1.1 Óxido Nítrico
1.1.1 Histórico
Em 1980, Furchgott e Zawadzki demonstraram que o relaxamento vascular
induzido pela acetilcolina era dependente da presença do endotélio, mediado por um
fator humoral lábil, reconhecido posteriormente como fator relaxante derivado do
endotélio (FRDE) (FURCHGOTT e ZAWADZKI, 1980). Com estudos posteriores,
foram identificadas as características bioquímicas bem como a natureza humoral do
FRDE, sendo uma substância com meia-vida de alguns segundos em solução salina
fisiológica e com atividade relaxante sobre a vasculatura, capaz de inibir a
agregação plaquetária, causar desagregação de plaquetas agregadas, bem como
inibir a adesão plaquetária ao endotélio (GRIFFITH et al., 1984; RADOMSKI et al.,
1987). Com base em experimentos adicionais, nas similaridades de comportamento
farmacológico entre o FRDE e o óxido nítrico (NO), Furchgott (1988) e Ignarro et al.
(1988), simultaneamente, sugeriram que o FRDE poderia ser o NO. No entanto, com
estudos bioquímicos posteriores, demonstrou-se que o FRDE e o NO eram
substâncias indistinguíveis (MONCADA et al., 1988).
Apesar de algumas controvérsias acerca da identidade química do FRDE
como sendo o NO, a maioria poderia ser contestada (MONCADA et al., 1991), sendo
baseadas na variação da meia-vida do FRDE (GRIFFITH et al., 1984), nas diferentes
afinidades do FRDE e do NO a ânions (COCKS et al., 1985), nas diferentes
atividades de relaxamento do FRDE e do NO em preparados de músculo liso
(SHIKANO e BERKOWITZ, 1987), bem como na atividade biológica e estabilidade
bioquímica desses compostos (MURRAY et al.,1986). No entanto, a existência de
mecanismos diversos de relaxamento vascular dependente do endotélio e diferente
daquele mediado pelo NO não pode ser descartada.
Mais tarde, Palmer e Moncada (1989) identificaram a óxido nítrico sintase
(NOS) – enzima responsável pela geração de NO e L-citrulina a partir do aminoácido
15
L-arginina (MONCADA, 1999). A partir de então, esta via começou a se chamar de
via L-arginina/NO.
Com o passar dos anos e com o desenvolvimento das pesquisas, passou-se
a considerar o endotélio vascular como uma “glândula endócrina”, com importante
papel na modulação da homeostasia vascular, bem como na regulação de outras
funções fisiológicas como processo inflamatório, agregação e adesão plaquetárias,
fibrinólise, angiogênese e mecanismos de neurotransmissão (JAFFE, 1985; MARÍN;
RODRIGUES-MARTINEZ, 1997). Além do NO, o endotélio sintetiza várias outras
substâncias tais como endotelina, prostaciclina, fator ativador plaquetário, fator
hiperpolarizante derivado do endotélio, ativador do plasminogênio tecidual,
interleucinas, fator de von Willebrand e vários fatores de crescimento (MARÍN;
RODRIGUES-MARTINEZ, 1997).
Em 1998, a via L-arginina/NO foi tema do Prêmio Nobel em Medicina, mesmo
com a exclusão do nome de Salvador Moncada como um dos pesquisadores a
dividir o prêmio. Cerca de 20 anos passaram-se após a descoberta do NO e a via Larginina/NO
vem
sendo
estudada
extensivamente
em
vários
processos
fisiopatológicos.
1.1.2 Características bioquímicas do óxido nítrico
O NO é um gás incolor, relativamente instável, com hidrossolubilidade
reduzida, sendo um radical livre biatômico ou espécie ativa de nitrogênio (EAN),
contendo um elétron não pareado que pode sofrer várias reações tanto como agente
oxidante fraco como um composto redutor (BRIAN & GRISHAM, 2007; DIAS et al.,
2011). Tem uma meia-vida curta (em torno de 4 segundos), podendo difundir-se
livremente através das membranas biológicas; portanto, com lipossolubilidade
(WELCH; LOSCALZO, 1994, DIAS et al., 2011). Três formas ativas de NO podem
ser descritas: radical livre, nitrosônio, e ânion nitroxil (WELCH; LOSCALZO, 1994;
PARADISE et al., 2010). O NO pode ser detectado no sangue, urina e ar exalado de
humanos e, para conseguir maior estabilidade química, esse gás sofre reações com
o oxigênio (O2), formando radicais nitrito (NO3-) e nitrato (NO2-) (LUCAS; RHODEN,
1999).
16
1.1.3 Mecanismo de ação do óxido nítrico
Vários agentes podem estimular a produção de NO, tais como 5hidroxitriptamina, acetilcolina, trombina, íons cálcio (Ca+2), ácido aracdônico,
alterações na pressão arterial, estímulo elétrico, entre outros (MONCADA et al.,
1991; JIN; LOCALZO, 2010). Em comparação com a prostaciclina, o NO é mais
instável, com meia-vida mais curta (alguns segundos contra aproximadamente 3
minutos), causando antiagregação plaquetária e relaxamento vascular de maneira
diferente à prostaciclina: os efeitos do NO são mediados pela ativação da guanilato
ciclase, enquanto que os efeitos da prostaciclina são mediados pela estimulação da
adenilato ciclase; no entanto, as duas substâncias agem sinergicamente na
antiagregação plaquetária (MARÍN; RODRIGUES-MARTINEZ, 1997; JIN; LOCALZO,
2010).
O mecanismo de relaxamento vascular das células musculares lisas está
simplificado na figura 1. Aos diferentes estímulos, ocorre influxo de Ca+2 para o meio
intracelular, ativando a NOS para formar NO que, por conseguinte, ativa a guanilato
ciclase solúvel, na formação de monofosfato de guanosina cíclico (GMPc) que
promoverá o relaxamento da vasculatura por diferentes mecanismos (DIAS et al.,
2011).
17
FATORES ESTIMULANTES
LÚMEN DO VASO
acetilcolina
Ca+2
bradicinina
shear stress
--------------------------------------------------------------------------------------------------------L-arginina
Ca+2
ENDOTÉLIO
NOS
VASCULAR
NO
--------------------------------------------------------------------------------------------------------CAMADA
MUSCULAR LISA
GTP
GMPc
(GCs)
Relaxamento
Dilatação do vaso
Figura 1. Mecanismo simplificado de relaxamento vascular das células musculares lisas mediado pelo
NO. Alguns estímulos encontrados na luz do vaso, tais como acetilcolina, bradicinina e o shear stress
(força de cisalhamento) favorecem o influxo de Ca+2 para o endotélio vascular, ativando a enzima
NOS na formação de NO a partir de L-arginina. O NO ativa a guanilato ciclase solúvel (GCs) na
formação de monofosfato de guanosina cíclico (GMPc) a partir do trifosfato de guanosina (GTP). O
GMPc favorece o relaxamento da vasculatura, culminando na dilatação do vaso.
1.1.4 Síntese do óxido nítrico: a via L-arginina/NO
Estudos iniciais descartaram a hipótese de que alguns compostos nitrosos
como NO3-, NO2-, amônio e a hidroxilamina poderiam ser fontes de NO (MONCADA
et al., 1991). Em 1988, no entanto, foi demonstrado que o aminoácido L-arginina era
o precursor da síntese de NO em células endoteliais vasculares (PALMER et al.,
1988a). A conversão de L-arginina em NO demonstrou-se ser específica, pois
análogos da L-arginina, incluindo seu D-enantiômero (D-arginina), não serviram de
18
substratos para a produção de NO; além disso, esta conversão pode ser inibida por
um análogo da L-arginina, o N-monometil-L-arginina (L-NMMA) (PALMER et al.,
1988b).
A transformação de L-arginina em NO está representada na figura 2 e envolve
a participação de alguns co-fatores e a enzima NOS, sendo um mecanismo
dependente de nicotinamida difosfatada-reduzida (NADPH) e íons Ca+2, resultando
na formação de L-citrulina e NO (MONCADA & PALMER, 1990; JIN; LOCALZO,
2010).
Co-fatores
(NADPH, FAD, FMN, BH4)
Ca+2
L-arginina
NO + L-citrulina
NOS
Figura 2. Reação de formação de NO a partir de L-arginina. Exige a participação da
enzima NOS e de co-fatores (NADPH: nicotinamida difosfatada-reduzida; FAD:
dinucleotídeo adenina-flavina; FMN – mononucleotideo flavina-reduzida; BH4:
tetrabiopterina).
Uma grande variedade de células pode sintetizar NO a partir de L-arginina,
através da enzima NOS (PALMER et al., 1987). Esta síntese implica a formação de
N-hidroxil-L-arginina (L-OHArg) por intermédio de NADPH e monoxigenação
dependente de BH4 (MONCADA et al., 1991). Basicamente, a formação do NO
envolve dois passos: primeiro, ocorre a formação de L-OHArg a partir oxigenação da
L-arginina (LEONE et al., 1991); e após, ocorre a clivagem da ligação dupla entre
carbono e nitrogênio do L-OHArg para formar citrulina e NO (LEONE et al., 1991;
JIN; LOCALZO, 2010).
Os estímulos fisiológicos para a produção de NO ainda não estão
completamente entendidos, mas o fluxo pulsátil e o estresse de cisalhamento (shear
stress) parecem ser os dois estímulos de maior importância (POHL et al., 1986). O
19
papel de outros fatores, tais como sistema nervoso autônomo ou outras substâncias
vasoativas liberadas pelas próprias células endoteliais que induziriam a produção de
NO ainda não está completamente elucidado (MONCADA et al., 1991).
Provavelmente, o controle vasomotor do tônus vascular dependente do NO é
regulado localmente e é, talvez, um dos mais simples e mais importantes
mecanismos de adaptação no sistema cardiovascular (MONCADA et al., 1991; JIN;
LOCALZO, 2010).
1.1.5 – Óxido nítrico sintase
A enzima NOS está presente em uma variedade de células, sendo
caracterizadas três isoformas de NOS: duas constitutivas (cNOS) e uma induzível
(iNOS). Existem dois sub-tipos de cNOS: uma detectada inicialmente no endotélio
vascular (eNOS); e outra presente no sistema nervoso central e periférico (nNOS)
(MONCADA et al., 1991). Förstemann et al. (1994) também caracterizaram essas
isoformas em I, II e III, sendo que as principais características dessas enzimas estão
descritas na tabela 1.
20
Tabela 1. Características gerais das diferentes enzimas NOS.
Características
nNOS
iNOS
(tipo I; NOS-1)
Células/tecido
eNOS
(tipo II; NOS-2)
cérebro,
(tipoII; NOS-3)
hepatócito,
medula espinhal,
endotélio
condrócito
nervos periféricos
Localização
cromossomo 12
cromossomo 17
cromossomo 7
161 kD
131kD
133kD
alta(microcomoles)
baixa (picomoles)
Massa molecular
Produção de NO
baixa (picomoles)
Estímulo
citocinas, LPS bacteriano
acetilcolina,
bradicinina
Fisiopatologia
sinalização celular
citotóxica,
(p.ex., memória)
citostática,
sinalização celular
(p.ex., vasodilatação)
citoprotetora
Regulação
Ca+2, calmodulina
expressão gênica
Ca+2, calmodulina
A nNOS está expressa principalmente no cérebro, medula espinhal, gânglios
simpáticos e nervos periféricos, produzindo pequenas quantidades de NO no
processo de sinalização celular. A enzima iNOS é responsável pela produção de
grandes quantidades de NO no processo de resposta inflamatória, estando presente,
fundamentalmente
nos
hepatócitos.
Por
último,
a
eNOS
produz
baixas
concentrações de NO pelo endotélio vascular, responsável pela vasodilatação
(MARÍN; RODRIGUES-MARTINEZ, 1997, TODA; OKAMURA, 2003).
Os genes codificadores dessas isoenzimas têm sido identificados, estando
localizados nos cromossomos 12, 17 e 7, respectivamente para as enzimas nNOS,
iNOS e eNOS (XU et al., 1993; MARSDEN et al., 1993).
As três isoenzimas usam L-arginina, bem como oxigênio molecular e NADPH,
em reações catalisadas, sendo que necessitam de alguns co-fatores (MARÍN;
RODRIGUES-MARTINEZ, 1997; FÖRSTERMANN et al., 1994; LUCAS; RHODEN,
1999; FÖRSTEMANN; SESSA, 2012).
21
A iNOS produz, em tempo prolongado, grandes quantidades de NO, ao passo
que a eNOS e a nNOS produzem pequenas quantidades de NO (MONCADA et al.,
1991). Além disso, a eNOS e a nNOS são inibidas competitivamente pelo L-NMMA e
outros análogos da L-arginina mas somente a iNOS é inibida por corticosteróides
(MONCADA et al., 1991).
1.1.6 Importância da via L-arginina/NO
A partir da descoberta da formação do NO a partir da L-arginina por diferentes
tipos de células e elucidação de alguns de seus papéis em mecanismos
fisiopatológicos nos últimos 20 anos, novas perspectivas terapêuticas surgiram em
muitas áreas de pesquisa.
Assim, a importância da via L-arginina/NO tem-se demonstrado em diversas
áreas, tais como no sistema cardiovascular, através da mediação de alterações
responsáveis pelo desenvolvimento da hipertensão arterial e da aterosclerose e na
fisipatogenia da insuficiência cardíaca e do infarto do miocárdio (MARIN &
RODRIGUES-MARTINEZ, 1997; ELAHI et al., 2009; AFANASEV, 2011). A disfunção
endotelial causada pela hiperglicemia em pacientes diabéticos também parece ser
mediada pela ação do NO (DAVEL et al., 2011).
A importância do NO como neurotransmissor e modulador de processos
fisiopatológicos no sistema nervoso central e periférico tem sido descrita e analisada
em algumas revisões (GUIX et al., 2005; GARTHWAITE, 2008). A atividade da
nNOS tem sido associada com a percepção da dor, controle do sono, apetite e
temperatura corporal, bem como desenvolvimento neural e plasticidade sináptica
(GUIX et al., 2005). Além disso, quando em altas concentrações, o NO gera o radical
peroxinitrito (•ONNO-), que pode causar estresse oxidativo e participar do processo
fisiopatológico de várias doenças neurodegenerativas como doença de Alzheimer,
doença de Parkinson, doença de Huntington, esclerose múltipla e isquemia cerebral
(GARTHWAITE, 2008).
A via da L-arginina/NO também tem sido implicada nas alterações
hemodinâmicas na resposta inflamatória em processos infecciosos tais como a
sepse, principalmente através da ação do lipopolissacarídeo bacteriano, uma
22
endoxina produzida por micro-organismos, que pode interagir com receptores
específicos de macrófagos, produzindo um complexo inflamatório que causa
liberação de citocinas, tais como a IL-1 (interleucina 1) e o fator de necrose tumoral
alfa (TNF- ) com potentes efeitos inflamatórios que estimulam a iNOS a produzir
grandes quantidades de NO que pode provocar citotoxicidade, aumento da
permeabilidade,
com
vasodilatação,
hipotensão
e
depressão
miocárdica
(PARRILLO, 1993; ANDRADES et al., 2011). O NO pode mediar reações
imunológicas, nas quais há ativação de macrófagos por diferentes antígenos ou
micro-organismos, capaz de induzir a uma produção de NO, principalmente pela
iNOS, causando efeito citotóxico ou citostático em células tumorais ou microorganismos invasivos (LUCAS; RHODEN, 1999).
1.2 Moduladores da produção do óxido nítrico
Através
de
estudos
fundamentalmente
experimentais,
obteve-se
um
conhecimento amplo e difuso da participação da via L-arginina/NO em processos
fisiopatológicos, aventando a hipótese de uso de mediadores da produção do NO
em diversas situações. Nesta perspectiva, várias revisões foram publicadas acerca
do potencial terapêutico na modulação da via L-arginina/NO (MONCADA et al.,
1991;
MARÍN;
RODRIGUES-MARTINEZ,
1997;
LUCAS;
RHODEN,
1999;
HESSLINGER et al., 2009; JOUBERT; MALAN, 2011; CAPLIN; LEIPER, 2012). A
modulação da biodisponibilidade do NO pode ser alcançada por diversos tipos de
substâncias, entre as quais os doadores de NO (proporcionam NO em reações não
mediadas por enzimas), os precursores do NO (substratos que necessitam de uma
reação enzimática e co-fatores para gerarem NO) e os inibidores da produção de
NO (inibem fundamentalmente a enzima NOS) (MARÍN; RODRIGUES-MARTINEZ,
1997; ELAHI et al., 2009).
23
1.2.1 – Doadores de óxido nítrico
Há muitos anos, os nitrovasodilatadores vêm sendo utilizados em algumas
condições clínicas como síndrome coronariana aguda, insuficiência cardíaca
congestiva, emergências hipertensivas e hipertensão pulmonar; no entanto, pouco
se sabia acerca do modo de ação dessas substâncias (MONCADA et al., 1991;
MAYER; BERETTA, 2008). Schultz et al. (1977) e Katsuki et al. (1977)
demonstraram que esses nitratos orgânicos induzíam a um aumento nos níveis de
GMPc em células musculares lisas. Alguns vasodilatadores, como o nitroprussiato
de sódio, liberam NO espontaneamente; outros, tais como os nitratos orgânicos,
necessitam de interação com outras substâncias e reações mais complexas para
liberar o NO (MONCADA et al., 1991; MAYER; BERETTA, 2008). No entanto, os
estudos sugerem que o NO é a molécula efetora final comum de todos os
nitrovasodilatadores que ativam a GCs (MONCADA et al., 1991).
Os nitrovasodilatadores podem ser classificados em: nitratos orgânicos,
nitritos orgânicos, compostos nitrosos inorgânicos, sidnoniminas e S-nitrosotióis
(MONCADA; HIGGS, 1995). Todos esses compostos são doadores de NO, pois
agem como pró-drogas, exercendo seus efeitos através da biotransformação nãoenzimática em NO (MONCADA; HIGGS, 1995). O efeito principal desses compostos
é a ação vasodilatadora no leito arterial e venoso (MARÍN; RODRIGUESMARTINEZ, 1997; MAYER; BERETTA, 2008).
1.2.2 – Precursores do óxido nítrico
O aminoácido L-arginina é essencial para o desenvolvimento e serve de
substrato para diferentes enzimas, tais como arginase, NOS e argininadecarboxilase (NAKAKI; KATO, 1994). L-arginina também é precursor de NO através
da via da NOS ou da via da arginina-carboxilase, que catalisa a transformação de Larginina em agmatina nas células endoteliais, produzindo efeito relaxante
dependente do endotélio mediado pela formação de NO, sendo, portanto, uma via
alternativa de biossíntese de NO (NAKAKI; KATO, 1994; DIOGUARDI, 2011). Em
24
seres humanos sadios, a administração de L-arginina provoca hipotensão, que
parece ser devido à estimulação da produção de NO (NAKAKI; KATO, 1994). Por
outro lado, em pacientes hipertensos ou hipercolesterolêmicos, a L-arginina pode
diminuir a pressão arterial e melhorar o relaxamento dependente do endotélio
(MARÍN; RODRIGUES-MARTINEZ, 1997). Revisões recentes contra-indicam, de
forma sistemática, a suplementação alimentar com arginina, sendo preconizada uma
quantidade balanceada para que haja uma disponibilidade controlada de seus
derivados (p.ex., NO) (DIOGUARDI, 2011).
1.2.3 – Inibidores da produção de óxido nítrico
Alguns análogos do aminoácido L-arginina agem fundamentalmente na
inibição competitiva pela NOS. A principal conseqüência disso é a diminuição na
produção de NO pelos diferentes sub-tipos de NOS (LUCAS; RHODEN, 1999). Os
inibidores da NOS (tabela 2) têm grande utilidade, pois ajudam a esclarecer as
funções da via L-arginina/NO com grande potencial clínico, pois parecem ser novas
opções terapêuticas para diversas situações patológicas.
Alguns derivados da guanidina foram analisados como possíveis inibidores da
NOS. A dimetil-guanidina atenuou a expressão da cNOS, enquanto que a
diaminoguanidina e a aminoguanidina inibiram a iNOS. Não se sabe se esses
compostos são competitivos, não-competitivos ou inibidores irreversíveis da NOS
(HASAN et al., 1993). Alguns inibidores da protease sérica, como o N-tosil-Lfenilalanina-clorometil-cetona e o N-tosil-L-lisina-clorometil-cetona, mostraram-se
capazes em diminuir a expressão da iNOS induzida por interferon
e lipo-
polissacarídeo bacteriano. Estes compostos são capazes de bloquearem a ativação
do fator nuclear NF-, um fator necessário para a transcrição da NOS (KIM et
al., 1995).
25
Tabela 2. Principais inibidores da enzima óxido nítrico sintase (NOS).
Sigla
Descrição
L-ADMA
L-SDMA
L-NA
L-NAA
L-NAME
L-NIO
L-NMMA
L-OHArg
N-dimetil-L-arginina assimétrica
N-dimetil-L-arginina simétrica
N-nitro-L-arginina
N-amino-L-arginina
N-nitro-L-arginina metil-éster
N-imino-etil-L-ornitina
N-monometil-L-arginina
N-hidroxil-L-arginina
Aminoguanidina
L-canavanina
7-nitroindazol
7-NI
Estudos experimentais iniciais in vitro demonstraram que o L-NMMA era um
inibidor competitivo da NOS (PALMER; MONCADA, 1989), sendo capaz de induzir a
constrição vascular dependente do endotélio em estudos envolvendo tiras de aorta
de coelhos (PALMER et al., 1988a); além disso, inibiu o relaxamento dependente do
endotélio induzido por acetilcolina (REES et al., 1989a).
Outros estudos in vivo também demonstraram que a administração de LNMMA e não de D-monometil-L-arginina (D-NMMA) induziu a um aumento na
pressão arterial em coelhos, porcos e ratos, sendo este aumento revertido com L- e
não com D-arginina (REES et al., 1989b; GARDINER et al., 1990). O aumento na
pressão arterial induzido pelo L-NMMA foi acompanhado por aumento na resistência
vascular periférica e visceral (GARDINER et al., 1990). Estes efeitos também foram
observados em seres humanos (VALLANCE et al., 1989).
Na
microcirculação,
demonstrou-se
que
os
efeitos
hemodinâmicos
(vasoconstrição) exercidos pelo L-NMMA foram mais proeminentes no seguimento
arteriolar e não venular (REES et al., 1990).
Embora os experimentos iniciais envolvessem mais frequentemente o uso do
L-NMMA, outros análogos da L-arginina também foram identificados como inibidores
da síntese de NO vascular (LEIPER; VALLANCE, 1999). Neste contexto, o L-NA é
um inibidor da NOS que mostrou efeitos similares aos do L-NMMA no tecido
vascular in vitro (MOORE et al., 1989). Além desse, o L-NIO e o L-NAME também
26
demonstraram efeitos no tecido vascular semelhantes aos do L-NMMA (REES et al.,
1990). Todos estes compostos inibiram a eNOS, embora o L-NIO demonstrou uma
potência 5 vezes maior (REES et al., 1990).
Os inibidores da NOS o fazem de forma irreversível, competindo com Larginina pela NOS. Alguns inibidores da NOS, tais como o L-NMMA e o L-NIO,
parecem competir com L-arginina pelo transportador y+ (KERWIN et al., 1995).
Portanto, existem diferentes inibidores da NOS descritos na literatura, sendo
os mais citados L-NMMA, L-NA e seu metil-éster, o L-NAME, e a aminoguanidina
(ALDERTON et al., 2001). O inibidor L-NAME necessita de hidrólise do radical metiléster pelas esterases celulares para se tornar no inibidor funcional L-NA, que por
sua vez, inibe de forma seletiva as enzimas nNOS e eNOS (GRIFFITH; KILBOURN,
1996). Por outro lado, o L-NMMA inibe de forma não-seletiva as isoformas iNOS,
nNOS e eNOS e a aminoguanidina é um inibidor altamente parcial da iNOS
(ALDERTON et al., 2001).
1.3 A Isquemia e reperfusão hepática
A isquemia e reperfusão (IR) tecidual é um evento fisiopatológico em que
ocorre, primariamente, a privação de oxigênio, seguido de restabelecimento do fluxo
de sangue ao órgão envolvido. Embora ocorra um dano tecidual significativo
resultante da privação sangüínea, a lesão tecidual originada durante a reperfusão é
mais grave (McCORD, 1985; RHODEN et al., 1996; JASSEM; ROAKE, 1998;
DOGAN; ASLAN, 2011; WANG et al., 2011; ELTZSCHIG; ECKLE, 2011). No fígado,
a IR hepática pode causar dano tecidual significativo em diferentes situações
clínicas, tais como nas cirurgias de ressecção hepática através da manobra de
Pringle; transplante hepático; e em situações de hipóxia, como choque (séptico,
hipovolêmico ou cardiogênico), cirurgia cardíaca com circulação extra-corpórea e
síndrome compartimental abdominal (TEOH; FARRELL, 2003; ILDEFONSO; ARIASDÍAZ, 2010; WALSH et al., 2009; MONTALVO-JAVE et al., 2008; DOGAN; ASLAN,
2011).
A lesão hepática de IR é um processo complexo que engloba diferentes vias
metabólicas, tanto moleculares quanto celulares. As espécies ativas de oxigênio
27
(EAO), mediadores inflamatórios e alguns tipos celulares, como as células linfóides
desempenham um papel crucial na fisiopatologia desse tipo de lesão. A
compreensão da seqüência de eventos que envolvem a IR hepática é de suma
importância no planejamento terapêutico para evitar as sérias conseqüências, tais
como a perda do enxerto transplantado (WALSH et al., 2009; ILDEFONSO; ARIASDÍAZ, 2010).
Uma complexa rede de eventos intra e extra-hepáticos está envolvida na
fisiopatologia da IR hepática. Nesse contexto, são distintas, basicamente, três fases
de lesão:
- fase da isquemia: com a privação de oxigênio no tecido hepático, pode haver
alteração do pH com tendência à acidose pela glicólise anaeróbica e hidrólise de
moléculas de trifosfato de adenosina (ATP) (XIA et. al., 1996; DOGAN; ASLAN,
2011); bem como alteração no transporte de íons com aumento do influxo de íons
sódio (Na+) e Ca+2 para o meio intracelular, havendo edema celular e estímulo à
produção de EAO na fase de reperfusão (TEOH; FARRELL, 2003). Concomitante à
diminuição do aporte de O2, também há um aumento na expressão da arginase
(enzima que degrada a L-arginina), diminuindo as reservas de NO durante a fase
isquêmica (TEOH; FARRELL, 2003);
- fase aguda de reperfusão: compreende as primeiras 2 a 6 horas de reperfusão,
onde o principal acontecimento é a ativação das células de Kupffer e produção de
EAO (JAESCHKE; FARHOOD, 1991; IKEDA et al., 1992). A ativação celular é
mediada pelo sistema do complemento e ativação de linfócitos T (LENTSCH et al.,
2000; TEOH; FARRELL, 2003; ILDEFONSO; ARIAS-DÍAZ, 2010). Com a
restauração do fluxo sanguíneo, ocorre também um aumento do pH tecidual,
havendo uma aceleração para a morte celular, fenômeno conhecido como “paradoxo
do pH” (TEOH; FARRELL, 2003);
- fase tardia de reperfusão: compreende o período após as 6 horas de reperfusão e
se caracteriza pela infiltração massiva de neutrófilos, alcançando o máximo em 18 a
24 horas da reperfusão. Os neutrófilos liberam mais EAO e proteases que causam
estresse oxidativo e lesão hepatocelular. Há também o recrutamento de
polimorfonucleares para o fígado, sendo secundário a uma série de eventos, tais
28
como: liberação de fatores quimiotáticos; produção de mediadores inflamatórios tais
como TNF-α e IL-1 (SUZUKI; TOLEDO-PEREYRA, 1994; LINFERT et al., 2009);
produção de moléculas de adesão intercelular pelas células endoteliais (SCOAZEC
et al., 1994); e lesão na microcirculação (LENTSCH et al., 2000; TEOH; FARRELL,
2003; ILDEFONSO; ARIAS-DÍAZ, 2010).
1.3.1 Espécies ativas de oxigênio na IR hepática
As EAO, bem como as EAN são produtos do metabolismo celular normal,
sendo consideradas moléculas contendo um ou mais elétrons não-pareados em
órbitas atômica ou molecular, conferindo-lhes grande reatividade (DRÖGE, 2002;
VALKO et al., 2007). O acréscimo de um elétron ao oxigênio molecular forma o
radical superóxido (•O2-), uma EAO primária e que pode interagir com outras
moléculas para gerar as EAO secundárias, tais como o peróxido de hidrogênio
(H2O2) e o radical hidroxil (•OH-), através de processos enzimáticos ou nãoenzimáticos (VALKO et al., 2007).
As EAO e as EAN são conhecidas por desenvolver tanto papéis benéficos
como deletérios nos sistemas (VALKO et al., 2007). Efeitos benéficos das EAO
ocorrem em concentrações baixas a moderadas e envolvem situações fisiológicas
na resposta celular à anóxia, como na defesa contra agentes infecciosos, na
sinalização celular e na indução da resposta mitogência (DRÖGE, 2002; VALKO et
al., 2007). O efeito deletério das EAO e das EAN que causa dano biológico potencial
é chamado de estresse oxidativo e estresse nitrosativo, respectivamente (DRÖGE,
2002; VALKO et al., 2007). Este processo ocorre quando há um aumento
significativo na produção de EAO ou EAN, ou uma redução e deficiência nos
sistemas enzimáticos ou não-enzimáticos antioxidantes. Em outras palavras, o
estresse oxidativo resulta de reações metabólicas que usam o oxigênio e que
representa um distúrbio no equilíbrio do estado pró-oxidante/antioxidante dos
organismos vivos (VALKO et al., 2007).
O excesso de EAO pode causar fundamentalmente dano nos lipídios,
proteínas e material genético celular, inibindo suas funções normais. Por causa
disto, o estresse oxidativo tem sido implicado em um número de situações
29
patológicas, tais como doenças cardiovasculares, câncer, distúrbios neurológicos,
diabete, alterações degenerativas relacionadas ao envelhecimento, processos
inflamatórios, bem como na IR tecidual (DRÖGE, 2002; DALLE-DONNE et al.,
2006). Essas doenças são agrupadas basicamente conforme a principal fonte de
EAO: doenças com predomínio do estresse oxidativo mitocondrial (p.ex., diabete e
câncer) e doenças em que a produção das EAO é secundária principalmente à
atividade aumentada da enzima NADPH-oxidase (p.ex., aterosclerose e inflamação)
ou da enzima xantina oxidase (XO) (p.ex., lesão de IR) (DRÖGE, 2002; VALKO et
al., 2007).
Na IR, a produção das EAO é considerado um importante fator de lesão
tecidual em vários órgãos, tais como fígado, rim, músculo, coração, intestino e
cérebro (McCORD, 1985; RHODEN et al., 2000a; RHODEN et al., 2000b;
CERQUEIRA et al., 2005).
Conforme o trabalho precursor de McCord (1985), na IR tecidual, a enzima
xantina de-hidrogenase é convertida em XO, tendo O2 como substrato. Durante o
período isquêmico, o consumo excessivo de ATP leva a um acúmulo de hipoxantina
e xantina, que no período de reperfusão, com o influxo de O2, são metabolizados
pela enzima XO, levando a uma produção exagerada de •O2- e H2O2 (McCORD,
1985) (Figura 3).
30
I
ATP
S
Q
AMP
U
E
xantina deidrogenase
adenosina
M
I
inosina
xantina oxidase
A
•O2-
Hipoxantina
REPERFUSÃO
(O2)
Figura 3 - Formação das espécies ativas de oxigênio (EAO) durante a isquemia
e reperfusão tecidual através da via da xantina oxidase. Durante a isquemia, há
uma depleção dos níveis de trifosfato de adenosina (ATP), com metabolismo até
hipoxantina que, com a restauração do fluxo de sangue, favorece a formação de
radicais •O2-. (AMP: monofosfato de adenosina).
Durante a IR tecidual, as EAO, como o radical •O2-, o •OH- e o H2O2 podem
produzir injúria celular através de reações de peroxidação lipídica das membranas
mitocondriais, lisossômicas e plasmáticas, alterando, então, a estrutura e a função
dessas membranas (McCORD, 1985). No fígado, os efeitos citotóxicos das EAO
podem-se dever também à nitrosilação de grupos ferro-enxofre e resíduos de
tirosina e inativação de radicais heme (ROMANQUE et al., 2005). Estas reações são
responsáveis pela alteração do metabolismo energético, homeostasia do Ca+2, bem
como redução da fosforilação oxidativa mitocondrial e liberação inapropriada de
enzimas líticas lisossômicas que acelerariam o processo de degradação celular, com
conseqüente diminuição da função hepática (RHODEN et al., 1996; JASSEM;
ROAKE, 1998; DOGAN; ASLAN, 2011).
Muitos autores acreditam que a maior fonte de EAO seja a via da XO, enzima
amplamente encontrada no intestino, pulmões e fígado (MARUBAYASHI et al.,
1991; COHEN, 1992; JAESCHKE; WOOLBRIGHT, 2012). Assim, durante a fase
isquêmica, há uma degradação acelerada das moléculas de ATP, influxo aumentado
de Ca+2 para o meio intracelular, bem como um aumento na atividade de algumas
31
enzimas (proteases, fosfolipases). Dependendo do tempo e intensidade da
isquemia, quando o oxigênio é reintroduzido aos tecidos, a lesão tecidual pode ser
exacerbada (efeito paradoxal do oxigênio) (McCORD, 1985; SZÖCS, 2004; ZHANG
et al., 2007).
Além de causar estresse oxidativo, as EAO interagem com outras vias
metabólicas, provocando lesão através de:
- aumento da expressão de genes pró-inflamatórios (TNF-, IL-1 e moléculas
de adesão intercelular) (LENTSCH et al., 2000);
- indução de fatores de transcrição, tais como o NF- (ZWACKA et al., 1998;
LLACUNA et al., 2009);
- indução e regulação da morte celular (RUDIGER; CLAVIEN, 2002);
- inativação de proteases (JAESCHKE, 2000);
- formação de •ONOO-, através da interação com o NO (VARDANIAN et al.,
2008);
- ativação do sistema tool-like receptor (TLR) (VARDANIAN et al., 2008).
Várias substâncias têm-se demonstrado eficazes em diminuir a lesão
provocada pelas EAO. Em nosso meio, foi evidenciado um efeito benéfico do
alopurinol (inibidor da XO) sobre a lesão causada pelas EAO durante a IR hepática e
renal em ratos (RHODEN et al., 2000a; RHODEN et al., 2000b). Além do alopurinol,
a superóxido dismutase (enzima capaz de inativar o radical •O2-); a dimetiltiouréia, o
-tocoferol e o ascorbato (que inativam o radical •OH-), a catalase (inativadora do
radical H2O2); o 21-aminoesteróide U74006F (inibidor da peroxidação lipídica
dependente do ferro); o probucol (inibidor da oxidação de lipoproteínas de baixa
densidade); o ATP; os inibidores dos canais de Ca+2; o manitol e o furosemide
também demonstraram efeito protetor na lesão induzida pelas EAO (MARZI et al.,
1992; DEFRAIGNE et al., 1994; DOGAN; ASLAN, 2011). Outros protetores da lesão
hepática secundária à IR são: carnosina (BAYKARA et al., 2009), N-acetilcisteína
(SENER et al., 2003), análogos da prostaglandina E1 (BÜLBÜLLER et al., 2003),
edaravone (MCI-186) (HIRANUMA et al., 2007), sulfonato mercaptoetano (SENER et
al., 2005), ácido α-lipóico (DULUNDU et al., 2007), metaloporfirina (WU et al., 2007),
32
melatonina (BÜLBÜLLER et al., 2003), resveratrol (KIRIMLIOGLU et al., 2008), e
curcumina (LIN et al., 2012).
1.3.2 Mediadores inflamatórios e moleculares na IR hepática
Vários mediadores inflamatórios e moleculares têm sido implicados na
fisiopatologia da IR hepática. Entre eles, destaca-se o envolvimento das EAO e do
NO, bem como a participação do sistema do complemento e do sistema TLR, as
citocinas,
as
quimiocinas,
as
moléculas
de
adesão
intercelular,
as
metaloproteinases, as heat shock proteins (tais como a hemeoxigenase - HO) e os
fatores de transcrição gênica, como o NF-. Todos esses fatores interagem entre si
e com outros elementos, resultando na lesão secundária à IR hepática.
O sistema de complemento consiste em cerca de 30 proteínas ligadas à
membrana celular que podem ser ativadas por diferentes tipos de estímulos,
inclusive a IR hepática (MONTALVO-JAVE et al., 2008). Uma vez ativado, o sistema
de complemento pode agir através de estimulação indireta na produção de agentes
quimiotáxicos e citocinas pró-inflamatórias, resultando em migração e adesão de
leucócitos e neutrófilos dentro dos sinusóides (JAESCHKE et al., 1993; GORSUCH
et al., 2012).
O sistema TLR é um mecanismo de defesa contra micro-organismos, sendo
homólogo ao sistema de proteínas presentes na Drosophila e tem sido implicado
recentemente como modulador da lesão hepática induzida pela IR (VARDANIAN et
al., 2008; WALSH et al., 2009). Esse grupo de proteínas pode ser expresso em uma
variedade de células, incluindo macrófagos, monócitos e células dendríticas
(VARDANIAN et al., 2008). A ativação do sistema TLR leva à produção de citocinas
e outras moléculas inflamatórias que potencializam o dano tecidual na IR
(VARDANIAN et al., 2008). Assim, como verificado por alguns autores, a modulação
deste sistema pode trazer efeitos benéficos na IR hepática (WALSH et al., 2009).
Por outro lado, durante a IR hepática, a oclusão da veia porta resulta em congestão
da parede intestinal, levando à liberação de moléculas, incluindo endotoxinas que
podem ativar o sistema TLR (VARDANIAN et al., 2008).
33
As citocinas são importantes mediadores na lesão induzida pela IR hepática,
iniciando e mantendo o processo inflamatório (MONTALVO-JAVE et al., 2008;
WALSH et al., 2009). Entre elas, as mais estudadas são o TNF-α e a IL-1
(MONTALVO-JAVE et al., 2008). O TNF-α é uma citocina produzida por diversos
tipos celulares sob vários estímulos inflamatórios e imunológicos (TEOH; FARRELL,
2003). Na IR hepática, o TNF-α parece agir na mitocôndria, estimulando a produção
de EAO pelas células de Kupffer, contribuindo, assim, com efeitos citotóxicos
(GOOSENS et al., 1995; SHIBUYA et al., 1997). Além disso, o TNF-α estimula a
produção de moléculas de adesão e de quimiocinas (LENTSCH et al., 2000). Por
outro lado, a IL-1 promove a produção de EAO e TNF-α (TEOH; FARRELL, 2003) e
o seu envolvimento na IR hepática também parece relacionar-se com a indução da
iNOS (YANAGIDA et al., 2004). Os níveis de TNF-α e IL-1 estão aumentados
durante a IR hepática e sua neutralização diminui a intensidade da lesão
(SHIRASUGI et al., 1997). Alguns autores acreditam que o TNF-α desempenha um
papel ambíguo no fígado durante o processo de IR hepática; pois pode atuar como
mediador da morte celular como também induzir a proliferação hepatocitária e
regeneração hepática (JAESCHKE; LEMASTERS, 2003).
As quimiocinas são proteínas de baixo peso molecular que agem como
quimioatraentes
de
células
inflamatórias,
principalmente
os
leucócitos
(FRANGOGIANNIS, 2007). A produção da quimiocina ENA-78 é induzida pelo TNFα, contribuindo para a sequestração de neutrófilos (COLLETTI et al., 1995). Outra
quimiocina que parece estar envolvida no processo de IR tecidual é a IL-8, um
potente quimiotático neutrofílico que parece se correlacionar com o grau de
infiltração neutrofílica na IR hepática (MONTALVO-JAVE et al., 2008).
As moléculas de adesão são glicoproteínas de superfície celular envolvidas
nas interações entre as células e entre essas e a matriz extracelular, sendo divididas
em selectinas, integrinas e imunoglobulinas (MARTINEZ-MIER et al., 2000). As
selectinas são expressas nas células endoteliais, plaquetas e leucócitos e medeiam
a capturação, rolamento e adesão dos leucócitos (TAKADA et al., 1997). Estas
moléculas de adesão estão envolvidas no processo de IR hepática na infiltração
celular e sinalização molecular (CALVEY; TOLEDO-PEREYRA, 2007). Existem três
tipos de selectinas: E, L e P. O grupo da P-selectina parece ser o mais importante
durante a IR hepática, demonstrando um pico de ação 20 minutos após a
reperfusão, extendendo-se nas próximas 5 horas (ZIBARI et al., 1998). As moléculas
34
de adesão intercelular (ICAM) são glicoproteínas semelhantes às imunoglobulinas,
sendo identificadas como ICAM-1, 2 e 3, dependendo da habilidade em interagir
com as integrinas (YADAV et al., 1998). A interação entre ICAM e integrina facilita o
extravasamento neutrofílico em locais inflamatórios (TEOH; FARRELL, 2003). O
bloqueio da ICAM-1 com um anticorpo específico reduziu significativamente a lesão
hepática em um modelo de IR em ratos (NAKANO et al., 1995).
A familia das metaloproteinases é um grupo de 24 endopeptidases
dependentes de zinco, secretadas fundamentalmente pelas células T, monócitos e
macrófagos, que têm um importante papel nas respostas celulares, incluindo a
degradação dos componentes da matriz extracelular (FOWELL; BENYON, 2008).
Alguns estudos demonstraram que as metaloproteinases têm um papel fundamental
na IR hepática, havendo um aumento de sua expressão na reperfusão,
correlacionando-se com a produção de EAO e com o grau de lesão hepática
(FOWELL; BENYON, 2008; WALSH et al., 2009). Além disso, o dano causado
durante a IR hepática parece depender do balanço entre a produção de
metaloproteinases e seus inibidores (WALSH et al., 2009). Em seres humanos,
apenas a matrix-metaloproteinase 9 (MMP-9) parece estar envolvida no processo de
IR hepática (KUYVENHOVEN et al., 2004).
Durante a IR hepática, a oxidação protéica provocada pelas EAO leva à
ativação das heat shock proteins que subsequentemente ativam o sistema TLR
(VARDANIAN et al., 2008). Entre essas proteínas, ressalta-se a importância da HO,
que é caracterizada por uma enzima catalizadora de degradação do radical heme
em ferro, monóxido de carbono (CO) e bileverdina, existente em duas formas: HO-1
(induzida pelo estresse oxidativo) e a HO-2 (constitutiva) (MAINES, 1997). A indução
dessa enzima tem sido benéfica na IR hepática pela redução do estresse oxidativo,
apoptose e processo inflamatório (XUE et al., 2007), sendo o efeito atribuído, ao
menos em parte, pelos produtos de degradação do radical heme, principalmente o
CO (AMERSI et al., 2002). Além disso, o tratamento com bileverdina diminuiu o dano
tecidual em um modelo de transplante hepático em ratos, através da redução do
grau de apoptose e da atividade inflamatória (TANG et al., 2007). Ainda, a inalação
de CO também atenuou o dano tecidual da IR pela diminuição da resposta
inflamatória e da infiltração neutrofílica (KAIZU et al., 2005).
Em modelo de
transplante hepático em ratos, a supressão da HO-1 atenuou a expressão da iNOS e
resultou em melhora na sobrevida do enxerto (COITO et al., 2002). Outras heat
35
shock proteins podem ligar-se ao sistema TLR, sinalizando o NF- para aumentar a
produção de proteínas inflamatórias pelos macrófagos (WALSH et al., 2009).
A isquemia hepática pode reprogramar a expressão gênica das células
sobreviventes, iniciando mecanismos celulares que permitem a regeneração e
remodelação tecidual. Um dos fatores de transcrição mais importantes é o NF-
(TAKAHASHI et al., 2002; LLACUNA et al., 2009). Durante o estresse oxidativo, há
uma translocação do fator NF- para o núcleo, induzindo a síntese de iNOS,
citocinas (p.ex., TNF-α), quimiocinas e moléculas de adesão (p.ex., ICAM-1)
(ALLEN; TRESINI, 2000). Por outro lado, o fator NF- é ativado durante o
transplante hepático e também é associado com a redução do grau de apoptose e
lesão hepática (LENTSCH et al., 2000). Assim, o NF- parece ter um duplo efeito
durante a IR hepática, agindo tanto como indutor da resposta inflamatória aguda,
quanto um promotor da regeneração hepática (LENTSCH et al., 2000; LLACUNA et
al., 2009).
1.3.3 Células envolvidas na IR hepática
Uma série de células está envolvida no processo de indução da lesão tecidual
secundária à IR hepática.
O fígado é composto por células parenquimatosas (p.ex., hepatócitos) e
células não-parenquimatosas, tais como as células endoteliais, as células estelares
(Ito), as células de Kupffer, os macrófagos e os linfócitos (RACANELLI;
REHERMANN, 2006). Os leucócitos hepáticos têm um importante papel durante a
IR, pois amplificam a resposta molecular e causam diretamente dano celular
(VARDANIAN et al., 2008). Durante a IR hepática, ocorre edema tecidual decorrente
pelo aumento no influxo de Na+ para o meio intracelular, provocando uma diminuição
do fluxo de sangue e liberação de mediadores e moléculas inflamatórias pelas
células de Kupffer, incrementando o dano celular (TEOH; FARRELL, 2003;
MONTALVO-JAVE et al., 2008; ILDEFONSO; ARIAS-DÍAZ, 2010).
A infiltração leucocitária durante a IR hepática ocorre por diversos
mecanismos, tais como as alterações na microcirculação que levam ao
36
extravasamento através do endotélio vascular, e migração ao espaço extracelular e
diapedese dos leucócitos através da atividade das selectinas (VARDANIAN et al.,
2008). Os leucócitos sistêmicos também são recrutados ao fígado durante a IR
hepática; porém, o mecanismo exato ainda está sendo estudado, mas parece
envolver o sistema TLR, bem como as quimiocinas e as citocinas (VARDANIAN et
al., 2008).
Os neutrófilos também contribuem para a lesão secundária à IR hepática,
através da liberação de EAO e várias proteases (LENTSCH et al., 2000;
JAESCHKE; FARHOOD, 1991; JAESCHKE, 2006). Durante a fase inicial de
reperfusão, os neutrófilos se acumulam no fígado, aderindo às células endoteliais
por intermédio de selectinas e integrinas (JAESCHKE; FARHOOD, 1991; GOPALAN
et al., 1997; JAESCHKE, 2006). Assim, os neutrófilos são envolvidos em ambas as
fases da IR, sendo o seu recrutamento um processo de várias etapas, que envolve
as moléculas de adesão, ativadas por vários mediadores inflamatórios como
citocinas, quimiocinas e fatores de transcrição, como o NF- (TEOH; FARRELL,
2003).
Recentemente, tem-se sugerido que as células T e as células natural killers
também desempenham um importante papel na lesão provocada pela IR hepática
(Le MOINE et al., 2000; MONTALVO-JAVE et al., 2008). No fígado, os linfócitos
estão distribuídos tanto entre os hepatócitos quanto nos espaços portais e tem-se
observado um acúmulo de linfócitos nos sinusóides hepáticos logo após o início da
reperfusão, provavelmente devido a um aumento na expressão de moléculas de
adesão (CLAVIEN et al., 1993; ILDEFONSO; ARIAS-DÍAZ, 2010). O pico de
acúmulo de linfócitos T no fígado ocorre na primeira hora de reperfusão, mantendose por, pelo menos, 4 horas (CALDWELL et al., 2005). Estes linfócitos podem alterar
o processo inflamatório através da secreção de mediadores, tais como as citocinas e
as quimiocinas, promovendo maior recrutamento de linfócitos e neutrófilos
(CALDWELL et al., 2007). Algumas drogas imunossupressoras podem atenuar a
lesão de IR através da prevenção da infiltração de células T (ANSELMO et al.,
2002). Um estudo experimental interessante feito por Okuaki et al. (1996)
demonstrou que a esplenectomia prévia à IR hepática em ratos provocou uma
diminuição na infiltração inflamatória e proteção contra a lesão induzida pela
reperfusão. Além disso, a supressão genética de linfócitos T provocou uma
atenuação na lesão induzida pela IR hepática em ratos, demonstrada pelos níveis
37
mais baixos de aminotransferases e pelo menor grau de necrose e infiltração
neutrofílica. Neste mesmo estudo, também foi identificado que as células T CD4+
são importantes mediadores da resposta inflamatória induzida pela IR hepática
(ZWACKA et al., 1997). Os mesmos autores aventaram a hipótese de que a IR
hepática estimularia as células T CD4+ que, por sua vez, secretariam citocinas,
estimulando a infiltração neutrofílica no fígado.
As plaquetas aderentes aos sinusóides hepáticos podem contribuir para o
distúrbio microcirculatório durante a IR, bem como induzir apoptose das células
endoteliais através da produção de NO, levando à formação de •ONOO- agindo
como indutor da morte programada das células endoteliais (MONTALVO-JAVE et al.,
2008). Por outro lado, foi demonstrado que as plaquetas contribuem com a
reparação e regeneração tecidual hepática através da produção de fatores tais como
citocinas, fatores de crescimento, serotonina e calpaína (LESURTEL et al., 2006).
1.3.4 – Alterações microcirculatórias na IR hepática
No fígado, a microcirculação compreende um sistema de vasos capilares
conhecidos como sinusóides que são alinhados a um endotélio fenestrado com alto
grau de permeabilidade que permite o íntimo contato entre hepatócitos e circulação
sanguínea (RAMALHO et al., 2006). A disfunção na microcirculação hepática é
considerada o principal evento no desenvolvimento da lesão de IR (RAMALHO et al.,
2006).
Na isquemia, ocorre edema celular devido, principalmente, ao distúrbio do
transporte de íons, causando um estreitamento da luz sinusoidal, comprometendo a
microcirculação de leucócitos e plaquetas, fazendo com que haja uma interferência
no fluxo de sangue através dos capilares sinusoidais (TEOH; FARRELL, 2003;
MONTALVO-JAVE et al., 2008; ILDEFONSO; ARIAS-DÍAZ, 2010). Ainda na
isquemia, com a depleção de O2 e liberação de arginase (enzima que degrada Larginina – substrato para a formação de NO), há uma queda importante na síntese
de NO, considerado um protetor da microcirculação pelo seu efeito vasodilatador,
anti-adesivo plaquetário e neutrofílico, e fator de relaxamento das células de Ito
(CLEMENS, 1999).
38
Durante a reperfusão, há um colapso na microcirculação, pois há uma
manutenção da isquemia em algumas áreas de tecido hepático, mesmo após o
restabelecimento do fluxo sangüíneo, fênomeno conhecido como “no-reflow”
(VARDANIAN et al., 2008; MONTALVO-JAVE et al., 2008). Além disso, os níveis de
endotelinas aumentam, favorecendo uma vasoconstrição na microcirculação
(KAWAMURA et al., 1995). Este desequilíbrio entre as quantidades de NO e de
endotelinas é responsável, ao menos em parte, pelo dano tecidual causado pelas
alterações na microcirculação hepática (MONTALVO-JAVE et al., 2008). Em alguns
estudos, um aumento na concentração de NO, bem como uma diminuição de
endotelinas, demonstrou-se benéfico na IR hepática (SCOMMOTAU et al., 1999;
GONG et al., 2008).
Além da formação do edema celular, secundário à disfunção no transporte de
íons transmembrana, tem-se evidenciado também um acúmulo de neutrófilos na
microvasculatura, hemoconcentração intravascular, diminuição da velocidade
eritrocitária, bem como um extravasamento de eritrócitos devido ao dano endotelial
(VOLLMAR et al., 1994). Além disso, os distúrbios microcirculatórios também podem
se agravar com a ativação da cascata da coagulação e com a deposição de fibrina
durante a reperfusão (RAMALHO et al., 2006).
Na redução ou ausência de fluxo de sangue aos hepatócitos, há uma inibição
da fosforilação oxidativa mitocondrial com a subseqüente redução nos níveis de ATP
(GONZÁLEZ-FLECHA et al., 1993; LIN et al., 2012). Como dito anteriormente, isto
leva a um distúrbio no transporte de íons, com um influxo também aumentado de
Ca+2, provocando uma ativação de fosfolipases e disrupção da membrana celular,
sendo crucial para o desfecho de dano irreversível à célula (RHODEN et al., 2000a).
O aumento do Ca+2 citosólico também desempenha um importante papel na
formação das EAO, através da ativação da enzima XO (McCORD, 1985; ZHANG et
al., 2007).
1.3.5 Morte celular após a IR hepática
O mecanismo de morte celular devido à IR hepática tem sucitado algumas
dúvidas e discordâncias. As duas maneiras mais prováveis de morte celular são a
39
apoptose e a necrose. A apoptose é uma forma controlada e programada de morte
celular, permitindo a remoção de células lesadas sem o envolvimento de uma
resposta inflamatória nem destruição do ambiente extracelular (TEOH; FARRELL,
2003; MONTALVO-JAVE et al., 2008). Durante a reperfusão, o TNF-α e outros
mediadores ativam muitas proteínas envolvidas na apoptose celular, tais como as
proteases, levando à destruição celular (MONTALVO-JAVE et al., 2008). Alguns
estudos demonstraram um predomínio da apoptose em células hepáticas
submetidas à IR, sendo detectado apoptose em 50 a 70% das células endoteliais e
40 a 60% dos hepatócitos (GAO et al., 1998).
Por outro lado, a necrose celular é caracterizada pelo edema celular que leva
à perda da integridade da membrana plasmática, levando à liberação de conteúdo
tóxico intracelular, tais como proteínas e enzimas proteolíticas e hidrolíticas dentro
do espaço intercelular (TEOH; FARRELL, 2003). Embora alguns autores acreditem
que a maior parte das células hepáticas, tanto as endoteliais quanto os hepatócitos,
sofram o processo de apoptose (KOHLI et al., 1999), Gujral et al. (2001)
demonstraram que apenas pequena percentagem dessas células (aproximadamente
2%) sofre tal processo e que a grande maioria das células morre por necrose após a
IR hepática. No entanto, a IR hepática pode culminar em necrose ou apoptose,
dependendo de outros fatores determinantes (MONTALVO-JAVE et al., 2008).
1.4 Óxido nítrico e a IR hepática
Como dito anteriormente, o NO é uma EAN, considerado um potente
vasodilatador gasoso que regula a microcirculação hepática, sendo sintetizado pela
oxidação do aminoácido L-arginina pela enzima NOS. No fígado, existem
basicamente dois tipos de NOS: a cNOS (constitutiva) e a iNOS (induzível) (TEOH;
FARRELL, 2003; SHAH; KAMATH, 2003; SERRACINO-INGLOTT et al., 2003). A
cNOS é expressa constitutivamente, sendo sua atividade dependente de cálcio e
calmodulina, produzindo pequenas quantidades de NO (TEOH; FARRELL, 2003;
SHAH; KAMATH, 2003). Por outro lado, a iNOS independe do cálcio e não se
encontra constitutivamente no tecido hepático, mas é expressa em algumas
situações, tais como resposta inflamatória, trauma, infecção e IR, sendo sintetizada,
40
principalmente, nos hepatócitos, células de Kupffer e células endoteliais, produzindo
grandes quantidades de NO (SERRACINO-INGLOTT et al., 2003, ILDEFONSO;
ARIAS-DÍAZ, 2010).
Em condições normais, a pequena quantidade de NO produzida no fígado
pela enzima cNOS é responsável pela regulação da perfusão hepática, bem como
prevenção da adesão plaquetária, do acúmulo de células polimorfonucleares e da
secreção de mediadores inflamatórios (MITTAL et al., 1994). Nessas circunstâncias,
o NO produzido causa vasodilatação a nível sinusoidal e mantém um equilíbrio com
substâncias vasoconstritoras como as endotelinas (SCOMMOTAU et al., 1999). A
suplementação com L-arginina ou com doadores de NO parece melhorar as
condições da microcirculação hepática e atenuar a lesão induzida pela IR hepática
(SHAH; KAMATH, 2003).
Segundo a literatura, a indução da iNOS parece ter efeito ambíguo durante a
IR hepática, trazendo tanto efeitos benéficos quanto deletérios. Esses efeitos
dependem do tipo de agressão tecidual, bem como da quantidade e do tempo de
duração da ação enzimática (SERRACINO-INGLOTT et al., 2003; ILDEFONSO;
ARIAS-DÍAZ, 2010). Na IR, a expressão da iNOS começa 1 hora após a reperfusão,
mantendo sua atividade aumentada até 5 horas de reperfusão (HUR et al., 1999).
Os resultados sobre o uso de inibidores da NOS na IR hepática tem sido
conflitantes, tendo alguns estudos demonstrado efeito protetor (HSU et al., 2002),
outros indicando um efeito deletério (MEGURO et al., 2002) e outros autores
referindo não haver efeito algum (HINES et al., 2002).
O NO oriundo da iNOS pode causar dano oxidativo através da interação com
as EAO, levando à produção de •ONOO-, um importante indutor da morte celular
(SERRACINO-INGLOTT; MATHIE, 2000; ILDEFONSO; ARIAS-DÍAZ, 2010). Por
outro lado, o •ONOO- pode exercer um efeito protetor através da diminuição da
adesão e infiltração leucocitária, bem como interação e neutralização de radicais
•O2- (LIU et al., 2000). Deste modo, a inibição da iNOS pode ter efeito ambíguo na IR
hepática. Em um modelo de transplante hepático em ratos, o uso de um inibidor da
iNOS, o FK 330, reduziu a ativação leucocitária e a apoptose hepática
(TSUCHIHASHI et al., 2006). Outro inibidor da iNOS, o ONO-1714, também atenuou
o dano hepático causado pela IR (MEGURO et al., 2002).
41
2 JUSTIFICATIVA
No fígado, a IR pode ser observada em diversas situações clínicas, como na
cirurgia do trauma para controle de sangramento através da manobra de Pringle,
ressecções hepáticas parciais, bem como na realização de transplante hepático.
O conhecimento dos diferentes fatores envolvidos na patogênese da IR tem
estimulado o emprego experimental de algumas substâncias no intuito de amenizar
o dano tecidual.
Atualmente, a via L-arginina/NO parece desenvolver um papel relevante
dentro deste contexto, no entanto, ainda não há consenso do efeito do NO na lesão
hepática causada pela IR.
Assim, nosso estudo foi proposto para estudar a importância da via Larginina/NO na IR hepática em ratos, analisando os efeitos de agentes moduladores
da produção de NO.
42
3 HIPÓTESE DO ESTUDO
A via L-arginina/NO exerce um efeito protetor na lesão hepática induzida pela
isquemia-reperfusão em ratos.
43
4 OBJETIVOS
4.1 Objetivo principal
Determinar o dano causado pela IR hepática em ratos submetidos ou não ao
pré-tratamento com drogas moduladoras da via L-arginina/NO (L-arginina ou LNAME).
4.1 Objetivos secundários
- Avaliar os níveis séricos das aminotransferases em ratos submetidos à IR
hepática normotérmica, pré-tratados com L-arginina ou L-NAME;
- Estudar as alterações histopatológicos em ratos submetidos à IR hepática
normotérmica, pré-tratados com L-arginina ou L-NAME; e
- Comparar as taxas de mortalidade peri-operatória de ratos submetidos à IR
hepática normotérmica, pré-tratados com L-arginina ou L-NAME.
44
5 MATERIAL E MÉTODOS
5.1 Delineamento do estudo
Estudo experimental, controlado, com dados recentes (contemporâneos),
realizado em ratos Wistar.
5.2 Amostra e grupos de animais
Foram utilizados 152 ratos Wistar, machos, adultos e com massa corporal
entre 220 e 330g. Os animais foram provenientes do Biotério da Disciplina de
Farmacologia e Toxicologia da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto
Alegre (UFCSPA), sendo identificados (individualizados) e mantidos em gaiolas de
plástico (47x34x18cm) em grupos de 4 animais em cada gaiola. A alimentação
consistiu de ração padronizada para roedores (Purina, Nutripal, Porto Alegre, RS,
Brasil) e água ad libitum, com ciclo claro com luz artificial das 7 às 19 horas com
temperatura mantida ao redor de 22ºC.
Para os procedimentos, os ratos foram previamente mantidos em jejum
durante 6 horas aproximadamente, sendo pesados no momento da administração
das drogas.
Os animais foram divididos em quatro grupos:
- GRUPO CONTROLE (C): foram submetidos à administração de solução fisiológica
20 minutos antes da indução anestésica e posterior realização de laparotomia e
dissecção do pedículo hepático, mantendo-se a cavidade abdominal exposta por 45
minutos, com proteção das vísceras com gazes úmidas em solução fisiológica
morna;
45
- GRUPO ISQUEMIA-REPERFUSÃO (IR): animais submetidos à administração de
solução fisiológica, seguida de IR hepática conforme técnica cirúrgia descrita
adiante;
- GRUPO L-ARGININA + ISQUEMIA-REPERFUSÃO (L-ARG): ratos nos quais foi
administrada solução de L-arginina 20 minutos antes da indução anestésica e
realização da IR hepática;
- GRUPO L-NAME + ISQUEMIA-REPERFUSÃO HEPÁTICA (L-NAME): animais
submetidos à administração de L-NAME 20 minutos antes da IR hepática.
5.3 Drogas e diluições
No presente estudo, foram utilizadas as seguintes drogas, todas obtidas
comercialmente:
- Solução fisiológica: solução de NaCl a 0,9% (Baxter, Brasil). Foi administrada da
dose de 1mL/Kg nos animais dos grupo C e do grupo IR, 20 minutos antes dos
procedimentos cirúrgicos correspondentes de cada grupo;
- Quetamina: agente anestésico (König, Brasil), usado na diluição de 50mg/mL, e
administrado aos animais na dose de 90mg/Kg;
- Xilazina: agente anestésico (Agener União, Brasil), usado na diluição de 20mg/mL,
e administrado aos animais na dose de 10mg/Kg;
- L-arginina (Sigma, USA): usado na diluição de 200mg/mL, sendo administrado na
dose de 200mg/Kg;
- L-NAME (Sigma, USA): usado na diluição de 20mg/mL, sendo administrado na
dose de 20mg/Kg.
46
5.4 Administração das drogas
Todas as drogas (solução fisiológica, L-arginina, L-NAME e as soluções
anestésicas) nas diluições e doses já descritas foram administradas nos ratos pela
via intraperitoneal, por ser uma via de fácil execução, utilizada amplamente na
literatura, em que a maioria das drogas possui absorção rápida (RHODEN et al.,
2006).
Além do preparo e jejum adequado para os procedimentos experimentais, a
técnica de administração consistiu na imobilização pelo dorso do animal acordado,
formando-se uma prega da pele, havendo uma retração da pele ventral, facilitando a
punção intraperitoneal com agulha 0,80x30mm/21G, que era realizada no quadrante
inferior direito pelo menor risco de perfuração de alça intestinal. Antes da
administração das drogas, aspirava-se a seringa (de 1mL) para certificar-se da não
ocorrência de uma punção inadvertida, principalmente de vasos intrabdominais
(RHODEN et al., 2006).
5.5 Anatomia cirúrgica do fígado de ratos
Conforme descrito por Brito et al. (2006), o fígado de ratos é composto por
quatro lobos principais: o lobo lateral direito, o lobo lateral esquerdo e o lobo
mediano, que é dividido por uma cissura longitudinal em lobo central direito e lobo
central esquerdo. Sob ponto de vista anatômico, os lobos lateral esquerdo e
mediano formam uma unidade que corresponde a aproximadamente 70% do órgão.
O pedículo hepático é composto pela veia porta, artéria hepática e ducto biliar. A
drenagem venosa é composta pelas veias hepáticas de cada lobo, que
desembocam na veia cava superior. O pedículo hepático encontra-se, inferiormente,
no interior do ligamento hepato-duodenal e, superiormente, encontra-se o ligamento
falciforme e triangular.
47
5.6 Procedimentos cirúrgicos experimentais
Após um jejum completo de 6 horas, os animais foram pesados
imediatamente antes dos procedimentos em balança digital. Nos grupos C e IR, foi
administrada solução fisiológica antes dos anestésicos e nos grupos L-ARG e LNAME, as drogas correspondentes foram administradas da mesma forma que a
solução fisiológica. Transcorridos 20 minutos após esta etapa de administração das
drogas, foi iniciada a indução anestésica com a administração de quetamina/xilazina.
Após a administração dos agentes anestésicos, transcorria-se cerca de 5 minutos
até o momento de se adquirir o efeito anestésico desejado, confirmado pela
ausência de reação do animal a estímulos dolorosos na parede abdominal e perda
de reflexos das vibrissas nasais. A partir desse momento, foi realizada tricotomia da
parede abdominal dos animais, posicionando-os em decúbito dorsal, com as patas
dianteiras e traseiras fixadas com fitas de apoio sobre a mesa cirúrgica, coberta com
campo operatório (figura 4). As cirurgias foram realizadas conforme descrição a
seguir.
Figura 4 - Rato anestesiado, com tricotomia abdominal e marcação do local da
incisão para a realização do procedimento de isquemia-reperfusão hepática.
48
5.6.1 Cirurgia simulada
Foi realizada no grupo C e consistiu em realização de acesso à cavidade
abdominal através de uma laparotomia longitudinal mediana de aproximadamente
3,5 cm de extensão, iniciando do apêndice xifóide ao sentido caudal, com abertura
por planos (pele, músculo e peritônio), exposição do pedículo hepático, deixando-se
gazes úmidas em solução fisiológica levemente aquecida para cobrir o conteúdo
visceral; ficando, portanto, a cavidade abdominal exposta por 45 minutos. Após este
período de tempo, realizou-se a sutura da parede abdominal em plano único
usando-se fio inabsorvível monofilamentar obtido comercialmente (mononylon 3.0,
Ethicon, Brasil). Após observação dos animais e recuperação dos mesmos na
própria gaiola plástica sobre aquecimento local com luz artificial, os mesmos era
levados ao Biotério para receberem ração e água ad libitum e prosseguimento do
estudo com as análises subseqüentes.
5.6.2 Técnica de isquemia-reperfusão hepática em ratos.
Após preparo dos animais, indução anestésica e posicionamento na mesa
cirúrgica, foi realizada laparotomia longitudinal conforme a cirurgia simulada,
procedendo, no entanto à secção do ligamento falciforme e, através de manobras
digitais delicadas, o lobo hepático mediano foi rebatido em sentido cranial,
permitindo a exposição do pedículo hepático. A isquemia hepática foi obtida pelo
pinçamento seletivo, englobando o pedículo dos lobos mediano e esquerdo através
de pinças vasculares atraumáticas tipo bulldog (EDLO 7-794, Brasil) por um tempo
de 45 minutos (RHODEN et al., 1996) (figura 5).
49
Figura 5 - Fígado exteriorizado, protegido com gazes, sendo realizado
pinçamento hepático seletivo (lobos mediano e esquerdo).
5.6.3 Técnica de hepatectomia parcial em ratos.
Para a realização da análise histopatológica, foi procedida hepatectomia
parcial do lobo esquerdo dos animais para obtenção de amostra do tecido hepático.
A técnica usada foi aquela descrita por Kalil et al. (2006), em que se realiza uma
delicada tração vertical do lobo hepático em interesse, colocando-se na base do lobo
uma pinça hemostática tipo cryle, seguida da secção com tesoura ou bisturi do
tecido hepático situado acima da pinça e ligadura com fio seda 2.0 sem agulha
(Ethicon, Brasil) do pedículo logo abaixo da pinça.
Imediatamente
após
cada
procedimento
cirúrgico-anestésico,
foi
administrado, por via intraperitoneal, 2 mL de solução fisiológica para hidratação dos
animais.
5.7 Experimentos realizados
Para avaliação dos níveis das aminotransferases, foram utilizados 112 ratos
divididos nos quatro grupos. Uma amostra aleatória de 63 desses 112 animais foi
usada para o estudo das alterações histopatológicas. Em outros 40 animais, foi
realizado o estudo da mortalidade peri-operatória.
50
5.7.1 Análise dos níveis séricos das aminotransferases em ratos submetidos à
isquemia-reperfusão hepática normotérmica, pré-tratados ou não com L-arginina ou
L-NAME.
Para verificar o efeito da IR hepática, bem como a influência do prétratamento
com
L-arginina
ou
L-NAME
nos
níveis
séricos
de
alanina-
aminotransferase (ALT) e aspartato-aminotransferase (AST) foram utilizados 112
ratos, divididos em quatro grupos, conforme descrito no item 5.2. O número de
animais para cada grupo está listado na tabela 3. Os níveis séricos de ALT e AST
foram analisados no primeiro, terceiro e sétimo dias após a IR hepática.
Tabela 3 Número de animais por grupo usados para a análise das alterações das
enzimas de dano hepatocelular (n=112).
GRUPOS
3º DIA
7º DIA
Controle (cirurgia simulada) 9
10
11
IR
8
10
12
L-ARGININA + IR
10
9
10
L-NAME + IR
1º DIA
5
8
10
Após cada procedimento e recuperação anestésica conforme descrição no
item 5.6, os animais foram levados ao Biotério nas gaiolas plásticas e a coleta de
amostra de sangue foi feita em 24 horas (1º dia), 72 horas (3º dia) ou 168 horas (7º
dia). Considerou-se um grupo distinto de animais para cada momento de coleta.
Assim, para a análise dos níveis de ALT e AST no 1º dia, foram utilizados animais
distintos daqueles usados para a análise no 3º e 7º dias. Tal estratégia foi tomada no
intuito de sacrificar os animais logo após a coleta da amostra de sangue, sendo
realizado, logo a seguir, a retirada de uma amostra de tecido hepático (hepatectomia
51
parcial – lobos mediano e esquerdo) de um subgrupo de animais para a obtenção de
amostras de tecido hepático para a análise histopatológica.
5.7.1.1 Técnica de coleta de amostra de sangue e análise laboratorial.
Após cada período estabelecido de pós-operatório, os animais foram
anestesiados em campânula de vidro, contendo éter etílico para proceder à coleta
de amostra de sangue através da punção do plexo arteriovenoso retrocular com um
capilar de vidro, através do qual o sangue fluía para o interior de um tubo de ensaio.
O volume aproximado de sangue coletado de cada animal era de 0,5 mL.
Imediatamente após a coleta, procedeu-se ao sacrifício de um subgrupo consecutivo
de animais (n=63) para obtenção de amostra de tecido hepático para análise
histopatológica nos primeiro, terceiro e sétimo dias após os procedimentos.
A determinação da atividade das enzimas séricas hepáticas (ALT e AST) foi
realizada através de técnicas colorimétricas em espectrofotômetro (CELM, E 210 D),
utilizando-se kits obtidos comercialmente (Labetest - Sistemas para Diagnóstico
LTDA, Brasil), empregados no Laboratório de Bioquímica da Disciplina de
Farmacologia e Toxicologia da UFCSPA.
5.7.2 Análise das alterações histopatológicas em ratos submetidos à isquemiareperfusão hepática normotérmica, pré-tratados ou não com L-arginina ou L-NAME.
Uma amostra inicial e consecutiva de aproximadamente metade dos 112
animais (n= 63) usados no experimento da análise das enzimas hepáticas foi usada
para estudo das alterações histopatológicas. O número de animais para cada grupo
está demostrado na tabela 4.
52
Tabela 4 Número de animais por grupo usados para a análise das alterações das
histopatológicas (n=63).
GRUPOS
1º DIA
3º DIA
Controle (cirurgia simulada)
5
6
6
IR
5
5
7
L-ARGININA + IR
5
4
6
L-NAME + IR
5
7º DIA
4
5
5.7.2.1 Técnica de análise das alterações histopatológicas
Imediatamente
após
a
ressecção
da
amostra
de
tecido
hepático
(hepatectomia parcial esquerda), o tecido foi incisado várias vezes para permitir a
penetração adequada do fixador e, a seguir, as amostras foram identificadas e
acondicionadas em recipientes contendo formol a 10%; após, esse material foi
colocado em álcool etílico a 100% por 12 horas, em seguida no xilol e depois,
preparado para inclusão em parafina. Posteriormente, os blocos de parafina foram
cortados em micrótomo e este material foi disposto sobre lâminas de vidros e
corados pelos corantes hematoxilina-eosina e picrosírius, sendo a seguir analisadas
em microscopia óptica por um médico patologista, que não era conhecedor dos
grupamentos aos quais pertenciam os tecidos analisados.
As seguintes características histopatológicas foram avaliadas:
- congestão vascular (CV): dilatação vascular e presença de eritrócitos dentro da
veia centrolobular;
- esteatose hepática (EST): acúmulo vacuolar lipídico dentro dos hepatócitos;
- infiltrado inflamatório (INF): acúmulo de células inflamatórias – neutrófilos, células
de Kuppfer); e
- necrose hepatocitária (NEC): hepatócitos com aspecto de necrose; p. ex., picnose,
cariorrexe, cariólise.
53
A quantificação da intensidade das características analisadas foi expressa em
cruzes (0 a 3+), obtida através da média de três campos microscópicos, aleatórios,
avaliados em aumentos de 200 vezes, considerando-se:
0: ausência de alterações;
1+: alterações de intensidade leve (até 25% do campo analisado);
2+: alterações de intensidade moderada (25% a 50% do campo analisado);
3+: alterações de intensidade severa (mais de 50% do campo analisado).
5.7.3 Análise da mortalidade de ratos submetidos à isquemia-reperfusão hepática
normotérmica, pré-tratados ou não com L-arginina ou L-NAME.
Outros 40 ratos foram subdivididos nos mesmos 4 grupos do item 5.2 com 10
animais
cada,
sendo
observados
durante
7
dias
consecutivos
após
os
procedimentos com relação à ocorrência de óbitos.
Após os procedimentos e recuperação anestésica, todos esses animais foram
acondicionados em gaiolas plásticas, sendo disponibilizado ração e água ad libitum.
Diariamente e até o sétimo dia após o procedimento cirúrgico, era avaliada a
ocorrência de óbito nesses animais. Ao término da análise, os animais sobreviventes
foram sacrificados.
5.8 Sacrifício dos animais
Imediatamente após a realização dos procedimentos, todos os animais foram
sacrificados através de injeção intraperitoneal de tiopental sódico (Cristália, Brasil)
na dose de 150mg/kg.
54
5.9 Análise estatística
O tamanho amostral foi determinado...
Os dados receberam tratamento estatístico através do software SPSS 17.0
(Statistical Package to Social Sciences for Windows) onde, para critérios de decisão
foi adotado o nível de significância () de 5%.
Os resultados referentes aos níveis séricos das enzimas de dano
hepatocelular (ALT e AST) foram expressos em média ± desvio padrão, sendo
posteriormente analisados através da análise de variância (ANOVA), seguida pelo
teste de Dunnett´s T3 (MERINO; DÍAZ, 2002).
Os dados obtidos referentes aos estudos histopatológicos das amostras do
tecido hepático foram expressos através de mediana e analisados estatisticamente
pelo teste de Kruskal-Wallis seguido pelo método de Dunn.
A mortalidade foi expressa em percentagem e a sua variabilidade entre os
grupos foi analisada pelo teste do qui-quadrado (MERINO; DÍAZ, 2002).
5.10 Normas bioéticas adotadas no trabalho
Todos os procedimentos nos animais foram realizados em laboratório
especialmente adaptado para o trabalho com animais de pequeno porte, com
profissionais técnicos experientes no manuseio e cuidado com esses animais. Além
disso, os ratos foram mantidos em Biotério especialmente projetado para o fim
proposto. Foram seguidas as normas nacionais e internacionais que regem a
experimentação com animais, sendo o projeto aprovado e aceito pelo Comitê de
Ética em Pesquisa da UFCSPA (LANZIOTTI et al., 1994; GOLDIN, 1995).
55
6 RESULTADOS
6.1 Análise dos níveis séricos das aminotransferases (AST e ALT) em ratos
submetidos à isquemia-reperfusão hepática normotérmica, pré-tratados ou não
com L-arginina ou L-NAME.
No 1º dia de reperfusão hepática, os níveis de AST foram significativamente
maiores no grupo IR (324,5±85,6 UI/L) quando comparado ao grupo C (156,1±50,8
UI/L)
(p=0,003).
O
grupo
L-NAME
também
demonstrou
níveis
de
AST
estatisticamente superiores aos animais do grupo C (p<0,001); e do grupo IR
(p=0,034). Além disso, os animais do grupo L-ARG demonstraram níveis de AST
significativamente inferiores aos do grupo L-NAME (243,6±129,7 versus 443,5±38,9
UI/L; p=0,005) (figura 6A). Na análise do 3º dia de reperfusão hepática, não houve
diferença estatística significativa nos níveis de AST entre os grupos (p>0,05) (figura
6B). No 7º dia, detectou-se que os valores de AST no grupo IR (115±43,9 UI/L) e LNAME (131±26,9 UI/L) foram significativamente superiores aos do grupo C (73,5±16
UI/L; p<0,05). No grupo L-ARG, não houve uma atenuação significativa nesses
níveis quando comparado com o grupo IR (93±31,8 versus 115±43,9 UI/L; p>0,05)
(figura 6C).
*#
*
(A)
56
(B)
*
*
*
(C)
Figura 6 - Níveis de aspartato-aminotransferase (AST) em ratos submetidos à cirurgia
simulada (controle); isquemia-reperfusão hepática (I-R); pré-tratamento com L-arginina +
I-R (L-ARG); e pré-tratamento com L-NAME + I-R (L-NAME) em diferentes períodos de
reperfusão: A) 1º dia; B) 3º dia; e C) 7º dia. Diferença estatística quando comparado ao
controle (*) e quando comparado aos demais grupos (#); p<0,05.
Os valores de ALT nos grupos IR (326,7±121,4 UI/L), L-ARG (286,3±79,3
UI/L) e L-NAME (349,3±51,5 UI/L) foram significativamente superiores aos do grupo
C (107±32,6 UI/L) no 1º dia após os procedimentos (p<0,05) (figura 7A). No 3º dia
após os procedimentos, o grupo L-NAME apresentou níveis significativamente
maiores de ALT quando comparado ao grupo C (183±68,7 versus 69±23,1 UI/L;
p=0,011). O grupo IR também demonstrou níveis de ALT (129±52,3 UI/L)
significativamente maiores que o grupo C (69±23,1 UI/L; p=0,006) (figura 7B). No 7º
57
dia após os procedimentos, os grupos IR (84,8±28,7 UI/L) e L-NAME (98,3±12,2
UI/L) demonstraram níveis de ALT significativamente superiores aos do grupo C
(72±19,8 UI/L; p<0,05). O grupo L-ARG demonstrou níveis significativamente
inferiores de ALT quando comparado ao grupo L-NAME (69,1±28,2 versus 98,3±12,2
UI/L; p<0,05) (figura 7C).
*
*
*
(A)
*
*
(B)
58
*
**
*
(C)
Figura 7 - Níveis de alanino-aminotransferase (ALT) em ratos submetidos à cirurgia
simulada (controle); isquemia-reperfusão hepática (I-R); pré-tratamento com Larginina + I-R (L-ARG); e pré-tratamento com L-NAME + I-R (L-NAME) em
diferentes períodos de reperfusão. Diferença estatística quando comparado ao
grupo controle (*) e ao grupo L-NAME (**); p<0,05.
6.2 Análise das alterações histopatológicas hepáticas em ratos submetidos à
isquemia-reperfusão hepática normotérmica, pré-tratados ou não com Larginina ou L-NAME.
Um subgrupo de 63 animais do total dos 112 animais submetidos à análise
das enzimas hepatobiliares foi submetido também à análise histopatológica.
Com relação aos resultados, analisamos possíveis diferenças em cada
parâmetro das alterações histopatológicas (CV, EST, NEC e INF) nos grupos em
diferentes períodos de pós-operatório, isto é, no 1º., 3º. e 7º. dia de reperfusão
hepática. Esses resultados estão sumarizados na tabela 5.
59
Tabela 5 - Resultado das alterações histopatológicas do fígado de ratos submetidos
à isquemia-reperfusão hepática, pré-tratados ou não com L-arginina ou L-NAME.
GRUPOS
1º. dia
CV
EST
NEC
3º. dia
INF
CV
EST
NEC
7º. dia
INF
CV
EST
NEC
INF
Controle
0
0
0
0
1
0
0
0
1
0
0
0
IR
2
0
1
2*
3#
0
0
1
3#
2#
0
0
L-ARG
1
0
0
0
2,5 0
0
0
0+
0++
0
0
L-NAME
2
0
1
0
3#
0
0
3#
0
0
0
0
Valores representados pela mediana. CV: congestão vascular; EST: esteatose; NEC:
necrose hepatocitária; INF: infiltrado inflamatório. * p<0,05 quando comparado aos
outros grupos; # p<0,05 quando comparado ao grupo controle; + p<0,05 quando
comparado aos grupo IR e L-NAME; e ++ p<0,05 quando comparado ao grupo IR.
No 1º dia após os procedimentos, observamos um aumento significativo no
grau de INF no grupo IR quando comparado com os outros grupos (p<0,05) (figura
8). Os demais parâmetros avaliados no 1º dia não apresentaram diferença
estatística significativa entre os grupos.
Na análise das alterações histopatológicas no 3º dia de reperfusão, constatouse um aumento significativo do grau de CV nos animais do grupo IR quando
comparado ao grupo C (p<0,05).
Os animais do grupo L-NAME também
demonstraram um aumento significativo de CV quando comparado ao grupo C
(p<0,05).
60
(A)
(B)
Figura 8 – Aspecto microscópico das alterações histopatológicas do fígado de ratos. A) Aspecto
normal de fígado de rato submetido à cirurgia simulada (grupo controle). B) Áreas de necrose e
infiltrado inflamatório em fígado de rato submetido à isquemia-reperfusão (IR) hepática (x 200,
hematoxilina-eosina)
Os resultados obtidos no 7º dia após os procedimentos demonstraram um
aumento significativo no grau de CV e EST nos animais do grupo IR quando
comparado ao grupo C (p<0,05) (figura 9A). O grau de CV e EST foram atenuados
no grupo L-ARG quando comparado ao grupo IR (p<0,05) (figura 9B). Os ratos
tratados com L-NAME demonstraram um grau maior de CV quando comparados aos
animais do grupo C (p<0,05). Não observamos diferenças entre os grupos com
relação aos parâmetros INF e NEC.
61
(A)
(B)
Figura 9 – Efeito da L-arginina nos aspectos histopatológicos nos fígados de ratos submetidos à IR
hepática. A) Áreas de esteatose hepática e congestão vascular de rato submetido à IR hepática sem
pré-tratamento (x 200). B) Atenuação das áreas de esteatose e congestão vascular em ratos prétratados com L-arginina (x 400). Hematoxilina-eosina.
6.3 Análise da mortalidade de ratos submetidos à isquemia-reperfusão
hepática normotérmica, pré-tratados ou não com L-arginina ou L-NAME.
Os animais do experimento descrito no item 5.7.3 foram observados
diariamente em relação às taxas de mortalidade ao longo de 7 dias.
Não houve nenhum óbito nos animais do grupo C durante todo o período.
Ocorreram 7 óbitos ao longo do período nos outros grupos; portanto, com uma taxa
de mortalidade global de 17,5%. Desses óbitos, dois ocorreram no grupo IR; um no
grupo L-ARG; e quatro no grupo L-NAME, com taxas de mortalidade de 20%, 10% e
40%, nesses grupos, respectivamente. O óbito de seis animais (85,7% dos óbitos)
ocorreu nas primeiras 24 horas após os procedimentos, sendo todos durante ou logo
após a cirurgia. O óbito que não ocorreu no período peri-operatório imediato foi de
um animal do grupo L-NAME, sendo observado no 2º dia após o procedimento. A
distribuição do número de óbitos ocorridos por grupo está representada na figura 10.
Analisando-se a mortalidade separadamente por grupo, não observamos
diferença significativa entre os mesmos (2calc = 2,000; p=0,519).
62
10
9
8
7
6
5
4
3
2
1
40%
0%
20%
0
C
IR
10%
L-ARG
L-NAME
Figura 10. Mortalidade dos ratos submetidos à isquemia-reperfusão hepática normotérmica,
tratados ou não com L-arginina ou L-NAME (2calc = 2,000; p=0,519).
63
7 DISCUSSÃO
7.1 A isquemia-reperfusão hepática
A isquemia-reperfusão hepática é um importante evento fisiopatológico
caracterizado por um período de privação de fluxo sangüíneo no fígado, seguido de
restauração da circulação hepática, estando presente em um número variável de
circunstâncias, tais como cirurgia de ressecção hepática (tumores benignos e
malignos), trauma hepático, choque séptico ou hemorrágico e transplante de fígado
(LENTSCH et al., 2000; SERRACINO-INGLOTT; MATHIE, 2000; RHODEN et al.,
2000a; PERALTA et al., 2001; TEOH; FARRELL, 2003; MONTALVO-JAVE et al.,
2008; ILDEFONSO; ARIAS-DÍAZ, 2010). O insulto sofrido pelo fígado durante a IR é
decorrente de vários mecanismos e mediadores bioquímicos, como exposto
anteriormente (LENTSCH et al., 2000; ARII et al., 2003; TEOH; FARRELL, 2003;
VARDANIAN et al., 2008; MONTALVO-JAVE et al., 2008; DOGAN; ASLAN, 2011).
Com a isquemia do tecido hepático, há uma redução da síntese de ATP,
resultando na produção de EAO especialmente durante a fase de reperfusão
(SERRACINO-INGLOTT et al., 2003; TEOH; FARRELL, 2003; RAMALHO et al.,
2006). Ocorrem também alterações nas membranas celulares, resultantes do
processo de peroxidação lipídica provocada pelas EAO, levando ao edema celular e
morte da célula se a isquemia for prolongada (RHODEN et al., 2000a; TEOH;
FARRELL, 2003; RAMALHO et al., 2006; VARDANIAN et al., 2008; MONTALVOJAVE et al., 2008; DOGAN; ASLAN, 2011). Também há queda no pH intracelular,
alterações na microcirculação, com desequilíbrio entre NO e endotelinas e acúmulo
de leucócitos e agregação de plaquetas nos sinusóides (SERRACINO-INGLOTT;
MATHIE, 2000; TEOH; FARRELL, 2003; ARUMUGAM et al., 2006; MONTALVOJAVE et al., 2008; ILDEFONSO; ARIAS-DÍAZ, 2010).
Na fase inicial de reperfusão (2 a 6 horas), há início de uma resposta
inflamatória com ativação de algumas células, tais como as células de Kupffer e os
neutrófilos, que liberam e ativam mediadores inflamatórios e lesivos, tais como as
EAO, as citocinas, o sistema de complemento e o próprio NO (TEOH; FARRELL,
2003; RAMALHO et al., 2006; ILDEFONSO; ARIAS-DÍAZ, 2010). Após essa fase
64
inicial de reperfusão, há uma persistência na produção de EAO e redução na
atividade dos antioxidantes, ocasionando um aumento no estresse oxidativo
tecidual, com dano celular cada vez maior (TEOH; FARRELL, 2003).
Na prática clínica, a IR hepática é um evento que pode desencadear lesão
hepática significativa com repercussões funcionais ao fígado, como insuficiência
hepática fulminante e perda do enxerto transplantado (VOLLMAR et al., 1994; ARII
et al., 2003; TEOH; FARRELL, 2003). O pinçamento da veia porta e da artéria
hepática (manobra de Pringle) é usado para prevenir sangramento durante a cirurgia
hepática, mas também pode estar associado a seqüelas secundárias à IR
(SUGAWARA et al., 1998; LENTSCH et al., 2000).
7.2 Interação entre óxido nítrico e espécies ativas de oxigênio durante a
síndrome de isquemia e reperfusão hepática.
A participação das EAO na injúria secundária à IR tecidual já foi evidenciada
previamente em vários órgãos, como fígado (JAESCHKE; WOOLBRIGHT, 2012),
rim (HUANG et al., 2012), músculo esquelético (GILLANI et al., 2012), coração
(MISRA et al., 2009), intestino (CERQUEIRA et al., 2005), pulmão (TORRES et al.,
2009), cérebro (MAKSIMOVICH et al., 2006) e medula espinhal (CHRONIDOU et al.,
2009). Em nosso meio, o aumento da atividade das EAO foi observado em fígados e
rins de ratos submetidos à IR (RHODEN et al., 1996; RHODEN et al., 2000b). No
fígado, vários outros investigadores têm sugerido que as EAO sejam importantes
mediadores da lesão secundária à IR hepática (MARUBAYASHI et al., 1991;
COHEN, 1992; TOLEDO-PEREYRA; SUZUKI, 1994; JAESCHKE, 1998; FAN et al.,
1999).
Tem sido proposto que as EAO possam ser geradas durante a IR hepática
pelos hepatócitos, células endoteliais e polimorfonucleares (MARUBAYASHI et al.,
1991; TOLEDO-PEREYRA; SUZUKI, 1994) através de diferentes fontes tais como
via da enzima XO nos hepatócitos e células endoteliais; respiração mitocondrial e via
da NADPH-oxidase associada aos polimorfonucleares e células de Kupffer; e
também através da via do citocromo P450 (JAESCHKE, 1998; TEOH; FARRELL,
2003; URAKAMI et al., 2007). Estudos prévios relatam que as células de Kupffer são
65
as principais fontes de EAO na fase inicial de reperfusão, mas, em períodos mais
tardios, o acúmulo de neutrófilos nos sinusóides hepáticos contribui para o estresse
oxidativo pós-isquêmico (LIU et al., 1995).
O NO é um gás com reduzida solubilidade em meio aquoso com
características de um radical livre biatômico, contendo um elétron não pareado, que
pode sofrer diversas reações, atuando tanto como agente oxidante tanto quanto
composto redutor (MARÍN; RODRIGUES-MARTINEZ, 1997; LUCAS; RHODEN,
1999). Uma grande variedade de células pode sintetizar NO a partir do aminoácido
L-arginina pela atividade da NOS e alguns co-fatores, conferindo uma participação
relevante do NO em vários processos fisiopatológicos no organismo (MONCADA et
al., 1991; MARÍN; RODRIGUES-MARTINEZ, 1997; LUCAS; RHODEN, 1999;
VALLANCE; CHAN, 2001; JIN; LOCALZO, 2010). No fígado, o NO é produzido em
situações basais fundamentalmente pela enzima cNOS nas células endoteliais
sinusoidais, em pequenas quantidades, mantendo as funções de vasodilatação,
controle da resposta inflamatória celular, bem como inibição da atividade
plaquetária, diminuição da expressão de citocinas e moléculas de adesão celular
(SERRACINO-INGLOTT; MATHIE, 2000). Em situações que ocorre um aumento da
resposta inflamatória local, como na IR hepática, alguns mediadores podem
estimular a iNOS (geralmente após 3 a 6 horas de reperfusão) na produção de
grandes quantidades de NO pelas células de Kupffer, hepatócitos e neutrófilos
(SERRACINO-INGLOTT; MATHIE, 2000; JIANG et al., 2009; DIESEN; KUO, 2010).
No período de reperfusão, onde há uma resposta inflamatória exacerbada, estas
altas concentrações de NO podem reagir com radicais •O2-, resultando no potente
radical •ONOO-, que também causa dano às células através da peroxidação das
membranas (SERRACINO-INGLOTT; MATHIE, 2000; DIESEN; KUO, 2010). Então,
acredita-se que o NO tenha um papel ambíguo durante a IR, dependendo de sua
concentração. Assim, nos períodos iniciais da IR, as pequenas quantidades de NO
produzidas pelas células endoteliais sinusoidais atuariam como um fator atenuante
da lesão tecidual através de sua atividade vasodilatadora e contra-balanceadora da
atividade das endotelinas (PANNEN et al., 1998; SIRIUSSAWAKUL et al., 2010). Já
com a ativação da iNOS, com grandes quantidades de NO produzidas, haveria uma
tendência para o efeito deletério pela produção de radicais •ONOO- (WANG et al.,
1998).
66
Em estágios mais tardios da reperfusão hepática (após 6-12 horas), ainda há
liberação de citocinas e quimiocinas que facilitam ainda mais o recrutamento de
neutrófilos, agravando a lesão local (TEOH; FARRELL, 2003). Há também um
aumento na atividade do fator de atividade plaquetária após aproximadamente 12
horas de reperfusão, que desencadeia o processo de morte celular (MONTALVOJAVE et al., 2008).
Dependendo do tempo de isquemia e da extensão do processo, as células
podem permanecer intactas, sofrer algum grau de reparo e regeneração ou evoluir
para o processo de morte celular, que pode ser programado (apoptose), ou pode
ocorrer através de necrose celular, resultante de um processo inflamatório (TEOH;
FARRELL, 2003; MONTALVO-JAVE et al., 2008). Acredita-se que, durante a IR
hepática, a maioria das mortes celulares ocorra pelo processo de necrose celular
(GUJRAL et al., 2001).
A via L-arginina/NO parece ter relevância durante o processo de IR em vários
órgãos, tais como fígado (SERRACINO-INGLOTT; MATHIE, 2000), rim (RHODEN et
al., 2002), coração (PADILLA et al., 2000), músculo esquelético (MELDRUM et al.,
1999), intestino (EMRE et al., 2008) e cérebro (MAKSIMOVICH et al., 2006). Como
descrito anteriormente, o NO parece ter um papel ambíguo durante a IR hepática,
pois pode atuar tanto como um protetor da lesão pelo seu efeito vasodilatador, antiagregante plaquetário e scavenger de EAO, quanto um agente deletério pela
interação com radicais •O2-, formando o radical •ONOO- (SERRACINO-INGLOTT;
MATHIE, 2000; TEOH; FARRELL et al., 2003). Tem-se sugerido que a interação do
NO com radical •O2- ocasionaria uma diminuição na biodisponibilidade de NO,
levando a um distúrbio na microcirculação hepática, com um desbalanço na razão
vasodilatador/vasoconstritor (NO/endotelinas), havendo uma constrição das células
de Ito, com conseqüente diminuição do diâmetro sinusoidal (URAKAMI et al., 2007).
Para elucidar o papel da via L-arginina/NO na IR hepática, a maioria dos
autores tem empregado, em estudos experimentais, drogas que modulam a
produção do NO, como os doadores (p.ex., nitroprussiato de sódio e FK-409), os
precursores (p.ex., L-arginina), e os inibidores da produção de NO (p.ex., L-NAME)
(KOEPPEL et al., 1997; OHMORI et al., 1998; PERALTA et al., 2001; MORISUE et
al., 2003; KATSUMI et al., 2008). O delineamento básico desses estudos é o uso
prévio dessas drogas e subseqüente análise da resposta do tratamento sobre vários
67
indicadores de lesão tecidual hepática após a IR (KOEPPEL et al., 1997; OHMORI
et al., 1998; PERALTA et al., 2001; MORISUE et al., 2003; KATSUMI et al., 2008).
No entanto, a maioria desses estudos trata do efeito imediato da modulação
da produção do NO, com limitação de análise das repercussões após algumas horas
de reperfusão (LIN et al., 2004).
Portanto, o presente trabalho foi desenvolvido para verificar indiretamente a
importância do NO em um modelo experimental de IR hepática em ratos, analisando
a repercussão da inibição (com L-NAME) e da estimulação da produção do NO (com
L-arginina) em alguns parâmetros, inclusive na mortalidade peri-operatória desses
animais, considerando-se tempos de reperfusão de até 7 dias.
7.3 Metodologia empregada no estudo
O tipo de animal usado em nossos experimentos foi escolhido em virtude de
sua fácil obtenção e manuseio, além do fato de contarmos com um biotério
específico para esse tipo de animal e prática e experiência adquiridos em cirurgia
experimental em animais de pequeno porte (RHODEN et al., 1996; RHODEN et al.,
1999; RHODEN et al., 2000a; RHODEN et al., 2000b; RHODEN et al., 2002). A
anatomia e fisiologia do rato também são similares aos seres humanos, embora
possa existir uma atividade metabólica mais acelerada nos ratos, facilitando a
análise das repercussões fisiopatológicas em menor espaço de tempo. A maioria
dos trabalhos realizados por outros autores também utiliza ratos, tornando mais fácil
e fidedigna a análise e comparação dos resultados (KOEPPEL et al., 1997; OHMORI
et al., 1998; COTTART et al., 1999; RIVERA-CHAVEZ et al., 2001; PERALTA et al.,
2001; GUJRAL et al., 2001; SELZNER et al., 2002; SERRACINO-INGLOTT et al.,
2003; LIN et al., 2004; TAKAMATSU et al., 2006; CHATTOPADHYAY et al., 2008).
Outros experimentos envolveram animais de maior porte, tais como cães
(SHIMAMURA et al., 1999; AIBA et al., 2001), porcos (ISOBE et al., 2000; BURRA et
al., 2001; GIOVANARDI et al., 2009) e coelhos (WILLIAMS et al., 1995; TAHA et al.,
2009). Ressaltamos que existem poucos estudos clínicos publicados a cerca da
fisiopatologia da IR hepática (CLAVIEN et al., 2000; VARADARAJAN et al., 2004;
ALDRIGUETTI et al., 2006; LANG et al., 2007).
68
Os modelos experimentais de IR hepática em ratos variam quanto ao tempo
de isquemia hepática e área hepática envolvida pelo pinçamento vascular. A técnica
empregada neste estudo é a mesma utilizada em estudos prévios (RHODEN et al.,
1999; RHODEN et al., 2000a), consistindo no pinçamento parcial correspondente ao
suprimento sanguíneo (artéria hepática e veia porta) dos lobos mediano e esquerdo,
correspondendo a aproximadamente 70% do volume hepático do animal (RHODEN
et al., 1999). O tempo de isquemia usado neste estudo (45 minutos), seguido de
liberação do fluxo (reperfusão) é descrito por outros autores (COTTART et al., 1999;
SERRACINO-INGLOTT et al., 2003; KOTI et al., 2005). No entanto, há
pesquisadores que empregaram tempos diversos de isquemia hepática parcial,
variando de 30 a 90 minutos de isquemia (KOEPPEL et al., 1997; OHMORI et al.,
1998; GUJRAL et al., 2001; LIN et al., 2004). Outros autores usaram modelos de
isquemia hepática total, com tempos variáveis de 30 a 45 minutos (KÖKEN; INAL,
1999; HINES et al., 2005). A isquemia hepática parcial evita alguns inconvenientes,
tais como congestão esplânica, alterações hemodinâmicas significativas, aumento
da permeabilidade microvascular bem como lesões em órgãos-alvos (VOLLMAR et
al., 1994). Assim, Burra et al. (2001) empregaram um modelo de IR hepática em
porcos, em que foi realizada uma derivação portocava previamente ao pinçamento
total do pedículo por 120 minutos, no intuito de diminuir as repercussões
hemodinâmicas indesejáveis com o pinçamento total do pedículo hepático. Ficou
demonstrado, em um modelo de IR hepática em porcos, realizado por Isobe et al.
(1998), uma correlação direta entre o tempo de isquemia hepática e o grau de lesão
hepatocitária e mortalidade dos animais, com um aumento significativo a partir de
120 minutos de isquemia hepática. O mesmo também foi observado em ratos por
Vollmar et al. (1994).
A maioria dos agentes anestésicos usada em animais de laboratório de médio
e grande porte pode ser utilizada em ratos (SILVA FILHO, 2006). A via
intraperitoneal é o acesso de escolha para a administração dos anestésicos em
ratos, pois é menos dolorosa que as vias subcutânea e intramuscular e de mais fácil
execução que a via intravenosa (SILVA FILHO, 2006). Existe uma gama de opções
anestésicas que podem ser empregadas para a cirurgia de IR hepática, tais como
tiopental (OHMORI et al., 1998); éter (PERALTA et al., 2001; MORISUE et al., 2003);
uretano (KOTI et al., 2005) e fenobarbital (KOEPPEL et al., 1997). A combinação
anestésica usada no presente experimento (quetamina + xilasina) é uma opção
69
muito bem aceita e amplamente utilizada com resultados satisfatórios encontrados
por outros autores (TUNCER et al., 2007). A dose anestésica utilizada foi suficiente
para o tempo do procedimento proposto (SILVA FILHO, 2006).
A proteção da via aérea do animal durante os procedimentos experimentais,
através da intubação orotraqueal e ventilação mecânica é usada por alguns autores
(SHIMAMURA et al., 1999); no entanto, a técnica que empregamos - ventilação
espontânea – é amplamente aceita e usada por outros (SCOMMOTAU et al., 1999;
SERRACINO-INGLOTT et al., 2003; MORISUE et al., 2003; KOTI et al., 2005). Há
quem prefira a realização de uma traqueostomia para auxiliar na ventilação
espontânea, evitando-se, portanto, problemas possíveis como resistência da via
aérea superior (VOLLMAR et al., 1994; LIU et al., 1998).
Além do modelo cirúrgico experimental, um aspecto também importante para
analisarmos são a via e a dose das drogas administradas (L-NAME e L-arginina). A
maioria dos autores tem empregado a via intravenosa para a administração das
drogas (KOEPPEL et al., 1997; OHMORI et al., 1998; UHLMANN et al., 1998;
SHIMAMURA et al., 1999; SCOMMOTAU et al., 1999; LIU et al., 2000;), enquanto
que outros usaram até mesmo a via oral para a suplementação de L-arginina
(CHATTOPADHWAY et al., 2008). Em estudo realizado em porcos, Giovanardi et al.
(2009) utilizaram a infusão intra-portal de L-arginina em um modelo de isquemia e
reperfusão hepática. Preferimos usar a via intraperitoneal por ser de fácil execução,
sem causar dor excessiva nos animais, além de proporcionar uma boa absorção e
biodisponibilidade da maioria das drogas administradas (RHODEN et al., 2006).
A análise do dano hepático causado pelo modelo de IR neste trabalho foi
feita através das alterações das aminotransferases, bem como das alterações
histopatológicas (grau de necrose, congestão vascular, infiltrado inflamatório e
esteatose hepática). De um modo geral, estes parâmetros foram usados pela
maioria dos autores que investigaram a participação da via L-arginina/NO durante a
IR hepática (KOEPPEL et al., 1997; OHMORI et al., 1998; UHLMANN et al., 1998;
SHIMAMURA et al., 1999; SCOMMOTAU et al., 1999; LIU et al., 2000; PERALTA et
al., 2001; MORISUE et al., 2003; SERRACINO-INGLOTT et al., 2003; LIN et al.,
2004; TAKAMATSU et al., 2006; CHATTOPADHWAY et al., 2008; JIANG et al.,
2009; TAHA et al., 2009). Além disso, no estudo em foco, foi avaliada a mortalidade
peri-operatória dos animais operados, também analisada por outros autores
previamente (RIVERA-CHAVEZ et al., 2001).
70
Outros parâmetros de lesão hepatobiliar tais como os níveis de bilirrubinas,
desidrogenase láctica, (SHIMAMURA et al., 1999; LIN et al., 2004; MIRANDA et al.,
2007; TUNCER et al., 2007), níveis plasmáticos de ácido hialurônico (marcador de
dano das células sinusoidais hepáticas) também já foram utilizados (COTTART et
al., 1999).
Embora não tenhamos avaliado diretamente a atividade da via L-arginina /NO
na IR hepática, outros autores investigaram a produção de radicais derivados do
NO, tais como NO2- e NO3-, bem como a expressão da enzima NOS (OHMORI et
al., 1998; LIN et al., 2004; HINES et al., 2005).
Durante a IR hepática, mais precisamente na fase inicial de reperfusão
tecidual (1-3 horas), ocorre um aumento na atividade da arginase (enzima liberada
pelo dano hepatocitário que degrada a L-arginina), havendo uma redução na
produção de NO, refletindo uma queda nos níveis de NO2- e NO3-, podendo haver
correlação com o aumento das aminotransferases (SAITO et al., 1996) e com a taxa
de mortalidade dos animais submetidos à IR hepática (BLEBEA et al., 1996). Reid et
al. (2007) demonstraram que o uso de um inibidor da arginase pode reduzir o grau
de lesão hepática em um modelo experimental de transplante ortotópico de fígado.
Outra explicação para a queda nos níveis de NO2- e NO3-, seria pela interação do
NO com o radical •O2- para formar o radical •ONOO- (HINES et al., 2005). Por outro
lado, em uma fase mais tardia de reperfusão (após 6 horas), há um aumento na
atividade da enzima iNOS, com aumento na produção de NO e incremento nos
níveis dos produtos finais NO2- e NO3- (OHMORI et al., 1998). Previamente, foi
identificada uma diferença no comportamento entre um precursor do NO (L-arginina)
e um doador espontâneo do NO, que independe da ação de qualquer enzima (o FK409). Em uma fase mais precoce de reperfusão hepática, o FK-409 aumentou
significativamente os níveis de NO2- e NO3-, enquanto que L-arginina aumentou
esses níveis em um momento mais tardio de reperfusão (12 e 24 horas). A
explicação para tal fato é que o FK-409 é um doador espontâneo, que não necessita
de ação enzimática, e resulta em produção rápida e não sustentada de NO e seus
produtos; por outro lado, a produção de NO através da L-arginina, depende da ação
da NOS, que tem um aumento significativo de sua atividade em uma fase mais
tardia de reperfusão hepática (OHMORI et al., 1998).
Liu et al. (1998) demonstraram um aumento da atividade da iNOS após a
isquemia hepática, correspondendo a aproximadamente 80% da atividade da NOS.
71
Nesse mesmo estudo, o pré-tratamento com L-NAME atenuou a atividade dessa
enzima e diminui os níveis de NO2- e NO3- quando comparado ao grupo controle. No
entanto, alguns autores têm salientado a importância da cNOS durante a IR
hepática. Assim, estudos prévios indicaram um aumento significativo do grau de
lesão tecidual em animais deficientes da enzima cNOS quando comparado a grupos
controles (KAWACHI et al., 2000). Em outro estudo, Hines et al. (2005) salientaram
também a importância da cNOS na lesão induzida pela IR hepática em
camundongos. Estes autores também identificaram a capacidade do •O2- interagir
com o NO, ocorrendo a decomposição do NO derivado da cNOS; além disso, foi
observado que a superóxido dismutase exerce um efeito protetor durante a IR
hepática não somente através da atividade scavenger de •O2-, mas pelo aumento da
biodisponibilidade do NO hepatoprotetor.
A interação entre NO e •O2- resulta na formação do potente radical oxidativo
•ONOO- que, ao atuar nas membranas celulares, produz a nitrotirosina (um produto
do dano protéico), sendo um importante marcador da atividade peroxidativa do
•ONOO- nas células, tendo uma certa correlacão com as altas concentrações de
•O2- (LIU et al., 1998; SERRACINO-INGLOTT et al., 2003; TAKAMATSU et al.,
2006). Previamente, autores demonstraram uma positividade na coloração com
anticorpo antitirosina em animais submetidos à IR hepática (SERRACINO-INGLOTT
et al., 2003). Além disso, o L-NAME foi capaz de diminuir a imunorreatividade à
nitrotirosina, mas não diminuiu o grau de lesão hepática, demonstrada pelo aumento
das aminotransferases e da atividade do •O2- (LIU et al., 1998)
Apesar de o radical •ONOO- ser um potente indutor de morte celular, tem-se
demonstrado uma ação benéfica desse composto durante a IR hepática, através de
uma hepatoproteção pela diminuição da adesão e infiltração leucocitárias (LIU et al.,
2000).
Os resultados dos trabalhos que analisam a ação do NO durante a IR
hepática não são homogêneos, tendo alguns autores demonstrado efeito benéfico
(COTTART et al., 1999; KOKEN; INAL, 1999; GELLER et al., 2001; PERALTA et al.,
2001; YAGNIK et al., 2002; SERRACINO-INGLOTT et al., 2003; TAKAMATSU et al.,
2006; CHATTOPADHYAY et al., 2008), enquanto outros concluíram para uma
tendência deletéria do NO durante a IR hepática (LIN et al., 2004; TSUCHIHASHI et
al., 2006). Nesses estudos, os autores empregaram substâncias moduladoras da
atividade da via L-aginina/NO durante a IR hepática. Para aumentar a
72
biodisponibilidade de NO, os compostos usados são os percursores do NO, sendo o
mais comumente empregado a L-arginina; ou os doadores de NO (p. ex.,
nitroprussiato de sódio, FK-409). Por outro lado, as substâncias usadas na
diminuição da produção do NO são, geralmente, inibidores da NOS, sendo alguns
não-seletivos (p. ex., L-NAME, L-NMMA, L-NA) (COTTART et al., 1999) e outros
seletivos da iNOS (p. ex., FK-330; ONO 1714; aminoguanidina) (MEGURO et al.,
2002; TSUCHIHASHI et al., 2006).
Poucos são os estudos clínicos acerca do papel da via L-arginina/NO na IR
hepática. Em um ensaio clínico, envolvendo 20 pacientes submetidos à
hepatectomia parcial por carcinoma hepatocelular sob a manobra de Pringle,
Sugawara et al. (1998) evidenciaram um aumento nos níveis de nitratos nas veias
hepáticas. Os níveis de AST foram máximos no primeiro dia após a cirurgia e a
expressão da iNOS foi detectada em todos os casos, ressaltando a importância
dessa enzima na IR durante a cirurgia hepática em seres humanos.
7.4 Análise dos níveis séricos das aminotransferases em ratos submetidos à
isquemia-reperfusão hepática normotérmica, pré-tratados ou não com Larginina ou L-NAME.
Com relação às alterações das enzimas hepatobiliares, ficou demonstrado, no
presente estudo, um aumento significativo nos níveis das aminotransferases após a
IR hepática, quando comparado ao grupo controle em todos os períodos analisados,
exceto no 3º dia de reperfusão, em que os níveis de AST não se demonstraram
diferentes entre os grupos. Shimamura et al. (1999), observaram um aumento
significativo e máximo dos níveis de AST após 12 horas de reperfusão em um
modelo de IR hepática, com retorno aos níveis basais apartir do 3º dia de
reperfusão. Em outro estudo, Cottart et al. (1999) observaram um retorno dos níveis
normais de AST e ALT após 24 horas de reperfusão. Outros autores também
evidenciaram um aumento significativo nos níveis de aminotransferases após a IR
hepática (LIU et al., 1998; LIU et al., 2000; RHODEN et al., 2000a; UHLMANN et al.,
2000; GUJRAL et al., 2001; LIN et al., 2004; CHATTOPADHWAY et al., 2008; TAHA
et al., 2009).
73
No presente estudo, houve um aumento significativo dos níveis de AST e ALT
nos animais pré-tratados com L-NAME quando comparado ao grupo C em todos os
períodos analisados, exceto no 3º dia de reperfusão, em que os níveis de AST foram
semelhantes para todos os grupos. Entre os animais submetidos à IR hepática, o
pré-tratamento com L-NAME também foi capaz de aumentar os níveis de AST
quando comparado ao grupo IR. Tais achados podem ser comparados com outros
estudos (KOKEN; INAL, 1999; COTTART et al., 1999; SERRACINO-INGLOTT et al.,
2003; URAKAMI et al., 2007) que evidenciaram um aumento significativo de AST e
ALT após a reperfusão hepática com piora significativa desses níveis com a inibição
da produção de NO. Cottart et al. (1999) demonstraram que os parâmetros de lesão
hepática (níveis de aminotransferases e ácido hialurônico) pioraram com a inibição
não seletiva da NOS (com L-NAA). Por outro lado, a aminoguanidina (inibidor
seletivo da iNOS) não agravou esse dano. Os mesmos resultados foram obtidos por
Geller et al. (2001), presumindo-se que o efeito protetor pode ser devido aos baixos
níveis de NO derivado da cNOS. Em outro estudo, Morisue et al. (2003) observaram
que o L-NAME aumentou significativamente os níveis de AST, sendo máximo em 2
horas de reperfusão, enquanto a aminoguanidina diminuiu esses níveis.
Peralta et al. (2001) observaram um aumento significativo nos níveis de
aminotransferases que foram exacerbados pelo uso de L-NAME e atenuados com a
L-arginina. No entanto, não houve correlação entre lesão hepatocitária e grau de
estresse oxidativo, pois o L-NAME teve uma tendência em diminuir os níveis de
malondialdeído
(produto
do
estresse
oxidativo)
e
elevar
a
atividade
da
mieloperoxidase. Por outro lado, Lin et al. (2004) demonstraram um efeito protetor
do L-NAME na IR hepática e um efeito deletério da L-arginina, concluindo que a
expressão da NOS e o aumento da produção de NO e de radicais •OH- têm efeitos
deletérios durante a IR hepática.
Observamos um efeito protetor significativo da L-arginina nos níveis de ALT
no 7º dia de reperfusão quando comparado ao grupo L-NAME. Alguns autores
também demonstraram um efeito benéfico da L-arginina, com atenuação significativa
dos níveis de AST e ALT após a IR (UHLMANN et al., 1998; COTTART et al., 1999;
GELLER et al., 2001; RIVERA-CHAVEZ et al., 2001; LI; LIANG, 2003;
CHATTOPADHWAY et al., 2008; TAHA et al., 2009). Outros autores também
demonstraram um efeito atenuante nesses níveis com a administração de doadores
de NO (SHIMAMURA et al., 1999; OHMORI et al., 1998). Em outros estudos, o FK
74
409 (um doador de NO) teve efeito atenuante nos níveis de AST e ALT após IR
hepática (OHMORI et al., 1998; KURABAYASHI et al., 2005). No entanto, após 24h
de reperfusão, os níveis de AST e ALT foram mais elevados no grupo L-arginina. Em
outro estudo, tanto a administração de L-arginina quanto de FK409 ocasionou uma
diminuição nos níveis de AST após a IR hepática em cães (SHIMAMURA et al.,
1999). Além disso, os doadores de NO têm sido mais efetivos em atenuar o dano de
reperfusão, pois não dependem da atividade da NOS (OHMORI et al., 1998). Assim,
o nitroprussiato de sódio foi capaz de atenuar a disfunção hepática e melhorar a
sobrevida de ratos submetidos à IR hepática (RIVERA-CHAVEZ et al., 2001). Tuncer
et al. (2007) também demonstraram uma diminuição da lesão hepatocitária, pela
redução dos níveis das aminotransferases e de gama-glutamil-transpeptidase com o
pré-tratamento com L-arginina.
Ohmori et al. (1998) observaram uma relação dose-dependente do efeito da
L-arginina durante a IR hepática em ratos. Estes autores demonstraram que a Larginina na dose de 300mg/Kg exerceu um efeito deletério, aumentando os níveis de
AST; enquanto que na dose de 100mg/kg, teve uma tendência a um efeito protetor,
mantendo os níveis de AST semelhantes ao grupo controle. Ainda neste contexto,
Peralta et al. (2001) demonstraram que um doador do NO (o NONOato espermina)
teve um efeito protetor na dose de 10mg/kg, e um efeito deletério (com aumento nos
níveis de aminotransferases) na dose de 15mg/kg, provavelmente pelo seu efeito
hipotensor.
Em alguns estudos, ficou estabelecida uma correlação entre disfunção
hepática e grau de estresse oxidativo. Burra et al. (2001) demonstraram um aumento
significativo nos níveis de malondialdeído após a IR hepática em porcos, que foi
atenuado significativamente pelo tratamento com L-arginina. Em outro estudo
realizado em nosso meio, foi evidenciado um aumento nos níveis de malondialdeído
no parênquima renal após a IR em ratos. Esse aumento foi atenuado pela L-arginina
e incrementado com o uso de L-NAME (RHODEN et al., 2002). Esses dados
corroboram com os achados de outros pesquisadores, onde L-arginina reduziu
significativamente o estresse oxidativo (CHATTOPADHWAY et al., 2008) e L-NAME
aumentou a atividade das EAO após a IR hepática (KOKEN; INAL, 1999; LIU et al.,
2000). Em estudo prévio, demonstramos um aumento significativo do estresse
oxidativo, analisado pelos níveis de malondialdeído e quimiluminescência, em ratos
submetidos à IR hepática (RHODEN et al., 1996; RHODEN et al., 1999).
75
A atividade das EAO também foi analisada por outros autores através da
expressão dos radicais H2O2 (LIN et al., 2004) e •O2- (LIU et al., 1998). Tanto LNAME quanto a aminoguanidina diminuíram significativamente a produção de NO,
que foi máxima nas 2 horas de reperfusão (MORISUE et al., 2003). Alguns autores
postulam que o mecanismo de lesão induzida pelo L-NAME possa ser devido ao
aumento na biodisponibilidade de radicais •O2- (por não interagir com NO para
formar •ONOO-) e acúmulo de neutrófilos no fígado (LIU et al., 1998).
7.5 Análise das alterações histopatológicas em ratos submetidos à isquemiareperfusão hepática normotérmica, pré-tratados ou não com L-arginina ou LNAME.
A IR pode causar alterações histopatológicas em diferentes órgãos, tais como
fígado (RHODEN et al., 2000a), rim (RHODEN et al., 2000b), pulmão (SAKUMA et
al., 1999), coração (OZER et al., 2004), cérebro (PAN et al., 2007), intestino
(CERQUEIRA et al., 2005), músculo esquelético (WANG et al., 2008) e testículo (AL
MAGHREBI et al., 2010).
Os resultados do presente estudo evidenciaram um aumento significativo do
INF nos ratos do grupo IR, em comparação com os demais grupos no 1º dia. O grau
de CV nos animais submetidos à IR hepática tratados ou não com L-NAME foi
superior quando comparado ao grupo controle nos 3º e 7º dias após os
procedimentos. Além disso, o grau de CV e EST foram significativamente reduzidos
com o pré-tratamento com L-arginina na análise do 7º dia.
Em nosso meio, já foi demonstrado, previamente, que a IR hepática pode
aumentar o grau de NEC e EST, sendo amenizadas pelo alopurinol, um inibidor da
XO (RHODEN et al., 2000a). Em outra ocasião, também foi observado uma redução
no dano histológico renal provocado pela IR com o uso do alopurinol (RHODEN et
al., 2000b).
Os parâmetros empregados no presente estudo (INF, NEC, EST e CV)
também foram estudados por outros autores em modelos experimentais de IR
hepática (KOEPPEL et al., 1997; LIU et al. 2000; SERRACINO-INGLOTT et al.,
2003).
76
A lesão pós-isquêmica induzida pelo estresse oxidativo não é capaz de
causar NEC, mas há evidências de que as EAO e algumas proteases são capazes
de causar NEC após a reperfusão hepática (MATHEWS et al., 1994).
No trabalho de Gujral et al. (2001), houve um aumento significativo no grau de
apoptose celular após 1 hora de reperfusão. A maioria das células hepáticas (99%)
evoluiu para o processo de necrose oncótica e apenas 1% para apoptose. Em outro
estudo, Li e Liang (2003) demonstraram uma redução do número de células
hepáticas apoptóticas em um modelo de IR em ratos.
Previamente, em estudo realizado em nosso meio, foi demonstrado que o prétratamento com L-arginina foi capaz de diminuir o INF em um modelo de IR renal em
ratos (RHODEN et al., 2002).
No trabalho de Shimamura et al. (1999), tanto a L-arginina quanto o FK409
atenuaram o grau de CV, NEC e INF após a IR hepática. Tais achados foram
corroborados por Chattopadhway et al. (2008) que demonstraram uma redução no
grau de NEC, atrofia, hemorragia e alterações degenerativas hepáticas secundárias
à IR. Em outro estudo, L-arginina foi capaz de atenuar a infiltração leucocitária em
um modelo de IR hepática em ratos (KOEPPEL et al., 1997). Além disso, o FK409
também foi capaz de reduzir o grau de lesão hepática histológica e o infiltrado
leucocitário no estudo de Kurabayashi et al. (2005). No estudo de Rivera-Chavez et
al. (2001), L-arginina e nitroprussiato também atenuaram as alterações histológicas
induzidas pela IR hepática. Em um modelo porcino de IR hepática, Burra et al.
(2001) observaram uma redução significativa do grau de NEC, CV e apoptose pela
L-arginina após 30 minutos de reperfusão hepática. Recentemente, Tuncer et al.
(2007) também demonstraram uma diminuição do grau de lesão histológica induzida
pela IR hepática com a administração de L-arginina.
A atividade da mieloperoxidase (um marcador de migração neutrofílica no
parênquima hepático) também foi estudada por alguns autores. Ohmori et al. (1998)
identificaram uma diminuição significativa da atividade dessa enzima em ratos
tratados com L-arginina e FK-409 em um modelo de IR em ratos.
L-arginina também pode ter um efeito dose-dependente sobre as alterações
histopatológicas. Assim, Ohmori et al. (1998) demonstraram que L-arginina a
300mg/kg teve um efeito deletério nas alterações histológicas, com piora do grau de
CV e NEC; enquanto que, na dose de 100mg/kg, teve um efeito protetor, atenuando
esses parâmetros.
77
Os resultados do estudo em foco também evidenciaram um aumento
significativo do grau de CV nos animais tratados com L-NAME na análise dos 3º e 7º
dias de pós-operatório. Comparando, Pannen et al. (1998) observaram que L-NAME
foi capaz de aumentar o número de hepatócitos não viáveis após a IR hepática e,
em outro estudo, ocasionou um aumento no acúmulo de neutrófilos após IR com
endotoxemia (LIU et al., 1998). Por outro lado, a inibição da iNOS pode exercer
efeito benéfico na IR hepática. Assim, o FK-330, um inibidor da iNOS, reduziu a
ativação leucocitária, o grau de apoptose hepática e a disfunção orgânica
secundária à IR (TSUCHIHASHI et al., 2006).
7.6 Análise da mortalidade de ratos submetidos à isquemia-reperfusão
hepática normotérmica, pré-tratados ou não com L-arginina ou L-NAME.
A taxa de mortalidade global dos animais em nosso estudo foi de 17,5% (7
óbitos no total de 40 animais). Não observamos nenhum óbito nos animais do grupo
controle. Após análise estatística, não identificamos diferença significativa na
mortalidade entre os grupos. Ressalta-se que este resultado possa estar relacionado
com o tamanho da amostra empregada no estudo. Com a pré-adiministração de LNAME, houve um aumento na taxa de mortalidade, sendo superior a dos outros
grupos, porém sem significado estatístico. Por outro lado, houve apenas um óbito no
grupo tratado com L-arginina (10%). Esses resultados são comparáveis aos de
outros estudos. Morisue et al., (2003) demonstraram que a sobrevida dos ratos do
grupo IR foi de 81,6%, enquanto que a administração de L-NAME diminuiu
significativamente a sobrevida (42,7%). Segundo esses autores, as mortes podemse correlacionar a uma insuficiência microcirculatória e falência de múltiplos órgãos
(MORISUE et al., 2003). Segundo Koeppel et al. (1997), o maior número de óbitos
ocorridos nos animais com L-NAME se deve, ao menos em parte, pelas alterações
hemodinâmicas provocadas pela droga, como vasoconstrição sistêmica e esplânica.
Em outro estudo, Shimamura et al. (1999) observaram uma taxa de
mortalidade de 70% no grupo IR, enquanto que nos animais tratados com L-arginina
(precursor de NO) ou FK-409 (doador espontâneo de NO) foi nula durante um
seguimento de 14 dias. Rivera-Chavez et al. (2001) demonstraram que tanto L-
78
arginina quanto nitroprussiato melhoraram a sobrevida dos animais após a IR
hepática quando comparados ao grupo não-tratado em 7 dias após os
procedimentos; no entanto, a inibição da iNOS não alterou a sobrevida em
comparação ao grupo IR. Em outro estudo, Li e Liang (2003) demonstraram um
aumento na sobrevida em 7 dias nos ratos submetidos ao pré-tratamento com Larginina.
7.7 Perspectivas terapêuticas na isquemia-reperfusão hepática
Devido à complexidade exposta acerca da fisiopatogenia da IR hepática,
várias estratégias terapêuticas têm sido propostas para atenuar a lesão tecidual
ocasionada. Uma das alternativas para isso é o pré-condicionamento isquêmico, que
consiste em submeter o órgão ou tecido a breves períodos de IR, tornando-o mais
tolerante a períodos maiores de IR. Os mecanismos implicados neste fenômeno
ainda não estão bem esclarecidos, mas acredita-se que haja uma associação do
efeito protetor do pré-condicionamento com o NO, adenosina e diminuição na
secreção de TNF- e degradação de moléculas de ATP (TEOH; FARRELL, 2003).
Outras estratégias terapêuticas que têm proporcionado resultados satisfatórios
consistem no uso de drogas antioxidantes (por exemplo, -tocoferol, N-acetilcisteína
e alopurinol), modulação da atividade da superóxido-dismutase, controle na
produção de mediadores inflamatórios, intervenção sobre a via L-arginina/NO,
emprego de imunossupressores, entre outras (RHODEN et al., 2000a; SERRACINOINGLOTT; MATHIE, 2000; TEOH; FARRELL, 2003; CLAVIEN et al., 2007;
MONTALVO-JAVE et al., 2008; ILDEFONSO; ARIAS-DÍAZ, 2010).
Um
grande
número
de
substâncias
farmacológicas,
baseadas
nos
mecanismos hipotéticos de formação das EAO, tem sido utilizado com o intuito de
reduzir a formação das EAO e, conseqüentemente, reduzir a injúria celular
decorrente da IR (MARUBAYASHI et al., 1986; MARUBAYASHI et al., 1991;
COHEN, 1992). Entre estas, citam-se a coenzima Q10, alopurinol (RHODEN et al.,
2000a), -tocoferol (PEREIRA-LIMA et al., 2001), vitamina C, carotenóides e
glutationa, que agiriam especificamente sobre a formação das EAO (McCORD,
79
1985; MARUBAYASHI et al., 1986; COHEN, 1992; DEFRAIGNE et al., 1994; FAN et
al., 1999). Na forma sintética, as enzimas redutoras, tais como a superóxidodismutase e a catalase também já demonstraram um efeito protetor na IR tecidual
(MIZOE et al., 1997; GLANTZOUNIS et al., 2005). Substâncias como a Nacetilcisteína, agindo no sentido de promover o aumento da glutationa intracelular,
têm sido referidas também como possuidoras de um potencial benéfico (KOEPPEL
et al., 1996). Outras, como dopamina e análogos das prostaglandinas, atuariam
melhorando o fluxo sanguíneo ao órgão e evitando o fenômeno de vasoespasmo
pós-isquêmico (GEDIK et al., 2009; KOETTING et al., 2010). Substâncias como
corticosteróides, antinflamatórios não-esteróides e imunossuprossores (p. ex.,
ciclosporina) agiriam estabilizando a membrana celular e outros elementos celulares,
controlando a resposta inflamatória desencadeada pelas EAO durante a IR (TRAVIS
et al., 1998; PULITANÒ; ALDRIGUETTI, 2008). A heparina, em função de sua ação
anticoagulante, que evita a deposição de fibrina, e através de mecanismos ainda
não bem definidos, também tem sido proposta como agente protetor contra as EAO
formadas na IR (TAHA et al., 2009). Os bloqueadores dos canais de cálcio (p. ex.,
verapamil) interferem no influxo de Ca+2 durante o processo isquêmico e também
têm sido apresentados como elementos capazes de exercer algum grau de proteção
a órgãos e tecidos durante a IR (OLIVEIRA et al., 2001). Mais recentemente, a
ciclosporina, agindo especificamente nos poros mitocondriais, evitando o acúmulo
de cálcio no interior destas organelas e, conseqüentemente, mantendo a sua
homeostase, foi postulada como tendo efeito protetor na IR, tendo-se em vista
serem as mitocôndrias o principal sítio energético das células (TRAVIS et al., 1998).
Motivo de nosso estudo, a modulação da via L-arginina/NO também poderia
exercer um efeito sobre o dano tecidual causado pela IR. Na maioria dos estudos já
realizados, observou-se que os doadores bem como os precursores do NO teriam
um efeito benéfico na IR tecidual, agindo, basicamente, no aumento da
biodisponibilidade de NO, promovendo vasodilatação da microcirculação, inibição da
agregação e adesão plaquetárias, bem como diminuição da interação entre
leucócitos e superfície endotelial, reduzindo assim, a atividade inflamatória no local
(KOBAYASHI et al., 1995; KOEPPEL et al., 1997; UHLMANN et al., 1998; COTTART
et al., 1999; SHIMAMURA et al., 1999; RIVERA-CHAVEZ et al., 2001; GELLER et
al., 2001; LI; LIANG, 2003; TUNCER et al., 2007; CHATTOPADHWAY et al., 2008).
Nossos resultados sugerem um efeito benéfico parcial da L-arginina sobre o dano
80
causado durante a IR hepática em ratos. Tal fato salienta a complexidade da
fisiopatogenia da IR tecidual, não dependendo de apenas um componente da gama
de eventos que desencadeiam a lesão tecidual.
A tendência terapêutica seria o uso de um conjunto de substâncias, sob a
forma de solução, que atuariam em diversas etapas fisiopatológicas na IR. Assim,
existem as já consagradas soluções de Wiscosyn e Euro-colins, amplamente
utilizadas na preservação de órgãos transplantados. Talvez, o acréscimo de outras
substâncias (p. ex., L-arginina) a essas soluções poderia aumentar o potencial
protetor tecidual, melhorando os resultados de preservação dos órgãos.
Embora com alguns resultados controversos (HSU et al., 2002; HINES et al.,
2002), a maioria dos trabalhos demonstram um efeito benéfico do NO durante a IR
hepática (COTTART et al., 1999; PERALTA et al., 2001; SERRACINO-INGLOTT et
al., 2003; URAKAMI et al., 2007). Os resultados do presente estudo apontaram
indiretamente para um efeito protetor do NO na IR hepática em ratos. Tal efeito não
foi absoluto, provavelmente pela complexidade dos eventos fisiopatológicos
decorrentes da IR, e pela provável ambiguidade do NO que, dependendo do
momento de análise na IR tecidual, pode ser benéfica ou deletéria. A despeito de
não havermos mensurado diretamente o nível de NO, acreditamos que o efeito da Larginina seja pelo aumento da produção de NO, embora poucas informações
existam acerca da quantidade de NO produzida após a administração de L-arginina
em condições normais. Os mecanismos pelos quais o NO exerce efeito protetor
decorre da vasodilatação e melhora da microcirculação, inibição da aderência de
polimorfonucleares ao endotélio e neutralização de radicais •O2- (SHIMAMURA et al.,
1999).
Durante a IR, pode haver uma grande produção de NO através da enzima
iNOS,
com
repercussões
deletérias
(SERRACINO-INGLOTT
et
al.,
2003,
ILDEFONSO; ARIAS-DÍAZ, 2010). Nas fases iniciais de isquemia, o NO atuaria
como fator protetor por sua atividade vasodilatadora, antiadesiva e antiagregante
plaquetário e contra-balanceador da atividade das endotelinas (DHAR et al., 1998;
SCOMMOTAU et al., 1999). Conforme o tempo de isquemia, pode haver um déficit
na produção basal de NO pelas células endoteliais, com conseqüente aumento da
lesão isquêmica (SHIMAMURA et al., 1999; SERRACINO-INGLOTT et al., 2003).
Durante a reperfusão, há uma disfunção das células endoteliais que é caracterizado
por uma diminuição na produção de NO (WANG et al., 1993). A diminuição na
81
liberação de NO é o mecanismo inicial que permite a aderência de neutrófilos e sua
diapedese para a área isquêmica, com aumento da lesão durante a reperfusão
(WANG et al., 1993). Com a restauração do fluxo sangüíneo, após 2 a 6 horas de
reperfusão, haveria um aumento na atividade da iNOS, com produção de grande
quantidades de NO, que junto com a produção de EAO, através da via da XO
(mitocôndrias) e NADPH-oxidase (células de Kuppfer), haveria uma interação entre
NO e •O2-, com formação de •ONOO-, aumentando a lesão de peroxidação lipídica
(HUR et al., 1999; ISCHIROPOULOS et al., 1995).
Com relação à importância do NO durante a IR em seres humanos, poucos
estudos foram realizados dentro deste contexto. Varadarajan et al. (2004)
demonstraram um aumento no grau de lesão hepática e infiltração neutrofílica após
o transplante hepático em seres humanos. Além disso, observaram uma
biodisponibilidade reduzida de NO, pela diminuição da expressão da cNOS e não da
iNOS. Scommotau et al. (1999) demonstraram que o aumento da concentração de
NO diminuiu a gravidade da lesão induzida pela IR hepática em um estudo clínico.
Em uma experiência de 10 pacientes transplantados, Lang et al. (2007)
evidenciaram uma melhora na recuperação cirúrgica e uma diminuição no tempo de
hospitalização com o tratamento com inalação de NO.
Espera-se que, em futuro próximo, os ensinamentos obtidos através de
estudos experimentais possam trazer benefícios para o tratamento de determinadas
doenças, inclusive na proteção da lesão tecidual provocada pela IR tecidual. Apesar
da complexidade da fisiopatologia da IR tecidual, acreditamos que a via Larginina/NO possa exercer um efeito benéfico dentro desse contexto.
82
8 CONCLUSÕES
Os dados do presente trabalho permitem estabelecer as seguintes
conclusões:
- A isquemia e reperfusão hepática em ratos ocasionou um efeito deletério
quando comparado aos animais submetidos à cirurgia simulada (grupo controle),
com aumento significativo nos níveis de aminotransferases nos 1º e 7º dias e piora
de alguns parâmetros histopatológicos (INF no 1º dia, CV nos 3º e 7º dias, e EST no
7º dia).
- A administração prévia de L-NAME piorou significativamente o nível de AST
no
1º
dia
de
reperfusão
e
o
pré-tratamento
com
L-arginina
atenuou
significativamente o aumento de ALT no 7º dia.
- O grupo de ratos tratados com L-arginina demonstrou uma atenuação
significativa no grau de CV e EST no 7º dia de reperfusão.
- Não houve diferença estatística significativa nas taxas de mortalidade entre
todos os grupos pré-tratados.
Em resumo, esse estudo demonstrou um efeito deletério parcial do L-NAME e
um efeito protetor incompleto da L-arginina em ratos submetidos à isquemia e
reperfusão hepática, provavelmente pela modulação na produção de NO.
83
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