III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES EDUCAÇÃO, DIVERSIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO 11 a 13 de novembro de 2009 UFS – Itabaiana/SE, Brasil 1 A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO FEMININA NO ESTADO DE SERGIPE Inácia Maria Rodrigues do Nascimento (UFS)1 Jorge Alberto Vieira Tavares (UFS)2 INTRODUÇÃO O artigo refere-se à história da educação feminina em Sergipe, dos primórdios da Colônia até o final da República Velha, em 1930. Este trabalho é resultado de pesquisas realizadas em diversas bibliografias e periódicos que tratam sobre a temática aqui explicitada. Começaremos conceituando a palavra história, que é de origem grega “histore”; significa entre outras coisas “aquele que vê” ou “aquele que sabe”. Pretendemos com esse conceito entender que a história pode ser uma narração, verdadeira ou falsa, com base na realidade histórica, no contexto em que se insere. Para melhor entendermos precisamos entender que um documento seja ele um monumento ou um texto, nunca é “puro”, isto é, puramente objetivo. Só há fato ou fato histórico no interior de uma história-problema. A história só aos vencedores parece racional, os vencidos vivem-na como irracionalidade e alienação. ( LE GOFF, 2003, p. 30) Falar dos silêncios da historiografia tradicional não basta, é necessário questioná-la sobre as lacunas, interrogar os esquecimentos, os hiatos, os espaços em branco da história. É necessário que o historiador lance um olhar sobre a história de sua disciplina; fazendo a história da história. E isso que propomos nesse trabalho lançarmos um olhar para 1 Aluna do Mestrado de Educação da UFS, licenciada em pedagogia, trabalha na Rede Pública Estadual como pedagoga há 11 anos. [email protected] 2 Especialista em Didática, licenciado em Geografia e Pedagogia e professor do PROJOVEM URBANO [email protected] ANAIS DO III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES GEPIADDE/UFS/ITABAIANA ISSN 2176-7033 III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES EDUCAÇÃO, DIVERSIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO 11 a 13 de novembro de 2009 UFS – Itabaiana/SE, Brasil 2 a história da educação feminina sem anacronismos, estudando cada período com o olhar lançado para o período. [...] julgo que cabe ao historiador transformar a história (res gestae) de fardo – como dizia Hegel – história rerum gestarum que faça do conhecimento do passado um instrumento de libertação. Não estou reivindicando nenhum papel imperialista para o saber histórico. Julgo ser indispensável o recurso a história, no conjunto das práticas do conhecimento humano e da consciência das sociedades. (LE GOFF, 2003, p. 144-145) Para Nunes (1984) a educação: como um fato social e assim, ligado à estrutura sócio-econômica vigente, o que, porém, não impede que com ela entre em confronto e a possa superar no decorrer do processo histórico. Não a encaro como um dado preestabelecido, mas variando segundo as condições sócio-político-econômicas vividas por um povo no decorrer de sua evolução. É nesse contexto que irei abordar a história da educação, observando a estrutura sócio-econômica de cada época. Durante o período colonial e imperial a educação apresentava-se como caótica, faltavam materiais, as instalações eram inadequadas, o ensino ineficiente, os salários dos professores baixos e os índices de analfabetismo eram altos (em torno de 80%). Os professores ensinavam individualmente os alunos, não existiam livros, nem quadro negro, as escolas estaduais eram raras e funcionavam em residências improvisadas, onde o professor normalmente pagava o aluguel com o seu salário. O mobiliário escolar era improvisado. O professor custeava com seus próprios vencimentos o aluguel da sala ou do prédio. Não havia mobiliário escolar. Cabia aos alunos levarem para casa da professora as cadeiras e mesas, mas a pobreza os impedia. O máximo que se permitia era o improviso em barricas, caixões, pequenos bancos de tábua, tripeças estreitas e mal equilibradas, cadeiras encouradas ou tecidas a junco. Comum mesmo era os alunos escreverem no chão, estirados de bruços sobre papeis de jornal, ou então fazerem seus ANAIS DO III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES GEPIADDE/UFS/ITABAIANA ISSN 2176-7033 III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES EDUCAÇÃO, DIVERSIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO 11 a 13 de novembro de 2009 UFS – Itabaiana/SE, Brasil 3 exercícios de joelhos ao corredor de bancos ou à volta de cadeiras. (NUNES apud VIDAL, 2005, p. 60-61) Mesmo com a sanção por D. Pedro I da lei de 15 de outubro de 1827, que criava a instrução primária em nosso país e que dizia em seu artigo 1º- “em todas as cidades, vilas e lugares mais populosos haverá as escolas de primeiras letras que forem necessárias”, na realidade as escolas eram raras e precárias. (VIDAL, 2005, p.28) Cem anos após a promulgação dessa lei aconteceram duas reformas educacionais importantes, uma em Minas Gerais, organizada por Francisco Campos em 15 de outubro de 1927, que tinha como meta a reorganização do ensino elementar e normal, além de redefinir o papel da escola elementar que passou a ser considerada como instrumento de reconstrução social, enfatizava que as crianças não eram adultos em miniatura, pelo contrário, tinham seus próprios interesses e necessidades, que deviam ser respeitados e desenvolvidos. Nas práticas escolares podemos destacar princípios do progressivismo com destaque para trabalhos de grupos nas salas de aula, ambientes institucionais democráticos. Processo ativo de ensino e aprendizagem, cooperação entre professor e aluno, conexão entre o conteúdo do currículo e a vida real, etc. Os currículos e programas eram concebidos como instrumentos para desenvolver na criança as habilidades de observar, pensar, julgar, criar, decidir e agir. Realçava a necessidade de atividades de visitas, excursões, organização de museus, clubes escolares, bibliotecas, etc. Já a outra reforma considerada a mais revolucionária e sofisticada das promovidas nos anos vinte, aconteceu no antigo Distrito federal, no Rio de Janeiro em 22 de outubro de 1927 e foi promulgada em 23 de janeiro de 1928; elaborada por Fernando de Azevedo. ANAIS DO III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES GEPIADDE/UFS/ITABAIANA ISSN 2176-7033 III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES EDUCAÇÃO, DIVERSIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO 11 a 13 de novembro de 2009 UFS – Itabaiana/SE, Brasil 4 Essa reforma foi segundo seu autor, profunda, radical e em consonância com a civilização industrial da época. Ela enfatizou as tarefas sociais do sistema escolar e sugeriu os meios que seriam necessários para que tais tarefas fossem cumpridas. A interação entre escola sociedade foi mais enfatizada que na reforma de Campos; desejava-se uma escola primária permeada por fins sociais, em intimo contato com a comunidade, integrando as novas gerações ao ambiente social em que tal ambiente seria melhorado e reformado. As reformas elaboradas pelos pioneiros representaram um importante rompimento com a escola tradicional, por sua ênfase na natureza social do processo escolar, por sua preocupação em renovar o currículo, por sua tentativa de modernizar métodos e estratégias de ensino e de avaliação e, ainda, por sua insistência na democratização da sala de aula e da relação professor-aluno. Apesar da expressa preocupação com reconstrução social, a maior contribuição das reformas acabou por limitar-se a novos métodos e técnicas. (MOREIRA, 1997, p.91-92) Na segunda década do século XX, existe um entusiasmo e a valorização da educação que passa a ser vista como o principal problema nacional, que se resolvido, levaria a resolução dos demais. Com o aparecimento de profissionais preocupados com a qualidade da educação como Fernando de Azevedo, Lourenço Filho e Anísio Teixeira entre outros, inicia-se o otimismo pedagógico. No que o movimento escolanovista contribui, mudando o foco que ao invés de ser nas preocupações políticas passa agora para o âmbito técnico-pedagógico. Anísio Teixeira ao deslocar a carência do indivíduo para a omissão dos governos na direção da reconstrução das condições sociais e escolares, o seu pensamento liberal foi capaz de criticar a inversão política que via na educação a solução apressada dos grandes problemas humanos. ( NUNES, 2000, p. 285) A intervenção do Estado no sistema educacional brasileiro, particularmente antes de 1935, teve principalmente a função de arbitrar os conflitos entre as tendências existentes. Mas a partir de 1937, o Estado fixa um objetivo bem preciso para suas ANAIS DO III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES GEPIADDE/UFS/ITABAIANA ISSN 2176-7033 III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES EDUCAÇÃO, DIVERSIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO 11 a 13 de novembro de 2009 UFS – Itabaiana/SE, Brasil 5 intervenções: utilizar a educação como instrumento para inculcar na infância e na juventude os princípios do Estado Novo e como arma ideológica. (HORTA, 1994, p. 292293) Já a tecnificação do ensino patrocinada pelo governo durante a ditadura militar teria como premissa básica a disciplinarização, a normatização, o alto rendimento e a eficácia pedagógica. Nessa perspectiva a Educação Física escolar, teve como objetivo o desenvolvimento da aptidão física do homem, e uma preocupação histórica na defesa dos interesses da classe no poder, mantendo a estrutura da sociedade capitalista. Freire colocando-se dentro da tradição liberal dos renovadores, apoiando-se amplamente sobre a obra de Anísio Teixeira defende uma educação em sintonia com a realidade e a revisão de todo o sistema educativo, de modo a torná-lo adequado à democracia e ao desenvolvimento. O desenvolvimento era interpretado por Freire, basicamente, como processo de mudança que possibilitava a democratização; está por sua vez, funcionava como motor de novas transformações na medida em que propiciava a formação de um tipo de homem que conscientemente contribuía para o processo de desenvolvimento. Uma educação e uma pedagogia adequadas à realidade brasileira deveria ter o processo nacional como centro: ele deveria ser o real educador dos educadores nacionais. E Freire lançou-se ao atendimento de tais sugestões e exigências, fosse através da busca de uma pedagogia que servisse à discussão do “processo nacional”. Como podemos verificar a educação esteve sempre em contaste mudança e ao longo de todo o período existiram pessoas compromissadas com o seu desenvolvimento e principalmente com a melhoria da sua qualidade, cada um do seu modo e dentro do ANAIS DO III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES GEPIADDE/UFS/ITABAIANA ISSN 2176-7033 III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES EDUCAÇÃO, DIVERSIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO 11 a 13 de novembro de 2009 UFS – Itabaiana/SE, Brasil 6 contexto próprio da época, mas principalmente lutando pela democratização do ensino e diminuição do analfabetismo. Mas não poderíamos deixar de mencionar que a mulher no período colonial e imperial esteve aquém desse processo educacional, pois suas atribuições principais eram: ser dona de casa, mãe e esposa; já ao homem português era dado o direito de usufruir da vida de todos os habitantes da colônia. Esse direito era devido à sua condição de “senhor” da família patriarcal. Aliás, é oportuno explicitar aqui que família vem da palavra latina “famulus” que significa escravos domésticos de um mesmo senhor: mulheres, filhos, crianças, escravos, terras, etc. Eram “bens” pertencentes ao poder dito na época “naturalmente” construído ao deleite do gênero masculino. O que podemos evidenciar como atitudes do patriarcalismo, que tem como característica básica “a autoridade imposta institucionalmente pelo homem sobre a mulher e os filhos no âmbito familiar. Autoridade esta que vem sendo contestada devido à entrada da mulher no mercado de trabalho remunerado, da utilização de anticoncepcionais e da sua conscientização de igualdade em relação ao homem, com direitos às mesmas prerrogativas e de controlar seus corpos e suas vidas”. (CASTELL, 1999, p. 169-170). A crise do patriarcalismo para Castell (1999, p. 173-174) teve início devido à insatisfação dos casais, resultando na dissolução dos lares por meio do divórcio ou separação, que leva a formação de lares de solteiros ou lares com apenas um dos pais, cessando assim a autoridade patriarcal sobre a família, das crises matrimoniais e da dificuldade em compatibilizar casamento, trabalho e vida, que acaba por adiar a formação de casais e aumentando os relacionamentos sem casamento, que devido à falta de legalização enfraquece a autoridade patriarcal tanto do ponto de vista institucional como psicológico. ANAIS DO III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES GEPIADDE/UFS/ITABAIANA ISSN 2176-7033 III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES EDUCAÇÃO, DIVERSIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO 11 a 13 de novembro de 2009 UFS – Itabaiana/SE, Brasil 7 No início da colonização a organização familiar e a vida doméstica foram influenciadas por elementos que marcaram profundamente a formação da sociedade brasileira e o modo de vida de seus habitantes. A distância da Metrópole era um dos fatores que dividia muitas vezes os membros da família entre os dois lados do Atlântico, também a falta de mulheres brancas, a presença da escravidão negra e indígena, a constante expansão do território, assim como a precariedade de recursos e de toda a sorte de produtos com os quais estavam acostumados os colonos no seu dia-a-dia. Para tratarmos da vida doméstica na Colônia, implica em penetrarmos no âmbito do domicílio, que foi de fato o espaço de convivência da intimidade. O domicílio, portanto, se sobrepõe a família numa análise desse tipo, na medida em que as famílias, além de se constituírem a partir de diferentes tipos de uniões (sacramentadas ou não), encontravam-se muito freqüentemente dispersas por longos períodos – característica de certa forma imposta pela própria colonização. Ora era o pai que se ausentava a serviço da Coroa ou em virtude de suas atividades, ora era a filha que se casava fora do seu local de domicílio, ou o filho que partia numa expedição ao sertão. Isso sem contar esposas e maridos que abandonavam a família para viver com outros companheiros, além, é claro, das repetidas interrupções dos laços familiares causadas por mortes prematuras. (ALGRANTI, 1997, p. 86) A educação em Sergipe não era diferente do restante do país, atendia as exigências da classe dominante, a quem interessava apenas assegurar o ingresso dos filhos nas escolas de nível superior, havia um desestímulo na implantação do ensino popular e profissionalizante. A Capitania de Sergipe Del Rei era basicamente rural, mas aos poucos passou a ter na cana-de-açúcar sua principal atividade econômica. Com a expulsão dos jesuítas no Brasil, durante a Reforma Pombalina, pretendia-se instalar uma educação laica, de responsabilidade do Estado. Para substituírem os colégios dos Jesuítas, extintos pelo Alvará de 1759, só a partir de 1772 começaram a serem criadas ANAIS DO III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES GEPIADDE/UFS/ITABAIANA ISSN 2176-7033 III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES EDUCAÇÃO, DIVERSIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO 11 a 13 de novembro de 2009 UFS – Itabaiana/SE, Brasil 8 as Aulas Régias. Em 1760 houve concursos para as Aulas Régias de Gramática Latina e Retórica em várias Capitanias. Mas durante o período de 1760 a 1772, diversos concursados lecionaram gratuitamente, ou recebendo pagamento de seus alunos. Em Sergipe o novo sistema só chegou ao final da década de 1780 com a nomeação dos primeiros professores. A educação encontrava-se caótica nos fins do século XVIII, os professores encontravam-se com seus salários atrasados, o que os levava a faltarem com suas obrigações, as crianças não freqüentavam as aulas por falta de incentivo de seus pais, ou porque alguns Mestres eram repudiados pelos seus péssimos costumes ou indolência. As mulheres apesar de serem responsáveis pela alfabetização de grande número de crianças no interior das casas-grandes e fazendas, não apareciam nas estatísticas, presas a uma estrutura social de laços consanguíneos ou de clientela, só a partir dos meados do século XIX começaram a transformar-se em assalariadas. Apesar do desenvolvimento econômico de Sergipe em 1820, devido ao aumento da produção canavieira e de engenhos, a maioria da população era analfabeta, mesmo muitos negociantes abastados. Muitas vezes um opulento sergipano encomendava aos seus vizinhos que lhe trouxesse um português de bons costumes que soubesse ler e escrever, para casar-se com a filha. Com a promulgação da Lei de 15 de outubro de 1827, estabelecendo que “em todas as cidades, vilas e lugares mais populosos haverá Escolas de Primeiras Letras que forem necessárias”. (NUNES, 1984, p. 39) A meta era a criação de Escolas de Primeiras Letras para alfabetizar os que procuravam. Também previa a criação de escolas de meninas, desde que o Presidente da Província e o Conselho julgassem necessário. ANAIS DO III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES GEPIADDE/UFS/ITABAIANA ISSN 2176-7033 III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES EDUCAÇÃO, DIVERSIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO 11 a 13 de novembro de 2009 UFS – Itabaiana/SE, Brasil 9 Embora pobre destituída em sua maior parte de direitos e privilégios sociais, referida usualmente com expressões depreciativas como gentalha, canalha, miseráveis, gente que vive da misericórdia de Deus, etc., o certo é que mais da metade da população de Sergipe pertencia, ao menos durante as primeiras décadas de oitocentos, a esta categoria: a dos homens livres, trabalhadores do eito, agregados, moradores de condição, meeiros e rendeiros. Gente pobre, na sua maioria livre, vivendo nas periferias das vilas e das grandes propriedades canavieiras, tal massa populacional, talvez apresentando um estilo de vida muito semelhante ao da escravaria, sobretudo no que se refere às práticas e tipo de trabalho, à dieta alimentar, vestuário, sujeição as doenças, etc., tal população constituída, junto com a escravaria, motivo de grandes preocupações à elite senhorial e a população em geral. (NUNES, 1984, p. 41) A mulher era reclusa no interior do seu lar, reflexo do domínio patriarcal, o homem temia que a mulher letrada escapasse ao seu mandonismo tradicional, conforme o cancioneiro popular assim entendia: Menina que sabe muito É menina atrapalhada Para ser mãe de família Saber pouco ou mesmo nada. (CALASANS apud THETIS, 1984, p. 47-48) Apesar das medidas revolucionárias do Marquês de Pombal, só a partir de 1790, começaram a surgir escolas públicas femininas em Portugal, a educação feminina acontecia no interior dos lares das famílias abastadas através de preceptoras, o ensino basicamente restringia-se a ler e escrever, música, trabalhos manuais e domésticos. Em Sergipe data de fevereiro de 1831 a criação na Capital, em Estância, Própria e Laranjeiras, de cadeiras públicas para o sexo feminino. O governo provincial avocava a responsabilidade de ministrar as Primeiras Letras à mulher sergipana. (NUNES, 1984, p. 47). Mas o ensino secundário era restrito apenas aos homens. O ato adicional de 1834 trouxe muitas mudanças para educação brasileira, dentre a tentativa de uniformização do currículo das Primeiras Letras. Os conteúdos eram diferentes ANAIS DO III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES GEPIADDE/UFS/ITABAIANA ISSN 2176-7033 III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES EDUCAÇÃO, DIVERSIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO 11 a 13 de novembro de 2009 UFS – Itabaiana/SE, Brasil 10 nas escolas femininas, que estudavam: Leitura e caligrafia, Gramática da língua nacional, teoria e prática de Aritmética até as quatro operações e os trabalhos de agulha. O ensino primário em Sergipe era entregue a leigos, devido ao apadrinhamento político, que admitiam inábeis Mestres. Conforme disse o Presidente Dr. Anselmo Peretti em 1843, ao traçar o panorama educacional de Sergipe: “ Não pode ser pior o estado da instrução aqui; e faltam-me expressões para descrever a inépcia, o desleixo, a incúria, a apatia, a inércia e a indolência que se ostenta o ensino público, principalmente o primário, com pouquíssimas exceções”. Existiam professores que não ensinavam aos discípulos “nem assinarem o nome”, como ele próprio evidenciou na Vila do Maroim. (NUNES, 1984, p.67) A criação de Escolas Normais em Sergipe, só aconteceu em 1870. A princípio só para alunos do sexo masculino, o acesso da mulher aconteceu de forma diferente em cada província. Em Sergipe foram criadas Escolas Normais femininas apenas em 1877. A possibilidade de realizar o curso normal era, para as jovens sergipanas no final do século XIX e no início do século XX, uma das últimas oportunidades de continuarem estudando e se prepararem para exercer uma atividade profissional fora do ambiente doméstico, uma vez que o magistério era socialmente aceito e entendido como prolongamento dos papéis femininos exercidos no lar. (FREITAS, 2002, p.49) O número de escolas femininas nas últimas décadas do Império teve um grande crescimento, foram instaladas as escolas mistas, mas infelizmente o discurso corrente de que a mulher deveria ser educada para ser boa esposa e mãe não sofreu alterações. Segundo Freitas (2002) o inicio da República aponta para a necessidade da educação da mulher, vinculando-a à modernização da sociedade, à higienização da família e a formação dos futuros cidadãos. A ênfase na escolarização feminina vinculava-se à função social de educadoras dos filhos. ANAIS DO III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES GEPIADDE/UFS/ITABAIANA ISSN 2176-7033 III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES EDUCAÇÃO, DIVERSIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO 11 a 13 de novembro de 2009 UFS – Itabaiana/SE, Brasil 11 O ensino superior para as mulheres foi possível com a Reforma Leôncio de Carvalho em 1879, mas só em 1881, ingressavam na Faculdade de Medicina no Rio de Janeiro Ambrosina Magalhães e Augusta Castelões Fernandes, seguidas de outras que foram tendo acesso aos diversos ramos do ensino superior. Nos últimos anos do Império, a vida educacional de Sergipe se mantém estática, apesar do impulso dado em 1870, reflexo dos problemas econômico-financeiros, vinculados as oscilações do mercado internacional que a agricultura canavieira passava devido aos preços desfavoráveis da safra de açúcar. Nas primeiras décadas da República, poucas mudanças aconteceram no sistema educacional brasileiro, uma vez que a maioria da população continuava analfabeta. As escolas primárias em Sergipe continuavam a ser abertas para atender interesses políticos, elevando o índice de professores incompetentes para exercer o magistério. Durante as décadas de 1910 e 1920, assiste-se a um aumento da matrícula nas instituições do ensino primário e normal. O ensino secundário acaba sendo centralizado na capital, em Aracaju, tendo como instituição-modelo o Atheneu Sergipense - equiparado ao Ginásio Nacional em 1908. A partir do final da primeira década da República, muitas escolas particulares passam a oferecer também o ensino secundário. (FREITAS, 2002, p.51) Fato destacado nessa época é a presença da mulher nos cursos do Atheneu. Eram muitas delas, jovens que tinham ambições intelectuais, mas tolhidas, em seus vôos de buscarem os Estados onde existiam Faculdades, pelos preconceitos da sociedade ou por não disporem de recursos financeiros. ANAIS DO III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES GEPIADDE/UFS/ITABAIANA ISSN 2176-7033 III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES EDUCAÇÃO, DIVERSIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO 11 a 13 de novembro de 2009 UFS – Itabaiana/SE, Brasil 12 Rompe-se assim na primeira metade da década do século XX, a tradição dominante de que o lugar da mulher estudar, além do curso primário, era a Escola Normal que, realmente desempenhou um papel decisivo na formação intelectual feminina de Sergipe, como atesta o ritmo de crescimento da matrícula. (NUNES, 1984, p. 201) Em 1912 surgem as Escolas Noturnas para adultos de ambos os sexos, elas se propunham a ensinar a ler, escrever e contar correntemente. Visavam preencher as exigências das fábricas aos operários, para o ingresso nas mesmas ou exercerem outras atividades. O sistema educacional, porém, não acompanhava as transformações estruturais sergipanas, apesar de tentativas feitas para alterá-lo pelos dirigentes. O ensino secundário continuava livresco, ornamental, mera passagem para os cursos superiores, só o concluindo no Atheneu os que não dispunham de recursos para seguir os estudos em outros Estados. ( NUNES, 1984, p. 232) Aumenta a participação da mulher em outros setores de atividades, além do magistério primário e normal. As mulheres começam a ocupar cargos no funcionalismo público, o que serve de estimulo para que as jovens não estudassem apenas na Escola Normal, mas também no Atheneu e Escola de Comércio. Devemos ressaltar a importância das Reformas educacionais acontecidas durante todo o período, do Colonial ao Republicano, que contribuíram para a emancipação da mulher, que aos poucos foi deixando a vida doméstica para alçar vôos, nas brechas (a princípio) do sistema educacional, que fizeram com que a mulher se profissionaliza-se e conquista-se um lugar na sociedade patriarcalista, de início como professora, (já que muitos a achavam aptas para ensinar) devido a sua condição de mãe, para depois aos poucos conquistar outros campos profissionais. ANAIS DO III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES GEPIADDE/UFS/ITABAIANA ISSN 2176-7033 III FÓRUM IDENTIDADES E ALTERIDADES EDUCAÇÃO, DIVERSIDADE E QUESTÕES DE GÊNERO 11 a 13 de novembro de 2009 UFS – Itabaiana/SE, Brasil 13 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALGRANTI, Leila Mezan. Família e vida doméstica. In: Souza, Laura de Mello e Souza, (Org.). História da vida privada no Brasil: cotidiano e vida privada na América portuguesa. 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