Efeitos do Recurso Ordinário cível
Samoel Martins Evangelista, DesembargadorPresidente do Tribunal de Justiça do Estado do Acre,
Pós-Graduado em Direito Processual Civil.
Celso Jerônimo de Souza, Promotor de Justiça da
Terceira Promotoria Cível de Rio Branco-Ac.
Presidente da Associação do Ministério Público do
Estado do Acre, Pós-Graduado em Direito
Processual Civil e Direito Público.
1. Introdução.
2. Objetivo do recurso.
3. Efeitos jurídicos do recurso.
4. Efeito devolutivo.
5. Efeito suspensivo.
6. O recurso ordinário.
7. Procedimento do recurso ordinário.
8. Fundamentos jurídicos do recurso ordinário e nuances da ação mandamental.
9. Alternativa para evitar eventual lesão irreparável ou de difícil reparação.
10. Conclusões.
11. Referências Bibliográficas.
1. INTRODUÇÃO.
Historicamente os recursos são dotados de efeitos devolutivos e suspensivos,
sendo que aqueles praticamente todos os recursos possuem, enquanto estes são reservados
para situações em que a execução imediata do julgado pode ocasionar gravame irreparável ou
de difícil reparação ao vencido. Há recurso que admite os dois efeitos e ocorrendo esta
hipótese, fala-se que o ele foi recebido no duplo efeito, como é a apelação cível.
O presente trabalho pretende refletir, tão-somente sobre os efeitos do recurso
ordinário tirado das decisões proferidas, em única ou última instância, em sede de mandado
de segurança pelos tribunais regionais federais ou estaduais, no exercício das suas
competências originárias.
Deste modo, cumpre assinalar que não será abordado o recurso ordinário
interposto para impugnar decisão proferida em causas envolvendo Estado estrangeiro e
município ou pessoa que mora no Brasil.
Considerando a definição do recurso ordinário, como sendo a apelação com
outro título (nome), pelo menos no tocante ao juízo de admissibilidade (CPC, art. 540), poderse-ia afirmar que, a exemplo desta, deve aquele ser recebido mediante atribuição dos efeitos
devolutivo e suspensivo, já que não integra as exceções inscritas no artigo 520 do Código de
Processo Civil?
2. OBJETIVO DO RECURSO.
Ao julgar o recurso no mérito, ou seja, se o órgão ad quem dele conhecer,
podem ocorrer duas hipóteses: 1 – pode ser negado provimento ao recurso se entendido que a
impugnação é infundada; 2 – pode ser dado provimento ao recurso entendendo-se fundada a
impugnação, pelo que o órgão ad quem reforma a decisão recorrida ou simplesmente a anula,
dependendo logicamente tenha reconhecido a existência de error in judicando ou de error in
procedendo.
Cumpre assinalar que os efeitos do julgamento nos casos de error in judicando
o objeto do juízo de mérito no procedimento recursal coincide com o objeto do juízo no grau
inferior, ou seja, do ponto de vista qualitativo ambos os pronunciamentos se reportam à
mesma matéria, e como não podem subsistir duas decisões com o mesmo objeto, o
julgamento pelo tribunal ad quem substitui a decisão recorrida no limite de sua impugnação,
ou seja, nos limites em que dela conheceu o tribunal do recurso. É o que determina o art. 512
do CPC (o julgamento proferido pelo tribunal substituirá a sentença ou a decisão recorrida no
que tiver sido objeto de recurso).
Nos casos de error in procedendo, dar-se-á a substituição somente no caso de
ser negado provimento ao recurso. É que se este for provido, anulará a decisão recorrida pelo
que, obviamente, não poderá substituir a decisão já que não haverá mais a decisão do órgão a
quo, que foi cassada, nem do órgão ad quem, que se limitou a cassar a decisão determinando
que nova seja proferida.
3. EFEITOS JURÍDICOS DO RECURSO.
O primeiro deles é o de ampliar procedimentalmente a relação processual, vez
que vários atos processuais serão praticados após o pedido de reexame da decisão contra a
qual o recurso é interposto. Com essa série de atos, forma-se um novo procedimento que é
denominado procedimento recursal. O segundo efeito jurídico adia o trânsito em julgado da
decisão impugnada, ou seja, interrompe a concreção da coisa julgada (art. 467 do CPC).
O terceiro efeito é o de prorrogar a litispendência, vez que uma série de atos,
no procedimento recursal, envolve via de regra, as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o
mesmo pedido que já foram conhecidos no 1° grau de jurisdição.
A doutrina tradicional identifica mais dois efeitos: o devolutivo e o suspensivo
e a doutrina moderna passou a criar outros fenômenos a partir das tendências legislativas do
processo civil, aos quais Nelson Nery Junior nomina de efeito expansivo, efeito translativo e
efeito substitutivo dos recursos. O objetivo deste trabalho é examinar apenas os primeiros, isto
é, os efeitos devolutivo e suspensivo, notadamente, no recurso ordinário contra decisão
proferida em mandado de segurança.
4. EFEITO DEVOLUTIVO.
Nos primórdios, a função ou poder de julgar e dizer o direito nos conflitos de
interesses era do Imperador, que representava a figura divina na terra. Com o passar do
tempo, as sociedades começaram a ficar mais complexas e com isso, os conflitos
experimentaram paulatino incremento, inviabilizando suas soluções pelo soberano, posto que
lhe tomava precioso tempo o qual poderia ser despendido com as demais questões de interesse
da coletividade.
Com isso, resolveu ele delegar a função jurisdicional a determinados
funcionários, sobretudo, na Roma antiga, preservando, destarte, o poder de revisar a decisão
proferida, caso o jurisdicionado, não concordando com o resultado do julgamento, recorresse
ao Imperador, titular da função jurisdicional, a fim de modificar ou confirmar a decisão
hostilizada. Daí porque surgiu a noção da devolutividade dos recursos, vale dizer, devolvia-se
ao titular do poder, o reexame da matéria decidida pelo funcionário delegado.
Por efeito devolutivo, subentende-se a transferência ao órgão ad quem da
matéria impugnada, com o objetivo de reexaminar a decisão recorrida. Como o recurso é um
prolongamento do exercício do direito de ação, a sua interposição transfere ao órgão ad quem
o conhecimento da matéria impugnada. O juízo destinatário do recurso somente poderá julgar
o que o recorrente tiver requerido nas suas razões de recurso, encerradas com o pedido de
nova decisão.
Assim, como bem salienta Nelson Nery Junior: “o efeito devolutivo
prolonga o procedimento, pois faz com que o processo fique pendente até que a decisão
judicial não mais seja impugnável, quer pela inércia da parte em não interpor recurso, quer
pelo esgotamento da instância recursal. Por outras palavras, o efeito devolutivo adia a
formação da coisa julgada”
5. EFEITO SUSPENSIVO.
Efeito suspensivo é a propriedade do recurso que leva ao adiamento da
produção dos efeitos normais da decisão hostilizada, a partir do momento em que é possível
impugná-la.
Tem início com a publicação da decisão impugnável por recurso para o qual a
lei prevê efeito suspensivo e termina com a publicação da decisão que julga o recurso.
Segundo o magistério de Barbosa Moreira, Vicente Greco Filho, Nelson Nery Junior e
outros, o efeito suspensivo do recurso não tem a característica de retardar o trânsito em
julgado da decisão, porque o adiamento ocorre em razão do efeito devolutivo. Luiz
Rodrigues Wambier, Teresa Arruda Alvim e outros doutrinadores distinguem o efeito
suspensivo em duas modalidades: típico e atípico.
Para esta corrente, o recurso tem efeito suspensivo típico quando a suspensão
da eficácia da decisão impugnada decorre da simples interposição do recurso, ou, nas palavras
de Luiz Rodrigues Wambier, “da mera situação de recorribilidade”. É o caso da apelação –
que, como regra geral, é dotada de efeito suspensivo -, por força de disposição legal expressa.
Note-se que quando o efeito suspensivo decorre de um pedido (como na hipótese do art. 558
do CPC) ou da formação de pedido cautelar, já há a tramitação de feitos que serão, em
virtude desses casos suspensos, por causa da interposição do recurso e da formulação do
pedido. Dá-se, então, o fenômeno processual do efeito suspensivo atípico.
6. O RECURSO ORDINÁRIO.
O recurso ordinário, de cunho constitucional, tem por objetivo impugnar
decisão denegatória de segurança, consoante estabelece o artigo 102, II, a e 105, II, b da
Constituição Federal, verbis:
Art. 102. Compete ao Supremo tribunal Federal, precipuamente, a
guarda da Constituição, cabendo-lhe:
II – Julgar, em recurso ordinário:
a)- o habeas corpus, o mandado de segurança,
segurança, o habeas data e o
mandado de injunção decididos em única instância pelos Tribunais
Superiores, se denegatória a decisão.
decisão.
Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:
II – julgar, em recurso, ordinário:
b) os mandados de segurança decididos em única instância pelos
Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados, do Distrito
Federal e Territórios, quando denegatória a decisão.
decisão.
Por seu turno, o legislador ordinário, também, disciplinou a matéria como se
nota pela redação do Código de Processo Civil, com o seguinte comando:
Art. 539. Serão julgados em recurso ordinário:
I – pelo Supremo Tribunal Federal, os mandados de segurança,
segurança, os
hábeas data e os mandados de injunção decididos em única instância pelos
Tribunais Superiores, quando denegatória a decisão.
II – pelo Superior Tribunal de Justiça:
a)- os mandados de segurança decididos em única instância pelos
Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados e do Distrito
Federal e Território, quando denegatória a decisão;
b)- as causas em que forem partes, de um lado, Estado estrangeiro ou
organismo internacional e, de outro, Município ou pessoa residente e
domiciliada no País.
Parágrafo único. As causas referidas no inciso II, aliena b, caberá
agravo das decisões interlocutórias.
A exegese dos dispositivos transcritos autoriza concluir que o recurso ordinário
é exclusivo do impetrante, exceto o instituído pelo art. 539, II, b, do Código de Processo
Civil, e deve ser exercitado no prazo de 15 (quinze) dias, conforme orienta o artigo 508 do
CPC.
7. PROCEDIMENTO DO RECURSO ORDINÁRIO.
Dispõe o artigo 540 do estatuto processual civil que se aplica ao recurso
ordinário, quanto aos pressupostos de admissibilidade e ao procedimento, no juízo recorrido,
as mesmas regras de regência do recurso de apelação, senão vejamos:
Art. 540. Aos recursos mencionados no artigo anterior aplica-se quanto
aos requisitos de admissibilidade e ao procedimento no juízo de origem, o
disposto nos Capítulos II e III deste Título, observando-se, no Supremo
Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça, o disposto nos seus
regimentos internos.
Por seu turno, o Regimento Interno do STJ preconiza que:
Art. 248. Distribuído o recurso, a Secretaria fará os autos com vista ao
Ministério Público pelo prazo de cinco dias.
Parágrafo único. Conclusos os autos ao relator, este pedirá dia para
julgamento.
Como se infere do dispositivo regimental citado, após a distribuição do recurso
ordinário, ele sequer passa pelo Relator, indo direto ao Ministério Público, para colher seu
parecer, somente depois é que os autos lhe serão conclusos, quando então terá a oportunidade
de fazer-lhe o juízo de admissibilidade, podendo adotar uma das seguintes providências:
a)- nega seguimento ao recurso, se inexistente um dos requisitos de
admissibilidade (art. 557, CPC, art. 38, Lei nº 8038/90 e art 34, XVIII, RISTJ);
b)- positivado o recebimento, dá provimento ao recurso, se a decisão
impugnada estiver em manifesto confronto com súmula ou jurisprudência dominante do STF
e STJ (CPC, art. 557, § 1ºA), ou então, leva o recurso a julgamento perante o órgão colegiado
competente (art. 34, X, e art. 248, Parágrafo único, RISTJ).
8. FUNDAMENTOS JURÍDICOS DO RECURSO ORDINÁRIO E NUANCES DA AÇÃO MANDAMENTAL.
Como já visto em outro lugar, a decisão que reclama recurso ordinário é aquela
proferida no exercício da competência originária pelos Tribunais de Justiça ou Regional
Federal, denegando a ordem de segurança, tendo como destinatário o Superior Tribunal de
Justiça, que funcionará como tribunal de segundo grau ou corte de apelação.
De igual sorte, os Tribunais Superiores (STF, STJ, TSE, TST, STM), que
denegarem mandado de segurança, da sua competência originária, o recurso ordinário será
interposto perante o tribunal superior correspondente, endereçado ao STF que funcionará
como tribunal de segundo grau.
Não apenas a decisão que denega, mas também aquela que extinguir o
processo, onde se veicula mandado de segurança, sem julgamento do mérito, podem ser
desafiadas por recurso ordinário. De fato. É questão superada a exegese restritiva, que outrora
chegou a imperar, sobretudo, no pretório, segundo a qual, apenas a primeira se expunha ao
recurso ordinário.
Oportuno advertir que, se o Relator designado para o mandado de segurança,
por decisão unilateral indeferir a inicial, por entender faltar algum dos requisitos da lei de
regência ou que a matéria não pode ser ventilada nesta via, esta decisão não fica exposta a
recurso ordinário, sendo necessário, provocar a decisão colegiada em sede de agravo
regimental, para que em sendo confirmado a rejeição da inicial, possa o impetrante, interpor o
recurso ordinário 1 .
Assim, se denegada a ordem ou extinto o processo sem julgamento do mérito,
o impetrante poderá manejar recurso ordinário perante o tribunal recorrido endereçado ao
STJ, cuja disciplina é a mesma prevista para a apelação, no tocante à sua admissibilidade e
procedimento.
No caso do tribunal conceder a segurança e esgotadas a instância ordinária, ao
2
impetrado restará tão-somente a via do Recurso Especial ou Extraordinário, se houver ofensa
1
Neste sentido decidiu o STJ ao julgar em 24.2.1992 o RMS 1365, relatado pelo Ministro Dias Trindade, publica no DJU de
23.3.1992, página 3481.
2
O STF firmou entendimento que a legitimidade para recorrer é do representante da pessoa jurídica interessada e não da
autoridade impetrada. Hely Lopes Meirelles se contrapõe a essa posição pretoriana.
de lei federal ou à Constituição Federal. Como é sabido, inexiste remessa necessária do aresto
concessivo da segurança, ao contrário do que ocorre com a sentença do juízo singular. (LMS,
art. 12, parágrafo único).
Se a assertiva é verdadeira, então o recurso pode ser recebido no efeito
devolutivo e suspensivo?
A doutrina majoritária inclina no sentido de admitir apenas o efeito devolutivo,
isto porque anota o Ministro Humberto Gomes de Barros no seu Artigo: Recursos Cíveis
Ordinários e Regimentais no Superior Tribunal de Justiça 3 , a eficácia suspensiva seria
contrária aos imperativos de urgência e auto-executoriedade que inspiram o processo do
mandado de segurança; o recurso ordinário presta-se, apenas, ao desafio de acórdão
denegatório da segurança. Ora, se a decisão recorrida nada concedeu, não há o que
suspender.
Contudo, no caso de haver liminar deferida, revogada pelo acórdão
denegatório, responde o Ministro que o recurso ordinário será recebido no duplo efeito,
citando, inclusive, precedente da Corte, Primeira Turma, em acórdão da sua lavra exarado no
Agravo Regimental na Medida Cautelar nº 569/RJ, in verbis:
“A teor do sistema consagrado no Código de Processo Civil, o recurso
ordinário em mandado de segurança produz eficácia suspensiva (CPC, arts. 520
e 540).”
Conclui que admitido o recurso nos efeitos devolutivo e suspensivo, a eficácia
da decisão colegiada ficará suspensa e, por isso, a liminar remanescerá ativa e eficaz.
Sua linha de raciocínio e a seguinte:
“O Acórdão montou-se na observação de que o art. 540 do Código de
Processo Civil trata o recurso ordinário – no que se refere à admissibilidade –
como se fora apelação. Ora, a teor do art. 520, ‘a apelação será recebida em seu
efeito devolutivo e suspensivo’, a não ser nas cinco hipóteses arroladas naquele
dispositivo legal. Como o acórdão que denega segurança não está arrolado
entre aquelas exceções, é de se concluir que o recurso ordinário em mandado
de segurança há que ser admitido no duplo efeito. O Professor Cássio
3
Doutrina. Superior Tribuna de Justiça. Edição Comemorativa – 15 anos, pp; 431-447.
Scarpinella Bueno arrola valiosas opiniões doutrinárias, prestigiando esse
entendimento.”
É verdade, também, que o artigo 247 do Regimento Interno do Superior
Tribunal de Justiça manda aplicar ao recurso ordinário em ação de segurança, o regime da
apelação previsto no CPC.
Art. 247. Aplicam-se ao recurso ordinário em mandado de segurança,
quanto aos requisitos de admissibilidade e ao procedimento no Tribunal
recorrido, as regras do Código de Processo Civil relativas à apelação.
Na lição de Alcides de Mendonça Lima 4 , o recurso contra decisão
denegatória da segurança deve ser recebido no efeito suspensivo e, com isso, suspenso fica,
inclusive, a decisão que revogou a liminar, concluindo, assim, que esta continua a produzir
seus efeitos, impedindo a auto-executoriedade do ato administrativo censurado pelo mandado
de segurança até o julgamento do recurso, a despeito da Súmula 407 do STF proclamar que
denegado o mandado de segurança, fica sem efeito a liminar concedida.
Para o Professor Cássio Scarpinella Bueno, esta súmula se assentou em
precedentes jurisprudenciais de 1963, portanto, antes da vigência do Código de Processo
Civil, em 1973, estando em descompasso com a novel ordem processual civil devendo, por
isso, ser revista pelas críticas que contra aqueles vetustos precedentes podem ser lançadas.
Diz mais, que conquanto extravagante a lei de regência do mandado de
segurança, suas lacunas devem ser integradas pelo Código de Processo Civil, ainda que
textualmente admita a aplicação deste apenas no tocante ao litisconsorte (LMS, art. 19), em
especial, a disciplina dos recursos.
Como se percebe, essa corrente doutrinária diferencia o mandado de segurança
com veiculação de pedido de liminar, do mandado de segurança sem esse pedido, para
assegurar que no primeiro, acolhida a liminar suspendendo o ato tido por ilegal, abusivo ou
arbitrário da autoridade administrativa, se o Tribunal, ao definir o processo, denegar a ordem
pleiteada ou colocar fim ao processo sem julgar-lhe o mérito, eventual recurso ordinário,
observado os requisitos de admissibilidade, deve ser recebido no efeito devolutivo e
4
Sua doutrina remonta 1958, antes, portanto, da edição da Súmula 407 do STF em 1963.
suspensivo, afirmando que a suspensão do decisório impugnado restabelece (repristina) ou
conserva a eficácia da liminar anteriormente concedida até a definição do ordinário.
É verdade que a tese do Ministro Humberto Gomes de Barros, Cássio
Scarpinella Bueno, Ovídio Baptista da Silva, Alcides de Mendonça Lima, Sérgio Ferraz,
Botelho de Mesquita, Luiz Antônio Barbosa Franco e Adroaldo Furtado Fabrício acerca do
restabelecimento da eficácia da liminar, decorrente de recurso ordinário munido de efeito
suspensivo, é sedutora, mas não parece, permissa venia, ser a melhor.
Sem prejuízo destas abalizadas e respeitáveis vozes defendendo o duplo efeito
do recurso ordinário na decisão denegatória da segurança com liminar positivada, contudo
pedimos licença para discordar.
Como contraponto a essa corrente doutrinária, comecemos pelo exame do
artigo 808, III, CPC, cuja redação vale transcrever:
Art. 808. Cessa os efeitos da medida cautelar:
(...).
III – se o juiz declarar extinto o processo principal, com ou sem
julgamento do mérito.
Não bastasse a regra legal, o STF pacificou o entendimento sobre a matéria
com a edição do Verbete 407 no seguinte sentido:
“Denegado o mandado de segurança pela sentença ou no
julgamento do agravo dela interposto, fica sem efeito a liminar concedida,
retroagindo os efeitos da decisão contrária”.
Assim, afigura correto dizer que denegada a ordem, independente da anterior
concessão de liminar, o recurso, se admitido, o será no efeito meramente devolutivo,
porquanto o aresto que nega a segurança tem natureza declaratória negativa, não havendo, a
rigor, efetivamente o que suspender. Nesse sentido, RT 684/169, RT 662/115.
Por seu turno, há até quem sustente que o recurso ordinário é munido apenas
do efeito meramente devolutivo, porque está sujeito ao mesmo regime do artigo 497 do
CPC, que disciplina:
“O recurso extraordinário e o recurso especial não impedem a
execução da sentença; a interposição do agravo de instrumento não obsta
o andamento do processo, ressalvado o disposto no artigo 558 desta Lei”
Certo é que denegada a ordem, julgando-se o mérito do mandado de segurança,
pelo tribunal, revogando ou não expressamente a liminar antes deferida, não há que se falar
em efeito suspensivo do acórdão recorrido. Ademais, considerando que a liminar teve seus
efeitos cessados pela definição do mandamus, o ato administrativo alvejado restabelece sua
eficácia. De sorte que a suspensão do julgado restaria providência inútil.
Razão disso, também não prospera o entendimento segundo o qual, ainda que o
recurso ordinário não tivesse efeito suspensivo, poder-se-ia aplicar-lhe o comando do artigo
558, parágrafo único do CPC, que teria incidência para as exceções contempladas pelo artigo
520 do mesmo estatuto processual, se presentes a possibilidade de lesão grave ou de difícil
reparação, desde que relevantes os fundamentos, e que não difere da norma inscrita no artigo
7º, II, da LMS.
Ocorre, todavia, que a invocação do artigo 558, parágrafo único, em
substituição ao caput do artigo 520, não resolve a questão como sugere o Professor
Scarpinella, porque ainda, assim, a suspensão do aresto atacado continua a ser medida
processual inútil, porquanto a decisão desfavorável ao impetrante, nada de concreto
reconheceu ou impôs ao impetrado.
De outro norte, pudesse prevalecer o entendimento de que o efeito suspensivo
no recurso ordinário restabelece a liminar, isto criaria, data maxima venia, uma situação
surreal.
Toda vez que o juiz, no primeiro grau, ou o relator, no tribunal, acolher o
pedido liminar, o impetrado se veria obrigado a agravar da decisão, para na eventualidade de
ser inexitoso o mandado de segurança, se houver recurso admitido no duplo efeito, não correr
o risco de ter a liminar restabelecida. Explica-se. Como é sabido, se na pendência do agravo, o
processo principal for julgado, aquele recurso (agravo) fica prejudicado, pela superveniente
perda do interesse recursal. Pois bem. A prevalecer a tese da repristinação, a assertiva da
perda do objeto passaria a ser um sofisma, porquanto remanesceria o interesse recursal, para o
fim de reformar a decisão interlocutória e, assim, evitar a sua sobrevida até a definição do
recurso ordinário.
Não parece acertado, igualmente, a assertiva segundo a qual, a decisão
denegatória do mandado de segurança até o trânsito em julgado, seria ato ineficaz e que a
interposição do recurso apenas prolongaria essa ineficácia, querendo com isso, admitir a
possibilidade de conferir-lhe efeito suspensivo. Ora, é preciso não descurar que a via, na
hipótese, é de mão dupla, isto é, pudesse a decisão denegatória ser ineficaz até o trânsito em
julgado, também a autoridade dita coatora, só estaria obrigada a cumprir a ordem concedida,
após o seu trânsito em julgado.
Sabemos, destarte, que não é bem assim, até pela natureza mandamental do
julgado concessivo (LMS, art. 12, parágrafo único, in fine). Não fosse assim e se tivesse de
aguardar o lapso temporal preclusivo, a medida judicial deferida, quando executada, poderia
se tornar providência totalmente inútil.
De igual sorte, se o efeito suspensivo em apelação ou recurso ordinário pudesse
reviver a liminar cassada pela decisão desfavorável ao impetrante, haveria que se reconhecer,
também, como possível restabelecer a eficácia de liminares concedidas nos demais processos,
cujas decisões desafiam recursos no efeito suspensivo, até pela aplicação do princípio da
simetria.
Dir-se-ia em contraposição que mandado de segurança é ação especial e,
portanto, não se confunde com as ações de rito ordinário. Destarte, o raciocínio e os
fundamentos, permissa venia, não podem ser diferentes.
9. ALTERNATIVA PARA EVITAR EVENTUAL LESÃO IRREPARÁVEL OU DE DIFÍCIL REPARAÇÃO.
Se se é certo que a decisão denegatória da segurança pelo tribunal se expõe a
recurso ordinário no efeito meramente devolutivo, não sendo possível imprimir-lhe o efeito
suspensivo e a liminar continuar vigendo, pelos motivos já esposados em linhas pretéritas.
Como justificar a sobrevida de liminar cassada por decisão lançada mediante cognição
exauriente, reconhecendo a inexistência do direito liquido e certo ao impetrante, para depois
dar prevalência ao ato produzido anteriormente em cognição sumária? Não parece uma
subversão?
Se a tese da sobrevida da liminar viesse dos processos com decisões
terminativas, (sem julgamento do mérito), até não seria de todo questionável, uma vez que na
hipótese, a extinção do processo decorreu de um vício processual e não da existência ou
inexistência do direito afirmado pelo impetrante, conquanto o artigo 808, III, CPC, seja
expresso em contrariar tal conclusão, a exegese da Súmula 407 não a desautoriza, até porque
esta não deixa dúvida, quando proclama que a cessação dos efeitos da liminar decorre da
denegação da ordem, nada dizendo acerca da extinção do processo sem aferição de mérito.
Sem embargo disso, certo é que o remédio para evitar eventual lesão
irreparável ou de incerta reparação, será a medida cautelar albergada pelo artigo 800,
parágrafo único do CPC, perante o STJ, não para emprestar efeito suspensivo ao recurso
ordinário, mas para suspender o próprio ato administrativo atacado pelo mandado de
segurança denegado, mercê da necessidade da prévia interposição do referido recurso. Dito
isso, pode surgir a seguinte indagação: a cautelar só pode ser requerida ao tribunal competente
quando o recurso já tiver subido à instância superior? Sérgio Bermudes sugere que sim.
Há quem diga, ainda, como Clito Fornaciari Júnior que enquanto não subir o
recurso, a competência para ação cautelar permanece com o juízo recorrido.
Não parece, concessa venia, ser esta a melhor interpretação do dispositivo
legal acima citado, eis que sua redação parece clara ao dizer:
Art. 800. As medidas cautelares serão requeridas ao juiz da causa e,
quando preparatórias,
preparatórias, ao juiz competente para conhecer da ação
principal.
principal.
Parágrafo único. Interposto o recurso,
recurso, a cautelar será requerida
diretamente ao tribunal.
tribunal.
Nesse particular, não há como discordar de Cássio Scarpinella Bueno quando
sustenta:
“...a razão está com aqueles que entendem que a interposição do
recurso é causa suficiente para que a competência para
conhecimento e processamento da ação cautelar, nos precisos
termos do parágrafo único do art. 800 do CPC, seja transferida
para o tribunal competente para apreciação da causa em sede
recursal 5 .
O tema, entretanto, não é tranqüilo na doutrina, o Ministro Carlos Alberto
Menezes Direito do STJ, por exemplo, faz censura a essa posição dizendo que não tem o
menor cabimento, em caso de sentença denegatória da ordem de segurança, de efeito
declarativo, admitir a medida cautelar inominada como equivalente a uma nova liminar para
suspender o ato de autoridade apontado como ilegal ou abusivo, configuração, de resto,
repelida pela sentença 6 .
10. CONCLUSÕES.
1)- A decisão do Tribunal Estadual ou Regional Federal, que no exercício da
sua competência originária, denegar mandado de segurança ou extinguir o processo sem
julgamento do mérito pode ser desafiada por recurso ordinário dirigido ao STJ. Assim,
decisão singular do relator não se expõe ao referido recurso, podendo esta ser impugnada em
sede de agravo regimental;
2)- A legitimidade para interposição do recurso ordinário na hipótese acima é
exclusiva do impetrante, de sorte que na hipótese da concessão da ordem, por ocasião do
julgamento do mérito, restaria ao impetrado como alternativa, se for o caso, agitar o recurso
extraordinário e/ou especial;
3)- Recurso ordinário não é instrumento de controle apenas da ordem negativa
de segurança, mas, também, nas causas em que forem partes, de um lado, Estado estrangeiro
ou organismo internacional e, de outro, Município ou pessoa residente e domiciliada no País;
4)- O recurso tirado da decisão denegatória de segurança, havendo ou não
anterior concessão de liminar, será recebido no efeito meramente devolutivo, não sendo
possível emprestar-lhe o efeito suspensivo, posto que a natureza do julgado é declaratória
negativa e nada foi imposto a autoridade coatora, razão pela qual, não há o que suspender;
5)- A concessão de liminar em sede de segurança, que mais tarde foi denegado
pelo tribunal com revogação explícita ou implícita da liminar, ainda que o recurso pudesse ser
5
6
Liminares em Mandado de Segurança. Um tema com variações. 2ª edição. São Paulo.RT. 1999. p. 315.
Manual do Mandado de Segurança, 3ª edição, Renovar, p. 154.
recebido no efeito suspensivo, não se restabelece a eficácia desta, podendo o ato estatal
alvejado pelo mandado de segurança, ser executado, por ter recuperado sua autoexecutoriedade;
6)- Interposto o recurso ordinário, pode o recorrente propor perante o tribunal
competente para dele conhecer, ação cautelar inominada objetivando suspender não o acórdão
atacado, mas o próprio ato da autoridade coatora, até o julgamento do recurso, retardando,
assim, a auto-executoriedade do ato administrativo, sem o que estará apto a produzir todos os
seus efeitos jurídicos contra o particular.
11. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
BARBI, Celso Agrícola. Do Mandado de Segurança. Rio Janeiro: Forense. 2000.
BARROS, Humberto Gomes de. Doutrina. Superior Tribuna de Justiça. Edição
Comemorativa – 15 anos. 2005.
BUENO, Cássio Scarpinella.Liminar em Mandado de Segurança. São Paulo: RT. 2001.
CAVALCANTI, Temístocles Brandão. Do Mandado de Segurança. RDA-37. jul-set. 1954.
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Efeitos do Recurso Ordinário Cível - Samuel Evangelista