Síntese do Trabalho ANGINA REFRATÁRIA NO BRASIL O DESAFIO DA BUSCA POR NOVAS ESTRATÉGIAS TERAPÊUTICAS E PELA MELHORIA NA QUALIDADE DE VIDA DOS PACIENTES DENTRO DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE Luís Henrique Wolff Gowdak Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo 2014 INTRODUÇÃO A despeito dos incontestáveis avanços no tratamento médico e em procedimentos de revascularização miocárdica, sintomas debilitantes relacionados à doença arterial coronária (DAC) podem ocorrer devido à progressão da doença, impossibilitando novos procedimentos de revascularização miocárdica. Esta condição é conhecida como ANGINA REFRATÁRIA. A incidência anual estimada de pacientes com diagnóstico de angina refratária situa-se entre 50 e 200 mil casos novos nos Estados Unidos e entre 30 e 100 mil na Europa. Embora não tenhamos dados estatísticos nacionais sobre a prevalência desta condição, podemos estimar que no Brasil entre 380 mil e 1,1 milhão de indivíduos convivem diariamente com sintomas incapacitantes devidos à angina refratária. Característica desta condição é o grande prejuízo dos afetados em termos de qualidade de vida, impedidos de realizar as atividades mais triviais do dia-adia sem que a dor anginosa ocorra; alguns pacientes são despertados frequentemente durante a noite por angina. Além disso, o consumo de recursos do Sistema de Sáude é imenso pois estes pacientes são admitidos, via Unidades de Emergência, em centros especializados e levados às Unidades de Terapia Intensiva ou Unidades Coronarianas para procedimentos diagnósticos complexos e tentativas de intervenções terapêuticas. Para estes pacientes, o objetivo principal do tratamento é a melhoria na qualidade de vida, com maior tolerância ao esforço, e menor necessidade de hospitalizações e procedimentos diagnósticos ou terapêuticos. No Brasil, não havia um programa especificamente dedicado na assistência de pacientes com angina refratária. Assim, em 2008, o Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP criou o NÚCLEO DE ESTUDOS E PESQUISA EM ANGINA REFRATÁRIA (NEPAR). OBJETIVOS 1. Oferecer uma abordagem multidisciplinar a pacientes com angina refratária incluindo assistência médica, aconselhamento nutricional e psicológico e atividade física supervisionada 2. Integrar uma rede de pesquisa “da bancada ao leito” 3. Trazer ao país os mais recentes avanços em medicamentos e dispositivos médicos atualmente disponíveis em outros centros internacionais 4. Estabelecer um Programa de Reabilitação Cardiovascular 5. Tornar-se um Centro Nacional de referência no tratamento desta condição 6. Determinar sua história natural 7. Definir seus mecanismos celulares e moleculares 8. Identificar biomarcadores genéticos e moleculares de prognóstico 9. Tornar-se um Centro de Educação Médica e Treinamento 10. Compartilhar o conhecimento adquirido e os avanços em pesquisa RESULTADOS Desde a criação do NEPAR, aproximadamente 900 pacientes já foram encaminhados para avaliação. Avaliamos anualmente, em média, 200 pacientes com diagnóstico presuntivo de angina refratária. Mantendo-se esta média de seleção de pacientes, em poucos anos teremos uma das maiores coortes de pacientes com angina refratária sendo seguidos em um único centro e dentro do Sistema Único de Saúde. Até o momento, aproximadamente 100 pacientes já foram incluídos em protocolos fase I e II/III de terapia celular combinada à cirurgia de revascularização miocárdica incompleta. Os resultados obtidos dão conta da segurança e exequibilidade do procedimento, sem eventos adversos sérios reportados. Estudos de perfusão miocárdica do nosso grupo demonstraram aumento da perfusão nos territórios injetados e não-revascularizados com melhora da qualidade de vida dos pacientes submetidos ao procedimento. Até o momento, o NEPAR conseguiu incluir um novo fármaco antiisquêmico metabólico (trimetazidina) e implementar ao menos duas estratégias: a revascularização transmiocárdica a laser (RTML) e a revascularização miocárdica extra-corpórea por ondas de choque dentro do Sistema Único de Saúde. Outras duas teconologias, a estimulação da medula espinhal (EME) e a contra-pulsação externa (CPE) tem projetos em fase de elaboração; um novo fármaco (ivabradina) tem sido dispensado a pacientes selecionados mediante acordo com o fabricante. Estudo de segurança com 10 pacientes revelou a exequibilidade e segurança da RTML combinada à terapia celular, justificando sua exploração em ensaio clínico randomizado, duplo-cego e controlado por placebo. Atualmente, este estudo encontra-se em fase de inclusão de pacientes. No momento, 30 pacientes já foram incluídos nesta sub-projeto. CONCLUSÃO E APLICABILIDADE Resultado da combinação do aumento da expectativa de vida da população brasileira, da diminuição da mortalidade por DAC ajustada pela idade e do aumento da prevalência dos fatores de risco (particularmente diabetes, obesidade e hipertensão), é esperado crescimento da população de pacientes em que a doença continua sua progressão inexorável rumo a formas mais avançadas, com envolvimento arterial difuso, e distal a enxertos ou stents previamente implantados. Esta condição, conhecida como ANGINA REFRATÁRIA, tornou-se um grande desafio clínico diante da constatação de que o tratamento convencional é pouco eficaz. A implementação do Programa do NEPAR mostrou ser aplicável dentro do SUS, desde a abordagem multiprofissional inicial para otimização clínica até a utilização de dispositivos mais complexos. A análise de custo-efetividade poderá demonstrar que a adoção e eventual incorporação de tais estratégias ao arsenal terapêutico atualmente disponibilizado justifica os esforços para que o Brasil também tenha um programa de atenção ao portador de angina refratária. Os milhares de indivíduos afetados aguardam ansiosamente esta resposta. Palavras-Chave: doença coronária – angina – tratamento – qualidade de vida – saúde pública