Luna Halabi Belchior; Luisa Rauter Pereira; Sérgio Ricardo da Mata (orgs) Anais do 7º. Seminário Brasileiro de História da Historiografia – Teoria da história e história da historiografia: diálogos Brasil-Alemanha. Ouro Preto: EdUFOP, 2013. (ISBN: 978-85-288-0326-6) Oliveira Lima e a Alemanha: Influências historiográficas e bismarckismo Júlio César de Oliveira Vellozo1 Em uma carta a um amigo, Lima Barreto comenta as ideias racistas científicas com as quais tivera contato em sua adolescência: Diz que as misturas entre as raças são um vício social, uma praga e não sei que coisa feia mais. Tudo isso se diz em nome da ciência e a coberto da autoridade dos sábios alemães. Oh! A ciência! Eu era menino, tinha aquela idade, andava no meio dos preparatórios quando li, na Revista Brasileira, os esconjuros, os seus anátemas...Falavam as autorizadas penas do senhor Domício da Gama e Oliveira Lima....Eles me encheram de medo (PRADO: 2012, pp.15) O trecho é interessante em vários aspectos, alguns dos quais não atinentes a esta exposição, como, por exemplo, o perceptível sofrimento de Lima Barreto diante do opressor estatuto de “cientificidade” que o racismo tomou naquele período. Mas há outros aspectos interessantes. O primeiro é a influência, detectada por Lima, que os teóricos alemães exerciam sobre os intelectuais do período. A ideia do autor de Clara dos Anjos de que era a sabedoria dos alemães, e não dos franceses ou ingleses, que dava a cobertura de ciência ao racismo científico faz pensar. Mostra o quanto é simplista a ideia de que na Belle Époque brasileira havia um francesismo de maioria acachapante, com uma pequena resistência germanófila, de certo modo isolada, exercida por Silvio Romero e alguns poucos outros da chamada Escola de Recife. Oliveira Lima foi um dos mais importantes intelectuais do período e exerceu, como podemos ver pelo trecho da carta de Lima Barreto, uma importante influência. Foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras na qual exerceu papel relevante, influenciando de modo importante a escolha de novos membros. Como crítico literário e jornalista esteve ao lado de nomes como José Veríssimo e Machado de Assis, durante as primeiras décadas do século XX, como um dos nomes capazes de oferecer consagração ou indiferença aos que se aventuravam 1 Doutorando em História Social pela Universidade de São Paulo (USP), Professor da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie. 1 Luna Halabi Belchior; Luisa Rauter Pereira; Sérgio Ricardo da Mata (orgs) Anais do 7º. Seminário Brasileiro de História da Historiografia – Teoria da história e história da historiografia: diálogos Brasil-Alemanha. Ouro Preto: EdUFOP, 2013. (ISBN: 978-85-288-0326-6) no campo das letras. Como diplomata foi um dos nomes chave do Itamaraty, só abaixo de Rio Branco e Joaquim Nabuco. Como historiador, apesar de ter sustentado, de certo modo, visões não hegemônicas em seu tempo, teve marcante influência, especialmente após a publicação de Dom João VI no Brasil. A ligação de Oliveira Lima com a Alemanha, quando discutida, tem sido buscada, fundamentalmente, na identificação de influências de tipo metodológico no seu fazer de historiador. Os estudiosos da obra de Oliveira Lima tem se debruçado em buscar desvendar que tipo de impacto a obra dos historiadores alemães, marcadamente Leopold V. Ranke, mas não só ele, teria tido em sua obra. Para tanto, especialmente as duas primeiras obras do autor, Pernambuco, seu desenvolvimento histórico (1895) e Aspectos da Literatura Colonial Brasileira (1896) , escritos em Berlim, são alvo de especulações sobre esta influencia da historiografia alemã ( SOBRINHO: 1971, MALATIAN: 2001, GOUVEA: 1976) Esta comunicação visa olhar a questão por outros prisma, sem negar a importância dos esforços e a fecundidade das polêmicas descritas acima. Queremos encontrar a influência germânica sobre Oliveira Lima não exatamente no texto, mas no contexto e na intenção de sua obra, inspirando-nos, ainda que livremente, na metodologia proposta por Quentin Skinner (SKINNER: 2000) Iberismo na contracorrente da História e da história Conforme destacou Nicolau Sevcenko a intelectualidade da Belle Epoque esteve marcada de modo forte pela experiência da República em seu alvorecer. Se houve uma importante parcela da intelectualidade que aderiu ao novo regime, foram marcantes as resistências, os desajustes, os descontentamentos. É interessante notar que unia tanto os aderentes ao novo poder republicano, quanto os renitentes, que viam no novo poder uma farsa uma interpretação negativa do passado. Os que aderiram às diferentes fases do novo poder republicano, viam o passado como um enorme obstáculo, o que explicava as limitações da nova experiência. A herança deixada pelo império era maldita, daí as dificuldades: um país de mestiços, uma população de analfabetos, uma infra-estrutura econômica inexistente, séculos de escravidão que haviam degenerado o nosso corpo social. Em suma, havia uma nação a construir e era necessário paciência para que o 2 Luna Halabi Belchior; Luisa Rauter Pereira; Sérgio Ricardo da Mata (orgs) Anais do 7º. Seminário Brasileiro de História da Historiografia – Teoria da história e história da historiografia: diálogos Brasil-Alemanha. Ouro Preto: EdUFOP, 2013. (ISBN: 978-85-288-0326-6) novo regime pudesse superar tantos obstáculos. Já os críticos ao novo poder, o eram fundamentalmente pela fraqueza da República e de seus líderes em romper com o passado de forma decidida. Assim, renitentes e aderentes tinham algo em comum: um balanço negativo do passado brasileiro e do legado que o Império deixara à República. É claro que entre estes dois extremos, aderentes cúpidos e renitentes oposicionistas, havia todo um gradiente de posicionamentos, visões de mundo, balanços do passado. Um grupo que pode ser classificado de uma forma ou de outra são os monarquistas, que mantiveram uma posição distinta. Mas, é preciso que se diga, este grupo era pequeno e pouco influente, para além de sofrer de permanentes defecções, como a de Joaquim Nabuco, para ficarmos em um exemplo. A rejeição à herança ibérica, que faria fortuna no pensamento social brasileiro no futuro, deita a suas raízes nesta rejeição radical do passado brasileiro. Euclides da Cunha, Alberto Torres, Silvio Romero, Manoel Bomfim, cada qual ao seu modo, atacaram o passado, sustentando a necessidade de aberta ruptura com este, para que se pudesse abrir espaço para a modernização, para que o Brasil se colocasse no compasso do século. Por eloquentes, citamos as palavras de Manoel Bomfim: Em verdade, que significação pode ter, para o Brasil, a política de conservação? Nos povos experimentados, quando a sucessão dos governos corresponde aproximadamente à opinião do país, para o desenvolvimento das suas tradições essenciais, a política de conservação será uma forma de equilíbrio, porque o passado vale como lastro nas oscilações de sempre e manancial de indicações, ao longo da evolução necessária. Então, ele é, de fato, a chave do futuro. Mas, para nós, quando o passado incorpora, apenas, o bragantismo alastrado no oligarquismo reinante, a política de conservação significa soterramento na podridão crescente, que é mesmo o nosso passado. De tudo que é história, no Brasil soberano, só temos a conservar o que nunca se realizou: o sonho de liberdade e justiça para a plena expansão desta nacionalidade, em gênio americano-brasileiro. 3 Luna Halabi Belchior; Luisa Rauter Pereira; Sérgio Ricardo da Mata (orgs) Anais do 7º. Seminário Brasileiro de História da Historiografia – Teoria da história e história da historiografia: diálogos Brasil-Alemanha. Ouro Preto: EdUFOP, 2013. (ISBN: 978-85-288-0326-6) E no inevitável duelo passado-futuro, não há que poupar, até a total eliminação de todo o mesmo passado, que só tem sido mal2. Oliveira Lima, em um primeiro momento de sua trajetória esteve deste mesmo lado. Suas primeiras obras criticavam o legado português, com seu jesuitismo, suas carolice, sua pouca propensão ao pensamento de tipo científico. Isso está expresso em suas primeiras obras, marcadamente em Pernambuco, seu desenvolvimento histórico e Nos Estados Unidos, impressões políticas e sociais. Entretanto, este tipo de visão negativa do passado foi se enfraquecendo, se amainando, e em obras como Dom João VI no Brasil já encontramos uma visão positiva tanto do passado brasileiro quanto do legado ibérico. O choque japonês Um momento que nos parece decisivo para esta transformação na posição de Lima foi a sua estada na Japão, para o qual seria transferido em 1901 e no qual viveria até 1903. Assim como havia feito nos outros países nos quais estivera, Oliveira Lima debruçou-se na literatura disponível sobre o país e, estando em solo japonês, elaborou a sua própria visão, cujas conclusões seriam determinantes para a sua obra. Lima identificou no Japão um novo caminho para a modernização, diferente do que ele e quase todos de sua geração propugnavam para o Brasil. Lá modernizar-se não significara abrir mão das tradições e do passado, mas, pelo contrário, apoiar-se nelas. Mais ainda, a modernização japonesa amparava-se em uma raça que, segundo os esquemas mais duros do racismo científico ainda em voga era inferior à branca. Sendo assim, pode-se dizer que o Japão demonstrava a Oliveira Lima que o caminho para a modernização não passava pela negação do passado português e, menos ainda, pela mudança da composição racial da população brasileira, verdadeira mania do pensamento social brasileiro de seu tempo. Não à toa, é em seu livro sobre o Japão que Oliveira Lima dá um giro em sua intepretação sobre o legado ibérico, aí incluso o papel dos jesuítas, tão malhados em sua obra anterior: 2 BOMFIM, Manoel. O Brasil Nação. Rio de Janeiro: Record, 1998. p. 657 4 Luna Halabi Belchior; Luisa Rauter Pereira; Sérgio Ricardo da Mata (orgs) Anais do 7º. Seminário Brasileiro de História da Historiografia – Teoria da história e história da historiografia: diálogos Brasil-Alemanha. Ouro Preto: EdUFOP, 2013. (ISBN: 978-85-288-0326-6) Também – e por certo as oitavas de Camões, recordando perenemente tantas glórias, são um dos motivos máximos da infalível sugestão – o nome português brilha para nós no Oriente com uma luz vivíssima, assim como a língua do poeta vibra para sempre em palavras soltas nas línguas dos diferentes estranhos povos com que o Reino esteve em contato (...) (...) é triste registrar que os portugueses do Oriente agora pela maior parte se acanham de ser portugueses. A decadência de hoje, comparada com a passada grandeza e com a prosperidade presente de outras metrópoles poderosas, os move a acolherem-se de preferência à larga sombra da bandeira britânica, esquecendo a nacionalidade e em muitos casos até a língua de seus maiores (...). Os naturais de Macau, por exemplo, dizem-se fora quase todos oriundos de Hong Kong, sem mais se lembrarem que Macau é um posto europeu há quatro séculos quase e Hong Kong há pouco mais de meio século apenas Nós porém brasileiros, não temos iguais motivos para olvidar ascendência e, demais, andamos todos hoje em dia tão pétris d’historie que mal podemos furtar-nos aos pensamentos grandíloquos, privilégio noutras eras dos espíritos cultos. Não logramos esquecer-nos, pelos portos percorridos da Arábia, do Ceilão, da Indochina, onde a esta hora tremulam todos os pavilhões, que já foi o português o único a afoitar-se a flutuar: antes a cada instante nos recordamos que, dentro os europeus, foram os portugueses os primeiros, chegados pelo mar, a desembarcar sem medo, mercadejar sem descanso e dominar sem peidade nas terras tropicais, gordas, férteis e luxuriantes do continente asiático, tanto quanto nos seus areais inóspitos, bordados de rochas nuas e negras (LIMA: 1997, p.28) 5 Luna Halabi Belchior; Luisa Rauter Pereira; Sérgio Ricardo da Mata (orgs) Anais do 7º. Seminário Brasileiro de História da Historiografia – Teoria da história e história da historiografia: diálogos Brasil-Alemanha. Ouro Preto: EdUFOP, 2013. (ISBN: 978-85-288-0326-6) Para o autor o longo período de isolamento consciente vivido pelo Japão durante a dinastia dos Tokugawa, onde todo o contato com o exterior foi evitado, havia forjado um tipo de cultura baseada no nacionalismo, na disciplina, no senso de hierarquia, na ausência de abertura para as frivolidades da modernidade. Isso permitiu que o Japão, ao se abrir, levasse a cabo um tipo de modernização que não necessitou anular as tradições do país. Este caminho, de uma modernização feita a partir da manutenção das características nacionais, da recusa da cópia dos modelos da França, da Inglaterra e dos Estados Unidos, faria Oliveira Lima nutrir grande simpatia pela experiência alemã em geral, e pelo bismarckismo em particular. Se o caminho que possibilitara ao Japão ascender a um processo de modernização sem mimetismo havia sido o período de insulamento da dinastia Tokugawa, no caso da Alemanha, a persistente destilação nacionalista que se dera no período que mediou entre a derrota para Napoleão em 1814 e vitória diante da França em 1871, teria tido o mesmo efeito. Orgulho nacional curtido pelos anos de humilhação, somado à existência de um tipo de poder forte, amigo das letras, devotado ao passado, como havia sido o de Bismarck, possibilitara o caminho, na visão de Oliveira Lima. É interessante notar que a historiografia alemã esteve profundamente envolvida, ainda que em alguns casos de modo indireto, com o sentimento da unificação alemã. O tipo de discurso que embasou o processo, a ideia de raízes imemoriais que uniam o povo germânico desde a noite dos tempos, tinha na atividade dos historiadores um ponto de apoio fundamental. Malgrado ser o século XIX o período no qual a historiografia, especialmente a alemã, buscou para a história o estatuto de ciência ( BENTIVOGLIO e LOPES: 2013), os historiadores germânicos não podiam deixar de olhar o passado - como de resto fazem todos os historiadores - a partir das questões colocadas pelo presente. Estas eram, fundamentalmente, as relacionadas ao tema da nação. É importante notar que perceber esta interação entre política e historiografia não deve significar aderir à ideia de que a historiografia alemã do século XIX se resuma à uma apologética das elites conservadoras ou a uma construção ideologizada do passado. A busca pela construção de um estatuto científico para a história, consubstanciado em um debate metodológico de grande riqueza, não se contradiz com as determinações da posição ocupada pelos historiadores germânicos. 6 Luna Halabi Belchior; Luisa Rauter Pereira; Sérgio Ricardo da Mata (orgs) Anais do 7º. Seminário Brasileiro de História da Historiografia – Teoria da história e história da historiografia: diálogos Brasil-Alemanha. Ouro Preto: EdUFOP, 2013. (ISBN: 978-85-288-0326-6) É neste sentido que consideramos que Oliveira Lima foi influenciado pela historiografia alemã: tratava-se de, olhando para o passado, tentar responder às perguntas do presente. No caso brasileiro, como no do alemão, o tema fundamental colocado à intelectualidade era o de completar o processo formativo da nação e coloca-la no compasso do século. E isso era especialmente importante para Lima, conforme veremos. Oliveira Lima viveu na Alemanha entre 1892 e 1896, período no qual a historiografia do país ainda gozava de enorme prestígio e debater a história, seus métodos, limites, alcances e possibilidades, eram um tema de preferencia no cenário local. Esta influencia pode ser verificada, por exemplo, nas referencias de Oliveira Lima a autores como Barthold Georg Niebuhr. Além disso, Lima preconizava que os estudos históricos brasileiros não poderiam deixar de olhar para a Alemanha sob pena de graves prejuízos: O Brasil deve, aliás, muito à ciência e até um pouco à arte germânicas. Os nomes de Spix e de Martius, do príncipe de WiedNeuwied e de Pohl, de Rugendas devem ser prezados entre nós (...) É lastimável, para não dizer censurável, sendo tão pouco divulgada entre nós a língua alemã, que não se achem ainda traduzidas em vernáculo as interessantíssimas viagens de Spix e de Martius que, segundo ouvi do senhor secretario perpétuo, o Instituto pensa justamente agora em mandar verter, pelo que o felicito cordialmente. Ostras obras de resto existem em alemão, mesmo obras históricas sob a forma de contribuições pessoais, sobretudo para os anais do primeiro reinado, que não só merecem como carecem de ser conhecidas para uma exata compreensãoo dos acontecimentos dessa época. Nem preciso recordar que a única História filosófica do Brasil, que é a de Handelmann, nunca mereceu as honras de uma tradução. O Instituto agora criado em Bonn visa e, dada a constância do caráter alemão, chegará sem dúvida a coligir, enfeixar e sistematizar semelhantes estudos latino-americanos, não deixando sumir-se a tradiçãoo científica na corrente industrial, se bem que a indústria alemã seja filha da ciência alemã. Tenho a honra de pertencer ao conselho direitor deste Instituto Teuto-Sul-Americano, que é um fruto 7 Luna Halabi Belchior; Luisa Rauter Pereira; Sérgio Ricardo da Mata (orgs) Anais do 7º. Seminário Brasileiro de História da Historiografia – Teoria da história e história da historiografia: diálogos Brasil-Alemanha. Ouro Preto: EdUFOP, 2013. (ISBN: 978-85-288-0326-6) do melhor meio acadêmico alemão, e posso recomendá-lo à boa camaradagem do Instituto Histórico. O nosso latinismo não perigará por causa desse convívio com o germanismo, antes terá muito a lucrar (...) ( LIMA: 1976, 723). A admiração de Oliveira Lima pelo caminho alemão o levou a sustentar posições favoráveis à Alemanha em diversos períodos. Em 1909, antes portanto da Primeira Grande Guerra, Lima afirmaria sobre a região renana, sempre disputada nos embates entre franceses e alemães: Nada alias melhor atesta a pujança e o esplendor de tal criação política do que este próprio vale, ameno e feraz, que da fronteira suíça à holandesa se estende cultivado, povoado e abastado, constituindo o maior do patrimônio refeito pelo gênio de Bismarck. Esta é a impressão capital para o viajante: a da força e riqueza do moderno império alemão. As tradições e legendas do passado quase perdem o seu interesse e somem-se desbancadas por esta realidade palpitante. Nas fábrias que s sucedem, como nas searas bem tratadas, nas edificações colossais de estabelecimentos públicos, como nas construções graciosas de residências particulares, retratam-se um progresso e uma prosperidade com fidelidade que não engana(...) Espetáculo algum é no seu gênero mais soberbo do que o oferecido pela Alemanha contemporânea: nenhum existe que seja mais de natureza a se impor. (...)Não creio contudo muito que, se fosse o caso de um plebiscito, a França recobrasse suas províncias perdidas na última aventura imperial. Deu-me antes impressão de um fato consumado a regermanização da Alsácia. Esta modernização alemã, assim como a japonesa, havia sido conseguida através de um tipo de governo que se colocava acima dos interesses individuais. Oliveira Lima via na república brasileira, assim como nos países da América Latina o obstáculo do jogo de interesses, que ao contrário de fomentar naturalmente o desenvolvimento e a modernização fazia da ação do estado a consecução do interesse do particularismo e dos particulares. 8 Luna Halabi Belchior; Luisa Rauter Pereira; Sérgio Ricardo da Mata (orgs) Anais do 7º. Seminário Brasileiro de História da Historiografia – Teoria da história e história da historiografia: diálogos Brasil-Alemanha. Ouro Preto: EdUFOP, 2013. (ISBN: 978-85-288-0326-6) E a força da Alemanha, assim como a japonesa, estava em se apoiar no passado para unificar a nação e vencer o particularismo. Em suas palavras: Na verdade a Alemanha entendera não ser preciso tudo derrubar para edificar de novo, havendo entre os materiais do passado muito que utilizar pela sua força e resistência. Foi à sombra dessa construção monumental, de que foi Bismarck o grande arquiteto, que cresceu a riqueza alemã, causa de suas desgraças pelo ciúme que causou (SOBRINHO:1971, 122) Assim, o germanismo de Lima ia além de uma admiração intelectual. Tratava-se de olhar o caminho alemão para a modernização como modelar para o Brasil, dado o fato de que este processo foi levado a cabo sem o abandono do passado e das tradições, pelo contrário, tendo esses como ponto de apoio, já que a unificação alemã, pressuposto da modernização, baseouse na criação/invenção/imaginação deste passado comum. Para além disso, Lima admirou o papel da historiografia alemã, que em meio ao processo de busca por dar à história um estatuto de cientificidade, conseguiu cumprir um papel concreto de amparar a construção de narrativas da nacionalidade que foram base desta assunção sem rupturas ao futuro. Bibliografia SKINNER, Quentin, Significado y comprensión en la historia de las ideias. Prismas, Revista de historia intelectual, N4, 2000 LIMA, Manuel de Oliveira. Pernambuco, seu desenvolvimento histórico. Recife: Editora de Pernambuco, 1975. ________. Movimento da Independência. São Paulo: Melhoramentos, 1972. ________. Aspectos da Literatura Colonial Brasileira. Rio de Janeiro: Editora Francisco Alves, INL, 1984. p. 63. 9 Luna Halabi Belchior; Luisa Rauter Pereira; Sérgio Ricardo da Mata (orgs) Anais do 7º. Seminário Brasileiro de História da Historiografia – Teoria da história e história da historiografia: diálogos Brasil-Alemanha. Ouro Preto: EdUFOP, 2013. (ISBN: 978-85-288-0326-6) ________.No Japão, Impressões da Terra e da Gente. São Paulo: TOPBOOKS, MEC, 1997 BENTIVOGLIO, Júlio, LOPES, Marco Antonio. A Constituição da História como Ciência. De Ranke a Braudel. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2013 GOUVEA, Fernando da Cruz. Oliveira Lima: Uma biografia. III Tomos. Recife: Instituto Histórico e Geográfico de Pernambuco, 1976 MALATIAN, Teresa. Oliveira Lima e a Construção da Nacionalidade. Bauru: EDUSC, 2001. SOBRINHO, Barbosa Lima (org). Obra Seleta de Oliveira Lima. Rio de Janeiro, 1971. 10