dos homens”, a fim de que cada artigo da Constituição derivasse de um princípio fundamental91. De acordo com Mounier, os deputados haviam sido encarregados de “reparar a Constituição” francesa, não de inventar uma nova, pois, segundo ele, “os franceses não são um povo novo que acabou de abandonar as florestas para formar uma associação”, mas “uma vasta sociedade de vinte e quatro milhões de pessoas que desejam estreitar os vínculos entre todas as suas partes e regenerar o reino, uma sociedade para a qual os princípios da verdadeira monarquia serão sempre sagrados”92. Chama a atenção o fato de que, antes da publicação do mais virulento e célebre panfleto contrarrevolucionário, as Reflexões sobre a Revolução em França do deputado britânico Edmund Burke (publicado em novembro de 1790, mas cuja tradução francesa, de janeiro de 1791, já podia ser adquirida por qualquer homem letrado europeu, assim como a Declaração francesa de 178993), Mounier já demonstrava uma clara preocupação com relação à direção abstrata e filosófica assumida pela Revolução, a qual, a seu ver, ameaçava o princípio liberal que deveria guiá-la. Para Mounier, a principal missão dos deputados era a de regenerar a monarquia, erigir uma ordem constitucional a partir dos rudimentos históricos e legais do reino, e jamais inaugurar um contrato social inteiramente novo. A seu ver, a primeira tarefa de uma revolução liberal deveria ser a de estabelecer limites constitucionais ao poder monárquico (por meio da separação dos poderes) e instituir garantias individuais aos cidadãos em face do Estado. Longe de prescindir dos direitos do homem, Mounier considerava-os imprescindíveis para o bom desfecho daquela urgente tarefa constitucional, mas à condição de integrarem aquilo que deveria ser o preâmbulo (curto 91 Archives parlementaires, tomo VIII, p. 216. Citado em BAKER, Keith M. “The Idea of a Declaration of Rights”. In: KLEY, Dale K. van (Org.). The French Idea of Freedom: The Old Regime and The Declaration of Rights of 1789. Stanford: Stanford University Press, 1994. p. 163. 93 Não nos esqueçamos de que a primeira tradução para a língua portuguesa dessa obra seminal do moderno conservadorismo político coube a ninguém menos que a José da Silva Lisboa, mais conhecido como Visconde do Cairu (1756-1835), através de Extratos das obras políticas e econômicas de Edmund Burke (1812). 92 Anais da 3ª Semana de Direitos Humanos da UFSC: A Influência da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (França, 1789) 169