TOXOPLASMOSE CONGÊNITA Unidade de Neonatologia HRAS/SES/DF Tatiana Fonseca Julho 2005 Toxoplasmose congênita CASO CLÍNICO Toxoplasmose congênita IDENTIFICAÇÃO: K.V.G, masculino, branco REGISTRO:04/08/2004 ANTECEDENTES OBSTÉTRICOS MATERNOS: Mãe fez 7 consultas de pré-natal, sendo solicitadas sorologias de rotina com os seguintes resultados Toxoplasmose congênita I TRIMESTRE II TRIMESTRE III TRIMESTRE TOXOPLASMOSE IgG negativo > 300 IgM negativo 6,75 VDRL Não reagente Não reagente HIV negativo HBSag negativo Fez uso de espiramicina de julho (data da última sorologia) até o parto. Toxoplasmose congênita ANTECEDENTES FISIOLÓGICOS: Nasceu no HRG, de parto cesariana por DCP, pesando 3620g, estatura 55 cm, PC 35 cm e índice de Apgar não anotado, sendo o primeiro exame físico normal. Permaneceu no ALCON sem intercorrências, tendo alta com a mãe. Toxoplasmose congênita SEGUIMENTO Aos 20 dias de vida, na consulta do CD, devido à história materna, foi iniciado tratamento para o RN e solicitados sorologia para toxoplasmose. Toxoplasmose congênita TOXO IgG: 970 TOXO IgM: Negativo Toxoplasmose congênita TRATAMENTO Pirimetamina 1 mg/Kg/dia Sulfadiazina 100 mg/Kg/dia Ácido folínico 10 mg 3x/semana Toxoplasmose congênita Compareceu ao ambulatório de Doenças de Transmissão Vertical aos 2 meses de vida, quando já não era assintomático. Ao exame, apresentava microcefalia, retardo do desenvolvimento neuro-motor e estrabismo convergente bilateral. Permanecia em uso da mesma medicação já referida. Foram, então solicitados os seguintes exames Toxoplasmose congênita SOROLOGIA 2 meses PARA TOXOPLASMOSE IgG (HI) 1/64 4 meses IgG (ELISA) Neg Neg IgM (ELISA ) Neg Neg 1/256 Toxoplasmose congênita FUNDOSCOPIAS 20/10/2004 -Massa vascularizada intra-ocular em ambos os olhos 22/11/2004 -Grave comprometimento retiniano TC de CRÂNIO (março/2005) “Alterações atróficas cerebrais difusas caracterizadas pelo acentuação dos sulcos e dilatação ventricular. Calcificações cerebrais difusas bilateralmente, incluindo ponte. Globos oculares com configuração e contornos normais. Sem lesões expansivas Toxoplasmose congênita Aos 7 meses de idade mantinha microcefalia (PC=39) e atraso no desenvolvimento neuro-psicomotor grave. Não fixava o olhar, não sustentava Toxoplasmose congênita PROGRAMAÇÃO TRATAMENTO com esquema tríplice por 1 ano ACOMPANHAMENTO MULTIDISCIPLINAR: Centro de Ensino Especial e neuro-pediatra, oftalmologista (FO trimestral) Toxoplasmose congênita Discussão Gestante com: IgG e IgM negativas no primeiro trimestre( = gestante suscetível.); viragem sorológica ( de IgG negativo para positivo alto) e IgM > 3. Valores de IgM acima de 3 são indiscutivelmente indicativos de fase aguda da infecção. Embora o resultado seja considerado positivo se > 0,5 ou > 0,6 (valor de referência informado pelo laboratório), valores < 3 podem ser IgM residual, de infecção passada. CONDUTA CORRETA: repetir a sorologia bimestralmente em gestante suscetível. FALHA: não foi realizada sorologia bimestral CONSEQUÊNCIA: atraso no início do tratamento da gestante acarretando em infecção fetal grave. Toxoplasmose congênita TRATAMENTO DA GESTANTE (do feto intra-útero): por tratar-se de infecção aguda, deveria ter sido prescrito para a gestante o esquema tríplice (pirimetamina, sulfadiazina e ácido folínico). Esse esquema ultrapassa a barreira placentária e trata o feto. Já a espiramicina prescrita não ultrapassa a barreira placentária. Sua ação é diminuir a parasitemia da placenta e evitar a passagem do taquizoíto para o feto. É recomendada em caso de infecção materna mas sem acometimento do feto (IgM materna positiva e PCR do líquido amniótico negativo). Não sendo possível a realização de PCR (e IgM materna positiva), tratar com esquema tríplice supondo infecção fetal. A contraindicação da sulfadiazina no último mês de gestação pelo risco de kernicterus está sendo abandonada pois não há estudos que confirmem essa possibilidade. Toxoplasmose congênita RN assintomático ao nascer, a termo e AIG. (90% dos infectados são assintomáticos ao nascer). 3) RN com IgM negativo: POSSIBIILIDADES: resultado falso-negativo; não produção de IgM pelo RN pela imaturidade imunológica ou pelo início precoce do tratamento. RN com título baixo de HI (1/64) ascendendo para 1/256 (4x maior) INTERPRETAÇÃO: o Teste de HI (hemaglutinação indireta) não está indicado para o diagnóstico de toxoplasmose congênita pois seus títulos demoram muito a se positivar e a ascender. Toxoplasmose congênita RN com índices elevados de ELISA (>300) e HI baixo: INTERPRETAÇÃO: o teste de ELISA é de alta sensibilidade e especificidade para o diagnóstico de toxoplasmose congênita, positivando-se muito antes da HI. FORMA CLÍNICA: Forma grave, inicialmente sub-clínica que poderia ter sido evitada com o uso da medicação em idade gestacional mais precoce. O lactente deve ter sido infectado ainda no primeiro trimestre de gestação devido a forma neurológica da doença. Toxoplasmose congênita Classificação Filum Apicomplexa Classe Sporozoae Ordem Eucoccidia Fam. Sarcocystidae Subfam. Toxoplasmatinae Gênero Toxoplasma Histórico • Parasita descrito por Nicolle e Manceaux em 1908 em amostra de fígado do roedor Ctenodactylus gundi no Norte da África • Primeiro caso humano descrito por Jankú na Rússia em 1923 em uma lesão de retina de uma criança • Transmissão congênita humana documentada por Wolf e Cowen em 1937 • Ciclo sexuado do parasita descrito por Frankel et al em 1976. Toxoplasmose congênita Epidemiologia Parasita intracelular obrigatório Zoonose de distribuição mundial Prevalência de infecção na população aumenta com a idade Estimativa da OMS 50 a 60% da população mundial Reservatórios naturais: mamíferos e aves Hospedeiro definitivo: Felinos (gato doméstico) Parasita de caráter oportunista em pacientes imunocomprometidos Toxoplasmose congênita Formas ciclo evolutivo Taquizoíto (a forma invasiva encontrada na infecção aguda) Cisto (contém os bradizoítos; encontrados nos tecidos) Oocisto (contém os esporozoítos; encontrados no solo e fezes exclusivamente na família dos felinos) Toxoplasmose congênita taquizoítos Cisto tecidual Oocisto imaturo Oocisto maduro Toxoplasmose congênita Toxoplasmose congênita Transmissão Transplacentária Toxoplasmose congênita Aproximadamente 40% dessas mulheres, se não tratadas, transmitirão a infecção A incidência da infecção fetal é maior quando essa é adquirida no terceiro trimestre (59%), e a gravidade é maior quando a infecção materna é adquirida no primeiro trimestre, apesar do menor risco de transmissão (14%). O risco de infecção fetal e a gravidade são intermediários no segundo trimestre (29%) A incidência da toxoplasmose congênita é variável, ocorrendo em 1:1000 a 1:12.000 dos nascimentos Beazley DM, Egerman RS. Toxoplasmosis. Semin Perinatol 1998; 22: 332-8 Guerina NG, Hsu Ho-Wen, Meissner C et al. Neonatal serologic screening and early treatment for congenita Toxoplasma gondii infection. N Engl J Med 1994; 330: 1858-63. Toxoplasmose congênita No Brasil, entre 25 e 40% das gestantes são soronegativas para a toxoplasmose. O risco de infecção aguda durante a gestação é de aproximadamente 1% e a transmissão fetal ocorre em 30% dos casos, levando a infecção fetal de gravidade variável. Spalding SM. Acompanhamento de gestantes com risco de transmissão de infecção congênita por Toxoplasma gondii Nicolle & Manceaux, 1909 na região do alto Uruguai, RS, Brasil: diagnósticos e aspectos epidemiológicos [dissertação]. Rio de Janeiro: Fundação Oswaldo Cruz; 2000. Vaz AJ, Guerra EM, Ferratto LCC, Toledo LAS, Azevedo Neto RS. Sorologia positiva para sífilis, toxoplasmose e doença de Chagas em gestantes de primeira consulta em centros de saúde da área metropolitana, Brasil. Rev Saúde Pública 1990; 24:373-9. Toxoplasmose congênita DIAGNÓSTICO PREMATURIDADE ALTERAÇÂO LIQUOR – HIPERPROTEINORRAQUIA/ PLEIOCITOSE/ LINFOCITOSE CORIORRETINITE RETARDO MENTAL ÓRGÃOS ENDÓCRINOS – MIXEDEMA, DM SÍNDROME NEFRÓTICA ALTERAÇÕES ÓSSEAS HEPATOMEGALIA PETEQUIAS ERITROBLASTOSE E HIDROPSIA FETAL ASCITE DIFICULDADE RESPIRATÓRIA SURDEZ Toxoplasmose congênita Múltiplas calcificações periventriculares associadas a hidrocefalia ex vácuo. Há também calcificações na fossa posterior, situadas na substância branca cerebelar. Múltiplas calcificações periventriculares associadas a hidrocefalia ex vácuo. Há também calcificações na fossa posterior, situadas na substância branca cerebelar. Caso clínico do Dr. Paulo R. Margotto / HFA/EMFA Toxoplasmose congênita Toxoplasmose congênita Toxoplasmose congênita DOENÇA NEONATAL Sinais e sintomas presentes ao nascimento.Usualmente severa. Sinais e sintomas de doença generalizada podem predominar e os sinais neurológicos estão sempre presentes. Raramente evoluem sem seqüelas Toxoplasmose congênita FORMA SUB-CLÍNICA Normalmente o diagnóstico é feito baseado em primoinfecção materna RN assintomáticos ou oligossintomáticos. O diagnóstico é baseado na história de primoinfecção materna ou persistência de títulos no lactente. A prematuridade (em 50%) ou a restrição do crescimento intra-uterino são considerados sinais clínicos. Toxoplasmose congênita DIAGNÓSTICO LABORATORIAL PESQUISA DE PARASITOS E SEUS COMPONENTES ISOLAMENTO DO TOXOPLASMA Inoculação em camundongos. Isolamento em Cultura de Células Reação de Polimerase em Cadeia (PCR) Toxoplasmose congênita TESTES SOROLÓGICOS TESTE DE IMUNOFLUORESCÊNCIA INDIRETA Toxoplasmose congênita A incidência de anomalias ultra-sonografias varia de 18,1% a 36,4%, estando associada à idade gestacional da infecção fetal As alterações observadas com maior freqüência são dilatação ventricular e calcificações intracranianas Berrebi A, Bessières MH, Cohen-Khalas Y, et al. Diagnostic anténatal de la toxoplasmose. A propos de 176 cas. J Gynecol Obstet Biol Reprod (Paris) 1993; 22:261-8 Hohlfield P, MacAleese J, Capella-Pavlovski M, et al. Fetal toxoplasmosis: ultrasonographic signs. Ultrasound Obstet Gynecol 1991; 1:241-4. Toxoplasmose congênita Couto JCF, Leite JM: Ultrasonographic markers for fetal congenital toxoplasmosis; Rev. Bras. Ginecol. Obstet. vol.26 no.5 Rio de Janeiro June 2004 Referências bibliográficas 1. Melo,LC. toxoplasmose congênita. Assistência ao Recém-Nascido de Risco, editado por Paulo R. Margotto, 2a Edição, 2004 2. Couto JCF, Leite JM: Ultrasonographic markers for fetal congenital toxoplasmosis; Rev. Bras. Ginecol. Obstet. vol.26 no.5 Rio de Janeiro June 2004 3. Berrebi A, Bessières MH, Cohen-Khalas Y, et al. Diagnostic anténatal de la toxoplasmose. A propos de 176 cas. J Gynecol Obstet Biol Reprod (Paris) 1993; 22:261-8 4. Hohlfield P, MacAleese J, Capella-Pavlovski M, et al. Fetal toxoplasmosis: ultrasonographic signs. Ultrasound Obstet Gynecol 1991; 1:241-4 5. Spalding SM. Acompanhamento de gestantes com risco de transmissão de infecção congênita por Toxoplasma gondii Nicolle & Manceaux, 1909 na região do alto Uruguai, RS, Brasil: diagnósticos e aspectos epidemiológicos [dissertação]. Rio de Janeiro: Fundação Oswaldo Cruz; 2000 6. Vaz AJ, Guerra EM, Ferratto LCC, Toledo LAS, Azevedo Neto RS. Sorologia positiva para sífilis, toxoplasmose e doença de Chagas em gestantes de primeira consulta em centros de saúde da área metropolitana, Brasil. Rev Saúde Pública 1990; 24:373-9 7. 8. Beazley DM, Egerman RS. Toxoplasmosis. Semin Perinatol 1998; 22: 332-8 Guerina NG, Hsu Ho-Wen, Meissner C et al. Neonatal serologic screening and early for congenita Toxoplasma gondii infection. N Engl J Med 1994; 330: 1858-63 treatment