ANAIS ELETRÔNICOS III ENILL
Encontro Interdisciplinar de Língua e Literatura.
29 a 31 de agosto de 2012, Itabaiana/SE: Vol.03, ISSN: 2237-9908
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O USO DA LINGUAGEM EM SALA DE AULA:
O DISCURSO DO PROFESSOR DE LÍNGUA PORTUGUESA
Geralda de Oliveira Santos Lima (UFS)
Samuel de Souza Matos (UFS)
Thiago Gonçalves Cardoso (UFS)
Caio César Costa Santos (UFS)
1. INTRODUÇÃO
O uso da linguagem tem repercussão tanto na escola quanto fora dela. Os
indivíduos humanos que a utilizam recebem o nome de sujeitos sociais, por estarem
envolvidos com outros sujeitos diariamente, compartilhando conhecimentos, experiências,
diferentes modos de ver o mundo e se comunicando a fim de atingirem determinados
objetivos. Destarte, a maneira como ocorre esse envolvimento e/ou entrosamento entre
eles, podemos chamar de interação, porque a simultaneidade de (re)construção desses
sujeitos no uso de sua língua(gem) nela existe de fato.
Dessa perspectiva, decorrem inúmeras maneiras de colocar a língua(gem) em
funcionamento, as quais constituem aqui o que podemos chamar de situações
comunicativas. Nessas situações, a língua passa por variados processos de estruturação, no
que se refere ao conteúdo temático, estilo e construção composicional que,
subsequentemente, dão origem aos gêneros do discurso (BAKHTIN, 1997). Como são
inúmeras as situações comunicativas das quais os sujeitos participam, a cada uma delas,
minimamente, pertence um gênero discursivo (ou textual).
Dessa forma, o ensino de Língua Portuguesa deve abarcar uma diversidade de
textos que circulam nas práticas sociodiscursivas e interacionais, levando-se em
consideração os saberes/conhecimentos prévios, a história e o processo sociocultural por
que passam os sujeitos quando do uso da linguagem. Assim, ao discurso do professor
dessa disciplina, em sala de aula, recai a necessidade de ele dispor de estratégias
linguístico-discursivas, buscando dialogar com seus alunos durante as atividades textuais
de leitura e escritura, as quais irão repercutir, positivamente, no desenvolvimento das
competências linguística, cognitiva e social.
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Durante a realização dos projetos de pesquisa “A contribuição dos estudos do
texto no processo ensino-aprendizagem” e “Texto e ensino: um domínio multidisciplinar”,
vinculados respectivamente ao Programa de Inclusão à Iniciação Científica
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PIIC/COPES/UFS (2011-2012) e ao Programa Institucional de Bolsas de Iniciação
Científica – PIBIC/CNPq (2011-2012), realizamos algumas visitas e atividades em uma sala
de aula do 4º ano da Escola Estadual Armindo Guaraná, localizada em São Cristóvão/SE e
em uma outra sala de aula do 5º ano da Escola Estadual Professor Manuel Franco Freire,
localizada em Aracaju/SE, com o intuito de verificar e analisar como ocorre a prática de
linguagem nessas salas de aula a partir do discurso dos professores investigados e suas
decorrentes implicações. Além de apontarmos algumas possibilidades de como os
professores podem tornar mais produtivas as suas aulas de Língua Portuguesa, se fizerem
uso de conceitos contemplados pela Linguística de Texto sob uma abordagem
sociocognitiva e interacional.
Para
alcançar
nossos
objetivos,
partimos,
portanto,
de
conceitos
fundamentados nos estudos de Bakhtin (1988, 1997), Orlandi (1996), Piletti (1997), Koch
e Elias (2008), Gomes-Santos e Almeida (2011), Cavalcante et al (2010) dentre outros.
Na primeira seção deste trabalho, encontra-se uma breve reflexão teórica e, na segunda
seção, os relatos de nossas visitas realizadas às referidas escolas.
2. O DISCURSO E/OU A LINGUAGEM DO PROFESSOR DE LÍNGUA PORTUGUESA
NA SALA DE AULA
Neste tópico, discutiremos a relação de interação entre professor e aluno nas
aulas de Língua Portuguesa. Os estudos de Piletti (1997) preconizam que a relação entre
professor e aluno necessita ser concebida de forma dinâmica, isto é, o professor precisa
interagir com seus alunos durante as atividades em sala de aula, estimulando-os,
orientando-os e estabelecendo com eles diálogos constantes. Porque o processo ensinoaprendizagem de língua requer o uso da linguagem como requer qualquer situação
comunicativa das interações sociais das quais o professor e os alunos participem
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diariamente, em que troquem conhecimentos, experiências, opiniões e crenças,
consolidando o papel de cidadãos competentes e alcançando seus objetivos.
Conforme nos afirma Piletti (1997), o professor não deixa de aprender, visto
que os seus conhecimentos, aliados aos conhecimentos que os alunos trazem consigo para
a sala de aula, mediados pelo uso da linguagem, num processo dinâmico-interativo,
resultam em um texto, pois a própria aula é um texto. Decorrente desse processo, a prática
de ler e escrever passa a ter alguma significação para os alunos, já que eles podem ser
levados a compreender que a própria língua que utilizam na escola, como fora dela, é a
mesma que utilizam para aprender a utilizar a língua de forma eficaz.
Os estudos de Orlandi (1996) se nos apresentam como complementares
relevantes dessa perspectiva. O discurso autoritário, tão marcante no ensino tradicional,
requer que o professor sempre esteja acima do aluno, numa relação de hierarquia que,
como hoje sabemos, é conceito insuficiente para a aprendizagem escolar. Esse discurso
sempre provocou na pedagogia escolar um apagamento do aluno, visto que este, segundo
Piletti (1997), sempre teve o papel de obedecer, escutar, permanecer obediente, ficar
calado na aula, anotar, memorizar, sendo submisso ao professor – “dono” do
conhecimento – reproduzindo conhecimentos.
Todavia, as demandas sociais atualmente apontam em outra direção. É
necessária uma atualização da abordagem de ensino-aprendizagem focada no discurso
autoritário do professor. Não mais suprem às necessidades pessoais e sociais, atividades
como: a memorização, a decodificação e a reprodução de conhecimentos introduzidos
pelo professor. É preciso, portanto, que o professor veja que o aluno é “capaz de pensar,
refletir, discutir, ter opiniões, participar, decidir o que quer e o que não quer” (PILETTI,
1997, p. 79). Sob esse pensamento, cabe ao professor de Língua Portuguesa um discurso
democrático, aberto a interações e a reelaborações de suas “verdades”, dando espaço aos
alunos de usarem a sua linguagem de forma competente nas discussões a respeito dos
mais diversos temas vivenciados socialmente e que se encontram e precisam ser
materializados em textos diversos nas atividades de leitura e escritura. É preciso que o
aluno
reflita,
critique,
analise
e/ou
conteste
determinadas
ideias
e/ou
opiniões/conhecimentos apresentados pelos colegas ou pelo professor, cumprindo, assim,
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seu papel de sujeito social na atividade textual, um ator social, que se constrói no texto e
por este é construído (KOCH; ELIAS, 2008).
Em consonância com Orlandi (1996), o material didático, tão valorizado na
escola e nas aulas de língua, passa a ser de instrumento a objeto de apagamento por razão
do discurso autoritário. Podemos também verificar que, além disso, a existência do
material didático possibilita o apagamento do diálogo e da interação professor/aluno em
sala de aula, pois é tido como autossuficiente, o que, para nós, é o contrário, visto que
preconiza somente o conhecimento linguístico, o metalinguístico.
O discurso autoritário do professor visa a metalinguagem, isto é, a reprodução
de conhecimentos mediante a transmissão de regras gramaticais que excluem o sujeito de
instâncias socioculturais, históricas entre outras. Os PCN, quanto a isso, posicionam-se,
dizendo que a gramática passa/passou a ser
ensinada de forma descontextualizada, tornou-se emblemática de um conteúdo
estritamente escolar, do tipo que só serve para ir bem na prova e passar de ano –
uma prática pedagógica que vai da metalíngua para a língua por meio de
exemplificação, exercícios de reconhecimento e memorização de nomenclatura
(BRASIL, 1997, p. 39).
Por essa razão, aqui, apregoamos que uma concepção sociocognitiva e
interacional da linguagem (CAVALCANTE et al, 2010) seja concebida no ensino de
Língua Portuguesa, no qual o professor passa a assumir a função de mediador do
conhecimento ao refletir e compartilhar novos conhecimentos com seus alunos, numa
interação em que permeiam não só os aspectos linguísticos, mas também cognitivos,
históricos, socioculturais e interacionais concentrados em experiências, vivências
adquiridas diariamente, opiniões, crenças, tudo o que vai contribuir para o
desenvolvimento das competências linguística, cognitiva e social, já que o texto é visto
como o próprio lugar de interação.
A interação pela linguagem deve ocorrer nas aulas de língua porque encontra
justificativa no modo como ocorrem as relações sociais fora da escola, como nas
atividades de leitura e escrita. Já é de nosso conhecimento que o contato com o texto,
quer quando se lê, quer quando se escreve, permite uma interação de conhecimentos, não
uma imposição de sentidos que se procura estabelecer. Assim, postula-se que “o sentido
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não está no texto, mas se constrói a partir dele” (KOCH, 2011, p.30), haja vista que
qualquer sujeito social já traz consigo uma parcela de conhecimentos prévios para a
interação no texto. Esse processo, por conseguinte, precisa ser refletido, discutido, em sala
de aula, em que o professor, o aluno e o próprio uso que realizam com a linguagem
constituem uma interação, quando dialogam, consolidando a teoria-analítica da interação
autor/texto/leitor. Na seção a seguir, falaremos um pouco das nossas pesquisas as quais já
nos referimos.
3. CONSIDERAÇÕES ACERCA DO ENSINO DA LÍNGUA PORTUGUESA NAS
ESCOLAS PESQUISADAS
Ao iniciarmos a pesquisa, no 4º ano da Escola Estadual Armindo Guaraná,
localizada em São Cristóvão/SE, procuramos conversar com a professora sobre como ela
concebia a relação professor/aluno em sala de aula no ensino de língua, prática que visa a
interação no trabalho com os textos e a qual permite dar espaço às vivências cotidianas e
aos conhecimentos prévios dos alunos. A docente nos afirmou que há uma enorme
carência nos alunos no que diz respeito à compreensão e à produção de sentidos, em
virtude do pouco contato na escola com textos que têm a ver com as vivências deles.
Por meio do discurso do docente, observamos que havia pouco entrosamento
ou interação aluno/professor. Desse modo, a interação pela linguagem ficava sempre
prejudicada nas atividades com textos. Além disso, podemos verificar, durante nossos
encontros, que a professora não tinha muito conhecimento sobre a importância do ensino
da Língua Portuguesa por meio da utilização de textos diversos. Essas questões foram
relevantes para mostrar como a docente fazia uso da linguagem em sala de aula. Ela e os
alunos só trabalhavam com o conteúdo explicitado no livro didático; focando no ditado de
frases descontextualizadas, formação de sílabas e palavras, decodificando-as, apenas, de
forma não contextualizadas. Quanto às práticas da leitura e produção textual (quando
acontecia) com gêneros discursivos como folhetos e roteiros turísticos, não possibilitavam
a interação sociodiscursiva, visto que eram afastadas das vivências dos alunos, além de o
professor não reconhecer a importância da forma dialógica de mediação pedagógica em
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situações de discussão e construção de textos em sala de aula.
Em uma das visitas que realizamos a essa turma, tivemos o propósito de
trabalhar com textos contextualizados que promovessem uma interação eficaz entre
alunos, professor e pesquisadores, levando-se em consideração o contexto sociocultural, o
conhecimento prévio e as experiências vivenciadas pelos alunos, a fim de promover uma
adequada produção textual posteriormente. Dos textos trabalhados, destacamos um conto,
cujo título era “História dos negros no Brasil”, e uma narrativa autobiográfica, intitulada
“Relato de vida” de uma aluna do 8º ano do Ensino Fundamental com a intensão de focar
possibilidades de trabalhar com a linguagem na sala de aula, tentando mostrar que esses
textos possuíam relações quanto ao contexto sócio-histórico do Brasil no que se refere à
chegada e às primeiras vivências dos negros escravos.
Essa atividade ocorreu com a leitura em voz alta feita por nós, dando ênfase a
algumas expressões nominais encontradas na superfície dos textos, as quais funcionaram
como porta de entrada para uma breve discussão: “os africanos”, “índios e homens
brancos”, “(n)a lavoura de café” “os negros”, “escravos dos homens brancos” “nenhum
dinheiro”, “senzala”, “a feijoada”, “chicotadas”, “muita discriminação”, “humilhação”,
“exploração”, “sofrimento”, “Lei Áurea”, entre tantas outras. Com isso, procuramos fazer
algumas relações entre os dois textos, verificando e comparando o que mudou desde a
época da escravidão até a época atual. Demos espaço para que os alunos expusessem
fatos vivenciados por eles quanto ao preconceito racial, levando-os ao diálogo sobre o
conteúdo dos textos em discussão. Mesmo assim, verificamos que alguns alunos, a priori,
não conseguiram fazer a leitura interpretativa, porque haviam mostrado desatenção no
momento da apresentação dos textos base.
Em seguida, solicitamos que eles produzissem textos escritos explicitando a
compreensão/interpretação que obtiveram a partir das leituras e discussões realizadas
sobre os textos lidos. A seguir, apresentamos dois textos escritos por alunos do 4º ano
após a atividade de leitura:
(1) Eles comiam feijão e leite para ficar brancos.
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(2) Eu entendi que nós não devemos ter preconseito por cor, religião ou raça
por esenplo eu sou negra mais puriço eu não vou fazer de tudo pra ficar
branca por esenplo o rei do pop Michael Jaquison tirou a pele dele para
ficar bramco e ficou branco sim mais qual sera o mutivo diso porque tenha
enveja ou não gostava da sua cor eu nunca iria fazer isso min orgulho da
minha cor essa é a minha Historia puriço não tenha vergonha de sua cor
pois nos negros somos vensedor fim.
Em (1), vemos que o autor conseguiu construir relação entre os dois textos
trabalhados em sala de aula, pois imprimiu as marcas lexicais do conto (feijão) e da
autobiografia (leite). No entanto, em consonância com Santos e Neves (1999), construiu
um sentido que fugiu das pistas textuais/discursivas dadas pelos autores dos textos
estudados. Além disso, verificamos que só o conhecimento linguístico empregado nesse
texto – a grafia correta, as concordâncias – não é o suficiente, pois o autor escreveu um
texto eficaz do ponto de vista linguístico, mas do ponto de vista dos conhecimentos de
mundo, cognitivo, social e interacional, produziu um texto inadequado, uma vez que não
mostrou habilidades de compreensão de sentido, a partir das quais, fizesse o texto
progredir.
Embora a pluralidade de sentidos seja aqui priorizada, precisamos saber que o
leitor não pode construir qualquer interpretação de um texto, visto que a finidade de
interpretações (MARCUSCHI, 2008) determinada para cada texto e também a interação
não residem somente naquele que lê ou ouve, mas também na relação autor/texto/leitor.
Quanto à sua extensão, podemos dizer que esse texto mostra a pouca frequência de
atividades de leitura e escrita mediadas pelos diálogos em sala de aula, já que a professora
dá prioridade ao conhecimento linguístico, que, como já sabemos, exclui os
conhecimentos sociais, culturais, históricos, cognitivos e interacionais tão necessários para
a formação do sujeito social/falante de língua competente.
O autor de (2), como vemos, ativou suas competências crítica e reflexiva, os
conhecimentos que possui sobre as leis de defesa dos negros, o respeito à religião e
procurou expor o orgulho da cor que possui. Além disso, reforçou as suas opiniões e
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crenças ao mencionar em seu texto um dos seus conhecimentos de mundo: a retirada da
melanina do cantor pop Michael Jackson. Essa produção escrita (2), como se pode ver, é o
resultado da intertextualidade decorrente do estudo do conto e do texto autobiográfico.
Fazendo a comparação entre os dois textos produzidos pelos alunos, percebemos que o
aluno constrói seu texto, levando também em consideração conhecimentos prévios, os
quais permitem a formação do leitor e do escritor competente, capazes de participar
plenamente de uma sociedade letrada.
Após essas atividades em sala de aula, verificamos que textos que não
dialogam com as vivências dos alunos não contribuem em nada para o desenvolvimento
das suas competências linguística, cognitiva e social. Isso acaba por suscitar desinteresse e
dificuldades tanto em leitura quanto em escritura. Quanto ao estudo de frases, formação
de sílabas e palavras descontextualizadas, sabe-se e ocorre, de fato, que os alunos nada
aprendem sobre os processos de funcionamento da linguagem. Nessas práticas, eles só
aprendem as atividades de memorização e decodificação, não contribuindo, assim, para a
formação de leitores e escritores competentes.
A leitura silenciosa, prática adotada constantemente pela professora nas
atividades de leitura e produção textual, é a promotora do desinteresse e indisposição
encontrada nesses alunos, visto que pouco ou quase não ocorreram diálogos entre a
professora e os alunos. Estes, por essa razão, encontram muitas dificuldades quando são
levados a desenvolver tais atividades, porque não estão habituados a isso, como bem nos
informou a professora da turma, mas apenas a habilidades de memorização, decodificação
e reprodução de regras gramaticais (sobre as quais muito pouco tem domínio). A respeito
disso Luft (1994), citado por Bagno (2001, p. 63), afirma que “um ensino gramaticalista
abafa justamente os talentos naturais, incute insegurança na linguagem, gera aversão ao
estudo do idioma, medo à expressão livre e autêntica de si mesmo”.
Em contrapartida, quando trabalhamos com textos relacionados às suas
vivências, dando-lhes oportunidades de reflexão, questionamento, discussão, expondo seus
pontos de vista, suas opiniões, esses alunos encontraram mais facilidade em compreender
e produzir textos, além de ficarem mais atentos às práticas discursivas desenvolvidas,
interativamente, na sala de aula. Isso se justifica pelo fato de que quando se incita o aluno
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a trabalhar com textos contextualizados, sob constantes diálogos e discussões com os
colegas e o professor, os seus conhecimentos prévios automaticamente se ativam e
reativam, fazendo com que ele busque compreender/interpretar, escrever e aprender por
meio do próprio texto. É dessa forma que, via o uso da linguagem, as atividades de leitura
e de escrita permitem a interação, desenvolvendo um processo ensino-aprendizagem
adequado.
A fim de conhecer melhor os alunos do 5º ano da Escola Estadual Professor
Manuel Franco Freire, em Aracaju/SE, fazer com que se sentissem a vontade com nossa
presença e observar as práticas metodológicas da professora, assistimos a algumas aulas
ministradas pela docente, em que pudemos constatar que ela, apesar de não conhecer as
teorias que embasavam nosso projeto, enquadrava-se, de certa forma, nele.
Em suas aulas, o ensino de língua era sempre realizado a partir do uso de
gêneros textuais diversos, que eram interpretados e produzidos para possibilitar aos alunos
o domínio de práticas que realmente poderiam lhes interessar no momento de suas mais
diversas ações comunicativas de seu cotidiano. Também procurava ouvi-los, estimulandoos a participar das discussões, valorizando e respeitando suas ideias, pontos de vista,
crenças, cultura e história, sempre aberta a mudanças, buscando estreitar suas relações
(relacionamento afetivo), vivenciando de fato o processo intenso e mútuo/interativo do
ensino-aprendizagem (PILETTI, 1997), em que, enquanto o professor ensina, aprende, e
enquanto o aluno aprende também
ensina. Enfim, guiando-os a um processo de
compreensão/interpretação e aprendizagem de língua(gem) mais eficaz.
Percebemos também que os textos e explanações utilizados por meio do
discurso da professora não fugiam da realidade dos alunos, muito pelo contrário, eram
textos que dialogavam com suas realidades, levando-os a compreender melhor os sentidos
desses textos, entre outras atividades. Em outras palavras, ela buscava manter uma
relação, de forma, mais dinâmica possível, afastando-se de abordagens estáticas
(memorização e silêncio). Portanto, nossa percepção de ensino de Língua Portuguesa e/ou
nossas práticas de linguagem, na sala de aula, somaram-se as dela para o crescimento e/ou
desenvolvimento desses alunos.
Logo após as primeiras aulas, começamos efetivamente a atuar, trabalhando
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com textos, interagindo/dialogando diretamente com os discentes. Para isso, foram
propostos e lidos para eles vários textos de diversos gêneros, dentre os quais, escolhemos
um para comentar e analisar. Nosso texto base foi uma crônica jornalística que trazia a
história de uma criança de oito anos, que após a morte de sua mãe foi abandonada pelo
pai e começou a vagar pelas ruas de São Paulo. Esta menina caminhava solitária até que
foi encontrada morta por causa do frio e da fome, com uma carta muito comovente em
suas mãos.
A partir da leitura e discussões sobre o texto, buscamos mostrar-lhes o valor de
conhecimentos prévios para o processo da compreensão e interpretação do conteúdo de
qualquer texto, gerando condições para o aluno desenvolver sua própria produção textual.
Primeiramente, introduzimos o texto base, contextualizando-o a realidade sociocultural e
histórica desses alunos. Para isso, necessitamos de autoridade e legitimidade na maneira
de ler, já que nossa orientação por meio do uso da linguagem (oral e corporal) lhes
transmitiria a visão que queríamos que se alcançasse naquela produção textual. Em
seguida, dialogamos sobre a situação contida no referido texto, dando-lhes oportunidade
para que levantassem questionamentos, expusessem seus pontos de vista, trouxessem
exemplos, entre outros fatores que proporcionaram esclarecimentos que não foram
possíveis no momento da leitura.
Por fim, propomos uma produção textual escrita, por meio da qual, os alunos
iriam expor seus pontos de vista com relação às temáticas trabalhadas, como o abandono
de crianças e moradores de rua. A título de exemplificação, mostraremos, a seguir, um dos
textos produzidos em uma das atividades desenvolvidas na sala de aula:
(3) A solução é o governo não só olhar para si e começar olhar para os outros
como a presidenta agora ela só tem olhos para as olimpiadas de Londres ela
tem que se preocupar com a sociedade Brasileiras porque ela não pega o
dinheiro da copa de 2014 para construir ofanato. Eles não tem que ligar
como o Brasil vai ficar bonito e sim para os moradores de rua, eu queria ver
se a presidenta estivesse na pele do morador de rua quando atearam fogo
nele ou quando espancaram o outro.
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Para iniciarmos os comentários é necessário evidenciar que um professor que
tem seu discurso firmado em metodologias que apenas visam o ensino das regras da
gramática normativa não saberia lidar com os resultados acima, pois o que acontece, em
diversas salas de aula, é que o professor de língua materna busca intervir no texto/discurso
do aluno, apenas para corrigi-lo, impondo-lhe a norma culta padrão; dizendo-lhe que está
escrevendo e/ou falando “errado”; muitas vezes ridicularizando-o em público; predicandoo de “incompetente” e o levando a constrangimentos desnecessários. Ao contrário, ele
deveria buscar interagir com eles como mediador do conhecimento por meio do uso da
linguagem, esclarecendo-lhes dúvidas, fatos obscuros que nasceram a partir do texto lido;
procurando levar o aluno a discutir e argumentar sobre o tema proposto, envolvendo-o na
atividade de forma dialógica.
No exemplo acima, percebemos que, apesar das inadequações linguísticas
encontradas, fruto da falta de práticas de leitura e escritura e marcas de oralidade, os
textos dos alunos continuam dotados de sentido. A partir das experiências vivenciadas,
eles exploram seus pontos de vista (“A Solução é o governo não só olhar para si e
começar olhar para os outros [...]”) e argumentam sobre o tema discutido (“[...] ela tem
que se preocupar com a sociedade Brasileiras porque ela não pega o dinheiro da copa de
2014 para construir ofanato”). Essa produção, sob a perspectiva em que nos embasamos,
justifica que não só o conhecimento linguístico (no que se refere à gramática) é suficiente
para que o sujeito produza textos coesos, coerentes e eficazes. Os conhecimentos
sociocognitivos, interacionais e de mundo construídos e reativados, fortemente presentes
nessa produção escrita (3) desse aluno, revelam a existência de escritores competentes,
restando somente se adequarem ao conhecimento linguístico, que faz parte do processo. A
essas afirmações, acrescentamos o pensamento dos PCN (BRASIL, 1997) de que a
codificação e a decodificação são apenas uns dos procedimentos necessários para se ler e
escrever.
É necessário avançar, ultrapassando esse modelo arcaico de ensino, já que
construir um conhecimento efetivo sobre a língua abrange fatores mais complexos do que
o domínio de normas gramaticais. Avançar, dar um passo a além, é por em prática, em
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sala de aula, estratégias linguístico-discursivas do uso da linguagem que motivem a
construção, compreensão/interpretação dos sentidos do texto, levando o aluno a utilizá-las
em suas práticas cotidianas de forma competente.
Queremos deixar claro que não temos como objetivo aqui uma prática de
ensino que proponha ensinar unicamente o que os alunos conheçam ou desejam, mas a
partir do seu conhecimento de mundo. Isso não significa que se deve descartar a norma
culta padrão, pois ela é um fator determinante para a ascensão social do sujeito, “cuja
aquisição, pelas camadas populares, é o meio de retirar do controle exclusivo das classes
dominantes um de seus principais instrumentos de dominação e de discriminação”
(SOARES apud MONTEIRO, 2000, p.149). Nesse sentido, o método de ensino de língua
portuguesa carece de um rumo diferente do que vem percorrendo.
Por isso, em um primeiro momento, compreendemos que a partir das
produções textuais desses alunos, devem ser exercitadas ideias de organização
textual/discursiva. Em outro momento, gradativamente, mostrar-lhes outros fatores que
cooperam para uma intelecção melhor de suas produções textuais, e que, de acordo com
determinadas situações e determinados gêneros textuais, existirá uma linguagem mais
rebuscada e outras não, pois o domínio da linguagem varia segundo as exigências de cada
situação comunicativa.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do que foi dito acima, queremos destacar que ao papel do professor
como mediador do conhecimento se atrela a função de mostrar a seus alunos que utilizar a
língua é condição imprescindível para se atuar na sociedade de forma ativa, o que não
corresponde a ensinar através de regras de memorização que serão apenas gravadas para
avaliação. O professor, nesse processo, exerce papel fundamental, incentivando o hábito
de ler, escrever, compreender e confrontar ideias nos processos comunicativos reais,
relacionando o conteúdo desenvolvido em sala de aula com as práticas sociais vivenciadas
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pelos alunos, mostrando que a construção do saber pode ser alcançada por meio das
relações interpessoais estabelecidas no ambiente escolar.
Conclui-se, portanto, que a relação dinâmica e interacional que ocorre entre
professor e/aluno, via o uso da linguagem, contribui expressivamente para que esse aluno
se interesse pelo estudo do texto/discurso como um fator que vai favorecer, de forma
decisiva, às relações interpessoais, permitindo que esses sujeitos ativos se expressem nas
mais variadas situações, ou por que não dizer, em qualquer situação que necessite de suas
competências linguística, cognitiva e social, praticando o exercício da cidadania.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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BAKHTIN, Mikhail. Os gêneros do discurso. In: Estética da Criação Verbal. São Paulo:
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