O PROCESSO DE INTERNACIONALIZAÇÃO DAS EMPRESAS DE SERVIÇO DE SANEAMENTO Neusa Santos de Souza; Frederico Araújo Turolla ESPM/ESPM RESUMO Neste trabalho se avalia o processo de internacionalização de serviços de saneamento, tomando como referência o processo de internacionalização de empresas previsto pela teoria de Uppsala (Johansen e Vahlne, 1977 e 2009) e as características microeconômicas do setor de saneamento básico. Assim usando duas abordagens distintas de internacionalização: a Escola de Uppsala, que se insere na linha de Negócios Internacionais e que procura explicar o processo de internacionalização de empresas; e as teorias de abordagem econômica, no segmento relativo à infraestrutura e monopólios naturais, que descreve a dinâmica do setor de saneamento básico e suas principais falhas de mercado. Palavras-Chave: Internacionalização. Infra-estrutura. Teoria. Serviço. 1.INTRODUÇÃO Há mais de um século, um grupo relativamente restrito de empresas de serviços de infraestrutura de alguns países avançou em direção a mercados estrangeiros.Nas últimas décadas do século passado, verificou-se uma intensificação deste processo de internacionalização em vários segmentos, dando origem a empresas multinacionais voltadas para a operação de mercados locais de telecomunicações, energia, saneamento e outros. Ainda assim, o número de empresas continua restrito, mas já constitui amostra suficiente para um estudo acadêmico relevante. Por exemplo Sarkar, Cavusgil e Aulakh (1999) realizaram avaliação da expansão internacional das empresas do setor de telecomunicações, um setor da infra-estrutura que se encontra avançado neste processo. Contudo, a literatura praticamente não tem estudos relevantes sobre a internacionalização do setor de saneamento, um segmento de serviços de vital importância para todos os países. Encontramos uma literatura relativamente madura que trata do processo de internacionalização das empresas. A principal abordagem nessa linha foi desenvolvida no âmbito da Universidade de Uppsala, na Suécia, nos anos 70, dando origem ao modelo de Uppsala. O modelo parte do pressuposto que a empresa decide pela internacionalização devido a incertezas quanto à lucratividade no país em que se encontra instalada. No entanto, devido à imperfeição das informações, as firmas buscam mercados que possuem características similares entre si e são guiadas por uma seqüência de passos incrementais, buscando aprendizagem sucessiva pelas experiências adquiridas em seu crescente comprometimento com mercados estrangeiros. Essas experiências são responsáveis tanto pela formulação das estratégias de operação quanto pela seleção de mercados a serem explorados, devido ao acúmulo de informações. A seqüência de seleção de mercados compreende o gradualismo existente na escolha de países cada vez mais distantes psiquicamente, à medida que a firma ganha experiência de operações no exterior. Embora a teoria de Uppsala se encontre relativamente madura, há importantes casos setoriais em que a teoria não se aplica perfeitamente. Entre estes, a literatura aponta as empresas Born globals, que já nascem orientadas aos mercados internacionais. A literatura se encontra hoje aberta à identificação de novos casos de setores ou empresas que não se ajustam ao paradigma de Uppsala. Este artigo considera que o segmento de serviços de infra-estrutura e, em particular, o setor de saneamento básico, constitui um candidato a exceção à teoria dominante de Uppsala. 2. O SETOR DE INFRA-ESTRUTURA Turolla (2007) a indústria de infra-estrutura possui uma peculiaridade que a torna fundamental para o desenvolvimento econômico de qualquer país, qual seja, sua capacidade de gerar externalidades positivas de várias naturezas, incluindo ganhos de eficiência para a economia como um todo e vantagens sociais. No caso do setor de saneamento, as externalidades são notórias. A insuficiência do saneamento está associada ao desperdício de oportunidades preciosas de redução da pobreza, aumento da inclusão social e promoção do desenvolvimento econômico. O setor de infra-estrutura caracteriza-se fundamentalmente pela presença de custos fixos elevados em capital específico (BID, 1997). Tais custos produzem um dilema econômico 2 entre eficiência produtiva e alocativa, enquanto a especificidade de capital produz subincentivo ao investimento. A importância relativa dos custos fixos faz com que o conjunto de vetores de produção relevante recaia sobre a faixa em que o custo médio é declinante. Economias de escala dessa natureza, quando consideradas em um contexto de monoprodução, identificam, conforme Baumol (1986), um monopólio natural. Modernamente, costuma-se usar um conceito mais amplo que o de monopólio natural, que é o de sub-aditividade de custos, como tratado por Braeutigam (1989). Neste conceito, a redução de custos com o aumento da produção pode advir do rateio entre dois ou mais serviços, ou seja, se admite economias relacionadas à multiprodução. Trata-se do conceito mais amplo que o de monopólio natural, onde não há necessidade de economia de escala global, bastando que uma firma produza um vetor y de produtos com custo menor que o somatório dos custos de um conjunto de firmas (TUROLLA, 2007). Por sua vez, a especificidade do capital tem impacto, principalmente, no incentivo ao investimento, na medida em que reduz fortemente o valor de revenda dos ativos após a sua construção ou aquisição. O efeito é ainda mais grave por se tratar de um setor com volume de investimento requerido bastante superior à média dos demais serviços públicos. Corrales (1998) reporta estudo do Banco Mundial que aponta uma relação de ativos necessários para gerar um dólar anual de faturamento como sendo 3-4 em telecomunicações e 7 em rodovias e 10-12 para saneamento. Assim, quando o investimento é feito pela iniciativa privada, há elevada incerteza em relação à rentabilidade futura do projeto, que pode ser irreversivelmente comprometida pela eventual entrada de um concorrente. Adicionalmente, no caso de propriedade privada dos ativos, o poder de barganha entre o proprietário privado e o governo pode mudar radicalmente após o investimento ser feito (TUROLLA, 2007). 3. ABORDAGEM ECONÔMICA DE INTERNACIONALIZAÇÃO Penrose (1959) apresenta o enfoque da organização industrial para o estudo dos determinantes do investimento externo direto, por este estudo o investimento externo direto é conseqüência do crescimento da firma. As firmas têm grande tendência de se expandir e isto significa diversificar, ou seja, penetrar em novos mercados, assim a subsidiária não seria muito mais do que é uma filial para a empresa. Por outro lado são esperados maiores riscos e custos por se estar fora do país de origem, enquanto também são esperados maiores retornos. 3 A matriz de posse dos recursos intangíveis tais como: capacidade gerencial, conhecimento tecnológico e inovações, estes elementos que são responsáveis em grande parte por determinar condições de expansão da firma, deduz-se que nesta abordagem a internacionalização é devida a uma vantagem especial que a empresa possui (PENROSE, 1959). O poder de mercado é diferenciado o investimento estrangeiro direto do investimento de portfólio no primeiro caso, o investidor possuiria o controle da empresa na qual o investimento foi feito. Tal diferenciação é importante devido aos diferentes comportamentos observáveis dos dois tipos de investimento. A base da teoria do portfólio era as taxas de juros em cada país, e cada investidor tentaria maximizar seus lucros investidos em países onde os retornos fossem maiores. Hymer (1960) considerou a abordagem direta de tal teoria muito ingênua, pois não suportava a inclusão de fatores como riscos, incertezas e barreiras à movimentação do capital. Na teoria do investimento direto, a motivação para o mesmo está nas altas taxas e nos lucros derivados do controle da empresa estrangeira. Primeiro as firmas buscam operações externas porque detém vantagens que o país de destino não possui. Assim os custos associados à internacionalização entre eles o desconhecimento do novo ambiente, riscos, incertezas e eventuais discriminações, devem ser compensados por esta vantagem. Segundo as empresas se internacionalizam para se protegerem de um possível concorrente. Por fim a vantagem está na redução do risco através de diversificação, em termos de número nos mercados onde a firma atua. Hymer procura mostrar os determinantes de internacionalização sob o ponto de vista da empresa, ou seja, visão microeconômica. (HYMER, 1960). De acordo com a teoria do poder de mercado, a firma que possua algum controle sobre o preço, ou seja, está num mercado de monopólio ou oligopólio, busca evitar a concorrência de uma firma com a mesma vantagem em outro país, assim a fusão entre elas é uma forma de evitar esta competição. Na mesma linha, uma empresa estabelece uma operação no exterior com o mesmo propósito. Hennart (2001) destaca que o ponto crucial da teoria de Hymer é que as EMNs são instrumentos para a diminuição da concorrência internacional em setores oligopolizados. Balassa (1966) explica as limitações da expansão do mercado interno em termos de crescimento para a firma, assim a empresa supera tais dificuldades com investimento externo. Corroborando com Hymer (1960), a empresa realiza no exterior um investimento defensivo para se proteger da competição, assim o investimento externo constitui uma estratégia de 4 mercado da firma, com isto a empresa pretende ampliar suas posições de mercado interno e externo. Assim as abordagens que enfatizam a organização industrial podem inicialmente propor que as vantagens específicas, resultantes, por exemplo, da experimentação e ou controle de uma técnica, capacidade de distribuição diferenciada, sejam motivadoras da internacionalização, assim como a necessidade de crescimento da firma. Buckley e Casson (1998) apontaram que tanto a teoria do poder de mercado quanto a teoria do ciclo do produto1 focavam apenas na opção entre exportação e investimento direto no exterior. Por outro lado, a abordagem da internalização identificou outras opções estratégicas para as empresas: licenciamento, franchising e subcontratação. Os teóricos da internalização advogavam a existência de um melhor modo de entrada ou estabelecimento, de acordo com a configuração dos custos de transação da empresa e dos mercados escolhidos. A abordagem dos custos de transação tem sua origem no artigo The Nature of The Firm, de Ronald Coase, e foi posteriormente discutida por Oliver Williamson (1981 e 1985). Ela consiste na análise dos custos não diretamente relacionados à atividade produtiva em si, mas aos contratos e aos custos de coletar informações, de negociação e estabelecimento de contratos, garantindo que os termos contratuais se concretizem. Assim, quanto maior for o custo na busca de informação, menor os problemas decorrentes do fechamento de um contrato e vice-versa. Williamsom (1985) ainda divide os custos de transação em ex ante (relacionados à coleta de informações, principalmente na elaboração do contrato, aos mecanismos que fornecem o cumprimento do contrato, além de salvaguardas) e ex post (relacionados à má adequação às condições contratuais). A presença de custos de transação seria um determinante tanto da integração vertical (conhecida na literatura como governança hierárquica), quanto da internacionalização nas firmas que evitariam assim os custos de transação presentes no mercado. O Paradigma Eclético de Dunning, (1980, 1988, 1993 e 2000), aplica os conceitos de custos de transação às decisões de internacionalização da firma (Williamson, 1975), tentando explicar quais características das empresas e dos mercados estimulam a internacionalização com investimento externo direto, diferenciando esse processo em termos das características do produto e dos mercados. Essa teoria entende a decisão de investimento direto no exterior 1 Teoria do ciclo de vida do produto, Raymond Vernon 1966, mostra o ciclo de vida do produto e investimento internacional. Vermon mostrou que as vantagens competitivas que haviam permitido às empresas competir com sucesso nos EUA, em um estágio inicial do ciclo de vida do produto, eram as mesmas vantagens que permitiam às empresas multinacionais norte-americanas penetrar com sucesso nos mercados estrangeiros. 5 como consistindo em uma escolha entre mercados ou hierarquias (Buckley e Casson, 1976; Rugman, 1981), apropriada pelo paradigma eclético, mostra que a empresa tem a função de internalizar ou integrar as transações ineficientes ou dispendiosas quando realizadas pelo mercado. A organização opera no mercado externo realizando as atividades internamente e obtém vantagem por conseguir manter a propriedade do conhecimento circulando dentro da firma. Esta facilidade de coordenação traria melhor desempenho para a organização. Dunning (1980) procura envolver estas teorias do Custo de Transação e da Internalização junto com outros determinantes para identificar características que explicam a produção internacional do ponto de vista da distribuição geográfica dos ativos da empresa e do padrão industrial adotado. Avaliou vantagens de localização, internalização e de propriedade para achar explicações. A teoria desenvolvida por Dunning explica a extensão, a forma e o padrão do investimento em outros países para desenvolver a produção da empresa. Oferece um esquema holístico que seja possível identificar os determinantes de onde a empresa iniciaria sua produção fora de sua origem. A escolha está baseada em três tipos de vantagem, identificadas pela sigla OLI (Ownership, Location e Internalization). As vantagens de propriedade do (ownership specific advantages) permitem a empresa multinacional manter o domínio do recurso utilizado em outro país. Desta forma, por exemplo, uma subsidiária no exterior manteria sob controle da empresa (mantém a propriedade) a marca ou a tecnologia, em vez de licenciá-las a uma parceira local que poderia se apropriar das vantagens deste recurso. As vantagens comparativas entre países (location specific advantages) seriam responsáveis por explicar a escolha de um local para o investimento. A multinacional optaria por aquele mercado que oferecer melhores condições, como a mão de obra barata e ou especializada, matéria prima, energia, menor burocracia etc. As vantagens de internacionalização (internalization specific advantages) surgem ao construir uma estrutura no exterior para internalizar as operações que poderiam ser realizadas pelo mercado. O Paradigma eclético explica o padrão do investimento no exterior, embora não explique o processo, o modo de entrada e as seqüências de comprometimento dos recursos. Teoria da Internalização introduzida por Coase (1937) e desenvolvida por Williamsom (1985), com contribuições de Penrose (1956) explica a natureza da empresa em um mesmo país, mas revelou-se igualmente útil para explicar a firma internacional. A teoria parte da existência de imperfeições no mercado que tornam mais barato para uma empresa incumbirse, ela mesma, de certas atividades produtivas que, alternativamente, poderiam ser realizadas por outros e adquiridas pela firma. Um tipo importante de imperfeição do mercado é a presença de custos associados às transações feitas nele, como os custos de encontrar 6 fornecedores, negociar contratos, monitorar as obrigações contratuais, lidar com a incerteza quanto a preços futuros e assim por diante. Outro tipo de imperfeição refere-se às dificuldades clássicas de se transacionar conhecimento e informação. A firma também incorre em um custo de oportunidade ao usar transações de mercado, por não explorar vantagens oligopolistas no país estrangeiro. Finalmente, existem custos associados com a intervenção do governo nas transações internacionais, como cotas, tarifas, controle de preços, impostos diferenciados e outros. Nesta situação a firma escolhe internalizar certas atividades que pela hierarquia da empresa são mais baixos que os custos de transação que seriam incorridos se ela usasse o mercado como mecanismo de coordenação. (COASE, 1937; WILLIAMSON, 1975). 3. ABORDAGEM COMPORTAMENTAL DE INTERNACIONALIZAÇÃO Alguns autores durante a década de 70 e 80 começaram a questionar o modelo de investimento no exterior enraizado na teoria econômica e passaram a focar no processo de internacionalização da firma (Johanson e Wiedersheim 1975; Johanson e Vahlne 1977; Cavusgil 1980; Welch e Loustarinen; 1988). Johanson e Vahlne (1977 e 1990) consideram o processo internacionalização da firma uma seqüência crescente de comprometimento de recursos no exterior, relacionados ao desenvolvimento de conhecimento em operações externas. Empenha-se conhecimento, tecnologia, pessoal e capital em outros países na medida em que se aprende com atividades externas. Desta forma quando se conhece melhor as operações em determinado mercado externo, a empresa investe e compromete maiores recursos neste mercado. O gestor da empresa não conhece perfeitamente todas as opções de mercado à disposição antes de experimentar o mercado em questão (JOHANSON e VAHLNE, 1990). O modelo assume que existe informações disponíveis a respeito dos custos envolvidos antes da empresa escolher qual mercado e qual estrutura adotar. Baseia-se na racionalidade que é limitada Simon (1965), na sua visão a organização é um sistema de decisão onde a pessoa participa de forma racional e consciente, escolhendo entre as alternativas para otimizar vantagens, mesmo com as mesmas informações disponíveis cada empresa é única e reage ao ambiente de forma distinta. Outra crítica é o caráter estático, pois não considera o aprendizado como fator para atenuar os custos envolvidos. Dunning (1998) pressupõe que os gestores conheçam os custos envolvidos antes de tomar a decisão de investimento. O processo de internacionalização 7 atenua os custos durante o processo de aprendizagem e à medida que as atividades se desenvolvem no exterior (JOHANSON e VAHLNE, 1990). A hipótese básica deste modelo é que a falta de conhecimento é um importante obstáculo para desenvolver operações em mercados de outros países e o conhecimento necessário para estas atividades pode ser adquirido principalmente na condução de tais operações. (JOHANSON e VAHLNE, 1977). Este modelo é conhecido como Escola de Uppsala, devido à origem dos autores, foi desenvolvida para criticar as teorias vigentes na época sobre investimento direto no exterior, consideradas muito estáticas pelos seus críticos, além de negligenciar o problema da distância psíquica. Uma atualização desta teoria, oi recentemente apresentado em Johanson e Vahlne (2009). Como Eden (2009) coloca "outsidership em relação à rede em causa, ao invés de distância psíquica, é a causa raiz de incerteza e precipita o processo de internacionalização" Eden, 2009, p. 1409, apud (TUROLLA, 2007). Na teoria original, a responsabilidade de estranheza foi um conceito-chave, enquanto que na nova versão de um conceito relevante é a responsabilidade do outsidership, em relação a uma rede em causa. 4. METODOLOGIA O estudo realiza uma revisão da literatura teórica em seus dois segmentos relevantes (Negócios Internacionais e Organização Industrial) a parte empírica é resultante da coleta de dados secundários de empresas de serviços de saneamento que se internacionalizaram para validar a aplicação das teorias. As empresas escolhidas para o estudo são as três maiores operadoras de saneamento do mundo, de acordo com a revista The Economist (2004), cuja internacionalização ocorreu a tempo suficiente para permitir o estudo das dimensões relevantes para a aplicação da teoria. São elas: Suez (antiga Lyonnaise des Eaux, francesa); Veolia (Générale des Eaux, francesa); e RWE Thames Water (empresa alemã, com operações relevantes no Reino Unido). Para cada uma destas empresas, pesquisaram-se atributos relevantes para a teoria de Uppsala, tais como: origem; trajetória de internacionalização; distância psíquica entre os mercados originais e hospedeiros; forma de entrada (greenfield ou brownfield, privatização ou concessão); entre outras. SUEZ (antes Société Lyonnaise des Eaux – adaptado para simplificar o processo de internacionalização de grupo) com operação em 130 países possui aproximadamente 46% do seu faturamento gerado fora do país de origem, constituída em 1858. Ainda que o foco deste 8 trabalho seja a presença da SUEZ no setor de saneamento, pode-se observar pela figura abaixo uma continuada concentração no seu centro de interesses geográfico a França e a Bélgica, aproximando-se de 54%. Isto posiciona a SUEZ como líder em energia (Benelux) e em segundo lugar em águas na França. Das regiões destino a liderança em águas na América do Sul, ainda com o episódio da saída de parte das operações na Argentina em 2001 e Bolívia em 2005. Por Guasch (2005) cenários típicos são um governo ou um prefeito, no caso de concessões de água (Prefeitos têm competência exclusiva sobre as operações de água) decidir de forma unilateral de cortar tarifas ou não honrar os aumentos acordados durante uma campanha de reeleição para assegurar o apoio popular. Outra é o cenário de uma nova administração, a decisão de não honrar o aumento de tarifas estabelecido no contrato de concessão concedido pelas administrações anteriores. Salientamos que no segmento industrial do saneamento, aquisição da Nalco e da Calgon, e ainda da SITA, e a entrada no capital de algumas empresas significativas das águas casos da Agbar, em Espanha, da NW, no Reino Unido, da UWR, nos Estados Unidos, e da Eurawasser, na Alemanha, resultou que estrategicamente a SUEZ apresente crescente focalização num mix que lhe permitiu ter, já, atingido a fase da “multi-utility” por excelência, associando atividades elétricas, de gás natural, de água e de saneamento, e visando ampliar a gama da oferta a toda a cadeia dos negócios no segmento ambiental, sendo o este o padrão de expansão setorial (SUEZ Annual Reports e site da empresa). 9 Figura 1. Presença da SUEZ no mundo Fonte: Eurotendencia Informação Internacional, Vol. I, 2004 – Departamento de Prospectiva e Planeamento VEOLIA (Générale des Eaux), com operação em 90 países, possui aproximadamente 50% do seu faturamento gerado fora do país de origem, constituída em 1853. Geograficamente a concentração internacionalizada da empresa é de 7% nas Américas, 6% na Ásia, 30% na Europa (exceto França) e 7% na África, Oriente Médio e Índia. O primeiro país para o qual Veolia se internacionalizou foi à Itália desde a segunda metade do século 19. A Veolia tem elevado peso e significado nos negócios relacionados com o ambiente (águas e saneamento), representavam mais de 1/3 do “chiffre d affaires2”, detendo o grupo, respectivamente, o segundo e o quarto lugares nos correspondentes rankings, a Veolia caracteriza-se como uma multi-utility inclusive com alguma exposição em telecomunicações. 2 chiffre d´affaires numa tradução livre volume de negócios. 10 Figura 2. Presença da VEOLIA no mundo Fonte: Eurotendencia Informação Internacional, Vol. I 2004 – Departamento de Prospectiva e Planeamento RWE - Thames Water, maior concessionário de água aberta com sede nos EUA e com 16 milhões de clientes presente em 29 estados e três províncias canadenses, foi totalmente adquirida pelo conglomerado alemão de energia RWE AG, em janeiro de 2003. RWE é um dos gigantes do mundo o maior em energia com mais de 640 filiais e faturamento anual de mais de US 50 bilhões via aquisição da AMERICANWATER Works até então a líder do mercado. RWE, adoção acentuada, rápida e refinada postura multi-utility, (eletricidade, gás, água e saneamento), com abandono, simultâneo, do histórico do conglomerado que engloba o negócio da energia, as indústrias químicas e petroquímicas e, ainda, a construção. 11 Figura 3. Presença da RWE no mundo Fonte: Eurotendencia Informação Internacional, Vol. I - 2004 – Departamento de Prospectiva e Planeamento Empresas em setores regulamentados enfrentam um grande dilema quando vão se expandir para o exterior. Por um lado há o estabelecimento teórico e a recomendação de internacionalização gradual, um modelo de internacionalização assim minimiza riscos e diminui as incertezas, ( Johanson and Vahlne, 1977;Chang, 1995; Rivoli and Salorio, 1996; Guill´en,2002; Vermeulen and Barkema, 2002), isto é para superar a chamada responsabilidade da estranheza (HYMER, 1976; ZAHEER, 1995). Por outro lado a natureza regulamentada desta indústria pede um grande comprometimento de recursos e rápida entrada em mercados estrangeiros. Esta situação é devido a três razões: primeiro, estas indústrias tendem a ser altamente concentradas e elas exibem características de monopólio. Segundo a entrada pode ser restringida pelo Governo, frequentemente sob um sistema de licenças. Terceiro o Governo pode possuir parte significativa da indústria. Nestas circunstâncias os concorrentes estrangeiros enfrentam dificuldades por comprometer grandes somas de recursos e estabelecer operações de forma rápida, quando e onde surgir a oportunidade, na forma de aquisições em oposição ao investimento greenfield (Sarkar et al,1999). Assim regulados este 12 mercado de natureza oligopolista gera grandes vantagens (DOH, 2000; KNICKERBOCKER,1973). Pesquisas recentes em estratégias argumentam que as indústrias seguem uma assimétria estratégica em que elas procuram defender a posição do seu país de origem, impedindo os rivais de competir em condições equitativas e prosseguindo entrada no mercado estrangeiro, até que ocorra a desregulamentação. Considerando que a desregulamentação ocorre no tempo em graus diferentes de país para país, empresas em setores regulados tendem a seguir uma estratégia multidoméstica de expansão internacional, ou seja, elas ao escolherem um mercado para entrar o fazem em função de circunstâncias específicas (SARKAR,1999). Um monopólio natural surge quando existe a possibilidade de explorar economias de escala ao longo de um intervalo muito grande de produção. Como resultado esta escala de eficiência ótima torna-se muito elevada a proporção da demanda do mercado total do produto ou serviço presentes em cada país estrangeiro, organizando suas operações num local ao invés de uma lógica global, (BONARDI, 2004). Outra característica que distingue de setores regulados é o papel do Estado como acionista. Algumas das empresas mais ativas em setores regulamentados em expansão no exterior são monopólios em que o Estado tem ou teve uma participação de controle (DOH, TEEGEN, and MUDAMBI, 2004). Dada a estrutura de monopólio natural, a maior eficiência produtiva pode ser conseguida através da operação de um produtor único. Entretanto, as distorções alocativas resultantes do poder de monopólio precisam ser controladas através de algum mecanismo. Eliminando-se pelo critério de eficiência produtiva a possibilidade de competição direta, a obtenção de eficiência alocativa requer o emprego de competição pelo direito à franquia para servir um determinado mercado (competição de Demsetz), ou ainda um mecanismo de regulação. Na prática é possível combinar as duas alternativas, com a realização de leilões pela franquia e o estabelecimento de mecanismos de regulação. Tabela 1. Amostragem com dados de origem, ano de entrada, forma de entrada e período contratual (sempre que disponível), das 03 maiores empresas de infraestrutura do tipo multiutility mundo. Área de Atuação Empresa Entrada Forma de entrada Período Alemanha Suez 1960 Privatização -3 Argentina Suez 1992 Privatização - Bélgica Suez 1972 Privatização - 3 Quando não foi possível encontrar o prazo contratual a anotação no campo de período é: - 13 Brasil Suez 1998 Privatização - China Suez 1979 Concessão - EUA Suez 2000 Privatização 30 anos Holanda Suez 1999 Privatização - Hong-kong Suez 2009 Privatização 25 anos Filipinas Suez 1999 Privatização 25 anos França4 Suez 1789 Concessão Republica Eslovênia Suez 1997 BOT - Macau Suez 1982 Fusão 25 anos França Veolia 1923 Concessão - Inglaterra Veolia 1989 Privatização - Portugal Veolia 1991 Concessão - Rússia Veolia 1991 Parceria pública privada - México Veolia 1993 Parceria Pública Privada 30 anos Hungria Veolia 1994 Joint Venture - Austrália Veolia 1996 Parceria Pública Privada 15,5 anos Gabão Veolia 1997 Concessão 20 anos Filipinas Veolia 1998 Concessão 35 anos Colômbia Veolia 1998 Parceria Pública Privada 25 anos Irlanda Veolia 1999 Aquisição 22 anos Alemanha Veolia 1999 Concessão 30 anos Romênia Veolia 2000 Adjudicação 25 anos Polônia Veolia 2000 Contrato de terceirização - EUA Veolia 2000 Parceria Pública Privada 15 anos + 05 República Checa Veolia 2001 Aquisição 27 anos Nigéria Veolia 2001 Arrendamento 10 anos Bélgica Veolia 2001 Concessão - Lituânia Veolia 2001 Concessão - Namíbia Veolia 2001 Concessão 20 anos Incheon Veolia 2001 Privatização 20 anos Israel Veolia 2002 Concessão 25 anos Marrocos Veolia 2002 Concessão 25 anos China Veolia 2002 Joint venture 50 anos Turquia Veolia 2003 Concessão - Noruega Veolia 2003 Consórcio - Holanda Veolia 2003 Parceria Pública Privada 30 anos Índia Veolia 2005 Contrato de performance 05 anos 5 4 5 País de Origem País de Origem 14 Dinamarca Veolia 2006 Consórcio - Oman Veolia 2006 Contrato performance 25 anos Armênia Veolia 2006 Licitação - Arábia Saudita Veolia 2008 Contrato de performance 06 anos Reino Unido6 RWE 2003 Privatização 10 anos licenças - instrumento de nomeação 7 Alemanha RWE 1898 Concessão - Fonte: Informações disponíveis nos sites das empresas. 5. CONCLUSÃO O modelo de Uppsala não se ajusta de forma plena à internacionalização das empresas de infraestrutura, pois a seqüência de passos não obedece à menor distância psíquica. O motivo para esta falta de aderência está nas falhas de mercado do setor de saneamento e nas respostas típicas a essas falhas. Em particular, a presença de custos fixos elevados em ativos altamente específicos leva a um tradeoff entre eficiência alocativa e produtiva, exigindo regulação ou competição pelo mercado como proposto por Demsetz (1988), além de contratos muito longos. Com isto, a entrada de novas empresas se dá, principalmente, nos períodos de renovação contratual, que constituem janelas de oportunidade limitadas no tempo. Não há, portanto, mercados disponíveis para entrada, o que leva as empresas a não obedecerem à seqüência típica de passos de Uppsala. Em relação às empresas estudadas: Suez, Veolia e RWE, percebe-se que a trajetória de internacionalização não segue o gradualismo em termos de etapas seqüenciais, e também não segue a premissa da empresa de procurar países com menor distância cultural. A análise aponta para a inadequação de alguns pressupostos dos modelos teóricos dominantes e para a necessidade de elaboração teórica para suportar a análise dos processos de internacionalização destas empresas. O gradualismo não pode ser aplicado nos investimentos de infra-estrutura, pela impossibilidade de se transacionar via importação-exportação, ou de iniciá-los via escritório de vendas. 6 Sistema de regulação bipartite, com separação funcional entre reguladores econômicos e de qualidade. Essa separação permanece inalterada, apesar das mudanças institucionais por que passou, nos últimos anos, a estrutura governamental britânica. 7 País de Origem 15 6. REFERÊNCIAS __________.The flood dries up. 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