MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA-GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO PROCESSO PGT/CCR/ICP 210/2009 ORIGEM: PRT/16ª REGIÃO INTERESSADO(S): 1 – CEAGRO ASSUNTO(S): Terceirização EMENTA: COLHEITA TERCEIRIZAÇÃO DE GRÃOS – – PLANTIO Verificação E da idoneidade da empresa prestadora de serviços, especialização da atividade, prestação de serviços para mais de uma empresa, por seus próprios meios de produção, sem nenhum prejuízo de ordem normativa ou à dignidade de seus trabalhadores – Ausência de indicação de subordinação e pessoalidade - Arquivamento que se homologa à falta da comprovação da existência dos pressupostos da vinculação empregatícia direta com a tomadora. RELATÓRIO Trata-se de inquérito civil instaurado pela Procuradoria do Trabalho em Imperatriz/MA, em razão do envio de cópia do Relatório de Diligência do Grupo Móvel de Combate ao Trabalho Escravo no Maranhão, por fax, pela Procuradoria do Trabalho em Caxias/MA. 1 MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA-GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO O Grupo Móvel de Combate ao Trabalho Escravo no Maranhão, composto por 4 auditores fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego, 4 Policiais Rodoviários federais e a Procuradora do Trabalho Dra. Maria Elena Moreira Rêgo, constatou, durante a inspeção empreendida na Fazenda Certeza, que a empresa CEAGRO AGRONEGÓCIOS S/A, localizada na cidade de Balsas/MA, arrendou essa propriedade rural, e, uma vez notificada a comprovar o vínculo empregatício dos trabalhadores encontrados no local, informou, durante a reunião realizada na sede da PRT/16ª Região, que transfere a terceiros todo o serviço de plantio e colheita de grãos, por não possuir os equipamentos necessários, o que demandaria um alto investimento. Vislumbrando, em tese, a possibilidade da ocorrência de terceirização irregular, a Procuradora do Trabalho Carolina de Almeida Mesquita, titular da investigação, realizou audiências com o representante da empresa investigada (fls. 44/45), da empresa contratada como prestadora de serviços PA FACHIN (fls. 83/84), com o proprietário da Fazenda Certeza Sr. Célio Antônio Weiller (fl. 85), com o Coordenador de Campo Agrícola da empresa PA FACHIN Sr. Cléo Eli Yunges (fls. 86/87) e com a Assistente Administrativa Sra. Joelma Terezinha Oliveira Prado (fls. 88/89). O advogado da investigada juntou documentos (fls. 90/229). Às fls. 235/239, a d. Procuradora oficiante promoveu o arquivamento do feito. 2 MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA-GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO VOTO Os fundamentos da proposta de arquivamento são os seguintes: “Trata-se de ICP instaurado em razão de representação do MPT em face da CEAGRO AGRONEGÓCIOS S.A., originada a partir da constatação da Procuradora do Trabalho oficiante no Grupo Móvel de Fiscalização, que implementou ações fiscalizatórias na região tocantina em meados de outubro de 2008. Conforme relatório de diligência que consta dos autos, durante a visita do grupo à fazenda “Certeza”, na região de Balsas-Ma, constatou-se que a empresa representada estava realizando contratos de arrendamento de terras a produtores rurais da região, terceirizando o serviço de plantio e colheita, havendo a locação de máquinas pela CEAGRO para realização de determinados serviços. Em razão de, terceirização a princípio, parecer a irregular, mencionada por estar transferindo, em tese, a terceiros, atividade fim da empresa – plantio e colheita – decidiu esta procuradora investigar a empresa mencionada e todo o seu modo de produção. Assim, foram administrativas marcadas e diversas audiências requisitados inúmeros documentos a fim de se esclarecer a questão. Constatou-se que a CEAGRO é uma empresa que está há 14 anos no mercado, e tem como objeto a 3 MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA-GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO comercialização de insumos, soja e grãos, além de agregar o sistema de armazenagem de grãos para fins de exportação e mercado interno; a empresa possui um sistema de “troca”: fornece insumos – defensivos sementes, agrícolas adubos, – fertilizantes para os e seus “colaboradores”, os quais produzem a soja (ocorre a “troca” de insumos por grãos, além de haver a assistência técnica à produção). No caso sob exame, ocorre o seguinte sistema: (ver fls. 71 do IC): a CEAGRO realizou contrato de parceria agrícola com o senhor CÉLIO ANTÔNIO WEILLER), proprietário de diversas fazendas na região (inclusive da “Fazenda Certeza”, objeto da fiscalização do Grupo Móvel, supra mencionado), na qual o parceiro proprietário cede e entrega à parceria agrícola o uso específico dos imóveis definidos no contrato de fls. 27/35, para exploração, em regime de parceria, de planos de culturas anuais, tais como soja, arroz e milho, sendo que o parceiro proprietário participa apenas cedendo o uso de suas terras e auferindo um percentual de 30% sobre a produção agrícola. Conforme o parceiro proprietário CÉLIO WEILLER, no depoimento de fls. 85, “antes dessa parceria, ele produzia grãos na sua fazenda, através de seus próprios empregados; que, hoje, não possui qualquer empregado seu na fazenda; todos ali presentes são funcionários da Pa Fachin; que os maquinários são desta ultima”. 4 MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA-GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO Por outro lado, a CEAGRO contratou a empresa PA FACHIN, especializada em serviços de mecanização agrícola, para que esta prestasse os serviços referentes ao plantio e a colheita mencionados supra, nas terras arrendadas; a PA FACHIN possui maquinários e empregados próprios, num total de 27 obreiros, os quais possuem treinamento específico para realizar os serviços e operar máquinas. A empresa PA FACHIN tem sede, localizada na BR 230, Fazenda Santa Teresa, Povoado Corrente, Zona Rural, Riachão-Ma, conforme documentação de fls. 102 e seguintes. A PA FACHIN presta serviços para a CEAGRO em várias fazendas: a “Santo Isidoro” – que envolve a fazenda Suelo, a Corrente, a Santa Teresa etc, conforme doc. de fls. 12/13 dos autos – e a Fazenda Certeza – que envolve as “Certezas” I, II, III...; esclarece-se que o proprietário dessas fazendas contribui apenas com a terra; Assim, seriam três atores: a CEAGRO, a PA FACHIN – que possui seus próprios empregados, além do maquinário – e o PARCEIRO AGRÍCOLA. Aduz a CEAGRO que a mesma não possui su parque de máquinas em razão de que, adquiri-lo, inviabilizaria totalmente o projeto da empresa, devido aos custos de aquisição desse maquinário. Alega que “dificilmente conseguiria fazer exclusivamente locação das máquinas, pelo fato de que os proprietários das mesmas, devido a necessidade de habilidades, conhecimentos e 5 MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA-GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO cuidados com as máquinas; até mesmo pelo alto preço que as mesmas têm, preferem que seus próprios funcionários operem-nas. A empresa buscou fazer este sistema construindo o contrato com vários mecanismos para assegurar os direitos trabalhistas dos prestadores de serviço, os quais são obrigados a cumprir a NR-31, bem como comprovar o pagamento de seus colaboradores, bem como dos encargos sociais e trabalhistas, sob pena de retenção do pagamento a que tem direito. Com certeza, se fosse para a CEAGRO adquirir máquinas e dar especialidade aos colaboradores e empregá-los, isto provavelmente inviabilizaria, neste momento, a seqüência dos trabalhos de cultivo da soja, o que esta prestes a iniciar como o inicio das chuvas que ser aproximam” (fls. 45). Foram ouvidos dois empregados da PA FACHIN, dentre eles o senhor CLEO YUNGES, coordenador de campo agrícola, o qual informou, no depoimento fls. 86/87, que a empresa cumpre corretamente todos os direitos laborais, além de fornecer alojamento salubre para seus obreiros (as fotos dos alojamentos encontram-se apensadas ao IC). No tocante aos 27 trabalhadores da referida prestadora de serviço, foram apresentadas suas fichas de registro, contra-cheques, cartões de ponto, comprovante de pagamento de FGTS e INSS, de décimo terceiro salário, ficha de entrega de EPIs, tudo em conformidade com a legislação trabalhista. 6 MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA-GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO Foi também apresentado levantamento fotográfico dos alojamentos existentes na sede da empresa PA FACHIN, dos alojamentos provisórios na Fazenda Certeza, além do projeto da construção dos novos alojamentos nesta última fazenda (já em andamento, conforme fotos – “foto 01” e projeto de fls. 97). Cumpre averiguar se o sistema adotado pela empresa CEAGRO trata-se de terceirização irregular ou não. Analisando-se tecnicamente, apenas pelos conceitos de “atividade fim” (atividade prevista no estatuto da tomadora, a Ceagro), Poderse-ia afirmar que a representada estaria terceirizando uma de suas atividades principais, o plantio e a colheita. Contudo, a questão não se afigura tão simples, pois, na opinião desta Procuradora, no caso específico, é necessário também averiguar se a empresa prestadora de serviço, in casu, a PA FACHIN, é realmente especializada, se detém as máquinas e os equipamentos e se é uma empresa idônea. Esta empresa, por toda a documentação e depoimento acostados nos autos, fornece o serviço acabado e não apenas a mão-de-obra, ativando-se em favor da tomadora somente na preparação do solo, adubação, plantio, colheita etc, cumprindo com todas os atributos trabalhistas, inclusive com o meio ambiente de trabalho. Não há degradação das condições de trabalho e/ou trabalho em condições análogas a de escravo, falta 7 MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA-GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO de cumprimento da legislação trabalhista em geral. Se houvesse tais características no caso sob exame, seria importante responsabilizar solidariamente o tomador e estabelecer-se o vínculo direto, pois estar-se-ia diante de um o prestador de serviço inidôneo, o que não é a hipótese dos autos. Acredito que, no caso específico em análise, deve ser observada a seguinte regra: se a empresa prestadora é especializada e presta tal serviço para mais de uma empresa, com seus próprios meios de produção, se é uma empresa idônea, que cumpre com a legislação trabalhista, sem qualquer prejuízo de ordem normativa ou à dignidade de seus trabalhadores, ainda que a atividade prestada esteja inserida numa das etapas iniciais da cadeia produtiva, deve ser sopesado, na atuação ministerial, o efetivo “ganho” que os trabalhadores terão com a simples transferência do registro contratual para e empresa tomadora. Destarte, se não houver ganho algum, não há motivos razoáveis para contestar a terceirização, apenas pelo aspecto legal (atividade prevista no estatuto da tomadora). Portanto, não vejo ilegalidade nesta transferência de atividade feita pela CEAGRO AGRONEGÓCIOS, não havendo, por todo exposto supra e pela vasta documentação inserida neste IC, razão para estabelecer-se o vínculo com a mesma. 8 MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA-GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO Não há, pois, conforme demonstrado, motivos ensejadores da atuação do Ministério Público do Trabalho neste caso específico. Nesse lastro, é importante destacar a orientação consubstanciada no Precedente nº 12 do Conselho Superior do Ministério Público - CSMPT, in verbis: PROCEDIMENTO INEXISTÊNCIA INVESTIGATÓRIO OU – CORREÇÃO DAS IRREGULARIDADES – HOMOLOGAÇÃO POR DESPACHO. “Nos casos de procedimentos investigatórios onde restar comprovada a correção ou a inexistência das irregularidades denunciadas, atestadas pelo Procurador oficiante, poderá o Conselheiro Relator homologar, por despacho, a promoção de arquivamento, devolvendo os autos á origem.” Destarte, considerando que a atuação ministerial deve se pautar por um critério de relevância, materialidade, razoabilidade e proporcionalidade, sobretudo em virtude da limitação de seus recursos humanos e materiais frente à imensa gama de possibilidades de fiscalização, não vislumbro justificativa para dar prosseguimento ao presente procedimento, razão pela qual se revela conveniente o seu arquivamento.” (fls. 235/239). Atestada, pela Procuradora oficiante que a empresa prestadora dos serviços PA FACHIN é realmente especializada e idônea, concluo pela razoabilidade da proposta de arquivamento - à falta de qualquer indicação de 9 MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA-GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO comprovação das notas de subordinação e pessoalidade dos empregados da prestadora em relação à tomadora dos serviços e seus prepostos. Com efeito, verifica-se robustecer dita conclusão, a constatação da Procuradora oficiante, no sentido de que a prestadora, na hipótese dos autos, “por toda a documentação e depoimento acostados nos autos, fornece o serviço acabado e não apenas a mão-de-obra(...)”, bem como a afirmação da sua subsunção à regra de ser idônea, especializada, prestando os serviços para mais de uma empresa, por seus próprios meios de produção, sem nenhum prejuízo de ordem normativa ou à dignidade de seus trabalhadores. Assim, embora a questão seja propensa a suscitar dúvidas posto envolver o balizamento do conceito da atividade fim da tomadora de serviços, bem como o da especialização da atividade realizada pela prestadora - o certo é que as circunstâncias fáticas peculiares colhidas do procedimento investigatório, na forma como minudenciadas na proposta de arquivamento acima transcrita, efetivamente autorizam concluir que, na espécie, não se logrou angariar elementos de prova definitivos, no sentido da presença dos pressupostos da existência de vinculação empregatícia direta entre os empregados da prestadora e a CEAGRO. Voto, pois, pela homologação da proposta de arquivamento, ante a razoabilidade da tese externada pela Procuradora oficiante, ante a inexistência nos autos de elementos fáticos que amparem convicção no sentido da propositura imediata de ação civil pública. 10 MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PROCURADORIA-GERAL CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO CONCLUSÃO Homologo, pois, o arquivamento proposto. Brasília, 31 de março de 2009. GUSTAVO ERNANI CAVALCANTI DANTAS RELATOR 11