“Os direitos de privacidade do trabalhador e a fiscalização do empregador sobre suas mensagens de internet.” 50º Congresso Brasileiro de Direito do Trabalho da Editora LTr José Affonso Dallegrave Neto 1. Previsão legal do tema • não há regulamentação legal específica • Sistema Jurídico aberto • CF: social, ética e solidarista: • Direito geral de personalidade (art. 1º, III) • art. 5º, X (intimidade, privacidade, honra e imagem) • art. 170, III (função social da propriedade) 2. Colisão de direitos fundamentais • • • • Empregador x Empregado Patrimônio x Dignidade Propriedade x Intimidade Prejuízo x Privacidade Segurança x Sigilo de correspondência • Imagem da empresa x Imagem do trabalhador - Princípio da Proporcionalidade Canotilho: “meios e fins são colocados em equação mediante um juízo de ponderação, a fim de se avaliar se o meio utilizado é ou não desproporcionado em relação ao fim.” 3. Sujeição da norma ao crivo da constitucionalidade “Nem o CT nem a norma coletiva teriam o condão de autorizar a realização de revista em detrimento da preservação da honra e intimidade do trabalhador, pois a proteção desses direitos inclui-se entre as garantias e direitos fundamentais da pessoa humana garantidos pela CF”. (TST, SBDI-I, Min. Maria Cristina Peduzzi, Processo E-RR 641571/2000.3) 4. Objeto da fiscalização do empregador - Princípio da inviolabilidade do sigilo das correspondências (art. 5º, XII, CF/88) Ex: E-mail e demais navegações (msn, Google, chat, etc) • Email corporativo do empregador; • Email pessoal e privativo do empregado; “a partir do momento em que o empregador concede aos obreiros espaços exclusivos, obriga-se, implicitamente, a respeitar sua intimidade”. Alice M. de Barros. A pergunta é: *houve expectativa de salvaguarda da intimidade? Tribunal do Texas, EUA - K-Mart Corp. x Trotti • trabalhadora processou empregador por revistar o seu armário. • o Tribunal constatou: “ao permitir que os trabalhadores comprassem e usassem as suas próprias fechaduras e cadeados, o empregador criou uma legítima expectativa de que o armário e o seu conteúdo estariam livres de qualquer interferência. • assim, “nem mesmo a suspeita de que um trabalhador teria furtado bens do empregador“ seria justificativa para invadir sua privacidade. 5. Espécies de fiscalização a) Fiscalização genérica, injustificada e de rotina; b) Fiscalização dirigida, pontual e justificada; • Jus variandi < art. 187 do Código Civil: “nem mesmo em nome da defesa do patrimônio, tampouco por interesse supostamente público pode-se desrespeitar a dignidade humana". (TST, 1ª. T., Processo RR 2195/1999) • legítima só quando precedida de outros meios que sinalizem para uma suspeita razoável contra o empregado. 6. Critérios para fiscalizar espaços virtuais corporativos a) último recurso diante de concreta justificativa; • Profa. Teresa Coelho Moreira: “Não cremos que baste a tutela geral da propriedade para que possa legitimar-se a realização de revistas sendo necessária ainda a concorrência de circunstâncias concretas que a justifiquem”. “Da esfera privada do trabalhador e o controlo do empregador”. Coimbra Editora, 2004, p. 342 • será abusiva a fiscalização sem a prévia e razoável suspeita e sem a prova de prejuízo em concreto. b) a invasividade deve ser proporcional às justificativas • Robert Alexy: “quanto mais intensiva é uma intervenção em direito fundamental, tanto mais graves devem ser as razões que a justificam”. • “A gravação da conversa de um dos interlocutores não configura interceptação, sendo lícita como prova no processo penal, aplicando-se, nesse caso, o princípio da proporcionalidade, que permite o detrimento de alguns direitos para que prevaleçam outros de maior valor.” (STJ, RHC, 7216/SP, 5a. T., RT n. 755/580) 7. Uso desvirtuado da internet = dano à imagem da empresa • Alexandre Agra Belmonte: “Umas das razões que levam ao rastreamento das navegações e de e-mails diz respeito à associação da má utilização à reputação da empresa. No terreno da RC, não têm validade os chamados avisos de isenção de responsabilidade empresarial (“Legal Disclaimers”), que remetem ao funcionário – e não à Empresa – a responsabilidade pelo envio de e-mail causador de prejuízo moral ou material”. (“Monitoramento da correspondência eletrônica nas Relações de Trabalho”, editora LTr) • Art. 932, III, CC; “Não constitui violação à intimidade e à privacidade do empregado, bem como ao inciso XII do art. 5º da CF, a ensejar a indenização por dano moral, o monitoramento, por parte do empregador, do correio eletrônico de trabalho do empregado, porquanto este procedimento está inserido dentro do seu poder de direção e fiscalização, que disponibiliza o referido instrumento para que o empregado o utilize na persecução dos fins da organização, não constituindo direito do obreiro a utilização de forma arbitrária dos instrumentos de trabalho que lhe foram confiados.” (TRT 12ª R.; RO-V 07547-2004-001-12-00-9; 3ª. T.; Rel. Gracio Ricardo B. Petrone; Julg. 03/11/2005) Caso emblemático • "PROVA ILÍCITA. ‘E-MAIL' CORPORATIVO. JUSTA CAUSA. DIVULGAÇÃO DE MATERIAL PORNOGRÁFICO • 1. Os sacrossantos direitos do cidadão à privacidade e ao sigilo de correspondência, constitucionalmente assegurados, concernem à comunicação estritamente pessoal, ainda que virtual (‘e-mail' particular). • 2. Solução diversa impõe-se em se tratando do chamado ‘e-mail' corporativo, instrumento de comunicação virtual mediante o qual o empregado louva-se de terminal de computador e de provedor da empresa, bem assim do próprio endereço eletrônico que lhe é disponibilizado igualmente pela empresa. Destina-se este a que nele trafeguem mensagens de cunho estritamente profissional. Em princípio, é de uso corporativo, salvo consentimento do empregador. Ostenta, pois, natureza jurídica equivalente à de uma ferramenta de trabalho proporcionada pelo empregador ao empregado para a consecução do serviço. • 3. (...) A experiência subministrada ao magistrado pela observação do que ordinariamente acontece revela que, notadamente o "e-mail" corporativo, não raro sofre acentuado desvio de finalidade, mediante a utilização abusiva ou ilegal, de que é exemplo o envio de fotos pornográficas. Constitui, assim, em última análise, expediente pelo qual o empregado pode provocar expressivo prejuízo ao empregador. • 4. Se se cuida de 'e-mail' corporativo, declaradamente destinado somente para assuntos e matérias afetas ao serviço, o que está em jogo, antes de tudo, é o exercício do direito de propriedade do empregador sobre o computador capaz de acessar à INTERNET e sobre o próprio provedor. Insta ter presente também a responsabilidade do empregador, perante terceiros, pelos atos de seus empregados em serviço (CC, art. 932, inc. III), bem como que está em xeque o direito à imagem do empregador, igualmente merecedor de tutela constitucional. • Sobretudo, imperativo considerar que o empregado, ao receber uma caixa de ‘e-mail' de seu empregador para uso corporativo, mediante ciência prévia de que nele somente podem transitar mensagens profissionais, não tem razoável expectativa de privacidade quanto a esta, como se vem entendendo no Direito Comparado (EUA e Reino Unido). • 5. Pode o empregador monitorar e rastrear a atividade do empregado no ambiente de trabalho, em 'e-mail' corporativo, isto é, checar suas mensagens, tanto do ponto de vista formal quanto sob o ângulo material ou de conteúdo. Não é ilícita a prova assim obtida, visando a demonstrar justa causa para a despedida decorrente do envio de material pornográfico a colega de trabalho. Inexistência de afronta ao art. 5º, incisos X, XII e LVI, da CF." (TST, 1ª. T., RR- 613/2000-013-10-00. Min. João Oreste Dalazen, DJU: 10/6/05) Assim, sobre email corporativo da empresa, pelo princípio da proporcionalidade, temos as seguintes possibilidades: • para apurar desídia, a mera verificação formal (quantidade de emails) será suficiente; • para apurar improbidade ou prejuízo contra terceiro, será possível a verificação material (conteúdo dos emails); • para apurar crime de pedofilia, será possível acionar a polícia federal; FIM (www.twitter.com/DallegraveNeto)