CONTRIBUIÇÕES DA TEORIA DA AÇÃO COMUNICATIVA DE HABERMAS NO USO DAS NOVAS TECNOLOGIAS DA COMUNICAÇÃO NA EDUCAÇÃO ¹ Denize da Silveira Foletto Mestranda em Educação pela UFSM/RS [email protected] ² Valmir da Silva Acadêmico Curso Pedagogia da UFSM/RS [email protected] ³ Carline Schröder Arend Acadêmica do Curso de Pedagogia da UFSM/RS [email protected] 4 Amarildo Luiz Trevisan Professor Doutor do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFSM/RS [email protected] Resumo: Estou desenvolvendo este projeto de pesquisa no qual investigo o poder formativo das novas tecnologias da informação no processo formativo do aluno. Refiro-me a estas novas tecnologias de informação, sendo as imagens culturais largamente divulgadas pela mídia, produzindo com isso, as mais diferentes formas de exclusão social. A mídia seduz a geração mais jovem com suas imagens atraentes e performáticas, formando conceitos, valores e padrões. Criar espaços para uso adequado desta nova forma de linguagem na comunidade escolar poderá trazer o cotidiano do aluno, assim como novas informações para sala de aula. O desafio para a educador, frente a este contexto, é como ajudar o educando a lidar com as informações recebidas, de modo a interpretá-las criticamente, transformando-as em conhecimentos, aplicando-as de maneira responsável e independente no seu dia-a-dia. Dessa forma, acredito que a filosofia, no processo educativo, poderá contribuir para desenvolver esse saber crítico e significativ, possibilitando ao sujeito sua emancipação. Nesse sentido, trabalhar uma abordagem hermenêutica segundo os pressupostos de Habermas, inspirada na Teoria da Ação Comunicativa, possibilitará uma interação dialógica em direção à formação da opinião pública na escola. O projeto foi estruturado a partir da consulta de várias fontes como: (Trevisan, 2002), (Pucci, 1995) (Gonçalves, 1997), (Goergen, 2004), (Freire, 1987), (Bastos, 1997), (Bannell, 2006) e (Adorno, 1995). Após realizar uma análise crítica dos materiais coletado, elaborei propostas de ações pedagógicas, as quais foram alicerçadas em pressupostos teóricos de Habermas. Estas ações aconteceriam a partir de discussões promovidas em seminários, mini-cursos, filmes, comerciais, propagandas, e palestras em sala de aula, tendo como objeto de discussão as tecnologias da comunicação apresentadas pela mídia. Neste cenário, o professor atuaria como mediador das discussões, provocando o estranhamento, o debate, a crítica e o gosto pelo conhecimento. Com meu trabalho de pesquisa acredito estar contribuindo com a educação, desenvolvendo propostas didático-pedagógicas que poderão ajudar o professor em suas praticas em sala de aula, construindo com seus alunos atividades que possam complementar as demais áreas do conhecimento. Com isso, ele poderá mostrar ao educando as possibilidades de sair de uma condição passiva diante do sistema vigente da cultura ideológica dominante, para uma condição de sujeito crítico, autônomo e humano. Palavras-chave: Filosofia e Educação, Formação, Tecnologias Considerações iniciais A escolha desse tema se deu por dois fatores: primeiro, pelo contexto que estão inseridos os pesquisadores; segundo, porque o interesse em pesquisar esse assunto não nasceu repentinamente, pelo contrário, seu processo de maturação foi lento e gradual. Quando no curso de pós-graduação fomos “apresentados” a Habermas, ficou explicito que o referido autor muito poderia contribuir para os questionamentos a respeito do papel da escola diante das demandas da sociedade atual. Quando começamos a participar do Curso Mídias na Educação, percebemos que o mesmo poderia culminar com a Teoria da Comunicação de Habermas. A inserção no Grupo de Pesquisa Formação Cultural e Hermenêutica (GPFORMA) www.ufsm.br/gpforma - também conduziu-nos, sem dúvida, a uma visão mais crítica para a educação fundamentada na proposta de Habermas. Diante desse contexto, o trabalho vem questionar a disseminação das novas tecnologias da comunicação pela mídia na sociedade, tradicionalmente comandada por ideologias dominantes e regida segundo seus próprios interesses. Elas atingem os diversos segmentos sociais de uma maneira exógena e muitas vezes distante das reais necessidades desses segmentos, gerando com isso, perturbações e exclusões sociais. Nesse sentido, penso que as bases filosóficas utilizadas para justificar o processo educativo irão influenciar positivamente a maneira como os educandos irão utilizar estas novas informações como objetos de aprendizado. Despertando-o para um pensamento crítico e reflexivo no processo de sua emancipação. Acreditamos que as novas perspectivas didático-pedagógicas, a partir das novas tecnologias da comunicação, poderá contribuir para o enriquecimento cultural e educativo da criança e do jovem no seu cotidiano familiar, escolar e social. Para isso, é necessário que o educador estabeleça uma correlação com seus alunos na troca de informações, sendo que, nesse processo o educador assuma uma postura de mediador e não de transmissor do conhecimento. A partir de uma relação intersubjetiva entre aluno/professor/escola/família/comunidade, acreditamos que os materiais produzidos pelas novas tecnologias da comunicação, poderá se tornar o eixo em torno do qual, se poderá construir o conhecimento individual e coletivo, contribuindo com o processo de emancipação da criança e do jovem. Assim, a pesquisa, pretende extrair subsídios para responder à seguinte questão: De que forma a Teoria da Ação Comunicativa de Habermas poderá contribuir para uma educação voltada às novas tecnologias da comunicação? Dessa forma, acredito que uma prática pedagógica ancorada nos pressupostos filosóficos de Habermas, tendo como princípio a teria da ação comunicativa, poderá contribuir para o desenvolvimento de um pensar crítico emancipador, em prol de uma educação voltada para a formação do sujeito emancipado, sensível e ético. Ação Comunicativa Habermas descreve em sua Teoria Crítica, a grande inquietação a respeito dos efeitos do positivismo nas sociedades modernas, onde impera uma razão técnica e instrumental, própria do capitalismo avançado. Longe de se contentar com esta abordagem, desenvolve suas pesquisas na busca sistemática de um novo entendimento de racionalidade, que se materializa através da ação comunicativa. Habermas buscou integrar conceitos da filosofia e da ciência, estudando a razão na sua mais profunda dimensão, na busca de uma maior compreensão, possibilidades e limites da racionalidade. Em sua Teoria da Ação Comunicativa, Habermas, parte do princípio de que os homens são capazes de ação, e para tanto utilizam-se da linguagem para se comunicarem com os seus pares, buscando chegar a um entendimento. Conforme as palavras de (Habermas, 1997, p.418) “Chamo ação comunicativa àquela forma de interação social em que os planos de ação dos diversos atores ficam coordenados pelo intercâmbio de atos comunicativos, fazendo, para isso, uma utilização da linguagem (ou das correspondentes manifestações extraverbais) orientada ao entendimento. À medida em que a comunicação serve ao entendimento (e não só ao exercício das influências recíprocas) pode adotar para as interações o papel de um mecanismo de coordenação da ação e com isso fazer possível a ação comunicativa”. Nesse sentido, o modelo de razão instrumental clássica é reformulado em termos da razão comunicativa, através de relações intersubjetivas, nas quais pela interação de dois ou mais sujeitos, os mesmos buscam entender-se sobre determinado assunto ou objeto, a fim de compreendê-lo. Das relações intersubjetivas é que se permite discernir a universalização dos interesses numa discussão. É exatamente neste ponto, que o fundamento de uma ética da discussão exige a reconstrução de um espaço crítico, aberto e pluralista. Desta forma, a racionalidade passa a ser vista como uma fonte inspiradora nas ações humanas, visando à emancipação dos homens e a um maior entendimento do mundo. Nesse contexto, a linguagem torna-se um ponto de destaque em sua teoria, podendo se considerar a linguagem, como toda e qualquer forma de comunicação que poderá transformar ou modificar o comportamento. Seriam todos os estímulos que o meio transmite, ou que o sujeito capta do meio, e que nos influencia de alguma maneira. A linguagem sob o ponto de vista habermasiano, é concebida como o elo de interação entre os indivíduos como forma de garantir um processo democrático nas decisões coletivas, onde através de argumentos e contra-argumentos, livres de coerções, os sujeitos buscam conseguir acordos. Razão e Racionalidade Entender a razão e a racionalidade envolve questões que remontam aos problemas do próprio ser humano, no sentido de buscar um fundamento que explique sucintamente o sistema complexo do qual fazemos parte. Assim, apesar desta abrangência, tentar-se-á centralizar esforços no resgate da compreensão destes conceitos, à luz da Teoria da Ação Comunicativa. De acordo com as palavras do próprio (Habermas, 1997, p. 506) “a teoria da ação comunicativa se propõe a investigar a razão inscrita na própria prática comunicativa cotidiana e reconstruir a partir da base de validez da fala um conceito não reduzido de razão”. Mas afinal, o que poderíamos conceituar como sendo razão? O conceito de razão para Habermas apoia-se na linguagem, na expressão dialógica que se concretiza pela relação entre os sujeitos que estabelecem uma discussão. Nessa mesma linha de pensamento outro autor posicionasse favoravelmente a habermas, (Pinent, 1995, p. 37), a firma que: “A conceituação de razão, o claro entendimento do que seja razão, para Habermas é de fundamental importância. Se em Kant a razão é subjetiva, inata, transcendental, e se em Popper ela é objetiva, em Habermas ela é comunicativa, dialógica. Se para o positivismo ela é a capacidade de manipular corretamente regras formais, para a ação comunicativa ela é a capacidade de dialogar seguindo a lógica do melhor argumento”. (Pinent, 1995, p. 37). A racionalidade possui uma relação muito estreita com o saber, e ao fato de sermos ou não racionais, o próprio Habermas nos fornece alguns exemplos esclarecedores, de pessoas que podem ser mais ou menos racionais, de acordo com suas atitudes e ações, pois incorporam um saber. (Habermas, 1987a, p.24) nos diz que “podemos nomear como “racionais” os homens e as mulheres, as crianças e os adultos, os ministros e os cobradores de ônibus, mas não os peixes, as montanhas, as estradas ou as escolas. Podemos nomear de ‘irracionais’ os atrasos, as desculpas, as intervenções cirúrgicas, as declarações de guerra, mas não o mau tempo, uma doença ou um ganho na loteria”. Para ele, a racionalidade tem menos a ver com o conhecimento e a produção de saberes, do que com o modo como os sujeitos capazes de linguagem e de ação fazem uso ou aplicam seus saberes. Segundo o autor, existem dois tipos de racionalidade, as quais seguem direções distintas: a racionalidade cognitivo-instrumental, em que as ações do sujeito são de relações de domínio sobre a natureza e os sujeitos, visando a manipulação instrumental, e a racionalidade comunicativa em que as ações do sujeito são de relações com os outros sujeitos, visando ao entendimento comunicacional. Continuando, a racionalidade cognitivoinstrumental ou razão instrumental caracteriza-se pelo distanciamento entre o sujeito e o objeto, por um sujeito tipicamente solitário, que visa a operação lógica dos conhecimentos, numa atitude calculista e metódica. Nesse sentido, como ela é parcial, preestabelecida, pronta, absoluta e auto-suficiente, ela por si se justifica e se perpetua. O grupo dominante aproveita esta visão parcial para reforçar suas idéias e impor sua dominação. Para Habermas, a razão comunicativa faz parte do mundo vivido, o qual é formado por símbolos que nascem a todo o momento das interações e vivências entre os sujeitos, e que são transmitidos de gerações a gerações pela atividade comunicacional. Assim, a razão comunicativa pode propiciar um auto-conhecimento, fruto da liberdade e entendimento alcançados através das condições de uma socialização comunicativa dos indivíduos. O mundo da vida e o mundo do sistema, segundo Habermas, é o objetivo do próximo item, de forma a buscar compreender suas particularidades e relações. O Mundo da Vida e o Mundo do Sistema A teoria crítica da sociedade é entendida e subdividida por Habermas em dois grandes mundos, quais sejam: o Mundo do Sistema e o Mundo da Vida. O Mundo do Sistema pode ser considerado como o mundo formal, das regras, das leis, das normas, etc, ou seja, um mundo “artificial” criado pelo próprio homem visando ao êxito e ao domínio sobre a natureza. Ele se reflete na organização da sociedade, na educação, na abordagem científica, etc. O Mundo do Sistema tenta controlar o Mundo da Vida. Isso gera muitas vezes um distanciamento entre o mundo do sistema (leis, regras e ações planejadas) e o mundo da vida (necessidades reais dos sujeitos, seus sentimentos e percepções), gerando problemas tais como: insatisfação, miséria, submissão e violência. Dessa forma, é o mundo da vida que contribui para que os sujeitos cheguem a um entendimento. Considerações finais Acredito que por educação, entende se todo um processo de formação, construção e reconstrução permanente dos sujeitos. A educação, nesta perspectiva, seria um processo contínuo e dinâmico, onde através da interação o indivíduo possa interagir com o outro na construção de seu conhecimento. Essa construção e reconstrução do conhecimento, constitui uma educação que leva em conta o outro como sujeito. A educação pode até ser negligenciada pelo Estado, escolas, professores, pais e comunidade, mas é a partir dela que se busca a revolução do homem como sujeito. No entanto, os discursos a favor de uma educação para todos visando uma sociedade mais justa e igualitária não se concretizam só com teorias e planos políticos, o comprometimento de cada um, independente de ser aluno, pai, professor, político cidadão etc. é indispensável para alcançarmos o mínimo de dignidade, solidariedade, humanidade, seja na escola, no trabalho, no lar de cada família, no convívio social etc. Mas enquanto as instituições sejam elas: família, escola, políticas etc. continuarem reforçando a hegemonia ideológica dominante, excluindo cada vez mais os sujeitos, principalmente os das classes sociais menos favorecidas, o ideal de humanidade sadia se afastará cada vez mais do alcance das instituições de ensino e da sociedade. Diante deste olhar crítico, Habermas nos fornece margens para interpretarmos, em sua Teoria da Ação Comunicativa, que seria possível construir uma nova e democrática estrutura nos atuais sistemas de ensino, buscando basicamente uma conciliação entre os dois mundos: o mundo do sistema e o mundo da vida, onde a teoria e a prática estariam interligadas através de ações concretas, numa dinâmica de interação entre os atores envolvidos visando a novas racionalidades. Nesse sentido, as novas tecnologias de comunicação, poderão contribuir significativamente com o processo de desenvolvimento e emancipação do aluno a partir de uma interpretação e análise critica dos fenômenos culturais do seu dia-a-dia. Levando-os a propensão de uma prática do saber construtivo à sua vida, assim como na construção de uma sociedade sadia. Nesse processo interpretativo crítico, o educador e os educandos buscariam, a partir da razão, encontrar o equilíbrio das coisas, ou seja, o uso racional daquilo que se pré-estabelece como certo, errado, bom, ruim, melhor, pior, etc. Levando em consideração tais mudanças, a escola não poderá permanecer indiferente a este paradigma, assim como às necessidades do educando em lidar com estes fenômenos. É necessário continuar desenvolvendo alternativas pedagógicas que venha orientar uma ação educacional para o despertar crítico, reflexivo e independente do aluno. A utilização destas tecnologias da comunicação pode ser uma alternativa para que o educador, no espaço escolar, desenvolva juntamente com seus alunos, atividades de interpretação, reinterpretarão das diversas informações largamente difundidas pelos meios de comunicação. Com este trabalho, o professor pode passar da condição de transmissor de informação a mediador, proporcionando dessa maneira ao educando, o desenvolvimento de concepções críticas da realidade, assim como do seu cotidiano, entendendo o mundo e as coisas que o rodeia. REFERENCIAL TEÓRICO BANNELL, Ralph Ings. Habermas & a Educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2006. BASTOS, João Augusto S.L.A. Educação e tecnologia. Educação & Tecnologia. Curitiba, n. 1. P.05-29, julho, 1997. FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 17ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987. GOERGEN, Pedro. Teoria da ação comunicativa e práxis pedagógica. In: DALBOSCO, Cláudio A; TROMBETTA, Gerson Luís; LONGHI, Solange M. (Org.). Sobre filosofia e educação: subjetividade e intersubjetividade na fundamentação da práxis pedagógica. Passo Fundo: UPF, 2004. GONÇALVES, Maria Augusta Salin. Teoria da ação comunicativa de Habermas: possibilidades de uma ação educativa de cunho interdisciplinar na escola. Educação & Sociedade. 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