Revista da Unifebe (Online) 2012; 11 (dez):106-114
ISSN 2177-742X
Artigo Original
A SEPARAÇÃO DE PODERES E A EVOLUÇÃO DOS JULGAMENTOS DO
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL EM MANDADO DE INJUNÇÃO1
THE SEPARATION OF POWERS AND THE EVOLUTION OF JUDGMENTS OF THE
SUPREME COURT IN FEDERAL WRIT OF INJUNCTION
Jefferson Barros Barbosa2
RESUMO
Busca-se, no presente trabalho, tratar da Separação dos Poderes frente ao instituto jurídico
do Mandado de Injunção, haja vista ser esse instituto de criação nacional, e o Supremo
Tribunal Federal, após longos anos de “comodismo” alterou seu entendimento sobre a
eficácia da decisão do Mandado de Injunção. Apresentar-se-á que a Separação de Poderes
de longa data é mais formal do que real, e que a Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988, reconheceu expressamente a mora legislativa, e deslocou para o Poder
Judiciário um Ativismo maior do que aos demais poderes, Ativismo esse incompreendido
pelos aplicadores do direito. Restará demonstrada que essa nova ordem deve ser sopesada e
sempre com o fim declarado na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e de
efetividade dos direitos constitucionais.
PALAVRAS-CHAVE: Ativismo Judicial, Mandado de Injunção, Separação dos Poderes.
ABSTRACT
Looking up, in the present work, dealing with the Separation of Powers against the legal
institution of the Writ of Injunction, given that this is national institute of creation, and the
National Supreme Court, after long years of "settling" changed your understanding of the
effectiveness of Writ of Injunction decision. Present will be the Separation of Powers longtime
is more formal than real, and that the Federal Constitution of 1988 expressly recognized the
lives legislative, and the judiciary shifted to one Activism larger than the other powers,
Activism this misunderstood by law enforcers. Remain demonstrated that this new order must
be weighed and always with the purpose stated in the Federal Constitution of 1988 and the
effectiveness of constitutional rights.
KEYWORDS: Judicial Activism, Writ of Injunction, Separation of Powers.
INTRODUÇÃO
O presente texto é um modesto exercício, na tentativa de responder que o atual Ativismo
Judicial é constitucional, sendo que a obrigação do Poder Judicial é dar vazão à histórica mora
legislativa em relação à Sociedade.
Passadas quase duas décadas e meia da promulgação da Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988, irá tratar o presente trabalho sobre a separação de poderes entre
1 Artigo escrito para cumprir exigência da disciplina Fundamentos da Percepção Jurídica, ministrada pelo Prof.
Dr. Cesar Luiz Pasold, no Mestrado em Ciência Jurídica da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.
2
Mestrando do curso de Mestrado em Ciência Jurídica da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI.
o legislativo, o executivo e o judiciário, bem como o encargo ao judiciário para resolver a
mora do poder legislativo, no sentido de regulamentar direitos contidos, na então criada
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
Sob esse prisma, irá ser tecidas considerações ainda sobre o Mandado de Injunção,
demonstrando uma mudança de posicionamento do poder judiciário através do Supremo
Tribunal Federal, no sentido de evolução de sua atuação no campo do Mandado de Injunção,
ou seja, um ativismo judicial com previsão constitucional e sendo um direito constitucional
individual.
O mandado de injunção é instituto constitucional posto à disposição da pessoa que se
sentir prejudicada/lesada pela falta de norma regulamentadora que torne inviável o exercício
dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à
soberania e à cidadania (CF, art. 5º, LXXI). Tem como desiderato, a proteção de quaisquer
direitos e liberdades constitucionais, individuais ou coletivos, de pessoa física ou jurídica,
inviabilizados pela inércia do Poder Legislativo e Executivo, de modo a conferir imediata
aplicabilidade à norma constitucional, conferindo, também, efetividade ao texto esculpido no
art. 5º, §1º da Lei Maior.
No início, pós 1988, as decisões em matéria de Mandado de Injunção do Supremo
Tribunal Federal eram no sentido de declarar a mora legislativa. Depois, declarar a mora e
conceder prazo para essa mora ser sanada, e agora, reconhecer a mora e dar resolução
normativa perseguida.
Verifica-se assim uma nova postura hermenêutica adotada pelo Supremo Tribunal Federal
no tocante aos efeitos da decisão do mandando de injunção.
Dentro desta moldura, passa-se à árdua tarefa de, em poucas páginas, analisar as alterações
por que passou o instituto jurídico do Mandado de Injunção e sua relação com a separação dos
poderes.
O mandado de injunção, na atual conjectura do poder legislativo, é taboa de salvação para
efetividade da Constituição federal de 1988 e do Estado Democrático de Direito no Brasil,
devendo inclusive ser feita uma releitura do ativismo judicial, visto estar expresso na
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, ser do Poder Judiciário essa
incumbência. Será utilizado o método indutivo e de pesquisa bibliográfica, principalmente
com pesquisa de doutrina nacional e estrangeira.
1 SEPARAÇÃO DOS PODERES
Ives Gandra da Silva Martins3 informa que:
Desde 1891 e pelas demais Constituições (34, 37, 46 e a atual de 67, com suas 25
emendas), o país hospeda o exercício do poder pela fórmula montesquiana. São três os
poderes nacionais, a saber, pela ordem de indicação da lei maior, o Poder Legislativo, o
Executivo e o Judiciário.
Na sistemática da atual Constituição de 1988, essa separação de poderes ainda existe. O
artigo 2º da Carta Magna de 1988 informa, São Poderes da União, independentes e
harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
E mais, no preambulo da atual Constituição de 1988, essa informa:
3
MARTINS, Ives Gandra da Silva. A Separação dos Poderes no Brasil. São Paulo: Instituto dos Advogados
de São Paulo. 1985, p. 51.
107
Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para
instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e
individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a
justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos,
fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a
solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte
CONSTITUIÇÃ O DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.
Percebe-se que a atual Constituição da República Federativa do Brasil, confeccionada
pelos Representantes do Povo, tem como base assegurar o exercício dos direitos sociais e
individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça
como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na
harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica
das controvérsias.
A lei é no atual ordenamento jurídico o caminho e a dimensão para fazer valer esses
direitos reconhecidos na Lei Maior de 1988. Todavia, quando essa lei não existe por mora do
Poder Legislativo e Executivo, pode ser invocado o Mandado de Injunção para dar efetividade
à falta legal, ou seja, socorre-se ao Poder Judiciário. É a atuação do Poder Judiciário, suprindo
a etapa política.
Nesse sentido, e para delimitar os campos temáticos, o professor da USP, Elival da Silva
Ramos conceitua “ativismo judicial”:
[...] por ativismo judicial deve-se entender o exercício da função jurisdicional para além dos
limites impostos pelo próprio ordenamento que incumbe, institucionalmente, ao Poder
Judiciário fazer atuar, resolvendo litígios de feições subjetivas (conflitos de interesses) e
controvérsias jurídicas de natureza objetiva (conflitos normativos). Há, como visto, uma
sinalização claramente negativa no
tocante as práticas ativistas, por importarem na desnaturação da atividade típica do Poder
Judiciário, em detrimento dos demais Poderes 4 .
E mais, para esse autor, o Poder Legislativo é o mais atingido diante de práticas judiciais
ativistas5 .
O que se tem ainda que levar em consideração, é que o Estado antes de ser de Direito é de
política, de democracia. Neste sentido a melhor expressão para designar o Estado de Direito é
Estado Democrático de Direito, e não Estado de Direito Democrático6 . É a democracia como
fundamento (governo do povo), finalidade (e para o povo) e funcionamento (governo pelo
povo) e que define o direito em nosso sistema jurídico.
Assim, o juiz fica adstrito ao cumprimento da lei. Não esquecemos os velhos, mas sábios
ensinamentos de Montesquieu de que o juiz é a bouche de la loi7 .
O ativismo judicial passa por este ponto, ou seja, o juiz nesse momento deixa a esfera de
atuação – poder judiciário, e adentra para resolver o caso proposto, na esfera do legislativo,
sem contudo realmente decidir de forma erga omines, como ocorre quando da criação de
4
RAMOS, Elival da Silva. Ativismo Judicial: parâmetros dogmáticos. São Paulo: Saraiva. 2010. p. 129
5
RAMOS, Elival da Silva. Ativismo Judicial: parâmetros dogmáticos. São Paulo: Saraiva. 2010. p. 129
6
GOMES CANOTILHO, J. J. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 6 ed.,
2002, p. 98.
7
MONTESQUIEU. O espírito das leis. Apresentação Renato Janine Ribeiro; tradução Cristina Murachco. 3. ed.
São Paulo: Martins Fontes, 2005, Livro XI, passim.
108
determinada lei. Assim, por lado indireto, acaba ainda por “resolver” naquele caso, problemas
políticos por critérios jurídicos.
A atuação atual do Poder Judiciário é sentido como crise da teoria da separação dos
poderes, ou esse Ativismo judicial, reconhecido expressamente na Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988, é na verdade, uma outra responsabilidade do Poder Judiciário e
que não demonstra crise da separação dos poderes e sim, um amadurecimento do Estado
Democrático brasileiro.
Nesse sentido, Norberto Bobbio8 informa:
Reúno neste pequeno volume alguns escritos dos últimos anos sobre as chamadas
“transformações” da democracia. Uso o termo “transformação” em sentido axiologicamente
neutro, sem associar a ele nem um significado negativo nem um significado positivo.
Prefiro falar de transformação, e não de crise, porque “crise” nos faz pensar num colapso
iminente.
E Norberto Bobbio continua9 “Para um regime democrático, o estar em transformação é
seu estado natural: a democracia é dinâmica, o despotismo é estático e sempre igual a si
mesmo”.
Essas são questões que devem ser entendidas para uma melhor compreensão do tema, ante
a atual interpretação do Mandado de Injunção.
2 MANDADO DE INJUNÇÃO
Osvaldo Ferreira de Melo10 declara que,
A prescrição de determinada conduta humana, com caráter bilateral atributivo, tutela estatal
e adequada posição geométrica no sistema, apresenta-se, numa visão positivista, como a
norma por excelência.
Quando a cultura jurídica de uma nação, como é o caso do Brasil, absorve a tradição do
Direito escrito e codificado, as tarefas político-jurídico estarão voltadas imediatamente para
análise axiológica do Direito posto ou para a proposição de normas positivas.
Com essas palavras de Melo, percebe-se a importância da norma escrita no nosso
ordenamento jurídico. A nossa opção foi por ter leis escritas, e sem maiores divagações, e
levando-se em consideração a realidade da época da Assembleia Constituinte, bem como em
relação a nossa atual realidade democrática, pode-se afirmar que bom que temos tantas leis
regulando as mais diversas relações do homem e do Estado, ou seja, nosso sistema normativo
é analítico e não sintético por necessidade.
Agora, e quando falta norma, como o cidadão poderá fazer valer o seu direito. Essa falta
de norma é somente do nosso atual sistema legal desde 1988, ou antes, também havia essa
falta de leis? E, uma vez constatada essa falta de lei, qual o mecanismo que se pode utilizar
para se ter essa norma legal.
8
Bobbio, Norberto. O Futuro da Democracia. (tradução de Marco Aurélio Nogueira). São Paulo: Paz e Terra,
2011, p.19.
9
Bobbio, Norberto. O Futuro da Democracia. (tradução de Marco Aurélio Nogueira). São Paulo: Paz e Terra,
2011, p.19.
10
MELO, Osvaldo Ferreira de. Temas atuais de Política do Direito. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris,
1998.
109
Para responder a essas indagações, tem-se:
Até o advento da nova Carta Constitucional de 1988, quem, para entrar no exercício de
algum direito, estivesse dependendo de alguma regulamentação, mormente do Poder
Legislativo, nada podia fazer, porque enquanto uma norma está pe ndente de ato
regulamentador, não produz efeitos. E não produz porque o pensamento de quem a criou
ainda não está devidamente esclarecido, porque não a pôs em conformidade com toda a sua
reflexão.
Com essas palavras de Ulderico Pires dos Santos11 imaginasse que não havia no
ordenamento jurídico anterior à Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,
meios de contrapor a ineficiência do Poder Legislativo, visto ser deste Poder a competência
oficial por “criar” as leis que a sociedade necessita no seu determinado tempo histórico.
Todavia, esse pensamento não é verdadeiro. Ives Gandra da Silva Martins12 , em 1985,
quando vigente a Constituição de 1967, na obra “A Separação dos Poderes no Brasil” já
informava que outro Poder, além do Legislativo podia criar “leis”:
Por todo o exposto – e são apenas algumas das deficiências da lei maior que anotamos –
verifica-se que não obstante ser o Poder Legislativo o primeiro dos poderes na enunciação
constitucional, por representar o povo, o Presidente da República, no Brasil, é, entretanto,
mais legislador que o Poder Legislativo, posto que possui privilégios de legislador que o
legislador não possui.
Tal hipertrofia faz com que a conclamada separação de poderes no país seja mais formal
que real. A nosso ver, grande parte dos descompassos sociais, políticos e econômicos que
vivemos, nos últimos 20 anos, deveu-se à hipertrofia do Poder Executivo.
Um dado que Ives Gandra da Silva Martins13 informa demostra que o Poder Legislativo de
longa data não detinha total competência para criar leis, sendo que outros poderes exerciam
mais efetivamente essa obrigação, veja-se:
No denominado período revolucionário, o Presidente da República exerceu, sem qualquer
constrangimento, seu direito de legislar, reduzindo o Poder Legislativo até o advento da
“nova República”, a mera Casa de tertúlias acadêmicas. Emitiu mais de 2.000 decretos -leis
sobre todos os assuntos, desde matéria tributária até locações civis, empréstimos, salários,
previdências, etc.
Confirma-se ainda, que a separação dos poderes de longa data era mais formal do que real.
Nessa esteira de separação de poderes, sinteticamente falando, pode-se dizer que o Poder
Legislativo é o responsável por criar as Leis, o Poder Executivo, executa as politicas públicas
firmadas nas Leis e o Poder Judiciário, controla a legalidade de referidas Leis.
Ocorre que, diferentemente do que até então se encontrava nas demais Constituições do
Brasil, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, no artigo 5º, inciso LXXI,
declara ser direito e garantia fundamental, “conceder-se-á mandado de injunção sempre que a
11
Ulderico Pires dos Santos. Mandado de Injunção estudos e considerações. São Paulo: Paumape S.A., 1988,
p. 13.
12
Ives Gandra da Silva Martins. A Separação dos Poderes no Brasil. Brasília: São Paulo: Instituto dos
Advogados de São Paulo. 1985, p. 56.
13
Ives Gandra da Silva Martins. A Separação dos Poderes no Brasil. Brasília: São Paulo: Instituto dos
Advogados de São Paulo. 1985, p. 53.
110
falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades
constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania ”.
Percebe-se que a nova Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, prevê uma
saída no caso de ineficiência do poder legislativo. Essa saída é no atual ordenamento jurídico
e Estado Democrático de Direito, desempenhado pelo Poder Judiciário através do Mandado
de Injunção.
Mas essa “saída” constitucional já não seria o próprio reconhecimento de que a divisão de
poderes não estaria mais tão forte assim, e mais, não seria o reconhecimento de que o Poder
Legislativo é ineficiente no sentido de criar leis na velocidade que a sociedade clama,
necessitando inclusive de reformas/mudanças.
Em outras palavras, o poder constituinte da nova Constituição de 1988, já sabedor de que
a celebre divisão dos poderes é mais formal do que real, reconhece a ineficiência do poder
legislativo, inserindo na Constituição de 1988 mecanismo denominado de Mandado de
Injunção, como meio de controle dessa ineficiência do poder legislativo.
Com o advento da Carta Magna de 1988, entra em evidência o Poder Judiciário através do
Mandado de Injunção, para reconhecer e resolver a mora legislativa em relação a determinado
direito.
A origem desse novo instituto não é uníssona na doutrina, tendo os que alegam ter origens
no sistema norte-americano e outros no sistema da Inglaterra. Todavia, na sua forma como no
Brasil foi criada é único.
Nas palavras de Roberto Augusto Castellanos Pfeiffer14 tem-se:
O mandado de injunção é criação original do direito brasileiro, sem precedentes no direito
comparado. Insere-se, ao lado do mandado de segurança, do habeas corpus e do habeas
data, bem como da ação direito de inconstitucionalidade, no sistema constitucional de
proteção dos direitos e liberdades fundamentais violados, ou ameaçados de violação, por
atos ou omissões do Poder Público. Apresenta-se como remédio para uma notória
modalidade de obstrução da eficácia das normas constitucionais e infraconstitucionais: a
omissão no exercício do poder de criar, para as normas que não sejam auto -aplicáveis, a
regulamentação de que dependem para que se tornem plenamente aplicáveis.
Essa criação brasileira não foi a primeira tentativa de fiscalizar a ineficiência do poder
legislativo, outros Estados já tinham criado a sua própria forma. Roberto Augusto Castellanos
Pfeiffer15 ainda informa:
Assim, constitui relevantíssima inovação, no contexto internacional, a previsão de ação
direta de inconstitucionalidade por omissão nas Constituições da Iugoslávia (1974) e de
Portugal (1976).
No Brasil, durante a Assembléia Nacional Constituinte, refletindo a preocupação da
doutrina e dos movimentos organizados da sociedade em evitar a perpetuação da ausência
de controle sobre a inércia regulamentadora, foram estatuídos dois institutos jurisdicionais
para o controle da omissão normativa: a ação de inconstitucionalidade por omiss ão, que
guarda similitude com o instrumento previsto nas duas Constituições assinaladas, e o
mandado de injunção, que a nosso ver, é uma inovação, já que não existe qualquer outro
remédio idêntico no direito comparado. Foi, igualmente, inserido um mecanismo político: a
iniciativa popular para a apresentação de projetos de lei.
14
Roberto Augusto Castellanos Pfeiffer. Mandado de Injunção. São Paulo: Atlas. 1999, p. 11.
15
Roberto Augusto Castellanos Pfeiffer. Mandado de Injunção. São Paulo: Atlas. 1999, p. 19.
111
Mas o que vem a ser esse Mandado de Injunção. O conceito de Mandado de Injunção pode
ser assim entendido segundo o Supremo Tribunal Federal:16
Mandado de injunção
Descrição do Verbete:
(MI) Processo que pede a regulamentação de uma norma da Constituição, quando os
Poderes competentes não o fizeram. O pedido é feito para garantir o direito de alguém
prejudicado pela omissão.
Já o termo Injunção segundo Ulderico Pires dos Santos17 é entendido como:
Injunção é ordem formal, cogente. Sua força é mandamental, imperativa e determinante no
sentido de que alguém faça ou deixe de fazer alguma coisa por determinação da autoridade
judiciária. É pois, um praeceptum de faciendo ou praeceptum de non faciendo de ordem
constitucional contra atos dos Poderes Legislativo e Executivo e até mesmo contra os do
Poder Judiciário.
Com as informações acima declaradas, e visando a efetividade da norma constitucional,
outra alternativa não possui determinada pessoa a não ser socorrer-se do judiciário para dar
efetividade à norma constitucional envolvida na mora legislativa.
Konrad Hesse18 informa sobre efetividade Constitucional:
A Constituição não configura apenas expressão de um ser, mas também de um dever ser.
Assim, ela procura imprimir ordem e conformação à realidade política e social.
Desse modo, a Constituição jurídica e a Constituição real estão em relação de coordenação,
condiciona-se mutuamente, mas não dependem uma da outra. Assim, não há comando
constitucional donde não se pode extrair uma norma para o caso concreto.
Com o passar dos anos após a promulgação da Constituição de 1988, a mora legislativa já
vinha sendo reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal, a exemplo do julgamento dos
Mandados de Injunção n. 20/DF (22.11.1996), 585/TO (02.08.2002) e 485/MT (DJ
23.08.2002). Todavia essa mora era reconhecida e declarada, já que não pode o Supremo
Tribunal Federal praticar qualquer medida para obrigar o Poder Legislativo a regulamentar tal
matéria, pois aí sim não se poderia falar em poderes harmônicos e independentes.
José Carlos Barbosa Moreira19 discorre sobre esse primeiro momento de passividade do
Poder Judiciário:
O melhor modo de compreender o remédio processual é aquele que leve a atribuir-lhe o
máximo possível de eficácia. Conceber o mandado de injunção como simples meio de
apurar a inexistência da norma regulamentadora e comunicá-la ao órgão competente para a
edição (o qual, diga-se entre parêntese, presumivelmente conhece mais do que ninguém
suas próprias omissões) é reduzir a inovação a um sino sem badalo. Afinal, para dar ciência
de algo a quem quer que seja, servia – e bastava – a boa e velha notificação (...). Não se
figura crível, com efeito, que a Constituição haja querido fazer uma coisa só de dois
instrumentos que forjou separadamente: um deles, é óbvio, estaria sobrando. A assimilação
16
http://www.stf.jus.br/portal/glossario/verVerbete.asp?letra=M&id=188. Acessado em: 02/07/2012.
17
Ulderico Pires dos Santos. Mandado de Injunção estudos e considerações , São Paulo: Ed. Paumape S.A.
1988, p. 14.
18
HESSE, Konrad. A força Normativa da Constituição. Porto Alegre: Sergio Antônio Fabris Editor, 1991. p.
40.
19
José Carlos Barbosa Moreira, O novo Processo Civil brasileiro. São Paulo: Forense. 2007, p, 129-130.
112
mostra-se descabida e funesta; despoja de individualidade o mandado de injunção e subtrailhe toda e qualquer possibilidade de frutificar. Sejamos sinceros: quem sairá dos seus
cuidados para requerer providência tão inócua? A prevalecer esse entendimento, como há
motivos para temer que aconteça, mais valerá que (na primeira reforma constitucional) se
suprima pura e simplesmente o inciso LXXI do art. 5º. O mandado de injunção, porém,
merece sorte melhor que essa morte precoce e inglória. Não será tempo, ainda, de salvá-lo?
A última palavra, naturalmente caberá ao legislador, que mais cedo ou mais tarde terá que
regula a matéria. Enquanto isso, é de desejar que ninguém assuma, para com o instituto de
tão interessantes potencialidades, o triste papel de coveiro apressado.
A mudança de interpretação por parte do Supremo Tribunal Federal em relação ao
Mandado de Injunção começa a mudar com o julgamento do MI n. 232-1-RJ que versava
sobre a ausência de regulação na hipótese normativa do art. 195 §7º da CF/88. Passou o STF
além de reconhecer a mora legislativa a dar eficácia no sentido de estipular um prazo para a
elaboração da norma faltante, sob pena de ter ao impetrante o reconhecimento do direito
subjetivo pendente de regulamentação.
Já com o MI 689/PA, julgado em 2007, além de reconhecer a mora legislativa, o STF
inovou, utilizando pela primeira vez, o que já era de direito seu nesse campo, ou seja, além de
decidir o caso proposto no sentido de declarar a mora legislativa, resolveu o tema proposto e
não mais simplesmente declarando.
No julgamento do MI n. 712-PA que se proferiu a última guinada para a atual concepção
dos efeitos advindos do julgamento do mandado de injunção. A tese desenvolvida por Marco
Aurélio Mello teve guarida nos votos dos Ministros Gilmar Ferreira Mendes e Eros Grau
(relator) que, para além de declarar a omissão legislativa, veem no mandado de injunção via
adequada para autorizar o exercício imediato do direito inviabilizado pela ausência de norma
regulamentadora, podendo inclusive se utilizar de norma existente em outro microssistema,
para efetivar direito em microssistema diverso.
O exemplo se mostra mais visível no caso de aposentadoria especial de servidores
públicos, visto que o artigo 40, § 4º, da Constituição de 1988, que exige lei complementar
para regular a matéria e que ainda não possui, sendo que, sem a edição dessa lei, a
Administração não pode agir. Todavia o STF determina utilizar o teor da Lei 8.213/91
(trabalhadores da iniciativa privada) para o servidor público que se enquadre em referida
condição, aposentando-se especialmente, se em contato com agentes insalubres.
Com esse encontro do caminho, primeiro pelo cidadão através do Mandado de Injunção, e
segundo pelo próprio Poder Judiciário, através do Ativismo Judicial encarado nos julgamento
de Mandado de Injunção, é previsível que o Judiciário seja acionado cada vez mais pela
sociedade e assim, acabe por deflagrar uma transformação entre os poderes, sem causar a tão
falada crise, pois o mau funcionamento e a falta de credibilidade dos Poderes, Legislativo e do
Executivo é histórica e delimitada constitucionalmente, ou seja, o Poder Judiciário que muitos
pregam que se agigantou sobre os outros poderes, na verdade vem se redescobrindo, no
sentido de que a atual Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 lhe incumbiu
de frear o ímpeto dos poderes legislativos e executivo, bem como na falta desses, resolver os
anseios da população.
O que se percebe, é que o Ativismo Judicial somente ocorre quando há mora legislativa ou
executiva, pois do contrário, o Poder Judiciário não é acionado a resolver determinada
situação.
Com essas singelas palavras, percebe-se que a separação dos poderes continua existindo
de forma harmônica entre si, todavia com uma leitura nova e necessária.
113
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
As considerações que foram exercitadas neste texto são iniciais. Buscou-se nesse estudo,
de uma forma simples, apresentar que a separação dos poderes é mais formal do que real, mas
que essa separação real não implica em crise da separação dos poderes, e sim uma visão nova
do sistema com foco que na atual Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, é
do poder judiciário a obrigação de declarar a mora legislativa e também de solucioná-la ante
ao anseio do individuo e da Sociedade.
O trabalho apresentou ainda que, inobstante outros entendimentos, o instituto do Mandado
de Injunção é criação brasileira, sendo que esse instituto é indicativo da morosidade do poder
legislativo e executivo em regulamentar os direitos e garantias inseridos na nova constituição
de 1988.
Ainda, foi informado que no início, as decisões do Supremo Tribunal Federal foram
tímidas, simplesmente reconhecendo a mora legislativa, tendo o STF, todavia, sensivelmente
a partir de 2007, mudado sua atuação, no sentido de efetivamente garantir às pessoas, os
direitos e garantias constitucionais ainda passíveis de regulamentação normativa.
REFERÊNCIAS
GOMES CANOTILHO, J. J. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra:
Almedina, 6 ed., 2002.
HESSE, Konrad. A força Normativa da Constituição. Tradução de Gilmar Ferreira
Mendes. Porto Alegre: Sergio Antônio Fabris Editor, 1991. Título original: Grundzüge des
Verfassungsrecht der Bundesrepublik Deutschland.
MARTINS, Ives Gandra da Silva. A Separação dos Poderes no Brasil. Brasília. Instituto
dos Advogados de São Paulo: 1985.
MELO, Osvaldo Ferreira de. Temas atuais de Política do Direito. Sergio Antonio Fabris,
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PFEIFFER, Roberto Augusto Castellanos. Mandado de Injunção. Atlas. São Paulo: 1999.
QUARESMA, Regina. O Mandado de Injunção e a Ação de Inconstitucionalidade por
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RAMOS, Elival da Silva. Ativismo Judicial: parâmetros dogmáticos. Saraiva. São Paulo:
2010.
SANTOS, Ulderico Pires dos. Mandado de Injunção estudos e considerações. Paumape
S.A. São Paulo: 1988.
114
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