O Ministério Instituição. Público. Considerações constitucionais básicas acerta da Obs: Comentários a serem intriduzidos futuramente na nova edição do livro intitulado “Comentários à Constituição – Editora Ferreira.” Capítulo IV DAS FUNÇÕES ESSENCIAIS À JUSTIÇA Seção I Do Ministério Público Art.127 O Ministério Público é instituição1,2,3 permanente4, essencial5 à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. 1-Não é fácil conceituar em poucas palavras o órgão denominado Ministério Público. Tendo em vista a sua saudável presença em todo aparelho estatal, com atuações de inequívoca importância para o bom funcionamento da administração geral do Estado (legislativa, executiva e jurisdicional), torna-se ousada a pretensão de definir por completo a extensão e profundidade deste órgão. Certo é que sua presença no sistema orgânico do Estado revela-se indispensável para manter o Regime Democrático e o Estado de Direito em perfeita composição e harmonia. Considerando o fato de que a materialização da atividade funcional deste órgão se opera por meio da função jurisdicional do Estado, função esta que tem por escopo maior a efetividade da Justiça, fazemos nossa as palavras de José Cretella Junior, que em comentário a este mesmo dispositivo, em obra de meticulosa e invejável dedicação (Comentários à Constituição 1988-Forense), declina “ausente este órgão, a Justiça não se faz de modo completo.” Evidentemente, não estamos dizendo que com estas palavras o Ministério Público se vê investido da função jurisdicional do Estado, mas que ele é indispensável a ela. Aliás, queremos até mais! Nossa pretensão é louvar a presença deste órgão, pois ele não só zela pela função jurisdicional do Estado, como cuida da própria saúde geral do Estado. Seja nas vestes de Estado-juiz, Estado-administração ou Estado-legislador, o Estado em si mesmo considerado não opera com o adequado equilíbrio sem a presença do Ministério Público. O ministério real desta instituição transcende os limites da função jurisdicional do Estado, embora por meio dela cristalize da forma mais eficaz a sua real vocação. Talvez por isso tenha merecido estar topograficamente localizado no Título IV da Lex Mater, dedicado à “Organização dos Poderes”, embora, sabidamente, não ostente genuinamente esta condição. 2-Qual a natureza jurídico-constitucional do Ministério Público? A primeira indagação, mais inquietante, vem aguçando os doutrinadores a encontrar uma explicação, um argumento, um raciocínio que encerre a discussão em torno da posição constitucional do Ministério Público. Seria ele um órgão vinculado ao Executivo ou ao Judiciário, ou mesmo ao Legislativo, ou então, seria ele um quarto Poder? Queremos registrar que no Direito brasileiro, considerando o regime constitucional vigente, o Ministério Público é órgão vinculado ao Poder Executivo, sem, contudo, manter com esse Poder uma relação jurídica de subordinação. Vamos tecer, primeiramente, uma consideração básica, para, em seguida, aprofundarmos um pouquinho mais o tema da posição e natureza jurídicoconstitucional do Ministério Público. Esclareça-se que o título “Ministério” não faz do Ministério Público órgão ministerial de assessoramento direto do Presidente da República. De certo que o Poder Executivo FEDERAL se vê auxiliado pelos diversos ministérios que compõem o primeiro escalão daquele Poder. Mas isso não tem nada a var com o Ministério Público, cujo mister se projeta para outros fins. Sua função não é a de assessoramento governamental. Não se vincula temporalmente a um determinado governo (mandato político) e territorialmente a uma esfera governamental (governo federal, governo estadual e governo municipal). Ultrapassa isso. Seu mister é a de guardião da ordem jurídica, do Estado Democrático, e da defesa dos direitos sociais e individuais indisponíveis (aspectos esses que serão melhor esclarecidos adiante). Basta nos lembrarmos da existência de Ministério Público no âmbito dos Estados (CF, art. 128, II) para nos apercebermos que, realmente, não tem nada a ver pensarmos no Ministério Público como órgão de assessoramento direto do Presidente da República, pois nos Estados não existem Ministérios, mas Secretarias; bem como o governante não é chamado Presidente, mas Governador. Agora sim, vejamos mais de perto a questão do posicionamento do Ministério Público no cenário orgânico constitucional brasileiro, com o intuito de definir-lhe natureza jurídica. Os autores, nacionais e alienígenas, ainda não chegaram a um consenso acerca do tema. Há aqueles que entendem ser o Ministério Público instituição de natureza executiva (a maioria pensa assim). Noutro sentido, sendo considerado órgão essencial à função jurisdicional do Estado, conforme declina a própria Constituição de 1988, existem aqueles que opinam pela maior adequação do Ministério Público à estrutura do Judiciário. Existem aqueles que, nem lá nem cá, dizem que tanto faz, pois seja no Executivo seja no Judiciário, o Ministério Público seria um agente essencial à aplicação da lei. Como o Executivo executa a lei, aplicando-a no sentido de atender os interesses gerais da coletividade, e o Judiciário também se constitui num aplicador da lei, com o propósito imediato de solucionar a lide compondo o litígio entre as parte, e remotamente, devolver a paz à sociedade, não haveria razão prática para a doutrina se preocupar com a “verdadeira” posição a ser ocupada pelo Ministério Público no quadro geral dos Poderes da República. Existem aqueles que, inclusive, ousam dizer que seria o Ministério Público um quarto Poder, guardando predicados próprios, a despeito da sua proximidade com a função executiva geral (própria do Poder Executivo) ou individual (própria do Judiciário). Os autores que sustentam o pensamento de ser o Ministério Público um quarto Poder, dizem que a sua localização topográfica na Constituição de 1988 denunciaria esta “inevitável” vocação. Estar no Título dedicado à “Organização dos Poderes” seria, então, um sintoma claro desta tendência. O que não se sustenta, pois seria esse um argumento válido também para a Defensoria Pública? E para a Advocacia? Claro está que não! Seja que entendimento for, predomina na doutrina brasileira a percepção de que considerar o Ministério Público um quarto Poder é avançar os limites racionais e desejáveis da estrutura orgânica do Estado, pois antes de contribuir com a consolidação da noção da unidade de Poder, parece estimular ainda mais a dissolução desta idéia, por propor mais um fracionamento ao já conflituoso cenário trinitário vigente. A configuração atual é localizar constitucionalmente o Ministério Público na estrutura do Poder Executivo, sem que haja entre esses órgãos uma relação hierárquica ou de subordinação. O que existe, na verdade, é mero vínculo que se estabelece entre eles pela sugestiva identidade executiva de suas funções: atendes às aspirações gerais da comunidade jurídica. Ao discorrer sobre esse tema, os doutrinadores se repetem em citar uma declaração do Ministro Rodrigues Alkmin, prestigiada inclusive em manifestação oficial no Supremo Tribunal Federal pelo Ministro Sepúlveda Pertence. Transcreve este eminente Ministro as palavras do igualmente ilustre Ministro Alkmin: “...a questão da colocação constitucional do Ministério Público entre os Poderes ;é uma questão de somenos, pois o verdadeiro problema é sua independência.” 3-Qual a natureza jurídico-administrativa do Ministério Público? Devemos entender a palavra “instituição” como órgão ou como entidade? Essa indagação reveste-se de maior objetividade prática para o Direito. Interpretar o vocábulo instituição como órgão ou como entidade, conforme o caso, confere direcionamentos distintos. Assim, de acordo com as lições consolidadas dos administrativistas, “entidade” é palavra que indica personalidade jurídica. Logo, entidade é aquele ser (pessoa física ou jurídica) dotado dos atributos e qualidades jurídicas necessários que o tornam apto a exercer direitos (prerrogativas, faculdades e capacidades) e a vincular-se a prestações (obrigações e deveres). Eis que o Ministério Público não age dentro dessa perspectiva. Não assume direitos e obrigações em nome próprio. Nem mesmo em relação aos seus próprios agentes, sejam eles políticos (membros do MP) ou administrativos (servidores e agentes auxiliares), pois que estes, por exemplo, recebem seus estipêndios (pagamentos) dos cofres federais ou estaduais, caso se trata de unidade ministerial vinculada à esfera Federal (MPU) ou à esfera Estadual (MPE). Sendo assim, conclui-se que o Ministério Público deve ser qualificado em sua natureza jurídico administrativa como órgão. Vale dizer, o vocábulo “instituição” é indicativo de órgão e não de entidade. Órgão é centro de competência funcional, que não se justifica por si mesmo se tomado isoladamente, desprovido de personalidade, sendo criado com propósito de atingir certas finalidades. Eis o contexto no qual se encaixa perfeitamente o Ministério Público. Daí a sua qualificação como órgão e não como entidade. 4-Para entendermos a razão de se dizer que o Ministério Público é instituição permanente requer é necessário retrocedermos ao momento constituinte originário, ou seja, ao momento de elaboração da própria Constituição. Ao gravar o Ministério Público com a cláusula da “permanência” o constituinte originário subtraiu do alcance de qualquer poder, inclusive do Povo em manifestação constituinte derivada (elaboração de emendas à Constituição), a capacidade de extinguir-se tão nobre Instituição. O que demonstra a sua essencialidade para o funcionamento orgânico do aparelho estatal. A perenidade (ou permanência) também assume outra dimensão, qual seja, a da constante e contínua presença deste órgão nos labores do Estado. Uma vez criada essa Instituição, passa a participar ativamente da vida dinâmica do Estado, em todas as suas áreas de atuação, zelando pelo fiel cumprimento e observância da Constituição e das leis, preservando a fisiologia do ordenamento jurídico, fato que em última instância representa o interesse maior de toda a coletividade cuja essência é a vida gregária. 5-Dizer-se que o Ministério Público é instituição essencial à função jurisdicional do Estado é, por um lado dizer mais do que o que se deveria realmente dizer; por outro, é dizer menos. Um paradoxo, portanto! Esta e a genuína observação registrada por Hugo Nigro Mazzilli, repetida em todos os comentários de análise dessa locução. Em breves palavras, tem-se que o legislador disse mais do que o que deveria ser realmente dito, implicando uma interpretação restritiva para que cheguemos a melhor termo, pois nem sempre o Ministério Público se encontra presente quando em exercício a jurisdição. Ou seja, o Judiciário no cumprimento de seu mister, ao aplicar o direito objetivo ao caso conflituoso concreto, com vistas ao alcance da paz social, não conta sempre com a presença do Ministério Público. Veja-se, por exemplo, qual seria a essencialidade da presença do Ministério Público nas matérias submetidas ao exame dos Juizados Especiais Cíveis, em hipótese que se discute bens jurídicos disponíveis de menor expressão econômica, como por exemplo, a querela entre locador e locatário de fitas de vídeo, onde o locatário entende não ser obrigado ao pagamento de valores por atraso na devolução das fitas? Por outro lado, a locução diz menos do que realmente deveria dizer, pois o Ministério Público não opera apenas diante da função jurisdicional do Estado. Basta ver, por exemplo, a participação do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas (CF, art. 130) – órgão de auxílio direto do Poder Executivo e encarregado das questões concernentes à fiscalização financeira, contábil, operacional e patrimonial do Estado (CF, art. 70, caput). www.editoraferreira.com.br Felipe Vieira