Processo de Avaliação de Resultados de Gestão de Pessoas: Em Direção a um Modelo Autoria: Patricia Morilha Muritiba, Sérgio Nunes Muritiba, Lindolfo Galvão de Albuquerque, Flávio Hourneaux Júnior Resumo: A Avaliação de Resultados de Gestão de Pessoas é um assunto atual e que vem demandando atenção crescente dos pesquisadores. Este estudo tem o objetivo de identificar e analisar este processo de avaliação de resultados. Neste trabalho, apresenta-se uma primeira aproximação de um processo de avaliação, buscando-se identificar quais aspectos devem ser avaliados, quais ferramentas podem ser utilizadas e quais informações resultam deste processo. Para isso, foi realizado um levantamento quantitativo com 162 profissionais pertencentes à área de Recursos Humanos, dos quais 70% atuam em suas organizações de maneira estratégica e gerencial. Como resultados, o estudo propõe um processo de quatro etapas, que relaciona os objetivos estratégicos da organização às informações que devem ser coletadas. Conclui-se que, dentre os participantes da pesquisa, não há clareza entre os aspectos que devem ser avaliados; há pouco conhecimento do ferramental existente para a avaliação; e a avaliação é feita com base em indicadores quantitativos, a despeito do alerta dos estudos de planejamento estratégico para o risco de basear estritamente nestes indicadores. O estudo também mostrou que o perfil das empresas que avaliam resultados corresponde àquelas que possuem clareza na sua estratégia. 1. Introdução A competição internacional intensiva tem forçado as empresas a reduzir custos e dar foco no valor agregado pelas pessoas, processos e estruturas. Nesse contexto, a Gestão de Pessoas tem sido cada vez mais apontada como uma das funções-chave para o desenvolvimento e implementação de respostas estratégicas para estas pressões (Ulrich, 1997; Yeung e Berman, 1997). Acadêmicos, consultores e executivos argumentam que, para que a Gestão de Pessoas crie valor na empresa, ela tem que se tornar um parceiro do negócio em busca dos objetivos estratégicos (Mabey, Skinner e Clark, 1998; Schuler e Jackson, 1987). A despeito da grande quantidade de trabalhos que apontam o valor estratégico da Gestão de Pessoas, teoria e prática parecem estar descasadas quando são analisados alguns dados sobre o papel do profissional que atua na área, a importância que a ela é dada atualmente e seu real envolvimento na estratégia. Uma pesquisa feita pela consultoria Price Waterhouse Coopers (Leonard, 1999) mostrou que “enquanto muitas empresas já consideram o departamento de Recursos Humanos (RH) como uma parte essencial de suas operações, o RH ainda está engatinhando quando se trata de ser reconhecido como um parceiro estratégico”. Somente 27% dos respondentes afirmaram incluir ou procurar pelos profissionais de RH quando estão começando seu ciclo de planejamento estratégico. Nestes casos, somente 43% dos respondentes relataram que a eficácia do departamento no planejamento e definição das políticas é “média”. De fato, como as organizações não consideram a área como parceiro de negócios, tendem a provocar uma certa incoerência entre os objetivos da organização e o que é praticado. “Gestão de Pessoas coerente com os negócios” é ainda um desafio para as organizações, como apontou a Pesquisa RH 2010 (Fischer e Albuquerque, 2000), que pesquisou tendências e desafios para a área até o ano de 2010. Atualmente, o papel do profissional de RH passa por uma fase de redefinição, com a baixa participação estratégica em boa parte das organizações, e daí a pouca importância que é dada à área em si. Essa situação aumenta a importância de se estabelecer parâmetros de avaliação para os investimentos feitos pelas empresas em Gestão de Pessoas. 1 O objetivo deste estudo é identificar e analisar o processo de avaliação de resultados de gestão de pessoas. Este objetivo será buscado a partir das seguintes questões de pesquisa: Quais aspectos devem ser avaliados pelo processo de avaliação de resultados de Gestão de Pessoas? Quais ferramentas podem ser utilizadas na avaliação? Quais informações resultam deste processo e como podem ser analisadas? As questões de pesquisa descritas acima foram a base para a estrutura deste estudo. Assim, os subitens do referencial teórico contemplam cada uma delas, bem como o levantamento quantitativo que será apresentado em seguida. Como se trata de um assunto ainda a ser consolidado, busca-se, neste estudo, uma primeira aproximação do processo de avaliação. 2. Aspectos que devem ser avaliados A maioria dos autores que tratam de Planejamento Estratégico como uma forma de atingir os objetivos da organização apontam o monitoramento da estratégia como uma das etapas fundamentais deste processo (Freedman, 2002; Almeida, 2003; Mintzberg, 2004). De fato, a determinação dos aspectos que devem ser avaliados por um processo de mensuração de desempenho está estritamente ligada à estratégia da organização. Porter (1985) explica melhor esta ligação – para ele, a Gestão de Pessoas compreende o recrutamento, promoção, avaliação, recompensas e desenvolvimento dos funcionários, e a empresa deve se assegurar de que estas atividades se liguem à estratégia corporativa da organização. Uma fraqueza em uma destas atividades irá impactar a cadeia de valor da empresa como um todo e afetar a sua competitividade. Kaplan e Norton (1996) indicam que o primeiro passo para se construir um processo de avaliação é identificar as principais metas estratégicas da empresa. Como exemplos de metas que são afetadas pela Gestão de Pessoas, os autores citam o desenvolvimento de novos produtos e o percentual de vendas. Sendo assim, a avaliação de resultados de Gestão de Pessoas deve estar diretamente ligada à estratégia corporativa. Muitos profissionais têm, contudo, dificuldades para estabelecer uma ligação clara entre a estratégia da organização e quais atividades de Gestão de Pessoas teriam impacto sobre ela (Lawler e Mohrman, 2000). No entendimento de Fitz-Enz (1984) há, entre os profissionais, um mito de que a Gestão de Pessoas apresenta resultados subjetivos – desta forma, não poderiam ser relacionados diretamente aos objetivos da organização. Esta pode ser uma das causas da difícil vinculação entre atividades, práticas e políticas de Gestão de Pessoas e os objetivos globais da empresa. 3. Ferramental de avaliação A avaliação dos resultados de Gestão de Pessoas é um assunto relativamente pouco estudado. Existem poucos modelos propostos especificamente para esta finalidade, porém há estudos com outros enfoques que podem ser correlacionados com a avaliação de resultados de Gestão de Pessoas. Pode-se citar como exemplos os estudos sobre a mensuração de ativos intangíveis, proposta por Sussland (2001), e mensuração de resultados de programas de gestão do conhecimento (Skyrme e Amidon, 1998). Oliveira, Albuquerque e Muritiba (2003) apresentam um meta-estudo de pesquisas publicadas em caráter nacional (16 estudos) e internacional (44 estudos), sobre a avaliação dos investimentos em gestão de pessoas, no período de 1999 a 2002. A categoria “abordagem temática” foi analisada classificando os artigos em famílias, de acordo com o modo como a avaliação de resultados de Gestão de Pessoas foi estudada. Este levantamento traria uma visão geral sobre os principais temas que entremeiam a avaliação dos investimentos em gestão de 2 pessoas. Foram identificadas cinco categorias de abordagens temáticas, definidas arbitrariamente, conforme os temas que foram surgindo no levantamento dos artigos. As famílias identificadas foram: 1) Efeitos da Gestão de Pessoas sobre os resultados das empresas: nesta família, estão agrupados os artigos que analisaram os efeitos da gestão de pessoas sobre os resultados das empresas. 2) Estratégia de Gestão de Pessoas: artigos que analisaram os resultados provenientes da integração entre a Gestão de Pessoas e a estratégia da empresa. 3) Metodologias de Avaliação da Gestão de Pessoas: artigos que propuseram ou analisaram métodos para avaliar a gestão de pessoas das empresas. 4) Balanced Scorecard (BSC): artigos que falavam sobre a utilização do Balanced Scorecard para a gestão de pessoas, ou que apresentavam casos de sua utilização. 5) Eficácia da gestão de pessoas: artigos que apresentavam a avaliação de resultados como uma maneira de aumentar a eficácia da função gestão de pessoas na empresa. Neste artigo, a revisão bibliográfica estará mais focada na análise de três pontos, visando subsidiar as questões de pesquisa apresentadas anteriormente: (1) aplicação de índices financeiros; (2) Benchmarking de Gestão de Pessoas, cujo principal autor é Fitz-Enz (1993; 2001) e (3) o Balanced Scorecard, que vem sendo amplamente difundido. Aplicação de índices financeiros A literatura financeira apresenta como um de seus pilares a relação entre risco e retorno, que é altamente difundida, e uma premissa para o entendimento dos conceitos financeiros (Ross, Westerfield e Jaffe, 1993; Gitman, 1997). Considerando-se ativos individuais, uma expectativa aceitável para o seu retorno é a média dos retornos passados. Já que o passado deve ser ajustado de acordo com as previsões futuras, os autores consideram que uma previsão mais apurada pode ser obtida a partir da determinação de um conjunto de retornos prováveis e de suas probabilidades relativas, calculando-se, assim, uma média ponderada. A análise de alternativas de investimento é utilizada em vários tipos de decisões. Os métodos de análise são bastante conhecidos, sendo os mais comuns: a análise de valor presente líquido (VPL) e a taxa interna de retorno (TIR). O princípio do VPL é descontar todos os fluxos futuros do investimento a uma taxa, denominada custo de oportunidade, adequada ao perfil de risco do projeto que está sendo analisado. Já o método da TIR calcula, a partir dos fluxos futuros, a taxa que transforma o VPL em zero. (Damodaran, 1996). Esta taxa deve ser comparada com o custo de oportunidade a fim de se decidir pela seleção ou não de um projeto. O VPL é utilizado, geralmente, para avaliar ativos por meio do método do desconto do fluxo de caixa livre (Copeland, 1994). Brown (1996) esclarece que o fluxo de caixa livre não deve ser confundido com o fluxo de caixa tradicional, pois o fluxo de caixa livre é o fluxo de caixa gerado das operações correntes disponível para distribuição que não afeta o nível de crescimento do negócio. Embora o fluxo de caixa seja uma ferramenta financeira para analisar o caixa da empresa, é muito utilizado para a avaliação de ativos. Desta forma, as entradas e saídas de caixa são analisadas para comparar diferentes projetos quanto ao seu valor presente líquido. Estas ferramentas foram utilizadas por Oliveira, Muritiba e Limongi-França (2003) em um estudo de caso que analisava os resultados de diversas iniciativas de Gestão de Pessoas em uma empresa de tecnologia. O caso mostrou que, embora se trate de índices quantitativos, estes trouxeram importantes contribuições para analisar o investimento feito pela empresa em Gestão de Pessoas. 3 Benchmarking de Gestão de Pessoas A busca de índices de avaliação de Gestão de Pessoas iniciou-se como uma tentativa de continuidade das métricas mais utilizadas, turnover e absenteísmo. Estes são os índices mais utilizados tradicionalmente. Mesmo estes têm seu impacto muitas vezes desconsiderado no planejamento da gestão. De acordo com Bohlander, Snell e Sherman (2003), o impacto do absenteísmo é desconsiderado muitas vezes no planejamento de Gestão de Pessoas, porque os dados a ele referentes deixam de ser representados em valor monetário. Isso pode ser feito considerando que “o custo de cada pessoa/hora perdida devido à falta baseia-se no salário médio ponderado por hora, nos custos dos benefícios do funcionário, nos custos de supervisão e nos custos incidentais”. Hoje, existe um trabalho bastante avançado desenvolvido por Fitz-Enz (1984; 1993; 2001). O autor, ex-presidente do Instituto Saratoga, é um nome de destaque na pesquisa e utilização de índices de desempenho para Gestão de Pessoas. O autor desenvolve uma linha de pesquisa de mais de 10 anos sobre o desenvolvimento de indicadores e, em 1977, fundou o Instituto Saratoga, que hoje é parte da Consultoria Price Waterhouse Coopers. Sua linha de atuação tem duas grandes bases: o desenvolvimento de indicadores de desempenho para Gestão de Pessoas e o cálculo do ROI – Return on Investiment ou retorno sobre o investimento. O autor faz uma estimativa de que os custos de pessoal podem representar 40% dos custos fixos de uma empresa, o que torna importante o cálculo do ROI do capital humano. Balanced Scorecard Atualmente, um dos métodos mais difundidos entre as empresas, de acordo com a literatura, é o Balanced Scorecard (BSC) aplicado a Gestão de Pessoas. Ele consiste em um método de monitoramento das atividades da empresa, por meio de indicadores quantitativos e qualitativos. Este método foi proposto inicialmente por Kaplan e Norton (1996), e posteriormente adaptado à área de RH por Becker, Huselid e Ulrich (2001). Sua premissa é de que a contabilidade tradicional é muito limitada e focada exclusivamente no desempenho financeiro. Eles sugeriram que questões como aprendizado e crescimento e clientes e processos comerciais deveriam ser acrescidas aos dados financeiros. A metodologia proposta por Becker, Huselid e Ulrich (op. cit.) pode ser resumida em duas fases. A primeira fase envolve a compreensão do processo de criação de valor que leva as práticas de gestão de pessoas a agregarem valor para a empresa. A compreensão do processo de criação de valor passa pela lógica de que a Gestão de Pessoas é composta por sistemas mais amplos, ou seja, remuneração, recrutamento e seleção, treinamento e desenvolvimento etc. Estes sistemas têm impactos sobre o comportamento dos funcionários, que em última instância, influencia a excelência da empresa no mercado. Pela arquitetura do BSC, então, o primeiro passo é definir qual a cadeia de valores, que define excelência no caso específico de cada empresa. A segunda fase consiste na projeção de um sistema de mensuração baseado na cadeia de valor, utilizando-se indicadores. 4. Informações fornecidas pela avaliação A maior parte dos ferramentais de avaliação apresentados neste estudo baseiam-se em uma série de informações traduzidas em indicadores ou medidas, relacionados aos objetivos avaliados. Kaplan e Norton (1996) também se valem de indicadores para analisar o Balanced Scorecard. Os autores sugerem que os indicadores sejam escolhidos cuidadosamente para que estejam ligados aos objetivos avaliados, e traduzam da melhor maneira possível o sucesso ou fracasso da implementação da estratégia. Eles também sugerem que sejam escolhidos poucos, 4 mas significativos indicadores. Por sua vez, Moores (1994) estabeleceu, como critérios de qualidade para as medidas de avaliação, que elas sejam, simultaneamente: claras, concisas, fáceis de coletar, relevantes e ligadas aos objetivos da empresa. Algumas métricas já se tornaram tradicionais. É o caso dos índices de rotatividade e absenteísmo (Fitz-Enz, 1984) que medem, respectivamente, a troca de funcionários na organização mediante demissões voluntárias e involuntárias, e as faltas dos funcionários no trabalho. Estas métricas fazem parte da gestão de pessoas da grande maioria das empresas. Mas isoladamente, abordam aspectos muito restritos da gestão. E não necessariamente ligados aos objetivos organizacionais que se está tentando medir. Fitz-Enz (1984) é um dos autores que mais apresenta métricas variadas que se relacionam à Gestão de Pessoas. Outro estudo de benchmarking de Gestão de Pessoas, desenvolvido pela consultoria Deloitte Touche Tohmatsu (2002), também se baseia em indicadores quantitativos. Um exemplo dos indicadores utilizados é o faturamento líquido por empregado, calculado pelo total de faturamento líquido da empresa dividido pelo total de empregados efetivos. A maior parte dos indicadores apresentados por estes autores são essencialmente quantitativos, e partem de informações que a empresa já coleta rotineiramente. Mintzberg (1996) alerta para o risco de se utilizar somente dados quantitativos para se basear uma avaliação. Para ele, os dados quantitativos podem não ser melhores e até mesmo serem piores do que informações qualitativas. Um exemplo de informação qualitativa utilizada comumente pelas organizações são as pesquisas de clima organizacional, que analisam a percepção que os funcionários têm da organização onde trabalham em um determinado momento (Fischer, 2002). Mesmo as pesquisas de clima, se não forem desenhadas com o objetivo de avaliar aspectos ligados à estratégia, trazem resultados pobres em termos de avaliação de resultados. 4.1 Críticas às ferramentas de avaliação Martindell (1950) já questionava a aplicabilidade dos métodos de mensuração de desempenho, dizendo que as diferentes características de cada organização impossibilitariam a adoção de um método fixo. Para o autor, ainda, um processo de avaliação pode falhar caso haja excesso de indicadores, ou quando os indicadores não forem relacionados às metas da organização. Robbins (1978) também ressalta a importância da definição do objeto da mensuração de desempenho, devendo ser criados controles de avaliação somente para os fatores controláveis para a organização. Buchele (1971) alerta que simplesmente quantificar um problema é uma prática que pode se tornar um empecilho, mais que uma ajuda. Isso ocorreria em função de que muitas vezes tais análises demandariam métodos analíticos e sistêmicos, que seriam mais indicados, em função da complexidade da empresa. Para Mintzberg (2004) existem três pontos críticos e problemáticos para a verificação da eficácia organizacional. São eles: a questão da confiabilidade da informação, a avaliação do planejamento e a questão de se inferir as causas, em que se confundem as possíveis correlações entre as variáveis com as relações de causa e efeito. Para Perrin (1998) o uso exclusivo de indicadores de avaliação pode incorrer no erro de se deslocar as metas como o principal, ou seja, o foco passa a ser os números e não as atividades e seus resultados. O autor ainda alerta para o possível uso de medidas irrelevantes e sem significado. O uso do Balanced Scorecard tem despertado comentários de diversos autores. No entendimento de Kenny (2003), o método pode se tornar inflexível e não atualizado com o que ocorre na empresa; há falta de arcabouço teórico que sustente suas idéias; e há a 5 possibilidade de os resultados positivos relatados por outros autores ser simplesmente uma demonstração do efeito Hawthorne. 5. Metodologia Este estudo foi baseado em uma análise crítica da literatura referente ao tema, seguida de um levantamento quantitativo. Com o objetivo de responder às questões de pesquisa apresentadas anteriormente, foram realizadas as seguintes etapas: definição do problema de pesquisa, identificação das variáveis do estudo, análise crítica da literatura, escolha das questões do banco de dados do levantamento quantitativo e análise dos resultados. Toda a estrutura da pesquisa visa analisar as seguintes variáveis: V1: Objetivos. A variável “Objetivos” compreende a análise dos aspectos que devem ser avaliados pelo processo de avaliação de resultados de Gestão de Pessoas. V2: Ferramental. A variável “Ferramental” analisa o ferramental de avaliação de resultados de Gestão de Pessoas que pode ser utilizado no processo de avaliação. V3: Informações. A variável “Informações” analisa as informações resultantes deste processo. As variáveis de pesquisa foram escolhidas de maneira que correspondessem ao objetivo apresentado anteriormente. Para a coleta de dados foi utilizado um questionário semiestruturado, composto por 25 questões dirigidas ao tema. Destas, escolheu-se 13 questões para o recorte dado a este artigo, conforme mostra a Tabela 1. Tabela 1 Variáveis e questões correspondentes Var. V1 V2 Cód. X1 X2 X3 X4 X5 X6 X7 X8 X9 V3 V4 X10 X11 X12 X13 Questão Há pressões da alta direção para que a avaliação de resultados ocorra A Gestão de Pessoas está claramente ligada à estratégia da organização A estratégia da organização é clara Quais os principais resultados que você acha que as práticas de Gestão de Pessoas devem trazer para a organização? Existe uma estratégia de Gestão de Pessoas documentada Em que profundidade sua empresa avalia os resultados de Gestão de Pessoas? Há quanto tempo isso é realizado? Desconhecem-se metodologias para avaliar os resultados de Gestão de Pessoas Sinto dificuldades em aplicar técnicas quantitativas para avaliar resultados Utiliza ou planeja utilizar: índices, benchmarks, Balanced Scorecard O sistema de informações disponibiliza dados confiáveis e rápidos Já ocorreram tentativas frustradas de avaliação Assinale os maiores benefícios que você atribui à avaliação de resultados Escala 1 – V; 2 – F Likert 1 a 6 Likert 1 a 6 Questão aberta 1 – V; 2 – F Múltipla escolha Múltipla escolha 1 – V; 2 – F Likert 1 a 6 Múltipla escolha 1 – V; 2 – F 1 – V; 2 – F Múltipla escolha Além destas questões, utilizou-se 14 outras perguntas para analisar o perfil da amostra. Duas delas – “trabalha com Recursos Humanos?” e “há quanto tempo?” – foram utilizadas como variável de controle da amostra. Os casos de respondentes que não trabalhavam em RH, ou o faziam a menos de um ano foram desconsiderados para a análise. O método do levantamento foi escolhido porque permite obter indícios de um grande número de respondentes, descrevendo-se assim as variáveis estudadas (Selltiz et alii,1974). Também permitiria inferir diferenças entre classes de empresas que avaliam os resultados de gestão de pessoas há algum tempo, e outras classes de empresas que não o fazem. Perde-se, numa pesquisa de levantamento, a profundidade de avaliação dos fatores estudados. Mas ganha-se, em troca, variedade de informações obtidas de diferentes sujeitos que participaram da amostra. 6 A elaboração do instrumento de coleta de dados foi feita em conjunto com quatro especialistas em Gestão de Pessoas e Metodologia, professores de programas de PósGraduação. Foi feito, depois disso, um pré-teste, que não ocasionou mudanças no conteúdo do instrumento – somente no entendimento de algumas questões. As respostas dos participantes do pré-teste não foram incluídas no banco de dados final. Foi feita a coleta de dados através do envio de uma carta-convite por e-mail aos participantes da amostra. O e-mail apresentava um hiperlink para o questionário, que foi disponibilizado em uma página da Internet restrita, vinculada à Universidade a qual pertencem os autores. As respostas foram armazenadas automaticamente em um banco de dados que pôde ser consultado on-line a qualquer momento para monitorar as respostas. Foram tomadas também várias precauções com relação à tecnologia – a página da pesquisa não permitia, por exemplo, que o respondente enviasse respostas incompletas ou fora do padrão de resposta. E foi tomado um cuidado extra quanto à amostragem: o questionário não ficou disponível para qualquer pessoa que acessasse a Internet, mas somente para os respondentes escolhidos, que teriam recebido o e-mail convite previamente. O plano amostral da pesquisa foi intencionalmente composto por profissionais e pesquisadores de Gestão de Pessoas vinculados à ABTD. Trata-se de uma associação sem fins lucrativos, que procura criar condições facilitadoras para os profissionais de Gestão de Pessoas/Treinamento desempenharem seus papéis. A escolha da entidade foi feita dado que o público alvo da pesquisa é de profissionais que atuam em Recursos Humanos. Este público está disperso em várias empresas, e em algumas delas, trabalham em departamentos que possuem outras nomeações (como departamento do Talento Humano, por exemplo). Desta forma, como não há maneira de se calcular o universo da pesquisa, e nem de se acessar os indivíduos que fazem parte deste universo, optou-se pela amostra de profissionais vinculados a alguma associação de Recursos Humanos. A ABTD foi selecionada por sua disponibilidade em apoiar a pesquisa, e também porque, apesar de ter como foco treinamento e desenvolvimento, congrega profissionais de diversas especialidades em Recursos Humanos, e tem importante representatividade no Estado de São Paulo. Assim, pôde-se contar com um universo de profissionais bastante qualificados para responder à pesquisa, como será mostrado adiante com a caracterização da amostra. Um dado importante é a especialização de Recursos Humanos da qual os participantes provêm. Muitos são diretores de Recursos Humanos, ou profissionais de Recrutamento e Seleção ou Remuneração. Não houve predominância de profissionais de treinamento – o que é um dado positivo, já que se mantém a característica da pesquisa de analisar a avaliação da gestão de pessoas genericamente, a despeito das especialidades. A ABTD conta com 250 associados, para os quais foram enviados convites de participação, por e-mail. Foram respondidos 162 questionários – ou seja, 64,8% de retorno, uma taxa bastante expressiva. Como se trabalhou com uma amostra não-probabilística, não foram realizados os testes de amostragem característicos. O plano de análise compreendeu, primeiramente, descrever estatisticamente todas as variáveis. Na seqüência, foram utilizadas técnicas estatísticas apropriadas às escalas adotadas. Algumas questões tinham escalas ordinais do tipo Likert de seis pontos. Este tipo de escala inviabiliza, de acordo com Norusis (1998), a utilização de várias técnicas estatísticas, como por exemplo, as análises fatorial e de correlação, que são mais indicadas para escalas do tipo razão. Utilizou-se primeiramente a técnica da análise de conglomerados hierárquicos. Esta técnica visa identificar, dentre todos os participantes da pesquisa, grupos de participantes que tenham características em comum. Somente foram escolhidas para a técnica as variáveis binárias (verdadeiro ou falso) já que não são permitidas variáveis ordinais. O resultado da técnica mostrou que a melhor solução seria de três conglomerados. Para melhorar a 7 distribuição de elementos em cada grupo, foi utilizada a técnica de conglomerados k-means. O software utilizado para todas as análises foi o SPSS. Os gráficos aqui apresentados foram transportados para o Excel, a fim de melhorar sua visualização. Calculou-se, então, a estatística do Chi-quadrado entre todos os pares de variáveis, com o objetivo de testar a independência de variáveis. Uma das premissas do Chi-quadrado é que o valor esperado dos cruzamentos das variáveis seja maior do que cinco. Para isso, as seis opções de resposta das questões ordinais foram resumidas a três categorias (valores 1 e 2; valores 3 e 4; e valores 5 e 6), atribuindo-se então valores de 1 a 3 para estas questões. Foram desconsiderados os casos em que o valor esperado foi menor do que cinco. Na seqüência, foi feita uma análise de correspondência com as variáveis em que verificou dependência, através do teste de Chi-quadrado. Esta técnica estatística tem o objetivo de representar visualmente as percepções de objetos em duas ou mais dimensões. Ela revela a visualização da relação entre variáveis cujo valor da estatística qui-quadrado é significante. Utilizou-se a técnica da análise de homogeneidade (homals) com o software SPSS – que foi usado em todas as análises estatísticas. A técnica homals tem a vantagem de aceitar o uso de muitas variáveis concomitantemente, e por isso foi escolhida. Os eigenvalues, medidas da importância de cada dimensão, foram de 0,54 para a primeira dimensão e 0,41 para a segunda. 6. Apresentação e análise dos resultados Contou-se com uma amostra bastante qualificada para as questões de Gestão de Pessoas, como se observa pelo perfil dos respondentes: alto nível de escolaridade. Pelo menos graduação completa (99,4%); muitos com PósGraduação (73,5%); experiência profissional: experiência na área muitas vezes superior a 10 anos (46,9%); atuação estratégica nas organizações: 38,3% atuam de maneira estratégica e 32,1% de maneira gerencial na organização; têm experiência em outras áreas fora Gestão de Pessoas (79%) e atuam em empresas de médio (40,7%) ou grande porte (45,1%). Aproximadamente um terço dos participantes é o Diretor Geral de RH da empresa onde atua (29,6%), e 65,4% são Gerentes funcionais das diversas especializações de Gestão de Pessoas (Recrutamento e Seleção, Treinamento, Remuneração, Consultoria Interna etc.), além de 5% de consultores. Estas características fazem com que a amostra seja bastante qualificada para responder às questões propostas. 6.1 Aspectos que devem ser avaliados Um dos desafios apontados pela literatura, foi a dificuldade em se definir, ou mesmo visualizar, os resultados que têm influência das práticas de Gestão de Pessoas. Assim, primeiramente, questionou-se aos profissionais quais os principais resultados que eles acham que a Gestão de Pessoas deve trazer para as organizações. Esta questão aberta requeria ao menos duas respostas, sendo que, em função de sua similaridade,foram criados grupos de respostas. Utilizou-se a técnica da análise de conteúdo: as respostas qualitativas foram analisadas, conforme o conteúdo que possuíam, e categorizadas conforme sua similaridade. Um primeiro grupo é o de resultados de “Impacto das Funções de Gestão de Pessoas”. Neste grupo estão respostas como “...desenvolvimento dos funcionários”, “...comprometimento”, “...qualidade de vida no trabalho”. Em comum a estas respostas, está o fato de que elas são produtos das políticas de Gestão de Pessoas adotadas pela empresa. O oposto desta classificação seriam os “Resultados do Negócio”, tais como “... resultados financeiros” ou “... produtividade”. No caso destes resultados, eles são um produto 8 de ações de Gestão de Pessoas, mas também de ações globais da organização. Neste sentido, é muito mais difícil verificar qual o impacto das ações de Gestão de Pessoas isoladamente. Uma terceira classificação de resultados congrega aspectos bastante “Intangíveis/Genéricos”, como “... motivação”, “... felicidade” ou “... satisfação”. Estes resultados também são muito difíceis de serem avaliados. As políticas de Gestão de Pessoas exercem pequena influência sobre estes aspectos, que dependem fortemente de fatores fora do controle da gestão. As respostas dadas a esta questão encontram-se nos gráficos a seguir. Percebe-se que a maior concentração de resultados está no primeiro grupo – “Impacto nas Funções de Gestão de Pessoas”. “Resultados do Negócio” também traz uma porcentagem expressiva de respostas. Gráfico 1 Resultados esperados da Gestão de Pessoas Classes de conceitos de resultado (primeira resposta) Impacto Funções de GP 63 38,9% N/Valid Resultados do Negócio 60 37,0% Int/Gen Intangíveis/Genéricos 33 20,4% Res.Neg. Não válidos 6 Imp.Funç 3,7% 6 33 60 63 0 20 40 60 80 Para que o departamento de RH ocupe uma posição estratégica dentro da organização, a Gestão de Pessoas deve estar claramente relacionada à estratégia geral da organização. Na amostra, em diferentes níveis, a soma de 29,1% concordaram totalmente que a estratégia de Gestão de Pessoas se relaciona claramente à estratégia geral da organização, e 30,2% concordaram parcialmente com esta afirmação. Em muitas organizações (60%), há pressões da alta direção para que a avaliação de resultados ocorra (entre respostas concordo totalmente, parcialmente e concordo). A estratégia da empresa foi considerada clara em 59,3% dos casos. Isso demonstra que, embora a prática da avaliação tenha se demonstrado pouco profunda em parte das organizações pesquisadas, existe a compreensão da estratégia da organização. 6.2 Ferramental de avaliação Com exceção da utilização de indicadores, que é feito por 38,3% das empresas, na medida em que a complexidade da avaliação aumenta, diminui o número de empresas que a praticam. 19,8% da amostra não praticam nenhum tipo de avaliação. E 27,2% avaliam somente as atividades específicas de Gestão de Pessoas, tais como os treinamentos, recrutamento e seleção, ou possuem avaliação de desempenho. Quando questionados sobre este fato específico, percebe-se que aproximadamente dois terços dos participantes conhecem metodologias para a avaliação (64,2%). Embora se conheça metodologias para a avaliação, as técnicas quantitativas são fontes de dificuldades para muitos profissionais. Os resultados mostraram que 62,3% dos participantes sentem dificuldades para aplicar técnicas quantitativas. 6.3 Informações fornecidas pela avaliação Quando se trata dos índices de avaliação, como turnover ou absenteísmo, uma porcentagem relativamente alta dos profissionais utiliza estes índices: 38,3%. 9 Já o uso de indicadores de eficiência das práticas de Gestão de Pessoas, com relação à estratégia da organização, como um scorecard, é prática adotada por somente 14,8% das empresas. Os índices mais utilizados, de acordo com estudos anteriores, são a rotatividade e o absenteísmo. Muitas empresas da amostra utilizam estes dois índices (63,6%), enquanto que 11,1% planejam utilizá-lo. O benchmark de Gestão de Pessoas (não necessariamente o que é composto por índices e comercializado pelo Instituto Saratoga) é utilizado por quase metade (48,8%) das empresas pesquisadas e 17,3% delas pretendem utilizá-lo no futuro. O método do Balanced Scorecard é menos difundido. Somente 14,8% das empresas o utilizam, e 21,6% delas planejam utilizar. Interessante o percentual de 57,4% de empresas que não utilizam nem pretendem utilizar esta metodologia. Uma possível dificuldade enfrentada pelos profissionais diz respeito ao sistema de informações de RH, que em 56% da amostra não disponibiliza dados confiáveis e rápidos para tomada de decisões. Percebe-se que muitas empresas já tentaram avaliar os resultados da Gestão de Pessoas anteriormente (77%); no entanto, dois terços dos profissionais já passaram por tentativas frustradas de avaliação (66%). Quando questionados sobre os maiores benefícios que uma empresa consegue ao avaliar resultados (máximo de 3), a maior concentração de respostas fica por conta de “Melhor qualidade das ações de Gestão de Pessoas” (92%), e “alinhamento com a estratégia” (80,9%). Melhoria da imagem e maior valor de mercado foram as alternativas menos escolhidas. Gráfico 2 Maiores benefícios da avaliação Assinale os maiores benefícios que você atribui ao fato de uma empresa avaliar os resultados de Gestão de Pessoas (máximo 3): Alinhamento com estratégia 131 80,9% Melhor qualidade ações 149 92,0% Melhoria da imagem 90 55,6% Maior valor de mercado 40 24,7% Nenhum dos anteriores 1 0,6% Outro 9 1 Nenh 40 Vmerc 90 Imag Qual 149 131 Al. Est. 0 50 100 150 200 6.4 Perfil das empresas que avaliam resultados Qual o perfil das empresas que avaliam resultados de gestão de pessoas? A análise de conglomerados hierárquicos mostrou existirem três grupos de empresas na amostra de respondentes. Analisando-se o perfil dos grupos, pôde-se perceber que eles diferem quanto à maneira como fazem a avaliação. O primeiro grupo, chamado de Cluster 1 (CL1), foi formado por 59 casos (36,5% do total da amostra). Este é o grupo das empresas que afirmaram avaliar a gestão de pessoas como métodos que a ligam à estratégia, tais como um balanced scorecard, mas que podem, inclusive, ter sido desenvolvidos internamente pela equipe de RH. O segundo grupo, chamado de Cluster 2 (CL2) foi formado por 33 casos (20% do total da amostra). Este é o grupo das empresas que avaliam indicadores de eficiência das funções de Gestão de Pessoas (tais como a realização de pesquisas de avaliação do treinamento entre os funcionários treinados), ou utilizam indicadores quantitativos tradicionais (tais como 10 rotatividade e absenteísmo) sem, contudo, relacionar tais informações aos objetivos estratégicos da organização. O terceiro grupo, chamado de Cluster 3 (CL3) foi formado por 70 casos (43,5 % do total da amostra). Este é o grupo das empresas que não praticam a avaliação de resultados de Gestão de Pessoas. A análise do teste de Chi-quadrado mostrou que o perfil de cada cluster está relacionado às variáveis: X2 - A Gestão de Pessoas está claramente ligada à estratégia da organização. Essa variável assumiu os valores 1, 2 e 3, dependendo do grau de concordância com a afirmação, sendo 3 o maior grau. X3 - A estratégia da organização é clara. Essa variável também assumiu os valores 1, 2 e 3, dependendo do grau de concordância com a afirmação, sendo 3 o maior grau. X5 - Existe uma estratégia de Gestão de Pessoas documentada. Essa variável assumiu os valores 1 (sim) e 2 (não). X6 - Em que profundidade sua empresa avalia os resultados de Gestão de Pessoas? Essa variável assumiu os valores 1 (não avalia); 2 (avalia somente indicadores tradicionais); 3 (avalia a eficiência das funções de Gestão de Pessoas) e 3 (avalia de maneira estratégica). Dado o resultado do teste, foi feita uma análise de correspondência homals, que mostra graficamente a relação entre estas variáveis (Gráfico 3). Gráfico 3 Análise de correspondência CL3: Avaliam 0,8 parcialmente Funções 0,6 2_Clareza 2_Rel.Est 0,4 0,2 N_Docum 0 -2 -1,5 -1 -0,5 N_Aval 1_Rel.Est CL2: Não Avaliam 1_Clareza -0,2 0 -0,4 -0,6 -0,8 -1 Indic 0,5 Docum 3_Rel.Est 3_Clareza 1 1,5 CL1: Avaliam estratégia Estrat -1,2 7. Processo de Avaliação de Resultados de Gestão de Pessoas Para estruturar a análise feita por este estudo, foi elaborado um modelo que representa graficamente as etapas do processo de Avaliação de Resultados de Gestão de Pessoas. A primeira etapa é o levantamento dos objetivos estratégicos, como representação dos aspectos que devem ser avaliados. Para este estudo, não se abordou a análise de como a empresa deveria elaborar sua estratégia. A maior parte dos estudos sobre estratégia trata do delineamento dos objetivos estratégicos, e existem diferentes enfoques e teorias, como por exemplo, os modelos de Porter (1985) ou de Prahalad e Hamel (1990), que se contrapõem e ao mesmo tempo se complementam (Fleury e Fleury, 2000). Para o presente estudo, parte-se do pressuposto de que a empresa pode adotar qualquer teoria como base para o seu delineamento dos objetivos estratégicos. Não se pretendeu, também, avaliar a qualidade dos objetivos delineados pela empresa, apesar de se saber que caso sejam delineados de maneira incorreta, os resultados obtidos por toda a organização estarão comprometidos. 11 A segunda etapa é a realização de práticas de gestão de pessoas. Mais uma vez, esta etapa não consistiu o enfoque deste estudo, uma vez que a escolha das práticas de gestão de pessoas mais adequadas à consecução dos objetivos propostos na primeira etapa tem sido objeto de estudos de Gestão de Pessoas já há bastante tempo. A maior parte dos livros didáticos ou de negócios explora novas práticas de Gestão de Pessoas que podem ser alternativa aos obstáculos enfrentados pela área. Existem também os estudos de melhores práticas, que procuram identificar as práticas mais correlacionadas a objetivos prédeterminados (Lawler e Mohrman, 2000). A avaliação das práticas de Gestão de Pessoas inicia-se com a escolha do ferramental adequado – terceira etapa do processo de avaliação. A literatura mostrou a existência de alguns ferramentais que podem ser utilizados para esta finalidade: Balanced Scorecard, indicadores quantitativos, pesquisas qualitativas, índices de avaliação financeira. A literatura mostrou que a escolha de qual ferramenta utilizar depende de alguns fatores: Informações disponíveis: muitos dos indicadores sugeridos pelos autores têm como limitação o fato de necessitarem de informações mais complexas, que devem ser coletadas previamente pelos administradores de RH, já com a intenção de utilizar o índice. A variedade de informações é muito grande; portanto há necessidade de se escolher previamente os índices relevantes para a avaliação, e então coletar as informações. Natureza dos objetivos que se quer avaliar: dependendo do objetivo que se quer avaliar, será necessária a coleta de informações diferentes. Por exemplo, para o objetivo estratégico de melhorar a satisfação dos clientes, será necessário incluir nas pesquisas de satisfação dos clientes indicadores relacionados aos funcionários e às políticas de Gestão de Pessoas da empresa. Avaliação da eficiência x eficácia. A literatura mostrou duas formas de avaliação. A primeira relaciona os objetivos aos resultados obtidos. A esta forma de avaliação denominou-se “avaliação da eficácia” para os propósitos deste estudo. A segunda verifica se os objetivos foram atingidos da melhor forma possível, ou seja, em menor tempo ou custo, que neste estudo foi denominada “avaliação da eficiência”. Ambas as formas de avaliação são importantes e necessárias. Para cada uma delas, há ferramentas específicas. O uso do Balanced Scorecard ou de outra ferramenta desenvolvida internamente verifica a eficácia das práticas de Gestão de Pessoas. Já os indicadores financeiros podem ser mais indicados a verificar eficiência – por exemplo, quando se verifica duas possibilidades de se fazer o mesmo treinamento – qual delas traria retorno em menor tempo? O uso diferenciado das ferramentas mostra a necessidade de se desenvolver medidas personalizadas a cada empresa, e a cada caso. O uso de ferramental indiscriminadamente pode levar a conclusões erradas sobre os resultados que as práticas de Gestão de Pessoas estão trazendo. A última etapa, feita a avaliação, é a análise das informações qualitativas e quantitativas. Esta etapa pode ser considerada uma simples decorrência das demais – uma vez que se tenha planejado quais informações coletar, analisá-las é uma tarefa decorrente. No entanto, a literatura trouxe alguns aspectos que enfocam cuidados nesta etapa. O primeiro deles é a necessidade de reavaliar possíveis aspectos não contemplados pela avaliação e/ou que necessitam ser reavaliados. Por exemplo, alguns objetivos podem não ter sido atingidos. Neste caso, é necessário que os indicadores relacionados a ele continuem sendo avaliados. O segundo aspecto é o cuidado com as informações a serem analisadas. É importante assegurar-se da confiabilidade dos dados, e manter séries históricas de dados para permitir analisar a evolução dos objetivos analisados. O terceiro aspecto enumerado pelos autores foi o cuidado ao estabelecer relações de causa e efeito. Um exemplo que é muito comum a Gestão de Pessoas é o impacto de 12 treinamentos sobre as vendas. Sabe-se que as vendas ocorrem como efeito de várias atividades desenvolvidas pela empresa, tais como o marketing, o produto, e até situações específicas de mercado, como sazonalidades. O treinamento é apenas uma das variáveis que têm influência sobre as vendas. Ao estabelecer esta relação de causa e efeito pode-se apenas inferir que o treinamento pode ter tido influência sobre as vendas. Inferências mais robustas serão obtidas na medida em que, se possível, as outras variáveis sejam isoladas – o que é muito difícil de se conseguir. Mas séries históricas de avaliação podem melhorar a qualidade da análise, uma vez que, ao longo do tempo, as demais variáveis também terão valores diferentes. Por fim, um último aspecto importante é o foco da análise. Muitos autores aconselharam a não se manter o foco somente nas informações quantitativas. Informações qualitativas podem ajudar a estabelecer melhor as relações de causa e efeito. No exemplo dado acima, da relação entre treinamento e vendas, pesquisas qualitativas com os funcionários ligados a vendas podem trazer informações relevantes sobre como o treinamento os está auxiliando, e quais influências teve sobre seu trabalho. A Ilustração 1 representa de forma gráfica as etapas que compõem a proposta do processo de avaliação de resultados de Gestão de Pessoas, bem como uma descrição de cada etapa. Ilustração 1 – Proposta de Processo de Avaliação de Resultados de Gestão de Pessoas POLÍTICAS PRÁTICAS DE GESTÃO DE PESSOAS DEFINIÇÃO DOS OBJETIVOS ESTRATÉGICOS Desenvolvimento de novos produtos Aumento nas vendas Recrutamento e seleção Desenvolvimento Remuneração e programas de incentivos ESCOLHA DO FERRAMENTAL PARA AVALIAÇÃO Avaliar eficiência e eficácia BSC já adotado pela empresa; Indicadores quantitativos Pesquisas qualitativas ANÁLISE DAS INFORMAÇÕES QUALITATIVAS E QUANTITATIVAS Índices Resultados das pesquisas Séries temporais A análise de correspondência realizada neste estudo trouxe importantes informações acerca do processo de avaliação. Ela mostrou uma correspondência entre o nível de avaliação de resultados adotado pela empresa e a clareza na definição dos objetivos estratégicos. Mais do que o desconhecimento de metodologias, ou as informações disponibilizadas pelo sistema de RH, o que mais diferencia as empresas que avaliam resultados mais profundamente é a clareza de sua estratégia e o quanto as práticas de Gestão de Pessoas se relacionam com ela. Possuir uma estratégia documentada também foi uma característica presente nas empresas que avaliam resultados de maneira mais profunda. 8. Conclusões Este estudo teve o objetivo de responder a três questões de pesquisa. A primeira delas dizia respeito aos aspectos que devem ser avaliados pelo processo de avaliação de resultados de Gestão de Pessoas. 13 A literatura mostrou que um primeiro cuidado ao iniciar um processo de avaliação de resultados é relacioná-lo com a estratégia da organização. O levantamento quantitativo mostrou dois aspectos importantes com relação a este cuidado. O primeiro é que boa parte das empresas pesquisadas tinha clareza da estratégia da empresa, e algumas ainda tinham esta estratégia documentada, além de relacionarem seus objetivos de gestão de pessoas a esta estratégia. No entanto, foram encontradas várias definições para quais resultados se espera da gestão de pessoas - não houve consenso sobre os resultados esperados. Encontrou-se dentre os resultados esperados pelos participantes da pesquisa, um percentual relevante de respostas consideradas intangíveis. Embora para Fitz-Enz (op.cit.) exista um mito de que os resultados da Gestão de Pessoas são intangíveis, a pesquisa mostrou que este mito poderia ser realidade, no sentido em que um percentual relevante dos participantes afirmou esperar resultados pouca tangibilidade. Dentre estes, estavam resultados como a “felicidade dos funcionários” – aspectos que não dependem única e exclusivamente de um esforço da gestão de pessoas, mas que tem influência de muitos outros fatores fora do controle do RH. A questão que surge é se estes resultados podem ser esperados da gestão de pessoas – ou se é um engano esperar que as políticas e práticas da empresa possam atuar sobre eles. A segunda procurava analisar as ferramentas que podem ser utilizadas na avaliação. Os resultados mostraram que existem algumas possibilidades de ferramentas para a avaliação; no entanto, cada uma delas apresenta usos distintos. É necessário primeiramente analisar as necessidades de avaliação da empresa; e então, adotar uma ou mais ferramentas; ou ainda adaptar as ferramentas existentes às necessidades da organização. O uso do ferramental analisado neste estudo foi baixo dentre os participantes do levantamento. Mais da metade das empresas (57,4%) não usam nem pretendem utilizar o Balanced Scorecard. E 62% dos participantes têm dificuldades para aplicar técnicas quantitativas. Estes resultados mostram que embora a avaliação seja um tema relevante e atual, existem ainda muitos desafios para que ela ocorra nas organizações. A terceira questão de pesquisa analisou as informações que resultam do processo de avaliação. A literatura mostrou a necessidade de escolher cuidadosamente os indicadores que serão utilizados. Estudos clássicos como o Mintzberg (1996) alertam para a necessidade de se utilizar métricas qualitativas na avaliação. No entanto, nenhuma das ferramentas analisadas neste estudo tem este enfoque – todas se baseiam em indicadores quantitativos. Os indicadores quantitativos mais usuais, como os índices de rotatividade e absenteísmo, são adotados por 63% das empresas. Quase metade delas (48%) coletam índices quantitativos com a finalidade de comparação com a concorrência (benchmark). Levando-se em conta o fato de que a literatura alerta para o uso limitado aos indicadores quantitativos, há que se desenvolver as métricas utilizadas pelas organizações, já que os índices apresentados têm uma amplitude de análise limitada. O uso de informações quantitativas fica, atualmente, ainda mais comprometido pelo fato de que os sistemas de informações de Recursos Humanos, de acordo com 56% da amostra não disponibilizam dados rápidos e confiáveis. Por fim, este estudo apresentou uma proposta de processo de avaliação de resultados de Gestão de Pessoas. Nele, as etapas do processo de avaliação de resultados são organizadas de tal forma que ela se inicie com a determinação dos objetivos estratégicos da organização. A seguir, são realizadas as práticas de gestão de pessoas que se espera que tenham efeito sobre a consecução destes objetivos. A avaliação é então feita utilizando-se o ferramental mais adequado aos objetivos propostos. Pode-se utilizar ferramentas já existentes na literatura e nas organizações, mas o mais indicado é adaptar as existentes ou elaborar novas ferramentas adequadas às necessidades de avaliação da empresa. Também se sugere que sejam realizadas pesquisas qualitativas, como um complemento aos indicadores quantitativos de avaliação. Por 14 fim, as informações obtidas pelo processo de avaliação devem ser analisadas buscando melhorias não somente nas práticas de Gestão de Pessoas da empresa, mas também no próprio processo de avaliação. Aconselha-se também o uso de séries temporais, para minimizar o efeito das outras variáveis que tem influência sobre os resultados organizacionais, além das práticas de Gestão de Pessoas adotadas. A análise de correspondência mostrou que a clareza na definição da estratégia, sua documentação e o uso de ferramental adequado correspondem ao grau de avaliação de resultados que a empresa utiliza. Ou seja: empresas que avaliam resultados de maneira mais profunda tendem a ter estratégias mais claramente definidas e documentadas. Este estudo possui a limitação de não tratar de uma amostra probabilística e, como todo estudo de levantamento, não trata de maneira mais aprofundada os resultados encontrados. Sugere-se, portanto, que sejam realizados estudos subseqüentes para aprofundar os resultados aqui encontrados, e aprofundar o estudo do processo de avaliação de resultados proposto. 9. Bibliografia ALMEIDA, M. I. R. Manual de planejamento estratégico: desenvolvimento de um plano estratégico com a utilização de planilhas Excel. São Paulo: Atlas, 2003. BECKER, B. E.; HUSELID, M. A. & ULRICH, D.. Gestão Estratégica de Pessoas com Scorecard: interligando pessoas, estratégia e performance. Rio de Janeiro: Campus, 2001. BOHLANDER, G., SNELL, S. e SHERMAN, A.. Administração de Gestão de Pessoas. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2003. BROWN, G. Free Cash Flow Appraisal... 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