A LECTOESCRITA NA EDUCAÇÃO BÁSICA Adriana Helena Gonçalves da Silva, Francisca Gláucia Ramos, Maria José Alacrino, Anézio Cláudio Bernardes Graduandas do Curso de Pedagogia – FEA/UNIVAP – [email protected], [email protected] Resumo: Este artigo tem como objetivo descrever e analisar a construção e a compreensão da lectoescrita de crianças de duas turmas de 1ª série do Ensino Fundamental, por intermédio de observações realizadas por alunos-pesquisadores, durante o desenvolvimento de atividades propostas a essas crianças, a partir de cópias, ditados e leituras diversas, a fim de estabelecer um contraponto entre a teoria e as metodologias selecionadas pelas docentes dessas turmas, nesse segmento educacional. Construiu-se o embasamento teórico a partir dos pressupostos de Gardner (2009), Soares (2006), Ferreiro e Teberosky (1999), dentre outros autores. Palavras-chave: Alfabetização, psicogênese, escrita, metodologia, aluno-pesquisador. Área do Conhecimento: Ciências Humanas (Educação) Introdução Metodologia Para que, individualmente, os alunos desenvolvam os seus potenciais, é necessário que o docente saiba que cada um possui formas e ritmos peculiares de abordagens, e que o professor deve estar apto a promover os questionamentos corretos nos momentos certos. Segundo Gardner (apud FERRARI, 2008, 128130), há oito inteligências diferentes, e sua teoria aponta que há talentos diferenciados para atividades específicas. Para esse autor, cada indivíduo nasce com um vasto potencial de talento e a educação costuma errar ao não considerar os vários potenciais de cada um. Além disso, afirma que é comum essas aptidões serem sufocadas pelo hábito nivelador de grande parte das escolas. Construiu-se o embasamento, para a realização desta pesquisa, a partir dos pressupostos teóricos de Gardner, Soares e Ferreiro e Teberosky, dentre outros autores. Esta pesquisa tem como objetivo destacar as ações dos docentes e a metodologia privilegiada para a aquisição discente da lectoescrita, considerando que toda práxis docente deve ser planejada com coerência para se atingir os objetivos durante o processo educacional, e que, para a consecução dessa meta, é preciso analisar e estar atento às dificuldades que possam surgir, bem como estar apto a promover a mediação adequada, conforme as dificuldades discentes que se apresentam, para que, de fato, concretize-se, dinamicamente, a aprendizagem. A pesquisa foi realizada em duas Escolas Estaduais de São José dos Campos, no projeto que está sendo desenvolvido pela Secretaria de Estado da Educação, por meio da Fundação para o Desenvolvimento da Educação (FDE), o Programa Ler e 1 Escrever , no qual alunos-pesquisadores dão suporte ao professor regente, assistência aos alunos e ajudam-no a organizar as aulas o que, na prática, promove a capacitação e experiências aos universitários e um trabalho mais direcionado, moldado à personalidade e desenvolvimento de cada criança que precise de apoio especial em seu primeiro ano escolar. A investigação pelas alunas-pesquisadoras foi realizada com o objetivo de verificar como se dão as hipóteses da lectoescrita, para, dessa forma, dar possibilidades aos alunos de se tornarem discentes leitores e escritores competentes, sabendo-se que o desenvolvimento da competência de ler e escrever não é um processo que se encerra quando o aluno domina o sistema de escrita, pois esse se prolonga por toda a vida, com a crescente possibilidade de participação que envolve a língua escrita, nos segmentos sociais em que o discente se encontra inserido, o que se traduz na sua competência de ler e 1 - Disponível em: .www.fde.sp.gov.br/pagespublic/Noticias.aspx?contextmenu=bu scaspub¬icia=855, Acesso em 25 mai. 2009 XIII Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e IX Encontro Latino Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba 1 produzir textos dos mais variados gêneros textuais. Esta pesquisa realizou-se em duas salas de aula compostas por 30 alunos, em média, cuja comunidade escolar é bem diversificada, atendendo crianças de baixa renda e de classe média. O trabalho foi desenvolvido em salas de 1ª série, por meio de observações e outras atividades específicas, como a sondagem individual. A observação se deu ao ver como é realizada a escrita na cópia, como se dá o conhecimento do alfabeto e a diferença entre a escrita e outras formas gráficas e convenções da escrita (orientação do alinhamento, por exemplo). Os alunos com maior grau de dificuldade foram observados, nesta pesquisa, e, para esses discentes foram apresentadas atividades diferenciadas e atenção direcionada. Resultados Atualmente, sabemos que a criança que chega à escola possui um notável conhecimento de sua língua materna, um saber linguístico que utiliza “sem saber” (inconsciente) nos seus atos de comunicação cotidianos. A teoria de Piaget (apud FERRARI, 2008, p. 89-91) permite introduzir a escrita enquanto objeto de conhecimento, e o sujeito da aprendizagem, enquanto sujeito cognoscente, e, assim, a noção de assimilação. Para Ferreiro e Teberosky (1999), o método, enquanto ação específica do meio, pode ajudar ou frear, facilitar ou dificultar, porém, não pode criar aprendizagem. A obtenção de conhecimento é um resultado da própria atividade do sujeito. Partimos da observação diária das atividades em sala de aula, envolvendo escrita e leitura. Verificamos quais os alunos que já chegaram na 1ª série na fase silábica-alfabética ou alfabética, e, de posse de tais dados, buscamos observar os alunos que se encontram em um processo de dificuldade de assimilação O critério de verificação foi observar cada atividade e a forma pela qual se dava a cópia. Em uma sala de aula composta por 35 crianças, 9 delas apresentaram maiores dificuldades no momento da escrita, ao fazer a cópia, olhavam letra por letra e imitavam o desenho destas. Algumas escreviam de duas em duas letras, e outras, de três em três. Para os que já têm um conhecimento prévio da escrita, a cópia é feita com mais facilidade, uma vez que conseguem relacionar o sentido que a palavra tem a seu significado, como, por exemplo, na palavra BOLO, já relacionada ao som e compreensão de cada sílaba e ao significado (alimento). Por meio da sondagem individual, ficou clara a hipótese de cada um e a apropriação que fazem durante a fase de transição entre as fases da escrita. Observamos o alinhamento, a direção da escrita e a assimilação dessa escrita. Na primeira sondagem, Ana - nome fictício de uma das crianças observadas - de 6 anos, escreveu a palavra brigadeiro “IAED”, demonstrando se encontrar no nível 1 da aquisição da escrita, hipótese pré-silábica com valor, tem consciência de que há relação entre a pronúncia e a escrita. Em uma segunda sondagem, Ana escreveu “BAEO”, encontrandose, nesse momento, no nível 2, intermediário, onde conserva as hipóteses da quantidade mínima e da variedade de caracteres. Na terceira sondagem, escreveu ”BGDEIO”, passando para o nível 3 – hipótese silábica, já adequando os conceitos de escrita e fala. Cada fase tem um desafio evidente para o docente. Como resolver essas hipóteses para que, de fato, a criança tenha autonomia para organizar as letras na palavra? Em um quadro geral de análise da sala A, com 24 alunos, os dados verificados na primeira sondagem foram: 1 aluno alfabético, 2 alunos silábico-alfabéticos, 17 silábico-alfabéticos com valor e 4 alunos silábico-alfabéticos sem valor. Constatamos, em uma segunda sondagem, a assimilação do aprendizado por meio dos seguintes dados: 2 alunos alfabéticos, 11 alunos silábico-alfabéticos, 9 silábico-alfabéticos com valor e 2 alunos silábico-alfabético sem valor. Segundo Ferreiro e Teberosky (1999), nas características e desafios dos níveis no processo de alfabetização, em cada nível a criança elabora suposições a respeito dos processos de construção da leitura e escrita, baseando-se na compreensão que possui desses processos. Dessa forma, a mudança de um nível para outro só ocorrerá quando se deparar com questões que o nível em que se encontra não puder explicar: elaborará novas suposições e novas questões e, assim, sucessivamente, sendo o processo de assimilação de conceitos gradativo, o que não exclui “idas e vindas”, entre os níveis. Constatamos, assim, as fases em que cada aluno se encontra, e verificamos que cada um tem um ritmo e uma maneira diferente de se apropriar da escrita, dentro desse processo de autonomia, em relação à aquisição da escrita. Discussão Hoje, o foco da aprendizagem está sobre o aluno e as suas hipóteses relativas à aquisição da lectoescrita. Em alguns casos, nos quais se pressupõem que esse aluno tem déficit de XIII Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e IX Encontro Latino Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba 2 aprendizagem, constitui-se um “problema” para o professor. Nas tentativas de acertar, buscando resposta para a questão: “O que deve ser proposto para que esse aluno desenvolva o seu potencial de aprendizagem como a maioria dos outros alunos?”. As respostas a esse questionamento nem sempre são precisas e claras. Pode-se pensar em questões sociais, crianças pobres, que não têm acesso a livros nem a portadores textuais diversos, ou no próprio ambiente escolar, ou, ainda, nas metodologias e práticas docentes. E a pergunta que não se cala: De quem é a culpa pelo fracasso escolar? Cabe ressaltar, segundo Ferreiro e Teberosky (1999), que não é o ambiente que alfabetiza, nem tampouco o fato de pendurar coisas escritas nas paredes que produz um efeito alfabetizador, e que nenhuma criança entra na escola regular sem nada saber sobre a escrita, e que o processo de alfabetização é longo e trabalhoso para todos, não importa a classe social. Para compreendermos a situação, é preciso analisar os fatores apontados como causas do fracasso. Segundo Soares (2006), há duas dimensões do letramento: a individual e a social. Quando o foco é posto na dimensão individual, o letramento é visto como um atributo pessoal, relacionado à posse que cada um faz do ato de ler e escrever. Quando o foco se desloca à dimensão social, o letramento é visto como um fenômeno cultural, ou seja, um conjunto de atividades sociais que envolvem a língua escrita, e de exigências sociais de uso da língua escrita. Mas identificar essas duas dimensões é apenas um primeiro passo para o enfrentamento do problema de formular uma definição adequada de letramento, que nos remeta à prática pedagógica, ao docente, a seu dia-a-dia na sala de aula, ao seu cenário real - com 35 alunos, cada qual com seu jeito de aprender -, e aos desafios chamados “déficits de aprendizagem”. Esta é justamente a missão: mudar essa situação que ainda é um agravante dentro das escolas, e que se inicia com diversos questionamentos, tais como: Alfabetização em que tempo? Quando se deve saber ler e escrever? À impotência e à frustração do professor somam-se as cobranças e os resultados que se esperam ao final dos anos seriais. Não se consideram a imaturidade de algumas crianças, os problemas físicos – como, por exemplo, os de visão ou de distúrbios de audição não detectados dentre tantas outras dificuldades que se podem apresentar, nesse processo. O discurso das hipóteses, a organização atual dos estudos, muita especulação que vai de encontro às próprias afirmações onde cada um tem seu ritmo, seu tempo de aprender, e o lamento continua. Alguns alunos aprendem muito rapidamente, outros são extremamente lentos, e convivemos, dessa forma, com o insucesso educativo. De acordo com Soares (2006): é preciso um tratamento que realmente permita compreender os vários tipos e níveis de proficiência em leitura e escrita atingidos, em nossa sociedade. Tal tratamento forneceria uma representação mais precisa, não apenas da natureza complexa das exigências de letramento em uma sociedade pluralística, mas também do status das pessoas que atuam em nossa sociedade. Optar por um meio de como ensinar e ter que escolher, implica, em dada situação, desconsiderar uma ou outra metodologia. O que se ganha ou se perde em cada caso, sabendo que em meio às dificuldades, toda criança é alfabetizável e que esse é o ponto de partida, é: compreender criticamente o dia-a-dia e saber como dar continuidade a esse processo para atingir metas em favor do sucesso educacional e social. Com os resultados obtidos, entendemos que a escola se dirige a quem já sabe, admitindo de maneira implícita que o método está pensado para aqueles que já percorreram, sozinhos, um longo e prévio caminhar. Percebemos que o êxito da aprendizagem depende, então, das condições em que se encontre a criança no momento de receber o ensino. As que se encontram em momentos bem avançados de conceitualização são as únicas que podem tirar proveito do ensino tradicional e são aquelas que aprendem o que o professor se propõe a ensinar-lhes. As demais são as que fracassam, são os discentes que a escola classifica como: “incapazes de aprender”, ou “com dificuldades de aprendizagem”. Sabemos que nenhuma criança parte do zero ao ingressar na escola e que é por meio de um processo de ensino e aprendizagem proficiente que se vivencia a aquisição da escrita. Vemos que, diante dos fatos, é preciso definir o que é educacionalmente desejável, refletir sobre conceitos e métodos e o que realmente funciona durante o processo de alfabetização. Naturalmente, as divergências - quanto ao objeto da alfabetização: o que se ensina quando se ensina a ler e escrever – determinam divergências quanto aos métodos de alfabetização – como se deve ensinar a ler e a escrever; e, consequentemente, divergências quanto aos resultados da alfabetização – o que funciona na alfabetização. No cotidiano escolar, as situações que precisam ser enfrentadas são muito complexas, vão além do espaço da sala de aula, engloba o XIII Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e IX Encontro Latino Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba 3 aluno enquanto ser social, a sua historia de vida, enquanto ser único, com as suas aptidões e diferenças. - SOARES, Magda. Letramento. Um tema em três gêneros. 2 ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2006. Conclusão Dentro do contexto sala de aula - professor, aluno -, não sabemos, exatamente, o que vai dar certo para a consecução dos objetivos educacionais. No entanto, sabendo que cada pessoa é um ser único, com ritmo diferente de aprendizado, há diversas possibilidades de aprendizagens, o que nos encaminha a uma complexa realidade, entre teorias, métodos e práticas. Segundo alguns estudos, há inteligências múltiplas; já, conforme outros alegam, há aptidões diferentes. Contudo, independente das divergências, é preciso e fundamental que o professor saiba o que vai ensinar, como vai ensinar, e mantenha-se aliado a estudos permanentes - a uma educação continuada-, para, dessa forma, contribuir para que ocorram mudanças significativas, a fim de que o cotidiano da escola e da sala de aula deixem de se constituir em insucessos em relação ao processo de alfabetização. Espera-se que, nesse novo horizonte, a educação vislumbre um mundo melhor, mais educado, rumo a um caminho promissor de se vivenciar cidadania, compreendendo, sempre, que cada criança se constitui em um ser único, independente de suas diferenças, aptidões ou inteligências, e que cada indivíduo pode, sim, desenvolver o seu potencial, e, assim sendo, tenha condições de “escrever” a sua história com dignidade e realizações. Referências - FERRARI, Márcio. O cientista das inteligências múltiplas. In: Revista Nova Escola. Ed. Especial nº 19. São Paulo: Abril, 2008. ______. O biólogo que pôs a aprendizagem no microscópio. In: Revista Nova Escola. Ed. Especial nº 19. São Paulo: Abril, 2008. - FERREIRO, E. e TEBEROSKY, A. – Psicogênese da Língua Escrita. Porto Alegre: Artmed, 1999. - SÃO PAULO. Secretaria da Educação. Ler e Escrever: guia de planejamento e orientações didáticas; professor alfabetizador. 2. ed. São Paulo: FDE, 2009. (V. I), 1ª série. XIII Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e IX Encontro Latino Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba 4