A EDUCAÇÃO RURAL: PRÁTICAS DE ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO NO
CONTEXTO EDUCACIONAL
Rita de Cássia L. de Souza¹; Francisca de Sousa Alm eida²; Juliana Marcondes de
Morais³; Rita Donizetti de Cássia Lima 4
. Maria Angélica Gomes Maian, Orientadora.
1234
Pesquisador Universidade do Vale do Paraíba – Faculdade de Educação e Artes - FEA, Rua Tertuliano
Delphim Jr., 181- Jardim Aquarius - CEP: 12246-080 - São José dos Campos – Sp; e-mail:
[email protected];
n
Orientador Universidade do Vale do Paraíba – Faculdade de Educação e Artes - FEA, Rua Tertuliano
Delphim Jr., 181- Jardim Aquarius - CEP: 12246-080 - São José dos Campos – Sp;
Resumo: Este artigo se propõe discutir e apresentar as práticas de alfabetização e letramento realizadas
em uma escola da rede particular de ensino, situada na área rural da zona norte da cidade de São José dos
Campos e também a participação da família nestas práticas, com base nos estudos teóricos das obras de
Ferreiro (1984), Soares (2004), Parâmetros Curriculares Nacionais (1997) considerados como referências
para o trabalho de alfabetização no ensino fundamental. A análise foi realizada a partir de um “kit” contendo
materiais para leitura e escrita (jornais variados, panfletos, portadores textuais diversos, conta de água, luz,
telefone, livros) e fichas com situações para escrita e leitura, buscando identificar os níveis da escrita onde
se encontram os alunos pesquisados, relacionando o papel da escola como promotora da inserção da
criança na aquisição da lectoescrita, fazendo um contraponto entre os estudos teóricos e o contexto atual e
por intermédio de pesquisas verificar a contribuição da família neste processo.
Palavras-chave:.Currículo, lectoescrita, psicogênese da língua escrita, estratégias didáticas.
Área do Conhecimento: Ciências Humanas (Educação)
Introdução
Atualmente o domínio da leitura e da escrita tem
uma importância completamente inversa da que
tinha anos atrás, ao mesmo tempo, maior e muito
diferente. A leitura e a escrita tornou-se hoje,
portanto uma ferramenta indispensável à vida em
sociedade, sendo necessário verificar como esta
vem sendo trabalhada em sala de aula e analisar
também como ela vem sendo motivada em casa,
observando que, em áreas rurais, o acesso a
escrita é restrito, ou seja, só é possível nos
ambientes familiares. Sabendo-se que a criança
desde que nasce é construtora de conhecimentos,
pode se dizer que quanto antes ela tiver contato
com o mundo da leitura e da escrita, maiores
serão as chances de se familiarizarem com as
letras e de desenvolverem hábitos de leitura e
escrita, pois para formar um leitor proficiente é
necessário que mesmo antes do ingresso dela a
escola, os pais incentivem por intermédio de
leitura de textos diversos o contato e o interesse
das
mesmas
pelo
mundo
letrado
e,
consequentemente, após a entrada da criança na
escola, o professor assuma a responsabilidade de
proporcionar um ambiente propício em que
desenvolverá na criança o gosto pela leitura e a
necessidade de fazê-la. Certamente há recursos
que estimulem os alunos, despertando seu
interesse para um determinado tema, numa
atitude de curiosidade e atenção, é importante que
a criança não se sinta sozinha, mas amparada e
incentivada pelas pessoas que são suas
referências (pais, responsável ou professor),
assim o aquisição da lectoescrita deixará de ser
um problema e passa a ser algo prazeroso. Além
de ler e escrever é fundamental que a criança
compreenda o que leu, pois, o sucesso escolar, o
sucesso profissional, a liberdade do cidadão em
que a criança se tornará futuramente, tudo
depende da sua capacidade de interpretação.
Portanto, o objetivo deste artigo é identificar os
níveis da escrita onde se encontram os alunos
pesquisados, tendo estes idades entre cinco e oito
anos, relacionando o papel da escola como
promotora da inserção da criança na aquisição da
lectoescrita, fazendo um contraponto entre os
estudos teóricos e o contexto atual e por
intermédio de pesquisas verificar a contribuição da
família neste processo.
Referencial Teórico
A partir dos anos de 80, na escola, o ensino de
Língua Portuguesa tem sido o centro de
discussões acerca da necessidade de melhorar a
qualidade de ensino no País. Em relação ao
ensino fundamental, a questão da lectoescrita tem
XIII Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e
IX Encontro Latino Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba
1
ocupado lugar de destaque na preocupação dos
educadores, pois de acordo com os PCN (1997,
p.15), o domínio da língua, oral e escrita, é
fundamental para a participação social efetiva,
pois é por meio dela que o homem se comunica,
tem acesso à informação, expressa e defende
pontos de vista, partilha ou constrói visões de
mundo, produz conhecimento.
Segundo Ferreiro (1989, p.69), muito antes de
serem capazes de ler, no sentido convencional do
termo, as crianças tentam interpretar os diversos
textos que encontram ao seu redor (livros,
embalagens comerciais, cartazes de rua), títulos
(anúncios de televisão, estórias em quadrinhos,
etc.).
Ainda Ferreiro (1988, p.43) afirma que, “a escrita
não é um produto escolar, mas sim um objeto
cultural, resultado do esforço coletivo da
humanidade”, e a idéia de considerar a
aprendizagem da leitura e escrita como um
processo de aprendizagem escolar torna difícil
reconhecer que o seu desenvolvimento comece
muito antes da escolarização, principalmente para
as crianças do meio urbano, que, mesmo sem
incentivos familiares, têm contato com diversos
tipos de textos.
Também se pode observar que quase todas as
crianças que residem em áreas rurais têm menos
contato com o mundo letrado e geralmente não
freqüentam salas de educação infantil, sendo
assim, possuem menos oportunidades de se
questionar e pensar sobre o escrito, a não ser que
vivencie atos de leitura e escrita em seu cotidiano,
pois mesmo que esta leitura ou escrita não seja
transmitida a ela, apenas ao observar, sua
tendência é imitar e, de acordo com Ferreiro
(1989), ao imitar a criança aprende e compreende
muitas coisas, porque a imitação espontânea não
é cópia passiva, mas sim tentativa de
compreender o modelo imitado. As crianças
imitam os adultos tanto no ato de leitura como no
ato da escrita, porém o ato de imitar escrever é
uma coisa e o ato de interpretar esta imitação é
outra.
Segundo o PCN (1997), as crianças não entram
nas escolas completamente desinformadas, mas
possuíam um conhecimento prévio, porém as de
famílias
mais
favorecidas
têm
maiores
oportunidades de participação em atividades
sociais mediadas pela escrita, possuem mais
experiências significativas com a escrita do que as
crianças das classes menos favorecidas, e essas
diferenças, se expressam no desempenho escolar
das mesmas.
Outra questão relevante apontada pelo PCN
(1997, p.21), é que para aprender a ler e a
escrever, a criança precisa construir um
conhecimento de natureza conceitual, ela precisa
compreender não só o que a escrita representa,
mas também de que forma ela representa
graficamente a linguagem.
Segundo Soares (2004), para ter acesso ao
mundo da leitura e da escrita e nele poder viver,
são necessários dois passaportes: o domínio da
tecnologia da escrita e, o sistema alfabético e
ortográfico, além de desenvolver competências de
uso dessa tecnologia, saber ler e escrever em
diferentes situações e contextos, passaporte que
se obtém com o processo de letramento.
Muitas crianças, apesar de viverem em locais
isolados se interessam pelo mundo letrado, porém
apenas na escola, por intermédio dos professores
têm oportunidades de vivenciar este ato no
concreto, pois em casa raramente há incentivo dos
pais que, muitas vezes, se omitem e atribuem
essa responsabilidade de garantir a seu filho o
acesso aos saberes lingüísticos necessários para
o exercício da cidadania, exclusivamente para a
escola. Muitos deles têm pouco grau de
escolaridade, uma vez que, em função da
necessidade
de
trabalhar
na
infância
abandonaram os estudos.
Essa responsabilidade é tanto maior quanto menor
for o grau de letramento da comunidade em que
vivem essas crianças, conforme apontado no PCN
(1997, p. 23)
Sem o contato com portadores de textos, a criança
aprenderá apenas a ler ou decodificar as palavras,
será considerada alfabetizada, porém, sem fazer
interpretações da mesma ou estabelecer suas
funções no contexto social, entretanto, de acordo
com Soares (2004), os pressupostos teóricometodológicos de propostas didáticas ou métodos
tem de garantir o acesso à alfabetização
associada aos usos da língua escrita, para que as
crianças alfabetizadas de hoje, não se tornem os
analfabetos funcionais de amanhã.
Nas citações do GEEMPA (1994), a vinculação
entre a escola e a comunidade é um elemento
essencial para o sucesso escolar das crianças de
classes populares, desde que a escola se insira,
através dos seus recursos didáticos e
pedagógicos, no contexto sócio-cultural dessas
populações.
Material e Métodos
A pesquisa foi realizada em uma escola da Rede
Particular de Ensino de caráter filantrópica, situada
na área rural da zona norte da cidade de São José
dos Campos/SP, destinada ao ensino fundamental
(1° ao 5º ano) e infantil (apenas uma sala mista,
com crianças com idade entre 4 e 5 anos),
atendendo num total de 123 (cento e vinte e três)
crianças. A coleta de dados realizou-se por meio
de análise da lectoescrita, foi desenvolvida a partir
de um “kit” contendo materiais para leitura e
escrita (jornais variados, panfletos, portadores
XIII Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e
IX Encontro Latino Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba
2
textuais diversos, conta de água, luz, telefone,
bulas de remédios, cupom fiscal, revistas, livros) e
fichas contendo situações para escrita e leitura,
sendo o objetivo da análise, identificar os níveis da
escrita onde se encontram os alunos pesquisados,
relacionar o papel da escola na aquisição da
lectoescrita e verificar a contribuição da família
neste processo.
Resultado
Dentre as nove crianças analisadas com idade
entre cinco e oito anos, tendo todas freqüentadas
a educação infantil, em relação a escrita verificouse que:
- Uma criança possui escrita alfabética, porém
com erros ortográficos e de segmentação, mas
atingiu este nível no inicio do 2° ano do ensino
fundamental, ou seja, no terceiro ano que
freqüenta sala de alfabetização.
- Dois alunos estão no nível silábico alfabético, ou
seja, começaram a ter noção de sílaba, entretanto,
estabelece um conflito no qual faz com que ela
procure
soluções,
estas
crianças
estão
freqüentam, uma o primeiro ano de alfabetização e
a outra o segundo ano de educação infantil.
- Uma no nível silábico com valor sonoro, ela
escreve uma letra para cada sílaba, mas com as
letras que pertence a palavra, esta freqüentou dois
anos de educação infantil e esta no primeiro de
alfabetização.
- Uma criança no nível silábico sem valor sonoro,
mas em conflito, pois ela utiliza as vezes uma letra
para cada sílaba, e outras vezes, utiliza duas
letras para cada sílaba, porém geralmente as
letras utilizadas não pertence a palavra, esta
freqüentou um ano de educação infantil e esta no
primeiro ano de alfabetização.
- Quatro crianças estão no nível pré-silábico, isto é
utilizam letras e números para escrever, porém
sem se preocupar com a quantidade de códigos,
destes, três crianças freqüentam o segundo ano e
uma o primeiro ano de educação infantil.
Em relação à leitura, pode-se observar que, ao
colocar estas crianças diante do kit preparado
para verificar seus conhecimentos a seu respeito,
apesar de oito crianças das nove analisadas já
freqüentarem a escola por mais de um ano,
demonstraram muita dificuldade de identificar
diferentes os portadores textuais, pois diante de
vários portadores, quando pedido para ela separar
aqueles em que ela conhecia o conteúdo, ou seja,
sabia o que estava escrito nele, todas escolheram
um livro de histórias e apenas três também
separaram panfleto, e, ao pedir para falarem para
que aquele livro era utilizado, todos disseram que
o livro de histórias servia para contar historinhas, e
os que separaram os panfletos disseram que “era
para cortar os desenhos e escrever o nome deles”.
E, ao questionar a importância da lectoescrita,
todos realizaram citações positivas expressando
sua importância para eles, apesar das respostas
não serem exatamente a mesma, apresentaram o
mesmo sentido.
Discussão
Conforme os resultados obtidos, pode se verificar
que de acordo com o PCN (1997) as crianças
possuem conhecimentos mesmo antes de iniciar
um processo escolar, porém, devido os difíceis
acesso a informação, o desenvolvimento de suas
aprendizagens torna-se mais lenta.
A afirmação de Ferreiro (1989) em relação à
imitação não pode ser analisada, visto que a
maioria dos pais dos alunos, não possui hábitos
de leitura.
Ao pedir que as crianças elaborassem uma lista e
escrevessem uma música, elas o fizeram sem
questionamentos, sem gerar conflitos, devido à
freqüência desta atividade realizada na escola,
este fato esta de acordo com as citações de
Soares (2004), onde destaca a importância de
desenvolver o processo de alfabetização
associado aos usos da língua escrita, ou seja, o
material didático concreto.
Ao tentar analisar os conhecimentos prévios das
crianças em relação à leitura, esta prática ficou
limitada em livros de histórias e panfletos, o
primeiro devido à rotina em sala de aula, e o
segundo devido o panfleto ser utilizado como
recurso didático, esta de acordo com Ferreiro
(1989), quando afirma que mesmo antes de ser
alfabetizadas as crianças reconhecem os textos
que fazem parte de seu cotidiano.
Estas crianças por viverem em áreas rurais,
possuem menos oportunidades de contato com o
mundo letrado, tornando-se mais difícil para elas
vivenciarem este processo na escola, sendo este
fato abordado em Ferreiro (1988) que afirma a
importância da comunidade neste processo.
Outra questão importante é a presença dos pais
no processo de alfabetização, porém, devido ao
pouco grau de escolaridade, por terem que
trabalhar ainda jovens, e a falta de hábitos de
leitura e escrita, muitas vezes por não
conseguirem interpretar o texto lido, as crianças
em seu ambiente familiar não vivenciam práticas
de leitura e escrita e consequentemente não
recebem estímulos e nem se sentem motivados
para a realização destas práticas, indo de acordo
com a citação de PCN (1997), quando afirma que
as crianças de classes menos favorecidas
enfrentam mais dificuldades que as demais devido
às raras experiências vivenciadas. Também este
resultado obtido está citado no PCN (1997, p.21)
quando relata a necessidade da criança construir
XIII Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e
IX Encontro Latino Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba
3
conceitos de leitura e escrita, a partir das
experiências vivenciadas em seu cotidiano.
Neste sentido, é muito importante o papel da
escola, em elaborar propostas didáticas em função
do tipo da população em que ela se destina,
sabendo que ela é o único ambiente letrado que
faz parte do mundo da criança, caberá a ela
desenvolver na criança o gosto pela leitura e de
proporcionar momentos significativos de leitura,
onde a criança poderá perceber sua importância e
utilização no convívio social, e também perceber
que sua prática facilita suas relações sociais,
conforme citado no PCN (1997, p.23) e também
na série GEEMPA (1994).
Conclusão
Por meio dos objetivos propostos, dos resultados
obtidos, das análises realizadas com as crianças é
possível verificar que o convívio em um ambiente
letrado
facilita
no
desenvolvimento
da
aprendizagem, e, quando este ambiente não esta
presente de forma involuntária no cotidiano das
crianças, é necessária intervenção familiar, mas
infelizmente esta intervenção familiar não ocorre,
deixando esta responsabilidade para a escola e,
com isso, muitas vezes, retarda a aprendizagem
da lectoescrita. Portanto, as crianças conseguem
desenvolver a escrita e a leitura, mas, esta leitura
passa a ser apenas uma decodificação daquilo
que está escrito, e não, a assimilação da palavra
com o seu significado e principalmente interpretar
a função social de um texto, pois, o processo de
letramento se desenvolve ao longo de muitas
experiências que deverá ser vivenciada pelas
crianças.
Referências
- Brasil. Secretaria de Educação Fundamental.
Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília, 1997.
- FERREIRO, Emília.
Alfabetização
processos. São Paulo: Cortez, 1989.
em
- FERREIRO, Emília e Ana
Teberosky.
Psicogênese da Língua Escrita. Porto Alegre:
Artmed, 1999.
FERREIRO,
Emília.
Reflexões
Alfabetização. São Paulo: Cortez, 1988.
sobre
- SOARES, Magda. Letramento: um tema em
três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.
- Grupos de Estudos sobre Educação –
Metodologia de Pesquisa e Ação / Alfabetização
em Classes Populares. Porto Alegre: Kuarup,
1994.
XIII Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e
IX Encontro Latino Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba
4
Download

práticas de alfabetização e letramento no contexto educacional