POLITICA PÚBLICA DE QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL: análise crítica dos Planos Nacionais de Qualificação Profissional do Trabalhador 1 Sandra Regina Paz da Silva 2 Ramon de Oliveira Resumo: Este estudo analisar a política pública de qualificação profissional do trabalhador consubstanciada nos Planos Nacionais de Qualificação Profissional – PLANFOR e PNQ. Buscamos com este estudo identificar as similitudes e diferenças e/ou as rupturas e continuidades dos referidos Planos. Utilizamos como metodologia a análise documental, e para efeito de análise consideramos os registros produzidos pelo Estado, em sua forma estrito senso como construtos históricos. Deste modo, analisamos os principais documentos, pareceres e normativas que revelaram a institucionalidade dos Planos como política pública. A técnica utilizada para análise foi a análise de conteúdo, onde decodificamos os documentos através da análise temática. As conclusões parciais da investigação evidenciam que mais do que políticas de governos distintos, os planos analisados têm se consolidado como política de Estado de cunho neoliberal. Palavras-chave: Política de qualificação profissional, trabalhador, neoliberal. PUBLIC POLICY FOR PROFESSIONAL QUALIFICATION: critical analysis of the National professional Training of Workers Abstract: This study examined the public policy of professional qualification of workers embodied in the National Professional Qualification - PLANFOR and PNQ. In this study we sought to identify the similarities and differences and / or the ruptures and continuities of these plans. Methodology to be used as document analysis, and for the purpose of analysis consider the records produced by the State, in its strict sense so as historical constructs. Thus, we analyzed the main documents, opinions and norms revealed that the institutionalization of plans and public policy. The technique used for analysis was the analysis of content, which decoded the documents through the thematic analysis. The research findings show that partial rather than policies of different governments, the plans have been reviewed and consolidated policy of neoliberal state. Keywords: Policy, professional training, worker, neoliberal state. 1 2 Doutoranda. Universidade Federal de Pernambuco. E-mail: [email protected] Doutor. Universidade Federal de Pernambuco. E-mail: [email protected] 1 1. O NOVO JÁ NASCE VELHO: uma introdução [...] antes de tudo, não existe só um único caminho para o futuro. Há outras trilhas e direções a serem seguidas. Encontrar o novo, sabendo retirar do velho o que nos permita estar sempre reconstruindo perspectivas futuras [...] (OLIVEIRA, 2003, p.9, grifos nossos). Vislumbrar a possibilidade do novo nos coloca em uma situação de otimismo em relação às perspectivas futuras. No entanto, quando nos voltamos às políticas de qualificação profissional no Brasil constatamos os seus (des) caminhos e sua (des) qualificação (OLIVEIRA, 2003). Para enfrentarmos esta perspectiva nos defrontamos com uma realidade: o que parece novo já nasceu velho. A intenção deste estudo foi analisar o paradoxo da “nova institucionalidade” da política pública3 de qualificação profissional, que compreende o PLANFOR e o PNQ. A compreensão da problemática deste paradoxo pressupõe, antes de tudo, situá-la no seio das transformações capitalistas das últimas décadas, esforçando-nos em tecer os fios invisíveis (CÊA, 2003) que articulam a um só tempo, as transformações de base produtiva, o Estado capitalista e a ideologia da qualificação profissional. Analisar as políticas contemporâneas de qualificação do trabalhador, sem levar em consideração tais aspectos torna-se uma ação inócua, pouco substantiva. As transformações relacionados. capitalistas envolvem dois movimentos, intimamente As mudanças de base produtiva estrutural e as de bases políticas e ideológicas. Ou seja, as transformações introduzidas pela denominada Terceira Revolução Industrial com a emergência de novas tecnologias no processo produtivo e a implementação do ideário neoliberal. Não obstante desde a segunda metade do século XX com a necessidade de aumentar os lucros, e num contexto de queda tendencial de ampliação do capital (MÉSZÁROS, 2002), o problema do aprimoramento da força de trabalho passou a assumir prioridade no desenvolvimento das sociedades capitalistas avançadas. E isto por uma razão 3 Quando utilizamos neste estudo a categoria política pública estamos levando em consideração os construtos e formulação de política pública desenvolvido por Azevedo Lins (2004, p. 5-7) em seu livro “A educação como política pública” e de Hofling (2001). De acordo com estas autoras Política Pública representam a materialidade da intervenção do Estado, ou o “Estado em ação”, com vistas a implantar um projeto de governo, através de projetos, programas e ações voltadas para setores específicos da sociedade. Deste modo, para Azevedo Lins (2004, p.5) conceituar política pública implica também considerar os recursos de poder que operam na sua definição e que têm nas instituições do Estado, sobretudo na máquina estatal, o seu principal referente. 2 fundamental: o novo padrão capitalista de acumulação passou a ser redefinido em função da introdução de novas tecnologias de gestão, produção e serviços; tecnologias que passaram a exigir um novo perfil de trabalhador assalariado com novas competências e habilidades. Estas competências4 são assim definidas: A capacidade de comunicar-se adequadamente, com o domínio dos códigos e linguagens, incorporando, além da língua portuguesa, a língua estrangeira e as novas formas trazidas pela semiótica: a autonomia intelectual, para resolver problemas práticos utilizando os conhecimentos científicos, buscando aperfeiçoar-se continuamente; a autonomia moral, através da capacidade de enfrentar as novas situações que exigem posicionamento ético; finalmente, a capacidade de comprometer-se com o trabalho, entendido em sua forma mais ampla de construção do homem e da sociedade, através da responsabilidade, da crítica, da criatividade (KUENZER, 2000, p. 32). Tais transformações caracterizam uma mudança estrutural da base técnica das atividades econômicas e da composição orgânica do capital. O reflexo mais plausível dessa mudança estrutural se deu com o processo de reestruturação produtiva do capital, com a convivência passiva e harmoniosa dos modelos e paradigmas produtivos, ou seja, a combinação do paradigma taylorista/fordista e o toyotista5, resultante do processo de acumulação flexível do capital6 (ANTUNES, 2005). 4 Para um estudo crítico acerca da Pedagogia das Competências ver o livro de RAMOS, M. N. A pedagogia das competências: autonomia ou adaptação? São Paulo: Cortez, 2001. Outro texto que problematiza a questão é o de RODRIGUES, Daniel (2007), intitulado: a impossibilidade da ressignificação das competências numa perspectiva marxista. Disponível em: http://www.anped.org.br. GT: Trabalho e Educação. 5 O modelo de acumulação flexível é marcado pelo confronto direto com a rigidez do fordismo. Ele se apóia na flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo. Caracteriza-se pelo surgimento de novos setores de produção, novas maneiras de fornecimento de serviços financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas altamente intensificadas de inovação comercial, tecnológica e organizacional. A acumulação flexível envolve rápidas mudanças dos padrões do desenvolvimento desigual, tanto entre os setores como em regiões geográficas, criando um vasto movimento do chamado emprego no ‘setor de serviços’ (HARVEY, 2000, p. 140). 6 A emergência do “novo modelo” de acumulação toyotista trouxe em sua essência aspectos mais de continuidade que de ruptura com o antigo modelo. Um dos aspectos fundamentais da continuidade é a manutenção do processo de expropriação da mais-valia, extraída extensivamente pelo prolongamento da jornada de trabalho, com acréscimo em sua dimensão absoluta e de maneira intensiva pelo aumento do ritmo de trabalho em sua dimensão relativa, ou seja, presencia-se uma intensificação do ritmo produtivo dentro do mesmo tempo de trabalho ou, até mesmo, quando esse se reduz. Essa forma de intensificação da exploração do trabalho ocorre quer pelo fato de os operários trabalharem simultaneamente com várias máquinas diversificadas, quer pelo ritmo e velocidade da cadeia produtiva. De modo geral, o toyotismo consegue se apropriar das atividades intelectuais do trabalho, que advêm da maquinaria automatizada e informatizada, aliada à intensificação do ritmo do processo de trabalho, configurando um quadro extremamente positivo para o capital na retomada dos ciclos de acumulação e na recuperação da sua rentabilidade. Nessa ótica, o toyotismo consegue reinaugurar um novo patamar de intensificação do trabalho, combinando, fortemente, formas relativas e absolutas da extração da mais-valia (ANTUNES, 2000, p. 37-56). A pedagogia emergente desse novo modelo busca consolidar formas de aprendizagem mascaradas de inovadoras, mas, em seus fundamentos sustentam os pilares próprios do capitalismo: a exploração do homem pelo homem. Houve, portanto, um recrudescimento, uma 3 A combinação destes modelos, com maior ênfase o de acumulação flexível, contribuiu para a proposição de políticas públicas de aprimoramento e qualificação da força de trabalho, nesse atual contexto histórico, passou a exigir mudanças na institucionalização da qualificação profissional, em todos os continentes. Exigências que se intensificaram nas três últimas décadas do século XX e se expandiram no limiar do século XXI. No Brasil foi introduzido, além de novos processos e modalidades de 7 formação /qualificação profissional, novos mecanismos de participação da sociedade civil e dos sujeitos sociais na realização e execução dos planos, projetos e programas de qualificação. Estes sujeitos passaram não só a executar as políticas de formação profissional, como a elaborar metodologias, assim como contribuiu para estabelecer o consenso entre capital e trabalho como demonstramos em estudos anteriores (SILVA, 2003). Outro exemplo da natureza desta nova institucionalidade são os conselhos que envolvem a qualificação profissional (como, por exemplo, o CODEFAT8) e as comissões de emprego; e de sujeitos, os sindicatos, as centrais sindicais e as diversas modalidades de organizações não governamentais. Entretanto, são as políticas públicas estatais, entre tantos outros acontecimentos, aquelas, que em nossa compreensão, traduzem e explicitam, mais concretamente, a materialidade do aprimoramento da força de trabalho, sob a reestruturação produtiva do capital e da reforma neoliberal do Estado. Estas políticas cumprem mais que um mero papel pedagógico, mas se vinculam a estrutura societal estabelecida. Conforme nos explicita Cêa et al (2007, p. 30): As políticas de formação do trabalhador são mais que meras respostas pedagógicas e formativas às mudanças estruturais que afetam todas as dimensões da vida social, o mapeamento e a explicitação dos fundamentos e das ações oficiais voltadas para a promoção dessa formação são instrumentos renovação da pedagogia instrumental para fortalecer, agora com maior intensidade, a dominação do capital sobre o trabalho, mediado pela qualificação profissional. 7 Segundo a LDB 9394/96 a Educação Profissional deve estar integrada as diferentes formas de educação, à ciência e a tecnologia. Trata-se, de um fator estratégico para o desenvolvimento sócio-econômico nacional, bem como para redução das desigualdades sociais e regionais (LODI, 2005, p. 125). Os objetivos da LDB no que tange a formação profissional se coadunam com os Planos que pretendemos analisar. 8 O CODEFAT – Instância tripartite e paritária, inicialmente com nove membros, sendo três de centrais sindicais de trabalhadores (CUT, Força Sindical e CGT – Confederação), três de confederações patronais (Confederação Nacional da Indústria, Confederação Nacional do Comércio e CNF – Confederação Nacional das Instituições Financeiras) e três representantes do governo federal (Ministério do Trabalho, Ministério da Previdência e BNDES). Com a incorporação de novas representações patronais e operárias o número de membros aumentou significativamente. Esse Conselho Deliberativo é responsável pela gerência dos programas e recursos do FAT. 4 de compreensão de como a educação do trabalhador se vincula organicamente a processos econômicos e políticos. Reconhecemos, neste estudo, que a política de qualificação profissional está no coração do aprimoramento e qualificação da força de trabalho. Que a ela envolve, reciprocamente, mudanças institucionais –jurídicas, políticas, sociais e econômicas. 2. MATERIALIDADE HISTÓRICA DA POLÍTICA DE QUALIFICAÇÃO: Nacionais de Qualificação (PLANFOR E PNQ). os Planos Interessou neste estudo apreender a materialidade histórica da política de qualificação profissional, implementada no Brasil nas últimas décadas a partir de dois governos distintos, FHC e Lula9. O marco temporal para iniciar as discussões referente às políticas foi a década de 90, pois é neste período histórico em que ocorre a reforma gerencial do estado brasileiro e, concomitantemente, as reformas no âmbito das políticas educacionais, inclusive a da educação profissional brasileira10, demandas por agentes de mando do capital, ou seja, os organismos internacionais (OLIVEIRA, 2001). Neste sentido, nossos estudos e análises partiram de dois planos que dão legitimidade a tal política, o PLANFOR (Plano de Formação Profissional), criado em 1996 no governo FHC e o PNQ (Plano Nacional de Qualificação Profissional) criado no âmbito do Ministério do Trabalho em 2003, no governo Lula através da resolução 333, em substituição ao PLANFOR. 9 O governo Lula teve início no ano 2003. Teve apoio das camadas populares e da esquerda brasileira. Tem se constituído como um governo de continuidade com os compromissos da burguesia brasileira e internacional. Sobre o caráter conservador do governo Lula, Pierre Anderson (2002) em uma conferência proferida no Rio de Janeiro, antes das eleições presidencias, anunciava a necessidade de nos tornar vigilantes frente às propostas políticas de partidos de esquerda. Outro autor que tem tecido considerações a respeito é Antunes, Ricardo em seu livro: A desertificação do governo neoliberal no Brasil: Collor, FHC e Lula. São Paulo: Autores Associados, 2003. Neste livro, o autor procura demonstrar as conseqüências e repercussões mais nefastas do neoliberalismo em nosso país, mostra-nos de que modo a pragmática erigida após o Consenso de Washington se enraizou na realidade brasileira, desde Collor até os dias atuais. Formula uma questão provocativa: quais são os traços de continuidade em três governos aparentemente tão diferentes, como os de Collor, FHC e mesmo de Lula? 10 Para um estudo aprofundado da Reforma da Educação Profissional ver a tese de doutoramento de OLIVEIRA, Ramon. Políticas do Ensino Médio e da Educação Profissional no Brasil – anos 90: subordinação e retrocesso educacional. 2001. 349f. Tese (Doutorado em Educação)- Faculdade de Educação, Universidade Federal Fluminense. Niterói/RJ. 5 Estes planos, no atual contexto das mudanças capitalistas contemporâneas têm se constituído como a expressão e materialidade vivas da “nova” institucionalidade11 da educação profissional brasileira. Forjados em um contexto sociohistórico de profundas transformações na base técnica produtiva, desencadeadas pela reestruturação produtiva do capital, em seus diversos planos socioeconômicos, culturais e político-ideológicos. Nosso objetivo consistiu em analisar a política de qualificação profissional implementadas pelos governos FHC e Lula, buscando identificar as rupturas e continuidades. Estas políticas muito mais do que políticas de governos distintos, tem se consubstanciado como política de Estado, estruturados sob lógica do capital. Esta lógica de acordo com Silva Jr & Sguissardi (1999, p.97): [...] faz do capitalismo um modo de produção expansionista e extremamente dinâmico em sua base produtiva, na economia, na política, na cultura e na necessária unidade social. Sua própria lógica, historicamente produzida, impõe-lhe constantes processos de rupturas e continuidades para sua própria manutenção. Coadunado a lógica reprodutiva do capital, a política de qualificação profissional, cuja expressão é o PNQ, mas do que rupturas com o velho sistema, apresenta continuidades. Verificamos nas análises dos planos aspectos de similitudes e continuidades do que rupturas. Mesmo os Planos apresentando discursos, estratégias, contornos e arcabouços diferenciados (PLANFOR E PNQ), não deixam de submeter-se, como política de Estado ao modelo neoliberal de acumulação capitalista flexível12 (HARVEY, 2000 e OLIVEIRA, 2003). Modelo que também exige uma forma específica de qualificação profissional, e que demanda um perfil de trabalhador para esse modelo de acumulação. 11 É importante esclarecer que entendemos, precisamente, as noções de rupturas quando comparamos o decreto 2208/97 com a lei 5692/71; de continuidades as reformas promovidas pelo PNQ sobre o PLANFOR. 12 Este modelo apresenta uma contradição insuperável: amplia desmesuradamente a certificação da força de trabalho sem a proporcional inserção da mesma na economia. Isto quer dizer que as mudanças institucionais promovidas pelo PLANFOR e, porque não, pelo PNQ, têm se revelado limitadas e impotentes para equacionar o problema do desemprego, em contextos neoliberais. Nas intenções do que pretendemos desenvolver no capítulo um chamamos a atenção para o fato das políticas de Estado transcender os limites provisórios do tempo de governo estabelecido constitucionalmente. Consideramos que a política de Estado muito mais do que determinada pelo tempo de governo constitucional é determinada pelas transformações mais amplas da economia: pelo modelo de acumulação e a base tecnológica das atividades econômicas. 6 Desta forma, este estudo revelou que independente de governos as propostas de formação para classe que vive do trabalho13, não apresenta possibilidades futuras de construir uma formação pautada em novas bases e que atenda os reais interesses dos trabalhadores. Estas políticas são forjadas em um contexto de desemprego estrutural e exclusão social, imposto pelo processo sociometabólico do capital (MÉSZAROS, 2001). Assim, foram capazes de recrudescer a teoria do capital humano sob a tese da empregabilidade, isto, na medida em que apresentam, no caso do (PNQ, 2003) a qualificação profissional como política pública e direito social (PNQ, 2003), e panacéia para o desenvolvimento econômico via inserção e reinserção dos trabalhadores no mundo da economia (PLANFOR, 1997). Estes planos reeditam em seus discursos a teoria do capital humano, pois parecem culpabilizar os trabalhadores pela sua pouca ou nenhuma empregabilidade. Mas do que qualificar com os fins de garantir os direitos sociais e a proclamada inclusão social, a qualificação dos trabalhadores consubstanciada nos referidos planos parece se alinhar a lógica capitalista de elevação da produtividade e competitividade econômica. 3. CONCLUSÃO Os sentidos e significados apreendidos na análise dos Planos nacionais, leva-nos as seguintes conclusões: A análise dos Planos demonstra que PNQ não trata de um novo plano, mas de um instrumento normativo de reforma da institucionalidade da educação profissional, pois não há diferenças substâncias em relação aos temas que os envolvem. As terminologias utilizadas dão o mesmo significado para temas que se pretende apresentar como diferente. Embora não possamos deixar de reconhecer que com a nova institucionalidade da qualificação inaugurada com o PLANFOR , a qualificação dos trabalhadores tenha deixado de se sujeitar ao monopólio do empresariado via sistema “S”, portanto, ter sido democratizada na década de 90 pelo Estado; admitindo, desde então, várias organizações da sociedade civil na gestão e execução da qualificação profissional, a mesma tem se manifestado impotente para reverter o problema da exclusão social pela reinserção dos excluídos na economia. Isto revela um fato relevante: a democratização institucional da 13 Com as ideologias apologéticas de fim da história e conseqüentemente, do fim das classes fundamentais Antunes (1995) busca responder a este debate teórico-prático com o conceito de classe social ampliada, aquela que vive do trabalho, para diferenciar da classe de mando representativa do capital. 7 qualificação profissional não é suficiente para inserção e reinserção dos trabalhadores nas ocupações existentes. Não há rupturas entre o PLANFOR e o PNQ o que existe são elementos que se complementam em sua forma e conteúdo, com as estratégias de atuação e fundamentação. A empregabilidade e a competência são utilizadas como ideologias em face do processo de reestruturação produtiva do capital. O PLANFOR se constituiu enquanto uma política renovada (CÊA, 2003) de qualificação profissional atrelada a reforma gerencial do Estado e o PNQ se configura como o coroamento e permanência das principais diretrizes que sustenta tal reforma: a diminuição dos recursos como fator de eficiência, descentralização com forte participação da sociedade civil, privatização do fundo público (FAT); ênfase na liberdade de mercado (cada sujeito/trabalhador deve buscar por conta próprio torna-se competente, empregável para disputar no livre mercado um emprego), arrefecimento das lutas sociais com o processo de concertação social (ALVES, 2001). Os Planos se consolidam como política pública compensatória de preparação da força de trabalho para informalidade e trabalho precário (SALES, 2006). A inclusão pretendida reforça a inclusão excludente, ao reforçar a dualidade histórica da qualificação profissional brasileira (KUENZER, 2001 e 2008). Por fim, pode-se afirmar que a principal ruptura do PNQ em relação ao PLANFOR diz respeito aos montantes de recursos investidos na política, tema não abordado nos documentos oficiais do PNQ. Interrompe-se com o PNQ o processo de ampliação dos recursos para qualificação profissional e a consequente melhoria da qualidade. Buscou-se a qualidade pedagógica no discurso, mas na prática não é oferecida as reais condições. Não obstante a materialidade histórica destes Planos na contemporaneidade é a expressão de um projeto formativo alinhado a lógica de reprodução capitalista, que subjuga, aliena e empobrece a classe que vive de trabalho. Esta é a mais nova institucionalidade da política pública de qualificação profissional constituída no Brasil. 4. REFERÊNCIAS ALVES, G. O Novo (e precário) mundo do trabalho: reestruturação produtiva e crise do sindicalismo. São Paulo: Biotempo, 2000. 8 AZEVEDO, Lins de M. J. A educação como política pública. 3º Ed. Campinas/ SP: Autores Associados, 2004. 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