GERAÇÃO DE COMPETÊNCIAS NO BRASIL: UMA ANÁLISE DO
PLANO NACIONAL DE QUALIFICAÇÃO DO TRABALHADOR
(PLANFOR)
Autoria: Derli de Souza Dias e Nelio Oliveira
Resumo:
Hoje, a preocupação com conceitos de competências e sua geração é uma realidade nas
diversas sociedades modernas e entre seus diversos atores, sejam organizações, governos,
sindicatos e trabalhadores. De várias formas, os países estão tomando medidas para viabilizar
o processo de desenvolvimento de competências, seja para ajudar as empresas, os
trabalhadores ou a sociedade como um todo. E no Brasil, como não poderia ser diferente, essa
preocupação já existe, apesar de nosso atraso em termos de qualificação em relação às
economias mais modernas. O Ministério do Trabalho vem implementando uma série de
programas sociais que enfocam tanto a educação profissional como a geração de emprego e
renda. Dentro destes, destaca-se o Plano Nacional de Qualificação do Trabalhador – Planfor –
que direciona seus programas para o desenvolvimento integral do indivíduo através de ações
que estimulem a formação do cidadão produtivo. O presente trabalho tem como proposta
apresentar uma descrição do Planfor, enfocando seus objetivos, atuações, resultados e
avaliações. Além disso, será realizada uma análise do mesmo, a partir do Plano Estadual de
Qualificação de Minas Gerais (PEQ/MG), que é um dos braços do Planfor. .
1 - Introdução
O mercado globalizado e competitivo traz reflexos significativos ao mundo do
trabalho, pois a possibilidade de se gerar empregos fica vinculada a capacidade de inovar
produtos, observando-se sempre um padrão mundial de eficiência e qualidade. Passa-se a
exigir um novo perfil e conceito de qualificação, que sai do simples domínio de habilidades
técnicas para uma formação mais ampla e sólida. Este contexto envolve a sociedade como um
todo, deixando de ser necessidade exclusiva da empresa ou interesse particular do trabalhador.
Assim, a qualificação para o trabalho exige uma integração e articulação entre os diversos
atores sociais - governos, empresas, trabalhadores e educadores -, sendo necessário, para
tanto, um repensar sobre a separação existente entre a educação e formação profissional.
A educação profissional, com certeza, não cria empregos. Se não estiver vinculada a
uma política maior, pode gerar um contingente de “desempregados qualificados”. Porém, é
um elemento fundamental para a “empregabilidade”, principalmente quando se considera que,
para a obtenção de uma economia fortalecida e competitiva, um país necessita de pessoas
qualificadas e produtivas. Enfocando o Brasil, um grande desafio é conseguir estruturar,
simultaneamente, uma rede integrada de educação profissional, com capacidade e
competência para qualificar e/ou requalificar, e erradicar o analfabetismo, principalmente de
sua população economicamente ativa.
De várias formas, os países estão tomando medidas para viabilizar o processo de
desenvolvimento de competências, seja para ajudar as empresas, os trabalhadores ou a
sociedade como um todo. E no Brasil, como não poderia ser diferente, essa preocupação já
existe, apesar de nosso atraso em termos de qualificação em relação às economias mais
modernas. Nesse escopo é que foi criado o Plano Nacional de Qualificação do Trabalhador
(Planfor), programa do Ministério do Trabalho que tem como propósito não somente
1
qualificar mão-de-obra, como também aumentar a probalidade de obtenção de emprego e
geração de renda.
A proposta do presente trabalho é, a partir do Plano Estadual de Qualificação de Minas
Gerais (PEQ/MG), parte integrante do Planfor, verificar junto a pessoas ligadas ao plano sua
visão de como está se dando o processo, em termos de objetivos, participação de atores
sociais e resultados.
2 - Referencial Teórico
Antes de se discutir conceitos ou outros aspectos relacionados a competência, é
necessário visualizar como esse tema nasce e quais as razões que levam organizações e
demais atores sociais a uma preocupação atual com o mesmo.
Não se questiona mais as modificações ocorridas nas organizações nos últimos anos.
De um modelo estático e assentado numa formalidade e padronização, verifica-se, cada vez
mais, novas exigências de flexibilidade e inovação. Eventos não previstos estão se
apresentando para as organizações com mais freqüência. A complexidade do ambiente e seu
dinamismo se avolumam. Por questões ligadas as novas tecnológicas de microinformática, ao
aumento da competitividade em nível global, ou mesmo devido as novas técnicas
administrativas de influência japonesa, os ambientes organizacionais estão sendo
pressionados a constantes mudanças, procurando adaptações a novas realidades.
Assim, a competição se acirrou e um dos elementos para enfrentar essa nova realidade
dinâmica, complexa e competitiva, em que é necessária uma maior preocupação com o
cliente, com a qualidade e com o preço, é ter um diferencial em termos de recursos humanos.
Não é questão apenas de se possuir um grande estoque de mão-de-obra barata e excedente,
como foi o diferencial de países como o Brasil por longo tempo, mas uma utilização efetiva
desses recursos em termos de maior produtividade, flexibilidade, adaptação e inovação.
Dessa forma, como afirma MERTENS (1996), a competência e sua preocupação nasce
com essas transformações produtivas e as modificações no mercado de trabalho, exigente de
novos perfis profissionais.
2.1 – Elementos para a Elaboração do Conceito de Competências
A base da competência ou de desenvolvimento de competências está ligada a união de
aspectos educacionais e do trabalho (BARATO, 1998), avançando nas formas tradicionais de
educação para o trabalho.
A formação tradicional que se verificou em escolas, centros e até nas próprias
empresas não correspondem às atuais necessidades organizacionais, dos trabalhadores e da
sociedade como um todo. As formas isoladas de educação e experiência advindas do passado
não possibilitam uma atuação no trabalho em que se exige conhecimento amplo, dinâmico e
flexível. É necessário um avanço na simples formação técnica e na noção tradicional voltada
para aspectos objetivos do trabalho, ligados, visivelmente, ao perfil requerido para
determinados cargos (ZARIFFIAN, 1996).
Nessa nova realidade que se apresenta, como aponta ZARIFFIAN (1996), o
trabalhador necessita assumir novas responsabilidades e uma maior reflexividade no trabalho,
ou seja, constante questionamento e visão crítica, numa forma de constante aprendizagem. Em
verdade, o que se procura é um aprendizado que atenda as novas realidades do mundo do
trabalho de forma efetiva, mesclando a educação ou o aprendizado formal e o aprendizado no
trabalho.
2
Além desses aspectos conceituais, DUCCI (1996) lembra que outros apresentam-se
ainda com relevância, quando se discute uma gestão pela competência ou até um
posicionamento social pelo desenvolvimento de competências, tais como: avaliação,
participação de atores sociais no processo, normalização e certificação.
Com respeito aos atores sociais envolvidos no processo, fica o questionamento sobre
quem será responsável pela geração dessas competências. O Estado, empresários, sindicatos,
além de outros são chamados a participar como aponta ZARIFFIAN (1996), pois todos são
responsáveis e serão beneficiados no processo. Ao mesmo tempo que todos serão
prejudicados pelo não desenvolvimento das competências.
Em relação às questões de normalização e de certificação, DUCCI (1996) lembra que
é necessário determinar quais são as habilidades ou competências necessárias, quem as
determinará, quem avaliará o processo e quem emitirá possíveis certificações. A normalização
e a certificação apresentam grandes vantagens, pois poderá possibilitar economia de recursos,
a homogeneização nos processo de formação e a possibilidade maior de mobilidade, aspecto
importante quando se discute hoje a empregabilidade.
De forma geral, esses seriam os elementos que subsidiariam a formação de um
conceito de competência. Acontece que, na realidade, a conceituação é situacional. Muito se
depende de como a sociedade espera que seja a atuação e avaliação do trabalhador em sua
realidade de trabalho. Alguns discutem que o conceito de competência deve se ligar mais aos
indivíduos, seus conhecimentos, habilidades etc., outros afirmam que o conceito deve se
prender ao trabalho a ser realizado e o comportamento esperado do indivíduo que nele atua.
Assim, o conceito ficará em aberto e será discutido os modelos apresentados em alguns países
que darão mostras de como eles procuram conceituar competências.
2.2 – Os Modelos de Competências
Apesar de muito consenso a partir das considerações feitas acima, os países buscam
resolver os problemas ligados ao tema ou sua forma de implementação de maneiras
diferentes. Isso deve ser visto de forma natural, desde que os modelos de implantação de
gestão de competências devem atender as particularidades de cada pais, suas características
próprias, realidades, história, cultura, objetivos, etc. Essas “variedades” de modelos, além de
atender as particularidades dos países, traz um enriquecimento ao tema, fazendo com que,
desse fato, surjam perspectivas de grande avanço, devido a diversidade de opiniões e pontos
de vista, como aponta DUCCI (1996).
Como apresentado por MERLE (s.rf.a.), na Alemanha, pode-se verificar o
engajamento das empresas, principalmente no financiamento do sistema de gestão de
competências, sem entretanto desprezar a participação dos trabalhadores, por intermédio dos
sindicatos. O grande envolvimento das empresas faz com que esse sistema tenha amplo
reconhecimento por parte das mesmas no momento de contratações de mão-de-obra. O
modelo preocupa-se com aspectos ou níveis mais básicos de formação, que podem gerar uma
infinidade de condutas adequadas a várias novas situações. Apoia-se numa característica
própria daquele país que são os mercados de trabalho fortemente estruturados. Preconiza
também uma separação entre a formação inicial e a contínua voltada para aqueles que já estão
no mercado de trabalho. A principal crítica a esse sistema é de que ele se aproxima demais do
sistema tradicional do tipo escola, propiciando capacidade analítica aos indivíduos, mas não
de rendimento para a realização de tarefas.
O modelo inglês, por sua vez, adota um sistema de geração de comportamentos
específicos, visando o cumprimento de funções correspondentes a um tipo de situação.
Aproxima-se muito do sistema de certificação de qualidade da indústria, como apontado por
MERLE (s.rf.a.). De forma geral, as empresas ditam as qualificações necessárias, enquanto
3
órgãos governamentais e um conselho nacional administram, normalizam, apoiam e regulam
o sistema. Porém, a habilitação é fornecida por organismos de certificação via centros de
avaliação. É um sistema aberto, em que se procura, através de documentação e auditorias,
uma integração, um rigor e uma qualidade para o sistema ( TAYLOR, 1996 ).
Críticas ao modelo britânico vão de encontro ao fato de que ele atende mais as
empresas que os indivíduos. Além disso, ele propicia verificar o cumprimento de uma tarefa
em determinada situação, o que não garante que isso irá acontecer de maneira efetiva em
situações concretas e diversas (BARATO, 1998; ZARIFIAN,1996).
Já o modelo francês aproxima-se mais do modelo alemão, apesar de não possuir os
mercados profissionais fortemente estruturado como naquele país. Conforme MERLE
(s.rf.a.), é um modelo que se preocupa com títulos que reflitam as qualidades da pessoa de
forma a justificar sua classe de emprego. Preconiza a qualidade deste titulo pelo fato da
independência em relação as forças do mercado de trabalho, e independência em relação as
funções específicas requeridas pelas empresas.
O modelo espanhol divide-se em formação profissional de base que são os tradicionais
e a formação profissional específica. É nítida a preocupação com a entrada de novos
indivíduos no mercado de trabalho e também da preparação para novas habilidades. Para isso,
ele se centra na renovação da formação profissional para atender a evolução das qualificações
exigidas de forma a fornecer certificados de validade nacional e internacional. É nítido,
também, o seu objetivo de inserção e reconhecimento de seu sistema na comunidade européia
(GILS, 1996).
A partir da análise dos sistemas europeus, pode-se verificar uma polaridade nas
preocupações. De um lado, existe uma maior preocupação com a demanda, e de outro, maior
com a oferta. Ou seja, alguns modelos se preocupam em atender as empresas e sua demanda
por mão-de-obra qualificada, enquanto outros, com os indivíduos, sua qualificação para
inserção e permanência no mercado de trabalho.
Como apontado por BARATO (1998), os primeiros preocupam-se com
comportamentos observáveis e desempenhos requeridos, formando pessoas para funções
específicas e já catalogadas. Os outros preocupam-se com o indivíduo, sua formação e o
desenvolvimento de competência, independente de um desempenho previamente definido;
forma pessoas com uma condição mais ampla e com possibilidades de inserção em várias
situações e funções as mais diversas.
Tomando STEFFEN (1999), o primeiro grupo conceituaria competência como:
“conjunto de habilidades e conhecimentos que se aplicam no desempenho de uma função
ocupacional a partir dos requerimentos impostos pelo emprego”, enquanto isso, o segundo
grupo conceituaria como a “capacidade de alguém, que dispondo de conhecimentos,
habilidades e atitudes necessárias para exercer uma profissão, pode resolver problemas
profissionais de forma autônoma, flexível, e está capacitado para colaborar em seu entorno
profissional e na organização do trabalho.”
Voltando-se para a América do Norte, o exemplo canadense, conforme BARATO
(1998), é extremamente rico com diversos atores agindo e programas implantados ao mesmo
tempo, havendo, inclusive, o questionamento da existência de um modelo canadense. Apesar
das normas técnicas serem emitidas pelo governo central, o “modelo” é caracterizado pela sua
descentralização, pois sua implantação é feita de forma voluntária. Explicando melhor, as
normas do governo central são apresentadas mais como referência do que como um sistema
obrigatório ao país. Entretanto, apesar desse aspecto não obrigacional, é nítida a preocupação
com competências, principalmente aquelas consideradas básicas, ou seja, aquelas que se exige
em várias áreas ocupacionais, como, por exemplo, as acadêmicas, as de desenvolvimento
pessoal e de trabalho em equipe.
4
Além do aspecto normativo, os projetos do governo central tem também função de
fornecer informações, desenvolvimento de padrões, estudos setoriais, determinação de
habilidades essenciais, dentre outras. Esses projetos contam sempre com representantes dos
diversos atores sociais como especialistas, educadores, representantes de trabalhadores e
empresários. Assim, o exemplo canadense é muito mais de suporte e apoio do que de
normalização e certificação, que fica mais a cargo dos interessados.
Tomando por base as considerações de STEFFEN (1999), observa-se que, nos Estados
Unidos da América, não existe um modelo único, pois cada estado é autônomo, não existindo
um sistema nacional unificado. A própria definição de competência é de responsabilidade dos
entes federados. No nível nacional, existem apenas alguns delineamentos, principalmente no
sentido de identificar competências genéricas comuns. Naquele país, o processo de
normalização, formação e certificação de competência é voluntário também. O processo é
conduzido pelos empresários com o apoio do setor educacional. As normas são muito
flexíveis, sendo continuamente atualizadas.
Já o sistema mexicano, conforme MACIAS (1996), apresenta-se de forma diferente
dos dois anteriores, pois caracteriza-se por seu aspecto normativo, pela busca de competências
específicas em loco e pela existência de uma rede de avaliação e certificação. O sistema é
caracterizado pelo seu formalismo, com normas para avaliação nacional. Existe um conselho
que trata dessa relação de normas. As competências são específicas para uma atuação
determinada do trabalhador e independe de como essa competência foi adquirida. As
avaliações são realizadas no local de trabalho por intermédio de centros de avaliação ou
avaliadores independentes, que são autorizados pelos organismos de certificação. O sistema
exige um controle rigoroso com instrumentos formais e manutenção de registros. Vale ainda
ressaltar que o trabalhador pode se candidatar de maneira independente ou filiado a uma
entidade educativa, sindicato ou empresa. Há de se observar, aqui, uma maior proximidade
com os sistemas mais rígidos, como o britânico.
Além do modelo mexicano, em se tratando de América Latina, conforme NOVICK
(1997), as preocupações com qualificação se apresentam de maneiras isoladas e as mais
diversas, muito se dependendo do setor econômico em questão. O passado recente gerou
muita diversidade, de forma que, atualmente, os setores mais avançados requerem maior
qualificação, enquanto outros, ainda não demonstram essa necessidade. Por exemplo, o
setores automotivos e de telecomunicações na Argentina e na Venezuela apresentam
preocupação maior com o tema.
Especificamente no Brasil, verifica-se características semelhantes de diversidade, mas
se apresenta como caso a parte. Assim, para análise de qualificação e gestão de competências
em nosso pais, faz-se necessário um resgate histórico dos diversos processo que trataram do
assunto.
2.3 – Educação Profissional e o Estado Brasileiro
A história da educação profissional no Brasil e as atuações do estado remontam desde
o século passado, sendo que as ações mais importantes ocorreram neste século com a
fundação das escolas de aprendizes e artífices, que mais tarde se transformaram nas atuais
escolas técnicas, e a fundação dos sistemas de formação profissional como Serviço Nacional
de Aprendizagem Industrial (Senai) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Sesc).
Entretanto, o sistema de qualificação profissional sempre foi tratado de forma separada da
educação formal, mesmo após o seu reconhecimento por parte da primeira LDB - Lei de
Diretrizes e Bases - em 1961.
De forma geral, como aponta FOGAÇA (1998) sempre houve dois sistemas
educacionais para classes sociais diferentes. O sistema formal, após a formação básica, se
5
destinava ao atendimento daqueles que teriam melhores condições econômicas e sociais, e o
sistema de qualificação profissional serviria para atender os menos favorecidos. A idéia
central era que estes últimos não poderiam estudar até idade muito avançada por questões
financeiras e de capacidade e, assim, era necessário prepará-los mais cedo para a vida
profissional. Eles deveriam ser formados para ocupar as profissões “subalternas” tão cedo
quanto o possível. Sem esse sistema, eles iriam, com certeza, fracassar como cidadãos. Então,
seria necessário treiná-los para a profissão e, assim, evitar a marginalidade.
No início da década de 70, foi criada, através de lei, a obrigatoriedade do 2o grau
técnico. Por diversas razões, que não cabe aqui apontar, após poucos anos de funcionamento,
o sistema simplesmente não deu certo. Sendo assim, pode se afirmar que, com exceção desse
pequeno período, o sistema brasileiro sempre foi dividido em dois. Apesar de muito discurso
em contrário, grande parte das ações de ensino profissionalizante no Brasil não tiveram como
razão principal o apoio a industrialização, através de qualificação de mão-de-obra, mas foram
muito mais assistenciais, visando se evitar a marginalidade. Como aponta FOGAÇA (1998),
foi um sistema de exclusão.
Desse modo, percebe-se que a qualificação profissional no Brasil nunca teve um
caráter de atender as empresas de modo efetivo. De forma geral, a maior parte da qualificação
profissional efetiva era fornecida por intermédio de treinamento dado pelas próprias
empresas. Esse treinamento era mais que suficiente para atender o padrão burocrático e
mecanizado das organizações nos períodos anteriores. Assim, verifica-se um histórico de
intervenção baseado na distribuição de renda e exclusão social.
Além disso, conforme relatório do MEC e considerações de FOGAÇA (1998), nesse
período, ações conjuntas entre o estado e a iniciativa privada sempre foram incipientes e
consideradas como exceção a regra.
2.4 – Ações do Estado para a Qualificação
Visando atender as atuais necessidades do mercado e da sociedade globalizada,
qualificada e informatizada, surgem novas perspectivas de atuação estatal para a educação
profissional. Essas ações estão partindo especificamente do Ministério do Trabalho, que já
tem tradição nessa interferência, e do Ministério da Educação. O primeiro através do FAT –
Fundo de Amparo ao Trabalhador - e o segundo através da nova LDB, que, a partir de sua
última edição, incluiu um capitulo com o nome de “educação profissional”.
Entretanto, DEMO (1999) alerta para a necessidade de uma postura crítica aos novos
programas de qualificação. Sua principal preocupação é que a qualificação por si só não cria
postos de trabalho, pode levar ao rebaixamento salarial no escopo geral e que a qualificação
deve ter, também, uma preocupação com a cidadania. O autor se preocupa com seu real
atendimento ao mercado de trabalho, defendendo que é preciso que se leve em consideração
aspectos como a descaracterização do aprendizado. Para ele, o problema da tradição brasileira
nessa área pode levar a cursos rápidos de tendência de puro treinamento para atender grande
número de pessoas, não atendendo às necessidades do trabalhador de aprender a aprender, ou
de saber pensar. Situação prejudicial ao trabalhador e às necessidades do mercado de trabalho.
Além disso, o autor afirma que, dentro dos programas, deve haver uma união
adequada entre os cursos e a demanda efetiva do mercado por intermédio de um acoplamento
entre a formação e as políticas ativas de emprego.
A partir do que foi verificado anteriormente, é preciso que se analise as ações de
geração de competências tomando por base as necessidades de cada país. Especificamente no
Brasil, caracteriza-se a necessidade de planos que busquem atender tanto às organizações e
sua busca de diferencial competitivo, como também a uma população não qualificada
possibilitando sua inserção em um mercado de trabalho que exige novas características. É
6
fundamental que essa qualificação atenda a realidade das empresas, e que não se limite ao
treinamento com cursos curtos, de maneira incipiente e com resultados não duradouros. É
necessário também envolver os atores sociais que tenham interesses e responsabilidades no
processo e, ainda, apresentar resultados efetivos com a utilização racional de recursos muitas
vezes escassos, como é o caso da realidade brasileira.
3 - Plano Nacional de Qualificação do Trabalhador – Planfor
Tendo com referência o relatório do Ministério do Trabalho (1996), da População
Economicamente Ativa (PEA) no Brasil, cerca de 70 milhões de trabalhadores possuem
menos de quatro anos de estudo, sendo que 20% dos mesmos são analfabetos. Outro dado
relevante e preocupante é que, aproximadamente, 80% dessa população se encontram com
idade entre 15 e 30 anos, que corresponde a faixa etária de maior produtividade e, portanto, a
princípio, com elevado potencial de empregabilidade. Essas informações demonstram a
gravidade da situação nacional, pois, para que seja possível oferecer ao mercado de emprego
mão-de-obra com o mínimo de preparo, torna-se fundamental uma ação no sentido de
erradicar o analfabetismo e, simultaneamente, investir na qualificação de jovens e adultos,
além de prevenir quanto ao futuro, ou seja, preocupar-se também com as crianças.
Já em 1990 o Governo Federal criou o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT),
constituído por recursos do PIS/PASEP e de parte da arrecadação do Imposto Sindical,
visando financiar programas sociais. Considerando as diretrizes traçadas pela Convenção da
Organização Internacional do Trabalho (OIT), o FAT é administrado de forma paritária e
tripartide por trabalhadores, padrões e governo.
Com o objetivo de mobilizar e articular de maneira gradual toda a infra-estrutura de
qualificação profissional existente no país, em 1995 o Ministério do Trabalho, através da
Secretaria de Formação e Desenvolvimento Profissional (Sefor), estruturou o Plano Nacional
de Qualificação do Trabalhador (Planfor), implementando-o em 1996.
Como os demais programas financiados com recursos do FAT, o Planfor é executado
de forma descentralizada, ou seja, conta com a participação dos interessados e parceria com
Governos Estaduais e outras entidades, tais como sindicatos, organizações empresariais,
universidades e instituições de formação profissional.
Tendo como meta atender pelo menos 20% da População Economicamente Ativa –
PEA, ao ano, o Planfor busca contribuir para: (a) o aumento da probabilidade de obtenção de
trabalho e de geração ou elevação de renda, reduzindo os níveis de desemprego e
subemprego; (b) o aumento da probabilidade de permanência no mercado de trabalho,
reduzindo os riscos de demissão e as taxas de rotatividade, e (c) a elevação da produtividade,
da competitividade e renda. Assim, seu atendimento está direcionado para a PEA,
contemplando, sem exclusividade mas com prioridade, segmentos excluídos ou com
dificuldade de acesso a outras alternativas de educação profissional, tais como: trabalhadores
de baixa escolaridade, desempregados, trabalhadores do setor formal e informal, mulheres
chefes de família, jovens iniciantes no mercado de trabalho, pequenas e micro empresas e
produtores do setor urbano e rural.
Buscando atuar dentro de um conceito amplo de educação profissional, o Plano faz
uma clara diferenciação entre qualificação e competências:
“a qualificação está contextualizada em um espaço de tempo mais
delimitado, que envolve um conteúdo mais específico de formação. Já a
competência é um conceito mais elástico. Ela deverá ser formada ao
longo da vida do trabalhador, quer seja em cursos formais, como em
7
atividades informais, na escola e no próprio mundo do trabalho, no qual
se formam os chamados conhecimentos tácitos. Tácitos, porque são
gerados a partir da prática dos profissionais no coletivo de seu
trabalho”. (MTb/SEFOR, 1996)
Assim, considerando que habilidades são atributos aos saberes (conhecimentos), ao
saber-ser (atitudes) e ao saber-agir (práticas no trabalho) que envolvem as dimensões
cognitivas, motoras e atitudinais, o Planfor propõe o desenvolvimento integrado de
habilidades básicas, aquelas essenciais para que alguém possa seguir sua educação
profissional; específicas, relacionadas aos conhecimentos técnicos e às competências
demandadas pela ocupação, profissões ou trabalhos em uma ou mais áreas correlatas; e
gestão, relacionadas às competências de autogestão, de empreendimentos, de trabalho em
equipes, enfim, habilidades mais vinculadas à organização desse trabalho.
Orientado-se nas diretrizes de participação, descentralização e fortalecimento da
capacidade de execução local, para implementação do Planfor foram consolidados dois
mecanismos: os Planos Estaduais de Qualificação (PEQs), coordenados pelas Secretarias
Estaduais de Trabalho, sob orientação e supervisão das Comissões Estaduais e Municipais de
Emprego e as Parcerias Nacionais e Regionais com toda rede de educação profissional do
país, mediante convênios e termos de cooperação técnica. Assim, os PEQs devem estar
inseridos de forma estratégica no desenvolvimento de uma política pública de trabalho e
qualificação, consonante com o Planfor, sendo sua implementação responsabilidade dos
governos estaduais.
A metodologia de acompanhamento e avaliação do Planfor prevê quatro níveis de
intervenção, integrados e complementares: acompanhamento/supervisão gerencial dos PEQs,
avaliação externo dos PEQs, acompanhamento/supervisão gerencial dos PEQs e Parcerias e
avaliação nacional do Planfor. O acompanhamento e avaliação de suas ações são orientados a
partir de três indicadores básicos: a eficiência, eficácia e efetividade social.
“Eficiência é entendido como o grau de aproximação entre o previsto e o
realizado, em matéria de treinandos, matrículas, carga-horária,
aplicação de recursos, entre outras variáveis. A eficácia é expressa pelo
benefício das ações da educação profissional para os treinandos, em
matéria de obtenção ou manutenção de emprego, geração ou elevação
de renda, ganhos de produtividade e qualidade, integração ou
reintegração social. O indicador de efetividade social abrange os
mesmos aspectos de eficácia, mas do ponto de vista mais amplo das
populações, comunidades ou setores beneficiados pelos programas,
levando em conta a dimensão do Planfor, como política pública.
(MTb/SEFOR, 1999)
A avaliação se pauta na realização de pesquisa quantitativa-qualitativa destinada a
identificar e a obter dados relevantes para analisar componentes, processos e resultados dos
PEQs. Procura-se, ainda, ter o grau de consonância desses dados com as premissas, diretrizes,
objetivos e metas estabelecidos, de modo a fornecer subsídios e apoio técnico-gerencial para a
tomada de decisões relativas ao aprimoramento ou a reformulação do plano.
4 - Avaliação do Plano Estadual de Qualificação em Minas Gerais (PEQ/MG)
4.1 – Metodologia
8
Conforme já descrito anteriormente, um dos mecanismos utilizados para
implementação do Planfor é os Planos Estaduais de Qualificação (PEQs), que apesar de ser
uma ação de iniciativa do governo, conta com a participação de outros atores sociais, como
empregadores e trabalhadores. Conforme documentos do Ministério do Trabalho, a avaliação
externa do PEQ deve contribuir para a avaliação da eficácia e da efetividade social, tanto do
PEQ com das Parcerias realizadas, podendo assim fornecer subsídios para seu aprimoramento
metodológico e para a avaliação do Planfor em âmbito nacional. Portanto, seu objetivo básico
é orientar.
Em se tratando de um plano de tamanha abrangência, inúmeras são as inquietações e
dúvidas que surgem, principalmente no que diz respeito aos resultados por ele alcançados.
Assim, cabe aqui alguns questionamentos: o plano está interessado em focar as necessidades e
interesses das organizações ou dos trabalhadores? Apesar da diferenciação clara entre
qualificação e competências que balizam o Plano, os cursos oferecidos efetivamente são
realizados dentro de uma novas proposta de educação profissional, visando o
desenvolvimento de competências ou ainda continuam sendo o tradicional treinamento e
“adestramento” do trabalhador? Há realmente participação e envolvimento dos diferentes
atores sociais em todas as etapas do plano? Quanto aos recursos investidos, são bem aplicados
e utilizados de forma racional? Essas questões servirão de norteadoras do trabalho que,
através de relatório e entrevistas, visa buscar dados que possam respondê-las ou, ao menos,
clareá-las.
Para tanto, primeiramente será apresentado um breve comentário sobre a avaliação
realizada sobre o PEQ/MG no triênio anterior. Para isso, utilizou-se dados do relatório de
avaliação referente a Gestão, Execução e Pontaria do Plano Estadual de
Qualificação/Requalificação Profissional no Triênio 1996 –1998. (MTb/Sefor, 1999)
Num segundo momento, serão apresentadas informações referente ao ano de 1999,
utilizando-se de três entrevistas realizadas com os diferentes atores sociais envolvidos nesse
plano: membro da Secretaria de Estado do Trabalho, da Assistência Social da Criança e do
Adolescente (Setascad), membro da Comissão Estadual de Emprego (CEE) e Representante
da CUT na Bancada dos Trabalhadores, também da Comissão Estadual de Empregos. Vale
ressalta que as pessoas entrevistadas não participaram, necessariamente, dos planos anteriores.
4.2. Síntese da Avaliação do PEQ/MG, triênio 96/98.
Conforme relatório de avaliação (MTb/Sefor, 1999), foram realizadas entrevistas com
representantes do governo, empregadores e trabalhadores participantes do Plano com o
objetivo de verificar se os resultados PEQ/MG, referente ao triênio 1996 –1998, conseguiram
atender aos objetivos e metas estabelecidos pelo Planfor.
Uma das informações obtidas diz respeito ao atendimento a demanda de qualificação
existente no Estado. Tendo em vista o critério definido pela Sefor, ou seja, atender no mínimo
75% da demanda estadual, o PEQ/MG foi considerado eficiente pelos entrevistados.
Entretanto, o que se percebeu é que a necessidade por qualificação profissional foi maior do
que as possibilidades oferecidas pelos diversos cursos.
Verificou-se que ocorreram investimentos em programas que visavam atender um
público que estava em desvantagem social, em risco de perda do emprego e desempregados.
Entretanto, foi salientado a necessidade de uma melhor adequação dos cursos oferecidos de
tal forma que priorizasse ações de qualificação profissional para os grupos considerados
preferenciais.
Foi bastante consensual entre os entrevistados que ainda falta muito para que o PEQ
consiga atingir um grau de eficiência devido a pouca consistência entre os programas
9
oferecidos e as diretrizes e metas do Planfor, mais especificamente em relação ao
desenvolvimento de forma integrada e complementar das três habilidades definidas (básicas,
específicas e de gestão). Foi também apontado que a prática pedagógica ainda é bastante
assistencialista e pouco integradora das habilidades, sendo que o investimento em tecnologia
de produção de material didático que incorpore estes novos conteúdos se não inexistente, é
insignificativa.
Considerando os conceitos dados à eficiência, eficácia e efetividade social, constatouse que o plano em Minas Gerais ficou bem próximo do esperado. Entretanto, ainda se
encontra frágil o processo de supervisão, necessitando de uma posição mais firme no que se
refere as ações de correção das irregularidades apresentadas no decorrer da implementação do
plano.
Conforme descrito no relatório, após a avaliação dos resultados alcançados pelo Plano
em Minas Gerais, referente ao triênio 96/98, ficou evidenciado uma relativa pertinência e
adequação dos programas e projetos implementados quando se considera as expectativas do
Planfor, havendo, porém, muitas coisas a serem corrigidas e/ou melhoradas.
4.3 - Avaliação do PEQ/99
Uma das diretrizes do Planfor define que, na elaboração dos PEQs, devem ser
considerados as tendências e potencialidades do mercado de trabalho, ou seja, verificar quais
são as demandas de qualificação necessárias e requeridas pelo mercado. Dois dos
entrevistados responderam que o PEQ/MG considerou as tendências dos setores econômicos
no Estado, além das demandas identificadas pelos Comissões Municipais de Emprego. Porém,
tal opinião não é compartilhada pelo representante da CUT, que argumenta não ter havido
uma discussão mais aprofundada dentro da Comissão Estadual de Emprego (CEE) sobre
tendências de mercado, e isso seria fundamental pois, é a Comissão que aprova o PEQ.
“Não (...) embora os técnicos da secretaria possam ter levado em
consideração, e certamente levaram para elaborar, a questão das
tendências de mercado e tal, não houve essa discussão aprofundada na
comissão, que é quem aprova o PEQ.” (Representante da CUT)
Entretanto todos os entrevistados confirmam que, na elaboração do PEQ/MG, foram
considerados o perfil, as necessidade e as aspirações da População Economicamente Ativa
(PEA) do Estado. Este também é um critério do Planfor pois, tendo como propósito básico a
qualificação dos trabalhadores, utiliza a PEA como referência em todo seu planejamento, o
que é considerado pelos entrevistados como um critério transparente, justo e objetivo. Porém,
um dos entrevistados ressalta que, durante a execução do plano, surgiram variáveis muitas
vezes não previstas, fazendo com que houvesse necessidade de ajustes e/ou correções do que
foi anteriormente planejado. Isso significa que, apesar do planejamento considerar diversos
aspectos da PEA, quando da execução o mesmo pode não ocorrer.
“Para o planejamento sim. (...) ... na execução um conjunto muito
grande de variáveis surgem o que podem, até mesmo, ajustar os seus
erros de planejamento.” (Membro da Setascad)
“... a PEA foi uma referência para definição dos recursos e definição do
tipo de curso que ia ser realizado tanto no público alvo quanto no âmbito
dos municípios e regiões do estado. (...) ... então, foi um dos fatores
10
fundamentais de transparência do plano (...) foi a PEA e é um critério
objetivo.” (Representante da CUT)
Considerando os grupos definidos com preferenciais pelo Planfor, ou seja,
trabalhadores de baixa escolaridade, desempregados do setor formal e informal, mulheres
chefes de família, jovens iniciantes no mercado de trabalho, pequenas e micro empresas e
produtores do setor urbano e rural, todos os entrevistados concordam que tais grupos foram
contemplados no PEQ/MG, embora tenha sido salientado que o percentual de pessoas que
pertencem a esses grupos ainda continua abaixo do determinado pelo Planfor. Apesar disso,
tal resultado representar um avanço, uma vez que é cada vez maior o número de pessoas
consideradas preferenciais que participam do PEQ.
“... dessa vez, estava dentro do público alvo prioritário, o que e um
grande avanço embora, ainda seja muito aquém do que o necessário (...)
já é uma pontaria melhor, um acerto em relação à situação anterior.”
(Representante da CUT)
O Planfor também definiu como um de seus objetivos, aumentar a probalidade de se
conseguir trabalho e de se gerar ou elevar a renda, reduzindo, assim, os níveis de desemprego
e subemprego. Assim, foi perguntado aos entrevistados se as ações de qualificação
profissional teriam vinculação com oportunidades de trabalho e/ou renda. Um dos
entrevistados considerou que houve tal vinculação, afirmando que sem essa ligação o plano
não teria sentido. Os outros dois entrevistados consideram que tal vinculação ocorreu
parcialmente, uma vez que, apesar de atualmente se ter poucas oportunidades de geração de
renda, existem outros programa do Governo Federal, também financiados pelo FAT, tais
como Programa de Geração de Empregos e Renda (Proger) e Programa Nacional de
Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) que tem exatamente esse propósito. É
relevante destacar a fala de um dos entrevistados, quando o mesmo declara que o plano de
qualificação por si só não gera emprego, e nem tem esse objetivo, mas, mesmo assim, acredita
que é melhor que as pessoas estejam qualificadas mesmo que desempregadas.
“... o plano de qualificação não adianta porque não gera emprego. O
plano de qualificação na minha opinião não é para gerar emprego, é
para gerar qualificação independente se o cidadão for trabalhar ou se
ele for gerar uma empresa ou se ele não conseguir emprego. Ele
continua sem emprego mas qualificado, é melhor do que ele estar
desqualificado.” (Representante da CUT)
Quando questionados se as ações de qualificações profissionais previstas contemplam
projetos que visam a elevação de escolaridade da PEA, todos responderam que parcialmente.
Foi declarado que, em algumas cursos, quando do desenvolvimento das habilidades básicas,
foram incluídas algumas matérias da grade curricular, tais como português e matemática,
porém, isso não é uma evidência no PEQ. De modo geral, há uma tendência dos cursos em se
concentrarem mais nas habilidades específicas do que nas básicas. Em relação à escolaridade,
outro ponto destacado em uma das entrevistas foi a dificuldade em se ministrar,
simultaneamente, um mesmo programa para pessoas com diferentes níveis escolares. Cabe
ressaltar que, em se tratando de educação básica, mesmo que o objetivo seja a
profissionalização, faz-se necessário maior integração e comunicação do Ministério do
Trabalho com o Ministério da Educação para que seja possível propor ações que,
11
efetivamente, contribuam para a solucionar, ou ao menos minimizar, o problema do baixo
nível escolar.
“No programa de qualificação (...) nós teríamos que ter um programa
com dois perfis: um perfil urbano e um perfil rural, porque nós não
podemos ingressar um trabalhador que às vezes já tem um nível de
escolaridade alto com um trabalhador que nunca sentou num banco de
escola. São nichos que o programa tem que trabalhar para adequá-los
ao dia a dia” (Membro da CEE)
Em relação aos recursos financeiros disponibilizados pelo FAT ao Estado, dois pontos
merecem ser destacados: se foram suficientes para atender as demandas detectadas e metas
definidas pelo Planfor, e como foram utilizados, ou seja, se houve uma maximização dos
mesmos. Quanto ao primeiro aspecto, de acordo com os entrevistado, tais recursos não foram
compatíveis com a real necessidade de qualificação existente no estado, uma vez que trata-se
de um estado de grande extensão territorial, onde muitas pessoas encontram-se sem emprego
e sem alternativa de geração de renda. Inclusive, aconteceu que outros estados que possuem
uma população bem menor recebessem mais recursos que Minas Gerais. Já em relação ao
segundo aspecto, foi possível constatar que, apesar da redução dos recursos financeiros, houve
um aumento da quantidade de pessoas atendidas pelo PEQ, quando se compara com os anos
anteriores. Esse dado é considerado pelos entrevistados como um sinalizador de que, de
alguma forma, os recursos financeiros foram bem utilizados.
A partir do que foi relatado pelos entrevistados, é possível constatar que, considerando
como referência as metas definidas pelo Planfor, o PEQ/MG vem apresentando, a cada ano,
melhorias nos resultados alcançados. Entretanto, ainda existem muitas falhas e dificuldades
quando o planejamento é posto em prática. É preciso definir melhor o perfil da clientela
preferencial e do mercado, ou seja, conhecer quais são suas reais necessidades para ajustar o
proposto com o que é, efetivamente, necessário.
“Eu acho que nós demos um passo adiante esse ano, embora eu aponte
que existem ainda problemas sérios no sentido da inconsistência geral
do sistema, da falta de habilidade de todos nós para lidar com o tema
inicialmente mas eu acho que foi um passo a frente que foi dado aqui em
Minas Gerais.” (Representante da CUT)
4 - Considerações Finais
A partir da análise feita, percebe-se que o Planfor foi muito bem elaborado e
estruturado, apresentando-se como uma proposta inovadora, havendo, inclusive, uma grande
preocupação por parte dos idealizadores em justificar a importância e necessidade da
qualificação profissional dentro do atual contexto de competitividade. Isso é ainda mais
verdadeiro pela separação feita, conceitualmente, entre competência e qualificação adotada
pelo Ministério do Trabalho, e que baliza as ações do plano.
Entretanto, na avaliação dos resultados alcançados, observa-se que muitas coisas terão
que ser feitas para que se consiga alcançar as metas estabelecidas. O que se observa é que na
execução do plano ainda prevalece, no geral, um sistema arcaico e tradicional de treinamento,
não conseguindo, assim, propiciar aos participantes o desenvolvimento de competências.
Aliás, vale questionar um ponto ainda mais básico: é possível “ensinar” competências?
Outro ponto importante é que, apesar de existirem alguns programas com a proposta
de oportunizar aos participantes a geração de renda, não existe, na prática, ações que,
efetivamente, possam alcançar tal objetivo. Para tanto, é necessário adotar políticas mais
12
abrangentes que procurem, efetivamente, solucionar, ou minimizar, os problemas causados
pela falta de emprego e renda e de gerar qualificações necessárias para as novas
oportunidades de trabalho.
No geral, percebe-se que o plano tende a repetir tendências históricas de qualificação
no Brasil. Uma grande preocupação de educação profissional direcionada apenas aos
chamados excluídos. Isso é necessário para um modelo de competências em nosso país, mas,
se não houver uma preocupação com a geração de postos de trabalho e que as qualificações
sejam voltadas para os mesmos, não se criará empregos, renda, nem aumento de qualificação
para atender a demanda de competitividade das empresas. Qualificar por si só não traz
resultado algum para o país. Utilizando os conceitos do próprio Planfor, a efetividade poderá
ser alcançada, mas a eficácia e a efetividade social, com certeza, não serão..
Finalmente, fica de positivo a avaliação dos participantes que, no processo, ano a ano,
o Plano está fazendo progressos e melhorando. Isso talvez seja o mais importante num país
em que a falta de continuidade é um problema sempre presente.
Bibliografia
BARATO, J. N. Competências essenciais e avaliação do ensino universitário. Brasília:
Universidade de Brasília. Mimeo, 1998.
BARATO. A experiência canadense. Mimeo.
DEMO, P. www.tba.com.br/pages/leonork/violenci.html
DUCCI, M. A. El enfoque de competencia laboral en la perspectiva internacional. In
Formacion basada en competencia laboral: situacion actual y perspectivas. pp 15-26,
1996.
DUFOUR, R. El processo de certificación em francia. In Formación basada em competencia
laboral: situación actual y perspectivas. pp 235-240,1996.
__________ Formación basaba em competencia laboral: alcances de al metodologia de
grupos de oficios aplicada em francia. In Formación basada em competencia laboral:
situación actual y perspectivas. pp 53-57,1996.
FISCHER, A.L. A constituição do modelo competitivo de gestão de pessoas no brasil – um
estudo sobre as empresas consideradas exemplares. Universidade de São Paulo. São
Paulo, 1998.
FOGAÇA, A. A educação e a reestruturação produtiva no Brasil. In. OLIVEIRA, M. (org.)
Reforma do Estado; políticas de emprego no Brasil. Campinas, Unicamp, 1998
GILS, J. J. A. Panorama general de la experiencia de España en materia de formación basada
en competencia laboral. In Formacion basada en competencia laboral: situacion actual y
perspectivas. pp 59-68, 1996.
LUMEN – Instituto de pesquisa. Fumarc. Puc Minas. – Avaliação externa do PEQ/MG. 199697
__________ Avaliação do Plano Estadual de Qualificação e Requalificação Profissional PEQ/MG - Módulo I: A Gestão, a Execução e a Pontaria do Plano Estadual de
Qualificação/Requalificação Profissional no Triênio 1996 –1998. Belo Horizonte,
maio/1999.
MACIAS, J. M. G. El sistema de certificacion de competencia laboral en Mexico. In
Formación basada em competencia laboral: situción actual y perspectivas. pp 249-255,
1996.
MERLE, V. La evolución de los sistemas de validación y certificación: qué modelos son
posibles y qué desafíos afronta el país francés? In Formación professional, n. 12. Revista
Europea. Cedefop, pp. 39-52.
13
MERTENS, L. Características de la transformación productiva y el surgimiento de la
competencia laboral a nivel empresa. In Competencia laboral: sistemas, surgimiento e
modelos. 1996
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA. Conselho Nacional de Educação – Câmara
de Educação Básica. Diretrizes curriculares nacionais para a educação profissional de
nível técnico. Brasília, 1999
MINISTERIO DO TRABALHO - Secretaria de Formação e Desenvolvimento Profissional.
Educação Profissional: um projeto para o desenvolvimento sustentado. Brasília, março
1995.
__________ Sistema Público de Emprego & Educação Profissional: implementação de uma
política integrada. Brasília, maio 1996.
__________ Habilidades, questão de competências? Brasília, outubro 1996.
NOVICK, M. Relaciones entre empresas y competências laborales en America Latina In
NOVICK, M. (org.) Competitividad, redes productivas y competências laborales.
Cinterfor, 1997
STEFFEN, Ivo. Tendências do mercado de trabalho e políticas de educação profissional.
1999
TAYLOR, M. Educacion y capacitacion basadas en competências: un panorama de la
experiencia del Reino Unido. In Formación basada em competencia laboral: situación
actual y perspectivas. Pp. 47-52, 1996.
__________ El modelo británico de certificación laboral. In Formación basada em
competencia laboral: situación actual y perspectivas. Pp. 229-233, 1996.
ZARIFFIAN, P. A gestão da e pela competência In Seminário internacional: educação
profissional, trabalho e competências. Rio de Janeiro: CIET, nov. – 1996.
14
Download

(PLANFOR) Autoria: Derli de Souza Dias e Nelio Oliveira Resumo