ASPECTOS DO PRESIDENCIALISMO NA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL: O VETO PRESIDENCIAL COMO INSTRUMENTO DE BALANÇA DE PODER1 Thiago Pacheco Costa Krebs2 Resumo: O presente trabalho busca, através da identificação da organização do Estado, demonstrar a prática da doutrina da separação de poderes, bem como a sua ligação com o sistema de freios e contrapesos, entre os poderes executivo e legislativo. É utilizado o enfoque da realidade brasileira que, através do sistema de governo presidencial, regula a relação dos poderes funcionais do Estado. O veto presidencial, neste contexto, aparece como forma de conter os abusos do poder legislativo, entretanto tem-se demonstrado, muitas vezes, como elemento de barganha política. Palavras-chave: Estado – Poder – Separação dos poderes – Sistema de freios e contrapesos – Poder Executivo – Poder Legislativo – Veto. Abstract: This paper intends to demonstrate, through the identification of the State´s organization, the practice of the doctrine regarding power division, as well as its vinculum with the checks and balances system, between the Executive and Legislative powers. The focus is on the Brazilian reality which, through the presidential government system, regulates the relations between the State’s functional powers. Within this context, the presidential veto appears as a way to refrain abuses of the Legislative power; however, at times it has been evidenced as an element of political bargain. Key words: State – Power – Power segregation – Checks and balances system – Executive Power – Legislative Power - Veto Sumário: 1. Introdução. 2. Organização do Estado 2.1 O Estado e o Poder 2.2 A Separação de Poderes 2.3 Sistema de Freios e Contrapesos 2.4 Formas e Sistemas De Governo 3. Presidencialismo 3.1 História do Presidencialismo 3.2 O Presidencialismo na Constituição do Brasil de 1988 3.3 Os Poderes do Presidente da República 4. O Veto Presidencial 4.1 Conceito de Veto 4.2 Motivação e Procedimentos do Veto 4.3 Reapreciação do Veto Pelo Legislativo 4.4 O Veto Presidencial Como Balança de Poder 5. Conclusão. 6. Referências Bibliográficas. Introdução: A relação entre o Poder do Estado e a sua divisão funcional sempre encontrou grande divergência doutrinária nas diferentes áreas do conhecimento. Assim aconteceu com a ciência jurídica, a ciência política, a teoria geral do estado, a sociologia, a filosofia. 1 Artigo extraído do trabalho de conclusão de curso apresentado como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul aprovado pela banca examinadora composta pelo orientador Prof. Me. Marcus Vinicius Martins Antunes, Prof. Dr. Alexandre Mariotti e Prof. Me. Jarbas Lima. 2 Aluno graduado pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. E-mail: [email protected] 2 O presente trabalho preocupa-se, acima de tudo, com um enfoque constitucional, isto é, pretende tratar, de forma interdisciplinar, da relação de dois dos três poderes de um Estado, quais sejam: o poder legislativo e o poder executivo. A motivação inicial da pesquisa está centrada na atual situação do Estado brasileiro que, depois de muitas demarches, retomou a característica de Estado democrático, sobretudo após uma ditadura de 24 anos. É por causa disso que a Nação brasileira sempre demonstrou uma certa instabilidade no que diz respeito aos poderes constituídos. A pesquisa delimita-se a abordar o tema do controle dos poderes, por meio do sistema de freios e contrapesos, através do veto do presidente no processo legislativo. Esse sistema de controle do executivo é estudado no sistema presidencialista, pois a maior dificuldade de relação entre os poderes está neste sistema político de governo e a direta ligação com o Estado brasileiro. No primeiro capítulo, serão analisados os elementos constitutivos do Estado, bem como a exteriorização do poder, a doutrina da separação dos poderes e o sistema de freios e contrapesos para melhor identificar a relação dos poderes. Será considerada no estudo também a relação que se desenvolve entre o Estado e o Governo, descrevendo as formas de governo e seus sistemas correspondentes. No segundo capítulo, buscar-se-á demonstrar especificamente o sistema presidencialista, desde seu surgimento, com a Constituição Norte Americana, a realidade brasileira, anterior e posterior à atual Constituição, bem como as modalidades com que se desenvolvem os poderes do Presidente da República. No terceiro e último capítulo, será demonstrado a sistemática da relação do veto presidencial como sistema de balança de poder. Serão analisadas também as regras constitucionais que regem o veto do executivo, bem como a sua funcionalidade para evitar algum abuso do poder legislativo. Desse modo, o tema apresenta-se sumamente importante, haja vista que atualmente, no Brasil, são discutidas mudanças e reformas políticas, com o intuito de trazer maior eficiência ao Estado, frente às necessidades e anseios populares. 3 2. Organização do Estado 2.1 O Estado e o Poder Um conceito unitário de Estado não é encontrado na doutrina, pois o seu caráter é complexo e variável. Dalmo de Abreu Dallari, citando a obra de David Easton informa que se encontram nada menos do que cento e quarenta e cinco diferentes definições.3 Historicamente, há cinco estágios diferentes de Estado: Estado Antigo, Estado Grego, Estado Romano, Estado Medieval e Estado Moderno.4 Gustavo Gozzi, analisando o Estado Moderno, identifica uma mudança fundamental na estrutura do Estado diante da nova ordem social. A partir da segunda metade do século XIX, surgem novas classes sociais, o que dificulta, em muito, o curso do governo no auxílio do bem comum. É o Estado Contemporâneo, no qual os direitos sociais vislumbram a participação no poder político e a distribuição da riqueza social. Nasce, então, uma relação conflituosa com o Estado Liberal, aonde a liberdade pessoal, política e econômica constitui um dique contra a intervenção estatal.5 Segundo Norberto Bobbio, o Estado e a política têm em comum a referência ao acontecimento do poder.6 Este é conceituado, em sentido amplo, como a capacidade ou a possibilidade de agir e produzir efeitos. Tanto pode referir-se a indivíduos e a grupos humanos, quanto a objetos e fenômenos naturais.7 O Estado por ser um grupo social tem poder próprio denominado de poder político ou estatal. Assim, utiliza-se deste para coordenar, impor regras e limites para atingir os seus fins, visando manter a ordem e a busca do bem comum.8 É característica marcante desta forma de poder, o exercício de medidas de força para obter os efeitos desejados, embora em última instância.9 3 EASTON, David. The Political System. Nova York: Alfred A. Knopf, 1968. p. 45-60. apud DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 115. 4 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 62. 5 BOBBIO, Norberto, MATTEUCCI, Nicola, PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política. 13. ed. Brasília: UnB, 2007. p. 401. 6 BOBBIO, Norberto. Estado Governo Sociedade: Para uma Teoria Geral da Política. 7. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2004. p. 76. 7 BOBBIO, Norberto, MATTEUCCI, Nicola, PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política. 13. ed. Brasília: UnB, 2007. v. 2. p. 933. 8 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 107. 9 BOBBIO, Norberto. Estado Governo Sociedade: Para uma Teoria Geral da Política. 7. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2004. p. 80. 4 Uma parte da doutrina ensina que o poder do Estado é político; entretanto, outra parte, tendo como expressão a obra de Hans Kelsen, informa que o poder que o Estado emana é o jurídico, pois é através deste que o Estado submete os homens.10 Porém, Dalmo de Abreu Dallari, citando Miguel Reale, diz que o poder do Estado é exercido através de uma organização jurídica, isto não significa dizer que o poder esteja totalmente no âmbito do direito. Na realidade ele nunca deixa de ser substancialmente político.11 Observa-se que o Estado também é um sujeito de direito, pois como pessoa jurídica tem direitos e deveres criados através da vontade jurídica, visando os interesses coletivos, evitando-se ações arbitrárias.12 O Estado contemporâneo, a partir das lutas contra o absolutismo monárquico, buscou ideais libertários. Baseado nos movimentos de libertação, como a revolução inglesa, a independência americana e a revolução francesa, demonstraram que o Estado deveria ser do povo. Assim, consolidou-se tanto a idéia de Estado democrático que, até mesmo o governo mais totalitário quer aparentar ser democrático. Para tanto, o Estado democrático deverá conter, como características básicas, a supremacia da vontade popular, a preservação da liberdade e a igualdade de direitos.13 Portanto, o Estado pode ser compreendido como democrático e de direito, exercendo poderes políticos e jurídicos, com intuito de promover, através de sua soberania, o bem comum do povo situado em seu território. 2.2 A Separação de Poderes O Estado não existe sem a presença do poder, e o seu exercício pelos órgãos estatais pode ser dividido e distribuído. Desta forma, com o intuito de conter a concentração de poder do Estado, é que aparece a teoria da separação de poderes.14 10 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 110. 11 REALE, Miguel; Teoria do Direito e do Estado. São Paulo: Martins, 1960. apud DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 110. 12 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 123. 13 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 150. 14 FILHO, Manuel Gonçalves de Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 30. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 131. 5 A idéia da limitação do poder político do Estado tem como base de pensamento a Antiguidade Clássica, remontando à Grécia e a Roma antiga algumas de suas idéias.15 Na idade média, a teoria da constituição média não passou de tradição literária, visto que na prática pouco existiu, tendo-se como notório o poder absoluto do Rei e da Igreja.16 Entretanto, como observa Dalmo de Abreu Dallari, a concepção moderna da teoria da separação de poderes não foi procurar na Antiguidade sua inspiração, sendo construída em função de grandes conflitos sociais.17 A doutrina da separação de poderes surgiu primeiramente na Inglaterra, no século XVII, associada à idéia do Rule of Law, com essência anti-absolutista. Segundo Nuno Piçarra, “Rule of Law foi a primeira forma histórica do que viria a ser o Estadotipo do Ocidente, ou seja, o Estado Constitucional ou de Direito”. Esta forma de Estado, baseada na constituição mista, ficou conhecida como monarquia mista. Ela surge, não para conter o abuso do poder, mas para compor uma unidade política às diversas ordens existentes.18 No livro “O Príncipe”, de Maquiavel, pode-se também perceber que, na França do século XVI, já existia a separação das funções do Estado. No capítulo que trata da forma como o Príncipe pode e deve evitar o ódio, Maquiavel esclarece que, na França, existe o Parlamento e um órgão para controlar os poderosos, delegando tarefas de julgamento. Desta forma, estabelece uma distinção entre o legislativo, o executivo e o Judiciário.19 Na obra de John Locke, Two Treatises of Government (1690), encontra-se a primeira sistematização doutrinária sobre a separação de poderes, a partir da experiência inglesa. Adepto da corrente contratualista, Locke identifica que o limite das leis naturais são as leis fixas e estabelecidas de comum acordo. Desta forma, afirma o caráter da supremacia do poder legislativo. Entende-se que este poderia ser corrompido caso não 15 PIÇARRA, Nuno. A Separação dos Poderes como Doutrina e Princípio Constitucional. Coimbra: Coimbra, 1989. p. 31. 16 PIÇARRA, Nuno. A Separação dos Poderes como Doutrina e Princípio Constitucional. Coimbra: Coimbra, 1989. p. 43. 17 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 217. 18 PIÇARRA, Nuno. A Separação dos Poderes como Doutrina e Princípio Constitucional. Coimbra: Coimbra, 1989. p. 60. 19 MAQUIAVEL. O PRÍNCIPE. 6. ed. São Paulo: Martin Claret, 2007. p.116. 6 houvesse limitação. Nesta senda, o autor supracitado, refere-se à separação de poderes entre o legislativo e o executivo.20 Montesquieu aborda especificamente a doutrina da separação dos poderes em seu livro De l’Esprit des Lois, no capítulo VI do Livro XI, publicado no fim da primeira metade do século XVIII (1748). Entretanto, mesmo que no capítulo citado estejam as idéias fundamentais do pensador sobre o tema, somente através da leitura global do texto que se pode depreender a doutrina que impregnou o constitucionalismo liberal.21 Em o “Espírito das Leis”, o pensador francês demonstra a idéia de limitação de poder com vista à liberdade política. Segundo o autor, “a liberdade não pode consistir senão em poder fazer o que se deve querer, e em não ser constrangido a fazer o que não se deve desejar”, isto é, o direito de fazer tudo aquilo que as leis facultam.22 Essa idéia de limitação do abuso do poder com intuito de promover a liberdade e a legalidade é tratada, segundo a obra supracitada, através da separação dos poderes: [...] a experiência eterna nos mostra que todo o homem que tem poder é sempre tentado a abusar dele; e assim irá seguindo, até que encontre limites... Para que não se possa abusar do poder, é preciso que, pela disposição das coisas, o poder contenha o poder. Uma Constituição pode ser feita de tal forma, que ninguém será constrangido a praticar coisas que a lei não obriga, e a não fazer aquelas que a lei permite. 23 Segundo Paulo Bonavides, o Estado constitucional da separação de poderes surge imediatamente após as revoluções da Independência Americana e a Revolução Francesa.24 Na Constituição Imperial de 1824, o Brasil faz a separação de poderes de quatro naturezas, pois, além do legislativo, executivo e judiciário, havia o poder moderador que regulava, através do Imperador, os demais. Desde a Constituição Republicana de 1891, o Brasil adota o sistema da separação de poderes, conforme a melhor tradição francesa da tripartição dos poderes.25 20 PIÇARRA, Nuno. A Separação dos Poderes como Doutrina e Princípio Constitucional. Coimbra: Coimbra, 1989. p. 65-68. 21 PIÇARRA, Nuno. A Separação dos Poderes como Doutrina e Princípio Constitucional. Coimbra: Coimbra, 1989. p. 89. 22 MONTESQUIEU. Do Espírito das Leis: Martin Claret, 2007. p. 164. 23 MONTESQUIEU. Do Espírito das Leis: Martin Claret, 2007. p. 164. 24 BONAVIDES, Paulo. Teoria do Estado. 4. ed. São Paulo: Malheiros. 2003. p. 29. 25 BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 11. ed. São Paulo: Malheiros. 2005. p. 145. 7 Hoje, com a Constituição de 1988, o princípio está normatizado no artigo 2º, o qual afirma que os poderes, legislativo, executivo e judiciários, são independentes e harmônicos entre si.26 2.3 Sistema de Freios e Contrapesos No século XVII, a função legislativa era, progressivamente, tratada como a função principal do Estado. Daí surgia o problema desse poder ser exercido de forma arbitral e assim extrapolar suas funções no Estado.27 Portanto, para evitar a tirania de um dos poderes, surge o sistema de freios e contrapesos (checks and balances), tentando estabelecer um mecanismo de controle recíproco entres os poderes do Estado.28 Paulo Fernando Silveira afirma o surgimento da balança de poder na Inglaterra, ao dizer que: “o balance originou-se na Inglaterra, pela qual a Câmara dos Lordes passou a equilibrar (balancear) os projetos de leis advindos da Câmara dos Comuns, a fim de evitar que as leis demagogas, ou formuladas pelo impulso [...] fossem aprovadas”.29 Nuno Piçarra assegura que a balança de poderes se identifica com o modelo da monarquia mista, aplicada ao modelo orgânico-funcional do Estado que tem no centro o legislativo.30 Os freios que um poder pode exercer sobre o outro, ou sobre os outros, tem o seu marco inicial nos Estados Unidos, quando no julgamento do caso Marbury x Madison, o juiz Marshal declarou que o poder Judiciário tinha a missão constitucional de declarar inconstitucionalidade dos atos do congresso, quando estes fossem contrários a Constituição americana.31 Dalmo de Abreu Dallari, por sua vez, explica que, segundo o sistema de freios e contrapesos, o Estado pratica atos gerais e atos especiais. Os atos gerais são praticados pelo legislativo quando emitem regras gerais e abstratas, enquanto os especiais são 26 SILVEIRA, Paulo Fernando. Freios e Contrapesos. Belo Horizonte: Del Rey, 1999. p. 77. PIÇARRA, Nuno. A Separação dos Poderes como Doutrina e Princípio Constitucional. Coimbra: Coimbra, 1989. p. 79. 28 STRECK, Lenio e MORAIS, José Luis Bolzan de. Ciência Política e Teoria Geral do Estado. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 164. 29 SILVEIRA, Paulo Fernando. Freios e Contrapesos. Belo Horizonte: Del Rey, 1999. p. 99. 30 PIÇARRA, Nuno. A Separação dos Poderes como Doutrina e Princípio Constitucional. Coimbra: Coimbra, 1989. p. 80. 31 SILVEIRA, Paulo Fernando. Freios e Contrapesos. Belo Horizonte: Del Rey, 1999. p. 99. 27 8 efetuados pelo executivo, por meios concretos para atuar sobre as normas gerais. Assim o legislativo, com atos abstratos não poderia abusar de seu poder, bem como o executivo, que deveria atuar sobre a égide das normas do legislativo.32 Na Constituição brasileira encontram-se inúmeros casos do sistema de freios e contrapesos, como exemplo: a) por parte do executivo, o veto presidencial (CF, art. 66 § 1º)33; b) por parte do legislativo o poder de fiscalização direto (CF, art. 49, X)34; c) por parte do poder judiciário o controle da constitucionalidade das leis. O poder demasiado conferido ao Presidente da República, combinado com a relação política com o congresso, pode transformar o poder executivo em uma ditadura constitucional, relegando o legislativo a menor representatividade. No entanto, a falta de maioria parlamentar, por parte do executivo, sobreporá o poder legislativo, impondo ineficiência à Administração do Estado.35 Através de interpretações ao princípio da separação de poderes, e da ineficiência do sistema de freios e contrapesos, nota-se que ocorrem situações em que um poder vem a exercer a função de outro.36 O Estado, cada vez mais aclamado a solucionar problemas sociais e econômicos necessita de leis mais numerosas e mais técnicas. Porém, a realidade mostra que o legislativo, muitas vezes, emite suas normas obedecendo a determinações e conveniências do executivo ou a elaboração legislativa se demonstra lenta, em virtude da burocracia administrativa ou por pressões políticas dos demais poderes.37 32 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 219. 33 BRASIL. Constituição Federal (1988). 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. Art. 66. A Casa na qual tenha sido concluída a votação enviará o projeto de lei ao Presidente da República, que, aquiescendo, o sancionará. § 1º - Se o Presidente da República considerar o projeto, no todo ou em parte, inconstitucional ou contrário ao interesse público, vetá-lo-á total ou parcialmente, no prazo de quinze dias úteis, contados da data do recebimento, e comunicará, dentro de quarenta e oito horas, ao Presidente do Senado Federal os motivos do veto. 34 BRASIL. Constituição Federal (1988). 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. Art. 49. É da Competência exclusiva do Congresso Nacional: [...] X - fiscalizar e controlar, diretamente, ou por qualquer de suas Casas, os atos do Poder Executivo, incluídos os da administração indireta. 35 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 245. 36 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 220. 37 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 220. 9 O executivo, por sua vez, pressionado a solucionar problemas de sua administração, não pode esperar a morosidade do legislativo,38 muitas vezes socorrendo-se às medidas provisórias para efetivar a administração.39 É certo que a separação de poderes implementada no Estado liberal não conseguiu implementar a liberdade individual. A sociedade plena de injustiças sociais tem, cada vez mais, através das políticas administrativas, procrastinado as camadas mais humildes, oprimindo a liberdade humana, frente ao poder econômico liberal e a disputa pelo poder político da Nação.40 2.4 Formas e Sistema de Governo Segundo Lenio Luiz Streck e José Luis Bolzan, o vocábulo ‘forma’ deve ser reservado para a classificação do tipo de estrutura da organização política de um país. 41 Aristóteles, no seu livro “Política”, classifica as formas de governo e identifica as formas corretas de constituição: “As palavras ‘Constituição’ e ‘Governo’ têm o mesmo sentido, e o governo, que é a suprema autoridade da Cidade, tem de estar, ou nas mãos de um, ou nas de uns poucos, ou nas de muitos”. 42 Segundo a doutrina aristotélica, cada uma das formas de governo pode sofrer degenerações, quando os governantes passam a exercer o poder político do Estado por interesses particulares. Assim, as formas que antes seriam puras, são substituídas por impuras. Em resumo, a realeza se transforma em tirania, a aristocracia se degenera em oligarquia e o governo constitucional passaria à democracia. 43 Maquiavel expõe novo ponto de vista da caracterização das formas de governo. Para tanto, é importante determinar sua visão em duas de suas obras, quais sejam: “Discursos sobre a Primeira Década de Tito Lívio”, publicada em 1531, e “O Príncipe” publicado em 1532. 38 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 221. 39 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 112. 40 BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 11. ed. São Paulo: Malheiros. 2005. p. 145-148. 41 STRECK, Lenio e MORAIS, José Luis Bolzan de. Ciência Política e Teoria Geral do Estado. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. p. 166. 42 ARISTÓTELES. POLÍTICA. São Paulo: Martin Claret, 2007. p. 124. 43 Segundo Aristóteles, o Governo Constitucional é a forma pura de governo exercido pela administração da Cidade por uma grande parte dos cidadãos; já a democracia seria a forma de governo degenerada, pois teria em mira apenas o interesse da massa. ARISTÓTELES. POLÍTICA. São Paulo: Martin Claret, 2007. p. 124. 10 Na primeira obra, o autor procura sustentar a existência de ciclos de governo.44 A segunda obra de Maquiavel, que segundo Bobbio,45 se trata de uma reflexão de política militante, identifica duas formas de governo, logo na sua primeira frase: “Todos os Estados que existem e já existiram são e foram sempre repúblicas ou principados.”46 Montesquieu, segundo o sociólogo Raymund Aron, tem forte inspiração aristotélica, tendo o autor influência da tradição da política clássica grega. O pensador francês, como Aristóteles, vê três formas de governo, também baseadas no número de governantes. Contudo, Montesquieu difere de Aristóteles, pois considera a democracia e a aristocracia como duas modalidades da república, bem como disse Maquiavel, e determina que não basta saber o número de governantes, mas também os sentimentos políticos fundamentais de cada forma. 47 Os doutrinadores contemporâneos tendem, em sua maioria48, a classificar como forma de governo a república e a monarquia. 49 As características principais da monarquia são: a vitaliciedade, não havendo limitação temporal para o exercício de governo; a hereditariedade, a escolha do monarca se dá pela linha sucessória; e a irresponsabilidade, visto que o monarca não deve explicações ao povo ou a qualquer órgão. 50 Já, as características principais da república são: a temporariedade, pois o Chefe do Governo recebe um mandato com prazo de duração determinado; eletividade, haja vista que na república há necessidade de o Chefe de Governo ser eleito pelo povo; e responsabilidade, pois o Chefe de Governo deve prestar contas de suas orientações políticas. 44 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 225. 45 BOBBIO, Norberto. Estado Governo Sociedade: Para uma Teoria Geral da Política. 7. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2004. p. 104. 46 MAQUIAVEL. O PRÍNCIPE. 6. ed. São Paulo: Martin Claret, 2007. p. 31 47 ARON, Raymond. As Etapas do Pensamento Sociológico. 6. ed. São Paulo: Marins Fontes, 2003. p. 12. 48 Posicionamento diferente encontra-se nas obras de Norberto Bobbio e Gianfranco Pasquino, que acreditam que as formas de governo atendem à dinâmica das relações entre poder executivo e o poder legislativo e respeita, em particular, às modalidades de eleição dos dois organismos, ao seu título de legitimidade e à comparação das suas prerrogativas. Desta forma, compreendem como bipartição clássica das formas de governo a forma de governo parlamentar e a forma de governo presidencialista. BOBBIO, Norberto, MATTEUCCI, Nicola, PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política. 5. ed. Brasília: UnB, 2000. v. 1. p. 517. 49 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 102. 50 Dallari informa que houve casos de monarquias eletivas, com voto indireto dos príncipes eleitores, entretanto a regra é a hereditariedade. DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 226. 11 Outro ponto importante da organização do Estado e de governo é a divisão federativa. Da simples leitura do artigo 1º da Constituição Federal, denota-se que o Brasil é uma república federativa. Segundo Dalmo de Abreu Dallari51, os Estados são federais quando conjugam vários centros de poder político de autônomos. Importante tema a ser tratado na concepção de Estado é a relação que o poder executivo tem com o legislativo, configurando a criação dos sistemas de governo que organizam o Estado.52 Segundo José Afonso da Silva, sistemas de governo são técnicas que regem as relações entre o poder legislativo e o poder executivo, no exercício das funções governamentais.53 O modo como se operam estas técnicas, com maior independência ou maior colaboração, ou a combinação de ambos numa assembléia, dá origem a três sistemas básicos, ou seja, o convencional, o parlamentarismo ou o presidencialismo.54 O sistema convencional prevê o domínio político pela assembléia, não havendo executivo separado. Se existir um Chefe de Estado, ele será figura decorativa e nem haverá governo separado, porque esse será exercido por uma Comissão da Assembléia. Este modelo, de referência parlamentarista, nasce na França, na Constituição montanhesa de 24 de junho de 1793.55 Os exemplos de Estados com sistema convencional são os da Suíça, de Cuba, da antiga URSS, da Polônia, da Hungria, da Romênia e da Bulgária. 56 Alexandre de Moraes explica que o parlamento surgiu e se desenvolveu em muitos países da Europa, durante o Estado medieval, na forma de instituições políticas e genericamente denominadas parlamentos ou cortes gerais, ou ainda, Estados Gerais. 57 A revolução inglesa em 1688, conhecida como Revolução Gloriosa, transforma o parlamentarismo como a maior força política da época58. Dallari expõe, com clareza, a situação parlamentar frente à revolução inglesa: 51 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 254. 52 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 229. 53 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 505. 54 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 505. 55 BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 11. ed. São Paulo: Malheiros. 2005. p. 333. 56 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 505. 57 MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 18. 12 A Revolução Inglesa, que teve seu ápice nos anos de 1688 e 1689, culminou com a expulsão do Rei católico Jaime II, que foi substituído por Guilherme de Orange e Maria, ambos protestantes, embora ela fosse filha do próprio Jaime II. A partir de 1688 o Parlamento se impõe como maior força política, e altera, inclusive, a linha sucessória, com a exclusão do ramo católico dos Stuarts, o que iria ter sérias conseqüências poucos anos depois. Durante o reinado de Guilherme e Maria, bem como no de sua sucessora, a Rainha Ana, estabeleceu-se o hábito de convocação pelo soberano de um “Conselho de Gabinete”, que era um corpo restrito de conselheiros privados, consultados regularmente sobre assuntos de relações exteriores. 59 Alexandre de Moraes aponta, ainda, que, com o advento do constitucionalismo, o parlamentarismo passa para uma fase conhecida como a racionalização do parlamentarismo, que consiste na subordinação do sistema à norma jurídicoconstitucional. O autor, de forma exemplificativa, cita Mirkine-Guetzévitch, sobre o tema: Formulando e confirmando, como o fez, o parlamentarismo, a Europa nova foi muito mais longe que as nações ocidentais do parlamentarismo ‘clássico’. Essa nova concepção, que apareceu nos textos das Constituições européias, transformou o costume em uma fórmula exata do direito escrito. As Constituições já não se limitam a formular em termos gerais e vagos a responsabilidade política dos ministros. Ao contrário, as diversas Constituições estabeleceram, com mais ou menos precisão, o próprio princípio do parlamentarismo; introduziram igualmente o processo interessante do voto de desconfiança, germe de uma forma de processo constitucional do parlamentarismo. Ao lado destas novas formas do parlamentarismo nitidamente definido, ligado ao princípio, característico de todas as novas Constituições, da supremacia do poder legislativo, vê-se surgir o referendum. E este referendum novo adquire um sentido político totalmente diferente do referendum suíço ou americano.60 Então, as características principais do parlamentarismo encontradas na doutrina são: a) Distinção entre Chefe de Estado e Chefe de Governo; b) Primeiro-Ministro é indicado (ou mesmo nomeado) pelo Presidente da República ou Monarca; c) Chefe de governo com responsabilidade; d) Dissolução da Câmara; Manoel Gonçalves Ferreira Filho assevera que no parlamentarismo há uma divisão funcional de funções entre o legislativo, o executivo e o judiciário.61 A 58 MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 19. DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 232. 60 MIRKINE-GUETZÉVITCH. As novas tendências do direito constitucional. São Paulo: Nacional, 1933. p. 188. Apud MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 21. 61 FILHO, Manuel Gonçalves de Ferreira. O Parlamentarismo. São Paulo: Saraiva, 1993. p. 9. 59 13 separação dos poderes se dá por cooperação ou interdependência, e não por independência como no presidencialismo. Essa interdependência se relaciona principalmente entre o poder legislativo e o executivo, em relação a uma coresponsabilização.62 O parlamentarismo é adotado, por uma considerável parte da doutrina, (Paulo Bonavides, Jarbas Lima, Miguel Reale) como possibilidade para a realidade brasileira, sem, contudo desenvolver uma solução milagrosa, mas como possibilidade de contornar algumas práticas políticas que o presidencialismo não contribuiu para um quadro mais favorável.63 Já o presidencialismo, tem como suas principais características: a) O Presidente da República é Chefe de Estado e Chefe de Governo; b) A chefia do executivo é unipessoal; c) O Presidente da República é escolhido pelo povo; d) O Presidente é escolhido por um prazo determinado; e) O Presidente da República tem poder de veto; Portanto, diante da caracterização básica dos sistemas de governo, parece o parlamentarismo mais apto a conter crises do que o presidencialismo, vista a relação de interdependência dos poderes executivo e legislativo, e da co-responsabilização política dos poderes. 3. Presidencialismo 3.1 História do presidencialismo Alexandre de Moraes aponta como marco inicial do sistema de governo presidencialista a constituição norte-americana de 1787, tendo como literatura de análise e caracterização os artigos federalistas de John Jay, James Madison e Alexander Hamilton. 64 É evidente que o sistema presidencialista teve forte influência dos colonizadores ingleses de cultura parlamentar. Alexandre de Moraes diz claramente que os “pais fundadores” dos Estados Unidos reuniram-se na Filadélfia, na Constituição de 1787 e que, num primeiro momento, foi fortemente marcado pela influência parlamentar 62 LIMA, Jarbas. Direito e Justiça: Revista da Faculdade de Direito da PUCRS – Parlamentarismo Instrumento de Soluções para o Brasil. v. 27. Porto Alegre: Edipucrs. 2003. p. 103. 63 LIMA, Jarbas. Direito e Justiça: Revista da Faculdade de Direito da PUCRS – Parlamentarismo Instrumento de Soluções para o Brasil. v. 27. Porto Alegre: Edipucrs. 2003. p. 105. 64 MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 16 14 britânica, mas acabou por gerar um sistema que confronta em uma única pessoa a maior concentração de poder na história moderna contemporânea. 65 A Constituição americana foi aprovada por estreita margem de convencionais. Nas convenções de ratificação nos Estados, poucos votos separaram as forças próconstituição (os federalistas) e os opositores (antifederalistas), ou seja, poucos votos de diferença garantiram a criação do sistema presidencialista de governo. Dalmo de Abreu Dallari descreve, em parte, os acalorados debates da Confederação da Filadélfia: [...] os adeptos do simples aperfeiçoamento da confederação alegavam, antes de tudo, que não tinham mandato para mais do que isso. Compreendendo muito bem que a adesão à federação significaria a perda da soberania e da independência, lembravam que só haviam recebido a incumbência de rever os Artigos de Confederação. Por esse motivo, não teria validade jurídica um ato que fosse além disso, parecendo mesmo a alguns que aceitar a federação seria trair a confiança dos representados. Outro argumento ardorosamente sustentado era que a federação tinha um caráter excessivamente centralizador, pois representaria a submissão de todos a um governo central [...] 66 Alexandre de Moraes, por seu turno, afirma que se pretendia implementar um regime de governo semelhante ao parlamentarismo constitucional inglês, sem, porém, a figura do rei.67 Também, segundo o autor supracitado, no processo histórico o presidencialismo apresenta mudanças, inicialmente caracterizadas por um processo político autoritário e centralizador, em torno da figura presidencial. Mais modernamente, numa tentativa de ampliação dos poderes de controles parlamentares e judiciais o presidencialismo procura garantir uma maior estabilidade democrática. 68 A luta pela concretização democrática, especialmente na América Latina e na África que seguiram o modelo presidencialista norte-americano, tem gerado grandes debates sobre as difíceis escolhas sobre modelos institucionais a serem implementados a fim de garantir-se, nas gestões dos negócios públicos, o necessário equilíbrio entre os diversos órgãos detentores do poder estatal, bem como a possibilidade de maior estabilidade de controle e fiscalização. 69 65 MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 16 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 255. 67 MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 24. 68 MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 23. 69 MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 16. 66 15 No Brasil, o sistema presidencialista originou-se com a Constituição de 1891, a qual operou outras importantes mudanças no Estado brasileiro, tais como a república e o federalismo.70 Em 1834 a Constituição do Império de 1824 sofreu um Ato Adicional que redimiu de certo modo o caráter absolutista outorgado pelo poder Moderador do Imperador, contido nos artigos 98 a 100 da Carta Magna.71 Entretanto, tal ato acaba perdendo força com a lei de interpretação de 1840, tratando a leitura do ato de forma concentrada do poder.72 O poder central, abalado por rebeliões e pressões liberais, sucumbe às forças descentralizadoras em 1889, tendo o seu marco legal o decreto n. 1, de 15 de novembro de 1889, que proclamou a República Federativa,73 sem, no entanto, mencionar a forma presidencial de governo.74 Paulo Bonavides sustenta que Rui Barbosa, idealizador da Constituição de 1891, tinha como posição ideológica o federalismo, independentemente da forma ou do sistema de governo, pois acreditava que a federação era indispensável ao progresso do país.75 Portanto, a Constituição de 1891 apresentava o sistema federativo, inspirado nos ideais do constitucionalismo americano, em uma república que expurgava idéias parlamentaristas, visto como um sistema peculiar às realezas constitucionais do velho mundo.76 3.2 Presidencialismo na Constituição do Brasil de 1988 Em 1984, o deputado Dante de Oliveira propõe uma emenda constitucional para implementar a eleição direta para Presidente; entretanto, tal medida não obteve êxito, restando a eleição indireta que elegeu Tancredo Neves à Presidência da República.77 70 ANTUNES, Marcus Vinicius Martins. Mudança Constitucional: O Brasil pós 88. Porto Alegre: Livraria do Advogado. 2003. p. 93. 71 BONAVIDES, Paulo. Teoria do Estado. 4. ed. São Paulo: Malheiros. 2003. p. 159. 72 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 77. 73 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 77. 74 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 15. ed. São Paulo: Malheiros. 2004. p. 223. 75 BONAVIDES, Paulo. Teoria do Estado. 4. ed. São Paulo: Malheiros. 2003. p. 170. 76 BONAVIDES, Paulo. Teoria do Estado. 4. ed. São Paulo: Malheiros. 2003. p. 170 77 MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 114. 16 O então Presidente eleito veio a falecer antes de assumir o cargo, tomando posse o seu vice, José Sarney, que sempre manteve vínculos com as forças militares, provocando certa desesperança do povo. Contudo, o Presidente deu seqüência à fase de democratização, enviando ao Congresso Nacional emenda constitucional e convocando uma Assembléia Constituinte.78 O presidencialismo brasileiro, mesmo após a redemocratização, demonstrou-se instável às crises institucionais, prova disso é que o primeiro Presidente eleito diretamente pelo voto popular, Fernando Collor, sofreu um impeachment. A Carta Constitucional manteve o presidencialismo, contudo, informando, no artigo 2º das disposições transitórias que deverá o povo, através de plebiscito, escolher a forma e o sistema de governo. A data do plebiscito , marcado para o dia 7 de setembro de 1993, foi alterada, através da Emenda Constitucional nº 2 de 1992, para 21 de abril de 1993.79 Paulo Bonavides assevera que a antecipação da data do plebiscito foi equivalente a um golpe de Estado, visto que infringiu a norma constitucional. Aponta também que a data, constante nos atos transitórios constitucionais, não poderia ser alterada, ocasionando lesão ao texto magno, tanto do ponto de vista material, quanto do formal.80 Mantido o presidencialismo, este se caracteriza por ser um sistema de governo de separação de poderes, baseado na tripartição de Montesquieu.81 O sistema da separação de poderes que, de início, mostrou-se rígido, passou a atenuar-se, manteve-se, entretanto, mais brando do que o idealizado.82 O Presidente da República será escolhido pelo povo, através de sufrágio universal, por sistema eleitoral majoritário de dois turnos, ao qual, caso o candidato não obtenha maioria absoluta no primeiro turno, haverá mais uma votação entre os dois candidatos mais bem votados,83 conforme regra do artigo 77 §3º da Constituição Federal.84 78 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 88. 79 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 88. 80 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 15. ed. São Paulo: Malheiros. 2004. p. 223. 81 FILHO, Manuel Gonçalves de Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 30. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 141. 82 BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 11. ed. São Paulo: Malheiros. 2005. p. 296. 83 MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 73. 84 BRASIL. Constituição Federal (1988). 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. Art. 77. A eleição do Presidente e do Vice-Presidente da República realizar-se-á, simultaneamente, no primeiro domingo de outubro, em primeiro turno, e no último domingo de outubro, em segundo turno, se houver, do ano 17 A escolha do Presidente é por tempo determinado, que segundo o artigo 82 da Constituição Federal será de quatro anos.85 O tempo razoável para a duração do mandato presidencial não é pacífico na doutrina.86 No Brasil, desde a primeira Constituição republicana, nunca se possibilitou a reeleição ao cargo de Presidente, até o ano de 1997. A Constituição de 1988 repeliu a idéia de reeleição nos seus artigos 14 §5º e 8287. Entretanto, na primeira oportunidade de reeleição, posterior à ditadura, houve a Emenda Constitucional nº 16 de 1997, possibilitando a mesma.88 A Constituição veda mais de dois mandatos sucessivos, ou seja, após dois mandatos consecutivos, não poderá o Presidente se candidatar novamente para a eleição subseqüente, incidindo sobre ele a inelegibilidade relativa por motivos funcionais para o mesmo cargo, mas logo após esse pleito, terá novamente chances de se candidatar, visto que a constituição não veda a quantidade de vezes que uma pessoa possa exercer mandatos presidenciais, mais sim a sucessividade indeterminada de mandatos.89 anterior ao do término do mandato presidencial vigente; [...] § 3º - Se nenhum candidato alcançar maioria absoluta na primeira votação, far-se-á nova eleição em até vinte dias após a proclamação do resultado, concorrendo os dois candidatos mais votados e considerando-se eleito aquele que obtiver a maioria dos votos válidos. 85 BRASIL. Constituição Federal (1988). 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. Art. 82. O mandato do Presidente da República é de quatro anos e terá início em primeiro de janeiro do ano seguinte ao da sua eleição. 86 Alexandre de Moraes informa a diversidade do prazo ao identificar que no Brasil já se teve prazo de 4 anos (Constituições Federais de 1934, 1967 e 1988), 5 anos (Constituição Federal de 1946) e de 6 anos (Constituição Federal de 1937 e Emenda Constitucional de 1969). MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 117. 87 Alexandre de Moraes assevera que os artigos constitucionais que vetavam a reeleição estavam dispostos: art. 14 §5º - “São inelegíveis para os mesmos cargos, no período subseqüente, o Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido, ou substituído nos seis meses anteriores ao pleito."; art. 82 - O mandato do Presidente da República é de quatro anos, vedada a reeleição para o período subseqüente, e terá início em 1º de janeiro do ano seguinte ao da sua eleição. Hoje, após a EC nº 16, têm seus textos assim: art. 14 §5º - “O Presidente da República, os Governadores de Estado e do Distrito Federal, os Prefeitos e quem os houver sucedido ou substituído no curso dos mandatos poderão ser reeleitos para um único período subseqüente”; art. 82 – “O mandato do Presidente da República é de quatro anos e terá início em primeiro de janeiro do ano seguinte ao da sua eleição”. MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 125. 88 MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 125. 89 MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 125. 18 3.3 Os poderes do presidente Gianfranco Pasquino afirma que o presidencialismo está caracterizado pela acumulação, por parte do chefe do executivo, dos poderes de Chefe de Estado e Chefe de Governo.90 Segundo Alexandre de Moraes, apoiado nas idéias de Santiago Sanchez Gonzáles e Pilar Mellado Prado, o presidencialismo reúne numa única pessoa a maior concentração de poder da história da humanidade, por causa do apoio da maioria do Eleitorado.91 Certo é que os fundadores do presidencialismo nunca teriam imaginado que o poder do Presidente seria tão centralizador quanto se tornou. Neste sentido, Alexandre Hamilton explica em parte este poder centralizador: As ações do governo federal serão mais amplas e significativas em tempos de guerra e ameaças; as dos governos estaduais, em tempos de paz e segurança. Como os primeiros serão provavelmente bem mais raros que os últimos, os governos estaduais gozarão sob este aspecto de mais vantagens sobre o governo federal. De fato, quanto mais os poderes federais puderem se tornar aptos à defesa nacional, menos freqüentes serão aqueles cenários de ameaça que poderiam favorecer sua ascendência sobre os governos dos vários Estados. Examinando-se a nova Constituição com esmero e imparcialidade, verifica-se que a mudança que ela propõe consiste muito menos no acréscimo de novos poderes à União que na revitalização de seus poderes originais.92 Paulo Bonavides, identificando a centralização dos poderes do Presidente, assevera que estes são considerados assoberbantes e esmagadores, sendo o sistema criticado por ser o regime de um homem só.93 O mesmo autor, citando Gilberto Amado, afirma que o regime presidencial escraviza o parlamento, canaliza a irresponsabilidade e torna-se o grande poder.94 Dentre os gigantescos poderes presidenciais, pode-se apontar o da chefia da Administração Pública, na qual o Presidente vale-se de ministérios e serviços públicos entregues a cargos de confiança.95 Assim, a Constituição brasileira de 1988, define como atribuições do Presidente da república a de nomear e exonerar os Ministros de Estado (art. 84, I); exercer, com 90 BOBBIO, Norberto, MATTEUCCI, Nicola, PASQUINO, Gianfranco. Dicionário de Política. 5. ed. Brasília: UnB, 2007. v. 1. p. 519. 91 GONZALEZ, Santiago Sanchez; PRADO, Pilar Mellado. Sistemas políticos actuales. 2ª Ed. Madrid: Centro de Estúdios Ramón Areces, 1995. p. 81. apud MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 131. 92 HAMILTON, Alexander, MADISON, James, JAY, John. O Federalista. Campinas: Russel. 2003. p. 293. 93 BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 11. ed. São Paulo: Malheiros. 2005. p. 298. 94 BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 11. ed. São Paulo: Malheiros. 2005. p. 312. 95 BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 11. Ed. São Paulo: Malheiros. 2005. p. 298. 19 auxílio dos Ministros a direção superior da Administração Federal (art. 84; II) prover e extinguir os cargos públicos federais na forma da lei (art. 84, XXV).96 Em relação aos poderes do Presidente para conduzir a política externa, pode-se dizer que o Presidente é o chefe diplomático do país, mesmo dividindo competências com o Congresso.97 O Presidente também é quem exerce a chefia de Estado, mostrando a exteriorização do Estado aos olhos estrangeiros.98 Segundo Alexandre de Moraes, “há um amplo entendimento de que o Presidente da República está investido de grande poder, competindo-lhe, inclusive, dar reconhecimento ou não de status a governo estrangeiro.99 Ainda, dentre as atribuições do Presidente, cabe-lhe manter relações com Estados estrangeiros, creditar seus representantes diplomáticos, celebrar tratados, fazer convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional,100 bem como, presidir cerimônias cívicas, representação do Estado em atos solenes internacionais, recepção de embaixadores, o grão-mestrado das ordens honoríficas, conselhos e até mesmo arbitragem nas crises e conflitos políticos internacionais.101 Outro setor importante que se denota em relação ao poder do Presidente é a chefia das forças armadas, garantindo ao chefe do executivo, na paz ou na guerra, supremacia da autoridade civil, eleita democraticamente.102 Cabe, por fim, ao Presidente poderes legislativos, como o veto presidencial, as medidas provisórias, propor emendas constitucionais, remeter mensagem e plano de governo ao Congresso Nacional por ocasião da abertura da sessão legislativa, expondo a situação do país e solicitando as providências que achar necessárias, enviar ao Congresso o plano plurianual, o projeto de diretrizes orçamentárias, bem como prestar anualmente, ao Congresso Nacional, as contas relativas ao exercício anterior.103 96 BRASIL. Constituição Federal (1988). 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: [...] XXV - prover e extinguir os cargos públicos federais, na forma da lei; 97 MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 145. 98 FILHO, Manuel Gonçalves de Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 30. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 222. 99 MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 145. 100 BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 11. ed. São Paulo: Malheiros. 2005. p. 301. 101 FILHO, Manuel Gonçalves de Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 30. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 222. 102 MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 145. 103 BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 11. ed. São Paulo: Malheiros. 2005. p. 301. 20 4. O Veto Presidencial 4.1 Conceito de Veto Segundo J. Cretella Júnior, sanção é o ato integrativo formal, com o qual o Presidente da República sacramenta o ato legislativo.104 Ao lado da sanção, há outra operação integrativa, a promulgação, que é o ato complementar que atesta a existência da lei.105 O veto, ao contrário da sanção, é a manifestação de discordância do Presidente com o projeto de lei apresentado pela Câmara Legislativa, consagrando-se como técnica de controle de exercício do poder político.106 Pinto Ferreira informa que o instituto do veto já existia na Roma antiga107, através dos tribunos da plebe, que se sentavam no vestíbulo do Senado, e anulavam as decisões, coibindo abusos do Senado e da velha oligarquia.108 A Inglaterra recebeu o instituto do veto como prerrogativa da Coroa.109 Entretanto, como sustenta Manuel Garcia Pelayo110, o veto cai em desuso a partir de 1709, não tendo sido abolido. Na realidade é pouco utilizado, visto o caráter cooperativo que o parlamentarismo tem no processo legislativo. A primeira Constituição Francesa, após a Revolução, datada de 03 de setembro de 1791, consagrou o instituto do veto, como poder do rei. As Constituições seguintes não consagraram o veto. Somente na Constituição de 1830 é que o instituto do veto volta a ser admitido.111 104 JÚNIOR, José Cretella. Comentários à Constituição Brasileira de 1988. Vol. V. Rio de Janeiro: Forense. 1991. p. 2762. 105 JÚNIOR, José Cretella. Comentários à Constituição Brasileira de 1988. Vol. V. Rio de Janeiro: Forense. 1991. p. 2762. 106 MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 192. 107 Ernesto Rodrigues identifica que o poder de veto na Roma antiga advém da intercessão (intercessio) dos cônsules romanos. Afirma que a magistratura, no inicio, era representada pelo Consulado, regidos pelo principio da colegialidade, destinado a conter abusos do Poder Soberano. Assim poderiam, através do intercessio (veto, jus prohibendi) anular os atos de um colega ou magistrado inferior. RODRIGUES, Ernesto. O Veto no Direito Comparado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 55. 108 FERREIRA, Pinto. Curso de Direito Constitucional. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 378. 109 FERREIRA, Pinto. Curso de Direito Constitucional. 9. ed. São Paulo: Saraiva. 1998. p. 378. 110 PELAYO, Manuel Garcia. Derecho Constitucional comparado. 3. ed. Madrid: Revista de Occidente, 1953. p. 298. 111 RODRIGUES, Ernesto. O Veto no Direito Comparado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 8283. 21 Alexandre de Moraes, ao explicar o veto presidencial, o consagra como importante instrumento de controle do exercício da competência legislativa do Congresso, impedindo abusos do poder de produções legislativas.112 O veto presidencial constitucional foi instituído, pela primeira vez, no presidencialismo americano (Constituição Americana, art. I, seção 7, item 2), possibilitando o veto total ao projeto de lei do poder legislativo.113 No Brasil, foi na Constituição de 1891,que se previu a possibilidade deste poder, em seu artigo 37, §1º.114 Manoel Gonçalves de Ferreira Filho explica que em 1926, com a emenda n. 3, de 3 de setembro do mesmo ano, houve alteração do texto constitucional, adotando uma modalidade original de veto no constitucionalismo brasileiro, ou seja, o veto parcial. O mesmo teve como precedentes as Constituições estaduais brasileiras e americanas. Assim, o autor explica as razões pelas quais ouve a criação de dita modalidade de veto: Sua criação visava a atender a uma necessidade universalmente sentida, qual seja a de dar meios ao Executivo de expungir, dos textos Legislativos, excrescências, “pingentes” ou “caudas”, como se usava chamá-los, acrescentados maliciosamente durante o debate parlamentar. Tais raiders, pois é assim que os autores americanos os denominam, são disposições que, nada tendo que ver com a matéria regulada no projeto, são nele enxertadas para que o presidente tenha que aceitá-las, se não quiser fulminar todo o projeto.115 Segundo o supracitado autor, as “caudas” que estabelecem disposições que não têm conexão com o texto principal do projeto de lei, constituem uma forma sutil de chantagem política, contra a qual, sem o procedimento do veto parcial, poderia desarmar o presidente.116 A modalidade de veto parcial tornou-se tradição constitucional no Brasil, e foi prevista nas Constituições de 1934 no artigo 45, na Constituição de 1937 no artigo 66, §1º, na Constituição de 1946 no artigo 70, §1º, bem como nas Constituições de 1967 artigo 62, §1º117 e na atual Constituição de 1988 artigo 66, §1º.118 112 MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 192. SCHWARTZ, Bernard. Direito Constitucional Americano. Rio de Janeiro: Forense, 1966. p. 408. 114 MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 192. 115 FILHO, Manuel Gonçalves de Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 30. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 196. 116 FILHO, Manuel Gonçalves de Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 30. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 196. 117 O artigo que previa a possibilidade de veto parcial foi alterado pela EC n. 01⁄69, passando a constar expresso no artigo 59, §1º. 118 MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 194. 113 22 Contudo, o veto parcial, que deveria impedir as práticas abusivas dos parlamentares, se mostrou como mecanismo para práticas abusivas por parte do poder executivo, que não raro alterava palavras isoladas do projeto de lei, mudando-lhe o sentido ou o alcance. Em 1946, com a Emenda Constitucional n. 17, houve alteração do texto constitucional, restringindo o poder de veto parcial a modificação de artigos, parágrafos, incisos, itens, números ou alíneas.119 A natureza do veto presidencial é um tema bastante controvertido. Os doutrinadores não consentem se a mesma é legislativa ou executiva, e, ainda, se o veto é um direito ou um poder do Presidente da República. Dentre os defensores da natureza legislativa, está Pinto Ferreira, que considera o veto uma modalidade de colaboração legislativa.120 Ainda, Bernard Schwartz declara o caráter legislativo do ato, pois entende que o Presidente pode ser visto da mesma ótica do parlamentar que vota a lei.121 Ernesto Rodrigues, defensor do caráter executivo do poder de veto do Presidente, cita Octacílio Alecrim, com estas palavras: “Com efeito, se o veto do Presidente é uma negativa sobre uma proposição afirmativa do Congresso, é intuitivo que se trata de dois poderes qualitativamente diferentes”.122 Entende-se que o veto presidencial ao projeto de lei tem natureza legislativa, visto que a própria Constituição normatiza o instituto, no capítulo referente ao processo legislativo. O presidente, através do veto, tem interferência direta na produção da lei. Para Alexandre de Moraes, a natureza jurídica do veto não encontra unanimidade entre os constitucionalistas, pois há teses que sustentam o veto como um direito, ou como um poder, ou até como um poder-dever do Presidente.123 119 FILHO, Manuel Gonçalves de Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 30. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 197. 120 MAYER, Maurice. O veto legislativo do chefe do Estado. Genève, 1948. apud FERREIRA, Pinto. Curso de Direito Constitucional. 9. ed. São Paulo: Saraiva. 1998. p. 378. 121 Com intuito de determinar se deve impor sua recusa, o presidente pode, na realidade, considerar as leis que se apresentam com o mesmo ponto de vista do que para os membros do Congresso quando têm que votar as leis. Como é esse o caso, o poder de veto é, sem dúvida, de caráter Legislativo. SCHWARTZ, Bernard. Los Poderes del Gobierno. Vol. II. Ciudad del México: Universidad Nacional Autónoma de México, 1966. p. 35. 122 ALECRIM, Octacílio. O Sistema de Veto nos Estados Unidos. Rio de Janeiro: Instituto de Estudos Políticos. 1954. p. 86. apud RODRIGUES, Ernesto. O Veto no Brasil. Rio de Janeiro: Forense, 1981. p. 24. 123 MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 194. 23 Neste diapasão, podemos citar o posicionamento de doutrinadores que defendem a tese da natureza jurídica do veto como direito, dentre eles Darcy Azambuja124 e Paulo Bonavides.125 Do ponto de vista da natureza de poder, encontra-se defesa nas obras de Dalmo Dallari126 e Ernesto Rodrigues.127 Bernard Schwartz utiliza, na maior parte do seu trabalho, o veto como poder, entretanto, diz que o Presidente tem o dever de aprovar ou rejeitar um projeto de lei.128 Por este motivo, a doutrina classifica este autor como defensor da natureza de poderdever do veto. Posiciona-se no sentido de que a natureza do veto seja um poder, uma vez que a Constituição, em seu art. 84, inciso V, trata esse ato como uma das atribuições do Presidente. Logo, é um ato executivo, que contrabalanceia os poderes do legislativo.129 Porém, não há como negar que, diante de leis abusivas, o Presidente deverá vetá-las, determinando um poder-dever. 4.2 Motivação e Procedimentos do Veto A Constituição brasileira, no título IV - da organização dos poderes, capítulo I do poder legislativo, seção VIII - do processo administrativo, subseção III - das leis, explica no seu artigo 66 e no seu § 1º que, concluída a votação de projeto de lei, este deverá ser remetido ao Presidente da República para que ele possa sancioná-lo ou vetálo. Art. 66 - A Casa na qual tenha sido concluída a votação enviará o projeto de lei ao Presidente da República, que, aquiescendo, o sancionará. § 1º - Se o Presidente da República considerar o projeto, no todo ou em parte, inconstitucional ou contrário ao interesse público, vetá-lo-á total ou parcialmente, no prazo de quinze dias úteis, contados da data do recebimento, e comunicará, dentro de quarenta e oito horas, ao Presidente do Senado Federal os motivos do veto. 130 124 AZAMBUJA, Darcy. Teoria Geral do Estado. 5. ed. Porto Alegre: Globo. 1969. p. 297. BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 11. ed. São Paulo: Malheiros. 2005. p. 298. 126 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 244. 127 RODRIGUES, Ernesto. O Veto no Direito Comparado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 46. 128 SCHWARTZ, Bernard. Direito Constitucional Americano. Rio de Janeiro: Forense. 1966. p. 130. 129 BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 11. ed. São Paulo: Malheiros. 2005. p. 298. 130 BRASIL. Constituição Federal (1988). 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. 125 24 Portanto, após os parlamentares aprovarem um projeto de lei, relacionado às matérias do artigo 48 da Constituição, deverão levá-lo ao Presidente da República para que este sancione ou vete-o, total ou parcialmente.131 Segundo Manuel Gonçalves de Ferreira Filho, o veto pode ser considerado um ato composto, haja vista que: “compreende ele dois atos, a manifestação da vontade negativa – a discordância – e a comunicação fundamentada dessa discordância”.132 O veto deverá ser motivado, no aspecto formal, material ou em ambos. O aspecto formal, também chamado de veto jurídico, diz respeito às razões do Presidente vetar um projeto de lei que entenda inconstitucional; já o aspecto material, conhecido como veto político, diz respeito ao interesse público, uma vez que entenda o Presidente ser o texto do projeto contrário ao interesse público. Poderá haver também motivação dupla133, ou seja, jurídico-política, quando ao mesmo tempo o texto do projeto for, no entendimento do Presidente, inconstitucional e contrário ao interesse público134. O parágrafo 3º do artigo 66 da Constituição Federal informa que se o Presidente não se manifestar no prazo dos quinze dias, seu silêncio representará sanção ao projeto de lei. É o caso da sanção tácita, pois não pode o legislativo ficar à deriva, esperando que o Presidente decida de acordo com suas motivações, seja de caráter jurídico ou político, articulando com seus ministros e assessores infinitamente.135 No caso da sansão tácita, a não manifestação pelo Presidente acarreta, segundo artigo 66 §7º, a promulgação do projeto em lei pelo poder legislativo. 136 131 FILHO, Manuel Gonçalves de Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 30. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 198. 132 FILHO, Manuel Gonçalves de Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 30. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 199. 133 Exemplo de manifestação de veto motivado pela inconstitucionalidade da lei, bem como a manifestação política, encontra-se no comentado veto à Emenda nº 3 no Projeto de Lei nº 6.272, de 2005: “Comunico a Vossa Excelência que, nos termos do § 1o do art. 66 da Constituição, decidi vetar parcialmente, por inconstitucionalidade e contrariedade ao interesse público, o Projeto de Lei no 6.272, de 2005... § 4o do art. 6o da Lei no 10.593, de 2002, acrescentado pelo art. 9o do Projeto de Lei - § 4o No exercício das atribuições da autoridade fiscal de que trata esta Lei, a desconsideração da pessoa, ato ou negócio jurídico que implique reconhecimento de relação de trabalho, com ou sem vínculo empregatício, deverá sempre ser precedida de decisão judicial.” (NR) Razões do veto “As legislações tributária e previdenciária, para incidirem sobre o fato gerador cominado em lei, independem da existência de relação de trabalho entre o tomador do serviço e o prestador do serviço. Condicionar a ocorrência do fato gerador à existência de decisão judicial não atende ao principio constitucional da separação de poderes”. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/Ccivil_03/_Ato2007-2010/2007/Msg/VEP-140-07.htm>. Acessado em: 15 de out. de 2008. 134 MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 194. 135 BASTOS, Celso Ribeiro e MARTINS, Ives Gandra. Comentários à constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva. 1995. Vol. IV, Tomo I. p. 495. 136 BASTOS, Celso Ribeiro e MARTINS, Ives Gandra. Comentários à constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva. 1995. Vol. IV, Tomo I. p. 495. 25 Portanto, o Presidente da República tem dois prazos a cumprir, sejam eles o de quinze dias para manifestar a sanção ou o veto, sob pena de o projeto ser sancionado tacitamente, e o de quarenta e oito horas após a manifestação do veto para fundamentação. O marco inicial da contagem do prazo, de quinze dias para manifestação do Presidente, é o do dia útil posterior ao recebimento do projeto de lei, como preceitua o Código de Processo Civil Brasileiro no seu artigo 184. Já o prazo para o Presidente da República expor sua motivação ao veto, é de quarenta e oito horas, após o término do prazo quinzenal. 4.3 Reapreciação do Veto pelo Legislativo Exercendo o Presidente o poder do veto, o projeto de lei retornará ao Congresso Nacional que, em seção conjunta, no prazo de trinta dias, reapreciará o projeto, por força do artigo 66, § 4º da Constituição do Brasil.137 Diz-se, então, que o veto é relativo ou superável, pois não impede absolutamente o texto do projeto de lei, apenas evitando sua imediata conversão em lei138. Paulo Bonavides, por sua vez, declara o caráter relativo do veto presidencial, pois poderá o Congresso tolher os efeitos do ato do Executivo, mediante rejeição via votação legislativa, a qual deverá ter maioria de dois terços, deixando em última análise aos parlamentares a aceitação ou não do veto.139 As características da relatividade do veto presidencial podem ser encontradas nos textos de Alexander Hamilton, que diz: O Presidente dos Estados Unidos terá o poder de restituir um projeto de lei aprovado pelas duas casas do Legislativo, a fim de que seja reconsiderado, transformando-se em lei se, quando dessa consideração, for aprovado por dois terços dos membros de ambas as casas. 140 137 BRASIL. Constituição Federal (1988). 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 196. 139 BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 11. ed. São Paulo: Malheiros. 2005. p. 298. 140 HAMILTON, Alexander, MADISON, James, JAY, John. O Federalista. Campinas: Russel. 2003. p. 421. 138 26 Manuel Gonçalves de Ferreira Filho, explica que havendo o veto total do projeto de lei, nada obsta ao congresso reaprecie cada disposição do projeto de per si, ratificando umas e rejeitando outras. 141 Quando ocorrer o veto presidencial, o Congresso terá o prazo de trinta dias, a contar do seu recebimento para o reexame do projeto. Não sendo o prazo cumprido, deverá o veto ser colocado na ordem do dia, sobrestadas as demais deliberações até a definição da sua votação, por força do §6º do artigo 66:142 Art. 66 - A Casa na qual tenha sido concluída a votação enviará o projeto de lei ao Presidente da República, que, aquiescendo, o sancionará. [...] § 6º - Esgotado sem deliberação o prazo estabelecido no § 4º, o veto será colocado na ordem do dia da sessão imediata, sobrestadas as demais proposições, até sua votação final.143 O regimento comum do Congresso Nacional informa em seu artigo 104, que, comunicado o veto, o Presidente do Senado deverá, em 72 horas, convocar sessão conjunta para dar conhecimento da matéria.144 Neste caso, será composta Comissão Mista do Congresso Nacional145, designada para relatar e estabelecer calendário para a tramitação. O prazo de 30 dias exposto no parágrafo 4º do artigo 66 da Constituição Federal, de acordo com o § 1º do artigo 104 do regimento comum do Congresso será contado a partir da sessão convocada. A Comissão terá, por força do artigo 105 do regimento comum, prazo de 20 dias de sua constituição para apresentar relatório sobre o veto. A Comissão deverá definir data para, em sessão conjunta, se deliberar sobre o veto, momento em que os parlamentares terão os avulsos com o texto do projeto, das partes vetadas e sancionadas 141 FILHO, Manuel Gonçalves de Ferreira. Curso de Direito Constitucional. 30. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 200. 142 BASTOS, Celso Ribeiro e MARTINS, Ives Gandra. Comentários à constituição do Brasil. 4º Volume, Tomo I. São Paulo: Saraiva. 1995. p. 498. 143 BRASIL. Constituição Federal (1988). 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. 144 BRASIL. Regimento Comum do Congresso Nacional. Resolução n.º 1, de 1970, com alterações posteriores até 2006. Disponível em: < http://www.senado.gov.br/sf/legislacao/regsf/RegCN.pdf>. Acessado em: 20 de set. de 2008. 145 BRASIL. Regimento Comum do Congresso Nacional. Resolução n.º 1, de 1970, com alterações posteriores até 2006. Artigo 104,§2º. A Comissão será composta de 3 (três) Senadores e 3 (três) Deputados, indicados pelos presidentes das respectivas Câmaras, integrando-a, se possível, os Relatores da matéria na fase de elaboração do projeto. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/sf/legislacao/regsf/RegCN.pdf>. Acessado em: 20 de set. de 2008. 27 e dos pareceres das Comissões que apreciaram a matéria. Essa regra está explícita no artigo 106 do regimento comum do Congresso.146 O parágrafo 5º do artigo 66 da Carta Magna apresenta a possibilidade de derrubada do veto presidencial, quando, no caso, caberá ao Congresso remeter o projeto de lei ao Presidente da República para promulgação. A manutenção, por parte do legislativo, do veto executivo é uma decisão extintiva do processo legislativo, não podendo, posteriormente, nem o Presidente, nem o Congresso, retratar-se. Assim, no entendimento do Supremo Tribunal Federal: Processo legislativo: veto mantido pelo Legislativo: decreto-legislativo que, anos depois, sob fundamentação de ter o veto intempestivo, desconstitui a deliberação que o mantivera, e declara tacitamente sancionada a parte vetada do projeto de lei: inconstitucionalidade formal do decreto-legislativo, independentemente da indagação acerca da validade material ou não da norma por ele considerada sancionada: aplicação ao processo legislativo – que é verdadeiro processo – da regra da preclusão – que, como impede a retratação do veto, também obsta a que se retrate o Legislativo de sua rejeição ou manutenção: preclusão, no entanto, que, não se confundindo com coisa julgada – esta, sim, peculiar do processo jurisdicional -, não inibe o controle judicial da eventual intempestividade do veto.147 Por força do §7º do artigo 66, o Presidente do Senado, ou seu Vice, poderão fazer às vezes do Presidente da República, em duas hipóteses, promulgando o projeto em lei. São os casos dos parágrafos 3º e 5º do referido artigo. Assim, se o chefe do executivo não promulgar o projeto em lei, em quarenta e oito horas, quando o deve fazer, terá o seu poder transferido ao Presidente do Senado. 4.4 O Veto Presidencial como Balança do Poder A balança dos poderes, como analisado anteriormente, é a forma de controle e balanceamento dos atos entre os entes que promovem as funções do Estado. Assim, o sistema de freios e contrapesos, balanceando a separação dos poderes, vem servir para evitar a tirania de um dos poderes sobre os demais. 146 BRASIL. Regimento Comum do Congresso Nacional. Resolução n.º 1, de 1970, com alterações posteriores até 2006. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/sf/legislacao/regsf/RegCN.pdf>. Acessado em: 20 de set. de 2008. 147 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.254-1. Rio de Janeiro, Tribunal Pleno. Relator Min. Sepúlveda Pertence. Publicado no Diário de Justiça em: 17/03/2000. 28 Então, o presente trabalho pretende apresentar um possível balanceamento ou equilíbrio, através do veto presidencial, entre os poderes constituídos, especificamente entre o poder legislativo e o poder executivo. Primeiramente, o sistema de separação de poderes, conforme a doutrina de Locke era exercido com supremacia do poder legislativo, servindo o executivo, apenas como aplicador das leis.148 Entretanto, o poder executivo, no presidencialismo, toma às vezes de poder superior, recebendo o chefe do executivo poderes em demasia, sem responsabilidade política, o que pode tornar o presidencialismo uma ditadura a prazo fixo.149 Os criadores da Constituição americana previram um risco da supremacia do legislativo sobre os demais poderes, assim seria necessário colocar meios para evitar essa preponderância de poder ao legislar. Assim, é creditado ao presidente a interferência ao procedimento legislativo.150 Neste sentido, Alexandre Hamilton ou James Madison, no artigo nº 51 de “O Federalista”, explicam que o veto presidencial é uma das armas contra a preponderância do poder legislativo: No governo republicano predomina necessariamente a autoridade legislativa. A solução para este inconveniente está em repartir essa autoridade entre diferentes ramos e torná-los, utilizando maneiras diferenciadas de eleição e distintos princípios de ação, tão pouco interligados quanto for permitido por suas funções comuns e dependência da mesma comunidade. Talvez sejam até necessárias preocupações adicionais contra perigosa usurpações. Como a importância da autoridade legislativa conduz a tal repartição, a fraqueza do Executivo, por sua vez, pode exigir que ele seja reforçado. Um direito a veto absoluto sobre o Legislativo parece, à primeira vista, ser o instrumento natural com que o Executivo deva ser armado [...] (grifo nosso)151 Como se vê, o presidencialismo evolui com numerosos poderes atribuídos ao chefe do executivo, proporcionando maior cobrança administrativa e interferência nos processos legislativos. Atualmente, as políticas de impacto social e econômico ficam a cargo do Presidente, utilizando, desta maneira, de boa parte da função legislativa. Essa 148 PIÇARRA, Nuno. A Separação dos Poderes como Doutrina e Princípio Constitucional. Coimbra: Coimbra, 1989. p. 75. 149 BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 11. ed. São Paulo: Malheiros. 2005. p. 301. 150 SCHWARTZ, Bernard. Los Poderes del Gobierno. Vol. II. Ciudad del México: Universidad Nacional Autónoma de México, 1966. p. 31. 151 HAMILTON, Alexander, MADISON, James, JAY, John. O Federalista. Campinas: Russel. 2003. p. 323. 29 transformação da responsabilidade do legislativo para o executivo trai os fundamentos do presidencialismo democrático, bem como a separação de poderes e o Estado de direito.152 Assim, as leis de maior repercussão partem da iniciativa do Presidente ou de seus ministérios, ficando o legislativo com função primordial de fiscalização, o que proporciona instabilidade funcional entre os poderes.153 Neste contexto, o sistema de freios e contrapesos tenta, infrutiferamente, balancear os poderes. Dentre as armas desse sistema encontra-se o foco deste trabalho, ou seja, o veto presidencial. O veto do executivo nasce assim como um dos principais métodos do sistema de freios e contrapesos. No passado, na Inglaterra, através do modelo do King in parliament se considerava um ato de vontade legislativa, entretanto, hoje, parece como uma negativa ao processo do poder legislativo, exprimindo a oposição do chefe do executivo ao projeto de lei154 Fato que no parlamentarismo se demonstra mais raro, face à interdependência dos poderes. A finalidade precípua do veto executivo é impedir abusos por parte do Congresso, bem como de provocar maior reflexão legislativa frente à matéria do projeto de lei.155 Desse modo, o veto presidencial consagra-se como elemento de controle aos processos legislativos abusivos, exercendo o controle sobre o poder político.156 No Brasil, por força do artigo 66 da Constituição e seus parágrafos, o veto presidencial é considerado como elemento do processo legislativo. Ives Gandra Martins identifica que o artigo 66 § 5º da Constituição Federal é a norma identificadora do sistema de freios e contrapesos, visto que o executivo tem a prerrogativa de vetar o processo legislativo da Câmara, bem como o poder legislativo tem o poder de derrubar o veto do Presidente.157 O veto presidencial certamente é um dos braços do sistema de freios e contrapesos, entretanto parece que tal sistema, no presidencialismo, tem-se 152 SANTOS, Fabiano. O Poder Legislativo de Coalizão. Belo Horizonte: UFMG, Rio de Janeiro: IUPERJ. 2003. p. 60. 153 SANTOS, Fabiano. O Poder Legislativo de Coalizão. Belo Horizonte: UFMG, Rio de Janeiro: IUPERJ. 2003. p. 75. 154 PIÇARRA, Nuno. A Separação dos Poderes como Doutrina e Princípio Constitucional. Coimbra: Coimbra, 1989. p. 82. 155 RODRIGUES, Ernesto. O Veto no Brasil. Rio de Janeiro: Forense, 1981. p. 33. 156 MORAES, Alexandre de. Presidencialismo. São Paulo: Atlas. 2004. p. 192. 157 BASTOS, Celso Ribeiro e MARTINS, Ives Gandra. Comentários à constituição do Brasil. 4º Volume, Tomo I. São Paulo: Saraiva. 1995. p. 502. 30 demonstrado, também, como meio de cooptação legislativa para a base governista, ou como forma de ataque numa possível queda de braço do poder político. Desta forma, verifica-se que na prática, o membro do Congresso, frente ao poder centralizado do Presidente da República, ora buscam alianças ao governo, ora traçam estratégias para travar as ações governamentais. As ligações entre legislativo e executivo, constituem especificamente meio de cooptação de base de apoio para fortalecer a governabilidade presidencial. O chefe do executivo busca por maioria parlamentar frente aos partidos que simpatizem com suas idéias. Entretanto, esse número de parlamentares pode ser insuficiente, tendo o Presidente que cooptar os membros do legislativo através de vantagens pessoais e partidárias. O poder executivo barganha cargos e vantagens para agilizar uma coalizão no legislativo.158 O presidente, mantendo uma maioria parlamentar, poderá governar como um ditador; porém, não obtendo essa maioria ficará cerceado, não conseguindo atuar, e provocando a ineficiência administrativa do Estado.159 Para Bernard Schwartz é um paradoxo para a separação de poderes a ingerência do poder executivo quanto à formulação legislativa.160 Há, por outro lado, uma tendência crescente para que as principais leis se originem nos departamentos do executivo. À medida que os problemas de elaboração de leis se voltam cada vez mais técnicos, o legislativo é, cada vez mais submetido frente ao executivo, para solicitar sua orientação no planejamento e redação das leis. Assim, calcula-se que, quatro de cada cinco leis importantes aprovadas durante o primeiro governo de Franklin Roosevelt, originaram-se na Casa Branca e nos Ministérios.161 Fabiano Santos identifica que no período de 1988 até 1994, praticamente oitenta e cinco por cento das leis aprovadas tiveram origem no poder executivo, contra pouco mais de quinze por cento das leis aprovadas tiveram origem na Casa Legislativa.162 158 SANTOS, Fabiano. O Poder Legislativo de Coalizão. Belo Horizonte: UFMG, Rio de Janeiro: IUPERJ. 2003. p. 60-62. 159 DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 301. 160 SCHWARTZ, Bernard. Los Poderes del Gobierno. Vol. II. Ciudad del México: Universidad Nacional Autónoma de México, 1966. p. 30. 161 SCHWARTZ, Bernard. Los Poderes del Gobierno. Vol. II. Ciudad del México: Universidad Nacional Autónoma de México, 1966. p. 30. 162 SANTOS, Fabiano. O Poder Legislativo de Coalizão. Belo Horizonte: UFMG, Rio de Janeiro: IUPERJ. 2003. p. 75. 31 No caso do Brasil, outro mecanismo do sistema de freios e contrapesos, por parte do executivo, que não pode deixar de ser citada, é a Medida Provisória, mecanismo utilizado pelo Presidente de forma indiscriminada, visto que o artigo 62 da Constituição permite a edição de tal medida apenas para casos de relevância e urgência. Desta forma, o executivo obtém força para mediar a cooptação com o legislativo, ou mesmo mostrar a força que este poder detém.163 Segundo Paulo Bonavides, é necessário repensar se o Estado Liberal representa, hoje, o Estado da separação de poderes. Diante da necessidade da usurpação do poder político e econômico, que favorece o retrocesso, a anti soberania popular, desfavorece o povo frente ao império dos mercados, enfraquecendo a democracia e o Estado de Direito.164 Como se identificou até aqui, o Presidencialismo brasileiro demonstra-se claramente idealizado ao estado liberal norte-americano, baseado na doutrina da separação de poderes, bem como no sistema de freios e contrapesos. Porém, é necessário vislumbrar se a balança dos poderes realmente tem servido para equilibrar o abuso dos poderes, ou participa do Estado de Direito como forma de cooptar uma base governamental de forma alheia a democracia. Conclusão: O presente trabalho procurou trilhar a pesquisa constitucional sobre o veto presidencial, com suas regras e o seu papel no sistema de freios e contrapesos. Identificou-se que o Estado e a política têm estreita relação e que ambos referem-se ao poder. Assim, a sociedade, como um todo, organiza-se e rege-se pelo poder social, familiar, ou religioso. O Estado, como grupo social que é, também exerce o seu poder, qual seja, o político, e vale-se do mesmo para obter formas de manter a ordem, e trilhar o caminho para o bem comum. O poder do Estado é uno e indivisível, entretanto a forma como se desenvolverão as funções do Estado é pelo princípio da separação de poderes dividido. O princípio da separação de poderes tenta evitar a tirania e os abusos do poder, mas esta mesma divisão precisa ser harmônica, impedindo que um poder abuse os espaços dos demais. Neste contexto nasce o sistema de freios e contrapesos. O sistema 163 164 BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 11. ed. São Paulo: Malheiros. 2005. p. 300. BONAVIDES, Paulo. Teoria do Estado. 4. ed. São Paulo: Malheiros. 2003. p. 32. 32 surge como forma de equilibrar os poderes entre si e, ao mesmo tempo, frear os possíveis abusos. Pelo conteúdo abordado, ficou caracterizado que a situação atual do Brasil não foi capaz de obedecer aos princípios da separação de poderes e o sistema de freios e contrapesos. O Estado contemporâneo está cada vez mais dinâmico, devendo atender aos anseios sociais e econômicos da sociedade, fazendo com que os poderes executivo e legislativo entrem em constante conflito. Assim o executivo é chamado a resolver os problemas do Estado, acabando por subverter as responsabilidades do legislativo, atuando com Medidas Provisórias e orientando a formulação das leis, seja por vetá-las ou exercendo a prerrogativa de iniciativa legislativa. O legislativo, por sua vez, ou tem o seu papel reduzido a mero apoiador do presidente, ou tem a função política de oposição. A relação dos poderes deve-se muito ao tipo de sistema de governo escolhido nos Estados para organização das funções estatais. Assim, têm-se como sistemas básicos de governo o convencional, o parlamentar e o presidencial. O sistema convencional prevê o domínio político por uma assembléia, havendo pouca ou nenhuma diferença entre o executivo e o legislativo. O sistema parlamentar tem suas principais características diferenciadoras focadas na relação de colaboração de poderes, com responsabilidades políticas, sendo possível o voto de desconfiança em relação ao Primeiro Ministro, bem como a dissolução da Câmara. Assim, parece ser um sistema com maior capacidade de gerência e menor potencial de traumas às questões de crises. O sistema presidencialista, que é o foco do segundo capítulo do trabalho, tem seu surgimento na Constituição norte-americana de 1787, com forte influência liberal e contrária à organização monárquica européia. O maior temor dos criadores da Constituição americana era a concentração de poder, no entanto, o presidencialismo demonstrou-se um sistema de governo que concede ao presidente uma abusiva concentração de poderes. O Brasil, por influência liberal norte-americana, cria a Constituição de 1891 com idênticos institutos, como a república, o federalismo, o presidencialismo, a separação de poderes, como também o sistema de freios e contrapesos. O sistema presidencial brasileiro demonstra, através da história, enorme fraqueza política, propiciando políticas espúrias e fragilidade às crises. 33 Foi demonstrado, através do trabalho, que o presidencialismo brasileiro se desenvolveu com práticas políticas abusivas do Estado Democrático de Direito, criando crises institucionais administrativas ao Estado, que findam em golpes de Estado, suicídio de presidente, impeachment. O presidencialismo apresenta-se com uma demasia de poderes nas mãos do Chefe do executivo, sendo considerado, por alguns, como o maior acúmulo de poder da história da humanidade. São exemplos dos poderes do presidente, a chefia da administração pública, a chefia de Estado, chefia das forças armadas, a iniciativa legislativa, o veto de projetos de lei, entre outros. O Presidente da República necessita, em muitos casos, do consentimento do congresso para agir, o que proporciona uma relação de colaboração muitas vezes espúria. Nesta senda, o presidente fica sujeito à necessidade de uma maioria de congressistas na base parlamentar governista, exercendo, muitas vezes, meios de barganha política que não favorecem aos interesses da nação. Assim, parece claro que a intenção de conter abusos de poder não obteve êxito no sistema presidencialista. Um dos poderes do Presidente da República que se insere no contexto do trabalho é o veto presidencial, pois ele é um exemplo típico da relação do executivo com o legislativo dentro da separação de poderes, com o intuito de conter os abusos dos congressistas. O veto presidencial aparece como instrumento de controle do legislativo por parte do executivo, sendo exercido com maior freqüência no sistema presidencial, visto que neste sistema a relação entre executivo e legislativo vive maior independência. O veto do executivo exerce uma função importante no desenvolvimento das funções dos poderes do Estado, identificando e impedindo leis que poderiam se tornar abusivas, tanto na esfera política como na jurídica. Entretanto, a prática da relação dos poderes no Brasil demonstra que, muitas vezes, o veto presidencial serve como elemento de barganha política, ou de pressão opositora, burlando o princípio democrático, por uma acirrada busca por poder. Conclui-se, ao final, que o sistema presidencialista não favorece a relação de cooperação de poderes que o Estado contemporâneo necessita, servindo apenas como mais uma das formas de corromper o poder político. Assim, inserido no Estado liberal, favorece a opressão social e mantém o povo mais distante das soluções dos seus problemas. Favorece o acúmulo de poder e as barganhas por governabilidade. Assim, o 34 poder de veto apresenta-se como forma de pressão aos parlamentares para servir de base governamental. Há de se repensar a forma de organização de governo, de modo a propiciar maior gerência estatal às necessidades fundamentais do ser humano que, através do sistema atual, está cada vez mais oprimido frente à desigualdade social e econômica. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANTUNES, Marcus Vinicius Martins. Mudança Constitucional: O Brasil pós-88. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003. ARISTÓTELES. Política. São Paulo: Martin Claret, 2007. ARON, Raymond. As Etapas do Pensamento Sociológico. 6. ed. São Paulo: Marins Fontes, 2003. AZAMBUJA, Darcy. Teoria Geral do Estado. 5. ed. Porto Alegre: Globo. 1969. BASTOS, Celso Ribeiro e MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil. 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