O JOGO COMO FERRAMENTA À CONSTRUÇÃO DA LÍNGUA
ESCRITA
TRINDADE, Thais Pulgatti1 - UFSM
JUCHEM, Luiza de Salles 2 - UFSM
Grupo de Trabalho - Formação de Professores e Profissionalização Docente
Agência Financiadora: não contou com financiamento
Resumo
A utilização de jogos em sala de aula pode apresentar vantagens sobre métodos tradicionais
de ensino. Com base nesta temática, a presente pesquisa visa compreender como o professor
alfabetizador percebe a repercussão do uso de jogos, em sala de aula, com crianças em
processo de alfabetização. Os referenciais teóricos que norteiam este trabalho provêm, dentre
outros, dos estudos realizados por Ferreiro (1990, 2011), Bolzan (2007, 2009) e Teberosky
(1987). A abordagem metodológica é qualitativa de cunho sociocultural, pois centra sua
análise na interação estabelecida entre indivíduos. Os dados foram obtidos por meio de
entrevistas semiestruturadas baseadas em tópicos, realizadas com duas professoras de uma
escola pública do município de Santa Maria. A partir das narrativas sobre as práticas
cotidianas envolvendo o jogo, as professoras destacaram os benefícios trazidos pelos jogos
em sala de aula, demonstrando reconhecer o potencial deste instrumento como mobilizador do
envolvimento dos estudantes no próprio processo de construção da leitura e da escrita. Como
fruto deste trabalho, foi possível ainda estabelecer uma relação teórico prática com base nas
leituras e nas vivências relatadas pelas colaboradoras, e propiciar a elas um momento de
reflexão sobre suas ações, à medida que narravam. Assim, pretendemos ter contribuído, de
alguma forma, com o campo conceitual concernente ao potencial pedagógico do jogo, não
somente no desempenho escolar da criança, mas sim, porque sentimo-nos responsáveis por
clamar por mais momentos que tragam sentido à infância, uma fase que ocorre só uma vez na
vida, e portanto precisa ser vivida. Sendo a escola, um lugar privilegiado para tal.
Palavras-chave: Alfabetização. Atividades diversificadas de leitura e escrita. Formação
docente. Mediações pedagógicas.
1
Acadêmica do Curso de Educação Especial da Universidade Federal de Santa Maria/UFSM, Bolsista de
Iniciação Científica Prolicen, Integrante do Grupo de Pesquisa GPFOPE (Grupo de Pesquisa-Formação de
Professores e Práticas Educativas: Educação Básica e Superior). E-mail: [email protected]
2
Fonoaudióloga e Mestre em Fonoaudiologia. Doutoranda em Educação, Professora substituta co Colégio
Técnico Industrial da UFSM/CTISM, Programa de Pós-Graduação, Centro de Educação, UFSM, Integrante do
Grupo de Pesquisa GPFOPE (Grupo de Pesquisa-Formação de Professores e Práticas Educativas: Educação
Básica e Superior). E-mail: [email protected]
10850
Introdução
O interesse pela reflexão sobre o uso de jogos3 como ferramenta no processo de alfabetização
resulta do trabalho que vimos desenvolvendo no Grupo de Formação de Professores e Práticas
Educativas na Educação Básica e Superior (GPFOPE) da Universidade Federal de Santa
Maria, coordenado pela professora doutora Doris Pires Vargas Bolzan. Uma das extensões
que este grupo realiza, envolve classes de alfabetização e consiste no acompanhamento das
turmas e na elaboração, de atividades diversificadas de leitura e escrita, junto às professoras.
Dentre as atividades desenvolvidas, os jogos têm ganham especial destaque no que concerne
ao interesse que é capaz de desencadear na turma.
Proporcionar o uso de jogos na sala de aula representa para as crianças uma forma
instigante e divertida de aprender. Desenvolver um conteúdo por meio de uma atividade
lúdica tem vantagens sobre formas tradicionais de ensinar, resultando em um aprendizado
prazeroso, divertido e significativo.
Durante atividades práticas desenvolvidas pelo grupo, evidenciamos que a utilização
de jogos em aula oferece aos aprendizes diferentes possibilidades de aprendizagens, sendo
que muitas delas são consolidadas cotidianamente no que concerne ao uso de regras, ao
trabalho coletivo e à cooperação. Além disso, o processo de construção da leitura e escrita
também é enriquecido com estratégias que os instiguem a ler e a escrever.
Com base nestas constatações, acreditamos que explorar diferentes jogos, quando
compatíveis aos objetivos pedagógicos e sensíveis aos interesses das crianças, pode se
constituir numa maneira mais interessante e instigante de desenvolver-se.
Práticas Pedagógicas de Alfabetização
As práticas pedagógicas de leitura e escrita, implicam não apenas o professor com sua
maneira de ensinar e o aprendiz com seus modos de aprender, mas também conhecer a
natureza do objeto de conhecimento, isto é, o sistema de escrita alfabética.
O aprendizado da leitura e da escrita acontece gradativamente de acordo com o tempo
de cada aprendiz em efetivar avanços. Este processo precisa ser compreendido pelo professor,
para que possa efetuar as mediações e assim auxiliar nessa construção de hipóteses que se
3
Este artigo é um recorte de um Trabalho de Conclusão de Curso intitulado “A utilização de jogos no processo
de alfabetização”, desenvolvido na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) com orientação da professora
Doris Pires Vargas Bolzan, co-orientação de Luiza de Salles Juchem e de autoria de Thais Pulgatti Trindade.
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confirmam ou se refutam. Ao organizar o trabalho pedagógico, diferentes maneiras de
conceber a leitura e a escrita resultam em diferentes meios de conduzir o processo de
alfabetização em sala de aula. Ou seja, o professor que considera a escrita um mero código a
ser decifrado, tende a menosprezar seu uso social, assim como as experiências prévias do
aprendiz com relação à escrita. Por outro lado, aqueles que concebem a alfabetização como
construção social, desenvolvida pelas experiências com leitores e materiais escritos, em
diferentes ambientes além da escola, tendem a valorizar e a trazer, para dentro da sua aula,
situações concretas dos usos e funções da língua escrita.
A maneira de conceber a alfabetização reflete como o professor vislumbra o homem e
a sociedade (BOLZAN, 2007). Assim, contribuir com a formação de um indivíduo para que
atinja a condição de ser social ativo, cujas experiências e interações com seus pares na cultura
em que vive são valorizadas, implica em conceber as múltiplas dimensões imbricadas no
processo de ler e escrever. Segundo a autora
a alfabetização é o momento de construção de estruturas na qual o individuo busca
encaixar novas informações, formulando hipóteses, buscando regularidades,
colocando à prova antecipações, através da compreensão dos modos de
representação da linguagem que corresponde a um sistema alfabético de escrita e
seus usos sociais (BOLZAN, 2007, p. 22).
Assim, no processo de alfabetização, o aprendiz formula hipóteses quanto aos seus
conhecimentos sobre a linguagem, por meio das representações sobre o sistema alfabético de
escrita a que tem acesso e, por meio do confronto de suas hipóteses com outras, ele as
reconstrói.
Sob um ponto de vista tradicional, a alfabetização ganha outro enfoque e seus usos
sociais são relegados a um segundo plano, ou seja, após o domínio das regras do sistema, pelo
aprendiz. Esse enfoque tradicional, segundo Ferreiro (2011) enfatiza os aspectos gráficos,
como a qualidade do traçado das letras, sua distribuição no espaço, a orientação iniciando da
esquerda para a direita e de cima para baixo, além das posições dos caracteres individuais.
Indubitavelmente o cuidado com os aspectos gráficos interferem na legibilidade do
texto e consequentemente na sua compreensão, mas, principalmente no período inicial de
construção da leitura e da escrita, é potencialmente importante para a formação do escritor e
leitor que saber ler e escrever mantenha o sentido que tem para a criança, que é ávida, muitas
vezes pela conquista desta faculdade. Portanto, ser incentivado a expressar-se oralmente e por
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meio da escrita contribui com a formação de bons comunicadores, cuja escrita servirá como
um instrumento a mais para seu convívio em sociedade.
A escola como espaço privilegiado para a alfabetização
Para algumas crianças, a escola representa apenas mais um espaço onde a linguagem
escrita está presente, pois estas provêm de meios onde a escrita faz parte do seu cotidiano,
seja través de historinhas que lhe contam, revistas que os pais adquirem, correspondências,
mails, jogos, etc. Porém, para outras crianças, cujo contexto sócial, econômico e cultural não
é tão favorável em termos oportunidades com a escrita, a escola é um espaço privilegiado para
as descobertas quanto à escrita.
De acordo com Palácio (1987), em muitos países, acontece uma preparação anterior à
escolarização obrigatória, o que chamamos de pré-escola. Neste período, as atividades
promovidas visam facilitar o acesso das crianças ao sistema numérico e alfabético. Porém,
desde já há uma tendência a valorizar o traçado gráfico e a pronúncia correta das palavras, por
acreditar-se que dominar tais elementos é condição para aprender a escrita.
Quando a escola assim concebe o período pré-escolar, desconsidera elementos
importantes, como os conhecimentos que o aprendiz traz consigo, além da natureza e da
função do objeto de conhecimento, ou seja, da língua escrita.
Quanto à natureza da língua escrita, Ferreiro (2011) afirma que sua invenção resulta de
um processo histórico de construção de um sistema representacional e não de um código.
Portanto, as dificuldades que as crianças enfrentam no início da escolarização, tanto na
representação alfabética como numérica, são reconstruções conceituais, semelhantes às
encontradas durante a construção do sistema, pois ao reconstruir os sistemas a criança vai
muito além de uma mera associação entre grafemas e fonemas.
Assim, o fato de a escrita não ser um produto escolar, mas sim um objeto cultural,
resultante do esforço coletivo da humanidade (FERREIRO; TEBEROSKY,1979), ela cumpre
diversas funções sociais e tem meios concretos de existência. Portanto, a sala de aula é mais
um espaço onde as vivências prévias de leitura e escrita dos aprendizes devem ser
incorporadas (FERREIRO; TEBEROSKY, 1979), uma vez que, para muitos este é o lugar
onde se darão as primeiras descobertas e a mobilização de sensações de prazer ou não, em
relação as novas possibilidades que a escrita representa.
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O Brincar
Brincar é fantasiar, é fazer de conta. A criança, a partir do que é capaz de sentir e de
interpretar quanto ao meio em que vive, elabora o seu brincar. E, ao mesmo tempo em que
extrai da sua realidade o conteúdo que transforma em brincadeira, ela é capaz de transformar
a sua realidade por meio do brincar. Enquanto brinca, conhece novas possibilidades de ser e
de fazer, que até então não pertencia ao seu repertório de saberes. Sendo assim, o brincar é
uma atividade carregada de sentidos e significados sociais, que se dá por meio de
interpretação e imaginação.
Brincar em grupo proporciona o confronto de pontos de vista diferentes, ajuda a
compreender a existência do outro diferente de si e também a identificação de interesses
comuns, o que promove o senso de equipe em prol de conquistar algo para o grupo. O brincar
tem, em cada momento da vida, uma função, um significado diferente e especial para quem
dele participa.
Segundo Jacquin (1960, p.15) o brincar representa para a criança “o que o trabalho é
para o adulto”, o que vai ao encontro da opinião de Piaget (1990), quando refere que, ao jogar,
a criança externa comportamentos, experimenta seus instintos, revive simbolicamente à sua
existência, liquida os seus conflitos cotidianos e tem a oportunidade de realizar o conjunto de
desejos que ficaram por saciar. Algumas situações que perpassam o cotidiano infantil podem
ser externadas através do jogo, inclusive podem ser expressos momentos alegres ou tristes da
vida da criança.
Ao realizar uma reflexão acerca desta premissa piagetiana, brincar pode ser considerado
uma forma de expressão, em que as crianças constituem-se como autores e atores da sua
própria história e seus brinquedos passam a ser os personagens. A interação entre a criança e o
objeto, neste caso o brinquedo, desencadeia uma situação que reflete como percebe seu
contexto sociocultural.
Nesse sentido,
[...] todo jogo simbólico, mesmo individual, acaba por ser, mais cedo ou mais tarde,
uma representação que a criança dá a um sócius imaginário, e que todo o jogo
simbólico coletivo, mesmo quando bem organizado, conserva algo de inefável que é
próprio do símbolo individual (PIAGET, 1990, p143).
Com base nas concepções piagetianas, a atividade lúdica gerada durante o brincar
promove um sentimento de prazer pela ação em si e pela dominação das ações. Logo, o jogo
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possui duas funções: consolidar os esquemas já formados e dar prazer ou equilíbrio emocional
à criança, pois, entre outras funções, permite a criança a expressar-se de maneira que outras
linguagens não o fariam.
Piaget (1979) classificou os jogos em três grandes categorias de acordo com três fases
do desenvolvimento infantil. A primeira, que vai do nascimento até dois anos de idade,
aproximadamente, é a fase sensório-motora e os jogos desta etapa são chamados de Jogo de
exercício sensório-motor; a segunda, a pré-operatória, vai dos dois até, aproximadamente,
sete anos de idade, cujos jogos são do tipo Simbólico e a última é a fase das operações
concretas, dos sete aos doze anos de idade, aproximadamente, cujos jogos desta etapa são
Jogos de regra.
Para Vygotski (1989, p. 107), “ao estabelecer critérios para distinguir o brincar da
criança de outras formas de atividade, conclui-se que no brinquedo a criança cria uma
situação imaginária”.
Os desejos não realizáveis podem ser realizados através do lúdico, como um mundo
imaginário, onde a criança cria e imagina, e ao imaginar, ela realiza. O brinquedo proporciona
para ela a mediação entre o real e o imaginário. A criança e o brinquedo se completam. “No
mundo, a criança encontra equilíbrio entre o real e o imaginário, alimenta sua vida interior,
descobre o mundo e torna-se operativa” (KISHIMOTO, 2005 p.59).
Então, pode-se dizer que as brincadeiras, para as crianças são mais do que apenas
divertimento, servem como mediadoras para seu desenvolvimento orgânico, cognitivo e
emocional.
Os jogos como recurso didático-pedagógico
A sala de aula constitui-se como um dos primeiros lugares que a criança frequenta em
que se relaciona com pessoas diferentes de seus familiares, e, portanto, a interação
proporcionada por este meio, é enriquecida pela diversidade que o caracteriza.
Na opinião de Cervo (2010) o brinquedo e a brincadeira devem permear a prática
escolar, fluindo e manifestando-se na criatividade, postura e convicção do professor e
acrescenta a necessidade de que os adultos, pais e educadores, levem a sério a importância do
brincar, como ação motivadora, interdisciplinar.
Infelizmente, a valorização do jogo como um recurso didático, nem sempre ocorre.
Alguns pais e até professores não conhecem a relevância deste tipo de estratégia, e portanto
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desacreditam, afirmando que, ao invés da criança estar aprendendo na escola, estaria apenas
brincando. Ao encontro deste equívoco conceitual, Santos (2010) constatou que não é
incomum professores impedirem que as crianças brinquem no ambiente educativo. E as
crianças, por sua vez, já tem incorporado em seu imaginário tal realidade, haja vista que, ao
brincar de escolinha e fazer o papel de professora, posicionam-se em pé, junto ao quadro,
frente a supostos alunos, que sentados e enfileirados esperam quietos para aprender algo. O
brincar, na escola, muitas vezes é autorizado somente durante o recreio.
Vigotsky (1991), faz menção à opinião popular quanto ao ato de brincar, e este fato,
em certa medida, justifica a resistência ainda encontrada de integrar o lúdico no processo de
ensino e de aprendizagem na sala de aula.
A opinião popular é olhar as brincadeiras como uma forma de ócio, como um tipo de
divertimento que apenas faz o tempo passar. É raro ver algum valor que seja nas
brincadeiras, no máximo pode-se pensar nas brincadeiras como uma forma de
fraqueza natural da infância a qual ajuda a criança a matar o tempo por um período
(VYGOTSKI, 1991, P.88).
De fato, o brincar também é uma atividade recreativa que permite que as crianças
relaxem, descansem, divirtam-se e se opõe à seriedade e rigidez das tarefas tradicionais,
muitas vezes sistematizadas pelo professor. A ludicidade é então, uma necessidade do ser
humano em qualquer idade e não pode ser vista apenas como diversão.
No processo de alfabetização de crianças, período que coincide, em geral, com a fase
pré-operatória, o jogo, além de ser um facilitador na construção da lecto-escrita, pode
contribuir com formação social, pois permite viver situações de cooperação, de cumprimento
de regras, de responsabilidade pelas próprias ações, despertando diferentes sentimentos e
atitudes necessárias a um convívio social saudável. Assim, o jogo contribui não somente para
a formação intelectual da criança, mas também para o seu desenvolvimento integral,
contemplando as dimensões cognitiva, social e afetiva, visadas também pelo ensino escolar.
Caminhos metodológicos da Investigação
Com o intuito de aprofundar a temática referente à utilização de jogos no processo de
alfabetização, duas professoras de uma Escola Municipal de Ensino Fundamental, da cidade
de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, foram convidadas a falar sobre suas práticas docentes,
a partir de uma entrevista baseada em tópicos, realizada individualmente. A partir da análise
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destas narrativas foram destacados os elementos categoriais evidenciados nas narrativas das
diferentes entrevistas.
Estas recorrências permitiram optar pela elaboração de categorias a fim de organizar
os diferentes aspectos das narrativas das participantes, contribuindo para a análise das
mesmas.
As contribuições evidenciadas nas narrativas das professoras serviram como
sustentação a esta pesquisa e contribuíram para as reflexões acerca da utilização de jogos no
processo de alfabetização. Abaixo, segue o quadro-1 com as características das colaboradoras
da pesquisa:
Nome
Idade
Formação
Tempo de
Profissão
Tempo de
Atuação Docente
Professora A
29
Pedagogia
Gestão Educacional
Mestrado em Educação
8 anos
6 anos
Professora B
37
Pedagogia
19 anos
12 anos
Níveis
em que leciona
1° ano
educação
infantil (anos
iniciais) e
3° ano
Quadro - 1 características das colaboradoras da pesquisa.
Fonte: Trindade, 2013, p.48.
Assim, com base nas narrativas das professoras colaboradoras deste estudo destaca-se
a categoria Jogo e Aprendizagem, a qual se divide em duas dimensões categoriais: o jogo
como estímulo auxiliar no processo de aprendizagem e o jogo como uma aprendizagem de
forma lúdica. Estas dimensões apresentam como elementos principais a motivação para a
aprendizagem, a mediação e interação, os desafios cotidianos, os recursos lúdicos, para a
construção de conhecimentos dos alunos, os objetivos do jogo e desenvolvimento a
construção da leitura e da escrita.
Para melhor ilustrar este estudo segue o quadro-2 com a síntese dos elementos que
caracterizam cada uma das categorias.
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Categoria
JOGO E
APRENDIZAGEM
Dimensões Categoriais
Elementos Categoriais
- estímulo auxiliar no processo de
aprendizagem
-motivação na aprendizagem
- mediação e interação
- desafios cotidianos
- aprendizagem de forma lúdica
- recurso lúdico para a construção de
conhecimentos dos alunos
- objetivos do jogo
- desenvolver a construção da leitura e
da escrita
Quadro – 2 Síntese dos elementos que caracterizam a categoria de análise e suas dimensões.
Fonte: Trindade, 2013, p.49.
Análise e discussão dos dados
Jogo e Aprendizagem
Ao realizar a leitura das narrativas das professoras colaboradoras foi possível
evidenciar uma categoria relacionada à utilização de jogos no processo de ensino e
aprendizagem em classes de alfabetização. A categoria Jogo e Aprendizagem apresenta
entendimentos das professoras sobre seu cotidiano de sala de aula. Elementos que constituem
o trabalho docente a partir da utilização de jogos, demonstrando A categoria Jogo e
Aprendizagem é constituída por duas dimensões que serão exploradas ao logo das análises.
São elas o jogo como estímulo auxiliar no processo de construção do conhecimento e a
aprendizagem a partir da ludicidade.
O jogo como estímulo auxiliar no processo de construção do conhecimento
Ao dialogar com as professoras sobre as concepções acerca do jogo em sala de aula foi
possível perceber que ambas acreditavam que o jogo contribui positivamente no processo de
aprendizagem, constituindo-se como um recurso didático para a construção do conhecimento
dos educandos. Assim, o jogo traz diversas possibilidades à criança despertando o interesse e
fazendo com que ela conheça melhor o mundo que a cerca. De acordo com as narrativas das
colaboradoras desta pesquisa as atividades com jogos motivam os aprendizes, por se tratarem
de situações diferenciadas no cotidiano escolar. Isso pode ser evidenciado nas falas das
professoras:
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Acredito que os jogos são uma forma de motivar as crianças nesse processo [de
alfabetização]. [...] eles se sentem mais envolvidos, eles têm a possibilidade de
interagir [...] O jogar é uma forma natural deles interagirem, deles se envolverem.
(Professora A)
Acho que os jogos dão novas possibilidades de aprendizagem aos alunos.
(Professora B)
Diante dos excertos expostos pode-se perceber que as duas professoras concordam que
os jogos proporcionam que a criança seja ativa no processo de aprendizagem, uma vez que é
um tipo de atividade que, em geral, envolve a criança e motiva a aprender.
Neste sentido, Cervo (2010, p.12) afirma que o jogo é integrador, há sempre um
caráter de novidade, o que é fundamental para despertar o interesse da criança e à medida que
joga ela vai conhecendo e construindo interiormente o seu mundo.
De acordo com o relato das professoras, o jogo também instiga as crianças a se
expressarem da sua maneira, naturalmente, e a interagir, estimulando assim, a cooperação e a
organização. Nesta mesma direção, Cervo (2010, p. 20) afirma que “a criança cresce
aprendendo hábitos necessários à convivência” por meio do jogo. Pode-se, então afirmar que,
através do jogo, as crianças viver em sociedade, pois aprendem a se expressar, a interagir, a
cooperar, a se organizar e a lidar com regras.
O jogo serve para que eles se expressem de forma mais natural para que eles
interajam entre si, para que eles possam se expressar mais próximo do que é a
vivência deles de criança. O jogo possibilita essa interação, essa expressão mais
natural. (Professora A)
O jogo é um ótimo facilitador de aprendizagem, e ele é uma maneira diferente que
as crianças gostam muito de trabalhar, gostam de brincar[...] tem a competição
mas tem também a cooperação e toda a organização de regras, de ideias e de
conversação entre eles,(Professora B)
Nesta perspectiva, Santos (2010, p. 15) destaca que as atividades lúdicas possibilitam
a aquisição de valores já esquecidos, o desenvolvimento cultural, bem como a assimilação de
novos conhecimentos.
Apesar dos jogos e das atividades lúdicas contribuírem para o aprendizado das
crianças, ainda é restrito o incentivo proveniente da escola quanto à utilização destes recursos
em sala de aula. Isso pode ser evidenciado no relato da “Professora B”, que destaca a falta de
oportunidades para aprender mais sobre os jogos e fazer trocas com os colegas sobre este
assunto. Outros desafios encontrados nas escolas para a efetivação da prática de jogos
também são mencionados por ambas as professoras.
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O uso do jogo ele causa um certo...uma certa movimentação que nem todos os
professores veem como positivo na questão da organização, daquela bagunça,
digamos assim, que acontece no início até que as crianças consigam entender
aquela organização do trabalho. Eu não vejo isso como negativo, eu acho que é sim
um desafio para o professor saber quais são os limites ou o equilíbrio entre esse
aprender de uma forma mais lúdica, que muitas vezes acontece de gerar bagunça,
de gerar conversa, mas sendo direcionado para o objetivo, tendo um objetivo
pedagógico eu acho que sempre é muito positivo e as crianças começam a se autoorganizar. A partir dessa interação, começam a desenvolver essa autonomia.
Também acho que isso é totalmente saudável dentro da proposta de utilização de
jogos. (Professora A)
É o professor não ter possibilidades de poder estudar mais sobre os jogos, ter
aquele tempo na escola também de interagir com os colegas, trocar com os colegas,
na faculdade também saber usar; porque ai às vezes você estuda bastante os jogos
na universidade, mas acaba no esquecimento, agente tem que ter mais momentos de
trocas com os colegas para não se perder e ter segurança para trabalhar com os
jogos. (Professora B)
Muitos professores consideram a utilização de jogos em sala de aula como algo
negativo, pois acreditam que uma organização menos estruturadas gera desorganização na
sala de aula. Além disso, falta incentivo das próprias escolas para que os professores utilizem
jogos, não lhe possibilitando o tempo para examinar o material disponível, lhe impede de
sentir-se à vontade para usar determinado material com a turma, fazendo com que desista de
usar o mesmo, retornando à prática que já lhe é familiar. Esses elementos puderam ser
encontrados nas narrativas das professoras.
Nas narrativas, embora ambas reconheçam a existência da impressão negativa sobre os
jogos, pelo potencial de desorganização da sala de aula, na narrativa da “Professora A”, ela
considera este desafio como uma possibilidade para o professor encontrar o equilíbrio entre o
aprender de forma mais lúdica e envolvente.
Desta forma, o jogo possibilita à criança construir suas próprias ideias a partir da
interação com outros, pois é o momento em que elas podem usar a imaginação, ter liberdade
para entrar em contato com diferentes pontos de vista, expressando sua alegria e sua forma de
compreender o que está fazendo.
Aprendizagem lúdica
A segunda dimensão categorial destaca o reconhecimento quanto à importância do uso
de jogos como recurso lúdico para a construção de conhecimentos, possibilitando alcançar
objetivos didáticos. Tal reconhecimento legitima a prática de jogos em sala de aula como
meio para a construção da leitura e da escrita.
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Estudos realizados por Cervo (2010, p.19) demostram que o lúdico é um instrumento
essencial para o desenvolvimento da aprendizagem e para o desenvolvimento da criança como
um todo. Assim, a exploração de jogos e a ludicidade contribuem para o desenvolvimento da
criança em todos os aspectos, sejam nos físicos ou nos intelectuais.
Por meio das narrativas das docentes, foi possível evidenciar a utilização de jogos em
suas práticas pedagógicas. Relataram a preocupação em desenvolver suas práticas pautadas
nas diversidades de atividades, destacando os jogos como recurso pedagógico, por
compreenderem que as experiências lúdicas favorecem a construção de diferentes
aprendizagens:
(...) eu procuro sempre envolver ou os jogos ou atividades que sejam
diversificadas, que sejam lúdicas, que tenham esse envolvimento, procuro
desenvolver esse trabalho ou a partir dos circuitos, pelo menos uma vez por
semana, de quinze em quinze dias ou no próprio trabalho trazendo
atividades que sejam motivadoras. (Professora A)
Eu uso os jogos desde que eu comecei a trabalhar com o magistério em
1993 [...] mas gostaria de usar mais. [...] não uso os jogos, às vezes, porque
eu tenho uma certa insegurança: será que eu vou conseguir? porque não
tem todo o conhecimento necessário. (Professora B)
Nas narrativas das professoras é possível perceber que, embora com frequências
diferentes, ambas utilizam os jogos em suas práticas em sala de aula. A professora que,
mesmo acreditando no potencial do jogo não o utiliza com tanta frequência, atribui o fato à
insegurança por não ter o conhecimento necessário sobre como utilizá-lo.
Fica claro, nas narrativas das professoras, que ambas valorizam o desenvolvimento de
uma metodologia lúdica desde que propiciem, de fato, um envolvimento do grupo no
processo de aprendizagem. De acordo com Silveira (1998, p. 15) “todos os recursos usados
pelo professor para que ocorra o ensino e a aprendizagem de maneira prazerosa pelo aluno”
são considerados como metodologia lúdica.
Diante disso, as professoras reconhecem que o uso de jogos em sala de aula está
atrelado não apenas ao domínio das suas regras pelo professor, mas pela determinação prévia
do que se objetiva, pedagogicamente, com aquele jogo:
Eu não posso largar o jogo para uma criança, para um grupo e deixar que eles
joguem e não observem quais são as interações que eles fazem, quais são as
hipóteses que surgem a partir daquela construção. (Professora A)
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Se o professor não conhece o jogo, chega na sala de aula sem... eu já tive, uma vez
peguei o jogo e eu não sei não olhei muito antes, não trabalhei muito ai tu fica meio
perdida. Teria que ter mais momentos para a gente estudar sobre os jogos
(Professora B)
Durante a dinâmica do jogo, o professor pode observar as hipóteses que emergem das
crianças, além de acompanhar as interações que ocorrem entre elas, mas para tanto, a escolha
proposital e não aleatória de determinada atividade é fundamental para a maximização do
trabalho pedagógico, isto é, a utilização de jogos não pode prescindir do conhecimento das
possibilidades que o material oferece, e tampouco do que se deseja alcançar com a turma.
As professoras destacam ainda, a importância de jogos voltados para a alfabetização,
ou seja, uma proposta de atividade lúdica que contemple as condições de compreensão dos
aprendizes, colocando-os diante do desafio de expressarem suas hipóteses e concepções sobre
a lecto-escrita.
O jogo mais direcionado, mais voltado para a questão da alfabetização com o
objetivo de construção da leitura e da escrita eu vejo como essencial para também
conhecer como essa criança está desenvolvendo esse processo, quais são as
concepções daquela criança naquele momento e como que eu posso, em um outro
momento, levar um jogo que seja mais direcionado para aquelas hipóteses em que
eles estão. (Professora A)
A criança brinca e aprende ao mesmo tempo, então é uma forma divertida de
aprender e eles adoram assim aprender desta forma em qualquer área do
conhecimento. E a alfabetização, ela facilita muito a aprendizagem com os jogos,
(Professora B)
A partir das narrativas das professoras pode-se perceber o valor que atribuem ao jogo
como ferramenta no processo de construção da leitura e da escrita e como auxílio para
identificarem as concepções e hipóteses que as crianças já construíram sobre a alfabetização e
outros temas.
Uma vez identificadas as potencialidades dos aprendizes, assim como as hipóteses já
elaboradas, o professor pode intervir visando o avanço das concepções a respeito da lecto
escrita.
[...]a partir do jogo eles escreverem, eles comporem um texto, escreverem palavras
ou ajudar o colega a escrever uma palavra é espontâneo, é próprio deles e é uma
forma também deles interagirem e de eles construírem isso...esse processo da
leitura e da escrita de uma forma mais natural (Professora A)
Assim nas ciências, a geografia que aí você cria jogos com perguntas, perguntaresposta e daí joga com pontos e as crianças vão fazendo aquela interação ali e vão
estudando ao mesmo tempo eles vão estudando e se divertindo (Professora B)
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Considerações Finais
No atual processo educativo, o educador percebe-se imerso em um universo dinâmico,
em constante transformação, no qual o ato de educar precisa se modificar a todo o momento,
produzindo novos conhecimentos em relação à maneira de lidar com a gama imensa de
informações a que se tem acesso, sem descuidar de promover um saudável convívio em
sociedade, uma demanda tão importante em dias que o ter, parece ser mais valorizado do que
ser. De outro lado, há uma pressão social, expressa pela valorização de boas notas, da
quantidade de trabalhos produzidos, da disciplina em sala de aula. Conquistas que alimentam
o imaginário comum, como se fossem garantir a inserção dos estudantes em mundo
competitivo de trabalho e que acabam também por reduzir a infância.
Frente à gama de possibilidades que se tem para obter informações nos dias de hoje,
faz-se necessário, mais do que antes, elaborar currículos criativos, a fim de que os aprendizes
sejam motivados a aprender de forma significativa em sala de aula. Para tanto, a ludicidade
gerada por situações com jogos ganha destaque como ferramenta privilegiada neste contexto.
Incorporar o uso de jogos como um recurso didático-pedagógico nas aulas é transcender às
práticas tradicionais de ensino, que concebem o professor o único detentor e mero transmissor
de conhecimentos, cujas aulas eficazes dependem de um quadro cheio de escrita e alunos que
copiam.
O uso de jogos, desde que criteriosamente selecionados, com seus objetivos e regras
claramente explicados à turma, favorecem a interação entre as crianças, o compartilhamento
de informações e novas construções. Além disso, permite ao professor, descobrir-se não mais
como o centro, mas como um mediador dos conhecimentos que emergem dessa atividade.
Uma alternativa a resgatar a alegria, o prazer de aprender e de ensinar, abrindo caminhos para
que os profissionais se tornem mais dinâmicos, reflexivos e mais próximos das necessidades
dos educandos.
Assim, para que o uso de jogos como estratégia pedagógica faça parte do cotidiano
escolar e não como uma exceção, cabe ao docente apropriar-se do campo teórico a esse
respeito e lançar-se nesta experiência, fazendo da sua prática pedagógica um laboratório, no
sentido de refletir sobre ela e avaliar os diferentes aspectos no que concerne ao
aproveitamento das situações pelos estudantes, o quão motivados se apresentam frente a tal
recurso metodológico e como este envolvimento repercute no avanço de seus aprendizados. O
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professor, se respaldado epistemologicamente e capaz de aliar a teoria à sua experiência,
consegue sustentar e justificar suas escolhas metodológicas.
Sentir-se seguro quanto à atitude adotada, gera um clima de segurança tanto na sala de
aula, como frente à equipe escolar, aos pais dos estudantes, o que é fundamental quando se
busca superar práticas em que desacreditamos.
Assim, concluímos que esta pesquisa, além de possibilitar a mobilização de nossas
concepções, a partir da relação que estabelecemos entre o aporte teórico pesquisado com as
experiências práticas relatadas pelas professoras, permitiu também a elas refletirem sobre suas
concepções, à medida que relatavam suas práticas docentes. Finalmente, temos pretensão de
contribuir, mesmo que timidamente, com este campo conceitual no sentido de incentivar o
uso de jogos em sala de aula, como um recurso pedagógico, não apenas por acreditar que este
engrandeça o desempenho escolar da criança, mas sim porque sentimo-nos responsáveis por
clamar pela infância, que só acontece uma vez na vida, e portanto, precisa ser vivida. Sendo a
escola um lugar privilegiado para tais vivências.
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