A APLICAÇÃO DE JUSTA CAUSA PELO USO INDEVIDO DE E-MAILS PELO EMPREGADO Adriana Calvo Professora de Direito do Trabalho do Curso Preparatório para carreiras públicas IELF e Mestranda da PUC/SP MANAGER DEBATE • As empresas tem o direito de monitorar as mensagens (e-mails, telefonemas, cartas) de seus empregados? • Não. O sigilo de correspondência é inviolável e a mensagem eletrônica é similar ao correio tradicional. Solange Lopes -TCU • Sim. Deve haver um monitoramento até porque é o nome da empresa quem vem com o co-autor. Sinnédria Dias - ECT NATUREZA TÉCNICA DO E-MAIL • Correspondência x conjunto de dados? • A rede é só um meio mais rápido e interativo de se fazer tudo que já fazíamos antes por meios tradicionais. • O e-mail consiste num endereço privativo do usuário, sendo equivalente a uma caixa postal eletrônica. • Cartas são fechadas, ao passo que e-mails não tem essa proteção. NATUREZA JURÍDICA DO E-MAIL Art. 5, inciso XII da CF: “é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados E das comunicações telefônicas, salvo, NO ÚLTIMO CASO, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal e instrução de processo penal”. NATUREZA JURÍDICA DO E-MAIL Lei 9.296, de 25/07/96, art 1º prevê: “a intercepção de comunicações telefônicas de qualquer natureza, para prova em investigação criminal e em instrução processual penal dependerá de ordem do Juiz competente da ação principal, sob requerimento de segredo de justiça. Parágrafo único: O disposto aplica-se à interceptação de comunicações de sistemas e em telemática. NATUREZA JURÍDICA DO E-MAIL • Ministro Luiz Vicente do STJ e Marco Aurélio do STF entenderam em 1992 que a Lei 9.296/1996 regulamenta o art 5, inc. XIII. • Art 21, inc. X da CF: “os serviços de correio são explorados em caráter exclusivo pela União”. • Lei 6.538/78, art. 7 dispõe que: “são objetos de correspondência a carta, o cartão-postal, impresso, cecograma e a pequena-encomenda”. NATUREZA JURÍDICA DO E-MAIL • Art 47, Lei 6.538/78 dispõe que: “carta é o objeto correspondência, com ou sem envoltório, sob a forma de comunicação escrita, de natureza administrativa, social, comercial ou qualquer outra que contenha informações de interesse específico do destinatário”. NATUREZA JURÍDICA DO E-MAIL • Ministro Nelson Jobin, congresso de Direito Eletrônico comentou a tendência do STF de considerar a violação de e-mail não como violação de correspondência mas de privacidade (inciso X do art. 5 da CF). • Med. Prov. 2.200/2001 - Certificação de Doctos Eletrônicos - chaves criptográficas são de uso exclusivo do próprio titular. USO DE E-MAILS NO LOCAL DE TRABALHO • O empresário tem o PODER HIERÁRQUICO para dirigir a prestação de serviços por seus empregados, podendo regular como se utilizarão os recursos da empresa no ambiente de trabalho. • O poder diretivo do empregador sobre os empregados permite-lhe traçar regras que mantenham a empresa funcionando sem prejuízo, seja qual for o empregado sob sua autoridade. USO DE E-MAILS NO LOCAL DE TRABALHO A atual Constituição Federal brasileira, afirma serem em seu artigo 5, X: "invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas,assegurando o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação". USO DE E-MAILS NO LOCAL DE TRABALHO A origem do conceito jurídico de intimidade é norteamericano: "the right to be let alone", ou seja, o direito a ser deixado em paz, ou de ser deixado só. Inegável que o empregado tem direito à sua intimidade e à sua privacidade no ambiente de trabalho. Tem o direito de se proteger da entrada indevida do seu empregador em sua vida pessoal. USO DE E-MAILS NO LOCAL DE TRABALHO • No âmbito laboral coexistem 2 (duas) tendências: • a) Há um interesse legítimo do empresário em utilizar as enormes vantagens das novas tecnologias com vistas de aumentar a eficácia de sua gestão pessoal. • b) Por outro lado, esse acesso e tratamento de dados pessoais do trabalhador, pode por em perigo direitos fundamentais do mesmo, e, sobretudo, seu direito a intimidade. USO DE E-MAILS NO LOCAL DE TRABALHO • Haveria uma colisão de direitos? • Direito de propriedade e poder diretivo do empregador versus direito à privacidade e intimidade do empregado? • Como equilibrar ambos os direitos? Como estabelecer tais limites, sem se fazer do local de trabalho um lugar opressor e pesado para o empregado? RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR • A empresa é responsável pelos danos materiais e morais causados por atos de empregados, consoante Súmula 341: “É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto”. RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR • A empresa é responsável pelos danos materiais e morais causados por atos de empregados quanto ao uso indevido da rede e de e-mails. • No local de trabalho, o empregador tem uma preocupação legítima para que o empregado não divulgue informações confidencias da empresa e não transmita e-mails com conteúdo não apropriado não relacionados ao trabalho. POLÍTICA PÚBLICA DE USO DE INTERNET/E-MAILS • O empregador, com fundamento no poder diretivo, pode estabelecer uma política pública de uso de internet/e-mails através de norma coletiva ou termo aditivo ao contrato de trabalho. • É admissível a cláusula de invasão de privacidade? • Exemplo comparativo de revista de empregados não ofensiva a intimidade e privacidade. JUSTA CAUSA • O uso indevido do correio eletrônico pode configurar justa causa, conforme disposto no art. 482 da CLT. • É importante que estejam presentes todos os elementos tipificadores de referida dispensa: a) o fato deve estar tipificado nas hipóteses de justa causa previstas no artigo 482 da CLT; b) deve haver imediatividade do ato; JUSTA CAUSA • c) deve haver gravidade tal que impossibilite a manutenção do vínculo de emprego; • d) inexistência de perdão tácito ou expresso e; • e) apreciação das condições do empregado e do seu passado na empresa. JUSTA CAUSA • A legislação trabalhista não estabelece a gradação da pena em caso de dispensa com justa causa, ficando ao critério do empregador. No entanto, se a falta é grave, como de furto, o empregado deve ser dispensado de imediato. • É recomendável que referida gradação seja prevista em regulamento interno da empresa para reconhecimento da justa causa. • A prova da justa causa deve ser robusta e o ônus de referida prova é do empregador. JUSTA CAUSA • No caso de monitoramento de e-mails, a prova poderia ser considerada ilícita? • Em caso positivo, a empresa deveria requerer judicialmente a quebra de sigilo das mensagens? • Em caso de ser entendida como ilícita, poderia ainda ensejar ação de danos morais pelo empregado? JURISPRUDÊNCIA • No Brasil não há legislação trabalhista sobre o assunto. • Há 3 ações trabalhistas sobre o assunto: HSBC ajuizada perante a 13ª Vara de Brasília, Unimed de São Paulo ajuizada perante a 37ª Vara do Trabalho de São Paulo, SADIA ajuizada perante a 2a Vara do Trabalho de Ponta Grossa. JURISPRUDÊNCIA 1 “Em decisão inédita na Justiça do Trabalho, a 3ª Turma do TRT-10ª Região reconheceu, de forma unânime, a justa causa na demissão de ex-empregado do HSBC Seguros Brasil S/A acusado de enviar fotos pornográficas por correio eletrônico utilizando o provedor da empresa. • A juíza relatora, Márcia Mazoni, reformou a sentença da 13ª Vara do Trabalho de Brasília, que não acolheu a justa causa alegando terem sido as provas obtidas de modo ilegal, com violação do artigo 5°, inciso XII, da Constituição Federal, o qual estabelece o sigilo da correspondência e das comunicações, salvo por ordem judicial. JURISPRUDÊNCIA 1 • “Para a relatora, a utilização pessoal de email funcional para fins estranhos ao serviço e de conseqüências nocivas à reputação da empresa é ato grave suficiente para a dispensa por justa causa. • Além disso, a juíza entende que o dispositivo constitucional de inviolabilidade da correspondência, não se aplica ao caso, uma vez que todos os instrumentos são de propriedade da empresa e disponibilizados aos empregados para suas atividades, não existindo “confidencialidade”, motivo pelo qual não se configuraria a suposta violação à garantia da intimidade e à obtenção de provas por meio ilícito. JURISPRUDÊNCIA 1 • “A utilização pessoal de correio eletrônico funcional para fins estranhos ao serviço e de conseqüências nocivas à reputação da empresa é ato grave suficiente para a dispensa por justa causa, tendo em vista a total quebra de confiança entre empregador e empregado, tornando impossível a relação de emprego. • Entretanto, o dispositivo não se aplica ao caso, já que todos os instrumentos são de propriedade da empresa e disponíveis aos empregados para suas atividades, não existindo "confidencialidade", motivo pelo qual não se configuraria a suposta violação à garantia da intimidade e à obtenção de provas por meio ilícito. JURISPRUDÊNCIA 2 “O TRT de São Paulo reformou a decisão contra a UNIMED da 37a. Vara do Trabalho de São Paulo que tinha julgado válida a justa causa: • Justa Causa. "Correio eletrônico" caracteriza-se como correspondência pessoal. O fato de ter sido enviado por computador da empresa não lhe retira essa qualidade. Mesmo que o objetivo da empresa seja a fiscalização dos serviços, o poder diretivo cede ao direito do obreiro à intimidade (CF, art. 5°, inciso VIII). Um único "correio eletrônico", enviado para fins particulares, em horário de café, não tipifica justa causa. JURISPRUDÊNCIA 2 O Tribunal analisou (dois) 2 pontos em referida decisão: • Violação da intimidade do empregado ("correio eletrônico" caracteriza-se como correspondência pessoal. O fato de ter sido enviado por computador da empresa não lhe retira essa qualidade, pois o endereço eletrônico pertence ao empregado). • Proporcionalidade da pena (um único "correio eletrônico", enviado para fins particulares, em horário de café, não tipifica justa causa, principalmente praticada por empregado, com mais de 3 (três) anos no emprego, sendo inadmissível o rigor da reclamada). • . JURISPRUDÊNCIA 3 “EMENTA: CORREIO ELETRÔNICO - JUSTA CAUSA. É comum as empresas disponibilizarem internet-correio eletrônico aos empregados, que os usam também com fins particulares. Releva aferir se tal uso (não importa o conteúdo) atrapalha o rendimento profissional do empregado ou constrange outras pessoas. O empregador deve propiciar ao trabalhador corrigir seu comportamento, aplicando advertências e, no caso de reincidência, suspensão e, finalmente, dispensa por justa causa, de forma gradual. A realização de auditagem na estação de trabalho do autor fere o direito ao sigilo de comunicação (CF-88, art. 5º, XII). JURISPRUDÊNCIA 3 O parágrafo único do art. 1º da Lei 9.296-96 equipara as comunicações em sistema de informática e telemática, via e-mail, às comunicações telefônicas, em relação às quais cabe a quebra do sigilo somente por determinação judicial. Ilegal, pois, a imposição de cláusula autorizadora de realização de auditagem nas estações de trabalho dos usuários. Ainda, se o autor não era o único empregado a enviar e-mails particulares, todavia, os demais não sofrem qualquer penalidade, há nítido ato discriminatório. JURISPRUDÊNCIA 3 Ainda, se o autor não era o único empregado a enviar e-mails particulares, todavia, os demais não sofrem qualquer penalidade, há nítido ato discriminatório. A inobservação da norma empresarial não caracterizou dano ao empregador, pois não comprovado efetivo prejuízo à ré ou constrangimento a terceiros. O uso, pelo autor, do computador da empresa, para envio de mensagens particulares, mesmo que pornográficas e sem permissão, não é suficiente a demonstrar ausência de boa-fé na execução do contrato e acarretar quebra de fidúcia. (02a. VT DE PONTA GROSSA – PR. Relator :JANETE DO AMARANTE. SADIA S-A.J. 20/02/2003, DJPR 04/04/2003). CONCLUSÃO A inserção do empregado no ambiente de trabalho não lhe retira os direitos da personalidade.Contudo, não é nenhuma ameaça ao empregado impedi-lo de usar os meios da empresa em benefício próprio ou em prejuízo da empresa. Trata-se de delimitar dentro da empresa e na sociedade em geral, OS AMBIENTES PRIVADOS OU NÃO. CONCLUSÃO As iniciativas isoladas de determinados países produzem efeitos quase nulos. Faz-se necessária a promoção de amplas discussões internacionais, as quais conduzam a assinatura de tratados, que versem sobre matérias relativas à grande rede.