359 o DIIER EO MOSTRAR NO DISCURSO CARNAVALESCO DA ESCOLA DE SAMBA M4~4 The~ez4de Q. Guim4~4e. St~oftgoli/USJT o objetlvo e dests comunica~ao tente entre pluralldade tes 11ngO{sticoB pesquisar a rela~ao exis- cultural e a pOlifonla dos significan- mais empregados no discurso da escola de sam- ba. A n~ao que se tern de cultura e a mesma deNard Goodenough Geertz: A cultu~a de uma .aciedade e de Clifford caK~i~te em a que 4eja que alguim teKha que cOKhece~ ou ac~edita~, ~a~ de manei~a aceitavel ralidade cultural pos quanto a consiste, si9nlflca~ao cials. A compreensao Elege-se ope- 4eu4 memb~04 (C.Geerta:ll).A plu- portanto, na diversifica~ao as dos valores que dao de diferenc1a~io priticas a linquagem como ocampo exemplar para porque nela esta inscrito 0 que 0 0 exame de~ falante dia e 0 a partir da rela~io·e~ tre a linquaqem e as coisas ou fatos do mundo objetivo: trar, a partir da rela~ao entre eSBa linquagem 0 e colocada mos- desejos, que a escolha do vocabulario gueva! discurso dOB grupos soc1als pede dizer a mesma coisa, mas mostrar outra, percebida lumbrada ou expllcitada. motlvada e os 0 ou nao, calcados nos valores do falante. A hip6tese comper so- de Bi9nifica~ao. que BOetra. 0 dizer produz significa~ao conscientes dOBgr~ dessa pluralidade exiqe,conseqdentemente, a analise do processo se processo, P04 pa4a e vivida, mas nao claramente vis- A diferen~a das vozes, a pol1fonla, por varios fatores, pertinentes e particulares e a cada grupo. Vejamos. o significante lingdistico Imagem. Para se compreender basta procurar explica~oes 0 e sempre representa~ao de uma processo de sua representa~ao nao na cultura, ou simplesmente nomeio, 360 menos ainda nas determina~oes economico-politicas, masna constanta e complexa intera~ao de todas essas areas. Nesse caso,d~ ve-se pensar a imagem como 0 produto de imperativos bio-psiqu! co-pulsionais do indiv!duo e das intima~Oes do meio social, ~2 dos constantemente se dinamizando e se revezando para presenti fica-la no discurso. Ora,se sepensa como Goodenough au que a cuttu~a e&ta iocalizada e que ape& aIL de nCio 6 na4 mente& e co~acoe4 e. .•• 6.[&.lca,Mo i WIld Geertz, d04 home.n4 ent-idade ocutta (Geertz: 10), pode-se dizer que a desfile das escolas de samba edas mais expressivas man1festa~Oes da cultura brasileira. Justifica-se, portanto, a escolha de seu discurso para a pesquisa sobra pluralismo cultural e polifonia. A analise nao focalizara textos, mas algumas palavras-ch~ ves do discurso das escolas, examinando to geral e 0 que mostr~ 0 que dizem no contex- no contexto carnavalesco. cial para este contexto e 0 0 referen- capitulo -Apresenta9ao doproblema" do livro de M. Bakhtin A cultura popular na Idade MedJ.aeno R!! nascimento, em que e estudada a obra de Rabelais. Faz-se tal confrontayao, pais os estudiodos da pos-modernidade ternapont~ do a estreita rela~ao do espirito queanunciaonovo milenio com o que pres1diu a era medieval. A analise examinara a vocabulario que se destaca momentos e espa~os: 0 da escola de samba, 0 em tres do desfile e 0 das arquibancadas. Estes seraa estudados em rela~ao aas campos semanticos abordados par M.Bakhtin: vida e marte, corpo erotlzado, sociabilldade e espayo particularizado. Bscola de samba As palavras relacionadas em segulda foram extraidas da e~ trevista concedlda por membro da diretoria daRe.as deOUro, que dividiu, este ana, 0 tItulo de campea com a Camisa Verde .Br~ co. Eata entrevista vidades durante relatou a or9an1za~io todo 361 da escola e auas ati ano. As palavras conservam, em linhas 9!! 0 rais, a ordem em que foram dites: s,cola. quadrat atelier e barracao; presidente, dirstorss adainiatrativoa. diretor de barmonia. diretor de bateria. rala~oes publicaa. comiaaio deor8aniza~ao; tem., enredo. pe.quiaa. ainopae do d••anvolvimanto do tema. abertura d. concurso para e,colha do .amba de enredo. apresenta~ao do pilato dos figurino. palo carnavalesco (encarreqado da criaQao artistica). entrega da. copia, das musicas e latral para a cl.s,ific.~ao. eliminatoria das ausicaa eeacolha da vencedora. e~aaioa (quarta. e ,extaa-feiraa •• noite. domingo, a tarde) a partir de 19 de deza.bro. 'l'odasessas imagens formam sentido para dJ.ser e.cHItrar a! go no campo semantico do espa~o partieularizado e cia aoc1abl11 dade. A •• cola i a imagem principal dizagem do campo senantico da apre~ formal, no qual se alinham, tambem, teDa. enredo. nopse e pesquis •• As palavras si- quadra e barr.cao reaetea para 0 aemant1sme da 11m1ta~ao artesanal; piloto doa figurinos. muaica. letra, para a crillQAo artIstica; ensaio, para 0 de esforQo planejado gresso; finalmente, espacial, os vocabuios atelier, para de trabalho 0 que visa aopro- preaidente, diretor, caraava- peUQio. Esse discurso diz uma atividade inteiro, cuja organ1za9io pos soc1ais. 0 trabalho, que existe durante um ano nio 8e diferenc1a a'criayao, a orqanizayio me usam uaa unica voz: a da produQio. escola conserva dos valores da de outros e 0 diriqis- A enfase dada a palavra a mesma dada no contexto geral culturais. Ocorre, contudo, que rigentes des sa escola pertencem ciados: negros, descendentes gru- 08 da transm1eeio associados a segmentos culturais e d! diferen- de nativos e/ou indiv{duos de be! xa renda ou de renda media, mas aceltos com reservas palos se~ 362 mentos mais altos na escala soclal. (No Rio este fato e bastan te eVidente, pois, das 16 escolas quedesfilaram noprimeiro po, este ana de 91, apenas duas nao eram patroclnadas baixadas para 0 gr~ por bi- segundo grupo). A vaz mais alta que se MOstra e, portanto, ados lizados culturalmente margina- que querem gritar a preserva~aa valores e instituciona1izi-los de seus atraves da aprendizagem organi- zada e produtlva da escola. vejam-se as declara~oes dapresi~ te da ca.dsa Verde e Branco, tri-campea este ano, ao lade da~ aaa de Ouro, em entrevista (Gazeta de Pinheiros de 24/02/91, p. 12),cujo titulo proclama: Sambista diz que aguerra continua p! ra 08 negrOB. No texto ela afirma: Eu acho qu~ a gen~~ pod~a 6~~ de~xado em paz pa~a en6~~d~ "04604 net06, a "046a cuttu~d. Que 0 4amba, nao adianta. Ago~a, ati um pouco d~3e~ente,po~ Que Quando_chega 0 ca4nava~, a_madame 6ulana que~ 44~~~dA e4cota6. Va 4tatu6. Ma6 ete6 60 p~ocu~am a e6cola na ~poCd do C4Anaval. Eu 40U totalmente cont~4 e66e negocio ... 404 "06404 e Observa-se, 6~!h06, d04 portanto, que 0 e carnaval que diz escola di- ferenciado e contrasta com aquele carnaval que sequer seja ~ trado. Ocon~raste ocorreparque e1essao,segundo Bakhtin, osdois p010s da exlstencla humana, au seja, vida e marte. que antecedem 0 desfile, saa a ~rte do egacentrismo. porque ~ xige dedica~ao total e submissao aos interesses da escola; das fraquezas e irnperfei~Oes, porque suas atividades pedem excele~ cia; da marginalidade, porque essa excelencla sera anunciada e reconhecida em luqar pUblico, 0 sambodroma. t airnposi~ao dePr~ meteu para que Dioni80 passe a ter vida durante dois dias. jogo da natureza: a marte quanta sua jornada e e prenuncio de outra vida, mas, 10nga, a da vida dura do is dias: 0 E 0 en- desfi- Compreende-se, gem/palavra e agora mais facilmente, que a escolha daima dinamizada pelo percurso em que se revezam as i~ perativos bio-pslquico-pulsionais e as intima~oes do meio soc! a1. ~ este percurso que da as contornos do campo semantico em Sob esse ponto de vista, a escola de samba diz lugar de ~ prendizagem e mostra pratica de morte de uma vida marginallzada,1ndesejada ou insatisfelta, a fim de fazer nascer outra. A cria~ao e pesquisa do enredo, das alegorias e figurinos, a el~ bora~ao das fantasias e carros alegoricos, 0 concurso para ae~ da escola, artistas e diretores, a possibilidade ea satisfayao de alcan~ar excelencia no campo criativo e artistico; aos fo- lioes, a excelencia do desempenho fIsico, sensoriale motor,sem a preocupa9ao de excelencia intelectual. Essa satlsfa~aa pelo e no samba quando vlvida na passarela, porque dao publica. Esta a razao de camente 0 0 0 so se completa, contudo, renascimenta exige certi- carnaval explorar e expor publ! corpo erotlzado, pois a erotlza~ao coloca-se no cam- po semantico da uniao dos corpos e esta, na da cria~ao davida. Apesar de 0 semantismo vida/morte e corpo erotizado nao se ex- plicitarem na imagem e8cola esta implicito no discurso que es- As palavras que se seguem foram as mais ouvidas entre .~ bistas e or9anizadores na concentra9ao no. dia do desfile: pas.arela, tempo para de.file, carro alegorico, luz, fantasia, fogoa de artiffcio. corea, brilho, bateria. evolu~.o, requebro, canto, letra, ritmo, ri.o, ala, destaque de carro (central ede apoio), destaque de ala, comissao de frente, comis.ao de apresenta~ao (crianQas e adolescentes), mestre-sala, porta-bandeira, abre-alas, bateria, rainha e madrinha da bateria, pa••iat. de bandeira. mulatas (mulheres jovens e bani tas, nio necessariamente descendente. de africanosl. baianas (mulheres mais velhas e, em geral, gorda.), componentes deala, sambistas, sambeiros (aqueles que sambam no desfile sem terem ensaiado), membro da harmonia e componente da bateria. o foliao conquistaram um espaQo particularizado para mostrar a excelencia de sua organizaQao e/ou desempenho. Este espaiolhes permite usufruir de toda liberdade para manifestarem suas asp! raQoes e explorarem mentam: 0 0 prazer do corpo erotizado. ~ onde exper! senti do da universalidade, pois as fantasiaseliminarn diferenQas de classes, leis, etnias, sexo e marcas do tempo: 0 prazer de gozar abundancia, pois os corpos se cobrern de adereQOs, cores e brilhos: e, finalmente, a sensaQao de estar part! cipando de uma saciedade privilegiada, pois reconhecida e Adm! rada par urnpUblico que aplaude seus risos, gritos, cantos eT~ quebro. de ventre • quadris. Entretanto, como no discurso anterior, estetambim apres~ ta amb~gaidade, pois deixa ouvir varias vozes. Ao contrario do outro, 0 que DO.~r. nao e 0 que dlZ8B muitas de suas palavras. o foliao nao pode se entreqar a sua propria folia: aeve obedecer as normas do diretor de harmonia, este a da comis.ao oraa- uizadora, que se suhmete, por sua vez, ao presidente etodos as exigencias da Liqa das Escolas de Samba: 'limites espaciai. (e! te ano os 530 metros de extensao, por 14 de largura, do .a.bodromo)lde tempo (a obriqaQao de nao ultrapassar 70 minutes p••••r.l."desempenho que satisfaQa 08 nove quesieos na (enrado. harmonia, evolu.ao. bateria, fanta.ia, al.aoria, ••mba de enr~ do, comiaaao de frente e porta-bandeira/meatre-aal.), julqados por vlnte e sete jurados. A relaQao do follia com a escola t~ oem DaO i de liberdade: hi a sele~io natural em fun~ao da ida- de, beleza l.ta •... ' e habilidades e restri~ao As restri~oes 365 do pa •• ista •••• biat., .eltre- •• l.,.~ para partlcipa~ao (condl~Oes para flnan- Impostas di.em a morte, a outra face do ea- petacul0 que se quer mostrado vivo • • DiBcorSO do pUblico Extraido de Gazeta de Plnheiro (14/02/91, p. 3): o e~~e da de6ini~40 do p~e~o d04 ~"g~e4404 'ieou ev~dente na p~op~~ te~~a-~e~~a da Apote04e, quando 04 alio-64l4Kte4 4KU"eia~a. pa~a 44 a~q~ba"eada4 vazi44 e P4~4 4 .ultidio do La do de 6o~a que 04 p~e~04 4 p4~i~ daquele .0_ento ~nh4. Aide ~eb4ix4d04. f •• eft04 de um4 ho~a 44 a~quibane4d44 6iea~4m, 4e "40 totada4, p~o men04 eom601 de 4ua eapaeidadt tom4da. Fica impl{clto tidao La '0~4 que 0 de poder aqulsitlvo arqulbancada do paralel1smo espetaculo .uL- 4~quib4Ke4da4 vazi44 da Apeteo.e na~ atralu pes.oas para paqar Cr$ 6.000,00 per uma entrada de descoberta ou Cr$ 12.000,00 para uma coberla, mas atralu muitos para vi-lo de longe, em sltua~io das mals precaria •• E.ta claro que e.samultldio mo reduzindo-se 0 logresso, nie lotau todas Ha verdad., aB que sobrar_ caso, 0 tem renda tao baixaque,.e~ form as arqulbancadas. as de valor mals alto. Hes.e sambcSdro.c tis lugar do samba, mas _tra lugu a. uma deter.m1nada cIa •••• Este pUblico que COIIparece para torcer pela suaescola 08 excluldoa do desfile, der a suas eXi~incias soaS, observadas de mulheres per nio terem condl~Oes de correspon- de ord •• economica. 1D 1000 A maloria dessaspes- per eata pesquiaadora, muito pobrea, acompanhada. i cons~l~u!da de crlan9aa de tcdaB •• idade., mas nao d. hOJnen., e sllllple ••ente obaervam, de entu8iaseo. A expressio lev4l1U'\ /l a~lvid&de para todos, _ua, aquela .scola, pois que a en~u.i.... 0 sio sem mostra u.qu...ib/lllc.ada nio tis ~ apena., que. tore. para .StA ·OU nio i 0 que ••• va 0 e!. 366 petaculo carnavaleaco em ai, mas 0 que diz aquela cujas cores Conclui-se que a polifonia no discurso carnavale.co da e! cola de samba de Sao Paulo, assim como no de outros estados, 2 corre porque esse discurso ~, e uma re-presen~, ou ainda, preBellt.ific.-~ re~reaent.- das imagens estruturadas pelos imperativos bio-psiquico-pu1810nais dolndivIduo, revezados com imperativos sociais dinamizados emseu' grupe, confirmando ser 08 o significante linqQIBtico intrinsicamente motlvado A anilise doB varios carnavais no resto do pais evideneia ser este even to heterogeneo e manifestar conhecimentos e crenylls de sua populayao. a heteroqeneidade de No entanto, compro- vou-se terM! esses discursos urndenomlnador cOIIUII:d1zer e 'trar a ordea cO.mica da passagemdo sal e -a. tempo. Esta verdade unive!. a sssencia dodiscurso carnavalesco da imprensa escrita e falada. Suas imagens e manchetes privilegiam corpos nus intenSaaeDte erotizados, gestos e atitudes que chegam ao grotesco, risos, brilh08 e cores que evidenciam a ansia coletiva de veneer a morte com Por esta razao, as insignias da sexua11dade criadora da vida. 0 carnaval e c1011co e no encantamento dinami- zador de.ses c1c108 abr1ga todas as cren~as econhec1rnentos, di t~8 e mo8trados, porque eles nasoem para marrero BAKBTIN, M. -Apresenta9ao do problema- in Aeuttu~a papula~ Id4d~ Midl4 t no RtK44el_eKto. sio Paulo: Huc1tec, 1987. DURAND, G. A lm4gl"4~aO 4l.bo!iea. 114 Sao Paulo: Cultrix /EDUSP, 1988. GEEaTI, C. Tlat .Lllte.Jtplte.tat.i.oK 06 euttultU. 1973. New York: Basic Books,