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o DIIER EO MOSTRAR NO DISCURSO CARNAVALESCO DA ESCOLA DE SAMBA
M4~4 The~ez4de Q. Guim4~4e. St~oftgoli/USJT
o
objetlvo
e
dests comunica~ao
tente entre pluralldade
tes 11ngO{sticoB
pesquisar a rela~ao
exis-
cultural e a pOlifonla dos significan-
mais empregados
no discurso da escola de sam-
ba.
A n~ao
que se tern de cultura
e
a mesma deNard Goodenough
Geertz: A cultu~a de uma .aciedade
e de Clifford
caK~i~te em a
que 4eja que alguim teKha que cOKhece~ ou ac~edita~,
~a~ de manei~a aceitavel
ralidade cultural
pos quanto
a
consiste,
si9nlflca~ao
cials. A compreensao
Elege-se
ope-
4eu4 memb~04 (C.Geerta:ll).A
plu-
portanto, na diversifica~ao
as
dos valores que dao
de diferenc1a~io
priticas
a linquagem como ocampo
exemplar para
porque nela esta inscrito
0
que
0
0
exame de~
falante dia e 0
a partir da rela~io·e~
tre a linquaqem e as coisas ou fatos do mundo objetivo:
trar, a partir da rela~ao entre eSBa linquagem
0
e
colocada
mos-
desejos,
que a escolha do vocabulario gueva!
discurso dOB grupos soc1als pede dizer a mesma coisa,
mas mostrar outra, percebida
lumbrada ou expllcitada.
motlvada
e os
0
ou nao, calcados nos valores do falante.
A hip6tese
comper
so-
de Bi9nifica~ao.
que BOetra. 0 dizer produz significa~ao
conscientes
dOBgr~
dessa pluralidade exiqe,conseqdentemente,
a analise do processo
se processo,
P04
pa4a
e vivida, mas nao claramente vis-
A diferen~a
das vozes, a pol1fonla,
por varios fatores, pertinentes
e particulares
e
a cada
grupo. Vejamos.
o significante
lingdistico
Imagem. Para se compreender
basta procurar
explica~oes
0
e
sempre representa~ao
de uma
processo de sua representa~ao
nao
na cultura, ou simplesmente nomeio,
360
menos ainda nas determina~oes economico-politicas, masna constanta e complexa intera~ao de todas essas areas. Nesse caso,d~
ve-se pensar a imagem como
0
produto de imperativos bio-psiqu!
co-pulsionais do indiv!duo e das intima~Oes do meio social, ~2
dos constantemente se dinamizando e se revezando para presenti
fica-la no discurso. Ora,se sepensa como Goodenough au
que a cuttu~a
e&ta iocalizada
e que ape& aIL de nCio
6
na4 mente& e co~acoe4
e.
.••
6.[&.lca,Mo i
WIld
Geertz,
d04 home.n4
ent-idade ocutta
(Geertz:
10), pode-se dizer que a desfile das escolas de samba edas mais
expressivas man1festa~Oes da cultura brasileira. Justifica-se,
portanto, a escolha de seu discurso para a pesquisa sobra pluralismo cultural e polifonia.
A analise nao focalizara textos, mas algumas palavras-ch~
ves do discurso das escolas, examinando
to geral e
0
que mostr~
0
que dizem no contex-
no contexto carnavalesco.
cial para este contexto e
0
0 referen-
capitulo -Apresenta9ao doproblema"
do livro de M. Bakhtin A cultura popular na Idade MedJ.aeno R!!
nascimento, em que e estudada a obra de Rabelais.
Faz-se
tal
confrontayao, pais os estudiodos da pos-modernidade ternapont~
do a estreita rela~ao do espirito queanunciaonovo
milenio com
o que pres1diu a era medieval.
A analise examinara a vocabulario que se destaca
momentos e espa~os:
0
da escola de samba,
0
em tres
do desfile e
0
das
arquibancadas. Estes seraa estudados em rela~ao aas campos semanticos abordados par M.Bakhtin: vida e marte, corpo erotlzado, sociabilldade e espayo particularizado.
Bscola de samba
As palavras relacionadas em segulda foram extraidas da e~
trevista concedlda por membro da diretoria daRe.as deOUro, que
dividiu, este ana,
0
tItulo de campea com a Camisa Verde .Br~
co. Eata entrevista
vidades durante
relatou a or9an1za~io
todo
361
da escola e auas ati
ano. As palavras conservam, em linhas 9!!
0
rais, a ordem em que foram dites:
s,cola. quadrat atelier e barracao;
presidente, dirstorss adainiatrativoa. diretor de barmonia.
diretor de bateria. rala~oes publicaa. comiaaio deor8aniza~ao;
tem., enredo. pe.quiaa. ainopae do d••anvolvimanto do tema.
abertura d. concurso para e,colha do .amba de enredo.
apresenta~ao do pilato dos figurino. palo carnavalesco (encarreqado da criaQao artistica). entrega da. copia, das musicas e
latral para a cl.s,ific.~ao. eliminatoria das ausicaa eeacolha
da vencedora. e~aaioa (quarta. e ,extaa-feiraa •• noite.
domingo, a tarde) a partir de 19 de deza.bro.
'l'odasessas imagens formam sentido para dJ.ser e.cHItrar a!
go no campo semantico
do espa~o partieularizado
e cia aoc1abl11
dade.
A •• cola i a imagem principal
dizagem
do campo senantico da apre~
formal, no qual se alinham, tambem, teDa. enredo.
nopse e pesquis •• As palavras
si-
quadra e barr.cao reaetea para 0
aemant1sme
da 11m1ta~ao
artesanal;
piloto doa figurinos. muaica. letra, para a crillQAo
artIstica;
ensaio, para 0 de esforQo planejado
gresso; finalmente,
espacial,
os vocabuios
atelier, para
de trabalho
0
que visa aopro-
preaidente, diretor, caraava-
peUQio.
Esse discurso diz uma atividade
inteiro, cuja organ1za9io
pos soc1ais. 0 trabalho,
que existe durante um ano
nio 8e diferenc1a
a'criayao,
a orqanizayio
me usam uaa unica voz: a da produQio.
escola conserva
dos valores
da de outros
e
0
diriqis-
A enfase dada
a
palavra
a mesma dada no contexto geral
culturais.
Ocorre, contudo, que
rigentes des sa escola pertencem
ciados: negros, descendentes
gru-
08
da transm1eeio
associados
a segmentos culturais
e d!
diferen-
de nativos e/ou indiv{duos
de be!
xa renda ou de renda media, mas aceltos com reservas palos se~
362
mentos mais altos na escala soclal.
(No Rio este fato
e
bastan
te eVidente, pois, das 16 escolas quedesfilaram noprimeiro
po, este ana de 91, apenas duas nao eram patroclnadas
baixadas para
0
gr~
por bi-
segundo grupo).
A vaz mais alta que se MOstra e, portanto, ados
lizados culturalmente
margina-
que querem gritar a preserva~aa
valores e instituciona1izi-los
de seus
atraves da aprendizagem organi-
zada e produtlva da escola. vejam-se as declara~oes dapresi~
te da ca.dsa Verde e Branco, tri-campea este ano, ao lade da~
aaa de Ouro, em entrevista
(Gazeta de Pinheiros de 24/02/91, p.
12),cujo titulo proclama: Sambista diz que aguerra continua p!
ra 08 negrOB. No texto ela afirma:
Eu acho qu~ a gen~~ pod~a
6~~
de~xado em paz pa~a
en6~~d~
"04604 net06, a "046a cuttu~d. Que
0 4amba, nao adianta.
Ago~a, ati um pouco d~3e~ente,po~
Que Quando_chega 0 ca4nava~, a_madame 6ulana que~ 44~~~dA
e4cota6. Va 4tatu6. Ma6 ete6 60 p~ocu~am a e6cola na ~poCd do C4Anaval. Eu 40U totalmente cont~4 e66e negocio ...
404 "06404
e
Observa-se,
6~!h06,
d04
portanto, que
0
e
carnaval que diz escola
di-
ferenciado e contrasta com aquele carnaval que sequer seja ~
trado. Ocon~raste ocorreparque
e1essao,segundo
Bakhtin, osdois
p010s da exlstencla humana, au seja, vida e marte.
que antecedem 0 desfile, saa a ~rte
do egacentrismo.
porque ~
xige dedica~ao total e submissao aos interesses da escola; das
fraquezas e irnperfei~Oes, porque suas atividades pedem excele~
cia; da marginalidade,
porque essa excelencla sera anunciada e
reconhecida em luqar pUblico,
0
sambodroma. t airnposi~ao dePr~
meteu para que Dioni80 passe a ter vida durante dois dias.
jogo da natureza: a marte
quanta sua jornada
e
e
prenuncio de outra vida, mas,
10nga, a da vida dura do is dias:
0
E 0
en-
desfi-
Compreende-se,
gem/palavra
e
agora mais facilmente, que a escolha daima
dinamizada pelo percurso em que se revezam as i~
perativos bio-pslquico-pulsionais
e as intima~oes do meio soc!
a1. ~ este percurso que da as contornos do campo semantico
em
Sob esse ponto de vista, a escola de samba diz lugar de ~
prendizagem e mostra pratica de morte de uma vida marginallzada,1ndesejada ou insatisfelta, a fim de fazer nascer outra.
A
cria~ao e pesquisa do enredo, das alegorias e figurinos, a el~
bora~ao das fantasias e carros alegoricos,
0
concurso para ae~
da escola, artistas e diretores, a possibilidade ea satisfayao
de alcan~ar excelencia no campo criativo e artistico;
aos fo-
lioes, a excelencia do desempenho fIsico, sensoriale motor,sem
a preocupa9ao de excelencia intelectual.
Essa satlsfa~aa pelo e no samba
quando vlvida na passarela, porque
dao publica. Esta a razao de
camente
0
0
0
so
se completa,
contudo,
renascimenta exige certi-
carnaval explorar e expor publ!
corpo erotlzado, pois a erotlza~ao coloca-se no cam-
po semantico da uniao dos corpos e esta, na da cria~ao davida.
Apesar de
0
semantismo vida/morte e corpo erotizado nao se ex-
plicitarem na imagem e8cola esta implicito no discurso que es-
As palavras que se seguem foram as mais ouvidas entre .~
bistas e or9anizadores na concentra9ao no. dia do desfile:
pas.arela, tempo para de.file, carro alegorico, luz, fantasia,
fogoa de artiffcio. corea, brilho, bateria. evolu~.o, requebro,
canto, letra, ritmo, ri.o, ala, destaque de carro (central ede
apoio), destaque de ala, comissao de frente, comis.ao de
apresenta~ao (crianQas e adolescentes), mestre-sala,
porta-bandeira, abre-alas, bateria, rainha e madrinha da
bateria, pa••iat. de bandeira. mulatas (mulheres jovens e bani
tas, nio necessariamente descendente. de africanosl. baianas
(mulheres mais velhas e, em geral, gorda.), componentes deala,
sambistas, sambeiros (aqueles que sambam no desfile sem terem
ensaiado), membro da harmonia e componente da bateria.
o foliao conquistaram um espaQo particularizado para mostrar a
excelencia de sua organizaQao e/ou desempenho. Este espaiolhes
permite usufruir de toda liberdade para manifestarem suas asp!
raQoes e explorarem
mentam:
0
0
prazer do corpo erotizado. ~ onde exper!
senti do da universalidade, pois as fantasiaseliminarn
diferenQas de classes, leis, etnias, sexo e marcas do tempo:
0
prazer de gozar abundancia, pois os corpos se cobrern de adereQOs, cores e brilhos: e, finalmente, a sensaQao de estar part!
cipando de uma saciedade privilegiada, pois reconhecida e Adm!
rada par urnpUblico que aplaude seus risos, gritos, cantos eT~
quebro. de ventre • quadris.
Entretanto, como no discurso anterior, estetambim
apres~
ta amb~gaidade, pois deixa ouvir varias vozes. Ao contrario do
outro,
0
que DO.~r. nao
e
0
que dlZ8B muitas de suas palavras.
o foliao nao pode se entreqar a sua propria folia: aeve obedecer
as
normas do diretor de harmonia, este
a
da comis.ao oraa-
uizadora, que se suhmete, por sua vez, ao presidente etodos
as
exigencias da Liqa das Escolas de Samba: 'limites espaciai.
(e!
te ano os 530 metros de extensao, por 14 de largura, do .a.bodromo)lde tempo (a obriqaQao de nao ultrapassar 70 minutes
p••••r.l."desempenho
que satisfaQa
08
nove quesieos
na
(enrado.
harmonia, evolu.ao. bateria, fanta.ia, al.aoria, ••mba de enr~
do, comiaaao de frente e porta-bandeira/meatre-aal.),
julqados
por vlnte e sete jurados. A relaQao do follia com a escola t~
oem
DaO i de liberdade: hi a sele~io natural em fun~ao da ida-
de, beleza
l.ta •...
'
e habilidades
e restri~ao
As restri~oes
365
do pa •• ista •••• biat., .eltre- •• l.,.~
para partlcipa~ao
(condl~Oes para flnan-
Impostas di.em a morte, a outra face do ea-
petacul0 que se quer mostrado vivo •
• DiBcorSO
do pUblico
Extraido
de Gazeta de Plnheiro
(14/02/91, p. 3):
o
e~~e da de6ini~40 do p~e~o d04 ~"g~e4404 'ieou ev~dente
na p~op~~
te~~a-~e~~a da Apote04e, quando 04 alio-64l4Kte4 4KU"eia~a. pa~a 44 a~q~ba"eada4
vazi44 e P4~4 4 .ultidio do La do de 6o~a que 04 p~e~04 4 p4~i~ daquele .0_ento ~nh4. Aide ~eb4ix4d04. f •• eft04 de um4 ho~a 44 a~quibane4d44 6iea~4m, 4e "40 totada4, p~o men04 eom601 de
4ua eapaeidadt tom4da.
Fica impl{clto
tidao La '0~4 que
0
de poder aqulsitlvo
arqulbancada
do paralel1smo
espetaculo
.uL-
4~quib4Ke4da4 vazi44
da Apeteo.e
na~ atralu
pes.oas
para paqar Cr$ 6.000,00 per uma entrada de
descoberta
ou Cr$ 12.000,00
para uma coberla, mas
atralu muitos para vi-lo de longe, em sltua~io das mals precaria •• E.ta claro que e.samultldio
mo reduzindo-se
0
logresso, nie lotau todas
Ha verdad., aB que sobrar_
caso,
0
tem renda tao baixaque,.e~
form
as arqulbancadas.
as de valor mals alto. Hes.e
sambcSdro.c tis lugar do samba, mas _tra
lugu
a.
uma
deter.m1nada cIa ••••
Este pUblico que COIIparece para torcer pela suaescola
08
excluldoa
do desfile,
der a suas eXi~incias
soaS, observadas
de mulheres
per nio terem condl~Oes de correspon-
de ord •• economica.
1D 1000
A maloria dessaspes-
per eata pesquiaadora,
muito pobrea, acompanhada.
i cons~l~u!da
de crlan9aa de tcdaB ••
idade., mas nao d. hOJnen., e sllllple
••ente obaervam,
de entu8iaseo.
A expressio
lev4l1U'\
/l
a~lvid&de para todos,
_ua,
aquela .scola, pois
que a en~u.i....
0
sio
sem mostra
u.qu...ib/lllc.ada nio tis ~
apena., que. tore. para .StA ·OU
nio i
0
que ••• va
0
e!.
366
petaculo carnavaleaco em ai, mas
0
que diz aquela cujas cores
Conclui-se que a polifonia no discurso carnavale.co da e!
cola de samba de Sao Paulo, assim como no de outros estados, 2
corre porque esse discurso
~,
e
uma re-presen~,
ou ainda, preBellt.ific.-~
re~reaent.-
das imagens estruturadas pelos
imperativos bio-psiquico-pu1810nais
dolndivIduo, revezados com
imperativos sociais dinamizados emseu' grupe, confirmando ser
08
o significante linqQIBtico intrinsicamente motlvado
A anilise doB varios carnavais no resto do pais evideneia
ser este even to heterogeneo e manifestar
conhecimentos e crenylls de sua populayao.
a heteroqeneidade de
No entanto, compro-
vou-se terM! esses discursos urndenomlnador cOIIUII:d1zer e
'trar a ordea cO.mica da passagemdo
sal
e
-a.
tempo. Esta verdade unive!.
a sssencia dodiscurso carnavalesco da imprensa escrita e
falada. Suas imagens e manchetes privilegiam corpos nus intenSaaeDte erotizados,
gestos e atitudes que chegam ao grotesco,
risos, brilh08 e cores que evidenciam a ansia coletiva de veneer a morte com
Por esta razao,
as insignias da sexua11dade criadora da vida.
0
carnaval
e
c1011co e no encantamento dinami-
zador de.ses c1c108 abr1ga todas as cren~as econhec1rnentos, di
t~8 e mo8trados, porque eles nasoem para marrero
BAKBTIN, M. -Apresenta9ao do problema- in Aeuttu~a papula~
Id4d~ Midl4 t no RtK44el_eKto. sio Paulo: Huc1tec, 1987.
DURAND, G. A lm4gl"4~aO 4l.bo!iea.
114
Sao Paulo: Cultrix /EDUSP,
1988.
GEEaTI, C. Tlat .Lllte.Jtplte.tat.i.oK 06 euttultU.
1973.
New York: Basic Books,
Download

o DIIER EO MOSTRAR NO DISCURSO CARNAVALESCO DA