1 EDUCAÇÃO ESPECIAL E INCLUSIVA NA REDE DE ENSINO PÚBLICA ESTADUAL DE SERGIPE Msc. Chrystiane Vasconcelos Andrade Toscano Universidade Tiradentes e Secretaria de Estado da Educação de Sergipe [email protected] Palavras Chaves: Políticas Educacionais, Educação Especial, Educação Inclusiva. INTRODUÇÃO A educação inclusiva é atualmente um dos objetivos mais importantes da política educacional e social contemporânea. No âmbito da escola, a inclusão envolve um processo de reestruturação, com destaque à acessibilidade arquitetônica e curricular, com a garantia da democratização substantiva e irrestrita junto a todos os cidadãos das inúmeras oportunidades educacionais e sociais. Alguns teóricos, como Stainback (1999), Sassaki (2005) e Mantoam (1997) apontam a necessidade dos estudos sobre a inclusão saírem dos muros da escola e alcançarem as famílias e comunidade externa, democratizando amplamente o apoio especializado que se deve disponibilizar em todo o contexto de educação regular. Portanto, a inclusão consiste em adequar os sistemas sociais gerais da sociedade de tal modo que sejam eliminados os fatores que excluíam certas pessoas do seu seio e mantinham afastadas aquelas que foram excluídas. A eliminação de tais fatores deve ser um processo contínuo e concomitante com o esforço que a sociedade deve empreender no sentido de acolher todas as pessoas, independentemente de suas diferenças individuais e das suas origens na diversidade humana, pois, para incluir todas as pessoas, a sociedade deve ser modificada a partir do entendimento de que ela é que precisa ser capaz de atender às necessidades de seus membros (SASSAKI, 2005, p.21). Defendida como inerente ao direito do cidadão à inclusão, de acordo com os teóricos acima citados, ainda enfrenta resistência por parte de militantes da educação especial de base segregativa. Tal constatação requer do Estado, fundamentalmente, que se defina politicamente, estruture um arcabouço de suportes, de modelos diversificados, de técnicos especializados, programas e currículos adaptados, no contexto do projeto de transformação educacional, colaborando para a efetivação da inclusão social. Uma das formas de se desenvolver um trabalho concreto com essas dificuldades, além de favorecer o acesso aos bens sociais mínimos, está na escola buscar caminhos para um 2 trabalho educativo mais prazeroso e produtivo, visando alcançar seus objetivos educacionais e trabalhar a diversidade humana. Os pressupostos da discussão anteriormente apresentados formam a matriz teórica balizadora da Política de Educação Especial, na perspectiva de educação inclusiva, da Secretaria de Educação do Estado de Sergipe. Muito embora se deva reconhecer que a implantação sistemática e ampla da inclusão na educação básica supõe desafios a enfrentar, como uma série de entraves discriminatórios nos discursos e nas práticas segregativas consolidadas. As concepções tradicionais sobre a deficiência, a referência central nas limitações, a falta de conhecimento e de condições de trabalho e a carência de apoios revelam-se, nos diferentes estudos e experiências, como desafios superáveis, desde que esteja explícita a vontade política dos governos e dirigentes educacionais quanto à inserção escolar desses alunos na perspectiva também da pedagogia do sucesso. Neste sentido o estudo teve a pretensão de conhecer o perfil do alunado com necessidades educacionais especiais e identificar o tipo de atendimento educacional oferecido na rede de ensino pública estadual de Sergipe. A relevância da pesquisa se evidencia na medida em que se pretende revelar aos serviços os resultados de uma política de Educação Especial. CONCEPÇÕES LEGAIS DA INCLUSÃO A proposta da política estadual da educação especial em Sergipe, em conformidade com a política nacional de educação, parte do pressuposto de que a Educação Especial é uma modalidade de educação que perpassa todas as etapas e níveis de ensino, requerendo recursos educacionais e estratégias de apoio aos alunos com Necessidades Educacionais Especiais e alternativas diversificadas no atendimento, de acordo com as necessidades de cada um, como também apoio supervisionado aos professores. A construção de uma sociedade inclusiva tem como base a valorização da diversidade, sendo este princípio básico inerente à constituição de uma sociedade justa e igualitária, com a garantia do acesso e da participação de todos, independentemente das peculiaridades de cada um, reconhecendo a identidade dos sujeitos e assegurando o respeito às diferenças em busca da igualdade. Dessa forma, o Ministério da Educação, através do Programa de Educação Inclusiva, propõe que as instituições de ensino tenham: • Disponibilidade de professor ou instrutor da língua de sinais, para o ensino de alunos surdos; • Disponibilidade de professor de braille para favorecer o ensino de alunos cegos; • Disponibilidade de equipamentos e materiais especiais (...) • Disponibilidade de equipamentos e materiais especiais para o ensino de alunos com baixa visão (lupa, livros didáticos com letras ampliadas, etc.); 3 • Disponibilidade de outros recursos didáticos para o ensino de alunos com dificuldade de comunicação oral (dicionários da língua brasileira de sinais – LBS – LIBRAS e outros); • Disponibilidade de equipamento de informática e de softwares educacionais para o ensino de alunos com dificuldades de aprendizagem; • Disponibilidade de mobiliário adaptado para os alunos com dificuldades motoras. Na vivência da inclusão, a escola vai-se estruturando no decorrer das suas experiências com pessoas com necessidades educacionais especiais e gradativamente implementa as adequações necessárias, para garantir o acesso de alunos à aprendizagem e ao conhecimento. A Constituição Federal, em um dos princípios para o ensino, elege em seu art. 206, inc. I “igualdade de condições de acesso e permanência na escola.” para todos, em um mesmo ambiente que pode e deve ser o mais diversificado possível, para atingir o pleno desenvolvimento humano e o preparo para a cidadania (art.205). Na vivência da inclusão, todos os envolvidos – comunidade escolar e extraescolar – enriquecem-se por terem a oportunidade de aprender uns com os outros. Para que a inclusão funcione com sucesso, há a necessidade de programas adequados, preparação dos envolvidos e formação continuada dos profissionais da área, além da inserção de alunos com necessidades educacionais especiais nas salas de aula do ensino regular. Dentre os programas adequados, destacam-se: acessibilidade – metodológica, de comunicação e arquitetônica – adaptações curriculares, recursos financeiros e materiais didático-pedagógicos. (...) os locais segregados são prejudiciais porque alienam os alunos. Os alunos com deficiência recebem, afinal, pouca educação útil para a vida real, e os alunos sem deficiência experimentam fundamentalmente uma educação que valoriza pouco a diversidade, a cooperação e o respeito por aqueles que são diferentes. Em contraste, o ensino inclusivo proporciona às pessoas com deficiência a oportunidade de adquirir habilidades para o trabalho e para a vida em comunidade (...). (STAINBACK & STAINBACK, 1999, p. 25) A base da concepção de educação inclusiva reside na Declaração Mundial de Educação para Todos (Jomtien/1990) e Declaração de Salamanca (Espanha /1994) – Conferência Mundial sobre Necessidades Educacionais Especiais: Acesso e Qualidade assim como na LDB 9.394/1996. As citadas Declarações, dentre outras recomendações, estabelecem o acolhimento, pelas escolas, de todos os indivíduos, independente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, econômicas e lingüísticas. No entanto, os documentos recomendam a organização da escola para atender a singularidade das necessidades educacionais especiais. A Legislação Educacional Brasileira em consonância as declarações acima citada estabelece na Lei 9.394/96: 4 Art. 59. Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades especiais: I - currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específicos, para atender às suas necessidades; II - terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível exigido para a conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências, e aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os superdotados; III - professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns; IV - educação especial para o trabalho, visando a sua efetiva integração na vida em sociedade, inclusive condições adequadas para os que não revelarem capacidade de inserção no trabalho competitivo, mediante articulação com os órgãos oficiais afins, bem como para aqueles que apresentam uma habilidade superior nas áreas artística, intelectual ou psicomotora; V - acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares disponíveis para o respectivo nível do ensino regular. (LDB 9.394/1996) Oportuno também é destacar das Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica os seguintes aspectos: Sob esse enfoque, ao contrário do modelo clínico, tradicional e classificatório, a ênfase deverá recair no desenvolvimento e na aprendizagem do aluno, bem como na melhoria da instituição escolar (...). A legislação federal brasileira estabelece ainda que dos recursos do FUNDEF, 60% (no mínimo) devem ser utilizados na remuneração dos profissionais do Magistério em efetivo exercício no ensino fundamental público, e o restante (máximo de 40%) em outras ações de manutenção e desenvolvimento desse nível de ensino. No âmbito de cada Estado haverá um valor por aluno/ano, calculado com base na razão entre a receita do FUNDEF e o número de alunos do ensino fundamental (regular e especial) das redes públicas estadual e municipais, de acordo com o Censo Escolar do ano anterior. Esse valor per capita é calculado de forma que o valor relativo aos alunos da 5ª a 8ª série e da Educação Especial seja 5% superior ao valor referente aos alunos da 1ª a 4ª série. METODOLOGIA O estudo pautou-se nos pressupostos da pesquisa descritiva. Os matérias e métodos utilizados foram: análise documental, no primeiro momento, do Censo Escolar 2007 da Secretaria Estadual de Educação, da Política de Educação Especial Estadual do ano 2006 e da Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação 5 Inclusiva do ano 2008. No segundo momento da coleta foram realizadas entrevistas, do tipo semi-estruturada, com sete gestores dos serviços de diagnóstico, de apoios educacionais especiais em salas de recurso e especializados, e assessoramento pedagógico na área de formação docente. Além de dez professores de escolas especiais e sessenta e oito professores de escolas inclusivas. O objetivo das entrevistas foi complementar as informações do Censo 2007 acerca do número de alunos com necessidades educacionais especiais atendidos e os tipos de serviços de educação especial e inclusiva oferecidos, da formação acadêmica e continuada dos docentes e da política educacional local de educação especial e inclusiva. As informações foram coletadas sob forma de relatos orais individuais, gravados, conduzidos pela formulação de questões e analisados a partir da elaboração de categorias temáticas abrangendo toda a complexidade e diversidade dos discursos dos informantes. RESULTADOS E DISCUSSÃO De acordo com Censo Escolar da Secretaria Estadual de Educação, ano 2007, e os resultados das entrevistas a condução da Educação Especial na Secretaria Estadual da Educação em Sergipe é responsabilidade da Diretoria da Educação Especial (DIEESP). Existe ainda um Centro de Referência em Educação Especial de Sergipe (CREESE) e dez setores de Educação Especial. Dentre os setores um localiza-se na Diretoria de Educação de Aracaju (DEA) e nove localiza-se nas Diretorias Regionais de Educação (DREs) em todo o Estado de Sergipe. Todo esse aparato organizacional e burocrático tem como função dar suporte técnico-pedagógico às instituições educacionais sob responsabilidade do Estado, as quais trabalham com os alunos com necessidades educacionais especiais. O atendimento a esses alunos, na Rede Estadual, é feito nas Escolas Especiais e Escolas Inclusivas (classes especiais e classes regulares). De acordo com Censo Escolar da Secretaria Estadual de Educação, ano 2007, há uma matrícula de 2.274 alunos com necessidades educacionais especiais na rede estadual de ensino. Dos quais 64%, representados por um total de 1.456 alunos, estão matriculados em escolas especiais e 36%, representados por 818 alunos, estão inseridos em classes especiais e classes regulares. O perfil do alunado é realizado pelo Centro de Referência em Educação Especial cujo demonstrativo evidencia que 93,1% apresentam diagnóstico de pessoas com deficiências (41,5 deficiência mental, 6,2% deficiência física, 17,8% deficiência visual e 27,6% deficiência auditiva), 5,8% transtornos globais de desenvolvimento e 1,1% altas habilidades. De acordo com a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, documento publicado em janeiro de 2008 pela Secretaria Nacional de Educação Especial, pessoa com necessidades educacionais especiais são aquelas que apresentam deficiência, transtorno global do desenvolvimento e altas habilidades. Segundo o referido documento pessoa com deficiência é “àquele que têm impedimentos de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, que em interação com diversas barreiras podem ter restringida sua participação plena e efetiva na escola e na sociedade” (MEC, 2008, p.28). Define pessoa com transtorno global do desenvolvimento como “àquela que apresentam alterações qualitativas das interações sociais recíprocas e na comunicação, um repertório de interesses e atividades restrito, estereotipados e repetitivo” (MEC, 2008, p.25) e pessoa com altas habilidades como “aquela que demonstra potencial 6 elevado em qualquer uma das seguintes áreas, isoladas ou combinadas: intelectual, acadêmica, liderança, psicomotora e artística (MEC, 2008, p.28). A Diretoria de Educação Especial (DIEESP) disponibiliza à comunidade os seguintes serviços: Centro de Atendimento ao Surdo (CAS); Núcleo de Apoio às Altas Habilidades/Superdotação (NAAH/S); Atendimento ao aluno com Surdocegueira, Atendimento ao aluno com Deficiência Visual, Atendimento ao aluno com Deficiência Mental/Baixa Cognição. Em entrevista realizada com os coordenadores dos serviços acima citados, no período de janeiro a março 2008, pode-se constatar que as dificuldades de operacionalização destes serviços são inúmeras. De acordo com uma das depoentes “É preciso que exista uma política de educação especial para atender necessidades educacionais reais dos alunos. A inclusão se dará quando os apoios educacionais se efetivarem” (Diário de investigação, janeiro, 2008). Além desses serviços a DIEESP presta assessoria na área de formação continuada aos docentes da educação especial e inclusiva objetivando viabilizando o processo de inclusão da pessoa com necessidades educacionais especiais. Segundo Censo Escolar da Secretaria Estadual de Educação, ano 2007, existem 152 professores atuando em escolas especiais e inclusivas dos quais 72% apresentam formação superior. No que se refere à formação na área da educação especial e inclusiva constatou-se que 82% apresentam formação especializada e 18% não apresentam formação especializada na educação especial e inclusiva. No que se refere à infra-estrutura, das duas escolas especiais e quarenta e seis escolas inclusivas, pode-se constatar, a partir de entrevistas com gestores das Diretórias de Educação e professores de classes especiais e inclusivas, que 100% das escolas especiais apresentam sanitários, dependências e vias adequadas. Das escolas inclusivas 18% têm sanitários adaptado e 7% dependências e vias adequadas aos alunos com deficiência. CONCLUSÃO Os resultados da pesquisa evidenciaram algumas contradições entre os documentos oficiais, da Política Estadual e Nacional de Educação Especial, e as ações desenvolvidas pelos serviços educacionais oferecidos na rede estadual de ensino. A primeira delas relaciona-se ao predomínio da matrícula em instituições de educação especial. De acordo com o paradigma educacional defendido pela Política Nacional (2008) a educação especial deverá ser um atendimento que perpasse todos os níveis, etapas e modalidades de ensino. A segunda refere-se ao serviço de diagnóstico, realizado pelo Centro de Referência em Educação Especial (CREESE), com ações centralizadoras limitando sua função durante o acompanhamento das alterações da situação de exclusão da pessoa com necessidades educacionais especiais. A terceira relaciona-se a urgência das adequações arquitetônicas em prédios escolares inclusivos que são garantias do exercício do direito de acessibilidade de todo cidadão. A quarta relaciona-se a uma contradição com a realidade nacional os índices do nível de formação dos professores permitem inferir que o coletivo esta preparado para desenvolver práticas pedagógicas menos segregativas e efetivar a longo prazo, junto aos gestores dos serviços da educação especial, uma Política de Educação Inclusiva. 7 REFERÈNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Especial. Ministério da Educação. Brasília, 2008. BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais. Ministério da Educação e do Desporto. Brasília, 1998. BRASIL. O acesso de alunos com deficiência às escolas e classes comuns da rede regular. 2a Edição. Ministério Público Federal. Brasília, 2004. GOVERNO DE SERGIPE. Estudo realizado pela equipe do Centro de Referência de Educação Espacial sobre as características da clientela das classes especiais do Estado de Sergipe. Aracaju, 1998. Secretaria de Estado da Educação-SEED. GOVERNO DE SERGIPE. Política Nacional de Educação Especial 2006. Secretaria de Estado da Educação-SEED. MANTOAN, M. T. E. A integração da pessoa com deficiência. São Paulo: Memmon, 1997. _________________. Inclusão: revista da educação especial. A Hora da Virada.. MEC. Brasília: Secretaria da Educação Especial, outubro 2005. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO – MEC. Secretaria de Educação Especial. Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade. Brasília; 2004. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL: Fundação Procurador Pedro Jorge Melo e Silva (organizadores). O Acesso de Alunos com Deficiência às Escolas e Classes Comuns da Rede Regular. 2ª ed. revisada e atualizada – Brasília: Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, 2004. SASSAKI, Romeu Kazumi. Inclusão: revista da educação especial. Inclusão: o paradigma do século 21. MEC. Brasília: Secretaria da Educação Especial, outubro 2005. STAINBACK, Susan & STAINBACK, William. Inclusão: um guia para educadores. Trad. Magda França Lopes. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999.