JORNAL MURAL da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação – EDIÇÃO ESPECIAL PELO DIA NACIONAL DA CONSCIÊNCIA NEGRA – Novembro / 2007
ONDE TEM BRASIL, TEM ESSA COR
Q
uando se fala em África, segundo maior continente do planeta,
o que vem ao pensamento é a
escravidão. E a maior parte dos livros didáticos reforça esse acontecimento que gerou,
somente no Brasil, um passivo social imenso por muitas gerações. No entanto, a abordagem da herança legada pelos africanos,
que ajudou a construir a identidade cultural
dos brasileiros, praticamente inexiste. Para
mudar essa realidade, entrou em vigor em
9 de janeiro de 2003, a Lei nº 10.639, que
inclui no currículo oficial das escolas públicas e privadas o ensino da História e Cultura
Afro-Brasileira.
O Subsecretário de Políticas de Ações Afirmativas da Secretaria Especial de Política
para Igualdade Racial da Presidência da
República (Seppir), Alexandro Reis, diz
que é importante ter uma lei de promoção
da igualdade no país. “Trata-se de um marco
legal criado para aprimorar a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - a LDB”
comemora.
Segundo o Subsecretário, “é importante levar para a sala de aula a história dos quilombos, as civilizações dos Bantos e Yorubás,
as histórias de Luiz Gama, Luiza Marinho,
heróis que ajudaram a construir esse país”.
Ele lembra também Aleijadinho com sua
arte barroca e Machado de Assis, destaque
na literatura. Cita ainda a capoeira, como
um componente filosófico e histórico, de
importante resgate da cidadania e de prática
esportiva.
É obrigação dos estados e municípios a aplicabilidade da lei, mas poucos municípios já
se engajaram nessa tarefa. A Confederação
dos Trabalhadores em Educação (CNTE)
produziu um cartaz no qual resgata a importância da raça negra na construção da
identidade brasileira. A peça será utilizada
pelas entidades filiadas à Confederação para
divulgar a lei nas escolas de todo o país.
De acordo com a Coordenadora Geral de
Diversidade e Inclusão Educacional do
Ministério da Educação, Leonor Franco de
Araújo, o objetivo é levar ao sistema escolar
informações, vivências, conteúdos e mentalidade que privilegie a diversidade, aumente
a auto-estima dos afro-brasileiros e discuta o
racismo em bases conceituais e com a seriedade e qualificação que o tema requer.
Leonor Araújo acrescenta que a lei incide em
um dos meios onde todos os dias as questões
raciais emergem, que é a escola. “Integrar
na escola os conteúdos e saberes da História e Cultura Africana significa dotar o povo
brasileiro de maior conhecimento sobre sua
gente e sua realidade”, esclarece.
O cumprimento da Lei nº 10.639 na rede
municipal de ensino de Salvador está resgatando e dando a devida importância às
raízes culturais da raça negra. A Escola
Municipal do Parque São Cristóvão Pro-
fessor João Fernandes da Cunha é referência em Salvador: desde o Pré-2, as crianças
já aprendem a valorizar a cultura negra.
Africanas - Biografias”; “África lá e Cá” e
“Resgatando Nossos Legados nos Municípios Baianos”.
De acordo com a diretora Jacilene Santos da Silva, o projeto de aprendizagem
do colégio visa valorizar a identidade e a
auto-estima dos alunos, na maioria negros,
que segundo ela, “são fruto de uma sociedade que carrega as marcas de um passado
cheio de opressão e discriminação racial”
lamenta.
Segundo Jacilene, cada indivíduo, seja
branco, negro ou índio deve ter orgulho de
suas origens. Diz ainda que muitas meninas têm vergonha de sua negritude, de seus
cabelos crespos. “É nosso papel mostrar
que esses cabelos crespos são característicos da raça negra e que não devemos ter
vergonha dela”, alerta a diretora.
Entre os projetos que o colégio desenvolve
sobre as questões da África estão: “Contos africanos”; “O legado africano no uso
terapêutico de plantas”; “Personalidades
A Escola Municipal Parque São Cristóvão
foi a primeira classificada para representar a Bahia no Prêmio Nacional de Referência em Gestão Escolar, em novembro,
Sistema
de
Cotas
não
é
eterno:
serÁ aprimorado em 2014
E
studo do Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (IPEA)
mostra que a escola brasileira,
por ter um padrão de identidade branca,
faz com que o negro já entre defasado no
sistema de cotas. E seria necessário que os
brancos deixassem de estudar durante 16
anos para que os negros pudessem alcançar o mesmo patamar da educação formal.
O sistema de cotas para negros é uma das
faces da política de ações afirmativas. Ele
foi criado em 2004 para facilitar o ingresso
do negro no ensino superior e vigorar pelo
período de dez anos. Isto quer dizer que
em 2014 ele será revisado. E a Secretaria
Especial de Políticas para Igualdade Racial
(SEPPIR) trabalha para que num curto espaço de tempo ele seja abandonado. A interção da SEPPIR é monitorar a eficácia do
projeto para daqui a 20 anos ser extinto.
Segundo René, “se for considerado que
95% dos negros são pobres e que muitas
vezes são obrigados a abandonar a escola
no quarto ano para trabalhar com o pai ou
com a mãe ou porque são arrimos de família, a cota é o menos importante. Se não for
desenvolvido um conjunto de outras ações
afirmativas além das cotas, essa população sequer chegará à universidade. Sequer
concorrerá às cotas”, alerta.
A Universidade de Brasília (UnB) foi a
primeira federal a instituir o sistema de
cotas em seu vestibular que reserva, pelo
menos, 20% das vagas para candidatos negros. Porém, a partir de 2008, a avaliação
vai mudar na UnB. Ao invés de fotografias,
os vestibulandos terão que passar por uma
entrevista. A medida é para aperfeiçoar o
sistema após a polêmica dos irmãos
gêmeos Alan e Alex Teixeira. Um
foi classificado como sendo da
raça negra e o outro ficou de
fora do sistema de cotas. Outra mudança: os estudantes
que quiserem concorrer
como cotistas só poderão
disputar as vagas reservadas a eles.
Foto: Divulgação
O historiador e antropólogo René Marc
da Costa Silva é amplamente favorável
ao sistema de cotas: “muita gente critica
esse sistema, que é preciso ter
um sistema por mérito, no
qual todos concorram
em igualdade de condições, sem distinções. Mas, essas
pessoas não se dão
conta que durante
400 anos nós tivemos um sistema de cotas
para brancos no Brasil que foi a escravidão. Durante 400 anos todas as oportunidades, empregos, benefícios e serviços
sociais eram orientados para a população
branca”, destaca.
Consciência negra significa compreender que somos diferentes, diz René
Alunos aprendem a valorizar a cultura negra
em Brasília. O prêmio é um estímulo à
melhoria do desempenho escolar, avaliando o aprendizado dos alunos e reconhecendo exemplos de gestões eficazes,
entre eles, projetos relacionados à Lei nº
10.639/03.
A África ESTÁ NO NOSSO PORTUGUÊS
É impossível falar de cultura brasileira
sem destacar as matrizes africanas que
a compõem. O Brasil tem a maior população de origem africana do mundo.
De acordo com as pesquisas oficiais,
mais de 45% da população brasileira
são negros e pardos. E como negar a
marca dos africanos e de seus descendentes na nossa formação? No Brasil
o idioma oficial é o português, mas a
língua portuguesa daqui é indígena,
grega, árabe, japonesa, inglesa, francesa e sobretudo recheada de palavras
com origem africana.
Abadá: Túnica folgada. Pode ser também
camiseta de trios elétricos.
Angu: Massa de farinha de milho ou
mandioca.
Azoeira: Barulhada. Zoeira.
Axé: Saudação.
Babá: Pai-de-santo. Ama-seca.
Bagunça: Baderna.
Banguela: Desdentado.
Bantos: Povos trazidos do sul da África,
que espalharam sua cultura e idioma.
Borocoxô: Molenga.
Caçamba: Balde para tirar água de poço.
Caçula: O mais novo.
Cafuné: Coçar a cabeça de alguém.
Cochilar: Sono leve.
Erê: Divindade ligada à infância. Criança,
em yorubá.
Farofa: Mistura de farinha com água,
azeite ou gordura.
Fungar: Assoar o nariz.
Garapa: Caldo de cana.
Ginga: Movimento corporal na capoeira,
na dança e no futebol.
Inhaca: Azar. Mau cheiro.
Inhame: Raiz alimentícia.
Yorubás ou Nagôs: Povos sudaneses da
África Ocidental.
Jagunço: Guerreiro. Capanga.
Jegue: Jumento.
Serigrafia Rubem Valentim / Disponível em: http://livrariamemorial.com.br
A
ntes, o 20 de novembro passava despercebido. Agora, do
primeiro dia de aula até o final do ano, todo dia é dia da Consciência
Negra nas escolas de Salvador. A cidade
é o primeiro município brasileiro no qual
toda a rede municipal de ensino cumpre
a Lei nº 10.639 nos currículos. A medida
teve ampla aceitação dos alunos, professores e da família. 82% da população de
Salvador são negros.
Foto: Arquivo da Escola Parque São Cristovão - Salvador (BA)
Todo dia é dia da Consciência Negra nas escolas de Salvador
Lambada: Chicotada.
Lengalenga: Conversa fiada.
Mafuá: Lugar desorganizado.
Miçanga: Contas de vidro.
Mochila: Bolsa carregada a tiracolo.
Nenê ou Neném: Criança de colo.
Odara: Bom. Bonito.
Orixás: Divindades às forças da
natureza.
Patota: Turma. Grupo.
Pirão: Papa grossa de farinha de
mandioca.
Quengo: Cabeça.
Quitute: Comida gostosa.
Ranzinza: Rabugento. Teimoso.
Samba: Dança de umbigada praticada em
algumas regiões da África.
Sunga: Calção.
Tanga: Roupa.
Tipóia: Rede usada como transporte.
Tecido para descansar o braço.
Urucubaca: Azar, má sorte.
Vatapá: Um tipo de pirão à base de
peixes e camarões.
Xingar: Ofender.
Xodó: Amor.
Zanga: Pirraça. Antipatia
Zonzo: Estonteado.
EXPEDIENTE • Jornal Mural da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação • Jornalista responsável: Leila Santos – Mtb 254 • Redação e edição: Frisson Comunicação • Tiragem: 60.000 exemplares • Data: 01/11/2007
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ONDE TEM BRASIL, TEM ESSA COR