RESUMÃO – Sociologia - 3º Ano – 1º Trimestre
Sociologia: Cidadania Moderna
Cidadania moderna
A história do desenvolvimento da cidadania moderna remonta ao Iluminismo e
está relacionada à conquista de quatro tipos de direitos: os direitos civis, no século
XVIII; os direitos políticos e sociais, no século XIX (cuja luta perdurou até o século
XX) e os direitos humanos, no século XX.
Os filósofos iluministas, sobretudo John Locke, Voltaire e Jean-Jacques
Rousseau, lançaram as bases para a percepção moderna da relação entre Estado e
indivíduos ao conceber o ser humano como um indivíduo dotado de razão e de direitos
intrínsecos à sua natureza (“direitos naturais”), como o direito à vida, à liberdade e à
propriedade. Dessa forma, abriu-se espaço para o nascimento do Estado de Direito.
A contribuição de cada um desses pensadores iluministas na constituição de
novas formas de pensar a relação entre indivíduos e Estado está pautada da seguinte
maneira:
a) John Locke (1632-1704): defendia que todos os homens são iguais, independentes
e governados pela razão. No estado natural, teriam como destino preservar a paz e a
humanidade, evitando ferir os direitos dos outros, inclusive o direito à propriedade,
considerado por Locke um dos direitos naturais do homem. Para evitar conflitos
decorrentes de interesses individuais, os homens teriam abandonado o estado natural
e criado um contrato social entre homens igualmente livres;
b) Voltaire (1694-1778): defendia a liberdade de expressão, de associação e de opção
religiosa e criticava o poder da Igreja Católica e sua interferência no sistema
político. Foi um crítico do Absolutismo e das instituições políticas da Monarquia e
defensor do livre comércio contra o controle do Estado na economia;
c) Jean-Jacques Rousseau (1712-1778): defendia a liberdade como o bem supremo,
entendida por ele como um direito e um dever do homem. Renunciar à liberdade
equivaleria a renunciar, portanto, à própria humanidade. Para que o homem possa
viver em sociedade sem renunciar à liberdade, ou seja, obedecendo apenas a si
mesmo e permanecendo livre, é estabelecido um contrato social em que a
autoridade é a expressão da vontade geral, expressão de corpo moral coletivo dos
cidadãos.
Desse modo, o homem adquire liberdade obedecendo às leis que prescreve para
si mesmo. Essas ideias foram muito importantes para o desenvolvimento do que hoje
entendemos por cidadania e que a base para a concepção de cidadania é a noção de
Direito. Mas que direitos são esses? Hoje falamos em direitos “civis”, “políticos”,
“sociais” e “humanos”, entretanto a definição clara de cada um deles e a quem seriam
aplicados ainda não foi definitivamente estabelecida e continua a ser fonte de intensos
debates. Qual a diferença entre esses quatro tipos de direitos?
As características de cada tipo de direito ajudará a diferenciá-los.
 Direitos civis: dizem respeito à liberdade dos indivíduos e se baseiam na
existência da justiça e das leis. Referem-se à garantia de ir e vir, de escolher o
trabalho, de se manifestar, de se organizar, de ter respeitada a inviolabilidade do
lar e da correspondência, de não ser preso e não sofrer punição a não ser pela
autoridade competente e de acordo com a legislação vigente.
 Direitos políticos: referem-se à participação do cidadão no governo da
sociedade e consistem no direito de fazer manifestações políticas, de se
organizar em partidos, sindicatos, movimentos sociais, associações e de votar e
ser votado.
 Direitos sociais: dizem respeito ao atendimento das necessidades básicas do ser
humano, como alimentação, habitação, saúde, educação, trabalho, salário justo,
aposentadoria etc.
 Direitos humanos: englobam todos os demais e expandem a dimensão dos
direitos para uma perspectiva mais ampla, pois tratam dos direitos fundamentais
do ser humano. Sem eles, o indivíduo não consegue existir ou não é capaz de se
desenvolver, de participar plenamente da vida. São eles: o direito à vida, à
liberdade, à igualdade de direitos e oportunidades e o direito de ser reconhecido
e tratado como ser humano, independentemente de nacionalidade, gênero, idade,
origem social, cor da pele, etnia, faculdades físicas ou mentais, antecedentes
criminais, doenças ou qualquer outra característica.
A história da luta pelos direitos civis pode ser identificada já no século XVII,
quando o parlamento inglês promulgou em 1689 o Bill of Rights (Carta de Direitos),
garantindo ao povo uma série de direitos que o protegia de atos arbitrários por parte da
Coroa. Esse movimento é um precursor dos eventos históricos que marcariam o fim do
Absolutismo e colocariam os cidadãos, agora não mais súditos do rei, na condição de
sujeitos políticos, ou seja, participantes efetivos do poder do Estado. Um exemplo disso
ocorreu na Revolução Americana e encontra-se explicitado na Declaração de
Independência dos Estados Unidos (1776).
Cidadania no Brasil
A construção da cidadania no Brasil não pode ser compreendida sem que se leve
em conta um processo histórico de lutas e conquistas que permearam as relações entre
colonos e colonizadores, brasileiros e portugueses, escravos e senhores. Para
compreendê-la, deve-se considerar também os grupos sociais que, posteriormente,
organizaram-se na luta pela ampliação dos direitos civis, políticos e sociais. Esse
processo culminou na formação da Assembleia Nacional Constituinte e na elaboração
da Constituição de 1988, denominada “Constituição Cidadã”.
Embora formalizadas, as prerrogativas do cidadão brasileiro ainda estão aquém
de ser efetivadas em sua plenitude para a totalidade da população e colocam em questão
a relação entre Estado e sociedade. Abre-se espaço, assim, para o debate sobre o papel
do cidadão como sujeito das decisões que governam a Nação e a importância da
participação política naquilo que denominamos efetivamente de “Estado democrático de
direito”.
Trazemos as reflexões acerca do processo de construção da cidadania para o
contexto nacional, analisando, de forma sucinta, a formação do Estado brasileiro e a
constituição dos direitos civis, sociais, políticos e humanos no país. Abordaremos uma
análise crítica dos fatores sociais, econômicos e políticos que contribuíram para a
especificidade do desenvolvimento da cidadania no Brasil. Não se pode desprezar os
impactos da escravidão, da Proclamação da República, do Estado Novo, da ditadura
militar e da Constituição de 1988 nesse processo. Essa retrospectiva busca identificar os
avanços, os retrocessos e os entraves na consolidação dos direitos dos brasileiros.
Cidadania “ativa” e cidadania “passiva”
É importante ressaltar o lugar do cidadão brasileiro no processo histórico de
constituição dos seus direitos civis, sociais e políticos. Para isso, destacaremos
particularmente a transição da Velha República para o Estado Novo, quando, na
primeira metade do século XX, observou-se um período de intensa agitação política
envolvendo vários grupos sociais (Greve Geral de 1917, Revolta Tenentista e fundação
do Partido Comunista do Brasil em 1922, Revolução de 1924, Coluna Prestes etc.) e,
depois, o estabelecimento do Estado Novo e o fortalecimento do governo central em
torno da figura de Getúlio Vargas.
A força motriz que impulsionou a queda da Primeira República e culminou na
Revolta Civil e Militar de 1930 pode ser explicada pelo anseio de grupos divergentes
(segmentos mais novos da hierarquia militar, chefes políticos de fora do eixo Minas
Gerais-São Paulo, pensadores liberais, intelectuais de classe média e a nova classe
trabalhadora emergente nos centros urbanos) de pôr fim à concentração do poder nas
mãos das oligarquias dos grandes proprietários rurais.
De 1930 a 1937, a participação de vários setores da população em movimentos
políticos de massa de âmbito nacional foi fundamental para assegurar a conquista de
direitos políticos e sociais inovadores. Porém, o golpe de 1937 inverteu a relação entre
Estado e sociedade, ao impor um regime ditatorial civil, garantido pelas Forças
Armadas.
Destacamos aqui não é tanto o encadeamento dos eventos históricos, mas a
relação entre Estado e cidadãos, principalmente, quais eram os atores políticos que
ocupavam ambas as esferas e questionando por que determinadas categorias sociais
ainda se encontravam excluídas da arena política enquanto sujeitos de sua própria
cidadania. Essa ambiguidade pode ser explicada pelo processo de cidadania “ativa” e
“passiva”.
O esquema a seguir ajudará na compreensão do tema:
Cidadania Ativa
Cidadania Passiva
ESTADO
ESTADO
SOCIEDADE
SOCIEDADE
É importante refletir sobre algumas questões: “Qual é a relação existente entre
Estado e sociedade quando os cidadãos governam por meio de representantes
democraticamente eleitos? E qual é essa relação quando o Estado governa por
tradição, conquista externa, golpe, força militar ou ditadura”?
Se analisarmos em qual situação os cidadãos têm mais condições de atuar na
modificação das leis, na luta por direitos e na consolidação do seu estatuto perante a
sociedade, concluiremos, prematuramente, que, no primeiro caso, os cidadãos terão
maior liberdade de modificar a atuação do Estado a seu favor. Porém, destacamos que a
disputa pela participação no poder nunca é imparcial e que os interesses políticos estão
sempre em jogo, ou seja, dependendo de quem está ocupando os espaços de poder e de
quem tem mais capacidade de mobilização, angariar apoio e influenciar outros grupos
sociais, os resultados dessa relação podem favorecer alguns grupos em detrimento de
outros.
Isso pode ser comprovado pela comparação dos principais eventos históricos do
período na política nacional. Existe uma dinâmica da relação entre Estado e sociedade e
as consequências para as categorias sociais excluídas dessa relação no processo de
consolidação da cidadania no Brasil.
Observe que a maior parte desses movimentos teve início nas capitais dos
Estados, e só então eles se espalharam para o interior do país, como foi o caso da
Coluna Prestes, em 1925. Nesse sentido, a maior parte da população, que na época ainda
residia e trabalhava predominantemente no meio rural, permaneceu à margem dos
acontecimentos do período, podendo, quando muito, apoiar, opor-se ou manter-se
indiferente a eles.
Além disso, é importante lembrar que boa parte desse contingente estava
excluída das listas eleitorais, por ser analfabeta. Esse fato é claramente observável ao
analisarmos o desenvolvimento dos direitos sociais entre 1930 e 1945.
Embora a legislação sindical, trabalhista e previdenciária que emergiu durante o
Estado Novo tenha favorecido os trabalhadores, “os direitos foram assegurados em
função da categoria profissional a que pertencia o indivíduo, ou seja, somente aqueles
que integravam o universo das profissões reconhecidas ingressavam no sistema.
Estavam excluídos, portanto, trabalhadores rurais, domésticos, autônomos,
desempregados, subempregados, além de todos aqueles que exerciam profissões não
regulamentadas”. O período entre o pré-Estado Novo e as ações do governo durante o
regime constitucionalista (1930 a 1934) e durante o Estado Novo caracteriza bem essa
questão.
O principal ponto a ser posto em discussão é a participação política dos
diferentes atores sociais na relação entre Estado e sociedade e sua contribuição para o
desenvolvimento de uma cidadania ativa. Questiona-se a validade dos trabalhadores
terem adquirido direitos de cidadania por meio de leis sociais decretadas por um Estado
autoritário, e não por meio de sua ação sindical e política independente. O que está em
questão é o tipo de cidadania que resulta dessa relação com o Estado. Por isso,
dizemos: “A cidadania que daí resultava era passiva e receptora antes que ativa e
reivindicadora”.
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