Desembargador Jeová Sardinha de Moraes 6 ª Câmara Cível AC 66617-73 DUPLA APELAÇÃO CÍVEL Nº 66617-73.2009.8.09.0074 (200990666174) COMARCA DE IPAMERI 1º APELANTE : MUNICÍPIO DE IPAMERI 2º APELANTE : JAIRO ANTONIO CARNEIRO 1º APELADO : JAIRO ANTONIO CARNEIRO 2ª APELADO : MUNICÍPIO DE IPAMERI RELATOR : DESEMBARGADOR JEOVÁ SARDINHA DE MORAES RELATÓRIO O MUNICÍPIO DE IPAMERI e JAIRO ANTONIO CARNEIRO, todos devidamente qualificados e representados nos autos, inconformados com a sentença proferida pelo Juiz de Direito da Vara de Fazendas Públicas e 2ª Cível, da comarca de Ipameri-GO, Dr. Luiz Antônio Afonso Júnior, nos autos de Ação Civil Pública, interpuseram os presentes recursos de APELAÇÃO CÍVEL no intento de verem reformada a referida decisão. Segundo consta, o Município de Ipameri ajuizou a presente ação alegando que o requerido deixou de apresentar os documentos constantes no artigo 77 da Lei Orgânica do Município por ocasião da transmissão do cargo, o que teria configurado ato de improbidade administrativa, nos termos da Lei nº 8.429/92. 1 Desembargador Jeová Sardinha de Moraes 6 ª Câmara Cível AC 66617-73 O Juiz de Direito, por meio da sentença de fls. 113/117, julgou improcedente o pedido inicial. Por não ter vislumbrado a ocorrência de litigância de má-fé, deixou de condenar o autor no pagamento de custas e honorários advocatícios. Inconformados com a sentença, ambos os litigantes interpuseram recursos de Apelação Cível. O primeiro Apelo foi interposto pelo autor às fls. 130/136. Em síntese, sustentou o apelante que o fato de o requerido não ter apresentado todos os documentos exigidos pela lei de regência violou o princípio da legalidade, configurando o ilícito de improbidade administrativa previsto no artigo 11, inciso I, da Lei nº 8.429/92 e ensejando as penalidades previstas no artigo 37, § 4º, da Constituição Federal. Ao final, requereu o conhecimento e provimento do Apelo a fim de obter a integral reforma da sentença. Ausente o preparo, ex vi legis. Devidamente intimado, o primeiro apelado apresentou as contrarrazões de fls. 152/194, por meio das quais, em extenso arrazoado, esclareceu que todos os documentos exigidos pela legislação teriam sido entregues por meio de sistema digital online e que estaria sofrendo perseguição política por parte da atual Administração Municipal. Asseverou, ainda, que, na hipótese dos autos, não restou configurada a prática de 2 Desembargador Jeová Sardinha de Moraes 6 ª Câmara Cível AC 66617-73 qualquer ato de improbidade. Também inconformado, o requerido interpôs o segundo recurso de Apelação Cível, fls. 195/209. Em síntese, pretende o apelante que sejam fixados a seu favor os honorários de sucumbência, uma vez que os casos de isenção abrangeriam apenas as hipóteses em que o Ministério Público ou associação figurem como autores. Além disso, sustentou que, na hipótese dos autos, teria ocorrido a prática de litigância de má-fé, a justificar a necessidade da condenação do autor no pagamento da verba honorária. Ao final, requereu o conhecimento e provimento do Apelo a fim de obter a parcial reforma da sentença. Preparo à fl. 208. O segundo apelado apresentou as contrarrazões de fls. 215/219, por meio das quais refutou a tese defendida pelo autor e pugnou pelo improvimento do Apelo. A douta Procuradoria Geral de Justiça, por meio do parecer de fls. 223/226, da lavra do Dr. Vagner Jerson Garcia, pugnou pelo conhecimento e improvimento de ambos os recursos. É o relatório, que submeto à ilustre revisão. Goiânia, 07 de fevereiro de 2013. 3 Desembargador Jeová Sardinha de Moraes 6 ª Câmara Cível AC 66617-73 Desembargador JEOVÁ SARDINHA DE MORAES Relator (354/k) 4 Desembargador Jeová Sardinha de Moraes 6 ª Câmara Cível AC 66617-73 DUPLA APELAÇÃO CÍVEL Nº 66617-73.2009.8.09.0074 (200990666174) COMARCA DE IPAMERI 1º APELANTE : MUNICÍPIO DE IPAMERI 2º APELANTE : JAIRO ANTONIO CARNEIRO 1º APELADO : JAIRO ANTONIO CARNEIRO 2ª APELADO : MUNICÍPIO DE IPAMERI RELATOR : DESEMBARGADOR JEOVÁ SARDINHA DE MORAES VOTO Trata-se, conforme relatado, de dois recursos de apelação cível interpostos contra a sentença de fls. 113/117, que julgou improcedente o pedido formulado na presente Ação Civil Pública. Primeiramente, passo à apreciação das teses deduzidas pelo Município de Ipameri no bojo do primeiro Apelo, fls. 129/136. De início, em que pese o referido recurso ter sido interposto antes do julgamento dos embargos de declaração opostos pela parte ex adversa, verifico que o Apelo somente chegou a ser recebido por ocasião do julgamento dos declaratórios, no bojo da mesma decisão (fls. 148/150), de modo que a reiteração da insurgência postou-se desnecessária. 1 Desembargador Jeová Sardinha de Moraes 6 ª Câmara Cível AC 66617-73 Insiste o primeiro apelante em aduzir que o fato de o requerido não ter apresentado todos os documentos exigidos pela legislação por ocasião da transmissão do cargo de prefeito configurou ato de improbidade administrativa, razão pela qual pugna pela aplicação das penalidades previstas na Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92). Sobre o tema, veja-se o que decidiu o julgador singular: “No caso vislumbrar presente, qualquer não ato é possível praticado pelo demandado que demonstre tenha agido ele com dolo, assim como resultado prejuízo ao erário. (…) Ora, o simples fato do demandado não ter apresentado toda a documentação exigida pela lei municipal não caracteriza improbidade administrativa. Por outro lado, é inconteste que atualmente todos os dados referentes a contabilidade administrativa das Prefeituras estão inseridos em programas computadorizados, o que sem dúvida substitui o papel impresso.” (fl. 116) Com efeito, considero irretocável o posicionamento adotado pelo magistrado condutor do feito, pois, hodiernamente, cristalizou-se no âmbito do Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que, para a configuração de ato de improbidade administrativa, é imprescindível a 2 Desembargador Jeová Sardinha de Moraes 6 ª Câmara Cível AC 66617-73 demonstração do elemento subjetivo, qual seja, o dolo. Nesse sentido: EMENTA: “PROCESSUAL ADMINISTRATIVO. AGRAVO CIVIL AGRAVO REGIMENTAL REGIMENTAL NO DO DOLO, NO AGRAVO INSTRUMENTO. IMPROBIDADE EXIGÊNCIA E DE ADMINISTRATIVA. NAS HIPÓTESES DOS ARTIGOS 9º E 11 DA LEI 8.429/92 E CULPA, PELO MENOS, NAS HIPÓTESES DO ART. 10. (…) ART. 11 DA LIA. NÃO CARACTERIZAÇÃO DE DOLO, AINDA CONTRA QUE NORMAS GENÉRICO, LEGAIS. DE (…) ATUAÇÃO 1. O STJ ostenta entendimento uníssono segundo o qual, para que tipificação incurso da nas seja reconhecida conduta do previsões réu da a como Lei de Improbidade Administrativa, é necessária a demonstração do elemento subjetivo, consubstanciado pelo dolo para os tipos previstos nos menos, pela artigo 10. 20.747/SP, artigos culpa, 9º nas Precedentes: Relator e e, ao hipóteses do AgRg 11 no Min. AREsp Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 23/11/11; REsp 1.130.198/RR, Relator Min. Luiz Fux, Primeira Turma, 479.812/SP, Zavascki, DJe Relator Primeira 15/12/10; Min. Seção, Teori DJe EREsp Albino 27/9/10; REsp 1.149.427/SC, Relator Min. Luiz Fux, 3 Desembargador Jeová Sardinha de Moraes 6 ª Câmara Cível Primeira Turma, DJe 9/9/10; AC 66617-73 e EREsp 875.163/RS, Relator Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, DJe 30/6/10. 2. Omissis. 3. Infere-se que não se caracterizou o dolo, ainda que genérico, de se conduzir deliberadamente contra as normas legais, o que descaracteriza o ato de improbidade. 4. Agravo regimental não provido.” (STJ, Primeira Turma, AgRg no AgRg no Ministro Ag nº Benedito 1376280/SP, Gonçalves, Relator Data da Publicação/ Fonte: DJe 23/11/2012) Assim, conclui-se que o simples fato de o administrador ter deixado de apresentar alguns documentos exigidos pela legislação não configura, por si só, ato de improbidade administrativa. De mais a mais, considero relevante as alegações feitas pelo requerido, no sentido de que teria entregado digitalmente os documentos solicitados, notadamente porque observo que o Município de Ipameri insiste que a entrega dos referidos documentos deveria ocorrer por escrito, mas em nenhum momento contesta a possibilidade de ter acesso às informações solicitadas por meio do sistema digital de dados da Prefeitura. De tal arte, constatada a ausência de elemento subjetivo na conduta do requerido bem como demonstrada a inexistência de prejuízo ao erário, conclui-se que a irresignação do primeiro apelante não merece acolhida. 4 Desembargador Jeová Sardinha de Moraes 6 ª Câmara Cível AC 66617-73 Já no segundo recurso de Apelação Cível interposto pelo requerido, constata-se que este pretende seja reconhecida a litigância de má-fé bem como arbitrados os honorários sucumbenciais em seu favor. Ocorre que, assim como também entendeu o julgador singular, verifico que, na hipótese dos autos, não se configurou a prática de nenhuma das condutas elencadas no artigo 17 do Código de Processo Civil, aptas a ensejar o reconhecimento de litigância de má-fé. O Município intentou a demanda por interpretar que a não apresentação de alguns documentos por parte do ex-administrador configuraria ato de improbidade administrativa. Ora, o simples fato de a ação ter sido julgada improcedente não conduz à afirmação de que o autor teria agido de má-fé, mormente porque o ente público possui o dever de agir para tutelar e fiscalizar o interesse público. Sobre o tema, trago à colação o seguinte julgado: EMENTA: “APELAÇÃO PUBLICA. ATO ADMINISTRATIVA. CONTAS. CÍVEL. IMPROBIDADE DEVER DE DE OBRIGAÇÃO. LITIGÂNCIA COMPROVADA. I e II- CIVIL DE (…) COMPROVAÇÃO AÇÃO PRESTAR CUMPRIMENTO DE MÁ-FÉ. Omissis. DA NÃO III- A condenação por litigância de má-fé só é cabível caso demonstrado cabalmente dolo processual em detrimento da parte 5 Desembargador Jeová Sardinha de Moraes 6 ª Câmara Cível AC 66617-73 contrária. Agravo retido não conhecido. Apelação conhecida e improvida.” (TJGO, 1ª Câmara Cível, AC nº 135598-9/188, Rel. Des. Luiz Eduardo de Sousa, Fonte: DJ nº 368 de 03/07/2009) Nessa linha de raciocínio, constata-se que, na hipótese dos autos, não há que se falar em litigância de má-fé. Apesar disso, no que se refere aos honorários de sucumbência, entendo que merece acolhida a irresignação do apelante. Vale ressaltar que, de fato, a Fazenda Pública não está sujeita ao pagamento das custas e despesas processuais, nos termos do art. 39, caput, da Lei federal nº 6.830/80. É certo, contudo, que a referida isenção não abrange os honorários devidos ao advogado, mormente no caso dos autos, em que houve a efetiva apreciação do mérito da demanda. Por oportuno, transcrevo o seguinte julgado: EMENTA: “Apelação Cível. Ação Ordinária (…) I a III- Advocatícios Omissis. contra IV- Fazenda Honorários Pública. Consoante dispõe o artigo 20, § 4º, do Código de Processo Civil, nas causas de pequeno valor, nas de valor inestimável, naquelas em que não houver condenação ou for vencida a Fazenda Pública, e nas 6 Desembargador Jeová Sardinha de Moraes 6 ª Câmara Cível execuções, embargadas honorários serão ou AC 66617-73 não, fixados os consoante apreciação equitativa do juiz, atendidas as normas das alíneas “a”, “b” e “c” do parágrafo anterior. V- Isenção das custas processuais pelo Estado de Goiás. Nos termos do artigo 39, da Lei Federal n. 6.830/1980, a Fazenda Pública municipal é isenta do processuais, pagamento das cabendo-lhe, custas apenas, se vencida, reembolsar a parte vencedora dos valores que antecipou. Apelação Cível conhecida e parcialmente provida.” (TJGO, 2ª Câmara Cível, AC nº 418325-90, Rel. Des. Carlos Alberto França, Fonte: DJ nº 1221 de 11/01/2013) Registre-se, ainda, que a ressalva prevista no artigo 18 da Lei nº 7.347/85, no sentido de ser incabível condenação em honorários de advogado, custas e despesas processuais no bojo de ação civil pública, abrange apenas as hipóteses em que a demanda for promovida por “associação”, não se estendendo aos casos em que a ação foi proposta pelo Município (pessoa jurídica de direito público). Por essa razão, nas causas em que for vencida a Fazenda Pública, os honorários serão fixados consoante apreciação equitativa do juiz, consoante dispõe o artigo 20, § 4º, do Código de Processo Civil. Ante o exposto, conheço de ambos os recursos de 7 Desembargador Jeová Sardinha de Moraes 6 ª Câmara Cível AC 66617-73 apelação cível, negando provimento ao primeiro e dando parcial provimento ao segundo, a fim de fixar em favor do requerido os honorários advocatícios de sucumbência no importe de R$ 2.000,00 (dois mil reais). Permanecem inalterados os demais comando da sentença recorrida. É o voto. Goiânia, 09 de abril de 2013. Desembargador JEOVÁ SARDINHA DE MORAES Relator (354/k) 8 Desembargador Jeová Sardinha de Moraes 6 ª Câmara Cível AC 66617-73 DUPLA APELAÇÃO CÍVEL Nº 66617-73.2009.8.09.0074 (200990666174) COMARCA DE IPAMERI 1º APELANTE : MUNICÍPIO DE IPAMERI 2º APELANTE : JAIRO ANTONIO CARNEIRO 1º APELADO : JAIRO ANTONIO CARNEIRO 2ª APELADO : MUNICÍPIO DE IPAMERI RELATOR : DESEMBARGADOR JEOVÁ SARDINHA DE MORAES EMENTA: DUPLA APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ATO DE IMPROBIDADE ADMINIS- TRATIVA. ELEMENTO SUBJETIVO. AUSÊNCIA DE DOLO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. NÃO CONFIGURAÇÃO. VENCIDA A FAZENDA PÚBLICA. CUSTAS PROCESSUAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1- Para a configuração de ato de improbidade administrativa, é imprescindível a demonstração do elemento subjetivo, qual seja, o dolo. 2- Na hipótese dos autos, constatou-se a ausência de elemento subjetivo na conduta do requerido bem como a inexistência de prejuízo ao erário, de modo que reputase correta a sentença que julgou improcedente o pedido. 3- A condenação por litigância de má-fé somente será cabível quando restar comprovada a prática de quaisquer das condutas previstas no artigo 17 do Código de Processo Civil. 4- O Município não está sujeito ao pagamento das custas e despesas processuais, nos termos do art. 39, caput, da Lei nº 1 Desembargador Jeová Sardinha de Moraes 6 ª Câmara Cível AC 66617-73 6.830/80. 5- Nas causas em que for vencida a Fazenda Pública, os honorários serão fixados consoante apreciação equitativa do juiz, consoante dispõe o artigo 20, § 4º, do Código de Processo Civil. APELOS CONHECIDOS. IMPROVIDO O PRIMEIRO E PARCIALMENTE PROVIDO O SEGUNDO. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL Nº 66617-73.2009.8.09.0074 (200990666174), acordam os componentes da Segunda Turma Julgadora da Sexta Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, à unanimidade de votos, em conhecer as apelações cíveis e negar provimento à primeira e dar parcial provimento à segunda, nos termos do voto do relator. Votaram, com o relator o Desembargador Fausto Moreira Diniz e o Desembargador Norival de Castro Santomé. Presidiu a sessão o Desembargador Fausto Moreira Diniz. Fez-se presente, como representante da Procuradoria Geral de Justiça, o Dr. Rodolfo Pereira Lima Júnior. Goiânia, 09 de abril de 2013. Desembargador JEOVÁ SARDINHA DE MORAES Relator 2