PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE GOIÁS
Gabinete do Desembargador Alvaro Alvo
Xª Câmara Cível
APELAÇÃO CÍVEL Nº 555.555.5555
COMARCA DE GOIANÉSIA
APELANTE BELGO BELGA
APELADO ALINE LENA
RELATOR Desembargador ALVARO ALVO
VOTO
Presentes os pressupostos de admissibilidade do
recurso, dele conheço.
Insurge-se o apelante em face da sentença que julgou
procedente o pedido, para decretar a separação judicial dos
litigantes e partilhar os bens na proporção de 50% para cada
cônjuge, sem contudo declarar o culpado pelo fim do
relacionamento conjugal.
Pois bem. Consoante a moderna tendência do Direito de
Família, não há que se debater acerca da aferição de culpa na
separação judicial com o advento do art. 226, § 6º da CF/88, que
prevê a dissolução do casamento através do divórcio, após prévia
separação judicial por mais de um ano e separação de fato por mais
de dois anos, sem condicionar a comprovação de culpa por
qualquer dos cônjuges. Logo, o disposto no art. 5º e seus
parágrafos, da Lei nº 6.515/77, no sentido de atribuir culpa ao
cônjuge que ensejou a separação, objetivando privá-lo de direitos
como receber alimentos ou pagá-los, perder a guarda dos filhos ou
o uso do nome do cônjuge, deve ser interpretado conforme a
Constituição Federal, com o fito de resguardar o interesse dos filhos
e dos próprios cônjuges.
Neste sentido, caminha a jurisprudência pela decretação
da separação judicial sem declaração de culpa, mas tão somente
em virtude da constatação da falência da sociedade conjugal, isto
porque não se mostra razoável que o Judiciário intervenha na
intimidade do casal para aferir quem é culpado pela insucesso do
casamento, considerando que, na maioria das vezes, nem os
próprios cônjuges sabem com precisão as suas causas.
Por oportuno, transcrevo trecho do voto da lavra do
Desembargador João Waldeck Félix de Sousa na Apelação Cível nº
148.403- 5/188 (200903312950):
“Segundo a moderna tendência do Direito de
Família, não se pode atribuir a responsabilidade
pela falência da vida conjugal a qualquer das
partes, mas tão-somente à corrosão dos
sentimentos,
configurando
as
posturas
historicamente nominadas de culposas mera
consequência de uma única causa: o desamor. E
de fato, quando termina o amor, torna-se
dramático o exame da relação vivida, não se
podendo olvidar que, em regra, o rompimento é
resultado de uma sucessão de acontecimentos e
desencontros próprios do convívio entre o casal,
em meio às dificuldades pessoais de cada um.
Daí a dificuldade em se atribuir a um ou outro a
culpa pelo fracasso da relação”.
Disso decorre a tendência de não se atribuir culpa a
qualquer das partes pelo fim do relacionamento conjugal,
entendimento que perfilho por entender que na dissolução de uma
família, constituída pelo casamento, não existe cônjuge inocente ou
culpado, visto que a maior prejudicada com o fracasso do
casamento é a família.
Nesta linha de raciocínio, tenho por desnecessário o
reconhecimento da culpa da apelada na separação conjugal,
considerando que a insuportabilidade da vida em comum foi, em
verdade, a causa do rompimento do vínculo conjugal. Confira o
entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
“SEPARAÇÃO. (...). Possibilidade da decretação
da separação. Evidenciada a insuportabilidade da
vida em comum, e manifestado por ambos os
cônjuges, pela ação e reconvenção, o propósito
de se separarem, o mais conveniente é
reconhecer esse fato e decretar a separação,
sem imputação da causa a qualquer das partes.
Recurso conhecido e provido em parte (REsp nº
467.184/SP, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJ
17/02/2003).
Cumpre analisar, ainda, a irresignação do apelante
quanto à partilha do lote de terra em assentamento rural, adquirido
pelo casal junto ao INCRA.
Razão não lhe assiste.
Verifica-se que o apelante juntou aos autos o Contrato
de Assentamento Rural, fls. 08/12, comprovando que o referido
imóvel foi adquirido pelo casal durante a constância do matrimônio,
ou seja, em 18//1/2003, considerando que o enlace matrimonial se
formalizou em 22/07/1999, como se infere da certidão de
casamento acostada à fl. 07.
Vale registrar o esclarecimento da Promotora de
Justiça atuante em primeiro grau quanto à questão:
“...Tanto o contrato de assentamento entabulado
com o INCRA, quanto as dívidas bancárias
contraídas para a realização de benfeitorias no
imóvel rural respectivo, foram firmados durante a
constância do casamento, realizado em 22/07/99
sob o regime de comunhão parcial de bens, como
se verifica pelos documentos de fls. 07/16,
havendo, portanto que ser partilhado o imóvel e
as dívidas respectivas, na proporção de 50%
(cinquenta por cento) para cada cônjuge,
conforme dispõe a lei civil.
Não procede a alegação formulada pelo
requerente de que o referido imóvel não deve ser
partilhado com a requerida porque ela, ao
abandonar o assentamento, teria perdido seus
direitos em relação ao lote de terras,
considerando que isso somente ocorreria,
gerando efeitos para o INCRA, se ambos os
beneficiários
houvessem
abandonado
o
assentamento, o que não ocorreu, até porque o
requerente ali continua residindo...” (fl. 72)
Diante da comprovação nos autos de que o bem
objeto da partilha foi adquirido na constância do matrimônio, mas
diante da comprovação do abandono do lar conjugal, impõe-se que
a Apelada seja preterida na partilha, uma vez que o bem foi motivo
de doação do INCRA ao casal. Ora, ante o abandono do imóvel por
um dos beneficiários, entende-se que este abriu mão da parte a ele
doada.
Destarte, como o bem em litígio não pertence
integralmente ao casal, deve-se reformar a sentença singular.
Desta feita, deve ser reformada a sentença ora
recorrida, acolhe-se, consequentemente, as alegações do apelante.
Desembargador ALVARO ALVO
Relator
Apelação Cível nº 555.555.5555, acordam os
integrantes da 4ª Turma Julgadora da Xª Câmara Cível, por
unanimidade, em CONHECER E NÃO PROVER o apelo, nos
termos do voto do Relator.
Presidiu a sessão o Desembargador Jeová Sardinha
de Moraes. Votaram com o Desembargador Alvaro Alvo, o
Desembargadora Heleonora de Tal e o Desembargador Andreoli
de André.
Esteve presente à sessão a ilustre Procuradora de
Justiça Dra. Gilma de Gilma.
Goiânia, 08 outubro de 2012.
Desembargador ALVARO ALVO
Relator
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