NONA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO CÍVEL nº 00204570020457-28.2008.8.19.0209 RELATOR DESEMBARGADOR CARLOS SANTOS DE OLIVEIRA ________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ________________________________ EMBARGOS À EXECUÇÃO. DUPLICATA. FACTORING. COMPROVAÇÃO DE NOTIFICAÇÃO DO SACADO ACERCA DA CESSÃO DO CRÉDITO. PAGAMENTO EFETUADO INDEVIDAMENTE AO CREDOR ORIGINÁRIO. SENTENÇA DE REJEIÇÃO DOS EMBARGOS. MANUTENÇÃO. Restou suficientemente demonstrada nos autos a efetiva notificação do sacado, através de carta com Aviso de Recebimento, acerca da cessão do crédito objeto da execução. Com efeito, à ausência de disciplina específica, aplica-se ao contrato de factoring o disposto no art. 290 do Código Civil acerca da cessão de crédito, no sentido de que qualquer documento público ou particular é suficiente a cientificar o devedor da cessão. Assim, tendo restado incontroversa a existência da dívida consubstanciada no título executivo, e demonstrado que a executada teve ciência da cessão de crédito realizada pelo primitivo credor, conclui-se que o pagamento indevido a este não extingue a obrigação, devendo, pois, os embargos a execução serem rejeitados. Precedentes. DESPROVIMENTO DO RECURSO. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 0020457-28.2008.8.19.0209, em que é apelante GPC ENGENHARIA LTDA. e apelado FORÇA CRESCENTE FACTORING FOMENTO MERCANTIL LTDA., ACORDAM os Desembargadores da 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade, em conhecer do recurso e negar-lhe provimento, nos termos do voto do Relator. Rio de Janeiro, 16 de março de 2010. Desembargador CARLOS SANTOS DE OLIVEIRA Relator 1 NONA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO CÍVEL nº 00204570020457-28.2008.8.19.0209 RELATOR DESEMBARGADOR CARLOS SANTOS DE OLIVEIRA ________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ________________________________ VOTO DO RELATOR Trata-se de embargos à execução. Sustenta o embargante a inexigibilidade da duplicata levada a protesto, alegando que efetuara o pagamento ao emitente do título na data de vencimento, não havendo prova da efetiva notificação quanto à cessão do crédito à embargada, empresa de factoring. A sentença rejeitou os embargos, ensejando a interposição do presente recurso. É o breve relatório, passo a decidir. A apelação não merece provimento. Restou inequívoca a existência de relação comercial entre a embargante-sacada e a empresa emitente da duplicata protestada. Com efeito, ainda que o título não tenha sido apresentado para aceite, resta comprovada nos autos a entrega das mercadorias objeto da contratação, tratando-se, pois, de título com o devido lastro. Nesta toada, o ponto nodal da controvérsia repousa na existência, ou não, de prova da notificação da sacada acerca da cessão do crédito à parte embargada, empresa operadora de factoring. A parte embargada demonstrou ter comunicado à devedora a cessão relativa ao título de crédito cobrado, mediante Aviso de Recebimento recebido por preposta da devedora em 13/07/2007 (fl. 49). Destaque-se que a pessoa que recebeu o AR em comento, de nome Leila, é funcionária da empresa embargante, conforme depoimento pessoal de seu representante legal à fl. 78. Por outro lado, o teor da comunicação expedida é expresso ao informar que o pagamento do respectivo título deveria ser efetuado junto à empresa faturizadora, “evitando qualquer pagamento diretamente ao cedente” (fl. 50), em razão da aquisição do crédito. 2 NONA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO CÍVEL nº 00204570020457-28.2008.8.19.0209 RELATOR DESEMBARGADOR CARLOS SANTOS DE OLIVEIRA ________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ________________________________ E o pagamento que a apelante busca ver reconhecido como válido, para fins de liberação da dívida executada, foi realizado em favor da credora originária em 02/08/2007, conforme fl. 15, data posterior ao recebimento daquela comunicação. Portanto, não está a mesma liberada da dívida, já que efetuado o pagamento a pessoa que não figurava mais na condição de credora do título. Nesse diapasão, esclarece o art. 290 do Código de Processo Civil, em interpretação a contrario sensu, que a cessão de crédito produz efeitos em relação ao devedor, quando a este notificada, valendo, para tal fim, qualquer escrito público ou particular em que o devedor se declare ciente da cessão feita. Logo, não há obrigatoriedade de que a comunicação da operação de factoring em comento seja efetuada via Oficial de Títulos e Documentos. Ao contrário, a expedição de AR ao endereço da devedora, recebido por funcionária da mesma, é suficiente a notificar a parte sacada. A propósito: “Apesar de o contrato de factoring ser autônomo, típico, não há no ordenamento jurídico uma lei que o discipline de maneira expressa, aplicando-lhe, assim, as disposições relativas ao contrato de cessão de direitos, tendo em vista a semelhança de tais institutos. Incide no factoring, pois, a norma insculpida no art. 1069 do CC/1916 (art. 290 do CC/2002), segundo a qual compete ao cessionário notificar o devedor de que detém a posse do título” 1. Da mesma forma, no direito cambiário não se exige concordância ou aceite do sacado ou emitente para que um título possa circular por endosso. É lícito ao titular do crédito transferi-lo a quem bem entender, na medida em que é da própria natureza do título circular. Tampouco se faz necessário que cópia do título cedido acompanhe a notificação, pois na comunicação expedida às fls. 49/50 constam informações suficientes a permitir ao devedor identificar qual título foi objeto da cessão. E uma vez diante de tais informações, claras e inequívocas, caberia ao mesmo, por critério de razoabilidade, adotar as medidas ulteriores que entendesse cabíveis caso tivesse dúvidas sobre a legitimidade da cessão. 1 Código Civil e legislação civil em vigor. Theotonio Negrão. 28ª ed., São Paulo:Saraiva, 2009, pág. 149. 3 NONA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO CÍVEL nº 00204570020457-28.2008.8.19.0209 RELATOR DESEMBARGADOR CARLOS SANTOS DE OLIVEIRA ________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ________________________________ Assim, restando suficientemente comprovada nos autos a comunicação ao sacado acerca da cessão do crédito, o pagamento indevido ao credor originário não extingue a obrigação, devendo, pois, os embargos a execução serem rejeitados. Espelhando o entendimento ora manifestado, vide ementas de julgado desta Corte: 0010179-65.2008.8.19.0209 - APELACAO - 1ª Ementa JDS. DES. ANTONIO ILOIZIO BARROS BASTOS 26/01/2010 - DECIMA SEGUNDA CAMARA CIVEL - Julgamento: Ação Monitória. Factoring. Duplicata não apresentada para aceite, mas com prova da entrega das mercadorias. Endosso efetuado no verso do título. Comunicação feita ao devedor pelo endossatário do título acerca da cessão do crédito nele representado. Devedor que supostamente paga a dívida representada no título ao credor originário, mediante transferência bancária após ter ciência da cessão de crédito realizada, sem tomar as devidas cautelas acerca da apuração da comunicação recebida. Dever de boa-fé. Ausência de prova de tratar-se de pagamento da dívida objeto dos autos, ante a ausência de recibo ou vinculação do pagamento ao contrato ou nota fiscal respectiva. Pagamento realizado de forma indevida, a quem não era mais seu credor, que não exime o devedor de sua obrigação. Sentença que se reforma integralmente para rejeitar os embargos monitórios e julgar procedente o pedido da ação monitória, invertendo-se os ônus sucumbenciais. Conhecimento e provimento integral do recurso. E M E N T A: Ação Monitória. Duplicada endossada ao Autor não quitada pelo devedor ora Suplicado. Notificação informando a cessão do título que foi enviada ao Requerido. Assinatura do aviso de recebimento não restando impugnada. Recorrente se limitando a contestar o fato de não ser o recebedor do aviso representante da empresa ou pessoa habilitada para tal. Fato irrelevante para o deslinde da questão. Réu confirmando a regularidade do título e se comprometendo a pagá-lo somente à Autora em seu vencimento. Correspondência informando o pagamento das Duplicatas diretamente ao credor primário enviada de forma extemporânea. Obrigação de pagamento do título ao credor legitimado para recebê-lo que não se afasta, não obstante sua quitação com o credor de origem. Exegese do art. 893 do Novo Código Civil. Pagamento que se deu de forma equivocada, cabendo ao Apelante procurar a via adequada para reclamar seu direito. Negado 4 NONA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO CÍVEL nº 00204570020457-28.2008.8.19.0209 RELATOR DESEMBARGADOR CARLOS SANTOS DE OLIVEIRA ________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ________________________________ Provimento. (2006.001.49477 - APELACAO - DES. REINALDO P. ALBERTO FILHO - Julgamento: 24/10/2006 - QUARTA CAMARA CIVEL) PROTESTO DO TITULO PELO ENDOSSATARIO DE BOA FE' EXERCICIO REGULAR DE DIREITO DESCABIMENTO DE PERDAS E DANOS APELAÇÃO. Ordinária de cancelamento de protesto e reparação de dano moral. Protesto de duplicata. Título regularmente sacado. Endosso translativo. Transferência dos direitos decorrentes da duplicata ao Banco apelante, endossatário. Pagamento indevido, pois realizado à endossante, com atraso, mediante depósito em sua conta corrente. Não recebimento do crédito por seu único legítimo credor. Exercício regular de direito (CC/16, art. 160, I, e art. 13, § 4º, da Lei nº 5.474/98). Conduto licita. Ausência de dano moral. Provimento do recurso. (2004.001.05361 – APELACAO - DES. JESSE TORRES - Julgamento: 14/04/2004 - SEGUNDA CAMARA CIVEL) À conta de tais fundamentos, voto no sentido de negar provimento ao recurso, mantendo íntegra a sentença guerreada. Rio de Janeiro, 16 de março de 2010. Desembargador CARLOS SANTOS DE OLIVEIRA Relator 5 Certificado por DES. CARLOS SANTOS DE OLIVEIRA A cópia impressa deste documento poderá ser conferida com o original eletrônico no endereço www.tjrj.jus.br. Data: 18/03/2010 12:37:33Local: Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro - Processo: 0020457-28.2008.8.19.0209 - Tot. Pag.: 5