O cordel é a chama alegre da cultura brasileira por João Bosco Bezerra Bonfim www.joaoboscobezerrabonfim.com.br Minha colega de ofício, meu amigo professor: venho falar de uma arte, um verdadeiro primor que é o cordel nordestino, obra de grande valor. Há mais de cem anos luta o cordel deste País para levar a mensagem da cultura de raiz, porém ouvidos se negam a ouvir o que o cordel diz. A rima desse cordel, coisa de muita valia, conta histórias de assombro e também de valentia e defende o oprimido das garras da tirania. Essa arte milenar, herdada do europeu, embrenhou-se no sertão, mas não desapareceu, ressurge de vez em quando, e ocupa o lugar que é seu. O cordel vivo é a casa da cultura do lugar, Pernambuco, Rio, Bahia, Alagoas, Ceará, mas também Rio ou São Paulo é que vamos celebrar. E se algum diz que não serve para a cultura escolar, criticando seus autores, vendo mal seu linguajar, lhe digo que é preconceito, ignorância cavalar. O cordel conta a história que é do gosto popular e se esse gosto do povo na escola não tem lugar, é melhor trocar de povo, ir ensinar em outro lugar. Usar o cordel na escola, é ato de cidadania recheado que é de histórias, de aventura e poesia e de quebra ainda ensina ciência e mitologia. Sim, porque o cantador ou poeta de bancada antes de ir pro papel dá uma boa estudada, depois, com muita emoção, fica a história temperada. Disseram que pra vencer nessa globalização precisa aprender inglês, coreano e alemão. Por que é que não se ensina a linguagem do sertão? Nessa linguagem se encontra um destemido vaqueiro, vestindo o seu gibão, guarda-peito e perneira, a perseguir barbatões rompendo na catingueira. Quem critica o bom cordel sem conhecer, faz besteira, não sabe que é o alimento da alma mais brasileira, a fruta mais saborosa nas barraquinhas de feira. O cordel é o vírus bom por ser tão contagiante. Basta se ler uma vez, para prosseguir adiante, e dessa arte do verso se tornar logo um amante. Mas eu sei que o professor que ainda não usa o cordel não é por preconceito contra qualquer menestrel, pois com uma boa oficina, eleva o folheto ao ceú. E aqueles alunos que entram no mundo letrado precisam de um diálogo com o seu mundo falado, pois é escrito para ser lido, e em voz alta aclamado. Sabemos que a concorrência no mundo é bem desigual com filme, música e livro do estrangeiro imperial relegando o cordel para o fundo do quintal. E quando falo cordel, falo também do repente, do rap e do hip hop e o partido alto, excelente, falo de coco e embolada que alegram bem a gente. Toda forma de poesia é uma celebração da beleza desta língua, com razão e emoção, pois a vida sem um verso é baião de dois sem feijão. Mas, felizmente, hoje em dia, há outra mentalidade, com a edição de cordéis prova de sua qualidade, além de ser estudado em muita universidade. Professor, meu bom amigo, vou terminar esta fala, pedindo, encarecido: leve o cordel pra sala que vai ganhar é o Brasil, com essa arte que não cala. João Bosco Bezerra Bonfim, poeta, doutor em Lingüística, com pesquisas na área de Análises de Discursos, Gênero e Cordel. Cearense nascido na cidade de Novo Oriente,, vive em Brasília desde 1972, onde, em 1986, formou-se em Letras. Antes de se tornar Consultor Legislativo do Senado Federal, atuou como professor de português e literatura no Ensino Médio e com Alfabetização de Adultos, no Movimento de Educação de Base, da CNBB. Publicações e Monografias de João Bosco Bezerra Bonfim 1. amador amador, de poesias, Ed. do Autor, Brasília, 2001 2. Pirenópolis pedras janelas quintais, de poesias, com fotos de Sílvio Zamboni e arte de Wagner Alves, Ed. Plano, Brasília, 2002 3. A fome que não sai no jornal, ensaio, Ed. Plano, Brasília, 2002 4. Era uma vez uma maria farinha, infantil, com ilustrações de Daniele Lincoln, LGE Editora, Brasília, 2003 5. Teoria do beijo, poesias, com arte de Ana Lomonaco, Ed. do Autor, Brasília, 2003 6. Romance do Vaqueiro Voador, cordel, com arte de Wagner Alves, sobre fotogramas de Vladimir Carvalho e xilogravuras e Abraão Batista, LGE Editora, Brasília, 2004 7. Palavra de Presidente, vol I – discursos de posse de Deodoro a Lula, ensaio e antologia, LGE Editora, Brasília, 2004 8. Palavra de Presidente, Vol. II – Sob o signo de Ruy Barbosa, ensaio e antologia, LGE Editora, Brasília, 2006 9. Passagens terrâneas e subterrâneas, com arte de Ana Lomonaco, LGE Editora, Brasília, 2004. 10. O Jipe Cangaceiro na Chapada dos Veadeiros, com arte de Ana Lomonaco, LGE Editora, Brasília, 2005 11. Chronica de D. Maria Quitéria dos Inhamuns – poema-em-drama, com ilustrações de Côca Torquato e arte de Wagner Alves, LGE Editora, Brasília, 2005. 12. Uma Traça de Casaca na Casa de Rui Barbosa, infantil, com arte de Renato Palet, LGE Editora, Brasília, 2005 13. A peleja do letrado contra as trevas do atraso,cordel, LGE Editora, Brasília, 2007 14. São Chiquinho ou o rio quando menino, infantil, com arte de Mateus Rios, Ed. Biruta, SP, 2008 15. No reino dos preás, o rei carcará, cordel, infantil, com arte de Mateus Rios, Ed. Elementar, São Paulo, 2009; 16. in feito, poesias, Ed. do Autor, Brasília, 2009 17. O Soldadinho de Chumbo recontado em cordel, Ed. Prumo, São Paulo, 2009. 18. Um Pau-de-Arara para Brasília, cordel com ilustrações de Alexandre Teles, Ed. Biruta, 2009 19. A Rabeca de Seu Chico Joana, com ilustrações de Jô Oliveira, Ed. Prumo, 2009.