Era uma vez... Assim começam muitos contos. Este conto também começa assim: havia um filho e seu nome era Guni. Sei que vocês não conhecem nenhum garoto de nome Guni. Em suas classes com certeza existem meninos com nome Lior ou Iaron, Moshé ou Itzik, Roy ou Eran. Mas esta é a verdade: Havia um filho chamado Guni. Que tipo de nome é este? Um nome da Bíblia. Podemos encontrá-lo no livro de Gênesis. Quando Guni nasceu, Jerusalém era uma cidade pequena. Os bairros ao redor não haviam sido construídos e a cidade antiga não era um lugar tranqüilo para se passear. O bairro onde vivíamos estava situado ao lado da cidade e à sua volta havia muitos campos e rochas. No bairro todos se conheciam e cada bebê que nascia criava uma emoção coletiva. Guni nasceu em outros tempos, em outra Jerusalém. Ele nasceu entre guerras, depois da Guerra da Independência e antes de uma guerra que, até então, não sabíamos de que se tratava, somente desejávamos que nunca começasse. Guni era nosso filho primogênito. Para mim sempre foi o bebê mais lindo do mundo. Por que pensava assim? Porque as mamães pensam assim de seus filhos. E quando vi quão adorável era nosso primogênito, lindo e inteligente, pensei que seria bom ter outro bebê. E assim, quando Guni era muito pequeno, nasceu Roni. Assim passamos a ser uma família completa: mamãe, papai, irmão mais velho e irmão mais novo. Guni tinha dois anos e já era muito travesso. Olhando para ele compreendi que tinha um filho teimoso. Alguém que sabe exatamente o que quer. Quando passeávamos, não queria se sentar no carrinho, preferia empurrá-lo. Mas quando Roni chorava, Guni parava ao lado de seu berço e, entre as grades, pegava sua mão para tranqüilizá-lo. Roni chorava porque os bebês costumam chorar de noite, e Guni porque Roni chorava. Papai se levantava e pegava no colo um dos meninos e eu pegava o outro. Assim durante muitas noites. Nós vivíamos perto de Emek Hamatzleva. Toda criança de Jerusalém sabe onde fica. Mas crianças de outras cidades também vinham só para visitar este vale cheio de oliveiras, ruelas e uma grande caverna misteriosa. Em Iom Haatzmaut, Emek Hamatzleva fica cheia de soldados. Em uma época o exército marchava cegando a Emek com seus tanques, e os soldados acampavam ali. As crianças do bairro vinham visitar os soldados e observavam com curiosidade o jeep e as armas sobre os tanques. Uma vez o tia Michael levou Roni e Guni a uma destas marchas e, sendo soldado, deixou que eles entrassem em um tanque. Todos os seus amigos ficaram com inveja. Guni compreendeu que era muito pequeno e que faltava muito tempo para ser um soldado de verdade. Então decidiu criar um exército próprio. E o que vocês acham? Guni conseguiu dirigir seu próprio exército de amigos. Eles acampavam perto de uma grande pedra, levando a bandeira de Israel, para que o mundo saiba que esse era seu lugar. Há meninos que querem ser motorista de ônibus, e meninas que querem ser médicas. Às vezes, quando crescem, realmente se dedicam às profissões sonhadas. Mas a maioria das pessoas que quis ser bombeiro quando pequenos estudam ou trabalham em outra coisa. Guni sempre quis ser comandante no exército. Quando era pequeno desejou muito, também quando cresceu e foi para a escola. E assim quando cresceu chegou a ser comandante. Mas enquanto isto, até crescer, era como todas as crianças, travesso e descuidado. Jogava bola, colecionada figurinha e era o Comandante de seus amigos no bairro. E, sobretudo, costumava se perder. Mas Guni, diferente de outros meninos, sempre sabia para onde ia, como chegar e como voltar. Quando Guni tinha seis anos, muitas coisas aconteceram de repente. Primeiro começou a escola, como todos os meninos de sua idade. E depois seu pai lhe comprou um cachorro, como havia prometido a ele, que cresceu muito rápido e ficou muito forte, mais forte até que Guni. Daí, na rua, as pessoas viam um cachorro grande arrastando com uma correia um menino. Depois de algum tempo, nasceu sua irmã caçula, Dana. Como Guni era grande, ele lhe dava comida e até levava para passear para que a mãe poder descansar. Mas o pior de tudo era que Guni odiava ir à escola. Ele dizia que isso era coisa de meninas. Elas gostavam de ter os cadernos arrumados e ele queria ir nadar, jogar bola e ser comandante do exército. Assim Guni começou a ir à Tnuá e sonhava ser madrich, já que era como ser comandante do exército. Vejo como meu bebê cresce. Está quase da altura de meus ombros. Daqui a pouco não será mais um garoto. Já é quase um adolescente. Guni tocava trombeta nos desfiles da escola, jogava basquete, mas não gostava de estudar e seu pai se aborrecia. Mas Guni dizia que o estudo não era tudo e que não tinha tempo para estudar. Era um garoto dizia. Um garoto comum. Mas muito teimoso. Quando Guni tinha onze anos, a guerra começou. A guerra dos seis dias. Todos os dias a rádio falava sobre a guerra. Todos os papais foram para o exército. Todas as mamães viviam preocupadas. E as crianças? Muitas tinham medo. Outros iam à escola como sempre e Guni pensava que tinha que fazer alguma coisa. O que um menino de onze anos pode fazer? Guni colocou sacos com areia nas portas das casas, para evitar que estilhaços de bombas entrassem nas casas. Além disto pintou os faróis dos carros de azul, para que de noite os inimigos não pudessem distingui-los. Alguns homens agradeciam, mas Guni estava muito triste por não ser grande para ir lutar. Eu estava muito contente por poder cuidar dele. Quando a guerra terminou todos estávamos muito felizes. Primeiro porque não havia mais guerra. Segundo porque havíamos ganhado. Agora podíamos visitar muitos lugares que até agora Guni só conhecia de nome pela Bíblia. Guni também estava triste. Por que? Porque não restava nenhum lugar que ele pudesse conquistar quando fosse comandante. Pensamos que a paz com os árabes havia chegado. Acreditávamos que com a paz não teríamos que mandar nossos filos para a guerra. Porque as mães não querem mandar seus filos para a guerra. Mas Guni sabia que seria soldado e lutaria na guerra. Jerusalém mudou radicalmente. Agora era possível passear pela cidade antiga, visitar o Kotel e comprar no shuk. Guni era feliz, conhecia cada uma das ruelas da cidade antiga. Eu também era feliz, tinha saudades dessa Jerusalém e pensava que os árabes deviam entender que não somos inimigos, que podemos ser vizinhos, que podem nos visitar e nós a eles. Enquanto isso, Guni começou o ensino médio e passeava por todo o país. Cresceu tanto que ficou mais alto que sua mamãe e seu papai. E quem é alto deve estar na seleção de basquete: entrou para a seleção de basquete. E o que mais? Ele gostava de muitas meninas. Quando era garoto, se apaixonou por Efrat e Carmel, que eram gêmeas. Era muito difícil diferenciá-las, então gostava das duas. E quando maior, gostou da Ilana, da Orly e da Ruty. E muitas meninas gostavam dele já que era alto, bonito e, sobretudo, dançava muito bem. Guni foi madrich na tnuá. Toda terça e sábado ia às atividades. Ele gostava muito de seus companheiros. E ainda mais de seus chanichim. Quando se tornou um homem, se alistou no exército, como todos. Há meninos que não sabem o que fazer no exército. Alguns querem dirigir tanques, outros querem voar. Mas Guni sabia exatamente que queria estar com os pés na terra. E queria estar na melhor unidade chamada “Saieret”. E Guni disse: vou para Saieret Golani”. É preciso ser muito forte para estar na Saieret. E além disto é preciso ser muito disciplinado. Na Saieret o treinamento é muito duro. Caminham de dia e de noite. Uma vez Guni pegou seu rifle e me pediu para segurálo. Peguei e quase caí com o peso. Este rifle se chama Galil. Mas Guni levava ataduras, granadas e até um comunicador desses com antenas grandes como as de uma televisão ou de um rádio. E com todo este carregamento começavam a caminhar. Mais e mais. Até que, finalmente fazem a grande caminhada final. Cento e vinte quilômetros. Perguntem à sua mãe e ao seu pai quando E 120 km saindo de sua casa. são Muito, não é? E quem chega recebe uma medalha da Saieret. Nesse momento Guni era soldado. Ele estava muito orgulhoso. Eu também estava. Estava feliz por ter um filho na força mais importante de nosso exército. Sabia que nosso país estaria bem cuidado. Mas também estava preocupada. Que se pode fazer? As mães são assim. Orgulhosas e com medo que lhes aconteça alguma coisa, que não tenham acidente com o jeep, que não se deparem com o inimigo e que, principalmente, que não ocorra uma guerra. Quando vinha nos finais de semana, estava muito cansado. Quase nem comia. Vinha com uma sacola cheia de roupa suja de areia e barro e quase nem falava. Pode ser que fosse porque achava que eu não entenderia, ou talvez para não me preocupar. Guni fez o curso de oficiais. Depois do treinamento na Saieret, ele pensou que o curso de oficiais seria fácil. E, depois do curso, convidaram todos os pais. Eu também fui, é claro. E quem encabeçava o desfile levando a bandeira de Israel? Guni. E depois o comandante em chefe da Armada, o comandante de todo o exército, entregou a cada um broche na lapela da camisa. Um prendedor, e nele uma espada com uma folha de oliveira. Uma espada simbolizando o heróico. Uma folha de oliveira simbolizando nosso desejo de paz. Se virem um soldado que traz um símbolo como esse, saibam que é um oficial. Guni subiu rapidamente. Quando Guni completou vinte e três anos, lhe ofereceram ser comandante. Guni comandante da Saieret Golani! Como estava feliz! Agora tinha um batalhão sob seu comando. O comandante é responsável por tudo o que acontece com seus soldados. Responsável por sua comida, sua bebida, sua saúde e seu treinamento correto. Mas, sobretudo, era responsável por suas vidas, em tempo de paz e em tempo de guerra. Pensem como é difícil para os pais serem responsáveis pela vida de seus filos; e para Guni eram muitos soldados, e era responsável por todos. Seu quarto no exército era muito pequeno e tinha um apartamento em Jerusalém. As pessoas diziam: “E aí Guni, quando você se casa? E Guni ria e não respondia. Porque ele sabia o que eu não sabia, nem seus companheiros. O exército se preparava para o guerra. A Saieret se preparava para uma luta muito difícil. O lugar que deviam conquistar estava situado na fronteira norte. Habufor. Uma montanha muito perigosa conduzia ao lugar. Em cima da montanha havia uma aldeia com terroristas. Habufor era um pontochave de ataque a Israel. Quando as pessoas saíam dos refúgios olhavam para cima e diziam com ódio: “É preciso conquista Bufor”. Mas eles não sabiam que a cada noite a Saieret saía para treinar, porque, em caso de guerra, conquistariam o Bufor. Um dia disseram a Guni que colocariam um novo comandante e que ele seria promovido para outro posto. Guni pensou e pensou. Ele queria continuar no exército, mas também queria estudar na universidade. Achava que era hora de se casar e, como não chegou a decidir-se, achou que seria bom viajar ao exterior. Comprou uma passagem para os Estados Unidos, devolveu as armar ao exército e organizou uma festa para comemorar sua baixo do exército. E pensou que em uma semana estaria em Nova York. E aí… O governo decidiu começa a guerra. Era primavera, junho de 1982. Guni tinha vinte e cinco anos. No shabat, depois de sua festa, Guni pegou seu carro e voltou para o exército. Porque havia guerra. E seus soldados, aqueles que ele treinou e conduziu e amou estavam indo conquistar o Bufor. É verdade que já tinham um novo comandante, é verdade que Guni podia ficar em sua casa e viajar para os Estados Unidos. Mas Guni amava seus soldados e considerava que era responsável por eles, e por isto devia voltar à Saieret. Os soldados viajaram o dia todo vendo a montanha à sua frente. Os campos de trigo de Eretz Israel estavam maduros, as flores da primavera enchiam os campos, mas os soldados da Saieret só olhavam para acima e pensavam quem viveria até a manhã seguinte. O combate continuou durante toda a noite. Lutaram dentro de túneis e disparam, jogaram granadas. E quando chegou a manhã, a bandeira da Saieret tremulava sobre Habufor. Seis soldados morreram. Guni também. Pela manhã vieram avisar-me que Guni tinha morrido. Meu filho lindo, meu herói. Que se transformou em homem e em combatente; em comandante e em vencedor. Morreu. Ao meio-dia o trouxeram para ser enterrado no monte Hertzl. Este é o cemitério militar em Jerusalém, só para soldados. O sol vermelho caiu sobre seu túmulo. Muita gente chorou. E eu pensei no meu pequeno, que tinha o maior exército de seu bairro. E eu também chorei. Agora penso nele o tempo todo. Com orgulho e tristeza. As pessoas me dizem: “Guni morreu como um herói”. Mas eu sei: ele viveu como um herói, sempre fez o que achava que tinha que fazer. Por que Guni morreu, meu garotinho? Porque amava sua pátria. E amava seus amigos. E achava que era responsável por seus soldados. Ele não morreu por que odiava os árabes. Ele não morreu porque queria ser um herói. Ele morreu pelo amor a esta bela terra, que conheceu durante sua vida. E pelo exército que considerou Guni como o melhor. E por seus soldados que acreditaram nele. Este é o final triste para um conto real. É um final triste para Guni e para mim, mas não para vocês, garotos. Guni quis que vivessem em paz e tranqüilidade, que crescessem com alegria como ele cresceu, que fossem ao jardim e à escola, que passeassem por Israel e a amassem. E que houvesse paz em vocês e sobre todo Israel. E se houver paz e não houver mais guerra, então este conto sobre Guni será uma lenda. Algo que se lembra como um sonho, como uma canção, que começa como todos os contos: “Era uma vez… Uma vez tive um filho, e seu nome era Guni.” Preparado por: Tradução ao Português: Miriam Kirsztain Departamento de Juventude Comunidade Shalom São Paulo, Brasil