Isenção de Responsabilidade criminal de réu primário, que não representa significativo perigo público No Brasil há diversas previsões quanto ao réu primário, entretanto, nenhuma delas possibilita a total isenção da pena. De todo modo, diante de crimes de menor potencial ofensivo ou para casos de primeira incidência, o Código Penal (Decreto-Lei 2.848 de 1940) e a Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais ( Lei n. 9.099 de 1995) prevêem atenuantes. No Brasil, a questão da primariedade do réu repercute em diversos institutos penais e processuais penais. Dentre esses, vale destacar: (I.) a utilização enquanto atenuante penal, (II.) as diferenças de aplicação de certas penas, quando previstas no tipo penal, (III.) a substituição da pena, (IV.) a transação penal, (V.) o sursis penal, (VI.) o sursis processual. I. A PRIMARIEDADE ENQUANTO ATENUANTE PENAL Apesar de não haver elenco expresso dentre as atenuantes do art. 65 do Código Penal, é a primariedade, por interpretação sistemática, considerada atenuante penal. Para maior parte da doutrina brasileira (MIRABETE, JESUS, NUCCI, et al.), é, inclusive, a mais importante dentre as atenuantes e as agravantes, devendo ser considerada superior quando contrastada com outras. II. TIPOS PENAIS ESPECÍFICOS E A PRIMARIEDADE No que tange ao Código Penal, este estabelece que nos crimes de furto, apropriação indébita, estelionato, receptação e sonegação de contribuição previdênciária (art. 155, §2º, art. 168-A, §3º, art. 171, §1º, art. 180, §5º e art. 337-A, §2º, respectivamente) é facultado ao juiz diminuir ou deixar de aplicar a pena caso o réu seja primário e possua bons precedentes. Ademais, ademais determina em seu art. 59 que se deve considerar os antecedentes penais para fixação da pena: Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: [...] III. SUBSTITUIÇÃO DE PENA Além dessas previsões, o Código Penal ainda estabelece que, caso o réu possua bons antecedentes, pode, desde que atenda aos demais requisitos, substituir a pena restritiva de liberdade por pena restritiva de direito, conforme preceitua o art. 44: Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando: I - aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo; II - o réu não for reincidente em crime doloso; III - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente. [...] IV. TRANSAÇÃO PENAL Quanto à Lei de n. 9.099/95, esta possibilita que nos crimes de menor potencial ofensivo, o réu primário que possua bons antecedentes faça uma transação penal, em outras palavras, que negocie com o Ministério Público e com a vítima a aplicação de pena que não seja privativa de liberdade, conforme consta no art. 72: Art. 72. Na audiência preliminar, presente o representante do Ministério Público, o autor do fato e a vítima e, se possível, o responsável civil, acompanhados por seus advogados, o Juiz esclarecerá sobre a possibilidade da composição dos danos e da aceitação da proposta de aplicação imediata de pena não privativa de liberdade. Assim, caso ocorra o acordo, o juiz receberá a denúncia e vai homologar o acordo, sem corra um processo penal. Todavia esses dados entram para os antecedentes penais. V. SURSIS PENAL O sursis penal do sistema europeu continental possui equivalência no probation do sistema anglo-saxão. Uma vez condenado o réu não reincidente em mesmo crime doloso, poderá o juiz motivadamente suspender a execução da pena em favor da prestação de serviços comunitários, da limitação de fins de semana, ou de outras exigências curiais. Para tanto, a pena cominada deverá ser de, no máximo, dois anos, e não passível de substituição pelo art. 44. Ademais, deverá o réu apresentar bons antecedentes e conduta social adequada. O período probatório estipulado deverá ser integralmente cumprido para que não se converta em prisão. Tais prerrogativas constituem direito do réu, de modo que, preenchidas as condições expressas no Código, obriga-se o juiz a concedê-las, devendo a negativa ser suficientemente justificada. VI. SURSIS PROCESSUAL O sursis processual representa inovação processual penal brasileira, não se igualando aos institutos clássicos do sursis do sistema belgo-francês. É discutido desde o 1º. Congresso Brasileiro de Política Criminal, sendo, inclusive, adotado no Código de Processo Tipo para a América Latina. O sursis processual, previsto no art. 89 da Lei n. 9099, dá-se ainda durante o trâmite processual para ilícitos de pequeno potencial lesivo. É, tal como o sursis penal, direito do réu. Não obstante, pode ser expressamente recusado pelo réu que confie na prolação de sentença penal absolutória. São seus requisitos: (I.) haver cometido crimes a que a lei tenha dado o somatório de penas mínimas igual ou menor a dois anos (Súmula 243/STJ), (II.) inexistência de outro processo penal em curso ou concluído contra o réu, (III.) presença dos demais requisitos do sursis penal (art. 77 do Código Penal). Há de se notar, portanto, que todas as exigências do sursis processual gravitam em torno do perigo potencial público potencial que o réu apresenta. Uma vez concedido o sursis processual, será o réu submetido a período probatório de dois a quatro anos, em que não poderá voltar a delinqüir. Deverá, também, informar e justificar mensalmente o juiz sobre suas atividades, assim como reparar o dano causado. Decorrido o prazo e atendidos os requisitos, será extinto automaticamente o processo. CONTABILIZAÇÃO DA PRIMARIEDADE Pela previsão do art. 64 do Código Penal, decorridos cinco anos do cumprimento da pena, da extinção da pena ou do término da suspensão, será considerado o réu novamente primário. Excetuam-se os crimes militares e políticos, cuja reincidência se dá em todos os casos.