CAPÍTULO 15 Mix de Vendas e Alocação de Custos Este capítulo explora dois temas diferentes com que se defrontam os gerentes, os quais na superfície talvez pareçam não relacionados, mas que, na verdade, são companheiros de viagem. Primeiro, tratamos das ferramentas para análise do mix de vendas, ou seja, as proporções relativas ou os pesos comparativos dos diferentes produtos nas vendas totais da empresa. A maioria das empresas vende uma ampla gama e uma grande diversidade de produtos. A estratégia de marketing básica das empresas consiste em determinar o mix de vendas ótimo que maximiza o lucro. No entanto, com o tempo, é quase certo que o mix de vendas da empresa mudará, e os gerentes precisam compreender o impacto dessas mudanças sobre o lucro. Qualquer discussão sobre o mix de vendas será incompleta sem a análise da alocação dos custos fixos. Em geral, dois ou mais produtos compartilham uma base comum de despesas fixas. Por exemplo, considere as vendas de uma loja de departamentos em determinado edifício. Existem muitas despesas de ocupação, como aluguel (ou depreciação), serviços públicos, imposto predial, seguro contra fogo e outros riscos, e assim por diante. Todos os produtos vendidos na loja se beneficiam com as despesas fixas. Ou considere em território de vendas sob a responsabilidade de um gerente de vendas, cujos salários e outros custos de escritório de estendem por todos os produtos vendidos no território. Será que todas as despesas fixas devem ser rateadas entre os diferentes produtos? A alocação talvez pareça lógica. Todavia, a questão mais fundamental é sobre se a alocação de fato ajuda os gerentes nas funções de controle e no processo decisório. A alocação é um tema complexo, especialmente quando os diferentes produtos (ou algum agrupamento de produtos) são organizados como centros de lucros separados, por cujos resultados os gerentes são responsáveis, inclusive recebendo pelo menos parte da remuneração com base no desempenho do lucro da unidade organizacional. Os aspectos de mix de vendas e alocação de custos se encaixam naturalmente. Se a empresa vendesse apenas um produto, não haveria problema de alocação de custos entre os produtos – embora talvez existissem custos comuns abrangendo duas ou mais regiões (territórios) de vendas segregadas. A principal preocupação da discussão seguinte é a alocação das despesas fixas entre os produtos. Conceito Chave ANÁLISE DO MIX DE VENDAS Suponha-se na posição do gerente geral de uma grande divisão, um dos vários centros de lucros autônomos da organização. A divisão vende uma linha de produtos, consistindo em quatro produtos com a etiqueta da empresa e mais um genérico (sem etiqueta), para uma cadeia de supermercado. O relatório de lucros do ano mais recente é apresentado na Figura 15.1. O formato do relatório de lucros é diferente do da demonstração do resultado já analisada neste livro. Começa com os preços de venda unitários, depois deduz os custos dos produtos unitários e as despesas variáveis unitárias, para determinar as margens de contribuição unitárias. Lembre-se de que a margem de contribuição é o lucro antes das despesas operacionais fixas (e antes das despesas financeiras e da provisão para o imposto de renda). Um relatório de lucros como o mostrado na Figura 15.1, que exibe essas informações vitais, é a ferramenta analítica básica dos gerentes. Observe que nesse relatório de lucros as despesas fixas não estão distribuídas entre os cinco produtos. Os métodos de alocação serão analisados mais adiante. Todos os cinco produtos geram certa margem de contribuição, embora essas margens de contribuição unitárias variem em dólar e em porcentagem do preço de venda entre os cinco produtos. O produto preliminar Premier apresenta o mais elevado percentual de margem de lucro (35%) e o mais alto valor em real de margem de contribuição unitária (R$ 33,25). Observe que o modelo genérico apresenta margem de contribuição percentual mais elevada e gera margem de contribuição total maior do que o modelo econômico. Os custos de produção são cortados até o osso no produto genérico, que, além disso, não conta com qualquer propaganda ou promoção de vendas – as despesas variáveis limitam-se, sobretudo aos custos de entrega. O custo do produto é mais alto para o modelo Premier, pois ele consome as melhores matérias-primas e exige mais tempo de mão-de-obra para assegurar sua qualidade de item topo de linha. Do mesmo modo, as despesas com propaganda e promoção de vendas são muito altas com esse produto; as despesas variáveis correspondem a 22% do preço de venda: 21,15% (despesas variáveis) / R$ 95,00 (preço de venda) = 22%. O modelo econômico responde por 18% do volume de vendas, mas apenas por 11% da margem de contribuição total. O modelo Premier gera apenas 9% do volume de vendas, mas proporciona 20% da margem de contribuição total. Dessas considerações decorre a questão importante de definir o melhor mix de vendas, ou a composição ótima. As informações comparativas, produto por produto, apresentadas na Figura 15.1 são muito importantes para a análise decisória em marketing. É importante compreender as mudanças no mix de vendas e os trade-offs entre os produtos, Dica A estratégia de marketing de muitas empresas consiste em encorajar os clientes a se deslocarem para os itens mais elevados da linha de produtos (trade-up). Em geral, os produtos de preços mais elevados apresentam margens de Essa contribuição unitárias mais altas. regra geral se aplica sobretudo aos produtos maduros, que já atingiram as faixas de meia-idade ou de envelhecimento no respectivo ciclo de vida. Dica Os produtos mais novos, nos estágios da infância ou adolescência, geralmente desfrutam de vantagem competitiva. Nas primeiras fases do ciclo de vida, os novos produtos tendem a apresentar margens de contribuição elevadas, até que chega a concorrência e força a redução do preço e/ ou dos volumes. De fato, o CEO da Eastman Kodak enfatizou exatamente esse aspecto, alguns anos atrás, num artigo no New York Times. Totais da linha de produtos Produto s Genérico Econômico Padrão DeLuxe Premier 28,25 42,50 60,00 75,00 95,00 5.261.000 (20,05) (26,65) (32,00) (36,00) (40,60) (2.886.500) (1,13) (6,80) (11,80) (16,50) (21,15) (922.390) 7,07 9,05 16,20 22,50 33,25 25 21 27 30 35 28.000 18.000 35.000 10.000 9.000 100.000 28 18 35 10 9 100 Margem de contribuição total (R$) 197.960 162.900 567.000 225.000 299.250 % da margem de contribuição total 14 11 39 15 21 Preço de venda (R$) Custo dos produtos vendidos (R$) Despesas variáveis (R$) Margem de contribuição unitária (R$) % do preço de venda Volume de vendas em unidades (R$) % do volume de vendas total Unidades R$ 1.452.110 100 Despesas fixas (R$) ? ? ? ? ? (766.000) Lucro operacional (R$) ? ? ? ? ? 686.110 A questão consiste em alocar ou não o total das despesas fixas entre os cinco produtos, para determinar o lucro operacional atribuível a cada produto. Figura 15.1 Relatório de lucros por produtos. Compare dois produtos da empresa: o standard e o deluxe. A margem de contribuição do deluxe é R$ 6,30 mais alta: R$ 22,50 (deluxe) – R$ 16,20 (padrão) = R$ 6,30. Ceder uma unidade do standard em troca de uma unidade deluxe aumentaria a margem de contribuição total, sem qualquer mudança nas despesas fixas totais. As estratégias de marketing devem basear-se em informações sobre a margem de contribuição, como as apresentadas no relatório de lucros da linha de produtos (Figura 15.1). A posição do modelo econômico é interessante, pois sua margem de contribuição é de longe mais baixa entre as que apresentam etiqueta da empresa e não muito superior a do modelo genérico. O modelo econômico talvez esteja na condição de líder do prejuízo ou, mais exatamente, líder do lucro mínimo – produto que não gera muita margem, mas que é necessário para conquistar a atenção dos clientes e que serve como trampolim ou degrau para que os clientes progridam para produtos de preços mais elevados. Todavia, o oposto também é possível. Em tempos difíceis, muitos clientes às vezes regridem (trade down) de modelos mais sofisticados para produtos com margens de lucro mais baixas. O tratamento dessas regressões é um dos principais desafios em marketing. Talvez seja possível aumentar o preço de venda dos produtos menos sofisticados, de modo a ampliar as margens de contribuição por unidade; mas nem sempre essa iniciativa é factível. Vale a pena continuar fabricando e vendendo o produto genérico? De um lado, esse produto contribui com 28% do volume de vendas total e com 14% da margem de contribuição total. De outro lado, o modelo genérico pode estar roubando vendas dos outros quatro produtos, embora seja difícil confirmar tal receio. Talvez a pergunta fosse respondida por meio de uma pesquisa de mercado. Se o produto genérico não estivesse disponível nos supermercados, será que os clientes não comprariam um dos outros modelos? Se todos os clientes passassem a comprar o modelo econômico a empresa estaria melhor; seria a substituição de vendas com margem de contribuição unitária de R$ 7,07 por outras com margem de contribuição unitária de R$ 9,05, uma diferença positiva de quase R$ 2,00 por unidade. Se os clientes se transferissem para o modelo padrão ou para outros mais sofisticados, a vantagem seria bem maior, embora os clientes de produtos genéricos não sejam do tipo que geralmente progride para itens de melhor qualidade. Sob esse aspecto, é possível levantar muitas questões de marketing. De fato, o trabalho do gerente consiste em considerar toda a gama de alternativas de marketing, inclusive o posicionamento de cada produto, a definição do preço de venda, a propaganda mais eficaz e assim por diante. As decisões sobre a estratégia de vendas, como as apresentadas na Figura 15.1. O quadro é uma boa ferramenta analítica no processo decisório sobre o mix de vendas ótimo. Conceito Chaves DESPESAS FIXAS: ALOCAR OU NÃO? Quando se vendem dois ou mais produtos, surge inexoravelmente o Problema das despesas operacionais fixas que não podem ser confrontadas ou associadas diretamente com a venda de cada produto. A questão inevitável é a conveniência de alocar ou não as despesas operacionais fixas entre os produtos. Retorne mais uma vez à Figura 15.1; observe que as despesas fixas não estão alocadas. Será que essas despesas, de alguma maneira, devem ser distribuídas entre os diferentes produtos? As despesas fixas geralmente se enquadram em duas grandes categorias: (1) despesas de vendas e marketing; e (2) despesas gerais e administrativas. A maioria das despesas operacionais fixas é indireta; a associação direta das despesas com os produtos é impossível. Aqui, adotamos a premissa de que inexistem despesas fixas diretas para qualquer dos produtos. Por outro lado, a hipótese de despesas fixas diretas é possível. Por exemplo, determinada companhia de propaganda pode abranger apenas um produto. Suponha que a empresa adquiriu uma inserção única no Wall Street Journal para o produto premier. O custo deste único anúncio deve ser deduzido da margem de contribuição total do produto premier com despesa fixa direta. Contudo, em geral, a maioria das despesas fixas é indireta; não pode ser confrontada diretamente com qualquer produto. As despesas fixas indiretas podem ser alocadas aos produtos, embora os propósitos e os métodos de alocação estejam sujeitos a controvérsia e a grandes diferenças de opinião. Por exemplo, é possível efetuar a distribuição com base no volume de vendas, ou seja, a cada unidade vendida seria atribuído um mesmo valor do total das despesas fixas; ou com base na receita de vendas, significando que a cada dólar da receita de vendas seria rateado um mesmo valor do total das despesas fixas; ou de acordo com alguma outra fórmula mais complexa. A Figura 15.2 mostra duas alternativas de demonstração do resultado para o exemplo da linha de produtos: uma em que as despesas fixas totais são distribuídas na base do volume de vendas e a outra na base da receita de vendas de cada produto. O lucro operacional total para toda a linha de produtos é o mesmo em ambos os casos, ma o lucro operacional de cada produto difere entre ao dois métodos. Tanto o volume de vendas como a receita de vendas como critérios de alocação dos custos fixos apresentam deficiências óbvias e os dois métodos são bastante arbitrários. Cada um deles se fundamenta numa premissa duvidosa: a de que cada unidade do volume de vendas ou cada real da receita de vendas tem o mesmo custo fixo. Recentemente, a teoria dos vetores ou indutores de custo, sob o título custeio baseado em atividades (activity-based costing –ABC), como método para a alocação dos custos fixos, tem sido objeto de muita atenção. Na realidade, a abordagem deveria chamar-se alocação de custos com base em atividades (activity-based cost allocation), por se tratar de uma técnica para o rateio dos custos indiretos entre os produtos. O ABC como ferramenta analítica questiona a premissa de que as despesas fixas são de fato completamente indiretas. As despesas fixas totais são subdivididas em grupos de custos segregados, ou seja, define-se um grupo de custo próprio para cada atividade básica ou para cada serviço de apoio. Em vez de misturar todos os custos fixos num único aglomerado de suporte “geral”, cada tipo básico de atividade de apoio é identificado com seu próprio grupo de custo separado. Em seguida, a analisa-se, mensura-se e determina-se para cada produto o respectivo uso ou consumo de cada atividade para a qual se constituiu um grupo específico de despesas fixas. Neste exemplo, todos os produtos, exceto o modelo genérico, são objeto de propaganda, por meio do departamento de propaganda da corporação. O departamento de propaganda é um dos grupos de custos fixos e sua atividade é mensurada de acordo com algum denominador comum, como quantidade de páginas de anúncios publicados na mídia impressa (jornais e revistas). Cada produto recebe sua fração do grupo de custos do departamento de propaganda, com base no respectivo número de páginas de anúncios. No caso, propaganda é o vetor de custo, a atividade que gerou o custo. O número de páginas de anúncios é a medida desta atividade que é utilizada para a alocação do custo entre os vários usuários, ou produtos que foram objeto de propaganda. Alternativamente, ainda seria possível identificar diferentes tipos de propaganda (mídia impressa versus mídia eletrônica, por exemplo), e cada produto seria onerado pela respectiva fatia de custo do departamento de propaganda, com base em duas medidas de vetores de custos: uma seria o número de páginas na mídia impressa e a outra seria o número de minutos na televisão ou rádio. Algumas despesas fixas são muito indiretas e bastantes distantes dos produtos específicos, como o departamento de contabilidade, o departamento legal, a auditoria anual, a segurança patrimonial e o seguro e responsabilidade civil. O conceito de vetor de custo seria distendido ao máximo, no caso de certas despesas fixas. Do mesmo modo, a quantidade de atividades distintas, cada uma com o seu próprio grupo de custos fixos, também pode tornar-se excessivo. Três a cinco, talvez sete a dez, vetores de custo para alocação das despesas fixas seriam compreensíveis e viáveis, mas há um limite. Conceito Chave A questão gerencial mais essencial é se qualquer critério de alocação justifica o esforço. Qual o objetivo? A alocação de fato ajuda no processo decisório? O propósito básico da gerência não deve consistir em apurar o verdadeiro” lucro operacional para cada produto ou para outras fontes de venda. A questão primordial é se a gerência está utilizando de maneira ótima os recursos e o potencial resultantes das despesas operacionais fixas da empresa. O objetivo essencial é descobrir o mix de vendas que maximiza a margem de contribuição total. A alocação das despesas fixas indiretas em si e por si não contribui para essa tarefa. Talvez seja preciso alocar as despesas fixas indiretas para fins legais ou por motivos contratuais; se for o caso, os métodos para tal alocação devem ser explicitados antecipadamente, em vez de esperar-se até o fato consumado para depois determinar o critério de alocação. Método A – Despesas fixas alocadas na base do volume de vendas Genérico Econômico Standard DeLuxe Premier R$ R$ R$ R$ R$ R$ Preço de venda 791.000 765.000 2.100.000 750.000 855.000 5.261.000 Custo das mercadorias vendidas (561.400) (479.700) (1.120.000) (360.000) (365.400) (2.886.500) Lucro bruto 229.600 285.300 980.000 390.000 489.600 2.374.500 Despesas variáveis (31.640) (122.400) (413.000) (165.000) (190.350) Margem de contribuição 197.960 162.900 567.000 225.000 299.250 Despesas fixas (alocadas) (214.480) (137.880) (268.100) (76.600) (68.940) (766.000) (16.250) 25.020 298.900 148.400 230.310 686.110 Lucro operacional Totais (922.390) 1.452.110 Método B – Despesas fixas alocadas na base da receita de vendas Genérico Econômico Standard DeLuxe Premier Totais R$ R$ R$ R$ R$ R$ Preço de venda 791.000 765.000 2.100.000 750.000 855.000 5.261.000 Custo das mercadorias vendidas (1.120.000) (360.000) (365.400) (2.886.500) 2.374.500 (561.400) (479.700) Lucro bruto 229.600 285.300 980.000 390.000 489.600 Despesas variáveis (31.640) (122.400) (413.000) (165.000) (190.350) Margem de contribuição 197.960 162.900 567.000 225.000 299.250 Despesas fixas (alocadas) (115.169) (111.384) (305.759) (109.200) (124.488) (766.000) 82.791 51.516 261.241 115.800 174.762 686.110 + 99.311 + 26.496 (37.659) (32.600) (55.548) Lucro operacional Diferença (B – A) Aumento no lucro operacional pela adoção de método alternativo de alocação das despesas fixas. Redução no lucro operacional pela adoção de método alternativo de alocação das despesas fixas. Figura 15.2 Dois métodos de alocação das despesas fixas. (922.390) 1.452.110 0 Sem alteração Às vezes, à empresa necessita distribui as despesas fixas para minimizar o aparente lucro operacional. Fui contratado como perito do autor numa ação judicial por infração ao direito de patente contra um empresa famosa. O réu já perdera na instância inferior; fora julgado culpado por infração do direito de patente. Durante três anos, a empresa fabricara e vendera um produto patenteado pelo autor, sem que este recebesse qualquer remuneração. A segunda instância avaliaria o valor dos danos e determinaria a indenização. O autor reivindicava parte dos lucros apurados pelo réu com a venda do produto. O réu atribuiu ao produto todas as despesas indiretas imagináveis – inclusive parte do salário anual do CEO – para minimizar o lucro que alegadamente auferia com a venda do produto. O júri rejeitou esse rateio grosseiro e concedeu ao autor uma indenização de R$ 16.000.000,00. Conceito Chaves ALOCAÇÃO DOS CUSTOS INDIRETOS DE FABRICAÇÃO Existe uma área em que os custos fixos devem ser alocados entre os diferentes produtos; inexiste a hipótese de não-distribuição. Os custos indiretos de fabricação devem ser rateados de alguma maneira entre os diferentes produtos fabricados durante o período. Os procedimentos e problemas de contabilidade de custo industrial são analisados no Capítulo 17. Aqui, apresenta-se apenas um resumo muito breve, focalizando-se basicamente o aspecto de rateio dos custos. O fabricante mantém registros detalhados para acumular os custos de material direto e de mão-deobra direta, do começo ao fim do processo de produção, para cada um dos produtos. Isso exige um enorme esforço de escrituração detalhado e meticuloso, referente aos custos diretos de cada produto ou de cada lote de produção. Por exemplo, estima-se que a montagem de automóveis envolva de 10.000 a 15.000 componentes diferentes; o processo de produção de uma cervejaria envolve mais de 1.000 etapas diferentes para a fabricação de um litro de cerveja. Os custos diretos de materiais e mão-de-obra não representam um problema contábil expressivo da empresa. Por sua própria natureza, as despesas gerais ou custos indiretos são não-diretos. Não podem ser relacionados diretamente com qualquer produto específico, estação de trabalho ou departamento de produção. Considere o salário anual do vice-presidente de fabricação e o imposto predial e territorial sobre os terrenos e prédios da fábrica. Assim, os custos indiretos precisam ser alocados ou apropriados de alguma maneira, para a determinação do custo de fabricação unitário integral e completo. Tradicionalmente, os fabricantes utilizavam um denominador comum da atividade de produção para fins de alocação dos custos indiretos de fabricação aos diferentes produtos. As horas de mão-de-obra direta foram um denominador comum, pois todos os produtos exigiam mão-de-obra direta. Assim, todos os produtos eram onerados com os custos indiretos de fabricação proporcionalmente à mão-de-obra direta. Num evento recente, em São Paulo, um sócio Arthur Andersen, a conceituada empresa de contabilidade e auditoria internacional, citou estudos e recorreu à própria experiência para afirmar que hoje, por causa da automação, a mão-de-obra direta corresponde a menos de 15% do custo de fabricação total na maioria dos setores. Muitos outros estudos chegam à mesma conclusão. O sócio da Arthur Andersen observou que os materiais diretos freqüentemente representam 50% ou mais do total do custo do produto. Talvez alguma medida do material, como peso ou tamanho, fosse melhor denominador comum para a alocação dos custos indiretos de fabricação. Alternativamente, é possível adotar duas ou mais taxas de rateio para a distribuição dessas despesas gerais – cada uma para um tipo separado ou grupo de custos fixos indiretos. Hoje, os métodos de custeio baseado em atividades (alocação de custos) são alvo de muita atenção como meio mais adequado de distribuir os custos indiretos de fabricação. As atividades de apoio básicas, necessárias à fabricação dos produtos, são cuidadosamente identificadas, compondo-se diferentes grupos de custos indiretos de fabricação para cada atividade. Conforme já analisado, no caso de outras despesas fixas, a tarefa crítica consiste em identificar as principais categorias de atividades de apoio necessárias à execução dos processos de produção. Os custos de cada uma dessas atividades básicas são acumulados em grupos separados. Em seguida, calculam-se taxas de rateio para cada um desses grupos de custos, com base no indicador de atividade mais relevante em cada caso. Assim, o custo total da atividade é distribuído entre os diferentes produtos, conforme respectivo grau de utilização da atividade. Por exemplo, o processo de fabricação de muitos produtos começa com o projeto e desenvolvimento de suas especificações pela engenharia. A empresa mediria a quantidade de tempo e a intensidade do esforço do departamento de engenharia para cada produto e distribuiria o custo do departamento com base nesse critérios. Os métodos tradicionais de contabilidade de custos misturam os custos do departamento de engenharia com os custos de muitos outros departamentos de serviços, abrangendo áreas tão diversas quanto compras, vigilância da fábrica e manutenção de equipamentos e instalações. Um denominador comum de bases muito amplas, como mão-de-obra direta, era usado para ratear todo o conjunto de custos indiretos e fabricação entre os vários produtos da empresa. Os métodos ABC, decerto, parecem ser mais preciosos em comparação com os métodos tradicionais mais ou menos grosseiros, baseados na mão-de-obra direta. A velha contabilidade de custos adotou a abordagem mais simplista de usar apenas uma taxa de rateio para efetuar um corte transversal único passando por todos os produtos. Atualmente, muitos teóricos da contabilidade gerencial acreditam que o processo tradicional de rateio dos custos indiretos de fabricação, redundavam em medidas unitárias enganosas do custo do produto. Ainda é um pouco cedo, na minha opinião, para afirmar com certeza os métodos de alocação da contabilidade de custos tradicional eram, em geral, enganadores. De início, o livro de Johnson e Kaplan foi recebido com muito entusiasmo, mas o tempo será o melhor juiz. Atualmente, todos querem acreditar que dispõem de melhores métodos de alocação - mais realistas e mais relevantes. De qualquer maneira, quaisquer que sejam as bases e métodos utilizados para a distribuição dos custos indiretos de fabricação, os gerentes devem estar cientes de que todos os critérios de rateio são arbitrários – e apenas uma questão de grau. Alguns produtos são favorecidos e outros são prejudicados, independentemente do método adotado. Os gerentes devem encarar as taxas de rateio dos custos indiretos de fabricação com uma boa base de desconfiança. É possível fazer com que um produto pareça menos rentável (ou até mesmo não lucrativo) ou mais rentável mediante a simples alteração do critério de rateio dos custos indiretos de fabricação. Ponto Final A análise do mix de vendas é muito importante no gerenciamento do lucro. Diferentes produtos apresentam diferentes margens de contribuição. Os gerentes devem analisar com cuidado se o atual mix de produtos da empresa pode ser melhorado por meio de trade-offs Estratégicos, principalmente deslocando os clientes de produtos de baixa margem para outros de alta margem. Da mesma maneira, é importante que os gerentes conheçam o impacto sobre o lucro decorrente de movimentos descendentes dos clientes na linha de produtos, ou seja, de produtos mais sofisticados para outros menos sofisticados. A multiplicidade de produtos acarreta um efeito colateral inevitável: as despesas fixas não podem ser associadas ou confrontadas diretamente com os diferentes produtos. Essas despesas fixas beneficiam uma ampla faixa ou linha de produtos, mas representam custos indiretos para qualquer um dos produtos individualmente considerados. A questão com que se depara a gerência é a conveniência de alocar essas despesas fixas comuns entre os diferentes produtos, para a determinação do lucro operacional de cada produto. É questionável se tal alocação contribuirá para o refinamento do processo decisório ou para a melhoria das estratégias de marketing. O fator crítico desse tipo de análise é o foco nas margens de contribuição antes das despesas fixas. Mas às vezes a alocação é necessária para outras finalidades. Em geral, os métodos de rateio são arbitrários e devem ser encarados com um ceticismo prudente, embora o novo método chamado custeio baseado em atividades (ABC) supere alguns dos limites dos métodos de distribuição tradicionais. Os fabricantes não dispõem de opções quanto aos custos indiretos de fabricação; tais custos devem ser alocados aos produtos fabricados no período, de acordo com algum método sistemático, para a determinação de todo o custo do produto por unidade, procedimento necessário para a avaliação do custo dos estoques e para a mensuração do custo das mercadorias vendidas. O Capítulo 17 trata da contabilidade industrial.