UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS POLÍTICAS E SOCIAIS – CEJURS CURSO DE DIREITO – NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA ASPECTOS SOCIAIS E PROCEDIMENTAIS DA ADOÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO SÔNIA MARIA COSTA DEMÉTRIO Orientador: Prof. MSc Marcelo Petermann Itajaí (SC), novembro de 2008 UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS POLÍTICAS E SOCIAIS – CEJURS CURSO DE DIREITO – NÚCLEO DE PRÁTICA JURÍDICA COORDENAÇÃO DE MONOGRAFIA ASPECTOS SOCIAIS E PROCEDIMENTAIS DA ADOÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO SÔNIA MARIA COSTA DEMÉTRIO Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. MSc Marcelo Petermann Itajaí (SC), novembro de 2008 iii Meus Agradecimentos: Primeiramente a Deus pelo seu infinito amor, que concedeu-me o dom da vida e a coragem para lutar em busca de meus objetivos. A todos os professores que além de mestres no transmitir seu saber, tornaram-se grandes amigos, dos quais jamais esquecerei. Ao meu esposo Manoel Américo Demétrio, pelo carinho e amor dedicado a mim. Aos meus filhos, Etiane Karina Demétrio e Manoel Américo Demétrio Junior, pelo carinho e compreensão. À minha nora Bianca Simas Reiser pelo carinho. À minha neta Helena Demétrio Bonato, por ser a alegria de minha vida. Às minhas grandes amigas Pamela Trogue, Priscila Camilo e Silvana Duarte Pércio, que sempre estiveram comigo, me incentivando a seguir em frente. A todos aqueles que deixei de mencionar, mas que de alguma forma contribuíram para a minha formação acadêmica. iv Dedico este trabalho: À minha mãe Aurelina Conceição da Silva Costa [in memorian] e ao meu pai Manoel Costa, que, mesmo sem o conhecimento do legislador, tiveram a sabedoria de me dar todo amor e carinho que um filho de coração precisa ter. Aos meus irmãos, Maria Adelaide Liandro, João Adilson Costa, Maria Aurelina C. Pinto, José Haroldo Costa, Tânia C. Nascimento e Gisele Aparecida C. Santiago, que sempre me dedicaram todo o amor que alguém pode querer de uma família. v O brocardo “dura lex, sed lex” não deve prevalecer, pois a norma não nasce para ser dura, mas sim justa. Maria Helena Diniz vi DECLARAÇÃO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. Itajaí (SC), 19 de novembro de 2008. Sônia Maria Costa Demétrio Graduanda vii PÁGINA DE APROVAÇÃO A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Sônia Maria Costa Demétrio, Demétrio sob o título Aspectos Sociais e Procedimentais da Adoção no Ordenamento Jurídico Brasileiro, foi submetida em 19 de novembro de 2008 à Banca Examinadora composta pelos seguintes Professores: Marcelo Petermann (Orientador e Presidente da Banca) e Fernanda Sell de Souto Goulart (Membro) e aprovada com a nota 0,00 (dez). Itajaí (SC), 19 de novembro de 2008. MSc. Marcelo Petermann Orientador e Presidente da Banca MSc Antônio Augusto Lapa Coordenação de Monografia viii ROL DE CATEGORIAS Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais. Adoção "[...] ato sinalagmático e solene, pelo qual, obedecidos os requisitos da Lei, alguém estabelece, geralmente com um estranho, um vínculo fictício de paternidade e filiação legítimas [...]" (CHAVES, 1994. p. 23). Adolescente "Pessoa em desenvolvimento, entre os 12 anos de idade completos e os 18 anos incompletos"1. Adotado "É toda pessoa que passa a integrar uma família por meio da adoção e cuja diferença de idade é de no mínimo dezesseis anos para com o adotante" (GONÇALVES, 2005. p. 343). Adotante "Qualquer pessoa maior de 18 (dezoito) anos, que possua condições morais e materiais de desempenhar a função de pai ou mãe de uma criança ou adolescente" (GONÇALVES, 2005. p. 343). Criança Criança é definida como toda pessoa até doze anos de idade 1 Cop. proposto por composição, com base no art. 2 do ECA, do Código Civil de 2002 e no art. l da Convenção sobre os Direitos da Criança da Assembléia Geral das nações Unidas. ix incompletos"2. Família "Há multiplicidade de conceitos da expressão 'família'. Ora significa o conjunto das pessoas que descendem de tronco ancestral comum, tanto quanto essa ascendência se conserva na memória dos descendentes; ou nos arquivos, ou na memória dos estranhos, ora o conjunto de pessoas ligadas a alguém, ou a um casal, pelos laços de consangüinidade ou de parentesco civil; ora o conjunto das mesmas pessoas, mais os afins apontados por lei; ora o marido e a mulher, descendentes e adotados; ora, finalmente, marido, mulher e parentes sucessíveis de um e de outra" (MIRANDA, 2001. p. 47). Guarda É o instituto jurídico pelo qual alguém, parente ou não, assume a responsabilidade de prestar assistência material, moral e educacional a determinado menor (SILVA, 1995, p. 158) Poder Familiar "É o complexo de direitos e deveres quanto à pessoa do filho, exercidos pêlos pais na mais estreita colaboração, e em igualdade de condições" (FIÚZA, 2005, p. 936-937). Tutela Ligação mais forte que a guarda (o tutor assume o lugar dos pais como representante jurídico do menor, assim como em todas as obrigações a ele referentes (MARINHO; MARINHO JUNIOR, 2006, p. 1). 2 BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente: Lei n. 8.069, de 13/07/1990, São Paulo: Saraiva, 2005. x SUMÁRIO RESUMO......................................................................................................................... xiii RESUMO INTRODUÇÃO ................................................................................................................14 Capítulo 1 A FAMÍLIA 1.1 ESCORÇO HISTÓRICO............................................................................................17 HISTÓRICO 1.2 CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA DA FAMÍLIA .................................................21 1.3 ESPÉCIES DE FAMÍLIA ..............................................................................................23 1.3.1 Família Matrimonial.............................................................................................23 Matrimonial 1.3.2 União Estável........................................................................................................24 Estável 1.3.3 Concumbinato ....................................................................................................25 1.3.4 União Homoafetiva.............................................................................................26 Homoafetiva 1.3.5 Família Monoparental ........................................................................................26 1.3.6 Família Substituta.................................................................................................27 Substituta 1.4 DO PODER FAMILIAR ..............................................................................................29 1.4.1 Extinção, Suspensão e Perda do Poder Familiar ...........................................31 1.5 MODALIDADES DE COLOCAÇÃO DE MENOR EM FAMÍLIA SUBSTITUTA .........36 1.5.1 A Guarda..............................................................................................................36 Guarda 1.5.2 Tutela.....................................................................................................................37 Tutela 1.5.3 Adoção.................................................................................................................38 Adoção Capítulo 2 ADOÇÃO 2.1 ABORDAGEM HISTÓRICA ......................................................................................40 xi 2.2 CONCEITO ...............................................................................................................43 2.3 NATUREZA JURÍDICA...............................................................................................45 JURÍDICA 2.4 ESPÉCIES DE ADOÇÃO ..........................................................................................47 2.4.1 Adoção Unilateral...............................................................................................47 Unilateral 2.4.2 Adoção de Maiores ...........................................................................................49 2.4.3 Adoção Internacional........................................................................................52 Internacional 2.4.4 Adoção Póstuma ................................................................................................54 2.4.5 Adoção “à brasileira” ou afetiva .....................................................................55 2.4.6 Adoção Intuitu “personae” “personae”...............................................................................56 personae” 2.4.7 Adoção Homoparental .....................................................................................57 2.4.8 Filho de “criação”...............................................................................................61 “criação” 2.4.9 Adoção de Nascituro.........................................................................................62 Nascituro 2.5 PARALELO ENTRE AS NORMAS DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E DO CCB/2002 NO TOCANTE À ADOÇÃO ...................................63 Capítulo 3 ASPECTOS PROCEDIMENTAIS DA ADOÇÃO 3.1 PROCEDIMENTOS PARA ADOÇÃO ......................................................................69 3.1.1 Requisitos ..............................................................................................................69 3.1.2 Cadastramento e documentação .................................................................76 3.1.3 Aspectos formais do processo de adoção ....................................................82 3.1.4 A sentença judicial .............................................................................................85 3.2 ORGÃOS ENVOLVIDOS NO PROCEDIMENTO DE ADOÇÃO NO ESTADO DE SANTA CATARINA....................................................................................................86 CATARINA 3.2.1 CEJA - Comissão Estadual Judiciária de Adoção ........................................86 3.2.2 CUIDA - Cadastro Único Informatizado de Adoção e Abrigo ....................88 3.3 O PAPEL SOCIAL DA ADOÇÃO ............................................................................89 xii CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................................94 FINAIS REFERÊNCIAS DAS FONTES CITADAS ........................................................................100 RESUMO A presente monografia trata dos aspectos sociais e procedimentais da adoção no ordenamento jurídico brasileiro. O trabalho foi divido em três capítulos. No primeiro foi tratado sobre a família, com uma abordagem em seu histórico, seu conceito, sua natureza jurídica, espécies, abordando, ainda a respeito da colocação do menor em família substituta. Já o segundo capítulo tratou do instituto da adoção, abordando seu conceito, lineamentos históricos, espécies, natureza jurídica, bem como estabeleceu um paralelo entre o contido no Estatuto da Criança e do Adolescente e no Código Civil a respeito do tema. E finalmente, tratou o terceiro dos aspectos procedimentais da adoção, elencando os requisitos necessários à adoção, a forma como se dá este processo, abordando, ao final, acerca do papel social deste instituto. 14 INTRODUÇÃO O presente trabalho monográfico foi elaborado com a perspectiva de fazer uma breve análise do instituto da adoção no Direito Brasileiro, com um enfoque em seus aspectos sociais e procedimentais. O tema escolhido justifica-se em razão do avanço da discussão desse tema na atualidade, haja vista os vários órgãos criados, a exemplo do CUIDA e do CEJA, no estado de Santa Catarina, com o objetivo de desburocratizar o processo de adoção e facilitar o acesso dos pretendentes aos menores que aguardam um lar. A investigação tem como objeto os aspectos procedimentais da adoção no ordenamento jurídico brasileiro. Tem como objetivos investigatórios: geral, analisar o instituto da adoção no ordenamento jurídico brasileiro; e, específicos: a) traçar a origem e evolução histórica da instituição familiar no sistema jurídico brasileiro; b) analisar o instituto de adoção e as suas espécies, à luz do Direito Civil e do Estatuto da Criança e do Adolescente; e, c) verificar como ocorre o processo de adoção, bem como o seu papel social na atualidade. O objetivo institucional, por sua vez, consiste na produção de Monografia para a obtenção do título de Bacharel em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí. Os problemas de pesquisa estabelecidos, em razão do objetivo investigatório inicialmente traçado, foram os seguintes: a) Qual a visão que se tem da instituição familiar, na atualidade, diante das mudanças advindas do progresso das sociedades? b) Quais as principais mudanças observadas acerca do instituto da adoção no decorrer da sua evolução histórica? c) Quais as principais dificuldades que o processo de adoção tem sofrido e qual o seu papel social na atualidade? Diante dos problemas formulados, foram aventadas as 15 seguintes hipóteses, podendo estas se confirmar ou não no decorrer da pesquisa a ser realizada: a) A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 trouxe muita inovação ao ordenamento jurídico ao estabelecer um cunho sócioafetivo à instituição familiar, legitimando novas formas de família, a qual passou a ter um papel diferente do costumeiro na sociedade, a saber, a chamada família matrimonial, e que, por conseqüência, fazia com que as demais formas existentes fossem discriminadas e, até, impossibilitadas de receber tal denominação. b) A evolução da adoção acompanhou os anseios da sociedade, passando, daquela forma arcaica de se perpetuar o culto doméstico, ou como forma de manutenção do culto familiar pela linha masculina para uma forma mais afetiva, na qual se busca a união de pessoas para formar uma família. c) O processo de adoção, apesar de ser gratuito e contar com um procedimento relativamente simples tem encontrado dificuldades devido à falta de pessoal preparado para atuar nas Varas da Infância, tais como assistentes sociais, psicólogas, etc, as quais, sendo essenciais ao desenvolvimento desse processo, por vezes se vêem abarrotadas de trabalho, o que faz com que o estudo psicossocial se torne demorado. Outro ponto que também merece destaque na prejudicialidade da adoção é a preferência que os casais têm por filhos recém nascidos, brancos e sem problemas de saúde, o que causa demora na fila de espera e deixa à margem da esperança aquelas crianças que não possuem o perfil desejado. No intuito de alcançar respostas aos problemas da pesquisa, com a confirmação ou não das hipóteses inicialmente traçadas, esta Monografia será dividida em três capítulos distintos. O primeiro destinar-se-á a tecer considerações acerca da origem e evolução histórica da instituição familiar, apresentar seu conceito, bem como sua natureza jurídica. 16 Tratar-se-á, ainda, acerca das espécies de famílias existentes e, ao final, fará uma abordagem a respeito da questão da colocação do menor em família substituta. No segundo capítulo será feita uma análise do instituto da adoção, abordando seu conceito, origem e evolução histórica. Abordar-se-á, também, acerca da sua natureza jurídica e espécies de adoção admitidas no ordenamento jurídico brasileiro. Ao final deste capítulo será feito um estabelecimento de um paralelo entre o contido no Estatuto da Criança e do Adolescente e no Código Civil a respeito do tema. Finalmente, o terceiro capítulo será destinado a tratar dos aspectos procedimentais da adoção, elencando os requisitos necessários ao deferimento de tal instituto, buscando-se, ainda, trazer de forma sucinta, a forma como se dá o processo de adoção. Ao final, far-se-á uma breve abordagem acerca do aspecto social da ação, diante do seu atual quadro. Nas considerações finais apresentam-se breves sínteses de cada capítulo e se demonstram se as hipóteses básicas da pesquisa foram ou não confirmadas. Para encetar a investigação foi utilizado o método indutivo, a ser operacionalizado com as técnicas do referente, das categorias, dos conceitos operacionais e da pesquisa de fontes documentais, resultando em uma fonte de pesquisa para os operadores do direito. 17 Capítulo 1 A FAMÍLIA 1.1 ESCORÇO HISTÓRICO A família sempre foi um dos pilares da sociedade, e com o passar dos tempos foi acompanhando a evolução desta e transformando-se gradativamente. Vale ressaltar que, como instituição sustentadora das sociedades, a família sempre teve seu valor na busca por uma proteção, onde o indivíduo, nos tempos primitivos, valia-se desta para defender-se dos perigos então existentes. Nesse sentido, afirma Ribeiro (2002, p. 1) que nas primeiras famílias, a segurança proporcionada pelo grupo organizado, ainda que de forma primitiva aos seus membros, era muito mais relevante que a consangüinidade, exercendo, assim, uma função de protetora contra as agressões externas. Também Silva (1995, p. 5), ao discorrer sobre o assunto, expõe que: Toda sociedade encontra ou deveria encontrar na família o seu ponto de partida. A família é a célula-mãe da sociedade; é o espelho sem o qual a sociedade não poderá prosseguir seu caminho rumo ao bem comum. A evolução da família aconteceu gradativamente, passando da “família coletiva”, aquela que proporcionava segurança a todos os membros do clã à “família individual”, onde os indivíduos passaram a se mentar unidos pela consangüinidade. Destarte, explica Friedrich Engels, apud Venosa (2005, p. 18) que "no estado primitivo das civilizações o grupo familiar não se assentava em relações individuais". As relações sexuais ocorriam entre 18 todos os membros que integravam a tribo, ocorrendo a chamada endogamia3, de modo que sempre a mãe era conhecida, porém se desconhecia o pai. Acrescenta Rizzardo (2005, p. 10) que numa fase primitiva havia uma certa promiscuidade, não ocorrendo as uniões reservadamente. Mais adiante, tornou-se costumeiro o rapto, que se efetivava como um ato de força, iniciando-se a união com a apreensão da mulher pelo homem, ficando ela submetida a seu domínio. Consoante Venosa (2005, p. 19): [...] com o desenvolvimento das sociedades, o curso da história se encarregou de encaminhar a humanidade para as relações individuais, com caráter de exclusividade, atingindo-se a organização atual de inspiração monogâmica. Para Venosa (2005, p. 19), essa forma de relação monogâmica4 desempenhou papel importante em benefício da prole, ensejando o exercício do poder paterno, convertendo-se em um fator econômico de produção, pois restringiu-se quase exclusivamente ao interior dos lares, nos quais existiam pequenas oficinas, vindo essa situação se reverter somente com a revolução industrial que fez surgir um novo modelo de família. Sobre essa condição Pereira (2004, p. 24) assevera que [...] pelos registros históricos, pelos monumentos literários, pelos fragmentos jurídicos, tem-se que a família ocidental viveu largo período sob a forma patriarcal. Nesse sentido Wald (2002, p. 9) esclarece que em Roma, a família era definida como um conjunto de pessoas que estavam 3 União matrimonial entre indivíduos da mesma raça ou família. 4 Estado ou condição de ter uma só esposa. 19 sob a pátria potestas do ascendente comum vivo mais velho. O pater famílias administrava a justiça dentro dos limites da casa, e, na primeira fase do direito romano, a família era uma unidade política. Para Wald (2002, p. 10): [...] o pater era uma pessoa sui juris, independente, chefe dos seus descendentes, e estes eram alieni juris, sujeitos a autoridade alheia. Explica Venosa (2005, p. 21), que na Idade Média, as relações familiares se regiam exclusivamente pelo Direito Canônico, sendo o casamento considerado um dogma da religião doméstica. Nesse sentido, Varjão (1999, p. 7), afirma que: A família deixou de constituir uma unidade política, transformando-se em uma comunidade natural, que compreendia apenas as pessoas ligadas entre si pelo casamento e pelos laços de procriação. Consoante Pereira (2004, p. 28), atualmente pode ser verificada uma mudança drástica no entendimento sobre o que vem a constituir a família, haja vista que nos últimos tempos, as relações familiares foram necessariamente atingidas entre pais e filhos, entre os diversos membros do grupo familiar, desaparecendo a organização patriarcal, que vigorou por todo século XX, não apenas no direito, mas, sobretudo nos costumes. No entendimento de Venosa (2005, p. 22), a escola e outras instituições de educação, esportes e recreação preenchem atividades dos filhos que originalmente eram de responsabilidade dos pais, ampliando assim, o rol de responsáveis por desempenhar um papel de condutor da criação do indivíduo. Além disso, assevera Venosa (2005, p. 22), que outras situações são advindas dessa revolução, tais como a industrialização, que 20 transformou drasticamente a composição da família, restringindo o número de nascimentos nos países mais desenvolvidos, além de trazer conflitos sociais diversos gerados pela nova posição social dos cônjuges, as pressões econômicas, a desatenção e o desgaste das religiões tradicionais, que fazem aumentar o número de divórcio, entre outros, de modo que "a unidade familiar, sob o prisma social e jurídico, não mais tem como baluarte exclusivo o matrimônio". Nesse contexto - afirma Venosa (2005, p. 23) - a nova família estrutura-se independentemente das núpcias, casais homoafetivos vão paulatinamente obtendo reconhecimento judicial e legislativo, filhos são reconhecidos através de realização de exame de DNA5, ou havidos depois do falecimento do pai, entre outros fatores que levam o jurista a se defrontar com um novo direito de família, que contém surpresas e desafios trazidos pela ciência. Apesar de toda essa evolução, verifica-se que a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que teve um importante papel na evolução de muitos conceitos, entre eles, segundo Boscaro (2002, p. 77) o destaque que esta deu ao instituto da família, ao estatuir que ela "é a base da sociedade, tem especial proteção do Estado (artigo 2266)". Há que se salientar, ademais, que o artigo 227 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 também foi de alta relevância na revisão de antigos conceitos trazidos pela sociedade ao longo dos anos, in verbis: Art. 227. É dever da família, da sociedade e do estado assegurar criança e ao adolescente, com absoluta 5 O ácido desoxirribonucleico (ADN, em português: ácido desoxirribonucleico; ou DNA, em inglês: deoxyribonucleic acid), é um composto orgânico cujas moléculas contêm as instruções genéticas que coordenam o desenvolvimento e funcionamento de todos os seres vivos e alguns vírus. O ADN é responsável pela transmissão das características hereditárias de cada espécie de ser vivo. 6 Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. 21 prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Através da leitura deste artigo vê-se que atualmente o Estado dá prioridade à preservação da família, como forma de assegurar à criança e ao adolescente um desenvolvimento sadio e pleno. Vê-se, ainda, que apesar dos avanços e modernidades em torno de família, esta ainda é alvo de proteção da sociedade como um todo. 1.2 CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA DA FAMÍLIA Atualmente, diante da diversidade existente acerca do que poderia ser conceituada como “família”, faz-se necessário abordar alguns dos diversos entendimentos apresentados pelos doutrinadores acerca do tema. Para Venosa (2005, p. 18), é importante: [...] considerar a família em conceito amplo, como parentesco, ou seja, o conjunto de pessoas unidas por um vínculo jurídico de natureza familiar. [...] Em conceito restrito, família compreende somente o núcleo formado por pais e filhos que vivem sob o pátrio poder ou poder familiar. Também adepto desse entendimento, Varjão (1999, p. 5) assevera que o vocábulo família pode ser empregado em dois sentidos. Em sentido amplo, designa o conjunto de pessoas descendentes de um tronco comum. Em sentido estrito, abrange o casal e seus filhos. Esse conceito estrito possui guarida na Constituição da 22 República Federativa do Brasil de 1988, que reza, em seu art. 226, § 4º que “entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”. Pereira (2004, p. 19), por sua vez, entende que "em sentido genérico e biológico, considera-se a família o conjunto de pessoas que descendem de tronco ancestral comum", assim, num significado amplo, engloba, além dos cônjuges e da prole, os parentes colaterais até determinado grau, como tios, sobrinhos, primos, e os parentes por afinidade - sogros, genros, noras e cunhados. Já num conceito sociológico, conforme Venosa (2005, p. 18), a família pode ser integrada pelas pessoas que vivem sob o mesmo teto, sob a autoridade de um particular. Já no entendimento de Rizzardo (2005, p. 10): No sentido atual, a família tem um significado estrito, constituindo-se pelos pais e filhos, apresentando certa unidade de relações jurídicas, com idêntico nome e o mesmo domicílio e residência, preponderando identidade de interesses materiais e morais, sem expressar, evidentemente uma pessoa jurídica. No sentido amplo, amiúde empregado, diz respeito aos membros unidos pelos laços sanguíneos, constituída pelos pais e filhos, nestes incluídos os ilegítimos ou naturais e os adotados. Entende-se que, mesmo possuindo a família um conceito amplo ou restrito, nos dias atuais nenhum desses conceitos pode ser aceito como o mais amplo ou mais acertado, haja vista a diversidade de espécies de família agora existentes, sendo certo apenas que esta compreende o grupo de pessoas que se mantêm unidas pelos laços de sangue ou afinidade. Venosa (2005, p. 25) assevera que a doutrina tem conceituado a família como uma instituição, sendo essa definição enunciada na França por Maurice Hauriou, repetida por muitos juristas. 23 Porém, na visão desse autor, trata-se de um conceito vago e impreciso, haja vista que como instituição, a família é uma coletividade humana subordinada à autoridade e condutas sociais e uma instituição deve ser compreendida como uma forma regular, formal e definida de realizar uma atividade. Ressalta, ainda, Venosa (2005, p. 24), que a família não deve ser considerada uma pessoa jurídica, pois lhe falta aptidão e capacidade para usufruir direitos e obrigações. A família nunca é titular de direitos. Seus titulares serão sempre seus membros individualmente considerados. Para Menezes (2008, p. 1) a família não é pessoa física pois é formada por vários indivíduos; também não é pessoa jurídica porque exigiria previsão em lei (art. 44). Família assim não tem personalidade jurídica, não podendo ser parte numa relação jurídica, podendo, assim, ser tratada somente como uma instituição, pois como diz a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em seu art. 226 é a base da sociedade. 1.3 ESPÉCIES DE FAMÍLIA Atualmente, com o desenvolvimento da sociedade, várias são as espécies de famílias que foram surgindo. Abaixo transcrevese alguns conceitos principais sobre cada uma delas. 1.3.1 Família Matrimonial Uma das espécies existentes é a tradicional família matrimonial, aquela derivada do casamento. Exemplo disso é que no Código Civil Brasileiro de 1916, a "família instituição" encontrava-se 24 diretamente atrelada ao casamento. Para Borda, apud Venosa, 2005, p. 43, o casamento, derivado dessa forma familiar, pode ser conceituado como “a união do homem e da mulher para o estabelecimento de uma plena comunidade de vida”. Pinheiro (2005, p. 1) enfatiza que a família matrimonial é o modelo mais tradicional e resultou da concepção patriarcal de família na qual a mulher e os filhos não ocupavam posição de destaque, além de estarem submetidos à autoridade do chefe da família representado pelo pater familias. 1.3.2 União Estável Outra espécie, já decorrente da inovação trazida pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em seu art. 226, § 3º7 é a união estável. Rizzardo (2005, p. 885), explica que a expressão união estável corresponde à ligação permanente do homem com a mulher, fundada em dois elementos: a comunhão de vida e a comunhão material e também a relação conjugal exclusiva de direitos e deveres inerentes ao casamento. Diniz (2002, p. 366), esclarece que a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, ao conservar a família, fundada no casamento, reconhece como entidade familiar, a união estável, a convivência pública, contínua e duradoura de um homem com uma mulher, vivendo ou não sob o mesmo teto, sem vínculo matrimonial, estabelecida com o objetivo de constituir família, desde que tenha condições de ser convertida em casamento, por não haver impedimento 25 legal para sua convolação. É interessante ressaltar que a legislação não coloca a união estável em posição de inferioridade, mas a compara com o próprio casamento, como sendo uma união verdadeira, possuidora de direitos e obrigações. 1.3.3 Concubinato Outra espécie de família é aquela decorrente do concubinato, apesar de o Código Civil Brasileiro, em seu art. 1727, asseverar que "as relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato". Porém, pelo que se observa na doutrina, não se trata de nenhuma inovação no ordenamento jurídico. Na Antiguidade, a família era constituída por meio de celebrações religiosas ou por meio de uma simples convivência. Nesse sentido, Pereira (2006, p. 533), afirma que o concubinato existiu em todos os tempos e em todas as civilizações, repercutindo necessariamente na vida jurídica. Há que se esclarecer, no entanto, conforme afirma Azevedo (2002, p. 8), que o concubinato pode ser visto de duas formas: em sentido amplo e restrito. Pelo sentido amplo ou lato, significa todo e qualquer relacionamento sexual livre; pelo sentido estrito, é a união duradoura, constituindo a sociedade familiar de fato, com affectio societatis, respeito e lealdade recíprocos. 7 Art. 226. [...] § 3º. Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua 26 1.3.4 União homoafetiva No entendimento de Lisboa (2006, p. 277), uniões homoafetivas são as relações íntimas entre pessoas do mesmo sexo que possuem afeição semelhante, ainda que com orientação sexual diversa. Rizzardo (2005, p. 922-923), expõe que alguns países, como a Suécia, Noruega e Dinamarca já admitem o casamento entre homossexuais. No entanto, o direito brasileiro não contempla essa forma de relação, admitindo o art. 226, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, a união estável como entidade familiar desde que entre homem e mulher, não reconhecendo, pois, as uniões homossexuais. Nesse sentido, acrescenta Venosa (2005, p. 456) que enquanto não houver aceitação social majoritária das uniões homoafetivas no Brasil, que se traduza em uma possibilidade legislativa, as uniões de pessoas do mesmo sexo devem gerar apenas reflexos patrimoniais relativos às sociedades de fato. 1.3.5 Família monoparental Na atualidade, diante das situações ocasionadas pelas separações, relações extra-matrinomiais, também as chamadas “produções independentes”, etc., esta forma de família tem se tornado cada vez mais comum. Nesse sentido, expõe Varjão (1999, p. 10) a família monoparental é freqüentemente resultado da livre decisão de pessoas que buscam a prole concebida por meios artificiais ou obtida por adoção. Lisboa (2006, p. 291) ressalta que: Relação monoparental é a entidade familiar constituída por conversão em casamento. 27 uma ascendente e o seu descendente. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 expressamente reconhece a relação monoparental entre o ascendente e qualquer de seus descendentes, e assim o fez com intuito de proteção de interesses da entidade familiar existente entre a mãe solteira e sua prole, o pai solteiro e sua prole, e o avô ou avó e seu neto ou neta. Assevera, ainda, Leite (1998, p. 48), que essa forma de família decorre não só da vontade unilateral de assumir sozinho uma paternidade ou uma maternidade, como ocorre no caso típico de "mães solteiras", por exemplo, mas pode resultar também de circunstâncias alheias à vontade humana (separação, divórcio, morte), o que torna a questão ainda mais complexa. Diante do atual panorama vivido pela sociedade, pode-se dizer que a família monoparental que já foi considerada minoritária, tornou-se freqüente, exigindo muita atenção dos operadores do direito. 1.3.6 Família substituta Família natural é aquela formada pelos pais ou por qualquer deles e seus descendentes, de acordo com o artigo 258 do Estatuto da Criança e do Adolescente. É aquela família, conforme afirma Silva (1995, p. 6): [...] como o próprio nome sugere, é a que encontra o seu ponto de partida na família biológica, ou seja, na família constituída de ascendentes e descendentes, unidos por laços de consanguinidade. Art. 25. Entende-se por família natural a comunidade formada pelos pais ou por qualquer deles e seus descendentes. 8 28 Rizzardo (2005, p. 563), por seu turno, explica que em contraposição esta família, que possui seus membros ligados por laços de sangue, existe a família substituta que é considerada em relação ao menor que nela ingressa, em geral sem qualquer laço de parentesco e afinidade com os demais membros . A despeito da família substituta, o Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu art. 29, reza que: Art. 29. Não se deferirá colocação em família substituta a pessoa que revele, por qualquer modo, incompatibilidade com a natureza da medida ou não ofereça ambiente familiar adequado. Para Silva (1995, p. 6), com a leitura deste artigo verifica-se que a "própria lei não põe em pé de igualdade a família substituta, dando realce à primeira". No entanto, não se pode dar a esta forma de família caráter diminuto, pois, há determinadas situações em que o menor precisa ser retirado de sua família natural e colocado em outra família, a família substituta, até mesmo para protegê-los de situações de risco. Nestes casos, onde a permanência da criança junto à família natural poderá colocá-la em risco de danos físicos, morais, psicológicos, entre outros, o Estado, por meio do Poder Judiciário, poderá destituir os pais do poder familiar, com o conseqüente encaminhamento à colocação em família substituta. Existem três formas para se efetuar a colocação de um menor neste tipo de família, de acordo com o art. 28 do Estatuto da Criança e do Adolescente9: a guarda, a tutela e a adoção, as quais serão tratadas pormenorizadamente na próxima subseção, porém, antes, faz-se 9 Art. 28. A colocação em família substituta far-se-á mediante guarda, tutela ou adoção, independentemente da situação jurídica da criança ou adolescente, nos termos desta Lei. 29 necessário esclarecer o que vem a ser o chamado Poder Familiar e sob que condições uma pessoa pode perdê-lo. 1.4 DO PODER FAMILIAR Consoante Monteiro (2003, p. 277), o poder familiar é "o conjunto de obrigações, a cargo dos pais, no tocante à pessoa e bens dos filhos. Por sua natureza é indelegável". Já Rodrigues (2002, p. 353) conceitua esse instituto como sendo "o conjunto de direitos e deveres atribuídos aos pais, em relação à pessoa e aos bens dos filhos não emancipados, tendo em vista a proteção destes". A expressão “poder familiar” foi trazida pelo Código Civil Brasileiro de 2002 em substituição, ao antes chamado “pátrio poder”. Para Venosa (2005, p. 333), trata-se de instituto que se alterou bastante no curso da história, acompanhando, em síntese, a trajetória da história da própria família. No Direito Romano a noção de pátrio poder era fundada na idéia de que o pai tinha autoridade absoluta sobre a pessoa de seus filhos. Com a mudança na situação familiar, essa definição também sofreu modificações, mormente com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que consolidou, em seu artigo 226, § 5º10 a igualdade de direitos e deveres entre marido e mulher na sociedade conjugal. O Estatuto da Criança e do Adolescente também já havia tratado a matéria seguindo a igualdade do texto constitucional, em 10 Art. 226. (...) § 5°. Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher. 30 seu artigo 2111, ao dizer que o pátrio poder será exercido em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe. Assim, seguindo essa linha de igualdade entre os pais, o artigo 1.634 do Código Civil Brasileiro reza que: Art. 1.634. Compete aos pais, quanto à pessoa dos filhos menores: I - dirigir-lhes a criação e educação; II - tê-los em sua companhia e guarda; III - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem; IV - nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar; V - representá-los, até aos dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento; VI - reclamá-los de quem ilegalmente os detenha; VII - exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição. Rizzardo (2005, p. 897) assevera, sobre essa igualdade, que nos dias de hoje, preponderam direitos e deveres numa proporção justa e equânime no convívio familiar, os filhos não são mais vistos como esperança de futuro auxílio aos pais. O poder familiar não é o exercício de uma autoridade, mas de um encargo imposto pela paternidade e modernidade, decorrente da lei. Nesse norte, conforme afirma Santos, apud Venosa (2005, p. 335): O poder paternal já não é, no nosso direito, um poder e já não é, estrita e predominantemente, paternal. É uma 11 Art. 21. 21 O pátrio poder será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência. 31 função, é um conjunto de poderes-deveres, exercidos conjuntamente por ambos os progenitores. Não restam dúvidas, pois, de que tal instituto serve de proteção para a criança e o adolescente, na medida em que confere aos pais a possibilidade de impedir ações capazes de prejudicar os filhos, praticadas pelos próprios filhos, ou por outras pessoas, ou mesmo pelos próprios pais ou responsáveis, por falta, omissão ou abuso. Venosa (2005, p. 339) salienta, apenas, que, enquanto menores, todos os filhos estão sujeitos ao poder familiar, que pela ordem constitucional já não podem ser distinguidos por legítimos, ilegítimos ou adotivos, e lembra, que, ainda que a guarda seja confiada a terceiros, os pais não o perdem, sendo que aquela apenas absorve alguns aspectos deste. 1.4.1 Extinção, suspensão e perda do poder familiar Consoante Venosa (2005, p. 347), como o poder familiar é um múnus que deve ser exercido fundamentalmente no interesse do filho menor, o Estado pode interferir nessa relação. De acordo com o disposto no artigo 24 do Estatuto da Criança e do Adolescente, a suspensão do poder familiar ocorrerá nas hipóteses previstas na legislação civil e em casos de descumprimento injustificado dos deveres e obrigações colocadas pelo artigo 2212 do mesmo Estatuto, quais sejam, o dever de guarda e educação dos filhos menores e a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais, no interesse da criança. Assim, reza referido artigo que: 12 Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, o obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais. 32 Art. 24. A perda e a suspensão do pátrio poder serão decretadas judicialmente, em procedimento contraditório, nos casos previstos na legislação civil, bem como na hipótese de descumprimento injustificado dos deveres e obrigações que a alude o art. 22. Da mesma forma, o Código Civil Brasileiro confere os motivos autorizadores da aplicação da pena de suspensão e do poder familiar. Explica Venosa (2005, p. 348) que a suspensão do poder familiar é decretada pela autoridade judiciária, após apuração de conduta grave. O pedido de suspensão pode ser feito por algum parente ou pelo Ministério Público, ou mesmo de ofício. Nesse sentido, o artigo 163713 fala da penalidade nos casos de abuso de autoridade, falta do cumprimento dos deveres ou ruína dos bens dos filhos de forma genérica, deixando, assim, a interpretação de tais casos a critério do juiz. A respeito do assunto Silva (1995, p. 158) afirma que: [...] sempre que os genitores, dolosa ou culposamente, deixarem de cumprir as tarefas impostas pela legislação específica, no caso o Estatuto e o Código Civil, ficarão implacavelmente sujeitos às penas de suspensão dos direitos / deveres do pátrio poder. Silva (1995, p. 158) ainda exemplifica algumas situações ensejadoras da aplicação da pena de suspensão e destituição do poder familiar: a) deixar os pais de fornecer alimentação adequada ao filho; b) não o matricular o filho na rede de ensino público ou particular; c) não 13 Art. 1637. Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres à eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe apreça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha. 33 supervisionar o filho nas atividades curriculares; d) deixar de apurar a razão de o filho apresentar faltas seguidas durante o ano letivo; e) se mostrar completamente alheios ou indiferentes ao péssimo círculo de amizades granjeado pelo filho; f) dilapidar o patrimônio do menor. Há que se ressaltar, no entanto, que os exemplos de suspensão acima citados, não se exaurem nestes, abarcando também várias outras situações. A suspensão, então, ocorre nos casos previstos no artigo 1.637 do Código Civil Brasileiro e visa preservar os interesses do filho menor enquanto perdura a causa de suspensão. Também ocorre a suspensão no caso de condenação do pai ou mãe, por sentença irrecorrível, em crime cuja pena exceda a 2 (dois) anos de prisão (art. 1.637, parágrafo único, do Código Civil Brasileiro). Acrescenta Venosa (2005, p. 350), que, uma vez suspenso o poder familiar, perde o genitor todos os direitos em relação ao filho, inclusive usufruto legal. Se houver motivos graves, a autoridade poderá decretar liminarmente a suspensão do poder familiar, dentro do poder geral de cautela. Enfatiza Venosa (2005, p. 350) que a suspensão é medida menos grave do que a destituição ou perda, porque cessados os motivos que a gerou pode ser restabelecido o poder paternal. A extinção do poder familiar, nos termos do artigo 1.63514 do Código Civil Brasileiro, ocorre pela morte dos pais ou do filho, pela emancipação (art. 5°, parágrafo único15), pela maioridade, pela 14 15 Art. 1.635. Extingue-se o poder familiar: I - pela morte dos pais ou do filho; II - pela emancipação, nos termos do art. 5o, parágrafo único; III - pela maioridade; IV - pela adoção; V - por decisão judicial, na forma do artigo 1.638. Art. 5º. A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil. 34 adoção, pela perda decretada por decisão judicial (art. 1.63816), em se tratando de filho menor, acarreta nomeação de um tutor. Venosa (2005, p. 348) afirma que: A morte de um dos pais não faz cessar o poder familiar, que remanesce na pessoa do genitor sobrevivente. Também isto não ocorre se um dos genitores contrair novas núpcias ou estabelecer união estável em relação aos filhos havidos na relação anterior, exercendo-os sem qualquer interferência do novo cônjuge ou companheiro. A emancipação é a forma normal de extinção do poder familiar, pois atribui ao filho a capacidade de direito. Quanto à adoção, qualquer que seja a modalidade, ela extingue o poder familiar da família original, que passa a ser exercida pelo adotante, alertando, Venosa (2005, p. 348), nesse caso, que o poder familiar aí não é extinto, mas sim transferido. A perda decretada por sentença judicial, ocorre nos casos de castigo imoderado aos filhos, abandono, prática de ato contrário à moral e aos bons costumes e incidência reiterada nas faltas ao artigo 1.637, conforme redação do art. 1638 do Código Civil Brasileiro. Venosa (2005, p. 350) salienta que: Parágrafo único. Cessará, para os menores, a incapacidade: I - pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver dezesseis anos completos; II - pelo casamento; III - pelo exercício de emprego público efetivo; IV - pela colação de grau em curso de ensino superior; V - pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que, em função deles, o menor com dezesseis anos completos tenha economia própria. 16 Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que: I - castigar imoderadamente o filho; II - deixar o filho em abandono; III - praticar atos contrários à moral e aos bons costumes; IV - incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente. 35 [...] os fatos graves relatados na lei devem ser examinados caso a caso. Sevícias, injúrias graves, entrega do filho à delinqüência ou sua facilitação, entrega da filha à prostituição, etc, são sérios motivos que devem ser corretamente avaliados pelo juiz. Abandono não é apenas o ato de deixar o filho sem assistência material: abrange também a supressão de apoio intelectual e psicológico. Convém ressaltar que o Estatuto da Criança e do Adolescente traz expressamente em seu artigo 23 que "a falta ou carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente à perda ou à suspensão do pátrio poder", de modo que a insuficiência de recursos, por si só, não tem o condão de retirar dos pais, ou de um deles, o poder familiar. A respeito da destituição e da suspensão, acrescenta Rodrigues (2002, p. 359) que: [...] estas constituem menos um intuito punitivo dos pais e mais um ato em prol dos menores, que ficam afastados da presença nociva e, uma vez decretada a perda do poder familiar a um dos genitores, o outro passa a exercê-lo isoladamente, salvo se não houver condições, caso em que deverá ser nomeado um tutor ao menor. Importante salientar, ademais, que a suspensão, extinção ou perda do poder familiar não se limita aos pais biológicos, equiparando-se os pais adotivos, em tudo, aos pais verdadeiros, pois estes têm as mesmas obrigações para com os filhos e, se não o fizerem, estão sujeitos à destituição do poder familiar. Pelo que se observa, a perda dos direitos dos pais sobre a criança só acontece por motivo de falta gravíssima, haja vista que retirar uma criança do convívio de seus pais é um processo muito delicado, e, antes de tal ocorrência, necessário se faz que todos os recursos de atendimento médico, psicológico e social tenham sido tentados. 36 1.5 MODALIDADES DE COLOCAÇÃO DE MENOR EM FAMÍLIA SUBSTITUTA 1.5.1 A guarda A guarda é a modalidade mais simples de colocação em família substituta, porém não retira o poder familiar dos pais biológicos. Nas palavras de Silva (1995, p. 158): É o instituto jurídico pelo qual alguém, parente ou não, assume a responsabilidade de prestar assistência material, moral e educacional a determinado menor. Assim, dá-se a guarda quando o menor vive em companhia de outras pessoas que não os pais, ou ajuda em caso de separação e divórcio, em que o menor viverá em companhia de apenas um deles (o que tiver a guarda). Rizzardo (2005, p. 565) escreve que a guarda envolve certa autoridade ou um poder de controle, na pessoa e na conduta do menor. Ela também assegura o direito de estabelecer seu domicílio legal. Por sua vez, Viana (1996 p. 28), entende que: A guarda não é da essência, mas da natureza do pátrio poder, podendo ser confiada a terceiro. É de direito que admite desmembramento, é destacável, sendo possível que convivam pátrio poder e direito de guarda, aquele com os pais, este com terceiro. O parágrafo 3° do art. 33 do Estatuto da Criança e do Adolescente expressa que: Art. 33. [...] § 3º. A guarda destina-se a regularizar a posse de fato, podendo ser deferida liminar ou incidentalmente, nos procedimentos de tutela e adoção, exceto no de adoção por estrangeiros. 37 A guarda no Estatuto da Criança e do Adolescente tem como finalidade a prática de facilitar a colocação de menores abandonados em uma família. Rizzardo (2005, p. 568) assevera que "[...] de modo geral, é necessário o consentimento dos pais para ser concedida a guarda, exceto se já destituídos do poder familiar". É importante destacar que a guarda nunca é definitiva, e não compreende um afastamento total dos pais, aos quais, o filho poderá retornar se assim o entender. 1.5.2 Tutela A tutela é um instituto que objetiva suprir uma incapacidade de fato e de direito de uma pessoa que necessita de proteção. Venosa (2005, p. 457), esclarece que este instituto serve para dar assistência e proteção de menores que não estão sob a autoridade dos pais, sendo este, pois, o “instituto pela qual uma pessoa maior e capaz é investida dos poderes necessários para a proteção de menor". Em complemento o art. 1728 do Código Civil Brasileiro17, dispõe que os filhos menores são postos em tutela quando os pais faleceram ou quando são julgados ausentes e quando os pais foram destituídos do poder familiar. Para a concessão da tutela a teor do que dispõe o parágrafo único do art. 3618 do Estatuto da Criança e do Adolescente, Art.1728. Os filhos menores são postos em tutela: l - falecendo os pais, ou sendo julgados ausentes; II - decaindo os pais do poder familiar. 18 Art. 36. A tutela será deferida, nos termos da lei civil, a pessoa de até vinte e um anos incompletos. 17 38 que haja prévia decretação da perda ou suspensão do pátrio poder, mediante a propositura de ação contra os pais do menor. Nesse sentido, assevera Venosa (2005, p. 467), que: Para que se tenha lugar a tutela, afora a situação dos órfãos, é necessário que os pais do menor tenham sido destituídos ou estejam suspensos do poder familiar. O tutor, assim, possui os mesmos poderes advindos do poder familiar, pois ele possui poderes para praticar atos em relação ao menor, porém, não tem as mesmas faculdades do pai, só podendo agir mediante vigilância do juiz. Acrescenta Gomes (2001, p. 374) que a dignidade do cargo não permite que o cargo de tutor seja remunerado, porém este pode ser indenizado com uma gratificação. A tutela cessa com a maioridade do emancipado, ou caindo o menor sob o poder familiar, no caso de reconhecimento ou adoção19. 1.5.3 Adoção A adoção é, das três modalidades de colocação do menor em família substituta, a que possui maior relevância no ordenamento jurídico, por sua natureza e por seus efeitos jurídicos e fáticos. Diniz (2002, p. 498), afirma que: Parágrafo único. O deferimento da tutela pressupõe a prévia decretação da perda ou suspensão do pátrio poder e implica necessariamente o dever de guarda. 19 Art. 1763. Cessa a condição de tutelado: l - com a maioridade ou emancipação do menor, II - ao cair o menor sob o poder familiar, no caso de reconhecimento ou adoção. 39 A adoção vem a ser o ato jurídico solene pelo qual, observados os requisitos legais, alguém estabelece, independentemente de qualquer relação de parentesco consanguíneo ou afim, um vínculo fictício de filiação, trazendo para sua família, na condição de filho, pessoa, que geralmente lhe é estranha. Atualmente, conforme acrescenta Carbonnier, apud Venosa (2005, p. 295), "a filiação adotiva é filiação puramente jurídica, baseando-se na presunção de uma realidade não biológica, mas afetiva". Por sua vez Venosa (2005, p. 295) expõe que: "a adoção é um ato jurídico que estabelece laços de filiação legal entre duas pessoas, independente de laços de sangue". No próximo capítulo tratar-se-á com mais propriedade acerca desse instituto, fazendo-se necessário, nesse primeiro momento, apenas tratar acerca desses conceitos mais genéricos para que se possa adentrar na questão com mais propriedade. 40 Capítulo 2 ADOÇÃO Versa o presente capítulo acerca do instituto da adoção, trazendo sua abordagem histórica, seu conceito, espécies existentes no ordenamento jurídico brasileiro e a forma de tratamento deste instituto no Código Civil Brasileiro e no Estatuto da Criança e do Adolescente, estabelecendo-se um paralelo entre essas duas legislações no tocante a este instituto. 2.1 ABORDAGEM HISTÓRICA Consoante Venosa (2003, p. 317), a adoção é instituto antigo entre os povos, podendo ser verificado que este era utilizado desde a Antiguidade como forma de perpetuar o culto doméstico, trazendo a Bíblia, alguns exemplos dos povos hebreus. A respeito dessa necessidade que se tinha de se perpetuar o culto doméstico, esclarece Rodrigues (2002, p. 379) que: Aquele, cuja família se extingue, não terá quem lhe cultue a memória e a de seus maiores. Assim, a mesma religião que obrigava o homem a casar-se para ter filhos que cultuassem a memória dos antepassados; a mesma religião impunha o divórcio em caso de esterilidade e que substituía o marido impotente, no leito conjugal, por um seu parente capaz de ter filhos, vinha oferecer, por meio da adoção, um último recurso para evitar a desgraça representada pela morte sem descendentes. Venosa (2003, p. 318) afirma que na Grécia a adoção também era conhecida como forma de manutenção do culto familiar 41 pela linha masculina, sendo em Roma, porém, que esta difundiu-se. A respeito, assevera Venosa (2003, p. 318) que: Duas eram as modalidades de adoção no Direito Romano: a adoptio e a adrogatio. A adoptio consistia na adoção de um sui juris, uma pessoa capaz, por vezes um emancipado e até mesmo um pater famílias, que abandonava publicamente o culto doméstico originário para assumir o culto do adotante, tornando-se seu herdeiro. A adrogatio, modalidade mais antiga, pertencente ao Direito Público, exigia formas solenes que se modificaram e se simplificaram no curso da história. Abrangia não só o próprio adotando, mas também sua família, filhos e mulher, não sendo permitida ao estrangeiro. Somente podia ser formalizada após aprovação pelos pontífices e em virtude de decisão perante os comícios (populi auctoritate). Havia interesse do Estado na adoção porque a ausência de continuador do culto doméstico poderia redundar na extinção de uma família. Esclarece Venosa (2003, p. 319) que em ambas as modalidades de adoção, era exigida idade mínima do adotante de 60 anos, bem como que não tivesse filhos naturais, devendo também ter 18 anos a mais que o adotado. Outro fator que merece ser lembrado é que a mulher não podia adotar no direito mais antigo, vindo a poder fazê-lo somente na fase imperial, com autorização do imperador. Para Dias (2007, p. 425), no Direito Brasileiro, o Código Civil de 1916 tratava tanto a adoção de maiores como a de menores por “adoção simples”. Nessa modalidade só podia adotar quem não tivesse filhos. A adoção era levada a efeito por escritura pública e o vínculo de parentesco limitava-se ao adotante e ao adotado. Dias (2007, p. 425) assevera que com o advento da Lei nº 4.655 de 196520, passou a ser admitida mais uma modalidade de 20 A Lei nº 4.655, de 2 de junho de 1965 dispunha sobre a legitimidade adotiva. 42 adoção, a chamada legitimação adotiva, que dependia de decisão judicial, era irrevogável e fazia cessar o vínculo de parentesco com a família natural. Dias (2007, p. 425) afirma que o Código de Menores21 substituiu a legitimação adotiva pela adoção plena, mas manteve o mesmo espírito, estendendo o vínculo de parentesco à família dos adotantes, de modo que o nome dos ascendentes passou a constar no registro de nascimento do adotado, independentemente de consentimento expresso dos avós. Explica, ainda, Dias (2007, p. 425) que, com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 a distinção entre adoção e filiação foi eliminada ao deferir idênticos direitos e qualificações aos filhos, proibidas quaisquer designações discriminatórias (Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, art. 227, §6º22). Nesse sentido, explica Dias (2007, p. 425) que, buscando dar efetividade ao comando consagrador do princípio da proteção integral, o Estatuto da Criança e do Adolescente enfatizou a importância à atenção aos interesses de crianças e adolescentes, passando a regular a adoção dos menores de 18 anos, assegurando-lhes todos os direitos, inclusive sucessórios. Assim, assevera Dias (2007, p. 425) que o atual Código Civil instituiu o sistema de adoção plena, mantendo a orientação do Estatuto da Criança e do Adolescente, revestindo a adoção, tanto de adultos, como de crianças e adolescentes, das mesmas características, sujeitando-se em qualquer hipótese a processo judicial. Finalmente, a respeito da evolução do instituto, afirma Dias (2007, p. 426) que a doutrina deu proteção integral e a vedação de referências discriminatórias na filiação alteraram profundamente o 21 Lei nº 6.697, de 10 de outubro de 1979. 22 Art. 227, § 6º. Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação. 43 enfoque dado à infância e à adolescência, rompendo-se a ideologia do assistencialismo e da institucionalização, que privilegia o interesse e a vontade dos adultos. Verifica-se, pois, que a adoção passou, com isso, a buscar uma família para uma criança, abandonando a concepção tradicional, em que prevalecia a natureza contratual que buscava uma criança para uma família. 2.2 CONCEITO Apresentado alguns aspectos históricos da adoção, faz-se necessário, também, trazer uma abordagem acerca de seu conceito, haja vista que ainda hoje há entendimentos doutrinários divergentes acerca desse instituto. Na visão de Diniz (2007, p. 483): A adoção é ato jurídico solene pelo qual, observados os requisitos legais, alguém estabelece, independentemente de qualquer relação de parentesco consangüíneo ou afim, um vínculo fictício de filiação, trazendo para sua família, na condição de filho, pessoa que, geralmente, lhe é estranha. Para Guimarães (2005, p. 30) a adoção é ato unilateral, quando não se estabelece, independentemente do fato natural da procriação, o vínculo da filiação. Já Gomes (1995, p. 340) afirma que adoção é o ato jurídico pelo qual se estabelece, independentemente de fato natural da procriação, o vínculo de filiação. Importante ressaltar que a visão desses três autores esse “vínculo fictício” estabelecido entre adotante e adotado é uma ficção legal, que possibilita que se constitua entre o adotante e o 44 adotado um laço de parentesco de 1º grau na linha reta. Consoante Venosa (2003, p. 315) a adoção é modalidade artificial de filiação que busca imitar a filiação natural. Daí ser também conhecida como filiação civil, pois não resulta de uma relação biológica, mas de manifestação de vontade, conforme o sistema do Código Civil de 1916, ou de sentença judicial, no atual sistema do Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como do Código Civil Brasileiro. A respeito assevera Rodrigues (2002, p. 380) que: Clóvis Beviláqua define a adoção como o ato civil pelo qual alguém aceita um estranho, na qualidade de filho, mas entende que essa definição não parece perfeita, porque o vocábulo “aceita”, usado por Beviláqua não reflete bem o comportamento do adotante, sendo melhor dizer que a adoção é o ato do adotante pelo qual ele traz, para sua família e na condição de filho, pessoa que lhe é estranha. Disso infere-se que a adoção é, portanto, um vínculo de parentesco civil, em linha reta, estabelecendo entre adotante e adotado um liame legal de paternidade e filiação civil. Explica Diniz (2007, p. 484) que: [...] tal posição de filho será definitiva e irrevogável, para todos os efeitos legais, uma vez que desliga o adotado de qualquer vínculo com os pais de sangue, salvo os impedimentos para o casamento, criando verdadeiros laços de parentesco entre o adotado e a família do adotante23. Trata-se, na visão de Diniz (2007, p. 484), de medida de proteção e uma instituição de caráter humanitário, que tem por um lado, 23 Art. 183. Não podem casar (arts. 207 e 209): [...] III - o adotante com o cônjuge do adotado e o adotado com o cônjuge do adotante (art. 376); [...] V - o adotado com o filho superveniente ao pai ou à mãe adotiva (art. 376); 45 por objetivo, dar filhos àqueles a quem a natureza negou e por outro lado uma finalidade assistencial, constituindo um meio de melhorar a condição moral e material do adotado. Finalmente, no entendimento de Dias (2007, p. 426), a adoção constitui um parentesco eletivo, pois decorre exclusivamente de um ato de vontade. Através desses conceitos pode-se considerar que a adoção tem sido utilizada para aquelas pessoas que desejam realmente adotar outra pessoa, não mais servindo como forma de satisfazer um casal, mas sim, na maioria das vezes, como forma de recolocar uma criança numa família que lhe dê a atenção, amor e proteção que, talvez, seus pais biológicos tenham lhe deixado faltar. 2.3 NATUREZA JURÍDICA A definição da natureza jurídica da adoção sempre foi controvertida, advindo essa dificuldade, consoante Venosa (2003, p. 320), da natureza e origem do ato. A respeito, explica Venosa (2003, p. 320) que uma delas é a linha francesa tradicional, que admite o instituto como contrato, sustentando que há necessidade de duas vontades, participando o adotado por si ou por representante. Granato (2005, p. 27), por seu turno, afirma que a adoção, no Código Civil de 1916, consistia num ato bilateral e solene, sendo indispensável da manifestação da vontade do adotante e do adotado e, imprescindível, a forma notarial. Era, portanto, um contrato de direito de família. No entanto, Rizzardo (2005, p. 532) entende que a adoção não se trata de um contrato, como é concebido o instituto por sistemas jurídicos que reclamam tanto a manifestação da vontade do 46 adotante como a do adotado, se for maior, ou de seus representantes legais, se for menor. Já para Lotufo (2002, p. 57): A adoção apresenta-se como figura híbrida, ou seja, um misto de contrato e de instituição, onde a vontade das partes, bem como o exercício de seus direitos encontram-se limitados pelos princípios de ordem pública. Para Venosa (2003, p. 320) no Direito brasileiro haviam duas modalidades distintas de adoção de acordo com o Código de 1916, cada uma delas apresentando nitidamente natureza jurídica própria. A adoção do Código Civil de 1916 realçava a natureza negocial do instituto, como contrato de Direito de Família, tendo em vista a singela solenidade da escritura pública que a lei exigia (art. 37524). Por outro lado, afirma Venosa (2003, p. 320), na adoção no Estatuto da Criança e do Adolescente não se pode considerar somente a existência de simples bilateralidade na manifestação de vontade, porque o Estado participa necessária e ativamente do ato, exigindo-se uma sentença judicial, tal como faz também o Código Civil Brasileiro, sem a qual não há adoção. Ademais, a ação de adoção é ação de estado, de caráter constitutivo, conferindo a posição de filho ao adotado. Verifica-se, pois, que, com a nova ordem jurisdicional que aponta para a necessidade de sentença judicial para a adoção, a adoção tomou um caráter híbrido, porque necessita da vontade das partes, e da chancela jurisdicional autorizando essa manifestação. 24 Art. 375. A adoção far-se-á por escritura pública, em que se não admite condição, nem termo. 47 2.4 ESPÉCIES DE ADOÇÃO O ordenamento jurídico brasileiro comporta várias espécies de adoção, sendo que algumas delas não se encontram dispostas na legislação, mas vêm sendo admitidas pela doutrina e jurisprudência. Abaixo transcreve-se alguns entendimento sobre cada uma delas. 2.4.1 Adoção Unilateral A adoção unilateral é aquela em que um ou ambos os cônjuges possuem filhos de uniões anteriores e o novo parceiro adota-os, estabelecendo-se uma biparentalidade fática do filho com o parceiro do genitor biológico. Trata-se, consoante Dias (2007, p. 432), de forma especial de adoção, com caráter híbrido, haja vista que permite a substituição de somente um dos genitores e respectiva ascendência. De acordo com Dias (2007, p. 432), há três possibilidades para a ocorrência da adoção unilateral: (a) quando o filho foi reconhecido por apenas um dos pais, a ele compete autorizar a adoção pelo seu parceiro; (b) reconhecido por ambos os genitores, concordando um deles com a adoção, decai ele do poder familiar; (c) em face do falecimento do pai biológico, pode o órfão ser adotado pelo cônjuge ou parceiro do genitor sobrevivente. Explica Dias (2007, p. 433) que há divergência doutrinária no tocante à adoção pelo cônjuge ou companheiro do genitor sobrevivente, em caso de falecimento do pai biológico. Isto 48 porque, conforme reza o art. 1635, I25, do Código Civil Brasileiro, a morte do genitor leva à extinção do poder familiar, restando o exercício do poder familiar exclusivamente ao genitor sobrevivente (Código Civil Brasileiro, art. 1.63126), não havendo empecilho, pois, em concordar com a adoção. Assevera Dias (2007, p. 433) que há, todavia, quem sustente que o genitor sobrevivente não tem o direito de dispor da identidade e do nome do filho, isto é, não tem legitimidade para autorizar a adoção do filho, o que implica extinguir o poder familiar do genitor falecido, havendo entendimento, pois, no sentido de não admitir a adoção unilateral em face da impossibilidade de o genitor, em virtude da morte, se manifestar. Outro ponto, conforme explica Guimarães (2005, p. 38), se da no caso de a criança ou adolescente estar registrada somente com o nome do pai ou da mãe (cônjuge ou companheiro(a) da pessoa que pretende adotar), sendo o outro genitor desconhecido formalmente. Nesse caso, o procedimento para adoção unilateral será muito simples, limitando-se a estudos sociais e psicológicos elaborados pelos setores técnicos do juízo, que embasarão a decisão do juiz, que será proferida após manifestação do Ministério Público e a aconselhável oitiva dos interessados em audiência. Para Guimarães (2005, p. 38): Se o adotando estiver registrado em nome dos dois genitores, a adoção unilateral também será possível, mas dependerá da destituição do poder familiar do outro genitor (que não é cônjuge ou companheiro do adotante), ou de sua formal anuência em juízo. 25 Art. 1635. Extingue-se o pode familiar: [...] I. Pela morte dos pais ou do filho; 26 Art. 1631. Durante o casamento e a união estável, compete o poder familiar aos pais; na falta ou impedimento de um deles, o outro exercerá com exclusividade. Parágrafo único. Divergindo os pais quanto ao exercício do poder familiar, é assegurado a qualquer deles recorrer ao juiz para solução do desacordo. 49 Assim, pode-se considerar que, no caso de falecimento de um dos pais, o cônjuge ou companheiro do pai sobrevivente poderia adotar o filho deste, bastando que houvesse a citação dos herdeiros do “de cujus”, que interviriam no feito como forma de defender os interesses dele. 2.4.2 Adoção de Maiores A adoção de maiores tinha tratamento diferenciado no Código Civil de 1916. Explica Guimarães (2005, p. 38) que naquele sistema, esta, que era denominada de adoção restrita, consistia em ato jurídico solene, com forma especial e requisitos próprios, não necessitando da intervenção judicial e não era irrevogável, permitindo a revogação nos casos previstos em lei. Era formalizada por escritura pública, não se admitindo condições nem termo, conforme previa o art. 37527. Assevera Dias (2007, p. 433) que essa forma de adoção não envolvia sucessão hereditária quando o adotante tivesse filhos legítimos, legitimados ou reconhecidos (Código Civil Brasileiro de 1916, art. 37728), sendo que, caso o adotado concorresse com filhos legítimos supervenientes à adoção, cabia-lhe somente metade da herança (Código Civil Brasileiro de 1916, art. 1.605 § 2°29). 27 Art. 375. A adoção far-se-á por escritura pública, em que se não admite condição, nem termo. 28 Art. 377. 377 Quando o adotante tiver filhos legítimos, legitimados ou reconhecidos, a relação de adoção não envolve a de sucessão hereditária. (Redação dada pela Lei nº 3.133, de 8.5.1957) 29 Art. 1.605. Para os efeitos da sucessão, aos filhos legítimos se equiparam os legitimados, os naturais reconhecidos e os adotivos. [...] § 2º Ao filho adotivo, se concorrer com legítimos, supervenientes à adoção (art. 368), tocará somente metade da herança cabível a cada um destes. 50 No entanto, afirma Dias (2007, p. 433), com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, todos, independentemente da origem da filiação, passaram a gozar da condição de filhos, fazendo jus a idênticos direitos, ainda que tenham sido adotados antes da vigência da Constituição. Guimarães (2005, p. 38) afirma que: [...] com o Estatuto da Criança e do Adolescente não houve uma ab-rogação dessas disposições do Código Civil de 1916 no que se refere à adoção, sendo revogadas apenas as disposições com ele incompatíveis, mantendo-se a referida modalidade de adoção restrita do Código Civil então vigente, que não poderia envolver crianças e adolescentes, não rompia os vínculos do adotado com seus parentes consanguíneos, sendo apenas transferindo o poder familiar do pai natural para o adotivo, nos termos do art. 37830 do Código Civil de 1916, limitando-se o parentesco resultante desta adoção ao adotante e ao adotado31, exceto no que tange aos impedimentos matrimoniais estabelecidos no art. 183, incisos III e V32. Dias (2007, p. 434) assevera que há dúvidas sobre a necessidade de consentimento dos pais para a adoção de maiores, havendo posições contraditórias controvertidas nesse sentido. No entanto, entende essa autora que se não o consentimento, pelo menos a citação dos pais registrais é obrigatória, pois mesmo que não precisem consentir, 30 Art. 378. Os direitos e deveres que resultam do parentesco natural não se extinguem pela adoção, exceto o pátrio poder, que será transferido do pai natural para o adotivo. 31 Art. 376. O parentesco resultante da adoção (art. 336) limita-se ao adotante e ao adotado, salvo quanto aos impedimentos matrimoniais, a cujo respeito se observará o disposto no art. 183, III e V. 32 Art. 183. Não podem casar: [...] III - o adotante com o cônjuge do adotado e o adotado com o cônjuge do adotante (art. 376); [...] V - o adotado com o filho superveniente ao pai ou à mãe adotiva (art. 376); 51 os pais biológicos devem ser citados, devido à mudança que a sentença que concede a adoção do filho causará em suas vidas. Nesse sentido, aliás, determina o artigo 1.62133 do Código Civil Brasileiro que, sem o poder familiar, o consentimento dos pais se torna desnecessário para a adoção. Isso porque o artigo 1.63534 define que o poder familiar é extinto com a maioridade e, de acodo com o Estatuto da Criança e do Adolescente, o consentimento é dispensado caso os pais tenham sido destituídos do poder familiar, havendo decisão nesse sentido também no Superior Tribunal de Justiça35. De outro lado, conforme afirma Dias (2007, p. 434), como se trata de ação relativa ao estado de uma pessoa, para a sentença produzir coisa julgada com relação a terceiros é indispensável a citação de todos os interessados como litisconsortes necessários (Código 33 Art. 1.621. A adoção depende de consentimento dos pais ou dos representantes legais, de quem se deseja adotar, e da concordância deste, se contar mais de doze anos. § 1º O consentimento será dispensado em relação à criança ou adolescente cujos pais sejam desconhecidos ou tenham sido destituídos do poder familiar. § 2º O consentimento previsto no caput é revogável até a publicação da sentença constitutiva da adoção. 34 Art. 1.635. Extingue-se o poder familiar: I - pela morte dos pais ou do filho; II - pela emancipação, nos termos do art. 5o, parágrafo único; III - pela maioridade; IV - pela adoção; V - por decisão judicial, na forma do artigo 1.638. 35 Nesse sentido julgou o STJ: SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA. ALEMANHA. ADOÇÃO DE PESSOAS MAIORES DE IDADE. CITAÇÃO DO REQUERIDO NO PROCEDIMENTO NO EXTERIOR. PROVA DO TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO. ASSINATURA DO JUIZ. DESNECESSIDADE. 1. Havendo previsão, na legislação do país de origem, de dispensa do consentimento do pai biológico para a adoção de pessoa que já atingiu a maioridade, resulta desnecessária a prova da citação do requerido no procedimento estrangeiro, bem como da sua intimação da correspondente sentença. 2.Evidenciado que a decisão homologanda (a) foi expedida pelo tribunal competente; (b) contém o carimbo do juízo, bem como a certificação da fidelidade da cópia ao original, por parte da funcionária da justiça escrivã do cartório; (c) é cópia chancelada pelo consulado brasileiro, resta demonstrada sua autenticidade, tornando-se desnecessária a assinatura do juiz no documento. 3.Presentes os demais requisitos, bem como verificado que o teor da decisão não ofende a soberania nem a ordem pública (arts. 5º e 6º da Resolução STJ nº 9 2005) (STJ. SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA Nº 563 - DE (2006 0106906-8) RELATOR:MINISTRO TEORI ALBINO ZAVASCKI. Jul. em 15 de agosto de 2007). 52 de Processo Civil, art. 47236). 2.4.3 Adoção Internacional Trata-se de adoção admitida constitucionalmente, sendo delegado à lei o estabelecimento dos casos e das condições de sua efetivação por estrangeiros (Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, art. 227 § 5°37). Assevera Guimarães (2005, p. 47) que os artigos 5138 e 5239, do Estatuto da Criança e do Adolescente tratam especificamente da adoção por estrangeiros residentes ou domiciliados fora do País, a chamada adoção internacional, reafirmando seu caráter excepcional 36 Art. 472. A sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros. Nas causas relativas ao estado de pessoa, se houverem sido citados no processo, em litisconsórcio necessário, todos os interessados, a sentença produz coisa julgada em relação a terceiros. 37 Art. 227. [...] § 5º - A adoção será assistida pelo Poder Público, na forma da lei, que estabelecerá casos e condições de sua efetivação por parte de estrangeiros. 38 Art. 51. Cuidando-se de pedido de adoção formulado por estrangeiro residente ou domiciliado fora do País, observar-se-á o disposto no art. 31. § 1º O candidato deverá comprovar, mediante documento expedido pela autoridade competente do respectivo domicílio, estar devidamente habilitado à adoção, consoante as leis do seu país, bem como apresentar estudo psicossocial elaborado por agência especializada e credenciada no país de origem. § 2º A autoridade judiciária, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, poderá determinar a apresentação do texto pertinente à legislação estrangeira, acompanhado de prova da respectiva vigência. § 3º Os documentos em língua estrangeira serão juntados aos autos, devidamente autenticados pela autoridade consular, observados os tratados e convenções internacionais, e acompanhados da respectiva tradução, por tradutor público juramentado. § 4º Antes de consumada a adoção não será permitida a saída do adotando do território nacional. 39 Art. 52. A adoção internacional poderá ser condicionada a estudo prévio e análise de uma comissão estadual judiciária de adoção, que fornecerá o respectivo laudo de habilitação para instruir o processo competente. Parágrafo único. Competirá à comissão manter registro centralizado de interessados estrangeiros em adoção. 53 estabelecido no art. 3140 do Estatuto da Criança e do Adolescente, e estabelecendo condições e regras próprias para a modalidade, que devem ser observadas. Dias (2007, p. 434) afirma que: [...] dentre outros dispositivos, o Estatuto da Criança e do Adolescente torna obrigatório o estágio de convivência quando o adotante (estrangeiro ou brasileiro) tem domicílio ou residência fora do Brasil (Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 46 § 2°41), devendo este ser cumprido no território nacional e com duração mínima de 15 dias, para crianças de até dois anos, e de, no mínimo, 30 dias, nos demais casos. Dias (2007, p. 434-435) assevera, ainda, que o Brasil ratificou a Convenção Relativa à Proteção e Cooperação Internacional em Matéria de Adoção Internacional, tendo regulamentado o credenciamento de organismos estrangeiros e nacionais para a adoção internacional. Guimarães (2005, p. 48) afirma que o novo Código Civil estabelece apenas, em seu art. 162942, que a adoção por estrangeiros obedecerá aos casos e condições que forem estabelecidas em lei. 40 Art. 31. A colocação em família substituta estrangeira constitui medida excepcional, somente admissível na modalidade de adoção. 41 Art. 46. [...] § 2º Em caso de adoção por estrangeiro residente ou domiciliado fora do País, o estágio de convivência, cumprido no território nacional, será de no mínimo quinze dias para crianças de até dois anos de idade, e de no mínimo trinta dias quando se tratar de adotando acima de dois anos de idade. 42 Art. 1.629. A adoção por estrangeiro obedecerá aos casos e condições que forem estabelecidos em lei. 54 2.4.4 Adoção Póstuma Consoante Santos (2003, p. 63), a adoção “post mortem” ou póstuma, é aquela que se dá após a morte do adotante quando este manifestar de forma inequívoca o seu desejo de adotar o adotando. Tal forma de adoção foi uma inovação introduzida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu art. 42, § 5°43, podendo ser deferida àquele que, após inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer no curso do procedimento, antes de prolatada a sentença. Explica Guimarães (2005, p. 40) que essa manifestação de vontade deve ser inequívoca, não deixando margem de dúvidas sobre a vontade do falecido em adotar determinada criança ou adolescente. Essa forma de adoção, consoante Guimarães (2005, p. 40-41), traz peculiaridades com relação aos efeitos da sentença que, nos termos do art. 47, § 6°, do Estatuto da Criança e do Adolescente e 1.628 do Código Civil Brasileiro, retroagirão à data do óbito do adotante, coincidindo com a abertura da sucessão a este referente. A este respeito, assevera Dias (2007, p. 435) que a sentença de adoção possui eficácia constitutiva e seus efeitos começam a fluir a partir do trânsito em julgado da sentença (“ex nunc”), não produzindo efeito retroativo. Contudo, a lei abre exceção na hipótese do falecimento do adotante, no curso do processo: o efeito da sentença retroage à data do falecimento. Assim, consoante Santos (2003, p. 63): [...] uma vez estabelecidos os laços de afeto e afinidade entre adotado e adotante, vindo o adotante falecer no curso do processo, garante-se ao adotando a adoção “post mortem”, sendo necessário, no entanto, que a ação tenha sido proposta antes da morte do adotante de forma 43 Art. 42. [...] § 5º A adoção poderá ser deferida ao adotante que, após inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer no curso do procedimento, antes de prolatada a sentença. 55 que os efeitos da sentença, que é de efeito constitutivo, retroagirá de modo a não romper o vínculo que já estava estabelecido entre o adotante e o adotado. A este respeito, ressalta Paulo Lobo, apud Dias (2007, p. 435) que o óbito faz cessar a personalidade e nenhum direito pode ser atribuído ao morto, sendo a retroatividade excepcional, no interesse do adotando. Para Dias (2007, p. 435) trata-se tal instituto de verdadeira adoção nuncupativa, podendo-se admitir também a adoção levada a efeito por meio de testamento, pois evidencia claramente a intenção de adotar. Há que ser considerado, ademais, que a adoção deve ser vista como um ato de amor, cujo sentimento acontece no coração tanto do adotante como do adotado, cujo acontecimento se dá antes do ato judicial que produzirá os efeitos legais. 2.4.5 Adoção “à brasileira” ou afetiva Assevera Dias (2007, p. 436) que no Brasil é muito comum a prática de o companheiro de uma mulher perfilhar o filho dela, simplesmente registrando a criança como se fosse seu descendente, por isso a jurisprudência elegeu o nome adoção “à brasileira” para denominar a adoção afetiva. No entanto, Dias (2007, p. 436) assevera que ainda que esse ato constitua crime contra o estado de filiação (Código Penal Brasileiro, art. 24244), não tem havido condenações, pela motivação 44 Art. 242. Dar parto alheio como próprio; registrar como seu o filho de outrem; ocultar recém-nascido ou substituí-lo, suprimindo ou alterando direito inerente ao estado civil: Pena - reclusão, de dois a seis anos. Parágrafo único - Se o crime é praticado por motivo de reconhecida nobreza: Pena - detenção, de um a dois anos, podendo o juiz deixar de aplicar a pena. 56 afetiva que envolve sua prática. Enfatiza Dias (2007, p. 436) que: O problema dessa forma de adoção está no fato de que, em muitos casos, rompido o vínculo afetivo dos genitores e findo o convívio com o filho, em face da obrigatoriedade de arcar com alimentos, o pai busca a desconstituição do registro por meio de ação anulatória ou negatória de paternidade. No entanto, a jurisprudência, reconhecendo a voluntariedade do ato levado a efeito de modo espontâneo, por meio da expressão "adoção à brasileira", passou a não admitir a anulação do registro de nascimento, considerando-o irreversível. Isto porque, não havendo vício de vontade, incabível é a anulação, pois a lei não autoriza a ninguém vindicar estado contrário ao que resulta do registro de nascimento (Código Civil Brasileiro, art. 1.60445), exceto em caso de erro ou falsidade. 2.4.6 Adoção Intuitu “personae” “personae” Determina o Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu artigo 5046 que, em cada comarca ou foro regional, deverá haver registro de crianças e adolescentes em condições de serem adotados e de pessoas interessadas em adotar, sendo que, para serem incluídos nesse rol, os pretendentes à adoção devem ser considerados aptos após a realização de entrevistas e estudo social. Conforme determina a lei, essa orientação deve ser seguida para que as crianças sejam adotadas segundo a ordem 45 Art. 1.604. Ninguém pode vindicar estado contrário ao que resulta do registro de nascimento, salvo provando-se erro ou falsidade do registro. 46 Art. 50. A autoridade judiciária manterá, em cada comarca ou foro regional, um registro de crianças e adolescentes em condições de serem adotadas e outro de pessoas interessadas na adoção. [...] 57 cronológica do cadastro na espera. No entanto, Guimarães (2005, p. 46) entende que: Embora existam controvérsias e seja aconselhável o respeito, sempre que possível, à ordem cronológica de inscrição no cadastro, o que deve prevalecer é o interesse da criança ou adolescente, observando-se que a adoção deve implicar necessariamente em reais vantagens para o adotando, sendo possível a não observância da ordem cronológica, se isto significar prejuízo ao adotando. Ademais, segundo Guimarães (2005, p. 46) também deve ser levado em conta e respeitada, dentro do possível, a vontade dos pais biológicos do adotando, no sentido de ser este colocado em determinada família substituta (adoção “intuitu personae”), desde que não seja do exterior em detrimento de nacional, pois, estando eles no exercício do poder familiar, podem, devem e têm o direito de opinar sobre o destino do filho. 2.4.7 Adoção Homoparental A questão da adoção por homossexuais vem sendo amplamente discutida na doutrina, haja vista a sua polêmica. Dias (2007, p. 438) entende não existir obstáculo legal a essa forma de adoção. Isto porque, segundo Dias (2007, p. 438), é crescente o número de homossexuais que se candidatam individualmeate à adoção e, ainda que de forma tímida, vem sendo concedida a medida, não havendo mais necessidade de ocultar a orientação sexual para a habilitação. Sobre a adoção por homossexuais, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 não traz qualquer proibição, o que não poderia deixar de ser, haja vista o fundamento basilar da proibição 58 de qualquer forma de discriminação. Ademais, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, no seu art. 227, estabelece: Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão" ... § 5º A adoção será assistida pelo Poder Público, na forma da lei, que estabelecerá casos e condições de sua efetivação por parte dos estrangeiros. Também o Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu art. 42, ao regulamentar o § 5º do art. 227 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, dispõe: Art. 42. Podem adotar os maiores de vinte e um anos, independentemente de estado civil. Verifica-se, pois, com a leitura de tais dispositivos, que não há qualquer impedimento para que homossexuais adotem. Ademais, o art. 43 do Estatuto da Criança e do Adolescente também reza que: Art. 43. A adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos. Maschio (2002, p. 1) afirma que um dos argumentos contra à adoção de crianças por homossexuais é de que especialistas ligados à área da psiquiatria e da psicanálise alertariam para o perigo da 59 identificação das crianças com o modelo dos pais, o que as levaria, por lealdade afetiva, a se tornarem também homossexuais. Outro argumento, agora no âmbito do ordenamento jurídico, levantado por esse autor, é que haveria vedação legal no art. 370 do Código Civil de 1916, que estabelecia que "ninguém pode ser adotado por duas pessoas, salvo se forem marido e mulher", persistindo tal vedação ainda no atual Código Civil Brasileiro, que dispõe, em seu art. 1622, “caput”, que ninguem poderá ser adotado por duas pessoas, salvo se forem marido e mulher, ou se viverem em união estável. Conforme entende Diniz (2005, p. 486): Se, porventura, alguém vier a ser adotado por duas pessoas (adoção conjunta ou cumulativa) que não sejam marido e mulher, nem conviventes, prevalecerá tão-somente a primeira adoção, sendo considerada nula a segunda, caso contrário ter-se-ia a situação absurda de um indivíduo com dois pais ou duas mães. Nos tribunais já existem alguns posicionamentos sobre assunto. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul já decidiu-se favorável à adoção por casais homoafetivos, conforme se infere nos entendimentos abaixo colacionados: APELAÇÃO CÍVEL. ADOÇÃO. CASAL FORMADO POR DUAS PESSOAS DE MESMO SEXO. POSSIBILIDADE. Reconhecida como entidade familiar, merecedora da proteção estatal, a união formada por pessoas do mesmo sexo, com características de duração, publicidade, continuidade e intenção de constituir família, decorrência inafastável é a possibilidade de que seus componentes possam adotar. Os estudos especializados não apontam qualquer inconveniente em que crianças sejam adotadas por casais homossexuais, mais importando a qualidade do vínculo e do afeto que permeia o meio familiar em que serão inseridas e que as liga aos seus cuidadores. É hora de abandonar de vez preconceitos e atitudes hipócritas 60 desprovidas de base científica, adotando-se uma postura de firme defesa da absoluta prioridade que constitucionalmente é assegurada aos direitos das crianças e dos adolescentes (art. 227 da Constituição Federal). Caso em que o laudo especializado comprova o saudável vínculo existente entre as crianças e as adotantes. NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME. (SEGREDO DE JUSTIÇA) (Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível nº 70013801592, Sétima Câmara Cível, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 05/04/2006) Do corpo desse acórdão se extrai que: Partindo então do pressuposto de que o tratamento a ser dado às uniões entre pessoas do mesmo sexo, que convivem de modo durável, sendo essa convivência pública, contínua e com o objetivo de constituir família deve ser o mesmo que é atribuído em nosso ordenamento às uniões estáveis, resta concluir que é possível reconhecer, em tese, a essas pessoas o direito de adotar em conjunto. Outro julgado desse mesmo tribunal, da lavra da desembargadora Maria Berenice Dias: APELAÇÃO CÍVEL. UNIÃO HOMOAFETIVA. RECONHECIMENTO. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DA IGUALDADE. É de ser reconhecida judicialmente a união homoafetiva mantida entre dois homens de forma pública e ininterrupta pelo período de nove anos. A homossexualidade é um fato social que se perpetuou através dos séculos, não podendo o judiciário se olvidar de prestar a tutela jurisdicional a uniões que, enlaçadas pelo afeto, assumem feição de família. A união pelo amor é que caracteriza a entidade familiar e não apenas a diversidade de gêneros. E, antes disso, é o afeto a mais pura exteriorização do ser e do viver, de forma que a marginalização das relações mantidas entre pessoas do mesmo sexo constitui forma de privação 61 do direito à vida, bem como viola os princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade. AUSÊNCIA DE REGRAMENTO ESPECÍFICO. UTILIZAÇÃO DE ANALOGIA E DOS PRINCÍPIOS GERAIS DE DIREITO. A ausência de lei específica sobre o tema não implica ausência de direito, pois existem mecanismos para suprir as lacunas legais, aplicando-se aos casos concretos a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito, em consonância com os preceitos constitucionais (art. 4º da LICC). Negado provimento ao apelo, vencido o Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves (Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível nº 70009550070. Relatora Maria Berenice Dias. Julgado em 17.11.2004,). Defendendo esse entendimento, assevera Maschio (2002, p. 1) que, se uma criança sofre maus tratos no seio de sua família biológica ou se é abandonada à própria sorte, vivendo nas ruas, sendo usada para o tráfico de drogas, como ocorre nos centros urbanos, evidentemente que sua adoção, quer seja por parte de casal homossexual, ou heterossexual ou mesmo por pessoa solteira, desde que revele a formação de um lar, onde haja respeito, lealdade e assistência mútuos, só apresenta vantagens. 2.4.8 Filho de “criação” Outro modo de adoção muito costumeira na sociedade brasileira é o chamado “filho de criação”. Assim, aquela criança que é criada no seio de uma família como se fosse filho legítimo, recebe essa designação, por vezes, para justificar a convivência naquele meio social sem ter cunho biológico com ele. Dias (2007, p. 440-441) assevera que: A partir do momento em que passou a vigorar o princípio da 62 proteção integral, a filiação não merece designações discriminatórias, não mais admitindo a palavra “filho” qualquer adjetivação, separando-se a identidade dos vínculos de filiação das verdades biológica, registral e jurídica. Nesse sentido, sustenta Belmiro Welter, apud Dias (2007, p. 440-441) que quem sempre foi chamado de "filho de criação", merece desfrutar de todos os direitos atinentes à filiação, devendo ser abolida a pejorativa complementação "de criação". 2.4.9 Adoção de nascituro A doutrina mantém aceso o debate sobre adoção de uma criança antes do seu nascimento. Essa faculdade, expressamente consagrada no Código Civil de 1916, no art. 37247, não está prevista no atual Código Civil. Dias (2007, p. 441) afirma que a doutrina inclina-se em rebater tal prática, considerando-a um contra-senso, sob o ponto de vista humano e legal. Para sustentar a sua inviabilidade, é invocada a Convenção de Haia, que exige o consentimento da mãe após o nascimento da criança, relativamente ã adoção internacional. Guimarães (2005, p. 36) sustenta que mesmo antes do advento do Código Civil de 2002, o nascituro não mais poderia ser adotado, em razão da nova ordem constitucional, que estabeleceu a exigência da assistência do Poder Público, nos termos da lei, nos casos de adoção, e das regras e princípios gerais contidos no Estatuto da Criança e do Adolescente. Assim, consoante Guimarães (2005, p. 36): 47 Art. 372. Não se pode adotar sem o consentimento do adotado ou de seu representante legal se for incapaz ou nascituro. 63 Se uma criança ou adolescente só poderia ser adotada com a intervenção do judiciário, que analisaria cada caso, possibilitando um controle rígido sobre o tráfico de crianças, que foi uma das razões (talvez a principal) que levaram o legislador a limitar os casos em que se permite a adoção internacional, não haveria qualquer fundamento para que se admitisse a adoção de nascituro, ou seja, de uma criança, antes de nascer, pelas regras da adoção do então vigente Código Civil de 1916 (revogado pelo NCC), ferindo completamente o espírito da lei. Afirma, ainda, Guimarães (2005, p. 36-37) que hoje, inequivocamente, no ordenamento jurídico brasileiro só existem duas modalidades de adoção: a de menores de 18 anos de idade, regida primordialmente pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e, subsidiariamente, pelo Código Civil Brasileiro de 2002 e a adoção de adultos (maiores de 18 anos de idade), não havendo mais a possibilidade da adoção de nascituros, outrora possível nas termos do art. 37248 do revogado Código Civil de 1916. 2.5 PARALELO ENTRE AS NORMAS DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E DO CCB/2002 NO TOCANTE À ADOÇÃO Com as alterações trazidas pelo Código Civil Brasileiro, algumas disposições existentes no Estatuto da Criança e do Adolescente, foram mantidas, principalmente no tocante à adoção de crianças e adolescentes, sendo tratado, no referido diploma, a adoção de maiores. Assim, verifica-se que a adoção prevista do Estatuto da Criança e do Adolescente, também chamada “adoção estatutária”, atualmente se harmoniza com a adoção estabelecida no Código Civil 48 Art. 372. Não se pode adotar sem o consentimento do adotado ou de seu 372 representante legal se for incapaz ou nascituro. (Redação dada pela Lei nº 3.133, de 8.5.1957) 64 Brasileiro, sendo concebida na linha dos princípios constitucionais e objetiva a completa integração do adotado na família do adotante. Trata-se, consoante Venosa (2003, p. 328-329), de ato jurídico complexo cujo ponto culminante é a sentença, pela qual é constituído o vínculo da adoção, sem a qual não haverá adoção, para os menores de idade, de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente, nem para os maiores, de acordo com o art. 1.623 do Código Civil Brasileiro49, afastando-se, pois, a adoção plena ou completa desse estatuto, da adoção de maiores, que se constituía por escritura pública, destinada a maiores, regulada pelo Código Civil de 1916. Observa Venosa (2003, p. 327) que o Código Civil Brasileiro não alterou, em princípio, a filosofia e a estrutura do Estatuto da Criança e do Adolescente, sua competência jurisdicional e seus instrumentos procedimentais, mantendo-se a atribuição dos juizados da infância e da juventude para a concessão de adoção dos menores, havendo que se compatibilizar ambos os diplomas. E, conforme ressalta Dias (2005, p. 427-428), tal Código estabelece regras referentes à adoção dos menores de 18 anos e ainda que não tenha a lei civil se afastado das diretrizes do Estatuto, não faz referências nem delega funções à lei especial. Assim, entende Dias (2005, p. 428) que, em se tratando de adoção de crianças e adolescentes, persistem os direitos assegurados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, aplicando-se supletivamente o Código Civil, quando não houver incompatibilidade com a lei especial. A respeito da evolução legislativa envolvendo a adoção, Venosa (2003, p. 327) acentua que a Lei nº 3.133/5750 representou um divisor de águas na legislação e na filosofia da adoção no Direito pátrio. Esse diploma aboliu o requisito da inexistência de prole para 49 Art. 1.623. A adoção obedecerá a processo judicial, observados os requisitos estabelecidos neste Código. 50 A Lei nº 3.133 de 8 de maio de 1957 atualizou o instituto da adoção prescrita no Código Civil de 1916. 65 possibilitar a adoção e diminuiu a idade mínima do adotante. Consoante Venosa (2003, p. 327), a segunda inovação marcante no ordenamento foi a introdução da legitimação adotiva, pela Lei nº 4.655/65. Pela legitimação adotiva estabelecia-se um vínculo profundo entre adotante e adotado, muito próximo da família biológica. O Código de Menores substituiu a legitimação adotiva pela adoção plena, com quase idênticas características. Assim, por um período, o sistema brasileiro, tal como no Direito Romano, teve duas modalidades, adoção plena e adoção simples. Esta última mantinha em linhas gerais os princípios do Código Civil. A adoção plena, que exigia requisitos mais amplos, por outro lado, inseria o adotado integralmente na nova família, como se fosse filho biológico. O assento de nascimento era alterado, para que não fosse revelada a origem da filiação, substituindo-se os nomes dos avós. Sobre a atual sistemática existente no ordenamento jurídico brasileiro enfatiza Venosa (2003, p. 327-328) que já não há distinção: [...] a adoção dos menores de 18 anos é uma só, gerando todos os efeitos da antiga adoção plena. O estatuto menorista posiciona-se em consonância com a tendência universal de proteção à criança, assim como faz a Constituição de 1988, que em seu art. 6º, ao cuidar dos direitos sociais, refere-se à maternidade e à infância. Nos arts. 227 e 229 são explicitados os princípios assegurados à criança e ao adolescente. O Estatuto da Criança e do Adolescente, especificamente quanto à adoção, descreve que a criança ou adolescente tem direito fundamental de ser criado e educado no seio de uma família, natural ou substituta (art. 1º). O estatuto considera a criança e o adolescente sujeitos de direito, ao contrário do revogado Código de Menores, que os tratava como objeto da relação jurídica, deixando mais claro o espectro de direitos subjetivos. 66 No tocante a algumas peculiaridades gerais acerca da adoção no atual ordenamento jurídico, afirma Dias (2005, p. 428) que a anuência do cônjuge ou companheiro (Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 165, inciso I51) é necessária para a adoção de crianças e adolescentes. Mesmo que o cônjuge não seja também adotante, indispensável que concorde com a adoção. O Código Civil Brasileiro não reproduz o art. 4952 do Estatuto da Criança e do Adolescente que reza que “a morte dos adotantes não restabelece o poder familiar dos pais naturais”. No entanto, a omissão do legislador, não derrogou a regra, não havendo qualquer possibilidade de ser restabelecida a relação familiar original. Aliás, conforme assevera Dias (2005, p. 428), nem seria necessária dita explicitação, que constitui singela consequência do instituto, haja vista que a adoção é irrevogável, rompendo todos os laços com a família biológica. Dias (2005, p. 429) afirma, ainda, que o Código Civil Brasileiro também não repetiu a vedação constante no Estatuto da Criança e do Adolescente de ascendentes e irmãos adotarem (art. 42, §1º53), mas, entende que essa omissão não implica no reconhecimento da possibilidade de tratamento diferenciado entre a adoção de maiores e de menores. Assim, avós não podem adotar netos e irmãos não podem ser adotados uns pelos outros, ainda que sejam adultos. Como o vínculo de parentesco alcança também a união estável (CC 1.595), a restrição estende-se aos conviventes, 51 Art. 165. São requisitos para a concessão de pedidos de colocação em família substituta: I - qualificação completa do requerente e de seu eventual cônjuge, ou companheiro, com expressa anuência deste; 52 Art. 49. A morte dos adotantes não restabele o pátrio poder dos pais naturais. 53 Art. 42. [...] § 1º Não podem adotar os ascendentes e os irmãos do adotando. 67 sendo vedada descendentes, a adoção mesmo depois entre de ascendentes rompida a e união. Contudo, não há qualquer óbice à adoção entre parentes colaterais de terceiro e quarto graus. Nada impede que alguém adote um sobrinho ou um primo, quer consanguíneo, quer ele tenha sido adotado (DIAS, 2005, p. 429). Assevera Dias (2005, p. 429) que o Código Civil Brasileiro afirma que a relação de parentesco se estabelece com todos os parentes do adotante (art. 1.62854), explicitação inexistente no Estatuto da Criança e do Adolescente. No entanto, trata-se de efeito próprio da adoção, que ocorre mesmo sem referendo legal. Assim, os vínculos familiares estendemse a todos que a lei considera parentes em razão do casamento ou da união estável, inclusive no que diz com os vínculos de afinidade. O Estatuto da Criança e do Adolescente exigia a plena capacidade para adotar, ou seja, a idade de 21 anos (Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 42). Como houve a redução da capacidade civil para 18 anos (Código Civil Brasileiro, art. 5°55), a idade para a adoção tem novo limite (Código Civil Brasileiro, art. 1.61856). Sendo dois os adotantes, basta que um deles tenha essa idade para o casal ter a possibilidade de adotar. Dias (2005, p. 429-430) afirma que há outro requisito que diz com a idade: entre adotante e adotado deve existir uma diferença de 16 anos (Código Civil Brasileiro, art. 1.619 e Estatuto da 54 Art. 1.628. Os efeitos da adoção começam a partir do trânsito em julgado da sentença, exceto se o adotante vier a falecer no curso do procedimento, caso em que terá força retroativa à data do óbito. As relações de parentesco se estabelecem não só entre o adotante e o adotado, como também entre aquele e os descendentes deste e entre o adotado e todos os parentes do adotante. 55 Art. 5º. A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil. 56 Art. 1.618. Só a pessoa maior de dezoito anos pode adotar. 68 Criança e do Adolescente , art. 42, § 3º). Esta distância de tempo busca imitar a vida, pois é a diferença em anos para a procriação. Mas a regra admite flexibilização, principalmente quando o pedido de adoção é antecedido de período de convívio por lapso de tempo que permitiu a constituição da filiação afetiva. Venosa (2003, p. 347) assevera que alguns dos dispositivos do Estatuto da Criança e do Adolescente foram substituídos pelo Código Civil Brasileiro, mas, em síntese, toda a base de direito material e de direito procedimental descrita nessa lei continua aplicável. Na ausência de outra norma regulamentadora, também deve ser aplicado o Estatuto da Criança e do Adolescente analogicamente, no que for compatível, com relação à adoção por maiores. Desse modo, consoante Venosa (2003, p. 347), persiste a aplicação do Estatuto da Criança e do Adolescente em matéria de adoção, em tudo que não conflitar com normas inovadoras introduzidas no Código Civil Brasileiro. No próximo capítulo tratar-se-á acerca dos aspectos procedimentais da adoção, bem como acerca de seu atual papel social. Parágrafo único. A adoção por ambos os cônjuges ou companheiros poderá ser formalizada, desde que um deles tenha completado dezoito anos de idade, comprovada a estabilidade da família. 69 Capítulo 3 ASPECTOS PROCEDIMENTAIS DA ADOÇÃO 3.1 PROCEDIMENTOS PARA ADOÇÃO 3.1.1 Requisitos A princípio, qualquer pessoa que preencha os requisitos prescritos no Estatuto da Criança e do Adolescente e no Código Civil Brasileiro poderá adotar, não fazendo a lei, qualquer distinção em relação ao estado civil do pretenso adotante. Destarte, poucas são as restrições para adotar e quase todas dependem da avaliação do Juiz em face do conjunto de informações prestadas pelos técnicos do juizado. O Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece, em seu art. 42 e parágrafos, algumas regras e restrições para a adoção, in verbis: Art. 42. Podem adotar os maiores de vinte e um anos, independentemente de estado civil. § 1° Não podem adotar os ascendentes e os irmãos do adotando. § 2° A adoção por ambos os cônjuges ou concubinas poderá ser formalizada, desde que um deles tenha completado vinte e um anos de idade, comprovada a estabilidade da família. § 3° O adotante há de ser, pelo menos, dezesseis anos mais velho do que o adotando. § 4° Os divorciados e os judicialmente separados poderão adotar conjuntamente, contanto que acordem sobre a guarda e o regime de visitas, e desde que o estágio de convivência tenha sociedade conjugal. sido iniciado na constância da 70 § 5° A adoção poderá ser deferida ao adotante que, após inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer no curso do procedimento, antes de prolatada a sentença. O Código Civil Brasileiro também estabeleceu alguns requisitos, em seus artigos 1.618 e 1.619 a respeito da adoção: Art. 1.618. Só a pessoa maior de dezoito anos pode adotar. Parágrafo único. A adoção por ambos os cônjuges ou conviventes poderá ser formalizada, desde que um deles tenha completado dezoito anos de idade, comprovada a estabilidade da família. Art. 1.619. O adotante há de ser pelo menos dezesseis anos mais velho que o adotado. Da leitura destes e dos dispositivos dos diplomas citados pode-se verificar que se faz necessário o preenchimento dos requisitos abaixo elencados. 3.1.1.1 Efetivação por maior de 18 anos De acordo com a inovação trazida pelo Código Civil Brasileiro, através do art. 1618, podem adotar os maiores de dezoito anos, independentemente do estado civil. Determina, ainda, o Código Civil, no art. 1.622, caput, que ninguém pode ser adotado por duas pessoas, salvo se forem marido e mulher, ou se viverem em união estável. Assevera Diniz (2005, p. 487-488) que, se, porventura, alguém vier a ser adotado por duas pessoas (adoção conjunta ou cumulativa) que não sejam marido e mulher, nem conviventes, prevalecerá tão-somente a primeira adoção, sendo considerada nula a segunda. Diniz (2005, p. 488) afirma, ainda, que os divorciados e 71 os separados judicialmente poderão adotar conjuntamente se o estágio de convivência com o adotado houver iniciado na constância da sociedade conjugal e se fizerem acordo sobre a guarda do menor e o regime do direito de visitas (art. 1.622, parágrafo único), assegurando-lhe, assim, a continuidade daquela convivência familiar. Se um dos cônjuges ou conviventes adotar filho do outro, os vínculos de filiação entre o adotado e o cônjuge, ou companheiro, e de parentesco entre os respectivos parentes (art. 1.626) serão mantidos. 3.1.1.2 Diferença mínima de idade entre o adotante e o adotado Outro requisito apontado no art. 1619 e no § 3º do art. 43 do Estatuto da Criança e do Adolescente é a obrigatoriedade de diferença mínima de idade entre o adotante e o adotado, que deverá ser de, no mínimo 16 anos. Para Diniz (2005, p. 488) tal exigência é cabível tendo em vista que não se poderia conceber um filho de idade igual ou superior à do pai, ou mãe, sendo imprescindível, pois, que o adotante seja mais velho para que possa desempenhar cabalmente o exercício do poder familiar. Diniz (2005, p. 489) acrescenta que se o adotante for um casal, bastará que um dos cônjuges, ou conviventes, seja 16 anos mais velho que o adotando. 3.1.1.3 Consentimento do adotado, de seus pais ou de seu representante legal Venosa (2006, p. 542) assevera que outro requisito indispensável para a adoção é o consentimento de ambos os pais de sangue, se o adotando for menor ou incapaz. No processo de adoção, 72 figurará a presença tanto do pai como da mãe. Já Granato (2005, p. 96) explica que como a adoção corta quaisquer laços com a família consangüínea, salvo os impedimentos matrimoniais, os pais ou representantes legais da criança ou do adolescente devem manifestar seu consentimento para tal ato, sendo dispensado tal consentimento, apenas, em relação aos pais já destituídos do Poder Familiar, conforme prescreve o art. 45 e seu parágrafo 1° do Estatuto da Criança e do Adolescente: Art. 45. A adoção depende de consentimento dos pais ou do representante legal do adotando. Parágrafo 1°. O consentimento será dispensado em relação à criança ou adolescente cujos pais forma destituídos do pátrio poder. Nos termos do art. 45, parágrafo 2° do Estatuto da Criança e do Adolescente, é necessário o consentimento do adotando maior de doze anos de idade, para que a adoção se concretize. Granato (2005, p. 74) afirma que é razoável que se procure obter a adesão da vontade do adolescente a uma nova família, já que seria muito difícil sua convivência ali, se não estivesse ele satisfeito com sua nova situação, não cabendo, no entendimento de Diniz (2005, p. 489), nesta matéria, suprimento judicial. Diniz (2005, p. 489) assevera, ainda, que não haverá necessidade do consentimento do representante legal nem do menor, se se provar que se trata de infante exposto que se encontra em situação de risco, por não ter meios para sobreviver, ou em ambiente hostil, sofrendo maus tratos, ou abandonado, ou de menor cujos pais sejam desconhecidos, estejam desaparecidos e esgotadas as buscas, ou tenham perdido o poder familiar, sem nomeação de tutor, como também de órfão não reclamado, por qualquer parente, por mais de um ano (art. 1.624 do Código Civil Brasileiro). 73 Em caso de adoção de menor órfão, abandonado, ou cujos pais foram inibidos do poder familiar, o Estado o representará ou assistirá, nomeando o juiz competente um curador ad hoc. Se se tratar de relativamente incapaz, deverá participar do ato assistido pelo seu representante legal. Diniz (2005, p. 489) afirma que o consentimento é revogável até a publicação da sentença constitutiva da adoção (Código Civil Brasileiro, art. 1.621, § 2º), donde se infere que a adoção se constitui bilateralmente, tendo uma “base contratual”, apresentando-se como um “contrato de direito familiar”. Além disso, apenas será admitida a adoção que constituir efetivo benefício para o adotando (Código Civil Brasileiro, art. 1.625), visto que não há adoção “intuitu personae”, pois o juiz é quem terá o poder-dever de optar pela família substitutiva adequada e não os pais da criança a ser adotada, e muito menos os adotantes. 3.1.1.4 Intervenção judicial na sua criação Outro requisito é a intervenção judicial na adoção, pois esta somente se aperfeiçoa perante juiz, em processo judicial, com a intervenção do Ministério Público, inclusive em caso de adoção de maiores de 18 anos (Código Civil Brasileiro, art. 1.623, parágrafo único). Enfatiza Diniz (2005, p. 490) que o Poder Judiciário é que analisará a conveniência ou não, para o adotando, e os motivos em que se funda a pretensão dos adotantes, ouvindo, sempre que possível, o adotando, levando em conta o parecer do Ministério Público. O juiz deverá agir com prudência, verificando se os adotantes têm condições morais e econômicas de proporcionar um pleno e saudável desenvolvimento físico e mental ao adotando. 74 3.1.1.5 Irrevogabilidade A adoção é instituto irrevogável (art. 48, do Estatuto da Criança e do Adolescente), não se restabelecendo o vínculo jurídico existente entre o adotado com sua família biológica com a perfectibilização desta, fazendo, com isso, que os pais biológicos percam os direitos inerentes ao Poder Familiar. Nesse sentido, afirma Diniz (2005, p. 493) que a adoção é irreversível, entrando o adotado definitivamente para a família do adotante, não restabelecendo a morte do adotante o poder familiar dos pais naturais (art. 49, do Estatuto da Criança e do Adolescente). Nesse sentido, também o Código Civil Brasileiro, em seu art. 1.626, reza que: Art. 1.626. A adoção atribui a situação de filho ao adotado, desligando-o de qualquer vínculo com os pais e parentes consangüíneos, salvo quanto aos impedimentos para o casamento. Parágrafo único. Se um dos cônjuges ou companheiros adota o filho do outro, mantêm-se os vínculos de filiação entre o adotado e o cônjuge ou companheiro do adotante e os respectivos parentes. Diniz (2005, p. 493) assevera que mesmo que os adotantes venham a ter filhos, aos quais o adotado está equiparado, este terá os mesmos deveres e direitos, inclusive sucessórios, proibindo-se quaisquer designações discriminatórias, relativas à filiação. 3.1.1.6 Estágio de convivência Outro requisito de basilar importância para o bom desenvolvimento do processo de adoção é o estágio de convivência. Conforme assevera Venosa (2006, p. 304), esse período 75 tem por finalidade adaptar a convivência do adotando ao novo lar, o qual se consolida à vontade de adotar e ser adotado. Nesse estágio terão o Juiz e seus auxiliares condições de avaliar a convivência da adoção. O artigo 46 do Estatuto da Criança e do Adolescente57 expressa que será posto o estágio de convivência com a criança ou adolescente, pelo prazo que o Juiz estipular, observados cada caso. O Estatuto confere ao Juiz o poder de decidir e avaliar o período do estágio de convivência, através do laudo técnico da equipe interprofissional, conforme dispõe o art.167 de seu texto: Art. 167. A autoridade judiciária, de ofício ou a requerimento das partes ou do Ministério Público, determinará a realização de estudo social ou, se possível, perícia por equipe interprofissional, decidindo sobre a concessão de guarda provisória, bem como, no caso de adoção, sobre o estágio de convivência. Leciona Granato (2005, p. 81), que o estágio de convivência é um período experimental em que o adotando convive com os adotantes, com a finalidade precípua de se avaliar a adaptação aquele à família substituta, bem como a compatibilidade desta com a adoção. É de grande importância esse tempo de experiência, porque constituindo um período de adaptação do adotando e adotantes à nova forma de vida, afasta adoções precipitadas que geram situações irreversíveis e de sofrimento de todos os envolvidos. 57 Art. 46. A adoção será precedida de estágio de convivência com a criança ou adolescente, pelo prazo que a autoridade judiciária fixar, observadas as peculiaridades do caso. 76 3.1.2 Cadastramento e documentação Os brasileiros interessados à adoção devem atender aos vários requisitos já citados. Além disso, devem preencher um Cadastro de Pretendentes à Adoção do fórum da comarca de residência. O Estatuto da Criança e do Adolescente, estabelece, em seu art. 50, que cada comarca deve possuir um registro de crianças e adolescentes em condições de serem adotadas e outro de pessoas interessadas em adotar: Art. 50. 50 A autoridade judiciária manterá, em cada comarca ou foro regional, um registro de crianças e adolescentes em condições de serem adotados e outro de pessoas interessadas na adoção. No Estado de Santa Catarina foi implantado, através do Provimento nº 13/2005, o Cadastro Único Informatizado de Adoção e Abrigo – CUIDA, do qual será tratado mais adiante. Conforme explica Gonçalves Junior (2008, p. 1), em Santa Catarina, com o Cadastro Único Informatizado de Adoção e Abrigo (CUIDA), os residentes no estado devem se habilitar somente nas comarcas onde residem. Posteriormente à habilitação, os dados dos pretendentes são incluídos no sistema computacional, o que permite o acesso às informações, via internet, pelos assistentes sociais e juízes de todas as comarcas do estado, favorecendo a aproximação e encontro entre os filhos e os seus pais por adoção. A consulta ao Cadastro se dá observando a ordem de habilitação, o perfil da criança em condições de adoção e a seguinte preferência: residente na comarca; no Estado; em outro Estado da 77 Federação (art. 5º58 do Provimento nº 13/2005). Portanto, os residentes na comarca terão preferência em relação aos residentes em outras comarcas do Estado. Somente não havendo pretendente habilitado para determinada criança ou adolescente na Comarca é que se fará a consulta ao cadastro estadual e nacional59. O tempo de espera varia de acordo com as exigências dos pretendentes com relação à criança que desejam adotar; quando maior o número de exigências com relação à idade, sexo, cor e condições de saúde, maior o tempo de espera. Isso porque existe um maior número de pessoas que desejam adotar bebês, brancos e saudáveis60. Além de preencherem o cadastro, os interessados devem entregar os seguintes documentos61: Identidade; CPF; requerimento de habilitação para adoção, assinado pelo(s) requerente(s), endereçado ao juiz da Comarca de residência dos interessados; estudo social elaborado por técnico do Juizado da Infância e da Juventude do local de residência dos pretendentes; atestado de antecedentes criminais; atestado de sanidade física e mental; comprovante de residência; 58 Art. 5º. Constatada a possibilidade de adoção, o juiz fará a consulta ao cadastro para a busca do(s) pretendente(s), observada a ordem de habilitação e atendida a seguinte preferência: I - pretendente(s) residente(s) na comarca; II - pretendente(s) residente(s) no Estado; III - pretendente(s) residente(s) em outros Estados da Federação; Parágrafo único. Somente diante do melhor interesse e de reais vantagens para a criança e o adolescente, em decisão fundamentada, poderá o juiz prescindir a ordem de antigüidade do cadastro. 59 Fonte: Site do Grupo Gerando Amor - Grupo de Estudos e Apoio a Adoção de São Bento do Sul/SC. Procedimentos para a adoção. Disponível em: <http://www.gerandoamor.org.br/wordpress/?p=36>. Acesso em 03 nov 2008. 60 Fonte: Site do Grupo Gerando Amor - Grupo de Estudos e Apoio a Adoção de São Bento do Sul/SC. Procedimentos para a adoção. Disponível em: <http://www.gerandoamor.org.br/wordpress/?p=36>. Acesso em 03 nov 2008. 78 comprovante de rendimentos; certidão de casamento, ou nascimento, se solteiros; fotos dos requerentes. (opcional); demais documentos que a autoridade judiciária entender pertinente. Estes documentos devem ser entregues ou em original ou em fotocópia autenticada. Encontrada uma criança que preencha os requisitos desejados pelos pretendentes, o juiz inicia o processo de colocação do menor na família substituta. O art. 165 do Estatuto elenca os requisitos básicos para a concessão de pedido de colocação em família substituta: Art. 165. 165 [...] I - qualificação completa do requerente e de seu eventual cônjuge, ou companheiro, com expressa anuência deste; II - indicação de eventual parentesco do requerente e de seu cônjuge, ou companheiro, com a criança ou adolescente, especificando se tem ou não parente vivo; III - qualificação completa da criança ou adolescente e de seus pais, se conhecidos; IV - indicação do cartório onde foi inscrito nascimento, anexando, se possível, uma cópia da respectiva certidão; V - declaração sobre a existência de bens, direitos ou rendimentos relativos à criança ou ao adolescente. O deferimento da inscrição se dá após o parecer do Ministério Público, conforme estabelece o art. 50, §1° do Estatuto da Criança e do Adolescente: Art. 50. [...] § 1° O deferimento da inscrição dar-se-á após prévia consulta aos órgãos técnicos do juizado, ouvido o Ministério Público. 61 Esta relação de documentos está disposta no site do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. Disponível em: <http://cgj.tj.sc.gov.br/ceja/nacional.htm>. Acesso em 30 out 2008. 79 A seguir, o Juiz da Infância e da Juventude deferirá ou não o pedido de inscrição, atendo-se a todos os detalhes, inclusive se os pretendentes oferecem ambiente familiar adequado para o desenvolvimento da criança. O art. 50, § 2° do Estatuto da Criança e do Adolescente, dispõe: Art. 50. [...] § 2° Não será deferida a inscrição se o interessado não satisfazer os requisitos legais, ou verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 29. O art. 29 do Estatuto da Criança e do Adolescente serve de parâmetro para o Magistrado tomar uma decisão: Art. 29. Não se deferirá colocação em família substituta a pessoa que revele, por qualquer modo, incompatibilidade com a natureza da medida ou não ofereça ambiente familiar adequado. Verifica-se, pois, que devem opinar no processo o Juiz, Ministério Público, a Assistente Social e a Psicóloga. O serviço social fará um estudo social do requerente. Conclusos os atos, ficam os interessados habilitados à adoção. Há discussão doutrinária e jurisprudencial acerca da necessidade de os pretendentes à adoção estarem ou não incluídos no cadastro de adoção da comarca para poderem adotar. É sabido que tal inscrição é uma exigência legal, porém, ante os interesses da criança, o entendimento que vem sendo adotado no Tribunal de Justiça de Santa Catarina é o de que a teor do que dispõe o art. 43, do Estatuto da Criança e do Adolescente, tal exigência não pode se sobrepor. Tal entendimento se verifica através dos entendimentos 80 jurisprudenciais abaixo colacionados: APELAÇÃO CÍVEL – ADOÇÃO – RECÉM-NASCIDO ENTREGUE À GUARDA DE TERCEIROS LOGO APÓS O NASCIMENTO – CASAL NÃO INCLUÍDO NO CADASTRO DE ADOÇÃO DA COMARCA SOBREPUJAR – FORMALISMO AOS INTERESSES LEGAL DO QUE MENOR NÃO – PODE LAÇOS FAMILIARES ESTABELECIDOS COM OS PRETENSOS ADOTANTES – SUPREMACIA DOS INTERESSES E BEM-ESTAR DO INFANTE – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Mostra-se viável a concessão do pedido de adoção, quando evidenciado que a criança encontra-se plenamente adaptada à nova família, que se mostrou capaz de assegurar a proteção, assistência e educação que lhe é devida. Embora a inscrição no cadastro de interessados à adoção seja uma exigência legal, a sua ausência não pode ser óbice ao deferimento da adoção, uma vez que o formalismo legal não pode se sobrepor aos interesses do infante, ainda mais quando este já tenha consolidado laços de afeto com os adotantes e todas as demais situações lhe são plenamente favoráveis. (Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Apelação Cível n. 2007.017499-7, de Armazém. Relator: Desembargador Mazoni Ferreira. Julgamento: 23.08.2007). APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE ADOÇÃO – AUTORES NÃO INCLUÍDOS NO CADASTRO DE ADOÇÃO DA COMARCA – FORMALISMO LEGAL QUE NÃO PODE SOBREPUJAR AOS INTERESSES DO MENOR – LAÇOS FAMILIARES ESTABELECIDOS COM OS PRETENSOS ADOTANTES – SUPREMACIA DOS INTERESSES E BEM-ESTAR DO INFANTE – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Embora a inscrição no cadastro de interessados à adoção seja uma exigência legal, a sua ausência não pode ser óbice ao deferimento da adoção, uma vez que o formalismo legal não pode se sobrepor aos interesses do infante, ainda mais quando este já tenha consolidado laços de afeto com os adotantes e todas as demais situações lhe são plenamente favoráveis. (Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Apelação Cível n. 2004.029491-5, de Brusque. 81 Relator: Desembargador Mazoni Ferreira. Julgamento: 9-1204). APELAÇÃO CÍVEL – PEDIDO DE ADOÇÃO – CONCORDÂNCIA DOS PAIS – ESTUDO SOCIAL FAVORÁVEL – NÃO INCLUSÃO NA LISTA DE INTERESSADOS EM ADOÇÃO DA COMARCA – FORMALISMO LEGAL NÃO SUPERIOR AO INTERESSE DA CRIANÇA – ESPORÁDICA MANUTENÇÃO DE CONTATO COM O PAI BIOLÓGICO – PREJUDICIALIDADE FUTURA – SUPOSIÇÃO – DEFERIMENTO DA MEDIDA – PROVIMENTO RECURSAL. Não pode um formalismo legal, ainda que de extrema importância, sobrepujar os interesses de uma criança manifestados no caso concreto. Embora seja a inscrição no cadastro de interessados à adoção uma determinação legal, a sua ausência não pode servir de óbice ao deferimento dessa medida, sobretudo quando o infante já desenvolve há anos laços de afetividade com os adotantes e todas as demais situações lhes são favoráveis. (Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Apelação Cível n. 2003.007437-6, de Orleans. Relator: Desembargador José Volpato de Souza. Julgamento: 20-10-03). DIREITO DE FAMÍLIA – ECA – ADOÇÃO – ENTREGA DE MENOR COM POUCOS MESES DE VIDA MEDIANTE GUARDA A FAMÍLIA SUBSTITUTA POR DELIBERAÇÃO DOS PAIS BIOLÓGICOS – AUSÊNCIA DE CONVÍVIO MÍNIMO PARA A MANUTENÇÃO DE VÍNCULOS AFETIVOS ENTRE A CRIANÇA E SEUS GENITORES – ABANDONO PSICOLÓGICO CONFIGURADO – LAÇOS FAMILIARES ESTABELECIDOS COM OS PRETENSOS ADOTANTES – EXTINÇÃO DO PODER FAMILIAR – ADOÇÃO DEFERIDA – RECURSO DESPROVIDO [...] 2. Deve ser deferida a adoção ao casal que detém a guarda do adotando adolescente desde que ele tinha poucos meses de vida e desde então provê toda gama de obrigações que se impõe aos pais, sendo-lhe conferidos educação, alimentação, lazer e, sobretudo, carinho familiar. (Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Apelação Cível n. 2003.012201-0, de Araranguá. Relator: Desembargador Marcus Tulio Sartorato. Julgamento: 28-5-04). 82 Assim, se os pretendentes forem as pessoas que, por suas condições subjetivas e familiares, melhor atendam ao preceito contido no art. 4362 da Lei n. 8.069/90, a eles deve ser reconhecido o direito de ser conferida a adoção. 3.1.3 Aspectos formais do processo de adoção A competência para processar e julgar a adoção será determinada pelo domicílio dos pais ou responsável, ou pelo lugar onde se encontre a criança ou adolescente, à falta dos pais ou responsável (art. 14763 do Estatuto da Criança do Adolescente). O cadastro no juízo competente para a habilitação, conforme explicado anteriormente, é o primeiro passo para o pedido de adoção. No entanto, podem ocorrer duas hipóteses no processo de adoção: ou a família convive com a criança ou adolescente a qual pretende adotar, ou a família busca uma criança ou adolescente para ser adotado. No primeiro caso, os interessados devem ajuizar o 62 Art. 43. A adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos. 63 Art. 147. A competência será determinada: I - pelo domicílio dos pais ou responsável; II - pelo lugar onde se encontre a criança ou adolescente, à falta dos pais ou responsável. § 1º. Nos casos de ato infracional, será competente a autoridade do lugar da ação ou omissão, observadas as regras de conexão, continência e prevenção. § 2º A execução das medidas poderá ser delegada à autoridade competente da residência dos pais ou responsável, ou do local onde sediar-se a entidade que abrigar a criança ou adolescente. § 3º Em caso de infração cometida através de transmissão simultânea de rádio ou televisão, que atinja mais de uma comarca, será competente, para aplicação da penalidade, a autoridade judiciária do local da sede estadual da emissora ou rede, tendo a sentença eficácia para todas as transmissoras ou retransmissoras do respectivo estado. 83 pedido de adoção através de um advogado e, no segundo caso, os interessados dependem de habilitação prévia no juízo de seu domicílio, conforme alhures explicado. Conforme explica Granato (2005, p. 96), o início do processo se dá através de petição inicial, formulada por advogado, ou nos termos do art. 16664 do Estatuto da Criança do Adolescente, que dispõe que poderá ser formulado diretamente em cartório, em petição assinada pelos próprios requerentes, se os pais forem falecidos ou se estiverem destituídos ou suspensos do pátrio poder, ou houverem aderido expressamente ao pedido ao pedido de colocação em família substituta. O juiz, ao receber a inicial, determina a verificação da existência de inscrição dos pretendentes no Cadastro Único Informatizado de Adoção e Abrigo – CUIDA, bem como a realização de estudo social na residência deles, ou perícia por equipe interprofissional (art. 50, § 1º, do Estatuto da Criança e do Adolescente65), decidindo sobre o estágio de convivência (art. 16766), quando for o caso. Feito o relatório social ou laudo pericial, ouvindo-se, se possível, o adotando, dar-se-á vista dos autos ao Ministério Público, pelo prazo de 5 dias, e a autoridade judiciária, então, deverá decidir em igual 64 Art. 166. Se os pais forem falecidos, tiverem sido destituídos ou suspensos do pátrio poder, ou houverem aderido expressamente ao pedido de colocação em família substituta, este poderá ser formulado diretamente em cartório, em petição assinada pelos próprios requerentes. Parágrafo único. Na hipótese de concordância dos pais, eles serão ouvidos pela autoridade judiciária e pelo representante do Ministério Público, tomando-se por termo as declarações. 65 Art. 50. A autoridade judiciária manterá, em cada comarca ou foro regional, um registro de crianças e adolescentes em condições de serem adotados e outro de pessoas interessadas na adoção. § 1º O deferimento da inscrição dar-se-á após prévia consulta aos órgãos técnicos do juizado, ouvido o Ministério Público. 66 Art. 167. A autoridade judiciária, de ofício ou a requerimento das partes ou do Ministério Público, determinará a realização de estudo social ou, se possível, perícia por equipe interprofissional, decidindo sobre a concessão de guarda provisória, bem como, no caso de adoção, sobre o estágio de convivência. 84 prazo (art. 16867). O juiz poderá determinar a consulta no Cadastro Único Informatizado de Adoção e Abrigo, a fim de verificar se há pessoas inscritas interessadas na adoção da criança pretendida. Nesse sentido, afirma Diniz (2005, p. 490) que: É preciso não olvidar que o órgão judicante deverá manter, em cada comarca, um registro de crianças e adolescentes em condições de serem adotados e outro de pessoas interessadas na adoção (art. 50), levando em conta na apreciação do pedido o grau de parentesco e a relação de afetividade ou afinidade, para evitar gravames (art. 28, § 2º). Caso haja interessados, poderá o juiz julgar improcedente o pedido de adoção formulado pelos pretendentes, caso em que será analisado o pedido dos interessados, a fim de verificar se estes preenchem os requisitos necessários para adotar dita criança. Se o juiz, analisando o caso concreto, não tomar tal providência, o pedido será julgado procedente e a adoção da criança será concedida aos pretendentes de forma definitiva. Isto porque, conforme enfatiza Diniz (2005, p. 491), não se permitirá a adoção àquele que não satisfizer os requisitos legais nem oferecer ambiente familiar adequado (arts. 29 e 50, § 2º), e sempre deferirá a adoção quando se apresentarem reais vantagens para o adotando (art. 43). Concluído o processo, o juiz determina a expedição de dois mandados: um para cancelar o registro original e outro para fazer a inscrição do novo registro de nascimento, com todos os dados indicados pelos adotantes (nome completo da criança, nome dos pais, nome dos 67 Art. 168. Apresentado o relatório social ou o laudo pericial, e ouvida, sempre que possível, a criança ou o adolescente, dar-se-á vista dos autos ao Ministério Público, pelo prazo de cinco dias, decidindo a autoridade judiciária em igual prazo. 85 avós maternos e paternos), não acarretando distinção entre um registro de nascimento do filho adotivo e o registro do filho biológico. Após a adoção não poderá constar em nenhum documento da criança adotiva qualquer observância sobre o fato68. Todo processo de adoção corre em Segredo de Justiça e somente os requerentes podem ter acesso às suas informações. Os genitores da criança não têm informações sobre os adotantes69. Afirma, ainda, Diniz (2005, p. 491) que a adoção poderá ser deferida ao adotante que, após inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer na pendência do procedimento, antes que a sentença judicial seja prolatada (art. 42, § 5º), hipótese em que a sentença constitutiva do vínculo da adoção retroagirá à data do óbito (art. 47, § 6º, 2ª parte; Código Civil, art. 1.628, 1ª parte). Para Diniz (2005, p. 491) essa adoção “post mortem” só é possível porque o adotante já havia manifestado sua vontade de adotar ainda em vida. 3.1.4 A sentença judicial Venosa (2006, p. 307), expõe que a sentença que concede a adoção tem cunho constitutivo. Quando prolatada a sentença de adoção, opera-se simultaneamente a extinção do poder familiar anterior. O mesmo autor cita, que após o trânsito em julgado, será inscrita no Cartório do Registro Civil, mediante mandado do qual não será fornecida certidão. É cancelado o registro original do adotado, não mais fazendo menção quanto à modificação. 68 Fonte: Boletins dos grupos de estudos e apoio à adoção do Estado de Santa Catarina Livro: 101 perguntas sobre adoção – CECIF. 86 Dispõe o art. 47 do Estatuto da Criança e do Adolescente: Art. 47. O vínculo da adoção constitui-se por sentença judicial, que será inscrita no registro civil mediante mandado do qual não se fornecerá certidão. Para Liberati (1995, p.157-158): A certeza da segurança e da regularidade processual nas ações de adoção fundamenta-se na sentença definitiva, atividade da autoridade judiciária que resolve o conflito de interesses ou homologa a vontade das partes. Os efeitos desta sentença, operam-se a partir do trânsito em julgado da decisão judicial. Com esta sentença, o registro original do adotado é cancelado e com ele, os vínculos com os pais biológicos, para tanto é expedido mandado para o cartório de registro civil para que se proceda ao novo registro do adotado. 3.2 ORGÃOS ENVOLVIDOS NO PROCEDIMENTO DE ADOÇÃO NO ESTADO DE SANTA CATARINA 3.2.1 CEJA - Comissão Estadual Judiciária de Adoção O Estatuto da Criança e do Adolescente previu a criação de Comissões Estaduais Judiciárias de Adoção nos Estados brasileiros. Em Santa Catarina sua instituição adveio através da Resolução nº 001/93, de junho de 1993, com suas atribuições e disciplinamento achando-se previstos no Provimento nº 12/93, da 69 Fonte: Boletins dos grupos de estudos e apoio à adoção do Estado de Santa Catarina Livro: 101 perguntas sobre adoção – CECIF. 87 Corregedoria-Geral da Justiça. Constitui-se a Comissão, presidida pelo CorregedorGeral da Justiça, de mais cinco membros: um Juiz da Vara da Infância e Juventude da comarca da Capital; um Procurador de Justiça; um representante da Ordem dos Advogados do Brasil - Secção de Santa Catarina; um representante do Conselho Regional de Psicologia e um representante do Conselho Regional de Serviço Social. Segundo dados da CEJA, atualmente em Santa Catarina há aproximadamente 1.000 crianças em medida de abrigo, e, portanto, em situação de risco, pois o tempo prolongado de afastamento dessas crianças de suas famílias pode acarretar o seu abandono total, já que a colocação em família substituta, na modalidade adoção, é dificultosa a partir dos 7 anos, e se inviabiliza quando atingem 12 anos, mesmo quando é internacional. Dentre as atribuições da CEJA, destacam-se: • Receber e processar os pedidos de habilitação, formulados por estrangeiros interessados em adotar no Estado; • Elaborar parecer nos processos de habilitação para adoção internacional; • Auxiliar os Juízos da Infância e da Juventude nos procedimentos relativos à adoção nacional e internacional de crianças e de adolescentes, bem como no gerenciamento e manutenção do Cadastro Único Informatizado de Adoção e Abrigo – CUIDA; • Prestar apoio técnico às assistentes sociais que atuam junto aos Juízos da infância e da juventude; • Promover intercâmbio com comissões similares de outros Estados, organismos e instituições internacionais relacionados à adoção, bem como elaborar projetos para captação de recursos à área da infância e da juventude, junto aos mesmos; • Definir as diretrizes de atuação, bem como promover seminários e encontros visando a formação e a capacitação dos servidores na 88 área de adoção; • Elaborar estatísticas e relatórios para avaliação das ações das entidades de abrigo; • Elaborar material informativo relacionado à área da Infância e da Juventude; • Realizar entrevistas de orientação, acerca dos procedimentos necessários à adoção, com interessados nacionais e estrangeiros; e • Acompanhar a adaptação do adotado no exterior, por meio da análise de relatórios e documentos remetidos pelos setores técnicos. Ao que se verifica, esta Comissão busca auxiliar as partes no processo de adoção, não só participando dos atos do processo, mas também promovendo a adoção pelo estado de Santa Catarina. 3.2.2 CUIDA - Cadastro Único Informatizado de Adoção e Abrigo O Cadastro Único Informatizado de Adoção e Abrigo (CUIDA) foi instituído através do Provimento 13/2005, de 20 de outubro/2005. É um sistema de informações acerca de pretendentes à adoção, inscritos e habilitados em Santa Catarina, de entidades de abrigo e de crianças e adolescentes abrigados ou em condições de colocação em família substituta. A nova disciplina introduz mudanças na sistemática de inscrição ficando instituído: • A inscrição de pretendentes à adoção residentes em Santa Catarina será feita unicamente na Comarca em que residem. • Uma vez deferida a habilitação, os pretendentes passam a integrar o cadastro estadual, concorrendo à adoção em todas as comarcas do Estado de Santa Catarina 89 • A inscrição de pretendentes à adoção residentes em outros Estados da Federação será realizada na Central de Adoções do Juízo da Infância e da Juventude da Comarca da Capital. Este Cadastro, conforme ora se verifica, tem por objetivo agilizar os procedimentos relativos ao encaminhamento de crianças e adolescentes para adoção e racionalizar a sistemática de inscrição de pretendentes à adoção evitando a multiplicidade de pedidos. 3.3 O PAPEL SOCIAL DA ADOÇÃO A partir da vigência do Estatuto da Criança e do Adolescente, em 1990, a participação da sociedade no processo de adoção se tornou mais efetiva, tendo em vista o caráter protetor da referida norma. O art. 3º do referido Estatuto reza que: Art. 3º. A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. Já o art. 4° do referido diploma estabelece que: Art. 4º. É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à 90 liberdade e à convivência familiar e comunitária. Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende: a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias; b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública; c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas; d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude. A discussão acerca da conveniência da adoção, no entendimento de Venosa (2006, p. 279), é de cunho sociológico, muito se debatendo com relação as suas vantagens e desvantagens. Venosa (2006, p. 279) também cita que a adoção na modernidade, preenche duas finalidades fundamentais na sociedade que procura esse tipo processo: dar a eles filhos que não podem ter biologicamente e dar pais aos menores desamparados. Leciona Granato (2005, p. 146 -147) que em diversos Estados do Brasil existem Grupos de Apoio à Adoção, integrados por pais adotivos, famílias de apoio, pretendentes à adoção e outros membros da comunidade, que realizam trabalho de grande alcance social na colocação de crianças e adolescentes em famílias substitutas. Acrescenta também Granato (2005, p. 147) que um marco importante para a questão da adoção foi a escolha do Dia Nacional da Adoção, no dia 25 de maio, que foi instituído através da Lei n° 10.447, de 09/05/2002, pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso. A proposta para a criação desta data foi do Deputado Federal catarinense João Matos que a escolheu em homenagem ao primeiro encontro nacional de associações e grupos de apoio à adoção realizada em Rio Claro (SP), em 1996. Tal fato veio demonstrar que a questão da adoção vem sendo difundida na sociedade, que vem enxergando a problemática 91 com uma visão mais ampla. Essa proteção ao menor e ao instituto da adoção procura evitar o abandono de menores nas instituições. Evidencia Erdelyi (2007, 1) que os abrigos do país têm atualmente 80 mil crianças. Destas, apenas 8 mil estão disponíveis para a adoção porque não possuem mais nenhum vínculo familiar. Mas do total, poucas têm chances de serem adotadas. A maioria dos casais procura um perfil de criança que não é da maioria. Normalmente tem que ser branca, saudável, de zero a um ano de idade e sem irmãos. No Estado de Santa Catarina há 1.266 crianças vivendo em abrigos, casas de passagem, lares ou projetos de famílias acolhedoras70. No Estado, no mês de maio, havia 158 crianças para adoção e 3.375 inscritos no Cadastro Único Informatizado de Adoção e Abrigo de Santa Catarina (Cuida), entre eles, 849 residentes em outros Estados e 233 estrangeiros. O número elevado de candidatos, e a aparente disparidade entre os que querem adotar e crianças disponíveis para a adoção, não são motivos coerentes para a demora de alguns processos71. No entanto, Célia Teodorowiski72 (2008, p. 1) afirma que, diferentemente do que grande parte da população imagina, o processo de adoção legal não é complicado. Segundo Teodorowiski (2008, p. 1): 70 Fonte: Artigo intitulado “Filhos da violência à espera de uma família”. Disponível no site do Portal da Adoção. Disponível em <http://www.adocao.info/2008/06/filhos-daviolncia-espera-de-uma-famlia.html>. Acesso em 03 nov 2008. 71 Fonte: Artigo intitulado “Filhos da violência à espera de uma família”. Disponível no site do Portal da Adoção. Disponível em <http://www.adocao.info/2008/06/filhos-daviolncia-espera-de-uma-famlia.html>. Acesso em 03 nov 2008. 72 Célia Teodorowiski, assistente social do Fórum de Canoinhas. In “Filhos da violência à espera de uma família”. Disponível no site do Portal da Adoção. Disponível em <http://www.adocao-.info/2008/06/filhos-da-violncia-espera-de-uma-famlia.html>. Acesso em 03 nov 2008. 92 O que realmente complica e faz com que o processo se arraste por anos, são as exigências estabelecidas pelos candidatos à adoção, que querem um determinado perfil de criança, e aí a demora aumenta. Uma pesquisa realizada pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) apontou que 34% das pessoas que gostariam de adotar uma criança iriam às maternidades e hospitais em busca da criança, e não ao Fórum, onde o processo se inicia73. Segundo Teodorowiski (2008, p. 1), a busca pela criança perfeita é um fator que apenas dificulta o processo. Há pessoas que estão há anos na fila de espera, porque querem o que 80% dos candidatos também querem, preferencialmente uma criança de até três anos de idade, do sexo feminino, sem irmãos. A média anual de adoções no Estado é de 450, entre nacionais e estrangeiras. As adoções realizadas por estrangeiros ocupam uma parcela significativa dos processos – em Santa Catarina, a média anual é de 50, o que representa mais de 10% - com a diferença substancial que o perfil procurado é muito diferente do nacional. No último caso, a procura é por crianças entre 7 e 14 anos, pardas ou mulatas, do sexo masculino, que tenham irmãos. Assim como nas adoções feitas por brasileiros, os estrangeiros passam pelas mesmas avaliações, e passam um mês na cidade, para criar vínculos com a criança e facilitar sua adaptação à nova vida74. O que se verifica, através destes dados, é que a adoção internacional tem favorecido mais àquelas crianças cujos padrões não são os buscados pelos brasileiros. 73 Fonte: Artigo intitulado “Filhos da violência à espera de uma família”. Disponível no site do Portal da Adoção. Disponível em <http://www.adocao.info/2008/06/filhos-daviolncia-espera-de-uma-famlia.html>. Acesso em 03 nov 2008. 74 Fonte: Artigo intitulado “Filhos da violência à espera de uma família”. Disponível no site do Portal da Adoção. Disponível em <http://www.adocao.info/2008/06/filhos-daviolncia-espera-de-uma-famlia.html>. Acesso em 03 nov 2008. 93 Com isto, infere-se que alguma solução mais abrangente, além das campanhas atualmente realizadas, deve ser encontrada com urgência, a fim de buscar no país, pretendentes que se disponibilizem a adotar essas crianças com o perfil preferido pelos estrangeiros, posto que para esses, o processo de adoção é mais exigente e minucioso, o que dificulta o encontro de um lar para grande parte dos menores abrigados em asilos. 94 CONSIDERAÇÕES FINAIS Teve a presente monografia o objetivo de investigar, à luz da legislação, da doutrina e da jurisprudência pátria, os aspectos procedimentais e sociais da adoção. O interesse pelo tema abordado deu-se em razão de sua atualidade, diante da forma como a adoção vem sendo encarada pela sociedade e também pela forma como os juristas tem buscado difundir as inovações e as facilidades de se adotar uma criança, mormente os magistrados de Santa Catarina que têm efetuado campanhas de divulgação do CEJA e do CUIDA. Para desenvolvimento lógico da pesquisa monográfica, o trabalho foi dividido em três capítulos. O primeiro tratou acerca da família, que, conforme se observou na elaboração do trabalho, sempre foi um dos pilares da sociedade, e com o passar dos tempos foi acompanhando a evolução desta e transformando-se gradativamente. Conforme disposto naquele capítulo, inferiu-se que a evolução da família aconteceu gradativamente, passando da “família coletiva”, aquela que proporcionava segurança a todos os membros do clã à “família individual”, onde os indivíduos passaram a se mentar unidos pela consangüinidade. Analisando o instituto verificou-se que a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 teve um importante papel na evolução do conceito deste instituto, ao estatuir que ela “é a base da sociedade, tem especial proteção do Estado” (artigo 226). Tratou, ainda, este capítulo, acerca do poder familiar, que é o conjunto de obrigações, a cargo dos pais, no tocante à pessoa e bens dos filhos. Abordou, ao final, acerca das modalidades de 95 colocação de menor em família substituta, quais sejam: a guarda, que é a modalidade mais simples de colocação em família substituta, porém não retira o poder familiar dos pais biológicos; a tutela, que é um instituto que objetiva suprir uma incapacidade de fato e de direito de uma pessoa que necessita de proteção e adoção, que, das três modalidades de colocação do menor em família substituta, é a que possui maior relevância no ordenamento jurídico, por sua natureza e por seus efeitos jurídicos e fáticos. Já o segundo capítulo foi destinado a analisar o instituto da adoção, que é bem antigo entre os povos, podendo ser verificado que este era utilizado desde a Antiguidade como forma de perpetuar o culto doméstico. A respeito da evolução do instituto, verificou-se que a doutrina deu proteção integral e vedou qalquer tipo de referências discriminatórias na filiação, o que alterou profundamente o enfoque dado à infância e à adolescência, rompendo-se a ideologia do assistencialismo e da institucionalização, que privilegia o interesse e a vontade dos adultos. Através do estudo deste instituto pode-se observar que a adoção é ato jurídico solene pelo qual, observados os requisitos legais, alguém estabelece, independentemente de qualquer relação de parentesco consangüíneo ou afim, um vínculo fictício de filiação, trazendo para sua família, na condição de filho, pessoa que, geralmente, lhe é estranha. Verificou-se, ainda, que as espécies de adoção existentes são: unilateral, que é aquela em que um ou ambos os cônjuges possuem filhos de uniões anteriores e o novo parceiro adota-os; a adoção de maiores, que no antigo Código Civil podia ser efetuada extrajudicialmente e com a nova sistemática passou a ter obrigatoriedade de apreciação judicial; a adoção Internacional, admitida constitucionalmente, sendo delegado à lei o estabelecimento dos casos e das condições de sua efetivação por estrangeiros; a adoção póstuma, 96 que é aquela que se dá após a morte do adotante quando este manifestar de forma inequívoca o seu desejo de adotar o adotando; a adoção à brasileira” ou afetiva, muito comum no Brasil, porém proibida por lei, por constituir crime contra o estado de filiação, de acordo com o que dispõe o art. 242, do Código Penal Brasileiro; a adoção intuitu “personae”, que é aquela em que o pretendente à adoção já convive com o menor e busca a sua legalização; a homoparental, que vem sendo amplamente discutida na doutrina, haja vista a sua polêmica; o chamado filho de “criação”, que é aquela criança que é criada no seio de uma família como se fosse filho legítimo, recebendo essa designação, por vezes, para justificar a convivência naquele meio social sem ter cunho biológico com ele; e, finalmente, a adoção de nascituro, que, embora expressamente consagrada no Código Civil de 1916, no art. 372, não está prevista no atual Código Civil. Por fim, estabeleceu-se um paralelo entre as normas do Estatuto da Criança e do Adolescente e Código Civil de 2002 no tocante à adoção. Finalmente, no terceiro e último capítulo, estudou-se o tema central da pesquisa, ou seja, os aspectos procedimentais da adoção. Através do estudo desse capítulo verificou-se que qualquer pessoa que preencha os requisitos prescritos no Estatuto da Criança e do Adolescente e no Código Civil Brasileiro poderá adotar, não fazendo a lei, qualquer distinção em relação ao estado civil do pretenso adotante. Ademais, constatou-se que os interessados à adoção devem, ainda, preencher um Cadastro de Pretendentes à Adoção do fórum da comarca de residência. No tocante ao processo de adoção, inferiu-se que este tem seu início através de petição inicial, formulada por advogado, a qual, será recebida pelo juiz, que determinará a realização de estudo social, ou 97 perícia por equipe interprofissional, decidindo sobre o estágio de convivência, quando for o caso. Feito o relatório social ou laudo pericial, ouvindo-se, se possível, o adotando, dar-se-á vista dos autos ao Ministério Público, pelo prazo de 5 dias, e a autoridade judiciária, então, deverá decidir em igual prazo. Ficou demonstrado que, concluído o processo, o juiz determinará a expedição de dois mandados: um para cancelar o registro original e outro para fazer a inscrição do novo registro de nascimento, com todos os dados indicados pelos adotantes, não acarretando distinção entre um registro de nascimento do filho adotivo e o registro do filho biológico. Após a adoção não poderá constar em nenhum documento da criança adotiva qualquer observância sobre o fato. No tocante aos órgãos envolvidos no processo de adoção, verificou-se que este instituto, no estado de Santa Catarina, conta com o CEJA - Comissão Estadual Judiciária de Adoção, que adveio através da Resolução nº 001/93, de junho de 1993, com suas atribuições e disciplinamento achando-se previstos no Provimento nº 12/93, da Corregedoria-Geral da Justiça e com o CUIDA - Cadastro Único Informatizado de Adoção e Abrigo, instituído através do Provimento 13/2005, de 20 de outubro/2005, que é um sistema de informações acerca de pretendentes à adoção, inscritos e habilitados em Santa Catarina, de entidades de abrigo e de crianças e adolescentes abrigados ou em condições de colocação em família substituta. Através deste capítulo pôde-se constatar que da forma como a adoção vem sendo encarada pelos pretendentes nacionais, a adoção internacional tem favorecido mais àquelas crianças cujos padrões não são os buscados pelos brasileiros. Tal observação leva a crer que alguma solução mais abrangente, além das campanhas atualmente realizadas, deve ser encontrada com urgência, a fim de buscar dentro do país, pretendentes 98 que se disponibilizem a adotar essas crianças com o perfil preferido pelos estrangeiros, posto que para esses, o processo de adoção é mais exigente e minucioso, o que dificulta o encontro de um lar para grande parte dos menores abrigados em asilos. Retomando-se as hipóteses da pesquisa, pôde-se concluir que: a) atualmente, com as mudanças advindas da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, a família passou a ter um papel diferente daquele paradigmado no início do século, assumindo, pois, novas formas. Assim, se antes a família era aquela que girava em torno do pai e mãe, casados e com filhos, a chamada Família Matrimonial, atualmente, tem se admitido outras formas, tais como a União Estável, o Combumbinato, a União Homoafetiva, a Família Monoparental e a Família Substituta; b) a adoção é instituto antigo entre os povos, podendo ser verificado que este era utilizado desde a Antiguidade como forma de perpetuar o culto doméstico, ou como forma de manutenção do culto familiar pela linha masculina. Já no Direito Brasileiro, o Código Civil de 1916 tratava tanto a adoção de maiores como a de menores por “adoção simples”. Nessa modalidade só podia adotar quem não tivesse filhos. A adoção era levada a efeito por escritura pública e o vínculo de parentesco limitava-se ao adotante e ao adotado. Com a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 a distinção entre adoção e filiação foi eliminada ao deferir idênticos direitos e qualificações aos filhos, proibidas quaisquer designações discriminatórias. Atualmente, o Código Civil instituiu o sistema de adoção plena, mantendo a orientação do Estatuto da Criança e do Adolescente, revestindo a adoção, tanto de adultos, como de crianças e adolescentes, das mesmas características, sujeitando-se em qualquer hipótese a processo judicial; c) O início do processo de adoção se dá através de petição inicial, formulada por advogado, a qual, será recebida pelo juiz, que determinará a realização de estudo social, ou perícia por equipe interprofissional, decidindo sobre o estágio de convivência, quando for o caso. Feito o relatório social ou 99 laudo pericial, ouvindo-se, se possível, o adotando, dar-se-á vista dos autos ao Ministério Público, pelo prazo de 5 dias, e a autoridade judiciária, então, deverá decidir em igual prazo. Concluído o processo, o juiz determinará a expedição de dois mandados: um para cancelar o registro original e outro para fazer a inscrição do novo registro de nascimento, com todos os dados indicados pelos adotantes, não acarretando distinção entre um registro de nascimento do filho adotivo e o registro do filho biológico. Após a adoção não poderá constar em nenhum documento da criança adotiva qualquer observância sobre o fato. Tais atos parecem simples teoricamete, porém os juízos da Infância têm encontrado dificuldades no trâmite dos processos de adoção graças à falta de aparelhamento judiciário, que atualmente é precária no tocante a funcionários preparados à realização de estudos sociais e acompanhamento psicológico das partes envolvidas, devido ao número elevado de trabalho para o número reduzido de funcionários. Aliado a este fato, tem-se a questão de preferência dos interessados em adoção, que alongam a fila de espera, tanto deles, que buscam crianças perfeitas e recém nascidas, quanto a dos menores que não preenchem os padrões desejados e, por isso, ficam fadados a aguardar nas instituições alguém que os queira adotar. Assim, verificou-se que as hipóteses foram todas confirmadas haja vista que se pôde verificar quais os principais entendimentos doutrinários e jurisprudenciais a respeito do tema, bem como confrontar os principais entendimentos. Por fim a conclusão a que se chegou foi que a a doção é instituto que sofreu alterações na sua essência com o tempo, passando de instituto assistencialista a uma forma de se buscar não só um lar para uma criança, mas também um filho para uma família. 100 REFERENCIAS DAS FONTES CITADAS AZEVEDO, Álvaro Villaça. Estatuto da família de fato. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2002. 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