INSTITUTO SUPERIOR DE EDUCAÇÃO IVOTI MARLICE MARIA FRANZ FROEHLICH O LÚDICO NO PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DO NÚMERO Ivoti - RS 2006 MARLICE MARIA FRANZ FROEHLICH O LÚDICO NO PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DO NÚMERO Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Instituto Superior de Educação Ivoti como prérequisito para obtenção do título de licenciado em anos iniciais do ensino fundamental, do Curso Normal Superior, orientado pela professora Vera Kern Hoffmann. Ivoti - RS 2006 AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus por ter me dado forças e coragem para que pudesse realizar este sonho. Ao meu marido Clóvis e minha filha Amanda que souberam compreender minhas ausências durante esta caminhada. Aos meus familiares, amigos e todas as pessoas que me incentivaram e apoiaram neste percurso. “A felicidade é algo que se multiplica quando se divide.” (COELHO, 1995) RESUMO O presente Trabalho de Conclusão de Curso: “O Lúdico no Processo de Construção do Número”, realiza a pesquisa bibliográfica do desenvolvimento do conhecimento lógicomatemático, com vistas ao processo de construção do número. Consiste, também, da aplicação, da observação e do registro das reações de crianças perante o estímulo de atividades lúdicas. As atividades foram propostas em uma escola de uma rede municipal com alunos de 1º ano, na faixa etária de seis anos. O professor, ao propor as práticas educativas desencadeadoras do conhecimento lógico-matemático favorece a criança no seu processo de construção do número, promovendo suas aprendizagens. Palavras-chave: conhecimento lógico-matemático; construção do número; atividades lúdicas. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO..................................................................................................................... 7 2 ACONSTRUÇÃO DO NÚMERO PELA CRIANÇA........................................................ 9 3 A CONTRIBUIÇÃO DAS ATIVIDADES LÚDICAS NO PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DO NÚMERO............................................................................................19 3.1 DIFERENÇAS NO AGIR E PENSAR DAS CRIANÇAS NA FASE PRÉOPERACIONAL E DAS OPERAÇÕES CONCRETAS........................................................ 22 3.1.1 Jogo Aplicado – Jogo da Pesca......................................................................... 23 3.2 JOGOS APLICADOS NA TURMA DO 1º ANO............................................................. 27 3.2.1 Jogo a Partir da História: A Galinha Choca.................................................. 27 3.2.2 Jogo da Pesca..................................................................................................... 30 3.2.3 Jogo do Boliche.................................................................................................. 32 3.2.4 Jogo do Boliche das Cores................................................................................ 34 4 CONCLUSÃO..................................................................................................................... 37 REFERÊNCIAS..................................................................................................................... 39 1 INTRODUÇÃO “Todo aprendizado que o brincar permite é fundamental para a formação da criança, em todas as etapas da sua vida”. (MALUF. 2004, p. 21) A aprendizagem de matemática, para muitas pessoas, reduz-se à obtenção de respostas corretas e da execução correta de algoritmos. Essa e outras concepções têm se modificado ao longo do tempo. Ao professor cabe oferecer aos alunos situações variadas e diferenciadas para que os alunos realizem descobertas e possam desenvolver suas habilidades de resolução de problemas e da construção de novas competências e conhecimentos. A ludicidade contribui para o desenvolvimento integral de cada nível do pensamento da criança e oportuniza interações reflexivas na forma de pensar e agir em favor da promoção dos processos de desenvolvimento da criança. Quanto mais a criança participar de atividades lúdicas, novos conhecimentos se manifestam tornando seu aprender muito mais prazeroso. Este trabalho objetiva vivenciar múltiplas situações de jogos significativos, em contextos adequados para a construção da aprendizagem da criança. Pensou-se em descrever, aplicar, observar e registrar a reação das crianças perante o estímulo das atividades lúdicas propostas com o intuito de contribuir no processo de assimilação e construção do número pela criança. O primeiro capítulo refere-se ao reconhecimento de fatos cientificamente aceitáveis sobre a construção do conhecimento lógico matemático, bem como das teorias a respeito da construção e conservação do número pela criança durante o seu desenvolvimento. O segundo capítulo consta da descrição de jogos matemáticos, da realização dos mesmos por crianças das séries iniciais, assim como do registro das relações ou hipóteses construídas pelas crianças sobre os acontecimentos vivenciados. 8 O desafio dessa proposta lúdico-matemática será o “aprender brincando” em concordância com as necessidades e dificuldades do educando, fazendo com que a matemática seja integrante efetiva do cotidiano escolar, vista como uma saber construído com prazer, interesse e com sentido para a criança. 2 A CONSTRUÇÃO DO NÚMERO PELA CRIANÇA O conhecimento só emerge em sua dimensão vitalizadora quando tem algum tipo de ligação com o prazer. (ASSMANN, 2001, p.31) O conhecimento, segundo a teoria de Piaget, é construído durante as interações da criança com o mundo. Ele não está no sujeito nem no objeto, mas no confronto entre os dois, frente à realidade em que estão inseridos. O conhecimento não só surge da ação, como consiste numa ação, portanto, é através da ação que se estabelece a diferenciação entre o sujeito que conhece e o objeto a ser conhecido. BECKER ao escrever sobre a epistemologia genética, construtivista, cita: O conhecimento não está no sujeito quando o indivíduo nasce, o conhecimento não está no objeto, ou seja, no meio físico ou social, não está na cabeça do professor com relação ao aluno, nem na cabeça do aluno com relação ao professor; o conhecimento se dá por um processo de interação radical entre o sujeito e objeto, entre indivíduo e sociedade, entre organismo e meio. (BECKER, 2001, p.36) É através da ação da criança sobre o objeto que se estabelece uma interação radical que vai produzindo o conhecimento, portanto, o conhecimento é um processo de construção. Piaget identificou três tipos de conhecimento: conhecimento físico, conhecimento lógico-matemático e conhecimento social. O conhecimento físico é o conhecimento dos objetos e das ações sobre estes objetos, é o conhecimento da realidade externa, que pode ser conhecido por meio da observação. O conhecimento lógico-matemático tem sua origem na mente do indivíduo. Consiste na coordenação de relações simples que cada indivíduo cria entre os objetos. O conhecimento social tem suas convenções construídas pelas pessoas, é um conhecimento completamente arbitrário não existindo nenhuma relação física ou lógica entre 10 um objeto e seu nome, portanto, para que um indivíduo adquira o conhecimento social é indispensável à intervenção de outras pessoas. A construção do conhecimento é constituída por vários fatores importantes, as características biológicas consistem no primeiro fator por exercer influência, mas sem fornecer uma estruturação psicológica pronta desde o nascimento. Outro aspecto é o que se refere às transmissões sociais que vão sendo gradativamente organizadas à medida que são incorporadas. O terceiro fator atribui-se ao conhecimento que a criança retira de suas experiências com objetos físicos e sociais. Esses fatores vistos isoladamente não poderão explicar os avanços na evolução do conhecimento. Deve haver uma ligação entre eles e esta faz existir o fator principal para o desenvolvimento do ser nesse processo contínuo de desequilíbrio para o equilíbrio, a “equilibração”. A equilibração se caracteriza pelo equilíbrio entre si e os fatores citados anteriormente, equilibrando a descoberta de uma nova resposta, integrando um novo dado, uma nova afirmação às outras já existentes no entendimento do sujeito. A criança, ao nascer, apresenta poucos esquemas. À medida que ela vai crescendo, seus esquemas tornam-se mais “adultos”. Os esquemas são percebidos pelos padrões de comportamento e estes se transformam a tal ponto que os conceitos dos adultos são diferentes dos conceitos das crianças. Os processos responsáveis por essa mudança são a assimilação e acomodação. A acomodação é a criação de novos esquemas ou a modificação de esquemas antigos que resultam em uma mudança na estrutura cognitiva, explicando o desenvolvimento da mente. A assimilação é uma parte do processo pelo qual alguém cognitivamente se adapta ao ambiente e o organiza, integrando novos dados aos já existentes. Juntos eles explicam a adaptação intelectual e o desenvolvimento das estruturas cognitivas. Piaget constatou que a criança constrói o seu conhecimento durante as interações com o mundo. A palavra interação é composta por “inter” e “ação”, a ação da criança sobre o mundo e a ação do mundo sobre a criança. De acordo com SEBER, precisamos pesquisar que parte cabe aos fatores externos e a que diz respeito aos internos da organização cognitiva, já que se complementam, apesar de terem direções opostas. Ela coloca que: As transformações sociais interferem no desenvolvimento da inteligência, mas as influências não são recebidas passivamente e nem assimiladas em bloco, isto é, de uma só vez. As informações vão sendo gradativamente organizadas à medida que são incorporadas. Essa organização cognitiva se modifica segundo aquele fator de equilibração que tanto explica, como explica também a possibilidade das transmissões sociais poderem ser compreendidas pela criança. (SEBER, 1995, p.15) 11 As mudanças no desenvolvimento cognitivo ocorrem em estágios de maneira seqüencial e integrativa. Os esquemas são construídos e reconstruídos ou modificados gradualmente. Na perspectiva piagetiana, o desenvolvimento cognitivo, enquanto processo contínuo, pode ser dividido em quatro níveis seqüenciais para fins de análise e descrição: ●O estágio da inteligência sensório-motora ( 0 – 2 anos) Nessa fase, a criança explora o mundo através dos sentidos, isto é, ela precisa tocar, provar os objetos. Essa exploração não é intencional, ela ocorre acidentalmente, por reflexos. No primeiro mês de vida, o recém-nascido busca alimentação e a libertação de desconfortos, suga e chora. O afeto é associado com os reflexos, não há “sentimentos”. Quando nasce a criança é totalmente egocêntrica. Ao longo do desenvolvimento sensóriomotor, se desenvolve essa noção de causalidade, uma consciência de relações de causa e efeito. No segundo período do desenvolvimento sensório-motor (1-4 meses), os comportamentos começam a ser modificados. Torna-se habitual chupar o polegar refletindo o desenvolvimento na coordenação mão-boca; os olhos começam a seguir o movimento dos objetos e a cabeça movimenta-se em direção aos sons. Durante esse período, a questão afetiva permanece voltada para o próprio corpo, sendo este o foco de toda afetividade e afeto. No período 3 (4-8 meses), a criança já se orienta para outros objetos e eventos além do seu próprio corpo, pega e manipula os objetos que consegue alcançar. Também tenta repetir experiências ocorridas que lhe são interessantes. No final do primeiro ano de vida, a criança começa a diferenciar meios e fins, ela pode ser vista afastando um objeto para obter outro que ela queira. É nesse período que a criança pela primeira vez demonstra consciência de que além dela outros objetos podem se constituir nas causas das ações. No segundo ano de vida, com a diferenciação cognitiva que a criança faz de si em relação aos objetos, os sentimentos como gostar e não-gostar podem começar a ser dirigidos para os outros, sendo o primeiro passo do desenvolvimento “social”. Durante esse período que a criança passa de um nível de inteligência sensório-motora para a representacional. ●O estágio do pensamento pré-operacional ( 2 – 7 anos) É no segundo ano de vida que as primeiras formas verdadeiras de representação mental ocorrem, a criança ao brincar imitando uma situação anterior vivida com seus pais, 12 está engajada numa imitação diferida. Ela desenvolve a capacidade de representar mentalmente o comportamento imitado. Nesse período as crianças também começam a representar as coisas por símbolos: um cabo de vassoura é um cavalo, uma cadeira empurrada é um trem, etc. Piaget nos assegura que a natureza livre do jogo simbólico tem um valor essencialmente funcional e não é uma simples diversão. É uma fase puramente egocêntrica e caracterizada pela irreversibilidade, ou seja, a criança considera que todos pensam como ela. A noção de espaço adquirida por volta dos dois anos antecede a noção de tempo, surgindo por volta dos quatro anos. A criança também não consegue entender transformações, mesmo que elas ocorram na sua presença. O raciocínio lógico representa um avanço sobre a inteligência sensório-motora, mas não alcança as operações lógicas do estágio das operações concretas, o comportamento cognitivo é ainda influenciado pelas atividades perceptivas. ●Estágio das operações concretas ( 7 – 11 anos) A criança já consegue usar a lógica para chegar às soluções da maior parte dos problemas concretos. O que foi pensado, pode ser repensado, refeito. Não é egocêntrica em pensamento, podendo assumir o ponto de vista dos outros. Entretanto, sua dificuldade aumenta quando se trata de lidar com problemas não-concretos. Pode ser observado o progresso dos conceitos morais: a compreensão de regras, mentiras, acidentes e justiça. Começa-se a manifestar a cooperação e entendem que as regras podem ser mudadas desde que haja concordância de todos. ●O estágio das operações formais ( 11 – 15 anos) O pensamento lógico já consegue ser aplicado a todos os problemas que surgem. Ela pode agora raciocinar mentalmente em termos de conceitos e abstrações, em vez de se basear em objetos reais e concretos, alcançando um nível de raciocínio adulto em potencial. Piaget destaca que o desenvolvimento das operações mentais depende de um meio rico de estímulos. Em um ambiente adequado e propício, a criança desenvolve melhor suas potencialidades, favorecendo assim não só seu crescimento físico, como o emocional e social. A inteligência, o desenvolvimento intelectual, na visão de Piaget, compreende dois aspectos fundamentais: o aspecto cognitivo e o aspecto afetivo. 13 O cognitivo é composto pelo conteúdo, pela função e pela estrutura. O conteúdo é o que a criança conhece. A função refere-se às características da atividade intelectual (assimilação e acomodação). A estrutura atribui-se às explicações de determinados comportamentos que se transformam à medida que a criança cresce. Piaget concluiu que a criança não tem a mesma estrutura mental do adulto, não pensa como ele, portanto, não é um adulto em miniatura. A afetividade decide que experiências são selecionadas para a construção do conhecimento, sendo que, este se desenvolve na medida que a criança faz assimilações e acomodações das experiências através de ações mentais ou físicas. O aspecto afetivo tem uma profunda influência sobre o desenvolvimento intelectual, pode acelerar ou diminuir o ritmo da aprendizagem da criança. Ele inclui sentimentos, interesses, desejos, tendências, valores e emoções. Piaget entende que o afeto se desenvolve através da motivação da atividade intelectual. Uma criança só estará habilitada ao mundo do conhecimento quando tiver o desejo de saber, quando descobrir as diferenças que a angustiam e através desta angústia desejar descobrir, saber e aprender. GADOTTI comenta que “só é possível conhecer quando se deseja, quando se quer, quando nos envolvemos profundamente com o que aprendemos.” (GADOTTI, 2003, p. 43) À medida que os aspectos cognitivos se desenvolvem, também há um desenvolvimento paralelo da afetividade. WADSWORTH esclarece que os mecanismos de construção do cognitivo e do afetivo são os mesmos, ele afirma que “as crianças assimilam as experiências aos esquemas afetivos do mesmo modo que as simulam as experiências as estruturas cognitivas.” (WADSWORTH., 1997, p.38) Para ultrapassar os níveis das atividades e estimular a construção do conhecimento cognitivo é necessário conhecer as peculiaridades do período no qual a criança se encontra. Já que o que se pretende alcançar com as atividades planejadas, descritas e aplicadas posteriormente nesse trabalho, cuja aplicação será realizada com crianças entre seis e sete anos, faz-se necessário pesquisar as características do estágio pré-operatório. No desenvolvimento do período pré-operacional a criança transforma-se de um ser que funciona de um modo sensório-motor e de pensamento que acontece através das ações para um ser que é capaz de representar eventos internamente. Neste período, o pensamento da criança é caracterizado pelo aproveitamento de novas capacidades. A da representação de objetos e eventos compreende vários tipos conforme a ordem do seu aparecimento: a imitação 14 diferida, o jogo simbólico, o desenho, a imagem mental e a linguagem falada, começando a se manifestar por volta dos dois anos de idade. O aparecimento da atividade representativa, que é a marca do término do estágio sensório-motor e do início do pré-operatório, não alcança ainda as operações lógicas dos níveis posteriores. O comportamento cognitivo, durante esse estágio, ainda é influenciado pelas atividades perceptivas. Nessa fase as crianças apresentam algumas características necessárias ao desenvolvimento contínuo do pensamento, atuando como um obstáculo ao pensamento lógico: ● Egocentrismo – tudo está centrado em sua pessoa, em seus sentimentos e ações, a criança não pode assumir o papel ou o ponto de vista do outro. Acredita que todos pensam como ela e que seus pensamentos são os corretos. ● Centração – Cada aspecto da realidade é considerado isoladamente, não havendo condições de percepção da situação como um todo, quando busca uma solução. ● Raciocínio Transformacional – a criança ainda é incapaz de raciocinar com sucesso sobre transformações inibindo o desenvolvimento da lógica do pensamento. ● Reversibilidade- a criança tem a incapacidade de reverter as operações. Somente quando as ações se tornarem reversíveis ela estará apta a raciocinar, por exemplo, sobre duas fileiras de igual comprimento, contendo oito moedas cada, concorda que as duas têm a mesma quantidade de moedas, mas ao alongar uma das fileiras, ela não mais concorda que as duas tenham o mesmo número de moedas. Essas características podem ser vistas como obstáculos ao pensamento lógico matemático, mas são necessárias ao desenvolvimento e ocorrem naturalmente, podendo ser melhor observadas nos problemas de conservação desenvolvidos por Piaget e seus colaboradores. WADSWORTH diz que a conservação atribui-se a idéia de que a quantidade de uma matéria continua a mesma sem depender de qualquer mudança em qualquer sentido: A conservação refere-se ao conceito de que a quantidade de uma matéria permanece a mesma independente de quaisquer mudanças em uma dimensão irrelevante. Por exemplo, se temos uma fileira de oito moedas e se mudamos as moedas, abrindo um espaço maior entre elas, nós ainda temos oito moedas. Isto é, o número de moedas não muda quando se introduz uma mudança em uma dimensão não relevante (neste caso, o comprimento da fileira ou a distância entre as moedas) (WADSWORTH, 1999, p. 81). 15 A não conservação é própria da criança, durante seu desenvolvimento pré-operacional, não conseguindo entender a invariância de uma dimensão frente a alterações em outras dimensões. Por volta dos sete anos, final do estágio pré-operacional, a criança já desenvolveu algumas estruturas de conservação. A passagem da não conservação para a conservação se procede gradualmente ocasionado pela reformulação ativa de esquemas já desenvolvidos. No processo de construção do conhecimento lógico-matemático, as relações que a criança estabelece entre os objetos são básicas. A fonte desse conhecimento provém das relações criadas por cada indivíduo. É a partir da criação e coordenação dessas relações que o ser humano constrói o conceito de número necessitando uma abstração reflexiva. A fonte de conhecimento físico vem do mundo externo, a criança descobre as propriedades físicas dos objetos agindo sobre eles e percebendo como eles reagem em suas interações. Ele necessita da abstração simples, ou empírica, portanto, a abstração das propriedades observáveis como: a cor, a textura, o peso, a forma, a propriedade de um objeto quebrar, dobrar ou destruir. Piaget explica que um quadro lógico-matemático é necessário para uma abstração simples em todos os níveis de desenvolvimento, a abstração simples é igualmente necessária para construir seu quadro lógico-matemático aos níveis sensório-motor e pré-operacionais. RANGEL descreve a abstração reflexiva como sendo um mecanismo presente em todos os níveis da vida. A abstração reflexiva ocorre quando o indivíduo é capaz de coordenar esquemas já construídos, reorganizando-os frente a novos dados. Ela diz que “a abstração reflexiva se caracteriza por um processo de reorganização da estrutura com novas combinações cujos elementos são retirados do sistema anterior, integrando-se a estes as “novidades” provocadoras do desequilíbrio”. (RANGEL, 1992, p.46) Portanto, o conhecimento lógico matemático, não é empírico, ele tem sua origem na mente de cada indivíduo. KAMIÍ diz que a estrutura lógico-matemática de número não pode ser ensinada diretamente, uma vez que a criança tem que construí-la por si mesma: ...relações precisam ser criadas por cada indivíduo porque idéias como “diferente”, “similar” ou “dois” não existem no mundo externo, observável. As crianças acabam elaborando seu conhecimento lógico-matemático coordenando as relações simples que elas criaram entre os objetos. ( KAMIÍ, 2001, p.23 ). Outra característica do conhecimento lógico matemático é que se ele é construído uma vez, não é mais esquecido. Uma vez que a criança tenha construído a inclusão terá incorporado a idéia de mais um, de que, por exemplo, existem mais animais do que galinhas. 16 As crianças aprendem conceitos numéricos não só através da manipulação de objetos, mas pela abstração reflexiva sobre estes objetos. O conhecimento lógico-matemático só pode suceder da estabilidade interna do sistema lógico construído por ela, não mediante observação, mas pela coordenação de diferenças entre os objetos. É através de jogos estruturados que permitem agrupamentos e seriações, que a criança poderá vivenciar a observação, a comparação, e a classificação, oportunizando-lhe as condições necessárias para o desenvolvimento do raciocínio lógico, auxiliando desta forma, a construção do conceito de número. A construção do número traz junto às idéias de quantidade e da expressão de quantidade. A quantidade é construída através de experiências lógico-matemáticas que, através da descoberta das propriedades das ações exercidas sobre os objetos possibilitam a representação da idéia de número. O professor em vez de apenas focalizar quantificação, deve encorajar a criança a colocar todos os tipos de coisas, idéias, e eventos em relação o tempo todo. A vida diária e os jogos em grupo conduzem à quantificação de objetos e fazem a criança pensar sobre o número e quantidades quando forem significativos para ela. O indivíduo, na medida em que se tornar capaz de criar, em sua mente, fazer relações entre objetos e coordenar tais relacionamentos, estará progredindo na sua inteligência. De acordo com RANGEL, a possibilidade do ser humano estabelecer relações lógicas, sustentadas na sua ação modificadora sobre a realidade que interage é a condição necessária para a construção do conhecimento matemático. O indivíduo pode estabelecer dois tipos de relações entre os objetos: as simétricas, que dão origem à formação da estrutura lógica de classificação e as assimétricas responsáveis pela estrutura de seriação. A classificação é o processo mental que permite arrumar as coisas em grupos, de acordo com um critério previamente escolhido, formando classes. Quando a criança (por volta dos 7-8 anos) tiver a assimilação recíproca entre a extensão (aspecto quantitativo de classe) e a compreensão (aspecto qualitativo da classe), será capaz de compreender que todos os objetos agrupados são alguns dentre os objetos da totalidade a que pertencem. É só mais adiante, com a reversibilidade operatória atingida, que a criança consegue se libertar dos dados da percepção e atingir a síntese da extensão e da compreensão da classe. Assim, a estrutura de classificação se consolida, e a criança passa a ser capaz de realizar inclusões hierárquicas, ou seja, de conceber classes encaixadas sucessivamente umas nas outras. (RANGEL, 1992, p.109) A seriação é a ordenação de uma seqüência lógica, obedecendo a uma regra. Empregamos as relações assimétricas ao seriar objetos, na forma ascendente ou descendente, 17 pelas diferenças ordenáveis de um atributo (tamanho, espessura, peso, velocidade, volume, idade, entre outros). O desenvolvimento das estruturas das relações assimétricas (seriação) obedece a estágios equivalentes as estruturas das relações simétricas (classificação), ocorrendo em épocas mais ou menos semelhantes.A construção do número operatório na criança, segundo Piaget, ocorre em solidariedade rigorosa com as operações da lógica de classificação e seriação. A criança constitui o número em função da sucessão natural do mesmo, ela só constrói o quatro depois de ter construído o um, o dois, o três. A capacidade de a criança contar não garante que ela tenha atingido o seu significado operatório, ela adquire o conceito de número através de um processo muito lento. DUHALDE esclarece que “o contar e o conceito de número se desenvolvem de forma gradual e espiralada. Este desenvolvimento vai se tornando mais complexo e isto provoca uma maior compreensão do número.” (DUHALDE, 1998, p. 39) A experiência cotidiana desperta nas crianças o desejo de saber mais, de ir mais longe, e enquanto crescem interagem com o meio que as cerca e assim vão adquirindo conhecimentos, permitindo-lhes que cheguem à escola com muitas noções matemáticas informais desenvolvidas. A partir dessa idéia DUHALDE afirma que: O conceito de número se adquire a partir de um processo muito lento. Mesmo que as crianças possam aprender a série oral com assombrosa rapidez - tanto que é ensinada pelo núcleo familiar desde pequenas - nem sempre podem utilizá-la para contar. Assim, a série oral converte-se em um poderoso instrumento para ir transformando os conhecimentos numéricos intuitivos em verdadeiros conceitos operatórios. As crianças passam, deste modo, de uma Matemática informal a outra formal e nesta passagem a escola cumpre um papel fundamental. (DUHALDE, 1998, p.35) Para que a criança conserve as quantidades, ela precisa passar por um processo simultâneo no qual possa utilizar procedimentos numéricos em situações de quantificação e comparação de quantidades. Para tanto, é importante que a criança possa através de jogos e brincadeiras, que oferecem uma série de situações envolvendo números, relações de quantidade, noções de espaço e outros, construir o conceito e a conservação de número. O brincar possibilita o encontro de aprendizagens, e a matemática está presente em todos os momentos deste processo. Fazer matemática é expor idéias próprias, escutar a dos outros, é formular, levantar hipóteses, argumentar, resolver problemas. O trabalho relacionado ao ensino e à aprendizagem da matemática pode contribuir para a formação de cidadãos autônomos, capazes de tomarem suas próprias decisões, sabendo resolver seus problemas. KAMIÍ explica que se encorajamos a criança a “construir seu próprio conhecimento e seus 18 valores morais podemos ajudá-la a ir muito mais longe do que com respostas “corretas” e “bons” comportamentos.” (KAMIÍ, 1993, p.80) A autonomia consiste numa situação de confiança da criança em relação ao seu trabalho e seu conhecimento. Desta maneira, é necessário conseguir que as crianças se convençam de que possuem capacidades suficientes para utilizar a matemática, tendo controle sobre seus êxitos e fracassos. Essa autonomia se desenvolve se não deixarmos a criança se sentir tímida frente ao adulto que traz as informações, frente à matemática a ser conquistada e frente ao desejo de descobrir e de ampliar seu conhecimento. Os jogos podem ser um bom tipo de atividade em grupo podendo ser usados para estimular e desenvolver a habilidade da criança a pensar de forma independente, contribuindo para o seu processo de construção do conhecimento lógico-matemático. É no grupo, com outras crianças que ela aprende, pois precisa pensar sobre. É na relação com o outro que haverá um avanço maior na organização do pensamento e é através dos jogos que terá que resolver vários “conflitos”, e com a resolução destes, ampliará seus conhecimentos. SMOLE escreve que “Brincar exige troca de pontos de vista, o que leva a criança a observar os acontecimentos sob várias perspectivas”. (SMOLE, 2000, p. 14 ) Através do brincar a criança desenvolve várias capacidades como a atenção, a concentração, assimila valores, assume comportamentos, desenvolve diversas áreas do conhecimento, exercita-se fisicamente, aprimora habilidades motoras, além de viver uma infância muito mais feliz e, com certeza, melhora seu relacionamento tornando-se um adulto muito mais equilibrado. As crianças são dotadas de criatividade, imaginação e inteligência. MALUF diz que “todo aprendizado que o brincar permite é fundamental para a formação da criança, em todas as etapas da sua vida” (MALUF, 2004, p. 21). MALUF afirma que “a criança encontra nas brincadeiras equilíbrio entre o real e o imaginário, alimenta sua interior, descobre o mundo” (MALUF, 2004, p. 95). No convívio com outras crianças, ela aprende a dar e receber ordens, a esperar sua vez de brincar, a emprestar e tomar emprestado, a compartilhar momentos bons e ruins, a ter tolerância e respeito. 3 A CONTRIBUIÇÃO DAS ATIVIDADES LÚDICAS NO PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DO NÚMERO “Quanto mais a criança participar de atividades lúdicas, novas buscas de conhecimento se manifestam, seu aprender será sempre mais prazeroso.” (MALUF, 2003, p. 32) As crianças precisam ser solicitadas, encorajadas e desafiadas a agir, estabelecendo o maior número possível de relações entre os objetos e os acontecimentos vivenciados, para coordenar as diferentes ações experimentais ou as diferentes hipóteses de interpretação do seu grupo. A experiência lógico-matemática dirige-se às propriedades das ações – das transformações e de suas coordenações. Para Piaget, a aprendizagem significativa e a compreensão dos conceitos matemáticos só são possíveis quando a criança tiver a oportunidade de reelaborar e de reconstruir este conhecimento. A lógica é antes de tudo a expressão da coordenação geral das ações; e esta coordenação geral das ações implica necessariamente uma dimensão social porque a coordenação interindividual dos atos e sua coordenação intraindividual constituem um único e mesmo processo sendo as operações do indivíduo socializadas todas elas, e constituindo a cooperação no sentido estrito em tornar comum as operações de cada um. ( PIAGET, 1988, p.77) Segundo Piaget, os jogos não são apenas uma forma de divertimento, mas contribuem e enriquecem o desenvolvimento intelectual e moral da criança. Para manter o equilíbrio com o seu mundo, a criança necessita brincar, jogar, criar e inventar. O jogo além de proporcionar a relação entre colegas e grupos, é um fator de avanço cognitivo, pois durante os jogos a criança estabelece decisões, conflitua-se com seus adversários e reexamina seus conceitos. Nesse clima lúdico, a criança experimenta um sentimento de prazer ante o descobrimento do 20 novo e suas possibilidades de invenção, permitindo-lhe que reestruture sua forma de pensar e interagir com a realidade, transformando suas estruturas intelectuais. A criança precisa brincar, seu desenvolvimento depende do lúdico, ela precisa brincar para crescer, precisa do jogo como forma de equilibração com o mundo. Maluf acredita que brincar é para a criança um momento mágico e que brincando ela alimenta sua vida interior, liberando sua capacidade de criar e reinventar o mundo. MALUF explica que: Independente do tipo de vida que se leve, adultos, jovens e crianças, todos precisam da brincadeira e de alguma forma de jogo, sonho e fantasia para viver. A capacidade de brincar abre para todos uma possibilidade de decifrar os enigmas que os rodeiam. (MALUF, 2003, p.29) Jogar faz parte do cotidiano das pessoas, e as crianças, em especial, são atraídas pelo jogo. Piaget dedicou-se a estudar os jogos e chegou a estabelecer uma classificação deles de acordo com a evolução das estruturas mentais. Maluf, baseando-se nos estudos de Piaget, os diferencia em jogos de exercício, simbólicos e de regras. Os jogos de exercício caracterizam-se pelo prazer da função. As crianças no 1º ano de vida necessitam repetir algumas seqüências motoras para assimilar como as coisas acontecem, essa forma de aprendizagem chamamos de assimilação funcional. Nos jogos simbólicos, fase da representação, a criança substitui o real por símbolos, gestos, palavras e jogos de simulação, onde um pedaço de madeira representa um telefone celular. Esses jogos precisam ser propiciados às crianças em seus ambientes escolares e familiares por terem a função primordial na elaboração do conhecimento dando-lhes a possibilidade de explicação das coisas. Os jogos de regras possibilitam à criança a assimilação do real aproximando-a desses objetos de conhecimento de forma prazerosa e desafiadora. Também possuem uma função ética, mesmo que o jogador elabore ótimas estratégias para vencer, precisa seguir regras, limites e usar o raciocínio operatório trazendo assim, a médio ou a longo prazo, uma consciência ética ao sujeito. Ao propor um jogo, entram várias áreas de conhecimento ligadas à língua, à lógica, ao espaço, ao tempo, ao social e ao emocional podendo gerar sínteses integradoras que fortalecem e amadurecem as crianças. O brincar é importante, através dele é possível formar indivíduos com autonomia, motivados e capazes de aprender rapidamente. MALUF nos fala que é “através do brincar que a criança irá se desenvolver permeada por relações cotidianas, e assim vai construindo sua identidade, a imagem de si e do mundo que a cerca.” (MALUF, 2003, p. 20) O brincar 21 incentiva a utilização de estratégias, de regras e de desafios desenvolvendo a capacidade de manter a criança ativa e participante. Os jogos podem ser usados para incentivar, estimular e desenvolver a autonomia na criança, eles podem contribuir para que a criança pense de forma independente tornando-a apta a tomar decisões por si mesma, contribuindo no processo de construção de conhecimento lógico-matemático. É importante a criança (e o adulto) ter sua autonomia intelectual porque permite que aprendam como encontrar caminhos mais seguros que os conduzam a aprendizagens solucionando seus problemas proporcionando a autoconfiança, a valorização da cooperação e do respeito mútuo. O jogo estimula a exploração e a solução de problemas e, por ser livre de pressões e avaliações, cria um clima adequado para a investigação e a busca de soluções. A autora Kishimoto afirma que o jogo é importante para o desenvolvimento infantil, porque propicia a descentração, a aquisição de regras, a expressão do imaginário e a apropriação do conhecimento. Enquanto joga, a criança se defronta com desafios e problemas, onde busca constantemente soluções e/ou estratégias para resolver as situações a ela colocadas. O jogo permite ao participante a criação de autoconfiança, motivação e diminuição de bloqueios e ansiedades em relação à matemática. BORIN afirma: “motivo para a introdução de jogos nas aulas de matemática é a possibilidade de diminuir bloqueios apresentados por muitos de nossos alunos que temem a matemática e sentem-se incapazes de compreendê-la.” (BORIN, 1995, p. 9) Durante os jogos, a criança é incentivada a desenvolver habilidades fundamentais na construção e apropriação do número, como: contar, quantificar, relacionar, dar significado, representar, comparar, avaliar, compreender que a quantidade de elementos de uma coleção não se modifica quando alteramos a disposição espacial desses elementos, identificar algarismos, adicionar pontos que fez durante o jogo, perceber intervalos numéricos, estabelecer relações e tirar suas conclusões desenvolvendo o conhecimento lógico matemático. 22 3.1 DIFERENÇAS NO AGIR E PENSAR DAS CRIANÇAS NA FASE PRÉOPERACIONAL E DAS OPERAÇÕES CONCRETAS Este trabalho de pesquisa foi realizado numa turma de 1º ano de uma escola municipal localizada na área urbana de um município cuja população, na sua maioria, é formada por descendentes germânicos. A escola municipal mencionada, abriga atualmente 390 alunos, 23 professores, 1 diretora e 1 vice-diretora e 4 servente-merendeiras. Possui onze salas para atender as crianças do Ensino Fundamental e duas salas para a Ed. Infantil. Sua estrutura comporta um refeitório, uma sala de informática, uma sala de brinquedos, uma sala de vídeo e DVD, uma biblioteca, uma cozinha, uma sala de professores, uma secretaria, uma sala de direção e amplos corredores. Também possui um Ginásio e uma pracinha. A formação dos professores dessa escola é de um bom nível. Atualmente onze professores estão cursando o ensino superior, sete professores têm pós-graduação em sua área, uma professora cursa o mestrado e apenas uma professora tem somente o magistério. A turma do 1º ano (crianças com seis anos de idade completos em junho de 2006) é composta por 18 crianças, sendo que 9 são meninos e 9 meninas. Percebe-se na turma em geral, um forte desejo de aprender, tanto a linguagem escrita quanto as múltiplas linguagens: gestual, corporal, plástica, oral, musical, e, sobretudo a linguagem do faz-de-conta, ou seja, do brincar. A turma é um tanto quanto agitada, mas muito ativa e produtiva, participando e realizando de todas as atividades com muito entusiasmo e dedicação. Na turma tem vários alunos com espírito de liderança, o que os torna um pouco competitivos entre eles fazendo com que, às vezes, se desentendam no decorrer das aulas. Vejo como positiva a maneira como resolvem suas desavenças, pensando e construindo soluções práticas e um tanto quanto lógicas estabelecendo laços sociais e afetivos na construção de seu conhecimento social. Para comprovar as leituras realizadas, apliquei um jogo com uma criança da turma do 1º ano de 6 anos e 2 meses de idade, e para estabelecer uma relação entre o raciocínio lógico 23 dessa criança realizei o mesmo jogo também com uma criança de 7 anos e 10 meses, estudante de uma turma de 2ª série. A fase do pensamento pré-operacional é puramente egocêntrica e caracterizada pela irreversibilidade, ou seja, a criança considera que todos pensam como ela. A criança ainda não consegue entender transformações, mesmo que elas ocorram na sua presença. Não ocorre nenhum raciocínio lógico. A percepção orienta o conhecimento. Nessa faixa etária as crianças se distinguem pela imaginação, a curiosidade, o movimento e o desejo de aprender aliados à sua forma privilegiada de conhecer o mundo através do brincar. Elas têm possibilidades de participar de jogos que envolvem regras e se apropriar de conhecimentos, valores e práticas sociais, construindo sua autonomia e sua identidade. A criança no estágio das operações concretas já consegue usar a lógica para chegar às soluções da maior parte dos problemas concretos. Entretanto, sua dificuldade aumenta quando se trata de lidar com problemas não concretos. Também desenvolve uma maior habilidade de entender regras. 3.1.1 Jogo Aplicado - Jogo da Pesca Materiais: uma certa quantidade de peixes coloridos (azul, amarelo, rosa e verde); uma caixa com serragem ou areia, uma vara com um gancho na ponta; palitos de picolé; grãos ou fichas; uma folha; cola; giz de cera. Desenvolvimento: Coloca-se os peixes fincados na serragem ou areia, tendo uma perfuração no rabinho, que ficará aparecendo. Cada criança é convidada a pescar durante meio minuto. Ao terminar de pescar, cada criança contará os peixinhos que conseguiu pescar. Em seguida propõe-se que mostre nos dedos a quantidade total de peixinhos que possui. Seguindo, a criança deverá separar a quantidade de palitos necessários para representar o número de peixinhos depois, deverá pegar um grão para cada palito que separou, emparelhando as duas coleções. Para realizar o relatório a criança deverá colar os materiais que separou representando a quantidade de peixinhos e que também mostre, através de registros, com o uso de giz de cera a quantidade de peixinhos que possui. 24 Através dessa atividade pode-se verificar se a criança tem noção da quantidade total de elementos, se possui a diferenciação entre o caráter cardinal e ordinal do número. Também se pode investigar a invariância numérica propondo que disponham um grão para cada palito que separou. A atividade foi realizada com uma criança de 6 anos e 2 meses, SA e com outra de 7 anos e 10 meses de idade, AM. Iniciando a atividade, cada criança pode pescar por meio minuto. Seguindo, cada uma contou a quantidade de peixinhos que pescou, depois solicitei que mostrassem com os dedos da mão a mesma quantidade. A seguir propus que usando palitos de picolé, mostrassem a quantidade de peixinhos que possuíam. Também pedi que pegassem um grão para cada palito de picolé separado. Percebi que a criança de seis anos e dois meses de idade apoiou-se na correspondência termo a termo, colocando um palito para cada dedo da mão, somando sete dedos. Ao questioná-la sobre a quantidade de palitos que separara, verifiquei que repetia a contagem para saber o número de palitos que tinha. Percebe-se claramente que essa criança emprega a correspondência termo a termo na quantificação numérica das coleções. Na contagem estabeleceu a relação biunívoca e recíproca, correspondendo cada signo falado a um único objeto da coleção que deseja quantificar. Questionando-a sobre onde teria sete palitos, ela os contou novamente e mostrou o último como sendo o “sete”, vi que não diferencia o caráter cardinal e ordinal do número. Solicitei então que essa criança contasse novamente os palitos no sentido contrário. Ao final da contagem, novamente afirmou que os sete palitos localizavam-se no último palito contado. Propus que dispusesse um grão para cada palito que separou, e emparelhando as duas coleções questionei-a em relação à quantidade de palitos e de grãos. Percebi que ainda não tem a invariância numérica desenvolvida, pois acredita que a quantidade de grãos fica menor quando esta série ocupar menos espaço do que a série dos palitos. Ao realizar o relatório a criança SA colou os materiais que separou representando a quantidade de peixinhos que havia pescado, como mostra a figura 1. Novamente, ao colar o grão usou a correspondência termo a termo para se certificar da quantidade de grãos que teria que colar. O mesmo ocorreu no momento de representar graficamente a quantidade, de acordo com a figura 2. A criança SA pegou os palitos um após o outro e os contornou contando-os. 25 Figura 1 – Correspondência termo-a-termo . Figura 2 – Representação gráfica dos palitos Já a criança AM havia pescado “oito” peixinhos, e prontamente disse a quantidade de peixinhos pescados. Quando pedi que mostrasse com os dedos da mão a quantidade de peixes pescados, mostrou rapidamente uma mão, mais três dedos da outra mão, dizendo: “cinco mais três são oito”. Ao pegar a quantidade de palitos representando a quantidade de peixinhos pescados, pegou quatro e depois mais quatro e disse: “são oito”, conforme mostra a figura 3. O mesmo fez ao separar os grãos. Conclui-se que essa criança diferencia o caráter cardinal e ordinal do número, postulando a quantidade total. Ao pedir que representasse a quantidade de peixinhos pescados na folha de papel, ela escreveu “8”. Nota-se que emprega um signo numérico para representar o cardinal da coleção que quantificou, tendo construído a invariância numérica e dando-se conta de que a igualdade numérica de duas coleções se conserva apesar da disposição que seus elementos ocupam no espaço. 26 Figura 3 – Emprego do signo numérico para representar a quantidade de palitos 27 3.2 JOGOS APLICADOS NA TURMA DO 1º ANO Alguns jogos em grupos e individuais, além de estimularem a interação da vida social da criança entre seus colegas propiciando a construção da lógica dos valores sociais e morais, ajudam na construção do número pela criança pré-operatória. Para a criança que está construindo o conceito de número e relacionando quantidades à escrita numérica, a literatura também pode vir acompanhada de jogos matemáticos e até mesmo de indagações sobre a história ajudando a criança a formar o conceito numérico. Descrevo a seguir alguns jogos matemáticos realizados com as crianças do 1º ano tendo como objetivo contribuir no processo de aquisição e assimilação da construção do número e através de atividades lúdicas, verificar qual o entendimento das crianças na questão da conservação do número. 3.2.1 Jogo à partir da história: A Galinha Choca Materiais: personagens da história confeccionados pelas crianças; dado com os desenhos dos personagens; tabuleiros com desenho da paisagem onde se passa a história. Desenvolvimento: Depois de contada, interpretada e trabalhada a história “ Galinha Choca de Mery França e Eliardo França”, a turma deverá ser dividida em equipes, cada uma ganhará um tabuleiro desenhado com a cena onde se passa a história. Cada equipe deverá jogar o dado, o qual indicará o personagem a ser comprado. Termina o jogo quando todos os personagens da história estiverem no tabuleiro. As regras do jogo deverão ser combinadas no início da atividade para não haver desentendimentos no final. No decorrer do jogo, o (a) professor (a) deverá lançar algumas perguntas de inclusão, tais como: 28 -No tabuleiro, tem mais animais ou só tem bichinhos que põem ovos? -E na equipe, foram comprados mais galinhas ou outros animais? No final é proposto um relatório, onde o aluno representará o mesmo tanto de animais que comprou, colando materiais de contagem como bolinhas de papel ou outros. Justificativa: Esta atividade pretende, solicitar a ação da criança estabelecendo relações entre objetos, construindo a relação termo a termo. Os números são aprendidos por abstração reflexiva através da coordenação, pela criança, de relações criadas por ela própria. É muito importante para as crianças o trabalho de inclusão, pois, o raciocínio da criança se torna mais móvel e um dos resultados dessa mobilidade é a estrutura lógico-matemática do número. Outro objetivo desta atividade é a construção da autonomia pela criança, tornando-a capaz de tomar decisões por ela mesma, decidindo o melhor caminho da ação levando em consideração o ponto de vista do outro. É interagindo com seu próximo, trocando idéias e coordenando esses diferentes pontos de vista, para solucionar pequenas situações problema, que a criança desenvolve sua autonomia intelectual e constrói progressivamente o conhecimento lógico-matemático. Tendo em vista a importância da comunicação, é fundamental que seja feito sempre um registro sobre a atividade realizada. Estes registros têm um papel importante como auxiliares na comunicação oral e escrita, permitindo estabelecer relações entre noções informais e as noções matemáticas envolvidas no jogo. SMOLE explica que, as crianças enquanto brincam, muitas vezes não tem consciência do que estão aprendendo, do que foi exigido delas para realizar os desafios envolvidos na atividade. Por isso, pedir que alguma forma de registro seja feita após a brincadeira faz com que os alunos reflitam sobre suas ações e permite ao professor perceber se eles observaram, aprenderam e se apropriaram dos aspectos mais relevantes que foram estabelecidos como metas no planejamento da brincadeira escolhida. Desenvolvimento e discussão da atividade: As crianças estavam sentadas em grupos. Cada equipe formada por 4 crianças, recebeu o desenho dos personagens da história; um dado com os desenhos dos personagens e um tabuleiro com o desenho da paisagem onde se passou a história. Inicialmente foram estabelecidas as regras do jogo, com a participação das crianças, a seguir foi feita a proposta: “Uma criança de cada equipe deverá jogar o dado e comprar o personagem da história marcado no dado; o jogo termina quando todos os personagens estiverem no tabuleiro.” AL sugeriu que sempre um do grupo jogasse o dado e 29 decidiu que ela iria começar. A professora questionou: “Assim cada um chegará na vez de jogar o dado?” JÚ explicou: “Profe, se no dado tem seis personagens, e nós somos quatro crianças no grupo, então cada um joga uma vez e depois dois colegas ainda vão jogar duas vezes”. Com esse pequeno diálogo pode-se perceber que o menino JÚ tem a questão da relação termo a termo bem desenvolvida, pois logo relacionou seis lados do dado com jogar o dado seis vezes e soube calcular que se só tem quatro crianças, duas teriam que jogar duas vezes. Depois dos quatro alunos terem jogado o dado uma vez, a professora os questionou: “No tabuleiro tem mais animais ou bichinhos que põem ovos?” AL prontamente respondeu: “Tem mais animais, porque todos eles são animais, é que o coelho de verdade não bota ovo, mas ele é um bicho que também nasceu.” Com esta afirmação verificamos que AL já consegue pensar simultaneamente no todo e nas partes, consegue chegar a este raciocínio lógico, através da coordenação das relações em uma escala hierárquica. Neste caso, DUHALDE diz que “a comparação não se refere a dois conjuntos diferentes, mas à relação desde um ponto de vista quantitativo entre as partes e o todo, entre os subconjuntos e o conjunto total.”(DUHALDE, 1998, p.55) Ao final do jogo, o tabuleiro estava completo, as crianças fizeram o registro do jogo desenhando os personagens da história e para cada um colaram uma bolinha de papel. A maioria das crianças fez a contagem dos personagens e efetuou o relatório desenhando seis personagens e colando seis bolinhas, fazendo a relação termo a termo: uma bolinha para cada personagem, o que podemos ver na figura 4. Piaget acredita que, mesmo que a criança emprega a correspondência termo a termo espontaneamente para constituir uma coleção equivalente à outra dada, isso não pressupõe que a criança tenha a noção da invariância, tão necessária à consolidação do número aritmetizado. A correspondência termo a termo é necessária à construção da estrutura numérica, mas também não é uma condição suficiente. 30 Figura 4 - Registro do jogo. 3.2.2 Jogo da pesca Materiais: uma certa quantidade de peixes coloridos (azul, amarelo, rosa e verde); uma caixa com serragem ou areia, uma vara com um gancho na ponta. Desenvolvimento: Coloca-se os peixes fincados na serragem ou areia, tendo uma perfuração no rabinho, que ficará aparecendo. Cada criança é convidada a pescar durante meio minuto. Ao terminar de pescar, cada criança classificará seus peixes por cor, contará quantos pescou ao todo e poderão comparar quem pescou mais, menos, ou a mesma quantidade de peixes. Depois, farão o relatório do jogo verificando a quantidade de peixes pescada de cada cor e a quantidade total. Justificativa: Essa atividade colabora para que a criança construa a noção de número a partir da capacidade de classificar, seriar, pensar, adaptar-se, brincar e trocar idéias. Para que a criança adquira a conservação do número, é preciso que desenvolva algumas habilidades através do manuseio de materiais, como: a observação, a classificação e a seriação. Desenvolvimento e discussão da atividade: As crianças estavam sentadas em rodinha, foi apresentada uma caixa contendo serragem e peixinhos coloridos, todos do mesmo tamanho. A professora explicou o jogo para a turma e foi dada a seguinte proposta: “Cada criança poderá pescar durante um minuto, cuidarei e avisarei quando deverá parar.” 31 Enquanto pescavam as crianças contavam seus peixinhos e observavam suas cores, a quantidade de cada cor, a quantidade total, entre outros. Ao término da pescaria, foi pedido que se juntassem em grupos de cinco crianças e que comparassem seus peixinhos com os dos colegas. Logo começaram a contá-los e compará-los. ARI disse: “Ela tem mais, eu tenho sete.” LUCI então contou e rapidamente falou: “pesquei muitos, tenho oito.” ARI chegou a seguinte conclusão: “oito é mais que sete”. A professora então questionou: “Como você sabe que oito são mais que sete?” ARI respondeu: “Porque o sete vem antes do oito”. A professora então disse: “Como você pode me mostrar isso?” ARI colocou os peixinhos sobre a mesa e começou a contá-los. DUHALDE diz que a série oral permite a criança descobrir qual é o “seguinte de” um número: Observamos assim que começou a compreender que o termo mais alto na série significa mais que o anterior. Assim poderá comparar conjuntos muito próximos em quantidades maiores, mesmo que a diferença não seja visualmente perceptível como ocorria com os números intuitivos. (DUHALDE, 1998, p. 50) Num segundo momento, a professora propôs que cada equipe arrumasse os peixinhos em grupinhos. As crianças logo formaram grupos observando o critério cor. A professora perguntou a equipe: “ O que tem mais, peixinhos azuis ou animais?” As crianças da equipe responderam que haviam mais peixinhos azuis. Percebemos com essa afirmação que as crianças ainda tem a dificuldade de coordenar mentalmente, os aspectos qualitativos e os quantitativos da classe não conseguindo pensar simultaneamente na parte e no todo. Porém, o menino RAFA de outra equipe, respondeu prontamente: “Tem mais animais do que peixinhos azuis, os peixinhos são animais!” Esse menino com certeza já tem a reversibilidade operatória desenvolvida, conseguindo se libertar dos dados da percepção e atingindo a síntese da extensão e da compreensão da classe. Rangel fala que “a estrutura de classificação se consolida, e a criança passa ser capaz de realizar inclusões hierárquicas, quando tem a reversibilidade operatória atingida”.(RANGEL, 1992, p. 109) Após todas essas atividades, as crianças fizeram o relatório, como mostra a figura 5. 32 Figura 5 – Relatório do jogo da pesca 3.2.3 Jogo do Boliche Materiais: frascos de xampu vazios, bola de meia, cartaz do placar do jogo. Desenvolvimento: Disponha os frascos de xampu como se fossem os pinos de um jogo de boliche. Então, divida os alunos em duas equipes e escolha quem vai iniciar o jogo. Este deve pegar a bola de meia e tentar derrubar os recipientes, mantendo uma certa distância deles. Depois de sua tentativa, conte, com as crianças, quantos pinos foram derrubados e marque no cartaz, no local respectivo a sua equipe. Se o aluno não derrubar nada, não perde nem ganha pontos. Então, é a vez de um jogador do outro time. A equipe que formar mais pontos ganha o jogo. Depois que todos fizerem suas tentativas, crie espaços de reflexão perguntando, quem fez mais ou menos pontos, quantos a mais, quem fez a mesma quantidade. A equipe vencedora será aquela que obter maior número de pontos. Justificativa: Este jogo promove situações de interação e cooperação entre os alunos, bem como o exercício de valores como o respeito ao outro, participação, paciência, limites, estruturação do espaço e atendimento a regras. As situações postas nas jogadas, assim como as resoluções das situações-problema propostas, podem gerar sínteses integradoras que fortalecem e amadurecem as crianças. 33 Ao oferecer esse jogo às crianças dessa faixa etária, quero proporcionar situações de contagem, de comparação de quantidades, de realização de operações e cálculos matemáticos envolvendo a soma, noção de espaço, tempo, direção, sentido, além de propiciar-lhes momentos de recreação e descontração. Desenvolvimento e discussão da atividade: A turma foi dividida em duas equipes de nove crianças. Os frascos foram dispostos a uma distância de dez passos pequenos da linha demarcada para o arremesso da bola. Antes de iniciar o jogo, estabelecemos as regras para o andamento do jogo. Inicialmente ficou estabelecido que cada um teria só uma chance para arremessar a bola e acertar os pinos (frascos de xampu). Como as três primeiras crianças não acertaram nenhum pino, perguntei-lhes se não dava para mudar a regra do número de vezes que cada um poderia jogar. As crianças sugeriram dar uma nova chance somente ao colega que na primeira tentativa não acertasse nenhum pino. Na tentativa de acertarem o alvo algumas crianças mudavam a posição do corpo, se abaixando e levantando enquanto que outros gritavam: “mira, rola pelo chão!”. Percebe-se aí que as crianças quando tentam dirigir um objeto a um alvo específico pensam nas relações espaciais. Depois de uma tentativa, relacionam suas expectativas com os resultados efetivamente obtidos. Assim, diz Kamií, “todos os jogos de alvo exigem abstração reflexiva, além de coordenação perceptivo-motora.” (KAMIÍ, 1991, p.57) Inicialmente as duas equipes mostraram-se muito preocupadas e competitivas tentando derrubar o maior número de frascos e marcar mais pontos. Teve até algumas crianças que ficaram ofendidas e queriam parar de jogar ao perceberem que estavam em desvantagens de pontos. Como a competição não deve ser estimulada no sentido de ganhar a qualquer preço, questionei as crianças sobre a importância real do jogo, a importância da cooperação e se o mais importante era o “vencer” ou se ao jogar poderiam “aprender e se divertir”. As crianças então mencionaram algumas coisas que poderiam aprender jogando: contagem dos frascos, saber usar regras do jogo, saber perder e ganhar, além de mencionarem que isso os tornaria mais inteligentes. No decorrer do jogo, ao realizarem os registros dos pontos obtidos, as crianças faziam comparações em relação à quantidade de frascos derrubados e se questionavam em relação a melhor forma de posicionamento para derrubar o maior número de frascos. O boliche proporciona muitas possibilidades para o desenvolvimento do raciocínio espacial e numérico, ele apresenta a vantagem de oferecer uma oportunidade de registro de pontos obtidos. Veja a seguir, na figura 6, o registro dos pontos: 34 Figura 1.6 - Relatório do jogo do boliche Figura Figura 6 – Relatório do Jogo do Boliche 3.2.4 Jogo do Boliche das Cores (Variação do Jogo do Boliche) Materiais: bola leve ( de meia ou de plástico), frascos de três cores: vermelho, amarelo e azul, cartaz para realização do registro de pontos de cada jogador e folha para o relatório individual. Desenvolvimento: Antes de iniciar o jogo propriamente dito, os alunos e a professora deverão estabelecer uma série de regras, como, por exemplo: organizar os pinos, marcar a distância e a linha de limite para o arremesso da bolinha; determinar a vez de jogar e sortear quem começa o jogo. A professora combinará com os alunos que os frascos terão valores diferentes (de 1 a 3) dependendo da sua cor. O jogo inicia com uma criança rolando a bola para acertar um dos pinos. Se errar, passa a vez para o próximo colega; se acertar, conta quantos frascos e de quais cores conseguiu derrubar, depois registra a sua jogada e soma os pontos obtidos. Justificativa: Este jogo requer das crianças um conhecimento de como os objetos reagem mediante diferentes ações. Terão que descobrir qual a melhor forma de posicionar-se para derrubar garrafas da cor que tem o maior valor estabelecido. Além de aprimorar a coordenação motora, a percepção espacial, o jogo desenvolve processos de contagem e cálculo mental. 35 Desenvolvimento e discussão da atividade: Inicialmente foram estabelecidas algumas regras como: Não passar da linha estabelecida para arremessar; quem errar o primeiro arremesso terá direito de jogar novamente; após cada arremesso, serão calculados e anotados os pontos pela criança que o realizou; cada criança fará o relatório dos pontos obtidos na sua jogada; entre outras. Percebi que ao iniciar o jogo as crianças demonstravam certa preocupação e ansiedade. No primeiro arremesso, a criança conseguiu derrubar um frasco vermelho e um azul. Perguntei-as sobre a quantidade de frascos derrubados e a quantidade de pontos que conseguiu. A criança que realizou o arremesso logo disse: _ Se eu derrubei um frasco vermelho e um azul, tenho cinco pontos (mostrou dois dedos e três dedos e concluiu que dava cinco). No decorrer do jogo aconteceram várias situações interessantes como a comparação feita por uma menina que não conseguiu acertar nenhum pino, mesmo depois de duas tentativas. A menina levantou e correu até outra menina, abraçando-a e dizendo: _Viu, nós duas não acertamos nada. Um menino, ao ouvir esse comentário disse: _ A gente tem que aprender a ganhar e a perder. Durante o jogo, após cada arremesso, os alunos foram questionados e desafiados a calcularem o número de pontos obtidos. Também foram feitas algumas perguntas como: Quem derrubou mais pinos? Quem derrubou menos pinos? Quem obteve mais pontos? Quem obteve menos pontos? Porque um frasco amarelo e dois vermelhos somam cinco pontos? A questão da competitividade estava mais amena em relação ao primeiro jogo realizado, conseguiram encarar as perguntas à respeito do número de pontos com mais naturalidade, não se preocupando tanto com a questão do “ganhar e perder” e sim concentrando-se no jogo em si. Perder é desconfortável quando se torna sinônimo de fracasso. O professor tem um papel importante no desenvolvimento da postura de que ganhar um jogo não é nada mais do que ganhar um jogo. Não significa que quem perde seja inferior, incompetente e mereça rejeição. (KAMIÍ, 1991, p. 280) Veja na figura 7, o registro realizado por uma criança, da quantidade de frascos que conseguiu derrubar e do total de pontos que obteve. 36 Figura 7 – Jogo do Boliche das Cores CONCLUSÃO Durante o trabalho com a realização dos jogos matemáticos, sentiu-se que não se pode ensinar o conhecimento lógico-matemático: ele é construído através das relações que a própria criança cria entre os objetos e nas relações que estabelece com os outros. O conhecimento lógico-matemático configura uma estrutura que tende a progredir, não havendo possibilidade de regressão, pois, uma vez apreendida, não sofre regressão. Na medida que as crianças agem sobre os objetos através de atos de pegar, apalpar, dobrar, deixar cair, apertar, esticar, sacudir, entortar, juntar, separar, classificar que vão estruturando seu conhecimento físico, social e lógico-matemático. Assim, as brincadeiras propostas devem partir de atividades simples e que vão se dificultando à medida que as crianças conseguirem realizar os desafios sugeridos. Só depois de um período de manipulação concreta e de confronto de suas hipóteses com as dos colegas, é que as crianças alcançam a abstração. Os jogos com regras proporcionam o desenvolvimento social das crianças e contribuem para a formação de sentimentos e atitudes de cooperação e respeito mútuo formando a personalidade autônoma na criança. Ao participarem de jogos organizados, as crianças começam a compreender a lógica das normas, a reconhecer o certo e o errado, e começam a entender que é necessário respeitar a si mesmo e aos outros. Para que as crianças cheguem a uma verdadeira autonomia e compreendam as razões e o significado das regras, estas nunca devem ser impostas pelo adulto, devendo ser elaboradas com as crianças. Outra constatação refere-se ao ritmo de desenvolvimento único em cada criança. É necessário considerar que a passagem de um estágio para outro se processa sutilmente e por isso as atividades propostas devem ser adequadas ao estágio em que a criança se encontra. A criança quando estimulada de acordo com seu nível de desenvolvimento, no seu próprio ritmo, progride, e à medida que as reconstruções se sucedem no plano do pensamento, as crianças descobrem como representar para si os dados abstraídos. 38 Os jogos e atividades grupais dão às crianças a oportunidade de confrontar seu ponto de vista com o de seus colegas, contribuindo para a passagem do pensamento pré-operacional ao operatório e conseqüentemente favorecendo a passagem da imitação involuntária para a consciente. Se as estruturas do raciocínio lógico-matemático forem estimuladas e bem trabalhadas, as crianças dessa idade mais facilmente se alfabetizam, pois não se podem separar as estruturas da numeralização da alfabetização. Sabe-se que a noção de número é muito difícil de ser compreendida pela criança no período pré-operacional por ser muito abstrata. As crianças da turma do 1º ano, depois das aplicações de vários jogos, ainda não se encontram no estágio das operações concretas, mas percebeu-se que esses alunos estão num processo de transição para esse estágio, uns mais avançados, outros menos. REFERÊNCIAS ASMANN, Hugo. Metáforas novas para reencantar a educação: epistemologia e didáticas. 3ª ed. Piracicaba: Unicamp, 2001. BECKER, Fernando. Educação e Construção do Conhecimento. Porto Alegre: Artmed, 2001. BORIN, Júlia. Jogos e resolução de problemas: uma estratégia para as aulas de matemática. São Paulo: IME-USP, 1995. CARRAHER, Terezinha Nunes (org). Aprender Pensando: Contribuições da Psicologia Cognitiva para a Educação. 6ª ed. Petrópolis: Vozes, 1991. CHARLES, C.M. Piaget ao alcance dos professores; tradução da profª Ingeborg Strake. Ao livro Técnico S/A- Indústria e comércio. RJ, 1984. 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